A ARTICULAÇÃO ENTRE AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL E AVALIAÇÃO
DO ENSINO – APRENDIZAGEM: LIMITES E PERSPECTIVAS
Marijane Zanotto1
1 – Introdução
Diferentes perspectivas de avaliação agregam significados e intenções
historicamente constituídas. Sob o prisma da educação, estas perspectivas ofereceram
alternativas diversas, com resultados diferentes. A avaliação ora visou atender mais
rigorosamente à finalidade de controle, ora adensou possibilidades para a emancipação
das pessoas e instituições avaliadas, porém, sempre esteve carregada de conotações
ideológicas.
Tecer considerações diante de um tema amplo, complexo e em permanente
transformação como a avaliação institucional é, no mínimo, um risco e um desafio.
Risco, por apresentar diagnósticos e análises que, inevitavelmente, pela abrangência da
temática, não possam suscitar a devida compreensão na interação dos seus elementos e
significados constitutivos. Desafio, porque a avaliação institucional ainda não está
constituída na prática pedagógica das instituições escolares e muito menos a
compreensão de sua articulação com o ensino-aprendizagem, o que precisa ser
incessantemente construído e implementado com a intencionalidade de consolidar uma
política de avaliação institucional que seja um instrumento de qualificação
emancipatória das instituições educacionais públicas.
A Avaliação Institucional surge de forma mais significativa no cenário
brasileiro, com a implementação do Programa de Avaliação Institucional das
Universidades Brasileiras – PAIUB, em 1993. Entretanto, atualmente a avaliação está
presente tanto na educação superior, como na educação básica, como processos de
1
Pedagoga e Geógrafa; Especialista em Supervisão Escolar; Mestre em Educação; Docente e Assessora
da Avaliação Institucional da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. Pesquisadora
nos Grupos de Pesquisa: História, Sociedade e Educação no Brasil – GT da Região Oeste do Paraná HISTEDOPR Campus de Cascavel e do Grupo de Pesquisa em Educação e Formação de Professores –
GPEFOR do Campus de Cascavel. Email: [email protected].
iniciativa interna, ou como processos provindos de iniciativa governamental (nas esferas
municipais, estaduais ou federais).
Nesse sentido, mesmo que se convalide como percurso legitimado pela política
educacional, o que foi realizado em termos de Avaliação Institucional, não obscurece a
necessidade de consolidação de uma política permanente e de uma cultura avaliativa
que possibilite uma prática autônoma, como instrumento capaz, tanto de dar significado
aos avanços construídos, quanto revelar fragilidades, de modo que se possa superá-las e
contribuir na melhoria da educação pública.
De tudo o que se viu implementar, pouco se constatou de processos avaliativos
que conseguiram articular avaliação institucional com avaliação do ensinoaprendizagem. Porém, entende-se ser imprescindível realizar essa articulação, visto que
existe uma relação direta entre tais elementos, enquanto processo, que acaba por
constituir um conjunto de resultados finais. Assim, empreende-se esforços em
apresentar este artigo, como uma proposição para ampliar a discussão a ser efetivada e
legitimada pelos que acreditam na capacidade de avançar como educação pública,
gratuita e de qualidade.
2 - Fundamentos Teóricos e Concepção de Avaliação Institucional
Há mais de 2 mil anos a China já fazia exames de seleção para os serviços
públicos e a Grécia praticava a docimasia (verificação de aptidões morais) para as
funções públicas. Essas práticas, com finalidade avaliativa, confirmam a utilização da
avaliação como instrumento balizador na tomada de decisões.
Nos tempos modernos, a indústria usa a avaliação como um mecanismo que
afere dados em benefício da racionalização da gestão. Na educação, a avaliação vem
reafirmando a tradição de regulação, seleção e hierarquização que parecia estar
localizada apenas na sala de aula. No entanto, a avaliação ampliou seu campo de
atuação para além da sala de aula, chegando ao cenário nacional e transnacional. Nesse
contexto de intensificação do uso da avaliação, esta se torna cada vez mais complexa à
medida que considera insuficientes os procedimentos meramente descritivos e reclama a
consideração de aspectos humanos, psicossociais, culturais e políticos, onde não há
consensos prévios e os entendimentos precisam ser construídos. Isso remete à reflexão
sobre os fundamentos teóricos e a concepção que nortearão todos os processos de
implementação da avaliação de modo geral.
O campo da avaliação, ao crescer em complexidade e se inserir no âmbito
político e social, incorporou as contradições epistemológicas, resultantes de distintas
concepções de mundos.
Nesta contradição, insere-se a avaliação como controle
(racionalista, quantitativa, técnico-burocrática, retroativa) e a avaliação educativa ou
emancipatória (qualitativa, participativa, proativa). Nesse sentido, a avaliação é definida
conforme as necessidades circunstanciais e de quem a desenvolve (SOBRINHO, 2003).
A avaliação, conforme apontada anteriormente, inicialmente voltada quase que
exclusivamente para a aprendizagem, dedicada à verificação de rendimentos
individuais, passou pouco a pouco a se preocupar com os currículos e com os programas
em função dos objetivos, incorporando a categoria de julgamento de valores e se
abrindo à negociação e à participação, tornando-se mais democrática. Mesmo assim,
com todos os avanços obtidos, pode-se considerar que a avaliação jamais perdeu sua
dimensão técnica e positivista. Hoje se constitui em uma opção de investimento, um
mercado solidamente profissionalizado, com probabilidade lucrativa. Isso pode ser
exemplificado com o caso das provas do Exame Nacional de Desempenho dos
Estudantes - ENADE (2009), entre outras que formam os programas de avaliação, que
foram elaboradas por uma empresa de capital privado, a serviço do governo federal.
Assim, a avaliação torna-se um campo cheio de contradições. Assume as
marcas dos contextos em que se desenvolve, onde mais pessoas envolvem-se com ela,
seja pela obrigatoriedade da lei, intenções mercadológicas, questões políticas, interesse
de pesquisa, entre outras razões.
Nesse sentido o desafio consiste em conferir caráter de unitariedade à avaliação
institucional2, bem como na avaliação do ensino-aprendizagem, sem esquecer que, na
educação, ela sempre será limitada, não só pelo caráter capitalista, mas em decorrência
dele, pela formação como espaço separado da prática. É preciso lembrar que a práxis
pedagógica, em seu movimento, é totalidade concreta, onde partes e todo relacionam-se
dialeticamente. Contudo, essa práxis é fragmentária, por se dar à luz das demandas do
disciplinamento capitalista. E essa fragmentação não se supera no campo da formação,
senão no campo da luta de classes, o que vai depender da clareza de concepção e do
2
Compreende-se avaliação institucional como um processo que busca a “promoção da tomada de
consciência sobre a instituição. [...] A autoconsciência institucional constitui um importante subsídio para
o processo de decisão, tanto em nível individual quanto em nível coletivo, da instituição como um todo,
com vistas ao seu aperfeiçoamento, e tem como ponto de fundamental importância a intensa participação
de seus membros tanto na forma de encaminhar a avaliação na identificação de critérios e procedimentos,
como na utilização dos resultados” (Isaura Belloni, et al., 1995 – Avaliação Institucional da Universidade
de Brasília).
compromisso político da universidade e sociedade neste processo de enfrentamento
(KUENZER, 2002).
Segundo SAVIANI apud ORSO (2007), o desafio posto pela sociedade de
classes do tipo capitalista à educação pública só poderá ser enfrentado em sentido
próprio, isto é, radicalmente, com a superação dessa forma de sociedade. Inerente a este
desafio é preciso superar a ausência de um sistema nacional de educação e os processos
de descontinuidade presentes no trabalho educativo em todos os níveis e modalidades
educacionais.
Assim, embora seja uma ação limitada no contexto capitalista, deve-se, pois,
concentrar esforços em ampliar o processo de conquista dos conhecimentos
sistematizados pelos trabalhadores. Para isso, a escola pública é considerada um espaço
fundamental na apropriação da ciência, podendo ser um dos elementos mobilizadores na
construção de uma sociedade sem classes.
Com essa compreensão de sociedade, de educação e de avaliação é que serão
desencadeadas as demais reflexões, buscando, nos limites da sociedade capitalista,
reconhecer as perspectivas acerca da avaliação.
3 - A Avaliação Frente ao Modelo Neoliberal de Educação
Em tempos de neoliberalismo, em que se prima demasiadamente pela inserção
dos indivíduos e instituições no rol da produção do capital, a avaliação pode ser a mola
que impulsiona a adaptação a esse avassalador modelo.
A implementação dos processos avaliativos é rápida e requer mudanças no
cotidiano das instituições de educação. Faz muitos dos bem intencionados perderem a
dimensão conceptora da proposta e simplesmente a negarem. Outros, sem muitos
questionamentos, assumem a causa da avaliação e dão a ela um caráter sistemático,
controlador, com perspectiva mercadológica. Entre estes estão os poucos que
vislumbram e buscam dar à avaliação a função social de promover a melhoria das
instituições, com a finalidade de emancipar indivíduos e sociedade.
Instala-se assim, um cenário de grandes preocupações, como a inexistência de
um sistema educacional consolidado em nenhum de seus níveis, sem instituições firmes,
ou seja, não autônomas e não abastecidas de recursos materiais e humanos suficientes
para o desenvolvimento de sua função. Este panorama é fruto das históricas carências de
políticas educacionais, aliadas às novas tendências internacionais e locais.
Mas, o que se pretende avaliar na educação brasileira? A primeira e inevitável
constatação da avaliação pode ser o próprio fracasso das instituições? Mas, para quê?
Para fornecer dados ao Estado controlador? O que o Estado fará? Ranking e punição? A
privatização será o caminho? Ou o Estado dará suporte e subsídios às que não atingirem
bons resultados na avaliação? Quais são, afinal, os parâmetros – metas a serem
atingidos? É possível articular a avaliação institucional à avaliação do ensinoaprendizagem? Quais são os limites e perspectivas da avaliação? Diante do que se viu
implementar em termos de avaliação institucional e de avaliação do ensinoaprendizagem, na educação nacional, pode-se depreender que há muito a percorrer para
atingir a emancipação social por meio da avaliação, até porque esta, isoladamente, não
tem esse poder.
A compreensão de que a avaliação, nos moldes neoliberais em que foi
implantada e implementada até o presente momento, serviu como instrumento
ideológico de controle, pode-se mensurar o repúdio, a pouca credibilidade e o nível de
envolvimento da comunidade que constitui as instituições educacionais, frente aos
processos avaliativos.
O retrato sem retoques da educação parece sugerir a expressão de um futuro não
promissor para o povo brasileiro. As medidas avançam na perspectiva de que as novas
faces da educação no Brasil não parecem garantir um avanço significativo da educação
pública e da inclusão social. Ao contrário, tenderiam a aprofundar a apartação social
entre a minoria incluída e a maioria dos cada vez mais excluídos da sociedade, da
informação ou do conhecimento (SILVA Jr. e SGUISSARDI, 2001).
Confirma-se, até o presente momento, o descaso do governo com as instituições
públicas. Um exemplo é o crescente incentivo do Estado à ampliação do número de
instituições de educação superior privadas, em detrimento das públicas que, cada vez
mais, recebem menos recursos financeiros para suprirem suas necessidades e inclusive
obter melhores colocações nos rankings da avaliação. Assim, as instituições públicas
são obrigadas a violarem suas identidades, transferindo suas potencialidades para a
lógica das empresas, disputando espaço num campo minado de intensa e perversa
competitividade e mudanças.
A avaliação institucional “cai como uma luva” nessa situação. O Estado vem se
apropriando desse mecanismo com muita habilidade. Já indicada pela Reforma
Universitária de 1968, os indícios de sua efetivação deram-se durante a década de 1980.
Houve nesse período dois programas de avaliação no Brasil: O Programa de Avaliação
da Reforma Universitária – PARU e o Grupo de Estudos da Reforma da Educação
Superior – GERES. Ambos tiveram curta vigência, pois não lograram consensos
necessários para se fortalecerem.
Na década de 1990, conhecida como “a década da avaliação”, as experiências
avaliativas ganharam consistência e alcance nacional com o Programa de Avaliação
Institucional das Universidades Brasileiras – PAIUB, em 1993. Com ele tem-se a
proposta do Exame Nacional de Cursos – ENC, o “Provão” (1995-1996),
complementado pela Análise das Condições de Oferta – ACE. No ano de 2003, o
PAIUB foi substituído pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior –
SINAES.
Com esses eventos, a avaliação ganha corpo nas instituições e se fortalece em
virtude da adesão do governo brasileiro ao neoliberalismo. A avaliação recebeu plena
legalidade no texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDBEN n°
9394/96, e nos documentos que se seguiram para tornar pública e prática a sua
implementação em todos os níveis e modalidades da educação.
No contexto atual, a avaliação consolida-se em todas as instâncias, podendo ser
exemplificada pelas seguintes ações: na Educação Superior, o Exame Nacional de
Desempenho de Estudantes - ENADE, que integra o Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Superior - SINAES e, na Educação Básica, o Exame Nacional para o Ensino
Médio – ENEM e o Exame Nacional de Certificação de Competências de Jovens e
Adultos – ENCCEJA. Em virtude dessas ações, observa-se Secretarias Municipais de
Educação, dedicadas em desenvolver e aplicar instrumentos avaliativos desde os anos
iniciais do ensino fundamental.
No entanto, em se tratando da Educação Básica, o que se pode diagnosticar é
que na avaliação do rendimento escolar, pelos mecanismos externos à escola, o Sistema
de Avaliação da Educação Básica - SAEB e a Provinha Brasil3, os resultados aferidos
estão servindo, inicialmente, muito mais para classificar e fazer comparações entre
escolas, do que para agregar esforços e trabalhar as fragilidades do sistema que também
são responsáveis pelos índices. Assim, pela avaliação, acaba por se efetivar o que
ressalva LIBÂNEO (2004):
3
A Provinha Brasil foi criada em 2008 pelo governo federal para diagnosticar o nível de alfabetização dos
alunos de 2ª. série do ensino fundamental. A prova é aplicada em dois momentos: no início do ano, para
medir o grau de letramento dos alunos, e outra no final do ano, para medir o grau de evolução obtido no
ano letivo (BRASIL, 2009).
Os rumos que as práticas avaliativas vêm tomando no âmbito do
sistema de ensino brasileiro, ao contrário da posição formulada
anteriormente, encaminha-se para a subordinação do trabalho dos
professores e, portanto, da avaliação do sistema. Nesse caso, não são
os objetivos do ensino que irão determinar as formas de avaliação,
mas a avaliação é que acabará por determinar os objetivos, ou seja,
dependendo das finalidades postas pelos governos em relação à
avaliação do sistema de ensino, ter - se - à uma escola funcional a
serviço dos interesses de agências externas à escola (LIBÂNEO, 2004,
P.240).
As escolas, aplicadas em atingir resultados satisfatórios nos índices,
desconsideram seus projetos político - pedagógicos, voltando suas práticas pedagógicas
às demandas emanadas das avaliações externas. Em contato com diversas escolas, podese contatar que muitas estão centradas em conteúdos de Língua Portuguesa e
Matemática com tempo ampliado, reduzindo conteúdos das demais áreas do
conhecimento, pois precisam “preparar as crianças para a Provinha Brasil”. Vários
elementos poderiam ser questionados nessa decisão pedagógica pela complexidade e
gravidade nela contida, porém, de imediato, fica clara a compreensão e a prática de um
conteúdo ensinado de forma fragmentada, como se a Geografia, a História, entre outras
disciplinas, não pudessem trabalhar Língua Portuguesa e Matemática ou fossem menos
importantes.
Na LDBEN n° 9394/96, seu art. 12 institui que “os estabelecimentos de ensino,
respeitadas as suas normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência
de: I elaborar e executar a sua proposta pedagógica”. Nesse sentido, a lei permite às
instituições de ensino deliberarem sobre questões relativas à avaliação, tanto
institucional, como do ensino - aprendizagem, conforme seus projetos político pedagógicos, o que parece uma conquista. Porém, na verdade isso acaba sendo um
engodo, visto que as escolas estão mais inclinadas a atender às demandas dos processos
avaliativos externos. Esse fato engessa ainda mais as possibilidades de avanços
qualitativos, com base em seus projetos político - pedagógicos, e da educação de forma
mais ampla. Vale considerar, que melhorias nos índices quantitativos, nem sempre
revelam melhorias qualitativas.
Assim, tem-se elementos para compreender que a avaliação veio para ficar.
Podem ser reestruturados os programas e estratégias, mas, na essência, o controle do
Estado sobre a educação, permanece intacto e cada vez mais consolidado.
No contexto exposto, não se trata de condenar ou negar a avaliação. Pelo
contrário, a intenção é desafiar o modo pelo qual ela se apresenta, defendendo a
transferência da submissão ao controle para a promoção da emancipação que esta pode
desencadear.
Para além do exame de aspectos isolados, a avaliação deve suscitar questões e
reflexões filosóficas, éticas e políticas, a respeito dos fins da instituição, de como estão
eles sendo realizados e quais seriam os empreendimentos adequados para o melhor
cumprimento da responsabilidade institucional e social. (SOBRINHO, 2003).
Nessa direção, sem dúvida é importante coletar informações, elaborar
questionários, aplicá-los, analisá-los e fazer relatórios sobre as instituições avaliadas.
No entanto, mais importante que esse trabalho é definir o que se pretende fazer com os
relatórios; é saber de que modo a avaliação institucional pode ser um real instrumento
de qualificação da educação.
Percebe-se que, em última instância, o foco da avaliação na educação vem
experimentando algumas mudanças consideráveis na definição dos destinos sociais.
Essas transformações são reflexos da forte ingerência governamental sobre a educação
e, então, a avaliação é chamada para aferir os resultados das políticas no campo
educacional. No entanto, nem sempre os resultados da avaliação são decisivos para
estabelecer as novas políticas governamentais, tendo em vista que são as políticas
governamentais que organizam as avaliações, e não o inverso.
Apesar de toda a gama ideológica que a avaliação recebe, no contexto de
medidas rigorosamente neoliberais, deseja-se afirmá-la como necessária, é claro que
com uma conotação e fins contrários aos que vêm sendo empreendidos. Se proposta
coletivamente e articulada, à avaliação do ensino-aprendizagem a avaliação institucional
ainda podem ser um dos caminhos motivadores para a manifestação da oposição ao
controle e da busca desafiante pela emancipação da educação e da sociedade brasileira.
4 - A Articulação Possível entre Avaliação Institucional e Avaliação do EnsinoAprendizagem
Se considerado o contexto histórico em que a avaliação vem se constituindo,
parece trabalho inócuo buscar articular avaliação institucional à avaliação do ensinoaprendizagem na prática pedagógica, porém, algo necessário para ampliar as
possibilidades de avanços na qualidade da educação pública.
A avaliação institucional em todos os seus princípios norteadores, antes de
qualquer premissa, precisa ter clara a sua função, e, mesmo diante de seus limites, deve
primar pela sua perspectiva maior, a melhoria da qualidade do processo ensinoaprendizagem.
Desse modo, inicialmente é importante diferenciar conceitualmente avaliação
institucional da avaliação do ensino-aprendizagem para melhor compreender sua
articulação. Assim, toma-se por base LIBÂNEO ( 2004), quando define avaliação
institucional como,
[...] uma função primordial do sistema de organização e gestão dos
sistemas escolares e das escolas. Essa avaliação também chamada
de administrativa, visa à obtenção de dados quantitativos e
qualitativos sobre os alunos, os professores, a estrutura
organizacional, os recursos físicos e materiais, as práticas de gestão
[...] com o objetivo de emitir juízos valorativos e tomar decisões em
relação ao desenvolvimento da instituição (LIBÂNEO 2004, P.239).
Convalidando a avaliação institucional por essas premissas, entende-se que a
mesma precisa ser analisada, compreendida em seus nuances e pressupostos, para que
contemple, em seus processos diagnósticos os resultados da avaliação do ensinoaprendizagem, visto que é pela melhoria deste processo que se realiza a avaliação
institucional.
Nesse foco, ressalta-se o que LIBÂNEO (2004) conceitua:
A avaliação da aprendizagem escolar feita pelos professores deverá
estar a serviço das funções sociais da escola, dos objetivos de
ensino, do projeto pedagógico da escola, do currículo, das
metodologias. Além disso ela se assenta no respeito ao direito de
todos os alunos em usufruírem de um ensino de qualidade
(LIBÂNEO 2004, P.240).
Seguindo na direção apontada pelo autor, deseja-se acrescentar que a avaliação
da aprendizagem escolar, realizada pelos professores, também revela o ensino por eles
desenvolvido. Portanto, a avaliação do ensino e da aprendizagem são indissociáveis.
Ambos são processos significativos para a avaliação institucional, visto que o “sucesso
ou fracasso” da avaliação do ensino-aprendizagem pode ter sido influenciado pelas
características gerais da instituição, assim como o mesmo “sucesso ou fracasso”, que
pode ser aferido à instituição, revela o que nela se desenvolve em termos de ensino-
aprendizagem. Depreende-se então que o ensinar e o apreender são indivisíveis, bem
como o ato de avaliá-los.
{
No entanto, é preciso reconhecer que este processo articulado de desenvolver a
avaliação é o que se destaca como necessário ou como possibilidade, porém nem
sempre possível na prática pedagógica, considerando os vários elementos presentes no
contexto escolar. Como exemplo, a velha questão da fragmentação do trabalho na
organização e gestão escolar, bem como da produção fragmentada do conhecimento,
ambos aspectos oriundos da lógica capitalista de organização da sociedade. Esses são
alguns dos limites presentes na viabilização da avaliação como instrumento
qualificador da educação que precisam ser superados. Obviamente, se esses aspectos
têm como origem a sociedade capitalista, somente serão efetivamente superados com a
superação desta mesma sociedade. Aí se coloca o principal limite, mas também o
constante desafio. Evidencia-se esse aspecto como desafio por compreender o
movimento permanente da História, o que, conforme NAGEL (1985), revela as
diferentes formas em que se encaminhou a avaliação na educação:
Na Sociedade Contemporânea as avaliações já passaram pela
valorização do saber enciclopédico, pela valorização do saber
experimental (métodos de resolver problemas) pela valorização do
saber gerencial, administrativo, didático e até adentram em
determinado momento, na apologia do “não saber”, mas do
“participar”. Reafirma-se, pois, que pela avaliação que é realizada
nas escolas se reconhece qual a sociedade desejada pelos
professores e se conhece quem é o educador que educa (NAGEL,
1985, P. 23 ).
Mais do que uma prática pedagógica, muitas vezes compreendida como uma
mera opção metodológica, a avaliação, seja ela institucional ou do ensinoaprendizagem, significa um projeto de homem e de sociedade que se tem e que se quer
construir, portanto, um projeto social.
e
Vale considerar a importância de ter clareza sobre o que é primordial no ato de
avaliar, ou seja, o que se quer avaliar. De imediato, a resposta quase lógica ao
questionamento é que quando se trata de avaliar um aluno ou uma escola, é preciso
avaliar o conteúdo que esta escola ensinou e que este aluno aprendeu. Se a escola tem
uma função social, assume uma prática coletiva que revela também um projeto social.
Assim, antes de definir que conteúdo avalia - se, obviamente se define que conteúdo
ensina - se e para qual projeto social tal conteúdo servirá.
Certamente em uma
avaliação institucional seria relevante diagnosticar outros aspectos que influenciam o
ato de ensinar e aprender, entre eles: as condições da estrutura física da instituição, os
recursos didático-pedagógicos, a formação e a prática dos profissionais que nela
atuam, bem como o tipo de gestão que se realiza.
5 – Considerações Finais
Para agregar esforços no sentido da implementação de processos avaliativos
mais conscientes e significativos, vale considerar que os mesmos precisam ser
amplamente discutidos com os envolvidos no contexto escolar, e que as decisões
tornem - se projetos coletivos e sejam legitimados nos projetos político-pedagógicos
da escola. Com esse caráter a avaliação pode sair da condição de avaliação para o
controle, para uma possível avaliação educativa ou emancipatória. De forma muito
elucidadora Nagel (1985) alerta:
A história está sendo feita, agora, sob as coordenadas de diferentes
correntes. Cabe encaminhar, direcionar, elucidar suas dúvidas,
iniciando com garra a execução de suas intencionalidades que terão
maior ou menor sucesso, à medida que os professores se utilizarem
do conhecimento, da ciência. Não cabe a decretos, resoluções ou
normas delinearem propósitos de estudos; é aos professores que
cabe esta tarefa. A sociedade não se faz por leis. Faz-se com
homens e com ciência. A sociedade nova cria-se por
intencionalidade e não pelo somatório de improvisos individuais
(Nagel, 1985, p. 30).
Diante do exposto, fica então evidente que projetos individuais de avaliação,
tanto institucional como do ensino - aprendizagem, têm vida curta, dimensões isoladas
e simplificadas, portanto, não atendem à perspectiva de qualificar processos
educacionais. O grande empreendimento extrapola os muros e bancos escolares para se
colar a um projeto maior de homem e sociedade. Logo, enquanto não houver a
apropriação da condição de pensar, de dentro para fora da escola o que se objetiva para
a educação, o que vem de fora conduzirá os rumos da educação e consequentemente do
homem e da sociedade, reforçando assim, as bases da sociedade capitalista.
Referências
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_______ LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Aprovada pela lei
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KUENZER, Acácia Zeneida. O trabalho pedagógico: da fragmentação à unitariedade
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LIBÂNEO, José Carlos. Organização e gestão da escola: teoria e prática. 5. ed.
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ORSO, Paulino José. ( Org.). Educação, sociedade de classes e reformas
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SGUISSARDI, Valdemar. ; SILVA JR, João Reis. Educação Superior: Perspectivas
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SOBRINHO, José. Dias. Avaliação: políticas educacionais e reformas de educação
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