CURSOS DE LICENCIATURA EM CIÊNCIAS NATURAIS NOS
INSTITUTOS FEDERAIS DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA
SOUSA, Aparecida Gasquez – UFMT
[email protected]
BERALDO, Tânia Maria – UFMT
[email protected]
Eixo temático: Formação de professores e profissionalização
Agência financiadora: Não contou com financiamento
Resumo
Este trabalho põe em pauta o problema da formação de professores da área das ciências da
natureza, no Brasil. O objetivo é estabelecer relações entre a política nacional para a formação
de professores e a criação de cursos de licenciatura nos Institutos Federais de Educação,
Ciência e Tecnologia - IFs. A análise foi desenvolvida com base em dados sobre: histórico da
rede federal de educação profissional e tecnológica; demanda por formação de professores e
oferta de cursos de licenciatura pelos IFs. Os dados foram extraídos de estudos realizados por
pesquisadores da área (FRIGOTTO, 2005; KUENZER, 2001 e MACHADO, 1989), dos
estudos realizados pelo INEP (HINGUEL, RUIZ e RAMOS, 2007; BRASIL, 2009) bem
como dos sites das instituições investigadas. O quadro delineado permite compreender as
razões pelas quais o MEC induz os IFs a assumirem a tarefa de realizar cursos de licenciatura
para formação de professores. Essa iniciativa indica possibilidades de ocorrência de uma crise
no interior das citadas instituições, uma vez que elas devem formular projetos educativos para
atender alunos de diversas faixas etárias e níveis de ensino. Ademais, o histórico das
instituições que compõem a rede federal de educação tecnológica revela que o legado de
experiências que elas dispõem está diretamente relacionado à formação de profissionais para
áreas técnicas, especialmente para o setor industrial e agropecuário. As experiências na
formação de professores são recentes e restritas a algumas instituições. Embora não se possa
negar o valor da política de criação de novos cursos de licenciatura em instituições federais de
educação, faz-se necessário ampliar as discussões sobre as reais possibilidades que os IFs têm
de realizar tal tarefa para não incorrer em práticas que comprometem a qualidade do ensino
por eles promovido.
Palavras-chave: Educação; Institutos Federais; Cursos de Licenciatura.
Introdução
10170
Uma das palavras-chave que caracteriza o nosso tempo é “globalização”, também
denominado “mundialização” (CARNOY, 2003). Ambas estão relacionadas, particularmente,
com a internacionalização da economia, fenômeno que cria intrincada relação entre as
diferentes nações do globo e envolve até mesmo as sociedades não organizadas segundo a
lógica capitalista. A globalização foi acompanhada por um espetáculo de renovações e
desenvolvimento da ciência nunca observado na história humana. Isso explica porque Granger
(1994) qualificou o período que sucedeu a segunda metade do século XX como a “idade da
ciência”. Nos dias atuais, a ciência se faz presente nas várias dimensões da nossa vida
cotidiana, uma vez que “os objetos que utilizamos e de que estamos rodeados são produtos da
técnica e, por assim dizer, estão impregnados de pensamento científico” (GRANGER, 1994,
P. 16). Paradoxalmente, a ciência tem se constituído num campo de conhecimento restrito a
uma minoria privilegiada, ou seja, à “esotérica comunidade científica” (CHASSOT, 2003, p.
94). Isso explica as contradições entre a produção da ciência e o ensino de ciências.
No que se refere à produção científica, o Brasil, nos últimos anos, tem se destacado no
ranking mundial de artigos publicados em revistas especializadas, tanto em quantidade como
em qualidade. Nessa classificação saltamos do 17º lugar, em 2005, para o 15º em 2007,
ficando à frente de países como Suécia, Suíça, Bélgica, Áustria e Polônia. (HARLEY et al,
2008). Em 2008, passamos da 15ª para a 13ª colocação (GÓIS, 2009).
No que diz respeito ao ensino de Ciências nosso país ocupa posições desfavoráveis na
classificação apresentada pelo Programa Internacional de Avaliação de Alunos – PISA. Esse
programa se constitui numa pesquisa trienal de conhecimentos e competências de estudantes
na faixa de 15 anos de idade, realizada nos países da Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico – OCDE – e países convidados. O PISA realizou avaliações em
2000, 2003 e 2006. O Brasil participou de todas elas, porém até agora o desempenho de
estudantes brasileiros foi preocupante. Dentre os 57 países que participaram da avaliação em
2006, o Brasil ficou na 52ª posição, resultado que o deixou a frente de países como
Quirquistão, Qatar, Azerbaijão e Tunísia, e atrás de países como México e os sul-americanos
Uruguai e Chile (PISA 2006). Esses dados tornam evidente a necessidade de se promover a
alfabetização científica, conceituada por Chassot como “o conjunto de conhecimentos que
facilitaria aos homens e mulheres fazer uma leitura do mundo onde vivem” (2006, p. 38).
É cientificamente culto aquele que, diante da notícia de um sucesso científico recente,
é capaz de avaliar a sua amplitude real e de descontar a parte de exagero demasiado
10171
freqüente com o qual os periódicos de vulgarização (e às vezes até as publicações
científicas) anunciam a importância de uma descoberta (THOM, apud GRANGER,
1994, p. 18)
No Brasil, a alfabetização científica joga luz sobre outro problema igualmente
complexo: a existência de professores em quantidade e qualidade da formação profissional.
Esse problema foi revelado no relatório intitulado “Escassez de professores no Ensino Médio,
propostas estruturais e emergenciais”, de maio de 2007, produzido pela Comissão Especial
instituída para estudar medidas que visem superar o déficit docente no Ensino Médio,
particularmente nas disciplinas de Química, Física, Matemática e Biologia. De acordo com o
documento, o grande déficit de professores no Ensino Médio tenderá a ampliar-se nos próximos anos, diante da necessidade de universalização das matrículas nessa etapa da educação,
exigindo ações emergenciais e de caráter estrutural (RUIZ, RAMOS e HINGUEL, 2007).
O relatório se apóia em dados do INEP que apontam para uma necessidade de cerca de
235 mil professores para o Ensino Médio no país, particularmente nas disciplinas de Física,
Química, Matemática e Biologia. Precisa-se, por exemplo, de 55 mil professores de Física;
mas, entre 1990 e 2001, só saíram dos bancos universitários 7.216 professores nas
licenciaturas de Física, e algo similar também se observou na disciplina de Química. O
relatório aponta também baixo percentual de professores com formação inicial específica na
disciplina que lecionam. A situação mais preocupante é a disciplina de Física, cujo percentual
é de 9%. Situação similar ocorre na disciplina de Química cujo percentual é de 13%.
Com o objetivo de reverter o quadro de déficit de professores do ensino médio, o
relatório propõe o estabelecimento de políticas públicas voltadas para a formação de
professores que abranjam todos os conteúdos curriculares; contudo a insuficiência de
professores habilitados e qualificados para Física, Química, Matemática e Biologia
(Ciências), coloca essas disciplinas como prioritárias.
Diante do problema da escassez de professores da área das ciências da natureza, a rede
federal de educação profissional e tecnológica foi impelida a ofertar cursos de licenciaturas
nas áreas prioritárias, fato que se consolidou com a criação dos Institutos Federais de
Educação, Ciência e Tecnologia – IF.
Na condição de pesquisadoras da área de educação em ciências interessamo-nos pelo
estudo das políticas do governo federal para a formação de professores dessa área. Neste
trabalho, o foco de nossa atenção é a oferta de cursos de Licenciatura em Física, Química e
10172
Biologia pelos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia – IFs. Os dados foram
extraídos do site de 33 IFs.
Esse texto foi assim organizado: Inicialmente apresentamos um breve histórico da rede
federal de educação profissional e tecnológica. Em seguida fazemos considerações sobre a
reforma do ensino superior, procurando identificar as razões das políticas de formação de
professores de ciências naturais nos IFs. Apresentamos então, o quadro de ofertas de cursos
de graduação em Física, Química e Biologia pelos IFs espalhados pelas unidades federativas
do país, estabelecendo relações com os dados derivados dos estudos publicados pelo INEP
(RUIZ, RAMOS e HINGUEL, 2007; BRASIL, 2009).
1-Breve histórico da rede federal de educação profissional e tecnológica.
A história da rede federal de educação profissional e tecnológica começou em 1909,
quando o então presidente da República, Nilo Peçanha, por meio do decreto 7.566, de 23 de
setembro, criou 19 escolas de Aprendizes e Artífices, subordinadas ao Ministério dos
Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio. Essas escolas surgiram para suprir a
necessidade de mão-de-obra gerada pela indústria em crescimento no Brasil. De acordo com
Kuenzer (2001), a real finalidade dessas escolas era a formação profissional de pobres e
marginalizados que perambulavam pelas ruas desde a escravidão.
A partir de 1930, com a subida de Getulio Vargas ao poder, foi instaurada uma nova
fase na economia brasileira baseada na atividade industrial, o que exigiu a preparação de um
maior contingente de mão-de-obra para atuar nesse setor em expansão. Assim, no ano de 1937
foi promulgada a nova Constituição Brasileira tratando pela primeira vez do ensino técnico,
profissional e industrial. A Lei 378 de 1937 transformou as Escolas de Aprendizes e Artífices
em Liceus Industriais, destinados ao ensino profissional de todos os ramos e graus.
Em 1942 foi promulgada a Lei Orgânica do Ensino Industrial como parte da Reforma
Capanema. Com essa lei ficaram estabelecidas as bases para a organização de um sistema de
ensino profissional para a indústria. Foi estabelecida também a equivalência parcial do ensino
técnico com o sistema regular de ensino, permitindo aos concluintes dos cursos técnicos
ingressarem em cursos superiores “relacionados”. Naquele mesmo ano, o Decreto 4.127/42
transformou os Liceus Industriais em Escolas Industriais e Técnicas.
10173
A Lei n.º 3552, de 16 de fevereiro de 1959, propiciou uma maior autonomia e o
desenvolvimento da organização administrativa da rede de ensino técnico. As Escolas
Industriais e Técnicas foram transformadas em autarquias com o nome de Escolas Técnicas
Federais, com autonomia didática e de gestão.
Em 1961, o ensino profissional foi equiparado ao ensino acadêmico com a
promulgação da Lei 4.024 que fixou as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Foram
estabelecidos dois ramos de ensino médio diferenciados, mas equivalentes: “um propedêutico
representado pelo científico e outro profissionalizante, com os cursos normal (magistério),
industrial, comercial e agrícola” (KUENZER, 2001, p.14).
A partir de 1964 emergiu um novo discurso nacional fundamentado na Teoria do
Capital Humano. A crise econômica do país era explicada pela inadequação da proposta
educacional em relação ao momento histórico que o país atravessava. Dava-se prioridade aos
cursos acadêmicos em detrimento dos cursos técnicos (KUENZER, 2001, p. 15).
Em sintonia com o referido discurso a lei 5.692 de 1971 formulou as novas diretrizes e
bases da educação.
Modificou-se a estrutura do ensino; criaram-se novas denominações, com a abolição
dos cursos primário, ginasial e secundário; eliminou-se a estrutura de ensino baseada
em ramos profissionais para constituir-se uma rede única de ensino; instituiu-se a
iniciação profissional e a profissionalização em todo o ensino de 1º e 2º graus,
respectivamente (MACHADO, 1989, p.67-68).
A essência dualista da educação brasileira permaneceu inalterada, ou seja, o ensino
profissionalizante de 2º grau não se concretizou. Somente as escolas que antes da
promulgação da Lei n.º 5.692/71 ministravam os cursos de profissionalização deram
continuidade ao percurso histórico desses cursos, principalmente nas áreas voltados para a
indústria, a agropecuária e o comércio. As escolas que atendiam a população de maior poder
aquisitivo continuavam preparando seus alunos para o vestibular. O caráter propedêutico era
camuflado sob uma falsa proposta de profissionalização. As escolas públicas de 2º grau,
marcadas pela falta de recursos e por uma estrutura de funcionamento precária, e destinada à
população de baixa renda não conseguiram desempenhar a função propedêutica e muito
menos a profissionalizante, o que resultou numa perda crescente de sua qualidade
(KUENZER, 2001). Essa constatação motivou o governo federal emitiu o parecer nº 76/75
como forma de iniciar o processo de descompromisso da escola com a generalização
10174
profissional, fato que se consolidou com a lei 7.044/82 que extinguiu ao nível formal a escola
única de profissionalização obrigatória.
No ano de 1978 a Lei 6.545 transformou três Escolas Técnicas Federais (Paraná,
Minas Gerais e Rio de Janeiro) em Centros Federais de Educação Tecnológica. A lei definiu
para essas instituições, a tarefa de oferecer, além do ensino técnico, cursos de graduação.
Destarte, as referidas instituições passaram a oferecer cursos técnicos em diversas áreas e,
paralelamente, cursos de Engenharia Industrial, tecnológicos e licenciaturas voltadas para a
formação de professores para o ensino técnico e para os cursos de tecnólogos. Os citados
CEFETs assumiram também a tarefa de promover atividades de extensão e de pós-graduação
lato sensu bem como de realizar pesquisas na área técnico-industrial. Com o passar do tempo,
essas instituições passaram a oferecer também a pós-graduação stricto sensu nos níveis
mestrado e doutorado (FRIGOTTO, 2005).
No contexto das reformas educacionais engendradas no inicio na década de 1990,
outras Escolas Técnicas Federais e Escolas Agrotécnicas Federais foram transformadas em
Centros Federais de Educação Profissional e Tecnológica – Cefets. Isso se deu por meio da
Lei 8.948, de 08 de dezembro de 1994 que institui o Sistema Nacional de Educação
Tecnológica. Os CEFETs passaram a ministrar cursos em todos os níveis, desde cursos
profissionais até cursos de graduação e pós-graduação. Dentre esses cursos: “Formação de
professores para as disciplinas científicas e tecnológicas do Ensino Médio e da Educação
Profissional.” (Decreto n. 3462 de 17/05/2000).
No ano de 2006 foi instituído, no âmbito federal, o Programa Nacional de Integração
da Educação Profissional com a Educação de Jovens e Adultos, como proposta de promover
educação para aqueles que não a tiveram na idade regular. (Decreto n. 5840 de 13/07/2006).
Em 2008, a lei 3.775 de 16/07/2008 criou os Institutos Federais de Educação, Ciência
e Tecnologia – IF – que resultaram da integração e/ou transformação de instituições que
compunham a rede federal de educação profissional e tecnológica. Dentre outros objetivos
estabelecidos no artigo 7º da referida Lei os IFs têm a função de ministrar cursos de
licenciatura, bem como programas especiais de formação pedagógica, com vistas à formação
de professores para a educação básica, sobretudo nas áreas de ciências e matemática, e para a
educação profissional, conforme estabelece a alínea b, do inciso VI. O art. 8º da referida lei
também estabelece que os institutos devam garantir o mínimo de 20% de vagas para atender
tais objetivos.
10175
O breve histórico apresentado anteriormente revela que as instituições que compõem a
rede federal de educação profissional e tecnológica têm atuado, tradicionalmente, na formação
profissional, especialmente no setor técnico-industrial e agropecuário. A oferta de cursos de
licenciatura é uma tarefa recente e desafiadora para o quadro de docente de tais instituições,
visto que requer domínio teórico e metodológico do campo da educação. O desafio está ainda
na capacidade de articular projetos educacionais de ensino médio e ensino superior ofertando
diversos cursos (técnicos para alunos em idade regular, técnicos para jovens e adultos,
tecnológicos, engenharias, licenciaturas, especializações lato sensu e stricto sensu). Esse largo
espectro de atuação dos IFs compromete a identidade construída na história dessas
instituições e pode repercutir na qualidade do ensino.
2 - A reforma da educação superior e a oferta de cursos superiores pela rede federal de
educação profissional e tecnológica.
Desde a década de 1990, o Brasil é palco de expressivas mudanças no cenário político
e econômico justificadas pela necessidade de tornar o Estado mais “leve” e mais “eficiente”,
condições apontadas como requisitos para participar da dinâmica do mundo globalizado. As
reformas tiveram impactos nos diversos setores da gestão governamental incluindo a
educação.
Em se tratanto da educação superior o fenômeno mais notório foi o elevado aumento
no número de matrículas na educação1. Esse fato foi possibilitado pela expansão do setor
privado, que pôde contar com amparo legal e financeiro oferecido pelo Estado brasileiro. De
acordo com o Censo da Educação Superior publicado pelo MEC/INEP, em 2007, havia no
Brasil 2.281 IES. Desse total, 2.032 (89%) estava vinculado ao setor privado e apenas 249
(11%) ao setor público. Dos 23.488 cursos de graduação desenvolvidos no país, 16.892
(71%) ocorreram em IES privadas e 6.596 (29%) em IES públicas.
A expansão do setor privado pode ser explicada pela possibilidade de diversificação na
forma de organização acadêmica das IES. A diversificação de IES prevista na LDB de 1996
(Lei 9394/96) foi regulamentada pelo Decreto 2.306/97. Este foi revogado pelo Decreto nº.
3.860/01 que, por sua vez, foi alterado pelo Decreto 5.225/04, que incluiu os Centros Federais
de Educação tecnológicas – CEFET – entre a classificação das IES do sistema federal de
1
Conforme dados disponibilizados pelo MEC/INEP, em 1991, o Brasil registrou 1.565.056 matrículas em cursos
de graduação presenciais. Em 1996, este número alterou para 1.868.529 e, em 2007, para 4.880.381.
10176
ensino. De acordo com Chaves, Lima e Medeiros (2008, p.338) “esse tipo de IES foi a que
apresentou o maior crescimento após a aprovação da LDB passando de 16 em 1999, para 184
em 2005, aumentando 1.050% em apenas seis anos”.
A expansão dos CEFETs e a consequente transformação destas instituições em
Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia está relacionada com a política do
governo federal para a formação de professores, em especial para as disciplinas de Física,
Química, Biologia e Matemática. Tal política foi instituída pelo Decreto Nº. 6.755 de 29 de
janeiro de 2009 e visa formar, nos próximos cinco anos, 330 mil professores que atuam na
educação básica e ainda não são graduados. Conforme indicam os dados do Educacenso 2007,
esse número corresponde a cerca de 50% do total de professores que estão em exercício na
educação básica pública e que não possuem graduação ou atuam em áreas diferentes das
licenciaturas em que se formaram. O governo estabelece que os 38 institutos federais
existentes no país, na atualidade, terão que investir, para além do plano nacional de formação,
R$ 500 milhões por ano na formação de licenciados na área das ciências da natureza. 2
3-A oferta de cursos de licenciatura nos Institutos Federais de Educação, Ciência e
Tecnologia.
Para identificar as instituições e os cursos que estão sendo oferecidos pelos IFs, no
campo da formação de professores, em especial para o magistério das disciplinas Física,
Química e Biologia, extraímos dados do site de 33 IFs que compõem a rede federal de
educação profissional e tecnológica e de documentos oficiais publicados pelo MEC/INEP.
Em junho de 2009, no portal da Secretaria de Educação Tecnológica – SETEC – do
MEC, contabilizamos 38 IFs. Todavia, apenas 33 deles disponibilizaram informações sobre a
oferta de cursos. Os demais indicam que o site está em construção. Os 33 IFs que foram
campo do nosso estudo ofertavam juntos, em junho de 2009, 43 cursos de licenciatura nas
áreas de ciências naturais (Química, Física, Biologia e Ciências da natureza). A tabela 1
apresenta o quadro de oferta dos referidos cursos, por região.
2
De
acordo
com
informações
apresentadas
no
site
do
MEC.
Disponível
em
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=13583. Acesso em 17 de junho de
2009.
10177
Tabela 1- Cursos de Licenciaturas da área das Ciências da natureza, ofertados pelos Ifs, por regiões
Total Total
de
de
Regiões
IFs cursos % Química % Biologia % Física %
4
Norte
5
12
2
12
2
29
1
6
11
Nordeste
18
42
7
41
3
43
8
44
6
Sul
7
16
3
18
1
14
3
17
9
Sudeste
10
23
4
24
1
14
4
22
3
Centro-Oeste
3
7
1
6
0
2
11
33
43
100
17
100
7
100
18
100
Total
Ciências da
Natureza
1
1
%
100
100
Verificamos que a maior parte dos Institutos Federais está situada nas regiões
Nordeste e Sudeste, que juntas concentram 65% dos cursos oferecidos. Consideramos que a
maior concentração de cursos no Nordeste (42%) está relacionada com as deficiências
observadas nessa região em termos de formação de professores. De acordo com o Estudo
exploratório sobre o professor brasileiro (Brasil, 2009), a citada região é a que apresenta
maior número de professores da educação básica com escolaridade de nível fundamental (de
acordo com o gráfico 1).
Gráfico 1. Professores da educação básica com escolaridade de nível fundamental, por localização,
segundo a Região- Brasil- 2007
1002; 6%
2362; 15%
2058; 13%
Norte
Nordeste
Sudeste
2126; 13%
Sul
Centro-Oeste
8434; 53%
Na região Nordeste, o estado do Rio Grande do Norte é o que oferece a maior
quantidade de cursos nas áreas de ciências naturais, representando um total de 19%, de acordo
com dados apresentados na tabela 2.
10178
Tabela 2 - Cursos de licenciatura da área das ciências da natureza, ofertados pelos IFS, por
unidades da federação.
Estados
Amazonas
Ceará
Espírito Santo
Goiás
Maranhão
Minas Gerais
Mato Grosso
Pará
Paraíba
Pernambuco
Paraná
Rio de Janeiro
Rio Grande do Norte
Rio Grande do Sul
Santa Catarina
São Paulo
Piauí
Total
nº de cursos
2
1
1
2
3
1
1
3
1
2
3
5
8
2
2
3
3
43
%
5
2
2
5
7
2
2
7
2
5
7
12
19
5
5
7
7
100
De acordo com informações disponíveis no site dos IFs pesquisados estas instituições
passaram a oferecer cursos de licenciatura em diversas áreas (Educação Física, Matemática,
Biologia, Física, Química, Geografia e Espanhol para a educação básica) e cursos de Informática,
Construção Civil, Eletricidade, Mecânica para a educação tecnológica. Observa-se que há
predomínio de cursos destinados à formação de professores de Física, Química, Biologia e
Matemática. Considerando os propósitos deste texto destacamos também o curso de Ciências
da Natureza, embora os dados indiquem a existência de apenas um curso. Este visa à
formação generalista de professores, na referida área.
Tabela 3: Licenciaturas ofertadas pelos Institutos Federais de Educação, Ciência e
Tecnologia, na área das ciências naturais, por disciplina.
Cursos
Química
Biologia
Física
Ciências da Natureza
Total
17
7
18
1
%
40
16
42
2
10179
Total
43
100
A centralidade nos cursos de Física e de Química pode ser explicada pela expressiva
carência de professores dessas disciplinas, conforme indica o relatório da escassez de
professores do Ensino Médio publicado pelo MEC/INEP (RUIZ, RAMOS e HINGEL, 2007;
BRASIL, 2009). Tal carência foi revelada também no “Estudo exploratório sobre o professor
brasileiro” que apresenta um quadro atual sobre a formação de professores que estão em
exercício na rede pública, em todo país. O gráfico apresentado a seguir sintetiza os dados
sobre a formação de professores que atuam no ensino médio, nas disciplinas de Física,
Biologia e Química.
Gráfico 2. Percentual de professores do Ensino Médio, segundo a disciplina que lecionam e a área de
formação na graduação -Brasil -2007
%
60
54,6
55,9
50
38,9
38,2
40
Mesmo curso
Área específica
30
Pedagogia
25,2
Outras áreas
21,4
20
10
17,4
16,3
14,2
5,9
6,4
5,5
0
Física
Biologia
Química
Os dados apresentados neste gráfico indicam que, no Brasil, no Ensino Médio, as
disciplinas Física, Biologia e Química, são ministradas por professores de diversas áreas de
formação. Isso ocorre também em outras disciplinas conforme indica o referido estudo
(BRASIL, 2009). Quando se trata da área das Ciências da Natureza, os maiores problemas
ocorrem nas disciplinas Física e Química. No primeiro caso (Física) há predominância de
professores de outras áreas (54,6%) que juntos com os pedagogos (5,9%) somam 60,5%.
Contraditoriamente, os professores com formação em Física representam apenas 25,2%, ou
seja, um quarto do total de professores que ministram a referida disciplina. O problema ocorre
em menor proporção na disciplina de Química e de Biologia. Nesta a situação é menos grave,
10180
visto que os professores graduados na disciplina representam mais da metade (55,9%) do
total.
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
O quadro apresentado nos estudos que tratam da formação de professores, na educação
básica, em nosso país, revela um panorama crítico que prevê inclusive, a possibilidade de
ocorrência de um “apagão” no Ensino Médio, caso não sejam tomadas medidas emergenciais
(RUIZ, RAMOS e HINGUEL, 2007, p.12). Os reflexos da carência de professores em
quantidade e qualidade da formação podem ser identificados nos baixos resultados do Brasil
no PISA.
A carência de professores formados na área em que atuam, sobretudo, nas disciplinas
Física, Química, Biologia e Matemática, explica a iniciativa do governo federal de
transformação das escolas agrotécnicas, técnicas e CEFETs em Institutos Federais de
Educação Ciência e Tecnologia. Vale destacar que tais instituições continuarão a ofertar
diversos cursos da Educação Básica (técnicos de nível médio para alunos em idade regular;
técnico de nível médio voltado para jovens e adultos), além de cursos de nível superior
(tecnológicos, graduação e pós-graduação). Com criação de cursos de licenciatura nos IFs o
governo federal almeja formular alternativas para enfrentamento do problema da escassez de
professores no Brasil, em especial no que se refere à área das ciências da natureza (Física,
Química e Biologia).
Não podemos deixar de considerar a premência de ações que representam iniciativas
para a solução do problema da escassez de professores. Todavia, é preciso reconhecer que o
desafio que se impõe para essa nova institucionalidade – os IFs – pode gerar uma crise de
identidade de tais instituições, uma vez que elas devem formular projetos educativos para
atender alunos de diversas faixas etárias e níveis de ensino. Ademais, o histórico das
instituições que compõem a rede federal de educação tecnológica revela que o legado de
experiências que elas dispõem está diretamente relacionado à formação de profissionais para
áreas técnicas. As experiências na formação de professores são recentes e restritas a algumas
instituições. Esse quadro tem implicações no trabalho docente e pode comprometer a
qualidade do ensino.
10181
REFERÊNCIAS
BRASIL, MEC/SETEC. Expansão da Rede Federal. Disponível em
http://portal.mec.gov.br/setec/index.php?option=content&task=view&id=91&Itemid=2
acesso em: 13 de maio de 2009.
BRASIL, MEC/INEP. Estudo exploratório sobre o professor brasileiro.
http://www.inep.gov.br/basica/censo/Escolar/Sinopse/sinopse.asp. Acesso em: 13 de junho de
2009
BRASIL, MEC/INEP. Resultados da aplicação do PISA 2006. Disponível em
http://www.inep.gov.br/download/internacional/pisa/aplicacao_pisa2006.pdf. Acesso em: 05
de maio de 2009.
BRASIL, Decreto 3.462 de 17/05/2000. Dá nova redação ao art. 8º do Decreto 2.406, de 27
de novembro de 1997, que regulamenta a Lei nº 8.948, de 8 de dezembro de 1994. Brasília,
2000.
Disponível
em
http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf_legislacao/rede/legisla_rede_parecer142004.pdf.
Acesso em: 08 de março de 2009.
BRASIL, MEC/SETEC. Projeto de lei 3775/2008. Institui a Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e tecnológica e cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e
Tecnologia
e
dá
outras
providências.
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