UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA
UEFS-BRASIL
CENTRO DE REFERENCIA LATINOAMERICANO PARA LA EDUCACIÓN ESPECIAL
CELAEE-CUBA
JACIETE BARBOSA DOS SANTOS
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS ESTUDANTES DE PEDAGOGIA
SOBRE “ALUNOS COM DEFICIÊNCIA”
Feira de Santana – Bahia
2002
Biblioteca Central da UNEB
371.9
S237
Santos, Jaciete Barbosa dos
Representações sociais dos estudantes de pedagogia sobre “alunos
com deficiência”/ Jaciete Barbosa dos Santos. – Salvador: J. B. dos
Santos, 2002.
111 p.
Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Feira de
Santana,
Centro de Referencia Latinoamericano para la Educación Especial
Orientadores: Christine Jacquet, Oilda Orozco Hechavarría
1.Ensino superior 2. Educação especial 3. Estigma(Psicologia
social)
4. Educação Especial - Formação de professores 5. Analise de
interação
em educação
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA
UEFS – BRASIL
CENTRO DE REFERENCIA LATINOAMERICANO PARA LA EDUCACIÓN
ESPECIAL
CELAEE – CUBA
JACIETE BARBOSA DOS SANTOS
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS ESTUDANTES DE PEDAGOGIA
SOBRE “ALUNOS COM DEFICIÊNCIA”
Dissertação de Mestrado apresentada ao
CELAEE como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em Educação
Especial.
Orientadores:
Profª Dra. Christine Jacquet
Profª Dra. Oilda Orozco Hechavarría
Feira de Santana – Bahia
2002
JACIETE BARBOSA DOS SANTOS
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS ESTUDANTES DE PEDAGOGIA
SOBRE “ALUNOS COM DEFICIÊNCIA”
Local e data de defesa: Feira de Santana, 08 de agosto de 2002
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________
Presidente
Prof. Dra. Carmen Alvaréz Cruz
CELAEE – Cuba
__________________________________________
Membro
Prof. Dra. Rosa Maria Carvalho Castellano Pérez
CELAEE – Cuba
__________________________________________
Membro
Prof. Dra. Rosa Elisa Mirra Barrone
UEFS – Brasil
AGRADECIMENTOS
A Deus, criador da vida!
Aos meus pais, Lau e Jana, que me deram a vida!
Aos meus irmãos, Gene, Jarbas e Ladi, que comungaram comigo da mesma fonte de
vida.
A Sílvio, que escolhi para partilhar minha vida.
A Sônia, pela espiritualidade.
A Dadá, pelo apoio doméstico imprescindível.
A Mêre, pela cumplicidade.
À Prof. Irani, pela dedicação.
À Prof. Christine, pela competência.
À Prof. Oilda, pela responsabilidade.
A Fátima, pela disponibilidade.
Aos professores cubanos, pela determinação.
Aos professores da FES, pela credibilidade.
Aos estudantes da FES, especialmente Mig, Manu e Mid, pela solidariedade.
Às colegas do estudo, Mêre, Virgínia, Cláudia e Desirée, pelas trocas.
Às colegas companheiras de viagem: Cátia, Mawis, Helena e Paty, pela forca.
Às estudantes de Pedagogia da UFBA, da UCSAL e da UNEB, pela confiança.
Aos meus amigos e, também, professores, Malena, André, Regina, Jailson, Lu, Roberto,
Ana, Jocélio, Miron, pela amizade.
Há momentos na vida onde a questão de saber se podemos
pensar de outro modo que não pensamos e perceber de outro
modo que não vemos é indispensável para continuar olhar e
refletir.
Michel Foucault
RESUMO
A presente dissertação analisa as representações sociais sobre “alunos com
deficiência”, produzidas por estudantes de Pedagogia de três universidades
baianas. Os fundamentos deste estudo encontram-se na teoria da Representação
Social e em postulados da teoria Sócio-Histórico-Cultural. A pesquisa de campo
foi realizada através de entrevistas semi-estruturadas com estudantes do último
semestre do curso de Pedagogia. A análise de dados demonstrou que as
representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre “alunos com
deficiência” orientam e/ou podem orientar atitudes com relação à inclusão desses
alunos. Com efeito, a implementação da proposta de Educação Inclusiva no Brasil
depende das atitudes dos futuros docentes e não apenas de exigências impostas
pelas políticas públicas de educação. A pesquisa aponta a necessidade de se
investir na formação inicial docente, no sentido de disponibilizar informações e
propor uma formação universitária de qualidade, baseada em ensino, pesquisa e
extensão. Enfim, considera-se que a formação docente deve abarcar não só
habilidades e conhecimentos técnicos, mas, também, os conteúdos internos dos
futuros profissionais, oriundos de seu próprio universo psicossocial, no qual
encontram-se as representações sociais.
PALAVRAS-CHAVE:
inclusão, exclusão, deficiência, curso de Pedagogia,
diversidade, representações sociais, Educação Inclusiva, formação docente.
ABSTRACT
This present thesis analyses the social representations on “studentes with
deficiency” produced by Pedagogy students of three Universities in Bahia. The
bases of this study are found in the theory of Social Representation and in
postulates of Sociocultural and Historical theory. The field research was made
through semi-structured interviews with last-semester Pedagogy couser students.
The data analysis showed that social representations of Pedagogy students on
“students with deficiency” determine and/or can determine attitudes in the
educating practice in face of the inclusion of “students with deficiency”. In effect,
the implementation of Brazilian Inclusive Education proposal depends on attitudes
of future teachers and not only of imposed demands of education public policies.
The research indicates the necessity of investment on initial formation of teachers
in the sense of opening up information and suggesting a university formation of
quality, based on teaching, research and extension. At last, it is considered that
teaching formation must embrace not only skills and tecnical knowledge but also
internal contents of the future professionals from their own psychosocial universe
in which the social representations are found.
KEY WORDS: inclusion, exclusion deficiency, Pedagogy course, diversity, social
representations, Inclusive Education, , teaching formation.
SUMÁRIO
Introdução .......................................................................................10
Capítulo I: Inclusão de “alunos com deficiência” e curso de
Pedagogia em tessitura com a teoria da Representação Social ........19
1. Trajetória da deficiência: da marginalização à
“alunos
inclusão de
com deficiência” ..........................................................21
1.1 A “dialética exclusão/inclusão” na história da educação de
“alunos com deficiência” .......................................................21
1.2 A inclusão de “alunos com deficiência à luz da teoria
Sócio/Histórico/Cultural de Vigotsky ....................................29
2. Análise das políticas de inclusão de “alunos com deficiência” e
a formação inicial em Pedagogia ..............................................33
2.1 Políticas de inclusão de “alunos com deficiência” no
Brasil.......................................................................................33
2.2 Trajetória do curso de Pedagogia e o tratamento dado aos
“alunos com deficiência” nessa formação .............................38
3. Teoria da Representação Social: uma alternativa para conhecer
atitudes dos estudantes de Pedagogia com relação à inclusão de
“alunos com deficiência” .............................................................47
3.1 Aspectos relevantes da teoria da Representação Social ..47
3.2 As representações sociais nas pesquisas educacionais ....52
Capítulo II - Itinerário de pesquisa - Representações sociais dos
estudantes de Pedagogia sobre “alunos com deficiência” ................57
1. Cenário da pesquisa .................................................................60
1.1 População e amostra ........................................................61
1.2 Métodos utilizados ...........................................................65
2 . Análise dos dados .................................................................71
2.1 Descortinando representações sociais dos estudantes de
Pedagogia sobre “alunos com deficiência” ............................72
2.2 Desnudando atitudes dos estudantes de Pedagogia com
relação à inclusão de “alunos com deficiência” ....................83
2.3 Cruzando representações sociais com atitudes ................88
Capítulo III: PPACP - Proposta Pedagógica de Aperfeiçoamento do
curso de Pedagogia - Recomendações para formação de educadores
necessária à inclusão de “alunos com deficiência”...........................93
1. Justificativa ..............................................................................93
2. Metas ........................................................................................99
3. Estrutura e modo de funcionamento ......................................101
4. Validação................................................................................105
Conclusão ......................................................................................108
Recomendações .............................................................................110
Referências Bibliográficas........................................................112/121
Anexos......................................................................................122/159
Anexo A – Operacionalização de termos...................................123
Anexo B – Ficha de identificação do entrevistado(a).................125
Anexo C – Roteiro de Entrevista................................................126
Anexo D – Guia de análise de conteúdo.....................................133
Anexo E – Perfil das Entrevistadas............................................134
Anexo F – PPACP......................................................................135
Anexo G – Guia de critério para avaliação de especialista........140
Anexo H - Apreciação dos Especialistas....................................144
11
CAPÍTULO I
INCLUSÃO DE “ALUNOS COM DEFICIÊNCIA”1 E CURSO DE PEDAGOGIA EM
TESSITURA COM A TEORIA DA REPRESENTAÇÃO SOCIAL
Qualquer idéia que te agrade,
Por isso mesmo...é tua
O autor nada mais fez que vestir a verdade
Que dentro de te se achava inteiramente nua.
Mário Quintana, Antologia Poética.
O objetivo do presente capítulo é traçar um marco teórico que possa dar
sustentação ao estudo das representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre
‘alunos com deficiência’. Neste estudo, procuramos articular a proposta de inclusão de
“alunos com deficiência” com a formação inicial em Pedagogia, por meio das teorias
Sócio-Histórico-Cultural e Representação Social. Na primeira parte do capítulo, buscamos
tecer uma reflexão sobre as atitudes sociais apresentadas historicamente no tratamento dado
às pessoas com deficiência, desde a Antigüidade Clássica até o contexto contemporâneo de
implementação de políticas educacionais voltadas para proposta de inclusão de “alunos
com deficiência”. Ressaltamos que a efetivação dessa proposta educativa implica a
aquisição de uma concepção otimista do potencial educativo dos “alunos com deficiência”
por parte dos educadores, conforme estabelece os pressupostos da teoria Sócio-HistóricoCultural de Vigotsky.
Na segunda parte do capítulo, analisamos as políticas de Educação Inclusiva e a
trajetória do curso de Pedagogia no contexto educacional brasileiro, pois a inclusão de
“alunos com deficiência” depende de uma prática educativa baseada nessa concepção
otimista que começa a ser construída na formação inicial docente. Em síntese, podemos
afirmar que a profissionalização docente é um dos momentos mais importantes para
garantir alicerces necessários a construção de uma prática educativa inclusiva. Optamos por
1
Conforme nota 1 da INTRODUÇÃO deste trabalho, o uso da expressão “alunos com deficiência” é produto de
uma reflexão teórico/ metodológica que está explicitada na página 28.
12
analisar a formação inicial em Pedagogia porque é o curso de nível superior responsável
pela formação inicial da maioria dos educadores que atuam na Educação Infantil e nas
séries iniciais do Ensino Fundamental, níveis de ensino nos quais está concentrado o maior
número de “alunos com deficiência” do sistema educacional brasileiro. Trata-se, também,
do único curso de nível superior com experiência paralela na profissionalização de
educadores para os ramos de ensino regular e especial. Há uma tendência desses ramos de
ensino se unirem com a implementação das políticas de inclusão de “alunos com
deficiência”, para instaurar uma “escola para todos”, como estabelece o MEC – Ministério
da Educação e Cultura do Brasil.
Na terceira e última parte do capítulo, ressaltamos que a formação inicial docente
deve abarcar, não só habilidades e conhecimentos técnicos, mas também os conteúdos
internos2 dos profissionais em formação, que constituem as representações sociais.
Partimos do pressuposto de que as representações sociais orientam as atitudes dos
indivíduos e/ou grupos sociais porque
se uma representação é uma preparação para ação, ela não o é somente na medida em que
guia o comportamento, mas sobretudo na medida em que remodela e reconstitui os
elementos do meio ambiente em que o comportamento deve ter lugar. (Moscovici, 1978, p.
49)
Para compreender como as representações sociais ocorrem na formação inicial docente,
propomos uma exploração dos aspectos mais relevantes da teoria da Representação Social:
desde uma rápida exposição da pesquisa de Moscovici (1961) sobre a Representação Social
da Psicanálise, que inaugurou a referida teoria, até pesquisas recentes que tratam das
representações sociais na educação. Os resultados dessas pesquisas indicam que as
representações sociais exercem um papel importante na orientação das atitudes dos
educadores. Portanto, tais investigações podem ser utilizadas para analisar os mecanismos
que interferem na eficácia do processo educativo.
2
Trata-se das concepções, sentimentos, desejos, valores, emoções, percepções, etc. que orientam as atitudes
sociais dos indivíduos e/ou grupos sociais.
13
1. Trajetória da deficiência: da marginalização à inclusão de “alunos com
deficiência”
Como trágica ladainha a memória boba se repete. A memória viva,
porém, nasce a cada dia, porque ela vem do que foi e é contra o que foi.
Aufheben era o verbo que Hegel preferia, entre todos os verbos do
idioma alemão. Aufheben significa, ao mesmo tempo, conservar e
anular; e assim presta homenagem à história humana, que morrendo
nasce e rompendo cria.
Eduardo Galeano, O Livro dos Abraços.
1.1 - A “dialética exclusão/inclusão”3 na história da educação de “alunos com
deficiência”
A Educação Especial contemporânea passa por um momento muito importante,
que se caracteriza pelo seu encontro com a Educação Comum, inaugurando um novo
movimento denominado Educação Inclusiva. Este movimento não surgiu ao acaso, mas é
conseqüência das transformações ocorridas nas atitudes sociais que foram se estabelecendo
ao longo da história, em relação ao tratamento dado às pessoas com deficiência. Afinal, não
se pode falar sobre a Educação Especial sem se pensar na questão da deficiência.
Nas sociedades ocidentais não existem muitas informações disponíveis sobre o
tratamento dado às pessoas com deficiência no decorrer do tempo. Há um grande silêncio
na história oficial quando se trata de abordar a trajetória de sujeitos excluídos da vida
política, econômica e social, como ocorria com as pessoas com deficiência. Nas
informações disponíveis no Brasil, destacam-se o trabalho de Amaral (1994, 1995 e 1997),
que apresenta um percurso histórico sobre as representações da deficiência e o trabalho de
Mazzota (1993 e 1996), que retrata de forma sucinta as atitudes sociais subjacentes ao
tratamento dado às pessoas com deficiência. Amaral relaciona as representações sobre a
deficiência com concepções bíblica, filosófica e científica presentes em diferentes
3
Expressão utilizada por Sawaia para definir a exclusão como processo dialético de “inserção social
perversa” (Sawaia, 1999, p. 08). No decorrer desse capítulo, a referida expressão será descrita de forma mais
aprofundada.
14
contextos históricos. Na Antigüidade Clássica, a segregação e o abandono das pessoas com
deficiência eram institucionalizados: na Grécia, pessoas com deficiência eram mortas ou
abandonadas à própria sorte, numa espécie de exposição; os Romanos tinham uma lei que
dava o direito ao pai de eliminar a criança logo após o parto. A concepção filosófica dos
greco-romanos legalizava a marginalização das pessoas com deficiência, à medida que o
próprio “Estado tinha o direito de não permitir cidadãos disformes ou monstruosos e, assim
sendo, ordenava ao pai que matasse o filho que nascesse nessas condições” (Amaral, 1995,
p. 43). Na Idade Média, a visão cristã correlacionava a deficiência, especialmente a
cegueira, à culpa, pecado ou qualquer transgressão moral e/ou social. Predominava a
concepção bíblica, segundo a qual as pessoas com deficiência eram vistas como portadoras
de culpa ou pecado. A deficiência era a marca física, sensorial ou mental desse pecado, que
impedia o contato com a divindade, porque conforme os escritos bíblicos:
O Senhor disse a Moisés: dize a Arão o seguinte: homem algum de tua linhagem, por todas
as gerações, que tiver um defeito corporal, oferecerá o pão de Deus. Desse modo, serão
excluídos todos aqueles que tiverem uma deformidade: cegos, coxos, mutilados, pessoas de
membros desproporcionados. (Levítico, 21: 16-19)
A concepção bíblica legitimava a segregação das pessoas com deficiência em nome de uma
“lei divina”, presente nas escrituras sagradas. A primeira tentativa científica de estudo das
pessoas com deficiência surgiu, no século XVI, com Paracelso e Cardano, médicos
alquimistas que defendiam a possibilidade de tratamento da pessoa com deficiência. Mas a
consolidação da concepção científica sobre a deficiência só aconteceu no século XIX, com
os estudos de Pinel, Itard, Esquirol, Seguim, Morel, Down, Dugdale, Froebel,
Guggenbuehl, entre outros, que passaram a descrever cientificamente a etiologia de cada
deficiência numa perspectiva clínica. Cabe ressaltar que, apesar dessas contribuições
científicas, a primeira metade do século XX ainda ficou marcada pela a eliminação bárbara
das pessoas com deficiência pelo Nazismo. Verifica-se que, paralelamente à consolidação
da concepção científica da deficiência, ainda ocorrem atitudes sociais de marginalização
das pessoas com deficiência, vividas na Antigüidade Clássica.
15
Os estudos de Mazzota (1993) apontam que três atitudes sociais marcaram a
história da Educação Especial no tratamento dado às pessoas com deficiência:
marginalização,
assistencialismo
e
educação/reabilitação.
A
marginalização
é
caracterizada como uma atitude de descrença na possibilidade de mudança das pessoas com
deficiência, o que leva à completa omissão da sociedade em relação à organização de
serviços para essa população. O assistencialismo é uma atitude marcada por um sentido
filantrópico, paternalista e humanitário, porque permanece a descrença na capacidade de
mudança do indivíduo, acompanhada pelo principio cristão de solidariedade humana, que
busca apenas dar proteção às pessoas com deficiência. A educação/reabilitação se
apresenta como uma atitude de crença na possibilidade de mudança das pessoas com
deficiência e as ações resultantes dessa atitude são voltadas para a organização de serviços
educacionais. Cabe ressaltar que o fato de uma concepção ou atitude social predominar em
determinado período não significa que as concepções e atitudes não convivam juntas em
um mesmo contexto.
Diante do exposto, verifica-se que existe uma relação entre as representações
sociais sobre a deficiência (descritas por Amaral) e as atitudes sociais no tratamento dado
às pessoas com deficiência (descritas por Mazzota). A convergência desses estudos permite
fazer uma leitura mais aprofundada da história da educação dos “alunos com deficiência”
no contexto de implementação das políticas de Educação Inclusiva. Numa rápida
retrospectiva histórica, é possível identificar que o período que antecede o século XX é
marcado por atitudes sociais de exclusão (Mazzota, 1996) de “alunos com deficiência”,
porque as representações nessa época consideravam esses alunos indignos de uma educação
escolar (Amaral, 1997). Apesar dos estudos científicos da época tentarem demonstrar as
possibilidades de tratamento da deficiência, predominavam as concepções filosóficas e
bíblicas de marginalização e segregação das pessoas com deficiência. Na década de 50,
começaram a surgir as primeiras escolas especializadas e as classes especiais; a Educação
Especial se consolidou, como um subsistema da Educação Comum. As representações
sobre “alunos com deficiência” baseavam-se numa visão clínica da deficiência, pois o
aluno era tido como um doente e a escola especializada era o local de tratamento dessa
“doença”. Nesse período predominava a concepção científica da deficiência, acompanhada
16
pela atitude social do assistencialismo presente na Idade Média e reproduzido pelas
instituições filantrópicas de atendimento aos “alunos com deficiência”.
Na década de 70, os “alunos com deficiência” começaram a ser admitidos nas
classes comuns com o surgimento da proposta de integração. Os avanços dos estudos nas
áreas da Psicologia e Pedagogia passaram a demonstrar as possibilidades educativas desses
alunos, pois, nesse contexto, predominava uma atitude de educação/reabilitação como
proposta educacional. Entretanto, coexistia também uma atitude de marginalização por
parte dos sistemas educacionais, que não ofereciam condições necessárias para os “alunos
com deficiência” terem sucesso na escola regular. Segundo Mrech (1998), a proposta de
Educação Inclusiva surgiu nos Estados Unidos, em 1975, com a lei pública de nº 94.142,
que abriu possibilidades para a entrada de “alunos com deficiência” na escola regular. Os
pressupostos que levaram os Estados Unidos a implementarem tal proposta tem raízes nas
tendências pós-guerra. O governo norte-americano procurava minimizar os efeitos da
guerra por meio de um discurso que prometia assegurar direitos e oportunidades em plano
de igualdade para todos os cidadãos. Os “alunos com deficiência” foram inseridos nesse
plano de igualdade e conquistaram o direito de estudar em escolas regulares. Contudo, a
Educação Inclusiva norte-americana limitava-se apenas à inserção física de “alunos com
deficiência” na rede comum de ensino, nos mesmos moldes da proposta de integração:
esses alunos só eram considerados “integrados”, quando conseguiam se adaptar à classe
comum, como esta se apresentava, sem fazer modificações no sistema de ensino já
estabelecido. Portanto, os sistemas educacionais não precisavam fazer nenhuma
modificação para receber os “alunos com deficiência”. Verifica-se outra vez a coexistência
de atitudes sociais: educação/reabilitação e marginalização se cruzam num mesmo
contexto educacional.
Nas décadas de 80 e 90, apareceu a proposta de inclusão de “alunos com
deficiência”, numa perspectiva inovadora com relação à proposta de integração da década
de 70, cujos resultados não conseguiram modificar a realidade educacional dos “alunos
com deficiência”. O que muda na proposta de inclusão é que os sistemas educacionais
passam a ser responsáveis por criar condições de promover uma educação de qualidade
para todos e fazer adaptações que atendam às necessidades educativas especiais dos “alunos
com deficiência”. Nessa perspectiva, os sistemas educacionais devem assumir que “as
17
diferenças humanas são normais e que a aprendizagem deve se adaptar às necessidades das
crianças ao invés de se adaptar a criança a assunções preconcebidas a respeito do ritmo e da
natureza do processo de aprendizagem” (Declaração de Salamanca, 1994, p. 04). Portanto,
a proposta de inclusão se contrapõe à homogeneização padronizada de alunos, conforme
critérios que não respeitam a diversidade humana: a deficiência deve ser considerada
sempre como uma “diferença” que faz parte dessa diversidade e não pode ser negada. Com
o surgimento dessa proposta educativa, o conceito da Educação Inclusiva se amplia na
década de 90 – deixa de ser “apenas” a inserção física de “alunos com deficiência” – e
passa a ser entendido como:
A inserção escolar de pessoas com deficiência nos níveis pré-escolar, infantil, médio e
superior. Esse paradigma é o da inclusão social – as escolas (tanto comuns como especial)
precisam ser reestruturadas para acolherem todo espectro da diversidade humana
representado pelo alunado em potencial, ou seja pessoas com deficiências físicas, mentais,
sensoriais ou múltiplas e com qualquer grau de severidade dessas deficiências, pessoas sem
deficiências e pessoas com outras características atípicas, etc. É o sistema educacional
adaptando-se às necessidades de seus alunos (escolas inclusivas), mais do que os alunos
adaptando-se ao sistemas educacional (escolas integradas). (Sassaki, 1998, p. 09)
Nessa perspectiva, a Educação Inclusiva visa reduzir todas as pressões que levam à
exclusão e todas as desvalorizações atribuídas aos alunos, seja com base em sua
incapacidade física, rendimento cognitivo, raça, gênero, classe social, estrutura familiar,
estilo de vida ou sexualidade.
O educador cubano Rafael Bell Rodríguez adverte que falar da Educação
Inclusiva, sem pensar na realidade social de exclusão a que a maioria dos povos estão
condenados, representa uma ingenuidade intelectual. As estatísticas de desemprego, fome,
analfabetismo e violência revelam um cenário internacional dominado pelas diferentes
formas de exclusão social, em que “realidades como estas, lamentablemente, no son
excepción sino más bein regla de un mundo caracterizado por la globalización neoliberal,
en el que hablar de diversidad es casi una paraoja” (Rodriguéz, 2001, p. 63). Como
desenvolver a Educação Inclusiva dentro de uma realidade social que exclui boa parte da
população por questões sócio-econômicas, enquanto propõe incluir alunos que
historicamente foram excluídos do sistema regular de ensino? Será que se devem negar as
18
possibilidades da proposta de Educação Inclusiva devido ao contexto social de exclusão da
sociedade contemporânea? Ou será que é possível aproveitar a proposta de Educação
Inclusiva para criar mecanismos de ação que levem à construção de uma sociedade
inclusiva? Questionamentos como esses encaminharam a problemática da inclusão de
“alunos com deficiência” para a análise da “dialética exclusão/inclusão”. De acordo
Sawaia, a expressão “dialética exclusão/inclusão” é utilizada para explicitar as contradições
e complexidades da exclusão social. Trata-se de um “conceito processo” capaz de indicar o
“movimento” e não a “essencialidade” que as palavras “inclusão” e “exclusão” assumem no
contexto contemporâneo:
ambas não constituem categorias em si, cujo significado é dado por qualidades especificas e
invariantes, contidas em cada um dos termos, mas que são da mesma substância e formam
um par indissociável, que se constitui na própria relação. (Sawaia, 1999, p. 108)
A história da educação dos “alunos com deficiência” apresenta as mesmas
evidencias caracterizadas pela análise da “dialética exclusão/inclusão”. Os estudos de
Sawaia indicam que, na sociedade ocidental contemporânea, as formas de incluir e
reproduzir a miséria variam e podem se manifestar de maneira contraditória: “quer
rejeitando-a e expulsando-a da visibilidade, quer acolhendo-a festivamente, incorporando-a
à paisagem como algo exótico” (Sawaia, 1999, p. 108). O tratamento dado aos “alunos com
deficiência” expressa semelhança com as formas de inclusão e reprodução da miséria:
historicamente esses alunos foram rejeitados e expulsos da visibilidade do sistema regular
de ensino, e no contexto educacional contemporâneo, eles devem ser “acolhidos” e
“incorporados” à paisagem da escola regular. Quando se articulam os princípios teóricos da
Educação Inclusiva com a realidade educacional de países marcados pelas desigualdades
sociais, as contradições da proposta de inclusão aparecem. A análise da “dialética
exclusão/inclusão” permite compreender as diferentes dimensões da exclusão dos “alunos
com deficiência”, evidenciando que a proposta de inclusão pode ter
19
a qualidade de conter em si a sua negação e de não existir sem ela, isto é, ser idêntico a
inclusão (inserção social perversa). A sociedade exclui para incluir e esta transmutação é
condição da ordem social desigual, o que implica o caráter ilusório da inclusão. (Sawaia,
1999, p. 08)
Os estudos do sociólogo francês Robert Castel (1997), citado por Sawaia (1999)
ao abordar a “dialética da exclusão/inclusão” e por Gentili (2001) para tratar da
“normalização da exclusão” na sociedade ocidental contemporânea, possibilitam ampliar
essa reflexão. Segundo Castel (1997) podem-se reconhecer três formas qualitativamente
diferenciadas de exclusão: exclusão como aniquilamento, que é a expulsão ou extermínio
de indivíduos e/ou grupos sociais por meio da morte, através do que se busca apagar os
rastros e as identidades dessas pessoas; exclusão por confinamento e/ou reclusão, que é o
isolamento de indivíduos e/ou grupos sociais do convívio social em instituições
especialmente pensadas para que esses indivíduos não se misturem com os outros, os
incluídos; e exclusão includente, que constitui na aceitação de determinados indivíduos
e/ou grupos sociais – marcados por um estigma – para conviverem no meio social,
incluídos, só que numa condição inferiorizada e subalterna, em que é permitido um
convívio comum a todos, porém apenas alguns terão a possibilidade de acesso a
determinados bens e benefícios sociais. Uma vez que a inclusão de “alunos com
deficiência” não se constituiu numa atitude de “educação/reabilitação” (Mazotta, 1993),
ocorre uma “indiferença diante da exclusão” educacional dos referidos alunos (Gentili,
2001, p. 54), conforme demonstra a análise da “dialética exclusão/inclusão”.
Na trajetória que vai da falta de atendimento educacional de “alunos com
deficiência”, seguida pela consolidação da Educação Especial, enquanto subsistema, até
chegar à proposta de Educação Inclusiva, verificamos que muitas barreiras foram
derrubadas. Contudo, ainda existem muitas barreiras a serem enfrentadas, pois a segregação
e a marginalização das pessoas com deficiência permanecem no imaginário sociocultural de
indivíduos e/ou grupos sociais. As denominações utilizadas para se referir às pessoas com
deficiência no decorrer da história revelam essas barreiras e expressam limites na proposta
de inclusão. No contexto contemporâneo é possível encontrar no mesmo cenário
educacional
expressões
como:
inválidos,
anormais,
excepcionais,
incapacitados,
subnormais, deficientes, portadores de NEE – Necessidades Educativas Especiais –,
20
portadores de deficiência, etc. Cabe ressaltar que a denominação utilizada nos documentos
oficiais das políticas de Educação Inclusiva é “portadores de NEE”. Essa expressão surgiu
nas propostas de integração e inclusão para designar “a pessoa que apresenta, em caráter
permanente ou temporário, algum tipo de deficiência física, sensorial, cognitiva, múltipla,
condutas típicas ou altas habilidades” (PNEE, 1994, p. 22). Trata-se de uma denominação
nova, que procura minimizar os efeitos estigmatizadores das terminologias anteriores,
desfocando a deficiência do aluno. Contudo, será que uma simples mudança de
terminologia pode diminuir o problema da estigmatização dos “alunos com deficiência”?
Existem posicionamentos críticos que consideram a expressão “portadores de NEE”
excessivamente vaga. Bueno (1997) alerta para o perigo dessa expressão, que, ao abrigar
uma diversidade de sujeitos, pode ganhar na amplitude de sentidos e na quebra da
estigmatização, mas perde muito na precisão de seus significados. Essa imprecisão
conceitual pode abrir espaços para que um grande grupo de alunos, que não apresentam
deficiência, sejam excluídos das escolas regulares, em algum momento, com a justificativa
de que são portadores de NEE, sem que se evidencie que o problema nada tem a ver com as
características do aluno, mas com as características do processo pedagógico inadequado da
escola. Em contrapartida, alunos portadores de NEE que apresentam uma deficiência a qual
exige maiores cuidados, podem, também, ser relegados pela falta de atenção a sua
especificidade. Outra crítica a respeito dessa terminologia refere-se ao vocábulo
“portadores”, que antecede a sigla NEE, pois a cegueira, a síndrome de down, a paralisia
cerebral, a surdez, etc. são condições que integram os seres e não podem ser vistas como
um fardo a ser carregado. A deficiência faz parte da identidade desses seres; negá-la é
colocar, mais uma vez, a inclusão de “alunos com deficiência”, na análise da “dialética
exclusão/inclusão”.
Diante das reflexões apresentadas, verifica-se que é preciso cuidado na escolha da
terminologia porque esta pode determinar representações e atitudes que contradizem seu
próprio discurso. No presente estudo, optou-se pela expressão “aluno com deficiência”, por
permitir uma identificação imediata dos sujeitos dessa investigação, quais sejam: alunos
com deficiência sensorial (auditiva ou visual), física, mental e/ou múltipla. Considera-se
que a utilização do termo aluno “portador de NEE” é um fator complicador para essa
pesquisa, uma vez que exige sempre uma explicação ou adjetivação do termo. A testagem
21
do instrumento de coleta de dados dessa investigação revelou que a referida expressão era
desconhecida para a maioria das entrevistadas. Tal fato confirmou a opção pela expressão
“alunos com deficiência”. Como bem assinalou Jannuzi (1999), a variação terminológica é
uma constante e mais parece destinada a minimizar a forma pejorativa como essas pessoas
são concebidas socialmente. Uma vez que um dos objetivos do presente estudo é trazer à
tona essa realidade, torna-se coerente assumir a expressão “alunos com deficiência” porque
imprime um sentido claro, objetivo, direto e imediato da problemática abordada.
1.2 – A inclusão de “alunos com deficiência” à luz da teoria Sócio-HistóricoCultural de Vigotsky
Um dos pilares básicos da proposta de Educação Inclusiva4 é o respeito à
diversidade, segundo o qual “la escuela debe ser una instituición abierta a la diversidade
que se responsabilice com garantizar educación de calidad para todos sus alumnos, a pesar
de sus diferencias” (Machín, 1995, p. 05). Estudiosos da Educação Inclusiva – Rodríguez
(2001), Illán (2001), Molla (2001), Edler (2000), Werneck (1999), Sassaki, (1998),
Mantoan (1997), Machin (1995), entre outros, assinalam que, para viabilizar as estratégias
transformadoras e concretizar as ações práticas que a situação de cada instituição
educacional exige, é preciso vontade política dos dirigentes, recursos econômicos e
competência
dos
sistemas
educacionais.
A
conquista
dessas
condições
passa
necessariamente pela elaboração de um projeto educacional coletivo, com a participação de
todos os integrantes da escola: alunos, professores, pais, funcionários e comunidade, em
prol de uma educação de qualidade para todos. Portanto, a inclusão de “alunos com
deficiência” pressupõe, antes de tudo, a participação de educadores comprometidos com
uma prática educativa orientada por concepções otimistas sobre o potencial educativo dos
alunos, especialmente dos “alunos com deficiência”.
Para poder atender às necessidades da Educação Inclusiva, a prática educativa dos
educadores deve estar fundamentada no legado psicológico e pedagógico do russo Lev
4
Embora ocorra uma transgressão na terminologia “portadores de NEE”, o presente estudo compartilha com
os pressupostos teóricos da proposta de Educação Inclusiva.
22
Semenovich Vigotski (1896-1934) e de seus seguidores. O paradigma Sócio-HistóricoCultural proporcionou a construção de um novo olhar sobre o desenvolvimento psíquico do
ser humano, especialmente no que se refere ao desenvolvimento de “alunos com
deficiência”. Infelizmente o referido paradigma ficou silenciado durante muitos anos,
porque as obras de Vigotsky foram proibidas, devido aos problemas políticos na Rússia.
Seus escritos só começaram a circular abertamente por volta da década de 80, mesmo
período em que surgiu o movimento de inclusão. A teoria Sócio-Histórico-Cultural de
Vigotsky deu bases científicas para a construção de uma concepção otimista sobre o
potencial educativo dos “alunos com deficiência”. Portanto, o principal sustento teóricometodológico para a compreensão da pedagogia da diversidade está apoiado na tese de
Vigotsky sobre a natureza social do desenvolvimento psíquico do sujeito.
De acordo com o paradigma Sócio-Histórico-Cultural, as funções psicológicas
superiores de todos os seres humanos são de origem sociocultural, porque o homem é um
ser social por natureza, produto da sua história e sujeito ativo das relações sociais. Pode-se
afirmar que Vigotsky foi o grande precursor da proposta de Educação Inclusiva, porque ele
demonstrou que o desenvolvimento das crianças com deficiência é semelhante ao
desenvolvimento das crianças “ditas normais”. Postulava que a educação daquelas não se
diferenciava da educação destas, pois:
el niño com defecto no es indispensablemente un niño deficiente. El grado de su
anormalidad o normalidad depende del resultado de la compensación social, es dicir, de la
formación final de su personalidad en general. (Vigotsky, 1995, p. 10)
Para Vigotsky, a educação das crianças com deficiência era um poderoso fator
para correção ou compensação das suas dificuldades, porque os estímulos do meio social
são determinantes para o desenvolvimento humano. Os estudos desse autor demostraram a
possibilidade de desenvolvimento e de compensação do defeito físico, mental e sensorial
por meio do desenvolvimento e aperfeiçoamento das funções psíquicas superiores. Os
postulados da escola Sócio-Histórico-Cultural são revolucionários para a prática educativa
de educadores que atuam com “alunos com deficiência”. Antes dos estudos de Vigotsky, a
prática educativa era orientada para o entretenimento das funções elementares dos “alunos
23
com deficiência”. Com os estudos de Vigotsky criaram-se condições para a busca de uma
prática educativa voltada para o desenvolvimento das funções psíquicas superiores dos
“alunos com deficiência”, independentemente das limitações apresentadas. As implicações
pedagógicas desses estudos são inúmeras e seus pressupostos sustentam pedagogicamente a
proposta de Educação Inclusiva: comprovaram que o potencial educativo de todos alunos
pode ser desenvolvido a depender dos estímulos oferecidos pelo contexto sociocultural de
cada sujeito e/ou grupo.
O trabalho de Vigotsky é fundamental para a construção e/ou reconstrução de uma
prática educativa voltada para inclusão de “alunos com deficiência”, pois o autor defendia a
tese de que o processo de ensino/aprendizagem é determinante para o desenvolvimento
humano. De acordo com os pressupostos da escola Sócio-Histórico-Cultural, o docente tem
a função de provocar os avanços na aprendizagem dos alunos, pois estes não ocorrem
espontaneamente. Para favorecer esses avanços é imprescindível que os docentes
compreendam como se processam os níveis de desenvolvimento descritos por Vigotsky. O
primeiro é o que chamou de nível de desenvolvimento real: quando o sujeito realiza suas
ações de forma autônoma porque o resultado do seu ciclo de desenvolvimento já foi
completado. O segundo é o nível de desenvolvimento potencial: quando o sujeito só realiza
suas ações acompanhado por um companheiro mais competente porque o seu ciclo de
desenvolvimento não foi completado. O entendimento desses níveis de desenvolvimento
permite ao docente compreender que boas situações de aprendizagem podem acionar um
terceiro nível: ZDP – zona de desenvolvimento proximal dos seus alunos, que é:
A distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da
solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado
através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com
companheiros mais capazes. (Vigotsky, 1998. p. 112).
.
A compreensão do conceito de zona de desenvolvimento proximal permite ao
docente trabalhar com a diversidade de alunos, por meio do processo de mediação em
diferentes situações da prática educativa. Com mediação é possível chegar à zona de
desenvolvimento proximal do aluno aprendiz, com a orientação do docente ou de colegas
24
mais experientes, independentemente das limitações apresentadas por esse aluno aprendiz.
A mediação é o caminho mais rápido para se chegar à zona de desenvolvimento proximal
num contexto de sala de aula e ajudar todos os alunos a avançarem, especialmente os
“alunos com deficiência”. O conhecimento aprofundado da teoria Sócio-Histórico-Cultural
é essencial para a formação docente de qualquer educador. Essa teoria demonstra o papel
social da escola, que é acionar o desenvolvimento dos alunos através do processo
ensino/aprendizagem. Cada aprendizagem conquistada pelo processo de mediação da ZDP
abre novas possibilidades de aprendizagens, pois:
aquilo que é zona de desenvolvimento proximal hoje será nível de desenvolvimento real
amanhã – ou seja, aquilo que uma criança pode fazer com assistência hoje, ela será capaz de
fazer sozinha amanhã. (Vigotsky, 1998. p. 98)
Segundo Vigotsky, o objeto de estudo da Defectologia5 não é a deficiência por si
mesma, e sim as possibilidades de compensação dessa deficiência através de uma via
indireta, de caráter social e psicológico. Antes dos estudos de Vigotsky, a Defectologia
trabalhava com o isolamento das funções psíquicas superiores e se satisfazia com a
caracterização puramente descritiva da patologia de cada deficiência. O trabalho de
Vigotsky possibilitou uma compreensão dialética do desenvolvimento psíquico e
demonstrou o caráter interativo como ponto de partida para o tratamento com a diversidade.
Para esse autor existem sempre possibilidades de modificar ou compensar a deficiência,
porque se algum órgão, devido a uma deficiência funcional ou morfológica, não cumpre
por completo suas tarefas, o sistema nervoso central e o aparelho psíquico do homem
assumem a tarefa de compensar o funcionamento deficiente do órgão. As implicações
pedagógicas e psicológicas dos estudos de Vigotsky podem revolucionar a prática
educativa, por mais difícil que ela se apresente ao “olhar” do docente.
De acordo com Mantoan (1997), essa mudança de “olhar” sobre o potencial
educativo dos “alunos com deficiência” é o principal desafio a ser enfrentado pelos
docentes na proposta de Educação Inclusiva. Para conquistar esse desafio é necessária uma
5
Defectologia era a terminologia usado na época de Vigotsky (1896-1934), para referir-se a ciência que
estudava questões relacionada à deficiência.
25
atualização constante de informações sobre as possibilidades de aprendizagem dos “alunos
com deficiência” à luz do paradigma Sócio-Histórico-Cultural. A atividade de ensinar é
complexa e exige conhecimentos que muitas vezes contradizem o que foi ensinado ou
silenciado na formação dos docentes. Daí se insere a importância do estudo aprofundado do
paradigma Sócio-Histórico-Cultural de Vigotsky no processo de formação docente –
especialmente na formação inicial, quando os valores da prática educativa são construídos
e/ou reconstruídos nas experiências de aprendizagem e nas diferentes leituras que são
compartilhadas no contexto universitário. Illán reafirma essa idéia quando diz: “la
formación del profesorado es un elemento crucial se si quiere que la atención a la
diversidad traspase los límites legales y descienda a la cotidianidad de los centros y de las
aulas” (Illán, 2001, p. 46).
Essa formação deve propiciar um aprendizado sobre como funciona o processo de
construção de conhecimento dos alunos, incluindo aí os “alunos com deficiência”, que
devem ter os mesmos direitos de acesso e permanência na escola regular. O silêncio sobre
temas relacionados à educação de “alunos com deficiência” nos cursos de formação inicial
de educadores contribui para a reprodução de concepções e atitudes sociais de
marginalização e segregação da deficiência. Os docentes acabam por repetir experiências
construídas social e historicamente no tratamento dado às pessoas com deficiência. Essas
experiências dificultam o processo de escolarização dos “alunos com deficiência”, porque
os docentes não conseguem conduzir a prática educativa com base no respeito à diversidade
e na crença do potencial educativo desses alunos. Daí a necessidade imediata em se pensar
a proposta Educação Inclusiva articulada com a formação inicial de docentes.
26
2. Análise das políticas de inclusão de “alunos com deficiência” e da formação inicial
em Pedagogia
Somos, enfim, o que fazemos para transformar o que somos. A identidade
não é uma peça de museu, quietinha na vitrine, mas a sempre assombrosa
síntese das contradições nossas de cada dia.
Eduardo Galeano, O livro dos Abraços.
2.1 – Políticas de inclusão de “alunos com deficiência” no Brasil
O Brasil assumiu legalmente a proposta de Educação Inclusiva, à medida que
compartilhou com os princípios da Declaração de Educação para Todos (Brasil, UNICEF:
Fundos das Nações Unidas para Infância, 1990) e da Declaração de Salamanca (Brasil,
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA/CORDE. Secretaria dos Direitos de Cidadania, 1994),
documentos internacionais que lançaram raízes para a expansão da proposta de inclusão de
“alunos com deficiência” no mundo inteiro. A proposta de Educação Inclusiva foi
introduzida nas políticas públicas do sistema educacional brasileiro através da PNEE –
Política Nacional de Educação Especial (Brasil, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO.
Secretaria de Educação Especial, 1994), da nova LDB - Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (Brasil, SENADO FEDERAL: Lei de nº 9394/96,1997), do PCN Parâmetro Curricular Nacional - de Adaptações Curriculares para a Educação de alunos
com
NEE
(Brasil,
MINISTÉRIO
DA
EDUCAÇÃO.
Secretaria
de
Educação
Fundamental/Secretaria de Educação Especial, 1999), da publicação da Portaria de nº 1.679
(Brasil, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 1999) e do PNE - Plano Nacional de Educação
(Brasil, SENADO FEDERAL, 2000). Esses documentos demonstram que a proposta de
inclusão de “alunos com deficiência” está oficialmente instituída no sistema educacional
brasileiro.
A PNEE – Política Nacional de Educação Especial - constitui um grande avanço
em relação à compreensão do papel da Educação Especial no processo de inclusão. O
documento apresenta um mapeamento da situação da Educação Especial no Brasil, faz uma
27
revisão conceitual das terminologias e propõe objetivos para a política de Educação
Especial, no que se refere à inclusão de “alunos com deficiência”. Sugere que a
concretização desses objetivos depende da participação conjunta dos três níveis
governamentais (federal, estadual e municipal) e da sociedade como um todo. Entretanto, a
PNEE não determina oficialmente o cumprimento das responsabilidades concernentes a
esses objetivos e ainda traz muito do caráter assistencialista da Educação Especial, pois
enfatiza o atendimento clínico em detrimento do tratamento educacional dos “alunos com
deficiência”. Esse documento retrata uma fase de transição entre a “assistência aos
deficientes” e a “educação escolar”.
A nova LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - possui um
capítulo dedicado à educação de “alunos com deficiência” que prevê, em seu Artigo 58, §
1º e § 2º, o atendimento dos “portadores de NEE”, preferencialmente na rede regular de
ensino, em classes regulares, onde devem ser oferecidos, quando necessário, serviços de
apoio especializado para atender às peculiaridades do alunado. O atendimento em classes,
escolas ou serviços especializados só deverá ser oferecido quando não for possível a
integração destes alunos em classes regulares, devido às suas condições específicas6. No
Artigo 59, a Lei prevê, entre outras condições, que sejam assegurados, pelos sistemas de
ensino: currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específica para o
atendimento aos portadores de NEE
O PCN – Parâmetro Curricular Nacional – de Adaptações Curriculares e
Estratégias para a Educação de alunos com NEE, apresenta informações e orientações para
o professor do ensino regular atender às necessidades educativas especiais dos “alunos com
deficiência”, a partir da consolidação da política de Educação Inclusiva no Brasil. Esse
documento apresenta um rol de estratégias para os docentes utilizarem em classe, de acordo
com os diferentes tipos de “necessidades educativas especiais”, descritas no corpo do
documento. Para favorecer a inclusão são apresentados vários procedimentos de ensino,
recomendados pelo sistema educacional brasileiro na perspectiva de assegurar uma
educação aberta à diversidade. De modo geral, o referido documento dá uma ênfase muito
grande ao papel do professor, ainda que permaneçam inalteradas as condições de formação,
6
As condições específicas se referem às necessidades especiais advindas da deficiência que exigem um
tratamento mais clínico.
28
especialização e remuneração do docente. Contudo, apenas a “boa vontade” docente não dá
conta de superar os desafios da prática educativa de inclusão de “alunos com deficiência”.
São necessários investimentos na formação inicial e continuada dos docentes, bem como
melhoria das condições materiais de trabalho. Infelizmente o documento é omisso nessa
questão.
A Portaria de nº 1.679, exige que as Instituições de Ensino Superior ofereçam
condições de acessibilidade para os portadores de NEE, como requisito para o seu
credenciamento legal, junto ao Ministério da Educação. Com essa portaria, o sistema
educacional brasileiro abriu possibilidades para a entrada de “alunos com deficiência” no
ensino superior. Algumas universidades removeram barreiras arquitetônicas para atender ao
requisito estabelecido. Contudo, os docentes do ensino superior ainda não foram preparados
para atuar com a inclusão de “alunos com deficiência”. As experiências de inclusão no
ensino superior demonstram que os referidos alunos enfrentam muitas barreiras
pedagógicas7. Além dessas barreiras, falta formação e qualificação dos docentes do ensino
superior para atuar com a inclusão de “alunos com deficiência” na prática educativa.
O PNE – Plano Nacional de Educação – sugere uma interação entre docentes da
Educação Especial e docentes da Educação Regular, como uma das ações necessárias para
efetivação da Educação Inclusiva. Enfatiza ainda a importância de se redefinirem os
conceitos sobre deficiência no Brasil, sugerindo o uso das novas tecnologias da
comunicação e da informação para favorecer a inclusão de “alunos com deficiência”. O
documento propõe, inclusive, o estabelecimento de parcerias para melhorar o atendimento
dos referidos alunos por meio de adaptações de veículos, ambientes, materiais, etc.
Contudo, no que se refere à formação de docentes para atuar na Educação Inclusiva, o PNE
deixa um grande silêncio. Outra crítica feita ao PNE refere-se ao seu caráter meramente
descritivo, porque não são amarradas as responsabilidades para garantir o cumprimento
dessas ações.
As conquistas legislativas apresentadas nos documentos acima demarcam a
“intenção” do governo brasileiro em implantar a proposta de Educação Inclusiva em seu
7
Essas barreiras se traduzem pela indiferença das instituições de ensino superior em
atender às necessidades educativas especiais dos “alunos com deficiência”. Tais como:
tradução e transcrição de textos escritos em braille para alunos cegos, contratação de
tradutores da língua de sinais para alunos surdos, etc.
29
sistema educacional. Entretanto, existe uma distância muito grande entre a “intenção” e a
efetivação da ação no sistema educacional brasileiro, pois, mudanças legislativas não
implicam, necessariamente, em alterações na prática educativa. O Brasil é um país de
dimensões continentais com uma área de 8.511.965 km2 e uma população de 169.799.170
habitantes, conforme dados do último censo. Implementar políticas de Educação Inclusiva
num país com essas dimensões, marcado por elevados índices de pobreza, exige
competência e compromisso político dos dirigentes desse sistema. Os dados estatísticos
revelam que a exclusão escolar ainda é um problema grave no sistema educacional
brasileiro. No ensino regular, “de 1000 crianças que tinham sete anos de idade em 1980 e
conseguiram entrar na primeira série do Ensino Fundamental, apenas 148 conseguiram
chegar à oitava série em 1987, quando então, tinham completado quatorze anos.” (Xavier,
1994, p. 15). Portanto, na década de oitenta, 852 crianças foram excluídas da vida escolar.
Enquanto isso, dados da Secretária de Estatística e Educação8 indicaram que, no ensino
especial, do total de 334.507 “alunos com deficiência”, que conseguiram se matricular no
ano de 1997, 161.725 foram atendidos em escolas não-governamentais especializadas; isso
equivale a dizer que 48,34% da população de “alunos com deficiência” não são atendidos
nas escolas do governo. Uma análise qualitativa desses números revela que as
desigualdades na escolarização e a seletividade do sistema educacional brasileiro dificultam
a concretização das políticas públicas de Educação Inclusiva.
Como viabilizar uma proposta de Educação Inclusiva na realidade educacional
brasileira, que apresenta níveis tão altos de exclusão escolar? Para transformar uma escola
que exclui numa escola que inclui é preciso mudanças estruturais na prática social do
sistema educacional. Se os alunos “ditos normais” são excluídos da escola, o que esperar
dos resultados da inclusão dos “alunos com deficiência”? Promover Educação Inclusiva
numa sociedade marcada pela exclusão social não é uma tarefa fácil. O sistema educacional
brasileiro possui muita discrepância, algumas podem ser reveladas estatisticamente, mas
outras são silenciadas institucionalmente. A desarticulação entre a política de Educação
Inclusiva com as demais políticas educacionais desenvolvidas pelo MEC traduz esse
silêncio institucionalizado. A publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) é
8
Dados publicados no Informe Estatístico do MEC/INEP/SEEC (1998), referentes ao ano de 1997.
30
um exemplo claro dessa desarticulação: os PCNs de Educação Infantil (1998), Ensino
Fundamental (1997), Ensino Médio (1998) e os Referenciais para Formação de Professores
(1999), não abordaram a Educação Inclusiva, apesar desses documentos serem gestados no
mesmo contexto de implementação da proposta de Educação Inclusiva, conforme se
verifica nas datas de publicação. Para compensar tal “esquecimento”, o MEC publicou
isoladamente o PCN de Adaptações Curriculares para os alunos com NEE (1999), com
orientações pedagógicas para os docentes executarem a proposta de Educação Inclusiva
espontaneamente. Essa atitude do MEC demonstra como a “dialética exclusão/inclusão”
(Sawaia, 1999) permeia o sistema educacional brasileiro que, ora incluiu a Educação
Inclusiva com a criação de um PCN específico de Adaptações Curriculares para
“portadores de NEE”, ora excluiu a Educação Inclusiva quando omitiu sua abordagem nos
demais PCNs do ensino regular. Se os PCNs dos diferentes níveis de ensino não
apresentaram nenhuma abordagem sobre a inclusão de “alunos com deficiência”, como
esperar que os docentes do ensino regular incluam as informações do PCN de Adaptações
Curriculares em sua prática educativa? Paralelamente, temas referentes à educação de
“alunos com deficiência” permanecem silenciados na formação dos docentes do ensino
regular, enquanto temas relativos à Educação Comum continuam excluídos da formação
dos docentes do ensino especial.
Portanto, a implementação da Educação Inclusiva no sistema educacional
brasileiro implica muitos desafios, dentre os quais romper com um silêncio instaurado
historicamente sobre questões relativas à educação de “alunos com deficiência” no
processo de formação docente. Esse silêncio dá lugar à reprodução de concepções e atitudes
sociais de marginalização e segregação no tratamento dado aos “alunos com deficiência”,
pois:
O fato da Educação Especial está virtualmente excluída do debate educativo é a primeira e
mais importante discriminação sobre a qual, depois, se projetam sutilmente as demais
discriminações [...] civis, legais, laborais, culturais, etc. (Skliar, 1992, p. 14)
31
2.2 - Trajetória do curso de Pedagogia e o tratamento dado aos “alunos com
deficiência” nessa formação
A prática educativa das escolas regulares indicam que os docentes não possuem
preparação mínima para trabalhar com “alunos com deficiência”. Não se trata apenas de
falta de habilidade e/ou conhecimento técnico, mas da reprodução de representações e
atitudes sociais construídas historicamente no tratamento dado às pessoas com deficiência.
Em contrapartida, a prática educativa das escolas especiais indicam que os docentes
também não estão preparados para o trabalho pedagógico desenvolvido no ensino regular,
porque construíram suas práticas nas dificuldades específicas de cada deficiência. Ambas
estão imobilizadas diante da inclusão de “alunos com deficiência” porque historicamente
não foi permitido o diálogo entre a Educação Especial e a Educação Comum. Para
estabelecer esse diálogo, é necessário uma mediação entre essas modalidades de ensino que
foram tradicionalmente separadas: o especial e o regular. Claudia Werneck (1999), uma das
estudiosas da proposta de Educação Inclusiva no Brasil, defende a tese de que a escola
regular e a escola especial representam uma farsa, porque reproduzem a humanidade de
maneira anômala. Para essa autora, a Educação Inclusiva apresenta-se como alternativa
fundamental para o homem encontrar sua verdadeira humanidade. A formação inicial tem
um papel importante na preparação de docentes responsáveis em consolidar a prática
educativa de inclusão de “alunos com deficiência”.
Dentre os cursos de formação inicial de educadores, o curso de Pedagogia é o que
oferece as melhores condições para construir esse diálogo, pois promoveu a “consagração
da discriminação já na própria formação” (Cartolano, 1998, p. 32), com o surgimento da
habilitação em Educação Especial na década de 70. À medida que a formação inicial
passou a ser uma habilitação do curso de Pedagogia, oficializaram-se dois ramos de ensino
nessa graduação: um que tratou a formação docente como um subproduto do especialista,
contribuindo para que se formasse um docente especializado na deficiência e com pouca
formação como professor; e o outro ramo que atendia exclusivamente aos interesses
burocráticos do ensino regular e excluía a educação especial da formação docente. Essa
formação diferenciada de docentes para o ensino especial e para o ensino comum no curso
de Pedagogia confirma que “a Educação Especial, tal como o deficiente, é segregada,
32
isolada, em vários aspectos. Seus alunos, seus profissionais, suas instalações e às vezes suas
próprias reflexões vivem um espaço comum, mas separado” (Romero, 1993, p. 67). Por que
o curso de Pedagogia assumiu a formação desses dois níveis de ensino separadamente?
Como se encontra o curso de Pedagogia no contexto contemporâneo de implementação das
políticas de Educação Inclusiva? Para responder esses questionamentos é necessário fazer
um passeio pela história do curso de Pedagogia.
De acordo com Silva (1999), o curso de Pedagogia surgiu junto com os cursos de
Licenciaturas, instituído pela antiga Faculdade Nacional de Filosofia, da Universidade do
Brasil, com o Decreto-lei nº 1190 de 1939, que tinham como objetivo preparar docentes
para a escola secundária (Ensino Médio). Essas licenciaturas seguiam a fórmula conhecida
como “3+1”, em que se formava o bacharel nos primeiros três anos do curso e,
posteriormente, formava-se o licenciado com o estudo das disciplinas de natureza
pedagógica, cuja duração prevista era de um ano. Como bacharel, o pedagogo poderia
ocupar cargo de “técnico de educação”, e, como licenciado, poderia exercer a função de
“docente nas escolas normais”, um campo não exclusivo dos pedagogos, uma vez que a Lei
Orgânica do Ensino Normal, daquela época, só exigia um diploma de nível superior.
Esse quadro durou até 1969, quando a lei nº 5540/68 extinguiu a distinção entre
bacharelado e licenciatura e criou as famosas “habilitações”9 para o curso de Pedagogia.
Com esse direcionamento, o curso assumiu o papel de formador de diferentes “especialistas
em educação”, conforme determinava cada uma de suas habilitações. Paralelamente,
continuava a ofertar, agora em forma de habilitação, a “licenciatura em ensino das
disciplinas e atividades práticas dos cursos normais”, que garantia uma formação
alternativa para a “docência nas séries iniciais do Ensino Fundamental”. A consolidação da
habilitação em Educação Especial surgiu em 1973, impulsionada pela criação do CENESP
– Centro Nacional de Educação Especial – que propunha a formação de professores
“especiais”, no ensino superior. Até então, a formação desses profissionais era feita no
Ensino Médio10. O que mais caracterizava o curso de Pedagogia com habilitação em
9
As principais habilitações criadas nesse período foram: Supervisão Escolar, Orientação Educacional,
Administração Escolar, Coordenação Pedagógica, Educação Especial, etc.
10
Os cursos normais de Ensino Médio foram responsáveis pela formação inicial dos docentes da Educação
Infantil e das séries iniciais do Ensino Fundamental até a promulgação da LDB nº 9394 de 1996. Entretanto,
contraditoriamente, a flexibilidade da referida lei ainda permite a realização desses cursos no Sistema
Educacional Brasileiro.
33
Educação Especial era o fato de, geralmente, ter como “principal elemento identificado:
pertencer a faculdades particulares e funcionar no período noturno” (Enumo, 1995, p. 06).
Essas características, que ainda se encontram presentes no contexto contemporâneo,
revelam a indiferença das políticas públicas com relação à profissionalização de docentes
para atuar com “alunos com deficiência”. À medida que o governo brasileiro delega essa
formação inicial à rede privada, demonstra desrespeito com relação a proposta de inclusão
de “alunos com deficiência” e insere a profissionalização docente na análise da “dialética
exclusão/inclusão” (Sawaia, 1999).
Na década de 80, o curso de Pedagogia passou a ser alvo de muitas críticas, devido
ao caráter tecnicista de suas habilitações, que não atendiam às necessidades da realidade
educacional brasileira, dentro da formação docente. Por isso, os professores das Faculdades
de Educação começaram a se reunir para discutir a formação do pedagogo. Desses
encontros realizados em diferentes universidades do Brasil, surgiu o “Movimento de
reconfiguração do curso de Pedagogia” (Silva, 1999). O debate sobre a formação inicial em
Pedagogia expressava um conflito de posições teóricas, metodológicas e epistemológicas a
respeito do papel do pedagogo no contexto educacional daquela época. Na tentativa de
mediar esse debate, foi criada, em 1983, a “Comissão de Especialistas de Ensino de
Pedagogia” (Silva, 1999). Essa Comissão procurou integrar posições de diferentes grupos e
recolheu mais de 500 propostas de instituições de Ensino Superior, para reconfiguração do
curso de Pedagogia do Brasil. As propostas recolhidas foram sistematizadas numa única
proposta, que passou a orientar as mudanças curriculares do curso de Pedagogia em
diferentes contextos universitários. A partir das orientações contidas na referida proposta, o
curso de Pedagogia rompia com a tradição tecnicista de separar o saber e o fazer, a teoria da
prática, e assumia o compromisso de promover a formação de um profissional habilitado
para atuar no ensino, na organização e na gestão de sistemas, unidades e projetos
educacionais. O ponto mais importante dessa proposta é que o curso de Pedagogia passou a
assumir a docência como base obrigatória de sua formação e identidade profissional. O
campo de atuação do pedagogo ampliava-se para atender à formação de docentes para
Educação Infantil, para as séries iniciais do Ensino Fundamental e para o Magistério de
Ensino Médio.
34
Paralelo ao debate sobre a reconfiguração do curso de Pedagogia, surgiram os
primeiros cursos de pós-graduação em Educação Especial no Brasil. O resultado desses
cursos implicou a produção de pesquisas que denunciavam a realidade educacional dos
“alunos com deficiência” no Brasil. No final da década de 80 e na década de 90, as
primeiras produções dos cursos de Especialização, Mestrado e Doutorado em Educação
Especial trouxeram à tona a situação da educação de “alunos com deficiência” no país,
silenciada historicamente pelas políticas públicas de educação e, também, pelos estudos
acadêmicos. De acordo com Glat (1998), a publicação dessas pesquisas começou a
desnudar a situação da Educação Especial no sistema educacional brasileiro. Como a
maioria dos estudantes desses cursos de pós-graduação eram docentes de universidades em
diferentes Estados do Brasil, o debate sobre Educação Especial passou a circular em
algumas universidades brasileiras, especialmente naquelas onde os referidos profissionais
estavam inseridos. Enquanto isso, o governo brasileiro era contaminado com a proposta de
Educação Inclusiva, divulgada nos encontros promovidos pela UNESCO, ONU e demais
agências internacionais, que orientam e/ou determinam as políticas públicas de educação
em países de Terceiro Mundo, como o Brasil. Nesses encontros, foram assumidos os
compromissos da Declaração de Educação para Todos (1990) e da Declaração de
Salamanca (1994), que oficializaram a posição do Brasil em relação à proposta de
Educação Inclusiva.
À medida que a proposta de Educação Inclusiva passava a incorporar as políticas
públicas do sistema educacional brasileiro, as primeiras experiências de mudança curricular
começavam a ocorrer nos cursos de Pedagogia de algumas universidades. Contudo, estas
mudanças curriculares não aconteceram de forma linear. Cada universidade procurou
adaptar a proposta apresentada pela Comissão de Especialistas conforme sua realidade,
interesses e necessidades. Como conseqüência, o curso de Pedagogia chegou ao final da
década de 90 com diferentes fluxogramas.11 A abertura para mudanças curriculares levou
algumas universidades a desativarem habilitações – a exemplo da habilitação em
Supervisão Escolar, considerada tecnicista – e a criarem novas habilitações – como a
habilitação em Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental, considerada
11
Em termos didáticos, fluxograma é a representação gráfica da organização curricular de um determinado
curso, com a distribuição de disciplinas dentro de uma carga horária definida.
35
importante para o contexto educacional contemporâneo. O resultado desse processo de
reconfiguração é que algumas universidades mantiveram suas habilitações, outras criaram
novas habilitações incorporadas às antigas e outras excluíram habilitações antigas e
implantaram novas habilitações. A Comissão de Especialistas no ensino de Pedagogia
realizou encontros regionais, estaduais e nacionais, a fim de avaliar os resultados dessas
mudanças.
Dessa forma o curso de Pedagogia buscava encontrar seu rumo, pois as
experiências das mudanças curriculares combinavam com as exigências da nova LDB, que
determinava: “A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível
superior, em cursos de licenciatura, de graduação plena” (Art. 62, da Lei de n° 9.394/96).
Cabe ressaltar que essas mudanças curriculares, apesar de inovadoras, não contemplavam
as necessidades da proposta de inclusão. Ressaltem-se algumas exceções, advindas das
experiências na pós-graduação em Educação Especial de universidade brasileiras que
ofereciam, paralelamente, cursos de graduação em Pedagogia e cursos de pós-graduação
em Educação Especial – UNICAMP/SP, UFSM/RS, UFRJ/RJ, UFSCar/SP, UNESP de
Marília/SP, entre outras. No contexto das universidades baianas, o máximo que se
conseguiu sobre educação de “alunos com deficiência” no curso de Pedagogia, foi a oferta
da disciplina Educação Especial em algumas universidades que ousaram criar novas
habilitações no currículo do referido curso. Contudo, a ementa dessa disciplina, em geral,
apareceu carregada pela concepção clínica da deficiência, conforme se verifica na ementa
oferecida em uma das novas habilitações12 do curso de Pedagogia da UNEB/BA:
Estuda os fundamentos da Educação Especial. As etiologias das diversas afeções
responsáveis pela conseqüente condição de aluno especial. Discute o conceito de Ensino
Especial. Estuda as diversas abordagens que instrumentalizam bem a inserção social do
aluno atendido pela Educação do tipo especial. Analisa o fenômeno da aprendizagem na
perspectiva da Educação Especial. (Ementa da disciplina Educação Especial, 1999 - grifos
nossos)
12
Retirada do curso de Pedagogia com Habilitação em Administração e Coordenação de Projetos
Pedagógicos (Departamento de Educação - Campus XI, UNEB). É uma disciplina oferecida no 5º semestre
dessa nova habilitação.
36
Essa ementa expressa uma visão de “aluno especial” como um sujeito doente, que merece
um atendimento clínico e, por isso, deve-se conhecer as “etiologias das diversas afeções”.
Portanto, a deficiência é considerada uma doença e não uma diferença e a “aprendizagem”
desses alunos que analisada como um “fenômeno” e não como um processo de construção
e/ou reconstrução de conhecimentos. Contudo, a existência da disciplina pelo menos rompe
o silêncio acadêmico sobre essa temática no curso de Pedagogia.
Nesse sentido, não se pode negar que o curso de Pedagogia teve muitos avanços
nesse contexto de reconfiguração iniciado na década de 80. Inclusive, os representantes dos
docentes das Faculdades de Educação no final da década de 90 já discutiam a
reestruturação do curso de Pedagogia com CNE – Conselho Nacional de Educação –, na
tentativa de consolidar a formação do docente de Educação Infantil e das séries iniciais do
Ensino Fundamental no referido curso. Existia até um consenso entre representantes dos
docentes do curso de Pedagogia e representantes do Conselho Nacional de Educação de que
o processo de reestruturação do curso de Pedagogia visava atender às necessidades da
formação sugerida pela nova LDB.
Entretanto, o debate sobre a reestruturação do curso de Pedagogia para atender à
docência da Educação Infantil e das séries iniciais do Ensino Fundamental foi atropelado
em dezembro de 1999, com a publicação de um Decreto Presidencial que determinava: “A
formação em nível superior de professores para atuação multidisciplinar, destinada ao
magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, far-se-á
exclusivamente em Cursos Normais Superiores13 (Decreto nº 3.276, 1999). A palavra
“exclusivamente” decretou o fim dos cursos de Pedagogia como formadores de docentes e
liquidou o trabalho desenvolvido pelo movimento de reconfiguração do curso de Pedagogia
desde a década de 80. Devido à forte pressão dos educadores e da opinião pública, o
governo publicou um outro Decreto, em agosto de 2000, que apenas trocava a palavra
“exclusivamente” pela palavra “preferencialmente”. Essa simples mudança vocabular
restituiu ao curso de Pedagogia a possibilidade de continuar com sua formação voltada para
a docência. Mas não resolveu a situação da formação do profissional docente da Educação
13
Trata-se de um novo curso de licenciatura previsto na LDB, Lei de nº 9394/96, voltado para formação
inicial de professores da Educação Infantil e das séries iniciais do Ensino Fundamental.
37
Infantil e das séries iniciais do Ensino Fundamental, pois ainda não ficou definido o lugar
dessa formação no sistema educacional brasileiro.
Cabe ressaltar que a principal crítica que desencadeou a reconfiguração do curso
de Pedagogia, nos anos 80, foi sua formação ser considerada excessivamente tecnicista, que
não propiciava uma visão integrada da educação. Entretanto, parece que os Cursos Normais
Superiores, “recomendados” pelo governo federal, repetem o mesmo erro: trata-se de uma
formação baseada no aprendizado de técnicas de ensino, sem uma visão do conjunto
educacional. O Movimento Nacional dos Docentes das Faculdades de Educação considera
que os Cursos Normais Superiores não passam de uma nova roupagem dos Cursos Normais
de Ensino Médio. Dessa forma, pouco contribuirá para a formação profissional dos
docentes de Educação Infantil e das séries iniciais do Ensino Fundamental. Outro dado
importante nessa análise é que esses Cursos Normais Superiores, em geral, funcionam em
Institutos Superiores de Educação – instituições isoladas do ambiente universitário – e
limitam-se apenas às atividades de ensino. Sem contato com a pesquisa e/ou a extensão, a
formação inicial docente sofre uma grande perda, pois essas atividades acadêmicas
favorecem o diálogo com a diversidade, fundamental para a construção de uma prática
educativa inclusiva. Enquanto a formação inicial de docentes da Educação Infantil e das
séries iniciais do Ensino Fundamental permanece indefinida, novos cursos são criados –
especialmente pela rede privada –, sem a devida preocupação com as conseqüências que
uma formação inicial docente desqualificada pode acarretar para a educação do país. A
legislação deixou essa formação inicial em aberto para que os Cursos Normais Superiores e
os Cursos Normais de Ensino Médio formassem profissionais com uma baixa qualificação
em relação à formação inicial propiciada pelo ambiente universitário. A indefinição na
formação inicial de docentes para a Educação Infantil e as séries iniciais do Ensino
Fundamental pode contribuir para ampliar, ainda mais, o quadro de exclusão escolar no
contexto contemporâneo da Educação Inclusiva.
A retrospectiva histórica do curso de Pedagogia com relação à Educação Especial
e, mais recentemente, à Educação Inclusiva, retrata uma completa desarticulação entre a
formação docente e as políticas de Educação Inclusiva. Essa desarticulação nas políticas
públicas do sistema educacional brasileiro foi construída historicamente. No que se refere
ao curso de Pedagogia, foi produzida desde a criação do curso, uma vez que faltava uma
38
definição clara sobre a sua função social no processo de formação docente. As reformas
educacionais sofridas pelo curso, no decorrer de sua história, pouco contribuíram para criar
e/ou delimitar sua identidade. Contudo, as críticas que lhe foram atribuídas na década de 80
levaram o referido curso a se olhar, a perceber a necessidade de reformulação. Foram duas
décadas de trabalho para construir o processo de reconfiguração do curso de Pedagogia. O
resultado é que o curso de Pedagogia começou a descobrir sua identidade e delinear sua
opção pela docência. Mas a falta de articulação, nas políticas públicas do sistema
educacional brasileiro, interrompeu bruscamente o processo de reconfiguração do curso de
Pedagogia com a força de um Decreto imposto, no final da década de 90. A pressão dos
educadores conseguiu derrubar esse Decreto. Entretanto, o destino da formação inicial do
docente da Educação Infantil e das séries iniciais do Ensino Fundamental não foi resolvido
e o curso de Pedagogia continua com a identidade indefinida na legislação educacional
brasileira.
Enquanto isso, a proposta de Educação Inclusiva permanece indefinida porque
depende, também, de uma formação inicial qualificada. Parece contraditório que a
Educação Inclusiva seja instaurada num contexto em que a formação profissional do
docente da Educação Infantil e das séries iniciais do Ensino Fundamental enfrenta essa
crise de paternidade. O curso de Pedagogia poderia resolver a questão, pois é responsável
pela formação inicial da maioria dos professores que atuam na Educação Infantil e nas
séries iniciais do Ensino Fundamental, níveis de ensino em que se encontra o maior número
de alunos da Educação Inclusiva. Segundo o Informe Estatístico do MEC/INEP (1998), no
ano de 1997, dos 334.507 alunos matriculados na Educação Especial no Brasil, 25,67%
estavam na Educação Infantil, 40,44% estavam no Ensino Fundamental, 33,25% recebiam
outros atendimentos e apenas 0,63% estavam no Ensino Médio. Esses dados sugerem a
necessidade de investimento na formação inicial dos profissionais que vão atuar na
Educação Infantil e no Ensino Fundamental para incorporar os princípios da proposta de
inclusão em suas práticas educativas. Contudo, o CNE – Conselho Nacional de Educação –
permitiu que o caráter provisório e flexível das leis educacionais brasileiras atropelassem o
processo de reconfiguração do curso de Pedagogia e, paralelamente, deixassem em aberto a
situação do Curso Normal de Nível Médio e criassem Cursos Normais Superiores. A falta
39
de comunicação entre as políticas de Educação Inclusiva e a formação inicial em Pedagogia
indicam que,
no que tange a uma política de formação docente, estamos longe de alcançar níveis de
qualidade mínimos para a consecução de uma Educação Inclusiva, não por genérica falta de
condições, mas por falta de vontade política, tanto por parte dos órgãos governamentais
como pelas Instituições de Formação, em especial as universidades. (Bueno, 1999. p. 156)
Todavia, as universidades brasileiras não podem se furtar do compromisso social e
político de assumirem uma posição diante da formação inicial de docentes no contexto
contemporâneo de implementação da proposta de Educação Inclusiva. A retrospectiva do
curso de Pedagogia e a história da Educação Especial no Brasil demonstram que ainda
existe um silêncio pairando sobre a educação de “alunos com deficiência”. Em
contrapartida, o curso de Pedagogia tem uma dívida social com a formação de docentes
para atuar com “alunos com deficiência”, já que, em sua trajetória histórica, assumiu
paralelamente a formação profissional de “especialistas em Educação Comum” e de
“especialistas em Educação Especial”. Trata-se da única formação inicial docente de nível
universitário com instrumentos teóricos e experienciais necessários para integrar o ensino
especial com o ensino regular. Como ainda não existe uma formação instituída para o
exercício da Educação Inclusiva, o curso de Pedagogia é a graduação que se encontra mais
próxima para instaurar esse processo. Contudo, a preparação profissional para Educação
Inclusiva vai exigir do curso de Pedagogia, não só a abordagem de habilidades e
conhecimentos técnicos sobre “alunos com deficiência”, mas também o levantamento de
conhecimentos oriundos das representações e atitudes construídas historicamente no
tratamento dado às pessoas com deficiência.
40
3. Teoria da Representação Social: uma alternativa para conhecer atitudes dos
estudantes de Pedagogia em relação à inclusão de “alunos com deficiência”
Esse homem, ou mulher, está grávido de muita gente. Gente que sai por
seus poros. Assim mostram, em figuras de barro, os índios hopis, do Novo
México: o narrador, o que conta a memória coletiva, está todo brotado de
pessoinhas.
Eduardo Galeano, O Livro dos Abraços
3.1 – Aspectos relevantes da teoria da Representação Social:
Diante da realidade educacional brasileira, em que não existe uma formação
inicial para os docentes atuarem segundo os princípios da proposta de inclusão, ocorre
uma tendência dos educadores recorrerem às representações sociais sobre “alunos com
deficiência”, para orientar suas atitudes com relação a essa proposta educativa. Portanto,
conhecer as representações sociais de futuros educadores constitui-se numa alternativa
necessária para repensar a formação inicial docente no contexto de implementação das
políticas públicas de Educação Inclusiva. O conceito de Representação Social é
entendido como “uma modalidade de conhecimento particular que tem por função a
elaboração de comportamentos e a comunicação entre indivíduos” (Moscovici, 1978, p.
26). As representações sociais são constituídas por um conjunto de informações, idéias,
crenças, opiniões, concepções e valores partilhados por um grupo sociocultural a
respeito de um dado objeto social. Mas não se trata apenas de informações, valores,
crenças, opiniões, concepções ou idéias aleatórias, e sim, de teorias coletivas sobre o
real, sistemas que têm uma lógica e uma linguagem própria, uma estrutura de
implicações baseada em valores e conceitos que “determinam o campo das
comunicações possíveis, dos valores ou das idéias presentes nas visões compartilhadas
pelos grupos, e regem, subseqüentemente, as condutas desejáveis ou admitidas”
(Moscovici, 1978, p. 51).
41
Para compreender como ocorre a construção das representações sociais e o seu
significado na orientação das atitudes sociais dos indivíduos e/ou grupos, faz-se
necessário conhecer os conceitos básicos que estruturam essa teoria e um pouco da sua
trajetória histórica. A teoria da Representações Social não surgiu a partir do nada, num
“vazio cultural” (Farr, 1995), ela foi precedida por estudos da Sociologia, Antropologia
e Psicologia. Essas ciências preocupavam-se em compreender as relações entre os
aspectos individuais e sociais do sujeito. Os estudos elaborados pelas referidas ciências,
entretanto, apresentavam uma visão dicotômica, ora priorizando os aspectos sociais, ora
os aspectos individuais, conforme os interesses de sua área específica de conhecimento.
Durkheim foi o primeiro teórico a utilizar o conceito de representação, em seus estudos
sobre “representações coletivas”. Defendia a tese de que o conhecimento social era
determinante no processo de construção das “representações coletivas”. Para Durkheim,
o conhecimento das “representações individuais” era de domínio da Psicologia e se
diferenciava do conhecimento das “representações coletivas”, que era de domínio
exclusivo da Sociologia.
Moscovici partiu do referencial de Durkheim, apesar de reconhecer que este tinha
uma concepção bastante estática da sociedade e apresentava uma visão dicotômica entre o
individual e o social. Entretanto, Moscovici queria se contrapor à tendência individualista e
psicologizante da Psicologia Social Norte-Americana que atribuía ao indivíduo a
responsabilidade de todos os problemas. Por isso, o referido autor criou um novo modelo
teórico para dialetizar as relações entre o indivíduo e a sociedade; afastou-se tanto da visão
sociologizante de Durkheim, quanto da visão psicologizante da Psicologia Social NorteAmericana. O brilhantismo inédito na obra de Moscovici foi ultrapassar as barreiras
acadêmicas da Psicologia e da Sociologia – ciências que se apresentavam de forma
dissociada e independente – para criar uma nova teoria, capaz de explicar os mecanismos
psicológicos e sociais que atuam na produção das representações sociais, em suas
operações e funções.
A teoria da Representação Social foi inaugurada por Moscovici em 1961, com a
publicação da sua pesquisa sobre “Representação Social da Psicanálise”. O objetivo
principal dessa pesquisa, era saber o que pensava o grande público da cidade de Paris
sobre a Psicanálise, mais especificamente, que imagem fazia o homem leigo das diversas
42
camadas da sociedade parisiense – o trabalhador, o estudante, o profissional liberal, o
católico, o ateu, o burguês, o comunista, entre outros – acerca da finalidade da
psicanálise. Moscovici utilizou a entrevista combinada com questionário e apoiou-se nas
técnicas de pesquisa de opinião para fazer a coleta de dados. Trabalhou com uma
amostra formada por 2.265 sujeitos e fez um levantamento do material publicado pela
imprensa sobre o tema da Psicanálise, no período de janeiro de 1952 a julho de 1956.
Para interpretar os dados coletados na entrevista, usou a técnica de análise de conteúdo.
Os resultados da pesquisa de Moscovici demonstraram que o processo de absorção da
Psicanálise pelo senso comum se dava através da linguagem e da comunicação, sendo
que a socialização do conhecimento implicava sempre a reelaboração de atitudes num
grupo social específico e restrito – o dos que produziam a ciência – por outros grupos
sociais diversos, em ambientes sociais mais amplos.
A pesquisa de Moscovici estabeleceu um modelo teórico para explicar os
mecanismos sociais e psicológicos que atuam na produção das representações sociais. O
autor partiu da premissa de “que não existe um corte dado entre o universo externo e o
universo interno do indivíduo” (Moscovici, 1978, p.48), para descrever como as
representações sociais são produzidas. De acordo com Moscovici dois processos geram
as representações sociais: objetivação e ancoragem. A objetivação é o processo pelo qual
as noções abstratas, as idéias, as imagens não-familiares são transformadas em algo
concreto que molda e constrói a realidade. A ancoragem se reflete na classificação e
nomeação dos objetos não-familiares ao compará-lo com categorias similares de objetos
sociais já existentes. A classificação implica sempre na comparação do objeto
representado com o protótipo ou modelo, visando criar uma rede de significados a partir
de determinados fatores sociais. Moscovici utilizou os dois processos em sua pesquisa
porque tratava-se de um estudo de grande porte, que durou aproximadamente cinco anos
para sua concretização. Seus estudos foram aprofundados e complementados por vários
pesquisadores, dentre os quais cabe destacar as contribuições de Denise Jodelet (1998).
Jodelet é a principal colaboradora de Moscovici na análise dos aspectos
constitutivos da teoria da Representação Social. Para essa autora, as representações
sociais contribuem para elaborar os comportamentos porque são sistemas de referência e
de significação que permitem interpretar, entender, explicar e classificar as informações,
43
os eventos, os indivíduos, etc. – é uma maneira de apreender e de pensar a realidade
cotidiana, com o objetivo de dar sentido e coesão à referida realidade – enfim, trata-se de
um conhecimento prático, espontâneo que tem incidência no comportamento social. Os
sistemas de referencia fornecido pelas representações sociais tem uma função mediadora
entre o indivíduo e o seu meio e entre os membros de um mesmo grupo, por isso
contribuem para afirmar a identidade grupal e o sentimento de pertencimento do
indivíduo. Para compreender como isso ocorre Jodelet retomou aos processos básicos de
produção das representações sociais: objetivação e ancoragem. Tais processos são
responsáveis pela constituição das representações sociais e foram abordados por
Moscovici (1978).
Para Jodelet, a objetivação é a transformação de um conceito ou de uma idéia
em algo concreto, uma vez que as informações que circulam sobre esse objeto sofrem
uma triagem em função dos condicionantes culturais e, sobretudo, dos critérios
normativos, guiados pelo sistema de valores do grupo, para proporcionar uma imagem
coerente do objeto representado. Consideram-se como condicionantes o acesso
diferenciado às informações em decorrência da inserção social do sujeito. A ancoragem
é a inserção orgânica de um conhecimento novo em um repertório de crenças já
constituído; ancorar é classificar, rotular, é o processo utilizado para o sujeito se
familiarizar com algo que lhe é estranho e conseqüentemente ameaçador. Em síntese,
ancoragem é o enraizamento social da representação por meio da integração cognitiva
do objeto representado no sistema de pensamento preexistente a partir dos fatores sociais
determinantes. De acordo com a autora, a interação dialética entre os processos de
objetivação e ancoragem permitem compreender de forma mais ampla como a
significação é conferida ao objeto representado e como a representação social é utilizada
como um sistema de interpretação do mundo. Na objetivação a intervenção dos fatores
sociais se dá no agenciamento e na forma dos conhecimentos relativos ao objeto
representado. Na ancoragem, essa intervenção se traduz na significação e na utilidade
que os fatores sociais conferem ao objeto representado, em que os elementos da
representação não apenas exprimem as relações sociais, mas contribuem para constituíla. A estrutura imaginante que é produzida no processo de ancoragem torna-se um guia
de leitura, uma referência para a compreensão da realidade. Para estudar as
44
representações sociais os pesquisadores podem optar por um dos processos, ou por
ambos, a depender do objeto de estudo que se pretende investigar.
Desde a publicação da pesquisa de Moscovici e a ampliação de seus estudos por
Jodelet, a teoria da Representação Social tem se propagado pelo mundo e conquistado
novos seguidores, especialmente após a década de 80. Numa revisão bibliográfica sobre
a referida teoria, verificou-se uma fertilidade muito grande na produção de estudos e
pesquisas em diferentes áreas do conhecimento que utilizam as representações sociais.
Os resultados das pesquisas indicam que trata-se de “uma teoria boa para pensar e, assim
apontar soluções, dar respostas para ação concreta”. (Arruda, 1998, p. 11). Contudo, a
expansão da teoria da Representação Social não impediu o surgimento de críticas sobre
sua validade científica no mundo acadêmico. Em geral, essas críticas se referem à falta
de rigor dos métodos utilizados na pesquisa, à falta de clareza na definição dos
conceitos, à qualidade hermenêutica da análise e à falta de hipóteses que possam ser
submetidas à verificação empírica. Na qualidade de criador da teoria, Moscovici tem
procurado responder as críticas, esclarecendo alguns pontos da teoria que foram mal
compreendidos e, por isso, combatidos. No prefácio da obra organizada por Guareschi e
Jovchelovitch (1994), Moscovici retomou e aprofundou alguns aspectos teóricos e
metodológicos acerca da teoria da Representação Social e defendeu a tese de que esta
deve permanecer criativa e aproveitar as contribuições de diferentes métodos, embora
suscitem resistências ou discordâncias. Para Moscovici, cabe ao cientista descobrir
novos princípios, novas teorias, novos métodos de verificação e isso não se aprende com
o método e sim com o exercício da pesquisa. A defesa apresentada pelo autor da teoria é
importante para consolidar o referencial de pesquisadores comprometidos com o uso das
representações sociais em investigações científicas. Porém, não se pode negar que
existem pesquisas sobre representações sociais que não usam nem mesmo os conceitos
básicos da referida teoria, limitando-se a arrolar falas dos entrevistados, com pouca ou
nenhuma tentativa de interpretação dos resultados. Na realidade, os resultados dessas
pesquisas não passam de “opiniões sobre” ou “imagens de”, sem nenhuma análise
teórica. Para evitar incorrer nos mesmos erros, é necessário que pesquisadores,
interessados em trabalhar com essa teoria, busquem um rigor metodológico coerente
com os pressupostos apresentados por Moscovici.
45
3.2 – As representações sociais nas pesquisas educacionais
As representações sociais interferem nas práticas sociais porque cada grupo
sociocultural tem seu sistema de significação construído e partilhado socialmente. Esse
sistema de significação orienta as atitudes sociais desejáveis e/ou admitidas em cada
segmento social. Uma vez em que essas representações interferem e/ou podem determinar
comunicações e atitudes sociais de indivíduos e/ou grupos sociais, fica patente a
importância desse conhecimento para as práticas sociais, especialmente a prática educativa
que atua na formação da personalidade humana. Simone Baillauquès (2001), num artigo
intitulado “Trabalho das representações na formação dos professores”, defende a tese
segundo a qual as representações devem ser vistas como algo relevante na formação dos
educadores. A autora apresenta inúmeros estudos que comprovam o efeito das
representações sociais na prática educativa e no exercício profissional dos docentes.
Destaca através de uma citação que as representações sociais são “instrumentos cognitivos
de apreensão da realidade e de orientação das condutas, as representações dos professores
podem ser consideradas como um dos meios a partir dos quais eles estruturam seu
comportamento de ensino e de aprendizagem” (Baillauqués, 2001, p. 35, apud, Charlier,
1989, p. 46).
A teoria da Representação Social oferece elementos essenciais para analisar os
mecanismos que interferem na eficácia do processo educativo, devido ao seu papel na
orientação
de atitudes na
prática educativa.
Os
educadores,
enquanto
grupo
socioprofissional, constroem representações sociais sobre sua profissão e os diferentes
aspectos da prática educativa, a partir de referenciais e experiências determinadas pelo
contexto sociocultural em que se encontram inseridos. A evolução histórica, no tratamento
dado às pessoas com deficiência, demonstra o efeito das representações nas atitudes sociais
de cada época, refletidas no contexto contemporâneo. De acordo com os pressupostos de
Moscovici, as representações sociais orientam e/ou geram as atitudes dos indivíduos e/ou
grupos sociais com relação aos diferentes aspectos da sua realidade cotidiana. Por isso,
pesquisar as representações sociais dos futuros docentes sobre “alunos com deficiência” se
constitui num aspecto importante, quando se deseja conhecer suas atitudes com relação à
inclusão de “alunos com deficiência”. Se os sistemas educacionais levassem em conta as
46
representações sociais dos docentes – antes de impor mudanças legislativas alheias à
realidade educacional – talvez houvesse maiores possibilidades de associar políticas
públicas de educação com práticas educativas.
As questões norteadoras do presente estudo se identificaram com a teoria da
Representação Social porque ela permite aos pesquisadores da educação investigar como se
formam e funcionam os sistemas de referência utilizados pelos docentes para classificar os
indivíduos e/ou grupos, interpretar os acontecimentos da realidade educacional cotidiana e
promover a orientação de atitudes dos educadores. As pesquisas14 educacionais brasileiras
que se utilizaram dessa teoria demostram suas vantagens para refletir acerca de aspectos da
prática educativa que fogem a visibilidade acadêmica. Como ilustração, vale destacar as
pesquisas de Alves-Mazzoti (1996 e 1998) que denunciam como os meninos de rua são
vistos socialmente no Brasil e revelam, dentre outras coisas, o impacto “dessa visão” na
orientação das atitudes sociais dos indivíduos e/ou grupos sociais que atuam com esses
sujeitos. As atitudes dos educadores, empregadores e familiares dos meninos de rua estão
coerentes com suas representações sociais sobre “meninos de rua” e interferem na forma de
agir desses sujeitos com relação aos referidos meninos. Essas pesquisas também apontam
algumas alternativas para repensar a educação dos meninos de rua, no contexto educacional
contemporâneo, e demonstram que os estudos sobre representações sociais devem estar
comprometidos com as mudanças sociais. Nessa perspectiva, as pesquisas educacionais,
que utilizam essa abordagem teórica, podem indicar caminhos para o sistema educacional
brasileiro repensar suas atitudes com relação à formação inicial docente, no contexto de
implementação das políticas de Educação Inclusiva.
Neste trabalho, procuramos conhecer as representações sociais dos estudantes de
Pedagogia sobre “alunos com deficiência”, a partir do contexto sociocultural da formação
inicial no ambiente universitário e das práticas educativas de contato com pessoas com
deficiência. A pesquisa partiu do pressuposto que “segundo o que o indivíduo diz, pode-se
deduzir o que ele vai fazer” (Moscovici, 1978, p. 46) para propor a seguinte idéia a
defender: as representações sociais dos estudandes de Pedagogia sobre “alunos com
deficiência” orientam suas atitudes com relação à inclusão desses alunos. Essa investigação
14
Trata-se de pesquisas realizadas por Madeira (2000), Dauster (2000), Teves (1999), Rangel (1999), Eizirik
(1999), Alves-Mazzoti (1996 e 1998), Gama (1991), Penin (1998), entre outras.
47
buscou provocar a fala dos informantes, para fazê-los produzir discursos que permitissem
apreender suas representações sociais sobre “alunos com deficiência”. Pois os discursos
produzidos pelos futuros pedagogos são elementos importantes para descobrir suas
representações sociais sobre “alunos com deficiência” e conhecer suas atitudes com relação
à inclusão dos referidos alunos. Cabe ressaltar que, neste estudo, foram descritos os dois
processos de produção das representações sociais – objetivação e ancoragem – mas o
processo de ancoragem não chegou a ser utilizado porque as questões norteadoras da
pesquisa estão contempladas no processo de objetivação. Neste processo, ocorre a
passagem de conceitos e idéias para esquemas e imagens concretas de um dado objeto
social. O presente estudo procurou identificar o processo de objetivação das representações
sociais sobre “alunos com deficiência” nos discursos dos estudantes de Pedagogia.
No decorrer da pesquisa, verificou-se ainda a necessidade de ampliar o referencial
das representações sociais com o estudo sobre estigma, para interpretar melhor as atitudes
apresentadas pelos estudantes de Pedagogia com relação à inclusão de “alunos com
deficiência”. A obra de Goffman, intitulada “Estigma: notas sobre a manipulação da
identidade deteriorada”, permitiu um avanço nas reflexões teóricas e metodológicas dessa
pesquisa. Segundo Goffman o termo estigma foi criado pelos gregos para se referir a
“sinais corporais com os quais se procurava evidenciar alguma coisa extraordinária ou mau
sobre o status moral de quem os apresentava” (Goffman, 1988, p. 11); na era cristã esses
sinais passaram a ter uma conotação divina. No contexto contemporâneo, esse termo é
usado de forma semelhante ao sentido original, ou seja, trata-se de um “atributo
profundamente depreciativo” (Goffman, 1988, p. 13).
A análise das representações sociais sobre a deficiência (Amaral, 1995)
demonstrou a presença de estigmas que se constituíram historicamente, no tratamento dado
as pessoas com deficiência, nas sociedades ocidentais. Tais estigmas contribuíram, também,
para a produção de atitudes sociais (Mazzota, 1993 e 1996) que marcaram diferentes
contextos socioculturais, reproduzidos na sociedade contemporânea. Para Goffman (1988),
a sociedade estabelece os meios de categorização das pessoas conforme atributos
considerados comuns e naturais para os membros de cada uma dessas categorias. Portanto,
nos ambientes sociais se estabelecem categorias de pessoas que têm probabilidade de serem
neles encontradas. Os “alunos com deficiência” sempre foram socialmente excluídos dos
48
ambientes das escolas regulares e a proposta de inclusão busca romper com essa prática.
Contudo, as “expectativas normativas”15 dos educadores exigem sempre uma determinada
identidade social dos educandos, especialmente quando se trata de educandos com
deficiência. De acordo com os estudos de Goffman, a identidade social de um indivíduo
e/ou grupo social só é aceita socialmente quando ocorre uma confluência entre sua
“identidade social real16” e sua “identidade social virtual”17. Quando um indivíduo e/ou
grupo social tem um atributo que o torna diferente de outros – da categoria de incluído – ele
passa a pertencer à categoria dos que não podem ser incluídos.
Assim, deixamos de considerá-lo criatura comum e total, reduzindo-o a uma pessoa
estragada e diminuída. Tal característica é um estigma, especialmente quando seu efeito de
descrédito é muito grande [...] e constitui uma discrepância específica entre a identidade
social virtual e a identidade social real. (Goffman, 1988, p. 12)
Esse processo pode ocorrer com os “alunos com deficiência” na proposta de
inclusão, caso não se acorde para a necessidade de uma formação inicial de docentes que
leve em consideração os conteúdos internos dos sujeitos. Por isso, fez-se necessário ampliar
o marco teórico desse estudo
com as contribuições de Goffman (1988). Analisar as
representações sociais sobre “alunos com deficiência”, e suas atitudes com relação à
inclusão dos referidos alunos sem o referencial de Goffman, poderia limitar as reflexões
dessa investigação. Na realidade, há uma tendência nas pesquisas educacionais em se
associar elementos da teoria da Representação Social de Moscovici e seguidores com os
estudos sobre estigma de Goffman. Com essa interlocução teórica buscamos ampliar as
possibilidades de análise e interpretação dessa investigação.
Para finalizar, o presente trabalho visa identificar as representações sociais dos
estudantes de Pedagogia sobre “alunos com deficiência”, a fim de conhecer suas atitudes
15
A expressão “expectativas normativas” é utilizada por Goffman para indicar as preconcepções que
indivíduos e/ou grupos sociais apresentam diante de um estranho, buscando “prever a sua categoria e os
atributos, a sua identidade social (Goffman, 1988, p. 12).
16
“Identidade social real” é uma expressão usada por Goffman para apontar no indivíduo “a categoria e os
atributos que ele, na realidade, prova possuir” (Goffman, 1998, p. 12).
17
“Identidade social virtual” é uma expressão usada por Goffman se referir as cobranças feitas “em relação
àquilo que o indivíduo que está à nossa frente deveria ser” (Goffman, 1998, p. 12).
49
com relação à inclusão dos referidos alunos, com base nos pressupostos teóricos
apresentados no decorrer deste capítulo. Especificamente objetivamos responder a duas
questões: a) Como se apresentam as representações sociais dos estudantes de Pedagogia
sobre “alunos com deficiência”? e b) Quais as atitudes dos estudantes de Pedagogia com
relação à inclusão desses alunos? Enfim, a partir dos dados encontrados na pesquisa
pretendemos responder essas questões e contribuir para aperfeiçoar o curso de formação
inicial em Pedagogia, no contexto de implementação das políticas de Educação Inclusiva
no Brasil.
50
II CAPÍTULO
ITINERÁRIO DE PESQUISA: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS ESTUDANTES
PEDAGOGIA SOBRE “ALUNOS COM DEFICIÊNCIA”
Já trazes, ao nascer tua filosofia
As razões? Essas vêm posteriormente
Tal como escolhes, na chapelaria,
A fôrma que mais te assente.
Mário Quintana, Antologia Poética
Fazer uma opção metodológica para pesquisas de cunho educacional não é uma
tarefa muito fácil, conforme aponta Brandão (2000), porque a área de educação ainda não
possui uma tradição disciplinar de pesquisa. Em função disso é necessário se recorrer aos
referenciais e instrumentos gerados por outros campos de conhecimento. Apesar dessa
limitação de ordem metodológica, existem pesquisas educacionais que apresentam um rigor
metodológico invejável e não deixam nada a desejar às pesquisas de áreas de conhecimento
que já apresentam uma tradição disciplinar de pesquisa. O pesquisador educacional precisa
ter clareza de que sua escolha metodológica deve estar coerente com as características do
seu objeto de estudo. Por isso, a metodologia mais adequada será sempre aquela que possa
melhor responder à investigação do objeto de estudo do pesquisador e a seleção dos
instrumentos de coleta de dados deve estar em consonância com o problema que se deseja
investigar. Ou seja, o mais importante na escolha metodológica do pesquisador educacional
é encontrar técnicas de pesquisa que possam representar as “soluções apropriadas à
natureza do seu objeto de estudo” (Lüdke, 1986, p.63).
As questões norteadoras da presente investigação se identificaram com a abordagem
qualitativa, porque se trata de uma pesquisa centrada na produção de discursos, visando
apreender as representações sociais dos sujeitos pesquisados. Cabe ressaltar que optamos
51
por abordar as representações sociais a partir do processo de objetivação, um dos
responsáveis pela produção das representações. O motivo dessa opção deve-se ao objeto de
estudo, cujos elementos essenciais estão contemplados no processo de objetivação. É uma
investigação que exige um mergulho no discurso dos informantes para obtenção de dados
em profundidade com base no que é dito e/ou silenciado. As representações sociais são
objetivadas quando ocorre a transformação de um conceito ou de uma idéia em algo
concreto, através da interação de aspectos sociais e psicológicos. A escolha metodológica
para uma pesquisa dessa natureza precisa estar amparada num referencial que ultrapasse o
nível da constatação, para poder descortinar as representações sociais dos estudantes de
Pedagogia sobre “alunos com deficiência” e desnudar atitudes relativas à inclusão desses
alunos. Procede, então, que a metodologia adotada esteja baseada nos princípios que
enfatizam as representações sociais, que precisam ser entendidas no contexto que as
constituem, em suas interações sociais cotidianas. No entendimento de Spink (1995), as
representações sociais inserem-se entre os estudos que buscam a desconstrução da retórica
da verdade e a hegemonia da causalidade. Por isso, as pesquisas que utilizam à teoria da
Representação Social necessitam de um rigor metodológico apurado, que leve em conta as
especificidades do contexto e as interações sociais cotidianas dos sujeitos pesquisados com
relação ao objeto de estudo representado.
Para se estudar as representações sociais são necessários dois requisitos básicos: 1)
Os sujeitos do grupo social pesquisado devem ter sentimento de pertencimento em relação
ao grupo no qual se encontram inseridos, ou seja, devem apresentar características que
determinem uma identidade grupal; e 2) O objeto social representado deve estar inserido,
de alguma forma, no imaginário social desse grupo. A análise de dados da investigação
pode ficar comprometida se esses requisitos não forem devidamente observados. Esse fato
ficou evidenciado na presente pesquisa, pois o objeto de estudo que se pretendia investigar
inicialmente era as Representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre Educação
Inclusiva. Entretanto, os dados recolhidos indicaram que a temática da Educação Inclusiva
não estava devidamente inserida no universo dos sujeitos pesquisados. Os estudantes de
Pedagogia não apresentavam representações sociais sobre a Educação Inclusiva porque
desconheciam o significado dessa expressão no contexto educacional. Quando eram
questionadas sobre o que entendiam da Educação Inclusiva, em geral, as entrevistadas nos
52
pediam uma explicação sobre o significado da referida expressão e/ou faziam inferências a
partir da associação dos vocábulos “Educação” e “Inclusiva”, com as questões tratadas na
entrevista.
Portanto, a realidade encontrada na análise de dados não conferiu com o objeto de
estudo previamente estabelecido. Diante dessa situação foi necessário retomar a trajetória
da pesquisa. Verificamos que um dos requisitos necessários ao estudo das representações
sociais foi desrespeitado na delimitação do problema e, por isso, a análise de dados ficou
comprometida: a proposta de Educação Inclusiva não se encontrava devidamente inserida
no imaginário social dos estudantes de Pedagogia. Contudo, uma análise mais aprofundada
do material revelou que os estudantes de Pedagogia expressavam, em seus discursos,
imagens, informações, crenças e concepções sobre “alunos com deficiência”, aspectos
necessários à apreensão das representações sociais. Dessa forma, optou-se por fazer evoluir
o objeto de estudo desta pesquisa, que deixou de ser Representações Sociais sobre
Educação Inclusiva e passou a ser Representações Sociais sobre ‘alunos com deficiência’.
A evolução do objeto de estudo desta pesquisa levou a seguinte idéia à defender: as
representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre “alunos com deficiência”
orientam suas atitudes com relação à inclusão desses alunos.
Esse fato demonstra que a pesquisa nem sempre segue a linearidade descrita nos
manuais de investigação científica. Por isso, o processo de investigação científica leva
tempo, exige reflexão, sintonia e muita atenção do pesquisador para tratar os dados
apresentados sobre seu objeto de estudo. Quando o objeto de estudo não se enquadra nos
dados coletados na pesquisa, é necessário rever a trajetória da investigação para procurar
alternativas que levem em conta os dados, mesmo correndo riscos de atrasar o percurso
delimitado no trabalho. Cabe ressaltar que a evolução do objeto de estudo da presente
investigação não alterou seu marco teórico/metodológico, pois o aspecto mais importante
da investigação manteve-se intacto: refletir sobre a relação entre a formação inicial em
Pedagogia e inclusão de “alunos com deficiência”, com base no referencial da teoria da
Representação Social.
53
1. Cenário da Pesquisa
Da minha Aldeia vejo o quanto da terra se pode ver no universo.
Por isso a minha Aldeia é tão grande como outra terra qualquer.
Porque eu sou do tamanho do que vejo.
E não do tamanho da minha Aldeia.
Fernando Pessoa, Obra Poética.
Esta pesquisa foi realizada com estudantes do curso de Pedagogia, em três
universidades da cidade de Salvador, no Estado da Bahia. As universidades selecionadas
foram consideradas tradicionais, porque são as mais antigas e bem conceituadas Instituições
de Ensino Superior responsáveis pela formação inicial da maioria dos docentes da capital
baiana. Essas instituições já desenvolvem trabalhos de pesquisa e/ou extensão na área de
formação docente e, paralelamente, oferecem cursos de pós-graduação voltados para
docência. As referidas universidades abrangem o universo do curso de Pedagogia em
diferentes vertentes institucionais: uma é da rede Pública Federal, outra é da rede Pública
Estadual e a terceira é da rede Privada. A título de informação, segue uma breve
caracterização do curso de Pedagogia em cada instituição pesquisada:
UFBA – Universidade Federal da Bahia
Foi criado em 1944, na Faculdade de Filosofia, unidade isolada de ensino, que, a
partir de 1946, passou a integrar a então Universidade da Bahia. O curso de Pedagogia,
como todos daquela época, tinha como objetivo preparar professores para as matérias
pedagógicas das Escolas Normais de Ensino Médio. Em 1969, com a reforma universitária,
o curso transferiu-se para a Faculdade de Educação, onde permanece até hoje. Nessa
ocasião, o Currículo do curso foi reformulado e passou a oferecer as habilitações em
Orientação Educacional, Supervisão Educacional e Magistério das Matérias Pedagógicas.
Esse Currículo permaneceu durante trinta anos, até o segundo semestre de 1999, quando foi
implantada uma nova proposta curricular que extinguiu as habilitações antigas. Tal
reformulação seguiu as orientações da Comissão de Especialistas no ensino de Pedagogia.
54
Entretanto, as estudantes pesquisadas são, em sua maioria, remanescentes das habilitações
antigas.
UCSAL – Universidade Católica de Salvador
O curso de Pedagogia da UCSAL começou a funcionar na Faculdade Católica de
Filosofia, em 1956. Com a reforma universitária de 1968, a UCSAL passou por uma
reestruturação e o curso de Pedagogia passou a funcionar na Faculdade de Educação. O
reconhecimento do curso Pedagogia ocorreu em 1970 e instituiu as habilitações em
Magistério
das
Matérias
Pedagógicas,
Administração,
Supervisão e
Orientação
Educacional. Essas habilitações ainda permanecem no curso de Pedagogia, pois a UCSAL
não empreendeu as mudanças curriculares relativas ao processo de reconfiguração iniciado
na década de 80. A finalidade da instituição, segundo regimento do curso de Pedagogia, é
formar profissionais da Educação para as funções específicas da docência e para coordenar
atividades pedagógicas.
UNEB – Universidade do Estado da Bahia
O curso de Pedagogia da UNEB foi criado em 1983, com o oferecimento de 80
vagas, em caráter experimental. Nessa época, a autorização para o funcionamento do curso
designou-o de Licenciatura plena em Educação com habilitação em Pré-Escolar e Séries
Iniciais. Em 1984, foi aprovada a Resolução de nº 1.339/84 que legalizou a situação do
curso; em 1985, realizou-se o primeiro vestibular para o curso de Pedagogia da UNEB. Em
1991, foi criada a habilitação em Magistério das Matérias Pedagógicas do 2º grau,
acrescentando-se mais 80 vagas para o curso de Pedagogia, o que perfez um total de 160
vagas, anualmente distribuídas nos três turnos. Em meados de 1999, foi implementado um
Currículo Novo no curso de Pedagogia da UNEB, que extinguiu as antigas habilitações.
Vale ressaltar que os alunos entrevistados são remanescentes das antigas habilitações.
55
1.1 - População e Amostra
A população escolhida para realização desta pesquisa foram os estudantes do último
semestre do curso de Pedagogia das instituições descritas. A escolha pelos alunos do último
semestre se deu porque nesse período do curso esses estudantes já passaram por todas as
etapas curriculares da formação inicial e estão pedagogicamente autorizados para assumir a
prática educativa. Em geral, os estudantes do último semestre de Pedagogia já atuam e/ou
devem atuar como educadores em escolas que recebem e/ou podem receber “alunos com
deficiência”, pois a legislação educacional brasileira determina a inclusão desses alunos no
ensino regular. Trata-se de uma população que já se deparou e/ou pode se deparar a
qualquer momento com a inclusão de “alunos com deficiência” em sua prática educativa.
Por isso, é importante apreender suas representações sociais sobre tais alunos, a fim de
conhecer e prever suas atitudes com relação à inclusão. Estudos recentes apresentados por
Baillauquès (2001) demonstram o impacto das representações sociais nas atitudes da
prática educativa docente. Portanto, “levar em consideração as representações contribui
para formação de professores profissionais ao longo de toda a sua evolução” (Baillauquès,
2001, p. 49), a começar pela formação inicial docente. Uma vez que as representações
sociais construídas ou reconstruídas na formação inicial podem se prolongar por toda a vida
profissional dos educadores e determinar suas atitudes com relação a inúmeros fatores da
prática educativa.
Para selecionar a amostra, visitamos as instituições escolhidas e comunicamos
nossa intenção de pesquisa à direção do curso de Pedagogia de cada universidade, a fim de
receber autorização para realizar a investigação. Após a autorização da direção, entramos
em contato com as turmas que estavam concluindo o curso de Pedagogia, no primeiro
semestre de 2001. Fizemos uma rápida explanação da pesquisa e solicitamos a participação
dos estudantes no trabalho de campo. Nas universidades públicas, houve em média 80% de
aceitação dos estudantes em participarem da pesquisa, enquanto na universidade privada a
aceitação caiu para 40%. Esses dados já apontam uma diferença na postura dos estudantes
das universidades públicas, em relação aos estudantes da universidade privada. Cabe
ressaltar que, em média, 95% dos estudantes matriculados estavam presentes, quando essa
explanação foi feita, conforme verificou-se na caderneta dos docentes de cada instituição
56
pesquisada. Os estudantes interessados em participar da pesquisa preencheram uma ficha
(anexo B), para serem contatados posteriormente, após a conclusão da disciplina de estágio
supervisionado, que geralmente é a única disciplina oferecida no último semestre do curso
de Pedagogia. Com as fichas de identificação dos estudantes, entramos em contato com
cada estudante, individualmente, para explicar o procedimento da entrevista, o horário
previsto para sua realização, solicitar sua autorização para gravação e agendar local e
horário, conforme disponibilidade de cada um.
Inicialmente definimos uma amostra formada por 10 alunos de cada instituição,
pois pretendíamos ter um número igual de participantes por universidade. Entretanto, na
testagem dos instrumentos, verificamos a necessidade de diminuir a amostra, porque
transcrever e analisar 30 entrevistas em profundidade, exigiria o dobro do tempo
estabelecido para a análise de dados. Em contrapartida, nos contatos individuais, alguns
estudantes desistiram de participar da pesquisa, alegando incompatibilidade com o tempo
previsto para realização da entrevista. Esses aspectos nos levaram a optar pela seleção de
uma amostra de 10% do total da população pesquisada, porque esse percentual permite um
nível equilibrado de participação de entrevistadas, conforme o número de estudantes
concluintes em cada instituição. Assim, a amostra desta pesquisa ficou constituída
conforme a tabela abaixo:
ESTUDANTES DE PEDAGOGIA DE UNIVERSIDADES DE SALVADOR-BA
INSTITUIÇÃO
CONCLUINTE
ENTREVISTADO
UFBA
48
5
UNEB
35
4
UCSAL
76
8
TOTAL
159
17
Período relativo ao semestre letivo de 2001.1
A caracterização dessa amostra foi organizada através do levantamento do perfil das
entrevistadas em quatro aspectos: pessoal, acadêmico, docente e nível de contato com
pessoas com deficiência (anexo E). Esse perfil buscou apresentar as entrevistadas e
57
identificar fatores do contexto sociocultural que interferem nas suas representações sociais.
Inicialmente, o sexo foi escolhido como um dos fatores, mas no decorrer da pesquisa esse
fator foi abandonado porque a amostra contemplada é formada basicamente por estudantes
do sexo feminino. A presença do sexo masculino é reduzida dentro do curso de Pedagogia e
não foi possível entrevistar nenhum estudante porque estes não se dispuseram a participar
da entrevista, alegando falta de tempo. De qualquer forma, a entrevista manteve algumas
questões referentes à concepção de gênero, para verificar como as estudantes do curso de
Pedagogia encaram a presença masculina na área da Educação. A maioria das estudantes
atribuiram a ausência de colegas do sexo masculino a questões de preconceitos, pois
consideram a sociedade brasileira muito machista. Na análise do perfil pessoal, verificamos
que a maioria das estudantes estão na faixa etária dos 20 anos, são solteiras e não possuem
filhos. Conforme os dados recolhidos na entrevista, das 17 estudantes apenas três se
encontram acima da faixa etária dos 20 anos. Outro fato interessante é que apenas três são
casadas, sendo que duas dessas possuem filhos. Dentre as solteiras, uma delas possui filhos.
Os dados indicam uma certa mudança no comportamento feminino dessas estudantes: o
casamento e a realização profissional passam por uma reelaboração de valores, sendo esta
privilegiada em relação àquele. Quanto ao perfil acadêmico, verificamos que a maioria das
estudantes entrou no curso após o ano de 1997. Das 17 entrevistadas, apenas cinco
ingressaram no curso antes desse período. Essa informação sugere que a maioria das
estudantes está concluindo o curso no tempo regular. Quanto ao perfil docente, a pesquisa
demonstra que, das 17 entrevistadas, cinco já tinham atuado como docente antes de
ingressar no curso, e sete fizeram o curso de Magistério no 2º grau. Por outro lado, muitas
das entrevistadas passaram a atuar como docente após o ingresso no curso, identificando-se
com a profissão. A maioria das entrevistadas aponta a desvalorização profissional e salarial
como o aspecto negativo mais gritante da carreira docente. Entretanto, consideram sua
formação importante para a sociedade e vêem a Educação como uma necessidade essencial
aos seres humanos. Geralmente fazem uma diferenciação entre Educação Formal e
Educação Informal, reconhecem o valor de ambas e apontam para a necessidade dos
governos valorizarem os educadores. A análise sobre os níveis de contato que as estudantes
de Pedagogia tiveram e/ou tinham com pessoas com deficiência revelou que existe uma
relação entre as representações sobre a deficiência com os níveis de contato com pessoas
58
com deficiência. Quanto mais contato das entrevistadas com pessoas com deficiência,
maiores são as possibilidades de aceitação social destas pessoas no universo psicossocial
daquelas. A maioria delas já teve um contato social com “alunos com deficiência”: os
dados indicam que, das 17 entrevistadas, 15 já tiveram algum tipo de contato social. Tal
contato é entendido como superficial, por ser de caráter informal, ocorrido no ambiente
social mais amplo: rua, ônibus, vizinhança, etc. Quando se trata do contato profissional e
familiar, entretanto, os discursos se modificam. Contato profissional, é entendido aqui
como um contato docente, no qual a entrevistada experimentou a docência com “alunos
com deficiência”. Os dados indicam que, das 17 entrevistadas, nove atuaram como docente
desses alunos, sempre em classes regulares, ou seja, trabalharam com a Educação Inclusiva,
apesar da maioria delas desconheceram completamente o significado desta expressão. O
nível de contato profissional demonstrou dois tipos de reação: de um lado, seis estudantes
relataram que tiveram essa experiência durante o estágio, em escolas públicas, sem
orientação acadêmica e consideraram a experiência difícil, inclusive uma delas chegou a
desistir do estágio, porque se sentiu incompetente para trabalhar com essa realidade. De
outro lado, três alunas que tiveram a experiência de atuar com “alunos com deficiência”,
em classe inclusivas em seu local de trabalho – duas como docentes de Escolas Privadas e
uma como instrutora de uma Empresa, em um curso de profissionalização – consideraram a
experiência rica para sua ação docente e para a formação de seus alunos. Reconhecem,
contudo, que não estavam preparadas para essa experiência e que não atenderam às
necessidades educativas especiais dos “alunos com deficiência”. No nível de contato
familiar, verificamos que, das 17 entrevistadas, duas possuíam pessoas com deficiência na
família. O nível de contato familiar apareceu como um determinante nas representações e
atitudes das estudantes de Pedagogia sobre “alunos com deficiência”, pois seus discursos
expressaram uma crença muito forte no potencial das pessoas com deficiência e uma
descrença muito grande nas políticas públicas de atendimento a essas pessoas no Brasil.
Essas entrevistadas tiveram contato familiar nos papéis de mãe e irmã e afirmam que
buscaram o curso de Pedagogia como meio para poder ajudar na educação de seus
familiares, uma vez que não contaram com profissionais qualificados nas instituições que
tiveram acesso.
59
1.2 - Métodos utilizados
A investigação está pautada num estudo descritivo de caráter explicativo porque
procurou descrever e caracterizar as representações sociais dos estudantes de Pedagogia
sobre “alunos com deficiência”, visando conhecer suas atitudes com relação à inclusão
desses alunos. Para conquistar os objetivos propostos na pesquisa tomamos por base
métodos teóricos e métodos empíricos, definidos na seqüência:
Métodos Teóricos
Os métodos teóricos foram utilizados com o objetivo de sistematizar, analisar, explicar,
comparar e tirar conclusões referentes às representações sociais dos estudantes de
Pedagogia sobre “alunos com deficiência”. Esses métodos “posibilitan, a partir de los
resultados obtenidos, sistemazarlos, analizarlos, explicarlos, descubrir qué tienen en común,
par llegar a conclusiones confiables que nos permitan reolver el problema” (Mezquita e
Rodríguez, 2001, p. 23). A presente pesquisa utilizou os seguintes métodos teóricos:
- Análise e síntese
Com esse método, buscamos valorar os elementos do problema e relacioná-los com os
aspectos da realidade estudada, a fim de interpretar com profundidade as características do
objeto de estudo. Esta pesquisa parte da análise geral dos elementos da realidade dos
“alunos com deficiência” e da formação inicial em Pedagogia, para estabelecer relações
com elementos mais específicos da prática educativa, a partir da caracterização das
representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre “alunos com deficiência”. Com
base nessa análise, elaboramos uma síntese: as atitudes que orientam e/ou podem orientar a
prática educativa dos estudantes de Pedagogia com relação à inclusão de “alunos com
deficiência” são determinadas pelas representações sociais.
60
- Histórico-lógico
Esse método foi usado porque o presente estudo partiu da análise do problema da educação
dos “alunos com deficiência” e da formação inicial em Pedagogia, numa perspectiva
histórica, com que buscamos demonstrar como as mudanças e as permanências interferem
na construção das representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre “alunos com
deficiência”. A utilização desse método visa compreender a lógica do problema a partir de
sua contextualização histórica. O presente estudo procurou abordar as concepções sobre a
deficiência, as políticas de Educação Especial e/ou Educação Inclusiva, a trajetória do curso
de Pedagogia e a teoria da Representação Social na perspectiva do método histórico lógico.
- Hipotético-dedutivo
Esse método foi usado na presente investigação porque se partiu do modelo teórico
sustentado na teoria da Representação Social – o que permitiu seguir as regras lógicas da
dedução – para defender a idéia de que as representações sociais dos estudantes de
Pedagogia sobre “alunos com deficiência” orientam suas atitudes com relação à inclusão
dos referidos alunos. Essa idéia apareceu como uma predição amparada em pressupostos da
própria teoria, que foi submetida à verificação no decorrer da pesquisa. A predominância
do método hipotético-dedutivo não implicou a ausência absoluta do método indutivo, pois
nessa investigação houve necessidade de repensar os caminhos delineados no itinerário da
pesquisa e fazer evoluir seu objeto de estudo. Portanto, a articulação desses métodos pode
ampliar as possibilidades de estudo numa pesquisa científica.
Métodos Empíricos
Os métodos empíricos permitem aos pesquisadores levantar os dados para realização das
pesquisas e verificar as hipóteses indicadas no problema. Nesta pesquisa, os métodos
empíricos foram responsáveis pela comprovação da idéia a defender, a partir da qual
afirmamos que as representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre “alunos com
deficiência” orientam suas atitudes com relação à inclusão dos referidos alunos. Os
métodos empíricos servem para
61
descubrir y acumular un conjunto de hechos y datos como base para verificar la hipótesis o
dar respuesta a las preguntas científicas de la investigacion, pero que no son suficientes para
profundizar en las relaciones esenciales que se dan en los processos pedagógicos (Mezquita
e Rodríguez, 2001, p. 23).
A presente pesquisa utilizou os seguintes métodos empíricos:
- Entrevista semi-estruturada
A entrevista semi-estruturada se constituiu no instrumento mais apropriado para a coleta de
dados da presente pesquisa, porque ela permite focalizar as condições de produção do
discurso, não apenas, o conteúdo das respostas. Outro aspecto que reforçou essa escolha é,
porque se trata de um instrumento que permite uma compreensão do problema da presente
pesquisa, ou seja, permite uma identificação dos significados dos discurso e suas lógicas de
produção. Para aplicar a técnica da entrevista semi-estruturada o pesquisador precisa ter um
certo rigor metodológico, pois seu uso exige uma atenção permanente por parte do
entrevistador, no sentido de relacionar sempre as respostas dos entrevistados aos objetivos
da pesquisa. O entrevistador/pesquisador deve colocar-se intensamente na escuta do que é
dito, a fim de refletir sobre a forma e o conteúdo da fala do entrevistado, sobre os
encadeamentos, as indecisões, as contradições, as expressões e os gestos. A condução do
processo de entrevista semi-estruturada requer do pesquisador equilíbrio para manter, ao
mesmo tempo, uma relação de engajamento e distanciamento com o entrevistado, o que
evita deformar as informações. O pesquisador/entrevistador precisa estar sempre atento ao
ritmo da entrevista para buscar a coerência, controlar o periférico e eliminar o supérfluo na
fala do entrevistado, a fim de atender sempre aos objetivos da sua pesquisa. Foi elaborado
um roteiro de entrevista (Anexo C), com 50 questões relativas à temática investigada com o
intuito de conduzir o processo de entrevista. Esse roteiro foi testado com quatro estudantes,
matriculadas no último semestre do curso de Pedagogia da UEFS – Universidade Estadual
de Feira de Santana – no segundo semestre de 1999. No processo de testagem, o roteiro
sofreu algumas alterações, pois verificamos que alguns termos dificultavam a comunicação
com os entrevistados. Tal fenômeno já representava um indício sobre a necessidade de
62
fazer evoluir o objeto de estudo desta pesquisa. Entretanto, naquele momento, só atentamos
para a expressão aluno com NEE – Necessidades Educativas Especiais – que era utilizada
em todas as questões para se referir aos “alunos com deficiência”. A testagem revelou que
essa expressão era desconhecida para as estudantes de Pedagogia porque as entrevistadas
sempre solicitavam uma explicação conceitual. Como “toda generalização gera o
empobrecimento da compreensão” (Amaral, 1994, p. 29), resolvemos transgredir o uso da
expressão oficial de aluno com NEE para garantir uma melhor comunicação. A expressão
“aluno com deficiência” permitiu uma interlocução produtiva com os entrevistados, fator
imprescindível numa investigação que tem a produção de discurso como elemento de
análise. A expressão “aluno com deficiência” foi inspirada na terminologia “pessoa com
deficiência”18, usada por alguns autores, como Claúdia Werneck (1999), Geraldo Bueno
(1997 e 1999) e Ligia Assumpção do Amaral (1995 e 1997), entre outros, que foram
citados na construção do marco teórico do presente estudo. À medida que essa pesquisa
trata de aspectos relativos à prática educativa, o uso da expressão “aluno com deficiência”
torna-se mais adequado por permitir uma identificação imediata do seu significado. Juntar
os vocábulos “aluno” e “deficiência” é uma forma de trazer tais alunos para a prática
educativa. Inclusive, o uso dessa terminologia pode provocar concepções e atitudes sociais
enraizadas historicamente no tratamento dado às pessoas com deficiência. As reações
diante dessa terminologia constituem-se indícios que podem revelar diferentes
representações sociais sobre os referidos alunos. Outro aspecto apontado na testagem desse
roteiro foi a necessidade de reduzir a amostra. As questões da entrevista suscitavam uma
imensa produção de discursos, impossíveis de serem analisados no tempo previsto para
análise de dados, trabalhando-se com uma amostra de 30 informantes. Optamos por reduzir
a amostra para 17 informantes, número equivalente ao percentual de 10% da população
pesquisada. O roteiro de entrevista foi organizado em duas partes e as questões seguem
uma ordem de aprofundamento: na primeira parte ficaram as questões que tratam de
aspectos relativos à identificação do entrevistado e a sua escolha profissional pelo curso de
Pedagogia; na segunda parte, ficaram as questões relativas à prática educativa com relação
18
Essa expressão é utilizada para se referir a pessoa que “apresenta, em comparação com a maioria das
pessoas, significativas diferenças físicas, sensoriais ou intelectuais, decorrentes de fatores inatos e/ou
adquiridos, de caráter permanente e que acarretam dificuldades em sua interação com o meio físico e social”
(PNEE, 1994, p. 22).
63
aos “alunos com deficiência”. As entrevistas foram realizadas entre os meses de junho e
agosto de 2001, após o encerramento do estágio em cada uma das universidades
pesquisadas. O estágio é acompanhado pela disciplina de estágio supervisionado,
considerada o passaporte na profissionalização do docente, porque confere a comprovação
da experiência na prática educativa institucionalizada. De modo geral, esse estágio acontece
de forma isolada no último semestre do curso de Pedagogia, conforme se verificou na
experiência das estudantes pesquisadas nessas três instituições universitárias. Por fim, cabe
ressaltar que o tempo de realização das entrevistas durou, em média, uma hora e trinta
minutos, confirmando a previsão feita na testagem do roteiro de entrevista.
- Análise de Conteúdo
A metodologia adotada na análise de dados da presente investigação teve como
procedimento básico o método de análise de conteúdo, baseado nos estudos de Bardin
(1977). A análise de conteúdo
é um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando obter, por procedimentos,
sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (qualitativos
ou não) que permitam inferência de conhecimentos relativos às condições de
produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (Bardin, 1977, p. 42).
Esse procedimento permite que se trabalhe com um corpus reduzido de material,
estabelecendo-se categorias nas quais é mais relevante a presença do que a freqüência de
um elemento. A validade da análise de conteúdo decorre, sobretudo, das deduções
específicas propiciadas a partir das inferências acerca do fenômeno estudado. A análise de
conteúdo empreendida neste estudo foi do tipo temática conforme descrição de Bardin
(1977). É temática porque o tema é considerado como a unidade de significado e guia de
leitura para conhecer as representações sociais que emergem do discurso das entrevistadas.
Por meio desse procedimento, buscamos analisar o processo de objetivação, que é um dos
responsáveis pela produção das representações sociais.
64
2. Análise de resultados
Se as coisas são inatingíveis...ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que triste os caminhos, se não fora
A presença distante das estrelas!
M. Quintana, Antologia Poética
Inicialmente transcrevemos as entrevistas e submetemos estas a uma primeira
leitura para estabelecer o perfil das entrevistadas (fase de pré-análise). Em seguida
procedemos a leitura flutuante19 das entrevistas para obter uma impregnação de seu
conteúdo, com base no olhar temático, e registramos as primeiras pistas da análise de
conteúdo (fase de exploração do material). Em seguida, fizemos uma releitura do material e
estabelecemos os significados que as entrevistadas atribuíam aos “alunos com deficiência”.
Esses significados foram agrupados por ordem de semelhanças, categorizados e nomeados
de acordo com o discurso produzido pelas entrevistadas (fase de tratamento dos dados). Por
fim, elaboramos a descrição e a explicação do conteúdo das categorias encontradas, a partir
do processo de objetivação (fase de inferências), descrito por Moscovici (1978), em sua
pesquisa sobre Representação social da Psicanálise. Ressaltamos que as representações
sociais dos estudantes de Pedagogia sobre “alunos com deficiência” foram levantadas de
acordo com os procedimentos apresentados na obra de Bardin (1977) e sistematizadas
conforme nosso Guia de Análise de Conteúdo (anexo D).
Empreendemos uma nova análise sobre o material com o objetivo de identificar
atitudes sociais dos estudantes de Pedagogia com relação à inclusão de “alunos com
deficiência”. Nessa etapa, buscamos verificar se as representações sociais dos estudantes de
Pedagogia sobre “alunos com deficiência” orientam suas atitudes com relação à inclusão
desses alunos. Fizemos uma releitura das entrevistas de acordo com as representações
sociais levantadas na etapa anterior e identificamos as atitudes sociais produzidas em cada
19
Leitura flutuante é o cruzamento da leitura vertical; onde lê-se individualmente cada entrevista, com a
leitura horizontal; onde lê-se o conjunto das entrevistas na ordem das questões do roteiro de entrevista
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representação. Para encerrar, comprovamos a idéia a defender nesse presente estudo,
cruzando - as representações sociais sobre “alunos com deficiência” e as atitudes com
relação à inclusão dos referidos alunos - apresentadas pelas estudantes de Pedagogia nas
etapas anteriores.
2.1 - Descortinando as representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre
“alunos com deficiência”
Descortinar as representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre “alunos
com deficiência” implica, antes de tudo, reconhecer como a sociedade contemporânea tem
representado as pessoas com deficiência. Nesse sentido, cabe trazer os estudos de Goffman
(1988), para clarificar que a sociedade sempre estabelece os meios de categorização das
pessoas, conforme atributos considerados como comuns e naturais para os membros de
cada uma das categorias socialmente construídas. A partir dessa categorização, são
produzidas as “preconcepções” sociais que, posteriormente, serão transformadas em
“expectativas normativas” (Goffmann, 1988). As pessoas com deficiência pertencem a uma
categoria de sujeitos que fogem às “expectativas normativas”, porque não atendem aos
atributos de beleza, perfeição, funcionalidade, força e eficiência cultuados nas sociedades
ocidentais. Ao pesquisar as formas de representações da deficiência no universo mais
amplo da cultura ocidental, Amaral constatou que:
O outro, o deficiente, o diferente, representa muitas e muitas coisas. Representa a
consciência da própria imperfeição daquele que se vê, espelha suas limitações, suas
castrações. Representa também o sobrevivente, aquele que passou pela catástrofe e a ela
sobreviveu, com isso acenando com a catástrofe em potencial, virtualmente suspensa sobre a
vida do outro. Representa também uma ferida narcísica em cada pai, em cada profissional,
em cada comunidade. Representa um não camuflável, não escamoteável – explícito – em
cada dinâmica de interrelações. (Amaral, 1994, p. 30)
Por estarem inseridos nessa sociedade, os estudantes de Pedagogia partilham das
“preconcepções” – enraizadas historicamente – que determinam padrões de normalidade,
conforme os atributos estabelecidos socialmente. Para compreender a origem das
66
representações sociais apresentadas pelas estudantes sobre “alunos com deficiência”, fez-se
necessário recorrer ao estudo sobre estigma. Uma vez que os “alunos com deficiência”
apresentam atributos divergentes daqueles exigidos pela sociedade, as representações
sociais das estudantes sobre os referidos alunos podem se constituir em estigmas. Segundo
Goffman (1988), o estigma ocorre porque a sociedade impõe aos seus membros uma
“identidade social virtual”, para modelar a “identidade social real” dos indivíduos e/ou
grupos sociais. Quando existe alguma discrepância entre essas duas categorias de
identidades, aparece o estigma, como “atributo profundamente depreciativo” (Goffman,
1988, p. 13). Os “alunos com deficiência” podem ser estigmatizados porque seus atributos
não são aceitos socialmente, ou seja, ocorre uma incongruência entre a “identidade social
real” e a “identidade social virtual” desses alunos.
Em geral, as instituições de ensino reproduzem o comportamento da sociedade com
relação aos indivíduos estigmatizados. Há uma tendência dessa situação ocorrer no
processo de formação inicial docente e se perpetuar em diferentes aspectos da prática
educativa. A transgressão da reprodução da ordem social ameaça as estruturas de poder, nas
quais as próprias instituições de ensino se encontram inseridas. O curso de Pedagogia
constitui-se num espaço potencialmente favorável à produção de representações sociais
sobre “alunos com deficiência”, embora o contexto de formação universitária seja
dialeticamente um espaço destinado a construção e/ou reconstrução de conhecimentos.
Contudo, à medida que as representações sociais das estudantes de Pedagogia sobre
“alunos com deficiência” são desalojadas, a questão do estigma pode ser denunciada e
enfrentada no próprio processo de formação docente. Esta pesquisa oferece pistas para se
pensar sobre o impacto das representações sociais nas atitudes dos futuros docentes.
Esperamos que os dados permitam uma reflexão crítica sobre essa realidade. Na análise de
conteúdo do discurso das estudantes sobre os referidos alunos, verificamos muitas
semelhanças com as categorias apresentadas por Amaral, em sua pesquisa sobre
representações sociais da deficiência, no contexto mais amplo da cultura ocidental. A
autora aponta que as pessoas com deficiência são representadas segundo os moldes préestabelecidos de “normalização, heroicidade ou vitimização” (Amaral, 1994, p. 45). Apesar
das semelhanças, o presente estudo optou por nomear as representações sociais, conforme
aparecem no discurso das entrevistadas: As estudantes de Pedagogia representaram os
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“alunos com deficiência” como: aluno carente, aluno super-herói, aluno comum e aluno
com necessidades e potencialidades. Cabe ressaltar que essas expressões aparecem de
forma textual no discurso das entrevistadas. Segue a descrição e a caracterização de cada
uma das representações sociais sobre “alunos com deficiência” apresentadas pelos
estudantes de Pedagogia, conforme a freqüência indicada na tabela abaixo:
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE “ALUNOS COM DEFICIÊNCIA”
Aluno carente Aluno super-herói
4
3
Aluno comum Aluno
potencialidades
necessidades
8
com
e
2
- Aluno carente
A representação social de aluno carente aparece de forma declarada na fala de
algumas das estudantes. Essa fala evidencia que existe uma falta, uma privação, uma
necessidade no “aluno com deficiência” que o faz carente. Essa carência desloca o “aluno
com deficiência” do padrão de normalidade humana. De acordo com Goffman (1988), a
normalidade humana é imprimida por determinados atributos que padronizam um ideal de
perfeição. Nesse ideal aparece a figura do homem perfeito, vidente, ouvinte, falante,
inteligente, heterossexual, branco, rico, etc. Como a deficiência foge ao ideal esperado de
simétrico, de belo, de eficiente, de perfeito, etc., ela ameaça, desorganiza e provoca uma
hegemonia emocional nos sujeitos e/ou grupos considerados “normais”. Assim, a
representação social de “aluno com deficiência” como carente evidencia sentimentos de
pena, repulsa e medo, conforme denuncia o discurso dessas entrevistadas:
Não é querendo ser pessimista, eu acho assim positivo pessoas (com deficiência), que tão
conseguindo ser independente, mas é eu acho que é muito difícil pra pessoa. Se eu puder, eu
não quero ter relação com essas pessoas porque me passa um sentimento de angustia...
(Aluna M, UFBA – grifos nossos)
...uma vez, me disseram que a professora estava com um projeto de botar alunos com
deficiência, com debilidade, né, pra estudar na sala, né, dos alunos normais. E de certa
forma, você sabe que esses alunos às vezes eles tem uma certa agressividade, meu temor
seria no tocante a isso... (Aluna C.C, UCSAL – grifos nossos)
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A representação social de aluno carente desloca o “aluno com deficiência” para
uma posição de rebaixamento. Esse aluno passa a ser categorizado como um ser
incompleto, um ser que está em falta e, por isso, é representado como carente. Nessa
representação, o “aluno com deficiência” é visto com alguém que sempre apresenta uma
falta, é incompleto, impotente e encontra-se aquém do humano. No discurso da
entrevistada, é possível objetivar o significado que o vocábulo “carente” assume nessa
representação :
Quando eu digo assim: aquele menino é deficiente, é que aquele menino está carente de
alguma coisa, é um deficiente físico, que tá faltando uma perna ou um braço, as vezes um
olho, uma audição... (Aluna M, UCSAL – grifos nossos).
Os argumentos utilizados para vitimar os “alunos com deficiência” e representá-los
como carentes, aparecem amparados por concepções filosóficas, bíblicas e religiosas que
marcaram diferentes contextos históricos. No discurso das estudantes de Pedagogia é
possível identificar essas concepções. Elas aparecem na figura do sofredor, do prisioneiro,
do coitadinho, do bichinho, conforme apresentava os religiosos da Idade Média que
amparavam pessoas com deficiência em suas instituições de caridade. É interessante
observar como essas concepções aparecem, sutilmente, no discurso das estudantes, no
contexto de implementação da proposta de Educação Inclusiva:
Lá na faculdade a gente tinha um colega que é deficiente visual (...), eu notava, o meu
colega, eu notava que os professores não ligavam para o rapaz, ele lá sentado coitado, ele
participava, ele perguntava para caramba, sabe? (...) Os professores cortavam o menino
falando, ele nem completava o raciocínio, sei lá, e a gente ficava: Meu Deus do céu, o
bichinho não tem direito a falar e o professor mostrava mesmo impaciência, sabe? (Aluna
M, UCSAL – grifos nossos)
Cabe ressaltar que as estudantes de Pedagogia, que expressam a representação social de
aluno carente, geralmente, colocam-se na posição de alunas e não de educadoras, que
69
assumem e/ou devem assumir a prática educativa, no contexto de implementação da
proposta de Educação Inclusiva no Brasil.
- Aluno super-herói
Em oposição à representação social de aluno carente, aparece a representação de
aluno super-herói. Aparentemente essa representação social é o inverso da representação
do aluno carente, porque o super-herói é visto como aquele que tudo pode. Contudo, essas
duas representações sociais são semelhantes porque ambas afastam o “aluno com
deficiência” da possibilidade de ser reconhecido como pessoa. Ambas retiram do sujeito a
sua verdadeira humanidade, ou seja, a possibilidade de ser aceito simplesmente como uma
criatura humana, que tem limites e potencialidades. Enquanto o carente é considerado
impotente porque se encontra aquém das “expectativas da normalidade” (Goffman, 1988),
o super-herói é considerado onipotente porque encontra-se muito além das expectativas
humanas. Na realidade, a diferença que separa essas duas representações é que uma
focaliza apenas a falta e a outra exige sempre o excesso, o que encontra-se acima dos
limites humanos do “aluno com deficiência”.
A representação social de aluno super-herói implica deslocar o “aluno com
deficiência” de sua condição humana e colocá-lo numa posição de mito, de semideus, de
pessoa incomum, um descendente da divindade que não faz parte da humanidade. O superherói representa a superioridade desprovida de inteligência e dirigida apenas por forças
espirituais. O “aluno com deficiência” é representado como super-herói porque passa a ser
visto como aquele que transcende sua condição humana através de uma força sobrenatural
que lhe é atribuída de forma inexplicável.
Teve um indivíduo lá no CAP (Centro de Apoio Pedagógico), né, que ele tinha deficiência
visual e o que é que ele fez? Ele reconhecia as pessoas pelo toque, eu achei isso fantástico,
porque ele encontrou uma professora, isso eu estava presente e observei, que ele abraçou
essa pessoa e ele disse: você deve ter perdido os 2 quilos, fulana! Eu achei aquilo
fantástico... (Aluna P, UNEB – grifos nossos)
70
É como se o “aluno com deficiência” fosse dotado de um poder sobrenatural e não
tivesse que fazer um esforço individual para desenvolver suas funções psíquicas superiores,
a fim de compensar e/ou transformar suas limitações. A representação social de super-herói
exige muito do “aluno com deficiência”. Para ser “reconhecido” e “valorizado” socialmente
ele terá que atender às expectativas de um “olhar” de superioridade que o “outro” lhe
imprimiu. Nesse “olhar”, o desempenho do “aluno com deficiência” é considerado como
algo externo a ele, uma concessão “divina” como recompensa porque, como super-herói, o
referido aluno suporta exemplarmente um destino incomum, como, por exemplo, um
extremo infortúnio ou sofrimento provocado pela própria deficiência. Esse discurso retrata
como a representação social de aluno super-herói está presente na prática educativa:
No meu estágio na escola pública eu também tive contato com alunos cegos, de outras
classes diferente daqui eu estagiei. Eu achava essas alunas umas heroínas. (Aluna C, UFBA
– grifos nossos)
Representar o “aluno com deficiência”, como super-herói, significa ocultar suas
fragilidades humanas, enquanto pessoa, gente. O “aluno com deficiência” precisa se
esforçar muito para assumir o papel de super-herói, porque esse papel implica em negar
e/ou camuflar seus limites humanos, inclusive os limites provocados pela própria
deficiência. A representação social de aluno super-herói retira a identidade histórica da
deficiência e mascara a realidade desses alunos com uma superioridade que não é comum à
visão estereotipada que lhe foi conferida socialmente. Portanto, tal representação exige que
o “aluno com deficiência” supere todos os limites e obstáculos gerados pela sua condição
humana de pessoa com deficiência. À medida que os obstáculos sociais tornam-se imensos,
só sendo super-herói para poder ultrapassá-los.
Eu tive um contato com um colega meu de faculdade, ele é deficiente visual, né, e eu me
admirei com a capacidade dele de... de... entender as coisas de aprendizagem. Ele é superesforçado, super-estudioso, e (...) como a deficiência às vezes não atrapalha a questão da
capacidade quando a pessoa tem força de vontade. Então esse colega meu, ele é assim:
super-inteligente, super-dedicado, tem um conhecimento bastante profundo das coisas e isso
daí me surpreendeu bastante. (Aluna MG, UCSAL – grifos nossos)
71
Contudo, essa heroicidade requer que o “aluno com deficiência” esteja sempre na
frente, rompendo com sua condição de pessoa com deficiência e se transformando em mito.
Mas a posição de mito faz com que o “aluno com deficiência” continue segregado do
convívio social, pois o mito fica sempre distante da realidade para ser idolatrado. Quando o
mito se aproxima da realidade é porque ele deixou de ser mito e aí, geralmente, o mito
passa a ser marginalizado.
- Aluno comum
Em contraposição a essas duas representações sociais aparentemente antagônicas
sobre “alunos com deficiência”, aparece a representação de aluno comum. Cabe ressaltar
que essa representação foi a que mais se sobressaiu no material analisado. Tal
representação busca traduzir a expressão “normificação”, usada por Goffman (1988), para
explicar o esforço do indivíduo estigmatizado, em apresentar-se como uma pessoa comum.
Esse esforço leva o indivíduo a negar sua diferença. A representação social de aluno
comum aparece quando esse fenômeno explicado por Goffman (1988) ocorre no discurso
das entrevistadas, ou seja, quando as estudantes de Pedagogia se esforçam em apresentar os
“alunos com deficiência” como uma “pessoa comum” e negam a deficiência. Essa
representação é tão dissimulada que não foi identificada de forma imediata, inicialmente
consideramos como uma representação inovadora. O debruçar-se nas entrelinhas do
discurso das entrevistadas, sob a ótica de Goffman (1988), fez com que a representação
social de aluno comum fosse descortinada. Sempre que ocorre a neutralização das
diferenças que marcam a identidade do “aluno com deficiência” surge a representação
social de aluno comum. Tal representação social implica numa exigência de adequação do
“aluno com deficiência” a padrões de normalidade estabelecidos socialmente. Nessa
representação, a aparência, a aprendizagem e o desempenho do “aluno com deficiência”
devem aproximá-lo ao máximo do esteticamente usual e do pedagogicamente tradicional.
Quando o “aluno com deficiência” é representado como aluno comum, sua deficiência é
negada.
72
Eu não acho que existe aluno com deficiência, eu acho que existem alunos diferentes, como
existem pessoas diferentes, como existem pessoas diferentes, né? Normal, mas, assim, eu
acho essa palavra muito pesada, não faz parte do meu cotidiano, não gosto de usar,
entendeu, nem por brincadeira, eu acho que essa palavra traumatiza porque separa... Pra
mim, não existe deficiência, pra mim a gente tem que saber lidar com as diferenças. A
questão da dificuldade de aprendizagem, eu acho a dificuldade de aprendizagem, ela tá pra
todos, tá pra mim, tá pra você, tá pra todos, né? Eu acho que a questão da dificuldade de
aprendizagem acontece só quando você não é... como é que eu posso dizer, é quando você
ainda não absorveu aquele conhecimento, que na medida que você absorve a dificuldade
acaba, entendeu? (Aluna P, UCSAL – grifos nossos)
A negação da deficiência aparece camuflada pelo discurso moderno de respeito à
diversidade. Considerar o “aluno com deficiência” como uma pessoa diferente é uma coisa,
negar que essa diferença é uma deficiência é outra coisa completamente diferente. Porque a
deficiência existe e interfere na forma de ser, de aprender e fazer dos sujeitos. Então, não dá
para colocar a deficiência no mesmo lugar das dificuldades de aprendizagem. Mesmo
porque a deficiência nem sempre implica uma dificuldade de aprendizagem, embora
implique sempre numa “necessidade educativa especial” do sujeito.
As
entrevistadas,
em
muitas
situações,
utilizam
a
estratégia
do
“encobrimento”(Goffman, 1988), para mascarar a realidade dos “aluno com deficiência”.
Nessa estratégia, as “pessoas íntimas” do indivíduo estigmatizado podem “servir como um
círculo protetor que lhe permite pensar que é mais amplamente aceito como pessoa normal
do que ocorre na realidade” (Goffman, 1988, p. 109). Tal estratégia expressa uma posição
de ambigüidade porque as estudantes de Pedagogia procuram se aproximar dos “alunos
com deficiência” por meio do discurso da “valorização das diferenças” e dialeticamente
negam a existência da deficiência porque anulam a identidade e transformam os referidos
alunos num aluno comum:
Por um lado eu acho interessante eles (“os alunos com deficiência”), serem encarados assim
como pessoas normais como são, mas por outro lado, eu fico preocupado com o fato deles
estarem numa classe dos ditos normais, onde as necessidades especiais desses alunos não
fossem consideradas e eles ficassem isolados e colocados a parte da turma, isso seria
péssimo, né?... Na realidade, eu acho que esse aluno deve ser encarado sempre como um
aluno comum (Aluna G, UNEB – grifos nossos)
73
Essa ambigüidade é fruto do processo de simulação comum na sociedade
contemporânea. O discurso das entrevistadas pode levar os “alunos com deficiência” a
pensar que eles são amplamente aceitos como uma “pessoa comum”. Tal discurso pode
mascarar uma realidade sociocultural que segrega e marginaliza os referidos alunos. A
representação de aluno comum nega essa realidade sociocultural, manipulando a identidade
do “aluno com deficiência” para fazer de conta que a deficiência não existe. Nessa
representação, as diferenças provocadas pela deficiência são neutralizadas ao máximo: a
aparência, a aprendizagem e o desempenho do “aluno com deficiência” deve aproximar-se
ao máximo dos “parâmetros de normalidade” (Amaral, 1994) impostos pela sociedade.
Acrescenta-se a isso o fato desses parâmetros serem sempre mais rígidos e estáticos com
relação à pessoa com deficiência do que seriam de forma geral. Portanto, a representação
social de aluno comum pressupõe uma falsa aceitação do “aluno com deficiência”, revelada
nas entrelinhas de um discurso moderno de respeito às diferenças. Entretanto, por trás desse
discurso se esconde a negação do “aluno com deficiência” em sua mais alta subjetividade:
Como eu falei todo aluno apresenta a gente uma deficiência, não precisa ser uma síndrome
de down ou uma encefalia, tem crianças tímidas, tem crianças extrovertidas e mais tem
crianças que tem hiperatividade... Todo mundo tem uma deficiência, eu acho que é difícil
pegar uma sala homogênea, todo mundo tem sua especificidade Então o aluno com
deficiência é simplesmente um aluno comum, uma pessoa, né? ( (Aluna C, UFBA – grifos
nossos)
Nesse discurso de que “todo mundo tem uma deficiência”, encontra-se uma negação
da subjetividade da pessoa com deficiência em sua escala mais alta, porque mascara uma
identidade falsa com relação ao “aluno com deficiência”. Comparar a deficiência com a
timidez é uma forma de minimizar e/ou simular as necessidades educativas especiais desses
alunos. A representação social de aluno comum dita as normas e o preço que os “alunos
com deficiência” têm que pagar para serem aceitos socialmente e, ao mesmo tempo,
favorece a omissão dos governos no atendimento às necessidades educativas especiais dos
referidos alunos.
74
- Aluno com necessidades e potencialidades
A representação social do aluno com necessidades e potencialidades é a que menos
se sobressaiu na análise de dados. Nessa representação, os discurso das entrevistadas
assumem a deficiência como uma diferença característica dos “alunos com deficiência” que
implica, geralmente, numa limitação física, sensorial e/ou cognitiva. Entretanto, essas
estudantes procuram ressaltar que as limitações provocadas pela deficiência não impedem o
desenvolvimento do potencial educativo dos “alunos com deficiência”. O discurso das
entrevistadas, que apresentam essa representação, demonstra uma certa indignação com
relação ao tratamento dado aos “alunos com deficiência” pela sociedade. Nesse sentido, a
representação social de aluno com necessidade e potencialidade destoa das demais
representações identificadas na presente investigação. As estudantes de Pedagogia que
apresentam tal representação falam de uma posição muito próxima dos “alunos com
deficiência”, pois convivem com pessoas com deficiência na família de forma muita
próxima: uma é mãe e a outra é irmã. Essa experiência de contato familiar - muito próximo
- interfere de forma significativa na produção dos discursos das entrevistadas, pois ambas
assumem uma posição muito clara com relação à deficiência:
Pra mim eu acho que é uma deficiência é muito complicada porque isso pode acarretar em
problemas para o aluno. Você pode tratar desses problemas, mas é muito complicado porque
cada aluno tem um problema complemente diferente do outro. Cada um demonstra a você
de uma forma completamente diferente, entendeu? Mas, isso não significa que esse aluno
não tenha capacidade para aprender. (Aluna M, UNEB - grifos nossos)
Pelo o que eu vivi, pelo o que eu já li e pelo que eu conheço um pouco, penso que para atuar
com um aluno que tenha uma deficiência é preciso, antes de tudo, saber diagnosticar. Para
diagnosticar é preciso ter um conhecimento sobre a deficiência. Eu penso que as
potencialidades e necessidades desses alunos precisam ser bem compreendidas pelos
professores. (Aluna T, UNEB - grifos nossos)
Essas entrevistadas se colocam no discurso de forma veemente, fato marcado pela repetição
do pronome na primeira pessoa do singular. As estudantes que apresentam a representação
75
social de aluno com necessidade e potencialidade encaram a deficiência de frente, sem
subterfúgios: reconhece as limitações e as possibilidades dos “alunos com deficiência”. O
discurso permanece na primeira pessoa, mesmo quando uma das entrevistadas se coloca na
posição de educadora e assume que:
Nós que trabalhamos com esse aluno, percebemos que ele tem necessidade e tem
potencialidade. Ele tem a capacidade, agora...às vezes o que falta é a nossa capacidade para
despertar esse potencial. Eu acho que a gente precisa enfrentar nossa deficiência educativa
enquanto professores. (Aluna M, UNEB - grifos nossos)
Ao representar os “alunos com deficiência” como aluno com necessidade e
potencialidade, as entrevistadas reconhecem os limites e as possibilidades desse aluno, sem
colocá-lo acima ou abaixo de padrões sociais determinados. Essa representação implica
uma aceitação da identidade desse aluno, independentemente da sua deficiência e/ou
diferença.
Eu acho assim, aquela criança que...a criança, o adulto, a pessoa, seja lá quem for, a pessoa
chamada de deficiente, é porque ela não segue as regras né, da normalidade social. No caso,
né, o que socialmente se acredita que seja o normal. Não é? E quem garante o que é normal?
(...) Pra mim ela é deficiente, no sentido que ela tem algumas limitações diante das pessoas
ditas normais. Mas porém, elas tem outras habilidades que as ditas normais não tem tanta
competência quanto elas. (Aluna T, UNEB - grifos nossos)
O material analisado indica que a representação social dos “alunos com deficiência”
como aluno com necessidade e potencialidade não é comum no discurso das estudantes de
Pedagogia. As entrevistadas que apresentaram tal representação social não reagiram de
forma negativa ao ouvirem a expressão “alunos com deficiência”. Em contrapartida, as
demais entrevistadas que revelaram outras representações - identificadas nessa investigação
– criticaram o uso da referida expressão: “aluno com deficiência, eu acho essa expressão
feia, ela acaba completamente com as perspectivas de crescimento daquele aluno, ela
traumatiza. Por que você não usa aluno especial ou aluno excepcional?” (Aluna P, UNEB)
76
Enfim, as representações sociais das estudantes de Pedagogia sobre “alunos com
deficiência” são um reflexo do caldeirão psicossocial em que as entrevistadas encontram-se
inseridas: histórico, social e culturalmente. O conhecimento dessas representações
permitiram desnudar olhares inconscientes e/ou inconfessos das estudantes de Pedagogia
com relação aos “alunos com deficiência”. É importante deixa fluir esses olhares, mesmo
que revelem preconceitos e estereótipos enraizados socialmente sobre “alunos com
deficiência”. Existem também os olhares que encaram de frente o problema da deficiência e
rompem com preconceitos e estereótipos. Esperamos que o descortinar dessas
representações desperte uma reflexão na qual os “alunos com deficiência” sejam olhados e
possam olhar para si mesmos, de forma menos maniqueísta: nem pior, nem melhor, nem
mais ou menos. É preciso coragem de olhar de frente a deficiência para conviver com a
des-semelhança sem cobranças de adequação a moldes preestabelecidos, sejam
“normatização, heroicidade ou vitimação” (Amaral, 1994). Na realidades, os olhares se
diferenciam pela transparência nas relações estabelecidas por meio do respeito à
diversidade, pois diferenças sociais valorativas podem determinar o lugar social dos
“alunos com deficiência” de maneira muito mais forte do que diferenças físicas, mentais ou
sensoriais.
2.2 - Desnudando atitudes dos estudantes de Pedagogia com relação à inclusão de
“alunos com deficiência”
Há uma tendência nos indivíduos e/ou grupos sociais em responder, de forma
positiva, negativa ou indiferente, conforme normas de proceder ou pontos de vista
construídos socialmente no decorrer da história. Essa tendência de agir de maneira coerente
com referência a certos objetos, pessoas ou situações determina uma atitude social.
Portanto, tomar uma atitude significa – antes de tudo – decidir-se por um parecer e agir de
acordo com ele. Para Moscovici, uma atitude expressa um posicionamento, uma orientação
positiva ou negativa em relação ao objeto representado. Nesse sentido, pode-se afirmar que
77
uma atitude é considerada unicamente do lado da resposta enquanto “uma preparação para
ação”, comportamento em miniatura. Por esta razão, nós lhe atribuímos uma virtude
preditiva, uma vez que, segundo o que um indivíduo diz, pode-se deduzir o que ele vai
fazer. (Moscovici, 1978, p. 46 – grifos nossos)
As representações sociais sobre “alunos com deficiência” – de aluno carente,
aluno super-herói, aluno comum e aluno com necessidades e potencialidades –
apresentadas na primeira etapa da análise indicaram caminhos, para identificar atitudes nas
estudantes de Pedagogia, com relação à inclusão dos referidos alunos. Para conhecer essas
atitudes, fez-se necessário reorganizar as entrevistas e efetuar uma nova análise no material,
de acordo com as representações sociais descortinadas nesta pesquisa. Essa análise teve
como objetivo identificar, no discurso das entrevistadas, suas atitudes com relação à
proposta de inclusão. Foram desnudadas três atitudes: Aceitação, Negação e Indiferença.
Uma análise mais detalhada do material demonstrou que alguns discursos expressavam
posições de ambigüidade. Contudo, a análise exaustiva desses discursos confirmou os
resultados apresentados na tabela abaixo:
ATITUDES C/ RELAÇÃO À INCLUSÃO DE “ALUNOS COM DEFICIÊNCIA”
NEGAÇÃO
ACEITAÇÃO
INDIFERENÇA
4
5
8
- Atitude de Negação
A atitude de Negação apresentada pelas estudantes de Pedagogia com relação à
inclusão de “alunos com deficiência” é resultado da descrença no potencial educativo dos
referidos alunos. Essa atitude é proveniente das concepções construídas socialmente no
tratamento dado às pessoas com deficiência, em que verificamos a predominância de
“atitudes de marginalização e segregação” (Mazzota, 1993) dessas pessoas na trajetória
histórica das sociedades ocidentais. Portanto, as entrevistadas que apresentaram a atitude de
Negação desacreditam no potencial dos “alunos com deficiência” e defendem a segregação
desses alunos como o melhor caminho para favorecer sua “aprendizagem”. Trata-se de uma
78
atitude que revela a existência de barreiras – por parte das entrevistadas – em aceitar os
“alunos com deficiência” em sua prática educativa. Tais barreiras podem ser traduzidas
pela falta de preparação profissional, carência de informações e/ou inaptidão pedagógica
das futuras pedagogas para atuar numa prática educativa inclusiva. Os discursos das
informantes revelam a rejeição das estudantes de Pedagogia em acolher os “alunos com
deficiência” na escola regular e traduzem uma atitude de Negação com relação à proposta
de inclusão:
Não é questão que seja discriminação, não é isso, é que ele (aluno com deficiência) não vai
conseguir se adaptar dentro daquela classe, (...) então ele não vai ter que ter aquele domínio.
Mesmo assim tem menino que é apagado, é....fechado no mundo dele, então tem que estar
de junto das pessoas que são também deficientes e estar com um profissional que também
domine essa área de deficiência.(...) São pessoas que tem é... uma regressão de ensino, de
aprendizado entendeu, ela pega com dificuldade, leva vários meses pra pegar uma coisa,
entendeu? São pessoas... lá na escola já teve, na escola da minha mãe já teve uma. A gente
pegou e chamou os pais da criança e disse que aquela criança não poderia estar no meio de
pessoas normais entendeu? (...) Mainha pegou, chamou, conversou e ainda deu o nome do
lugar pra ela procurar, de uma entidade pra levar a criança... (Aluna D, UCSAL – grifos
nossos)
Meu Deus, eu ia ficar doida (risos), eu ia me preocupar bastante viu, não sei. (...) eu nem sei
se ia assumir essa sala (risos), eu ia ter medo porque eu não sou, não sei como é, eu
desconheço, assim ia pedir, que colocasse outra professora... (Aluna S, UCSAL - grifos
nossos)
- Atitude de Aceitação
A atitude de Aceitação, apresentada pelas estudantes de Pedagogia, com relação à
inclusão de “alunos com deficiência”, é resultado de uma concepção otimista sobre o
potencial educativo desses alunos. As entrevistadas que apresentaram essa atitude
acreditam nesse potencial e defendem a interação de “alunos com deficiência” nas escolas
regulares. Tal atitude indica uma postura de acolhimento nas estudantes de Pedagogia, pois
elas aprovam a presença de “alunos com deficiência” em sua prática educativa. Em geral,
as entrevistadas que evidenciam uma atitude de Aceitação com relação à inclusão revelam
uma certa abertura para aceitar, acolher, dar crédito, aplaudir e aprovar o potencial
79
educativo desses alunos. Porém, na presente pesquisa essa atitude aparece de duas formas
no discurso das entrevistadas.
Na primeira forma, trata-se de uma Aceitação passiva, que confia cegamente na
capacidade de auto-superação dos “alunos com deficiência”, independentemente das
condições socioculturais desses alunos. Essa atitude considera a proposta de inclusão
“ótima”, a despeito das condições oferecidas pelo sistema educacional vigente, pois
deposita, exclusivamente, nos “alunos com deficiência” a responsabilidade pelo seu
desenvolvimento educacional. As necessidades educativas especiais dos referidos alunos
são ocultadas com argumentos que desconsideram a realidade educacional brasileira:
A inclusão hoje é uma ótima opção, os alunos especiais podem acompanhar tranqüilamente
a escola. A inclusão é uma realidade tão... tão forte, eu como pedagoga só posso dizer que tá
mais do que justo, que tá certo. Eu acho que uma pessoa com deficiência numa sala, só vai
enriquecer o desempenho daquela turma. (Aluna G, UNEB – grifos nossos)
...porque eu acho que tem incluir mesmo entendeu, assim.. eu acho que a escola... a escola
tá muito melhor, a escola cresceu muito, sabe? Eu acho que a situação evoluiu muito e eu
acho que tem que tá mesmo incluindo, tem que tá sim. (Aluna M, UFBA – grifos nossos)
A segunda forma de Aceitação dos “alunos com deficiência”, que aparece no
discurso das entrevistadas, indica uma certa indignação com relação às condições
apresentadas pelo sistema educacional brasileiro, para atender às necessidades educativas
dos referidos alunos. Nessa atitude, as entrevistadas valorizam as potencialidades dos
“alunos com deficiência”, mas reconhecem também suas necessidades educativas e cobram
uma posição dos governos no atendimento dessas necessidades. Os discursos revelam uma
aceitação da proposta de inclusão, mas tal atitude vem acompanhada pela indignação. As
entrevistadas enfatizam a omissão do sistema educacional brasileiro, que não garante as
devidas condições para o desenvolvimento de uma prática educativa coerente com os
princípios da proposta de inclusão. Pode-se observar nesses discursos que a atitude de
aceitação está associada à valorização das potencialidades e à defesa do respeito às
necessidades educativas especiais dos “alunos com deficiência”.
80
O convívio com outros alunos eu acho que seria o ideal, agora desde quando se oferecesse
condições próprias pra isso, porque você jogar a criança portadora de cuidados especiais
numa sala sem oferecer condições eu acho muito complicado. Porque eu fui numa escola da
prefeitura de Salvador que tinha 6 crianças portadoras de deficiência, de cuidados especiais,
com problemas totalmente diferentes, gravíssimos, dentro de uma sala de crianças normais.
Essa inclusão aí não funciona, sinceramente, na minha visão não funciona... (Aluna M,
UNEB – grifos nossos)
- Atitude de Indiferença
A atitude de Indiferença foi a que mais se sobressaiu nessa análise. Contudo, essa atitude
deu muito trabalho para ser detectada, pois apareceu de forma dissimulada nos discursos
das entrevistadas. Tanto que, inicialmente, ela foi denominada como uma atitude de
Indefinição. Havia uma ambigüidade nos discursos das informantes que confundiu o
processo de análise. Chegamos a analisar separadamente as atitudes de Aceitação e
Negação – com relação à inclusão de “alunos com deficiência” em si – e a proposta de
inclusão desses alunos no Brasil, até descobrirmos que se tratava de uma atitude de
Indiferença. Para identificar essa atitude, uma outra análise aprofundada foi empreendida
sobre a representação social que mais se sobressaiu - aluno comum -, para buscar, nas
entrelinhas desses discursos, elementos que desnudassem as normas de proceder e de agir
das estudantes com relação à inclusão de “alunos com deficiência”. A atitude de
Indiferença apareceu por meio das posturas de indefinição das estudantes que
evidenciavam, nas entrelinhas do discurso, uma posição de desinteresse e negação da
deficiência. Uma vez que a indiferença é uma qualidade atribuída a quem não se define,
não apresenta motivos de preferência e/ou se desinteressa pelo outro. O outro, nesse
contexto da pesquisa, refere-se aos “alunos com deficiência”, que foram indefinidos e/ou
ignorados de forma dissimulada no discurso dessas estudantes. A atitude de Indiferença
pode ser identificada nos discursos das informantes que defendem o respeito à diversidade
e, contraditoriamente, negam a deficiência, como se esta não fizesse parte da diversidade
humana. Observa-se uma posição de descompromisso com relação à inclusão de “alunos
com deficiência”, nas entrelinhas do discurso abaixo:
Eu não vejo a Educação inclusiva como uma educação voltada para atender à deficiência,
vejo como uma educação para atender a todas as diferenças, né? Todos nós somos pessoas
81
diferentes, né? E como pessoas diferentes, cabem em qualquer lugar, cabe a mim, cabe a
você, cabe em qualquer relação grupal social, né? Então, quando a gente fala essa palavra
diferente, eu já estou abordando que não é uma pessoa... ele não é uma pessoa deficiente, é
uma pessoa que ele pode... como é que eu posso dizer assim.... não é uma pessoa deficiente,
e sim, uma diferente. Como outros alunos. Então essas pessoas diferentes devem ser tratadas
dessa forma e não como deficientes, entendeu? Eu entendo que inclusão é isso, mas não sei
assim falar sobre inclusão porque não trabalho com isso. (Aluna P, UCSAL - grifos nossos)
A análise de conteúdo desse discurso revela que a deficiência não cabe dentro da
“diversidade” apresentada pela entrevistada. Trata-se de um discurso que procura simular a
proposta de Educação Inclusiva, por meio da imposição de uma prática educativa, que
promove a exclusão da deficiência. À medida que a deficiência é negada, nega-se também a
identidade do “aluno com deficiência”. O discurso de valorização das diferenças, que não
admite a presença da deficiência, constitui-se num discurso politicamente perigoso. Atrás
de uma pseudo-aceitação das diferenças, pode-se esconder concepções e atitudes sociais de
marginalização e segregação da deficiência. Enfim, essa atitude de Indiferença reflete uma
postura de desatenção, desinteresse, apatia e negligência das estudantes de Pedagogia com
relação à inclusão de “alunos com deficiência”.
2.3 - Cruzando representações sociais com atitudes
O cruzamento das representações sociais das estudantes de Pedagogia sobre “alunos
com deficiência” com as atitudes com relação à inclusão desses alunos comprovou a idéia
defendida na presente pesquisa: as representações sociais dos estudantes de Pedagogia
sobre “alunos com deficiência” orientam suas atitudes com relação à inclusão desses
alunos. O resultado dessa análise pode ser visualizado no quadro abaixo:
82
CRUZAMENTO ENTRE REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E ATITUDES
Representações sociais dos
estudantes de Pedagogia sobre “alunos com deficiência”
Atitudes dos estudantes de Pedagogia com relação à
inclusão de “alunos com deficiência”
Aceitação
Negação
Indiferença
-
04
-
03
-
-
-
-
08
Aluno com necessidades e
potencialidades
02
-
TOTAL
05
04
Aluno carente
Aluno super-herói
Aluno comum
08
Na análise do quadro, verifica-se que existe uma coerência entre as representações
sociais sobre “alunos com deficiência” e as atitudes com relação à inclusão desses alunos,
ou seja, para cada representação corresponde uma determinada atitude.
O grupo de estudantes de Pedagogia que representou os “alunos com deficiência”
como aluno carente apresentou atitudes de Negação com relação à proposta de inclusão. A
representação social de aluno carente colocou o “aluno com deficiência” como um doente,
sofredor, frágil, alguém que possui uma falta, etc. Portanto, essa representação não pode
suportar a proposta educativa de inclusão desses alunos. A atitude de Negação apareceu
porque essas estudantes não acreditam no potencial educativo dos “alunos com
deficiência”. Nessa atitude, o potencial educativo desses alunos é desvalorizado. Eles são
tratados como impotentes e não são aceitos na prática educativa. A representação social de
aluno carente pressupõe um atestado de incompetência cognitiva ao “aluno com
deficiência” porque suas potencialidades são sempre negadas. Uma vez que o “aluno com
deficiência” é representado como carente, nada será exigido dele e, em contrapartida, nada
lhe será dado. Para essas entrevistadas, as instituições e profissionais responsáveis pelos
“alunos com deficiência” devem trabalhar com “amor e resignação”, porque as limitações
geralmente são consideradas definitivas. Quando o “aluno com deficiência” é representado
como carente, fica implícito que falta algo, no seu corpo e/ou na mente, que impede seu
desempenho de ser humano. A atitude de Negação aponta uma rejeição explicita do “aluno
com deficiência” da prática educativa dessas entrevistadas.
83
Em contrapartida, o grupo de estudantes de Pedagogia, que representou os “alunos
com deficiência” como aluno super-herói, apresentou atitudes de aceitação com relação à
inclusão desses alunos. Essa representação implica uma atitude de Aceitação ilimitada da
proposta de inclusão de “alunos com deficiência”, pois o potencial educativo desses alunos
é sempre supervalorizado, independentemente das suas condições socioculturais. A
representação de “super-herói” faz com que o ‘aluno com deficiência” seja consagrado
onipotente e a atitude de Aceitação da proposta de inclusão de “alunos com deficiência”
aparece de forma irrestrita.
As entrevistadas, que representaram os “alunos com deficiência” como aluno
comum, apresentaram uma atitude de Indiferença com relação à inclusão dos referidos
alunos. A representação de aluno comum foi difícil de analisar, porque os discursos das
entrevistadas apresentaram-se ambivalentes: ao mesmo tempo que defendiam o respeito à
diversidade, negavam a deficiência. Contudo, verificamos que havia uma certa coerência
que ligava a representação de aluno comum com a atitude de Indiferença com relação à
inclusão desses alunos. As diferenças dos “alunos com deficiência” só eram aceitas se a
deficiência fosse escondida. A atitude de Indiferença aparece no discurso das entrevistada
porque estas procuram impor um padrão de normalidade para os referidos alunos, sem levar
em conta a identidade e/ou a subjetividade apresentada por eles. Na representação social de
aluno comum, há uma certa negligência por parte das informantes em não se posicionar em
relação à inclusão desses alunos. Tal negligência implica uma atitude de indiferença
reconhecida, também, nas posturas
dos sistemas educacionais que
implementam as
políticas de Educação Inclusiva e, contraditoriamente, não oferecem as condições
necessárias para inclusão dos “alunos com deficiência”. Uma vez que os sistemas não
oferecem condições materiais e pedagógicas, para inclusão de “alunos com deficiência”,
demonstram uma atitude de indiferença que serve como modelo na promoção da exclusão
desses alunos, conforme análise da “dialética da inclusão/exclusão” (Sawaia, 1999). Essa
atitude dos sistemas educacionais pode contribuir para ampliar a propagação da
representação social de aluno comum nos futuros docentes.
A representação social de aluno com necessidades e potencialidades produz uma
atitude de Aceitação com relação à inclusão de “alunos com deficiência”. As entrevistadas
que apresentaram essa representação assumem que a presença da deficiência pode gerar
84
limitações no desenvolvimento do sujeito. Porém, defendem que tais limitações não
impedem o desenvolvimento das potencialidades dos “alunos com deficiência”. A atitude
de Aceitação com relação à inclusão demonstra uma concepção otimista dessas
entrevistadas com relação ao potencial educativo dos referidos alunos. Verifica-se uma
coerência nesse discurso porque essas entrevistadas enfrentam a deficiência de frente:
admitem as limitações geradas pela deficiência, sem negar as possibilidades dos “alunos
com deficiência”. Outro fato relevante em seus discursos é que elas denunciam, por meio
de suas experiências, as péssimas condições de atendimento dos “alunos com deficiência”
no sistema educacional brasileiro. As informantes reconhecem a Educação Inclusiva como
proposta ideal para promover a interação e o desenvolvimento das funções psíquicas
superiores dos “alunos com deficiência” e apontam, em seus discursos, a necessidade do
governo brasileiro oferecer condições educacionais adequadas para a inclusão educacional
e social dos “alunos com deficiência”.
Os resultados dessa pesquisa confirmam que o sistema educacional brasileiro
encontra-se desarticulado em termos de políticas públicas de educação e de práticas
educativas. Uma visita ao site do MEC20 demonstra como estamos avançados em termos
das políticas públicas de Educação Inclusiva no Brasil. Contudo, em termos de práticas
sociais estamos muito distantes de conquistar o cumprimento mínimo de tais políticas. No
que se refere à formação inicial de docentes, para atuar com a proposta de inclusão, esse
fato pode ser comprovado nessa pesquisa. Numa mesma instituição formadora, é possível
encontrar diferentes representações sociais sobre “alunos com deficiência”, conforme
indica a tabela abaixo:
20
O site http://www.mec.gov.br apresenta a organização do sistema educacional brasileiro – em suas
diferentes modalidades e níveis de ensino – e as principais políticas públicas de educação vigentes no
contexto educacional contemporâneo.
85
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE “ALUNOS COM DEFICIÊNCIA”
Aluno carente Aluno super-herói Aluno comum
Aluno
com
necessidade
e
potencialidade
UFBA
1
-
4
-
UNEB
-
1
1
2
UCSAL
3
2
3
-
Essas representações expressam que temas relativos à educação de “alunos com
deficiência” ainda estão distantes do espaço acadêmico das instituições universitárias que
foram pesquisadas. Como as entrevistadas estão na etapa final do curso, não terão mais
tempo para construir e/ou reconstruir suas representações. Contudo, a pesquisa pode
provocar uma reflexão sobre a necessidade de se pensar nas representações das estudantes
que estão entrando nessas universidades, uma vez que as representações sociais orientam as
atitudes dos estudantes de Pedagogia com relação à inclusão de “alunos com deficiência”.
Para incorporar as políticas públicas de Educação Inclusiva, na prática educativa dos
futuros educadores do curso de Pedagogia, é preciso, também, conhecer suas atitudes com
relação à referida proposta. Na tabela abaixo, verificamos quais foram as atitudes
apresentadas em cada instituição, de acordo com a análise empreendida nas representações
sociais:
ATITUDES DOS ESTUDANTES DE PEDAGOGIA COM RELAÇÃO À INCLUSÃO DE
“ALUNOS COM DEFICIÊNCIA”
NEGAÇÃO ACEITAÇÃO INDIFERENÇA
UFBA
1
-
4
UNEB
-
3
1
UCSAL
3
2
3
O fato da atitude de indiferença se sobressair é um dado que merece uma séria reflexão por
parte das instituições universitárias e dos sistemas educacionais. Como podemos
86
implementar à inclusão de “alunos com deficiência” no sistema regular de ensino, se os
futuros docentes estão indiferentes diante dessa proposta?
Para reverter esse quadro, é preciso buscar alternativas que contribuam para
melhorar a formação inicial no curso de Pedagogia em instituições universitárias. Os
resultados dessa pesquisa indicam que a implementação da proposta de inclusão de “alunos
com deficiência” não pode ocorrer de forma dissociada das políticas educacionais de
formação inicial de docentes. É necessário que se ampliem estudos para instrumentalizar a
prática educativa dos futuros docentes, a fim de que, a inclusão de “alunos com
deficiência”, ocorra de forma responsável. Este estudo demonstrou que o curso de
Pedagogia tem possibilidades de oferecer uma formação inicial coerente com os princípios
da proposta de inclusão. Nesse sentido, os resultados dessa pesquisa oferecem um
referencial teórico-metodológico para se pensar uma proposta de recomendações para o
curso de Pedagogia articulada as representações sociais e as atitudes dos estudantes, com
relação a prática educativa de inclusão de “alunos com deficiência”.
87
CAPÍTULO III
PPACP21 - RECOMENDAÇÕES PARA UMA FORMAÇÃO INICIAL DE
EDUCADORES, NECESSÁRIA À INCLUSÃO DE “ALUNOS COM
DEFICIÊNCIA”
Este capítulo tem como objetivo apresentar a PPACP – Proposta Pedagógica de
Aperfeiçoamento do Curso de Pedagogia - Recomendações para uma formação inicial de
educadores, necessária à inclusão de “alunos com deficiência” (anexo F). A referida
proposta consiste num conjunto de recomendações em forma de sistema, que visa promover
o aperfeiçoamento do curso Pedagogia, no contexto de implementação das políticas de
Educação Inclusiva no Brasil. Na realidade, trata-se de uma proposta de modificação
curricular não significativa, pois seu funcionamento não depende da aprovação
institucional, mas sim, da vontade coletiva dos sujeitos envolvidos no curso de formação
inicial em Pedagogia de instituições universitárias. Na seqüência, encontram-se:
justificativa, metas, estrutura e modo de funcionamento - pressupostos, operacionalização,
resultados desejados, avaliação e validação da proposta.
1. Justificativa
A política de Educação Inclusiva do sistema educacional brasileiro assumiu o
compromisso de incluir os “alunos com deficiência” nas classes regulares, conforme indica
a nova LDB, lei de nº 9394 (1996) e o PNE - Plano Nacional de Educação (2000). A
efetivação das ações apresentadas nesses documentos oficiais implica, obrigatoriamente, na
reformulação do processo de formação docente. No entanto, o sistema educacional
brasileiro ainda não apresentou uma proposta de mudança curricular para os cursos de
formação de docentes atuarem conforme princípios da proposta de Inclusão. Apesar das
21
A sigla PPACP significa Proposta Pedagógica de Aperfeiçoamento do Curso de Pedagogia.
88
Diretrizes Nacionais para Educação Especial na Educação Básica, aprovada pelo Conselho
Nacional de Educação em 03/07/2001, prever no seu Art. 18, § 1º que:
São considerados professores capacitados para atuar em classes comuns com alunos que
apresentam necessidades educacionais especiais, aqueles que comprovem que, em sua
formação, de nível médio ou superior, foram incluídos conteúdos sobre educação especial
adequados ao desenvolvimento de competência e valores para:
I – perceber as necessidades educacionais especiais dos alunos e valorizar a Educação
Inclusiva;
II – flexibilizar a ação pedagógica nas diferentes áreas de conhecimento de modo adequado
às necessidades educacionais especiais de aprendizagem;
III – avaliar continuamente a eficácia do processo educativo no atendimento de necessidades
educacionais especiais;
IV – atuar em equipe, inclusive com professores especializados em educação especial.
(Diretrizes Nacionais para a Educ. Especial na Educ. Básica, 2001 – grifos nossos)
À medida que a proposta de inclusão de “alunos com deficiência” perpassa
transversalmente todos os níveis de ensino, a formação de educadores, em todas as
instâncias, deveria estar de acordo com essas Diretrizes.
Contudo, nossa experiência indica que a formação inicial de docentes em nível
superior, para atuar na Educação Básica, não está adequada com as orientações do
documento acima citado. As universidades baianas permanecem indiferentes às exigências
das políticas públicas de Educação Inclusiva no Brasil, pois o modelo curricular da
formação inicial docente não contempla, ainda, os princípios da proposta de inclusão de
“alunos com deficiência”. Os cursos de licenciaturas parecem insatisfatórios, para garantir
uma profissionalização docente que atenda às necessidades educativas especiais dos
referidos alunos. Uma vez que a preparação profissional, para atuar com essa proposta,
deve abarcar não só habilidades e conhecimentos técnicos, mas, também, os conteúdos
internos dos futuros profissionais, oriundos do próprio universo pessoal e/ou decorrentes
de atitudes construídas no contexto sociocultural em que estão inseridos.
Por isso, é urgente repensar a formação inicial docente no contexto de
implementação das políticas de inclusão de “alunos com deficiência”. Sabemos, contudo,
89
que mudanças curriculares não ocorrem de uma hora para outra, é preciso tempo para
reflexão, estudo, pesquisa etc. Exceto, quando os governos impõem, autoritariamente,
mudanças fadadas ao insucesso porque não correspondem à realidade da prática educativa
docente. Nesse sentido, antes de apresentar a PPACP, consideramos importante abordar
alguns aspectos da pesquisa - Representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre
‘alunos com deficiência’ – responsável pela elaboração da referida proposta. Os resultados
dessa pesquisa permitiram conhecer o perfil profissional das estudantes de Pedagogia,
descobrir o que pensam sobre “alunos com deficiência” e quais as possíveis atitudes com
relação à inclusão dos referidos alunos.
A pesquisa – Representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre ‘alunos
com deficiência’ – demonstrou um grave problema a ser enfrentado pelas instituições
universitárias: a exclusão na abordagem de temas referentes ao processo educacional de
“alunos com deficiência”, no curso de formação inicial em Pedagogia, em pleno contexto
de implementação das políticas de Educação Inclusiva no Brasil. A PPACP surgiu para
contrapor a manutenção de representações e atitudes que contribuem para reforçar a
segregação e/ou marginalização dos referidos alunos, na profissionalização do pedagogo.
Elaboramos algumas recomendações para o aperfeiçoamento do curso de Pedagogia, no
sentido de incluir a temática da educação de “alunos com deficiência”, nas diferentes
disciplinas, oferecidas no decorrer da graduação e nas diversas atividades desenvolvidas no
contexto universitário: núcleo de pesquisa e/ou extensão, eventos específicos com
funcionários do corpo técnico-administrativo, eventos abertos à comunidade, cursos de pósgraduação, entre outros. Propomos uma formação inicial que contemple o desenvolvimento
de competências para os futuros pedagogos atuarem em classes inclusivas. Enfatizamos que
a PPACP consiste numa proposta que busca as experiências dos docentes de diferentes
disciplinas, oferecidas no curso de Pedagogia, em parceria com estudantes, colegiado,
departamento, núcleo de pesquisa e/ou extensão, funcionários do corpo técnicoadministrativo das universidades, entre outros, para articular a abordagem da educação de
“alunos com deficiência”, na formação inicial em Pedagogia.
O contexto de reconfiguração demarcado pela história recente do curso de
Pedagogia confere-lhe condições para implementar a PPACP. Essa formação tem uma
dívida social com a profissionalização de educadores, para atuar com “alunos com
90
deficiência”. Trata-se do único curso de nível superior que separou a formação docente em
duas categorias: especial e regular. Uma vez que consagrou essa separação, o curso de
Pedagogia deve assumir o compromisso de promover a interação entre educação especial e
regular. Seu currículo já oferece uma formação generalista, aspecto fundamental na
formação de educadores, para atuarem na inclusão de “alunos com deficiência”, que exige
um profissional mais polivalente. Outro fato importante, é que os estudantes de Pedagogia
geralmente atuam e/ou devem atuar na Educação Infantil e nas séries iniciais do Ensino
Fundamental, níveis de ensino nos quais está concentrada a maioria dos “alunos com
deficiência”, conforme dados de 199722. Portanto, essa formação inicial deve assumir o
compromisso de prepará-los para atuar segundo os princípios da proposta de inclusão de
“alunos com deficiência”. O papel da PPACP será contribuir para que o referido curso
possa assumir esse espaço de formação com competência técnica, compromisso político e
sensibilidade humana.
Contudo, para assumir a responsabilidade da formação inicial de educadores para a
Educação Inclusiva, o curso de Pedagogia precisa se amparar em pressupostos teóricos que
fundamentem a prática educativa com relação à inclusão de “alunos com deficiência”. O
referencial teórico construído no decorrer da pesquisa - Representações sociais de
estudantes de Pedagogia sobre ‘alunos com deficiência’ - apresenta muitas contribuições
no que tange aos aspectos da prática educativa, para atuar com os referidos alunos.
Verificamos que os princípios pedagógicos da proposta de inclusão de “alunos com
deficiência” fundamenta-se no legado psicológico e pedagógico de S. L. Vigotsky (18961934) e de seus seguidores, à luz teoria Sócio-Histórico-Cultural.
A assimilação da teoria Sócio-Histórico-Cultural, na formação inicial de
educadores, implica na construção de uma credibilidade dos docentes, para apostar no
potencial educativo dos “alunos com deficiência”. Essa teoria oferece sustentação teórica e
metodológica para a compreensão da pedagogia da diversidade, porque está apoiada na tese
de Vigotsky sobre a natureza social do desenvolvimento psíquico do sujeito. O autor
22
Esses dados publicados no Informe Estatístico (MEC/INEP/SEEC, 1998), indicam que, no Brasil, dos
334.507 “alunos com deficiência” que conseguiram se matricular, 25,26% freqüentavam a Educação Infantil,
40,44% freqüentavam o Ensino Fundamental, 33,26% recebiam outros atendimentos e apenas 0,63%
freqüentavam o Ensino Médio. Não foram localizados dados sobre o Ensino Superior.
91
apresentou uma argumentação sólida e coerente sobre a natureza social do desenvolvimento
humano: demonstrou que o desenvolvimento das crianças com deficiência é semelhante ao
das crianças ditas “normais”, porque as funções psíquicas superiores de ambas são de
origem sociocultural. Seus estudos apresentam bases científicas que comprovam a
possibilidade de desenvolvimento e de compensação dos “alunos com deficiência”, por
meio do estímulo das funções psíquicas superiores.
Os pressuposto teóricos da proposta de Educação Inclusiva estão ancorados na
teoria Sócio-Histórico-Cultural de Vigotsky e de seus seguidores, porque esse enfoque
permitiu a construção de uma visão otimista do potencial educativo de todos os alunos,
incluindo os “alunos com deficiência”, pois “la zona de desarrollo próximo y la pedagogia
de la diversidad parten del mismo soporte ético principal: la igualdade” (Rodríguez, 2001:
p. 105). Os estudos de Vigotsky indicam que o papel dos educadores é acionar a zona de
desenvolvimento proximal dos educandos, por meio do processo de mediação,
independente das limitações apresentadas pelos referidos alunos. O aprofundamento dos
conhecimentos produzidos pela referida teoria é indispensável para implementação da
PPACP, uma vez que esta proposta visa aperfeiçoar o curso de Pedagogia, para atender à
formação inicial de educadores para Educação Inclusiva. Ressaltamos que a modificação
das representações sociais sobre “alunos com deficiência”, e conseqüentemente, a
transformação de atitudes com relação à proposta de inclusão depende da crença no
potencial educativo dos “alunos com deficiência”.
Destacamos, também, as contribuições de educadores brasileiros – Mrech (1997 e
1998), Mantoan (1997 e 1998), Bueno (1997 e 1999), Cartolano (1998), Ferreira (1999),
Jannuzzi (1999), entre outros – na construção desta proposta. Esses educadores
pesquisaram e esboçaram linhas, para se traçar um projeto político-pedagógico de formação
inicial para educadores, no contexto de implementação das políticas de inclusão de “alunos
com deficiência”, no Brasil. Inclusive, Bueno e Cartolano chamam à atenção sobre a
especificidade na educação dos “alunos com deficiência”, o ensino de braille para cegos, o
ensino de libras para surdos, etc. que requerem um tratamento diferenciado dos
profissionais da área. O curso de Pedagogia não pode assumir essa especificidade. Por isso,
sugerimos uma formação continuada em pós-graduação, como busca de desenvolvimento
profissional, para o educador tornar-se um especialista em cegos, surdos ou outras
92
categorias de deficiência. Compreendemos que a formação de educadores espe-cializados
nos diferentes tipos de deficiência deve estar em permanente sintonia e interação com a
formação inicial em Pedagogia. Do contrário, será mantido o modelo tradicional de
formação, que reafirma a segregação de dois tipos de educação: especial e regular.
Para finalizar, enfatizamos que a PPACP visa contribuir para formação de um
educador comprometido, aberto a fazer revisões no seu referencial teórico, de modo a
acompanhar o desenvolvimento das ciências e as descobertas da tecnologia para seu campo
de ação. Mas que seja, acima de tudo, um educador sensível às necessidades do ser
humano, que veja a deficiência como parte integrante da diversidade e que acredite sempre
no potencial educativo dos “alunos com deficiência”.
2. Metas:
• Instrumentalizar os profissionais do curso de Pedagogia a desenvolverem uma prática
educativa que possibilite a construção de conhecimentos de forma significativa e pensante,
levando em consideração os princípios da proposta de inclusão “alunos com deficiência” e
as necessidades do mundo social contemporâneo;
• Promover uma formação inicial, no curso de Pedagogia, que permita ao pedagogo
desempenhar o papel de mediador, ou seja, da pessoa que se interpõe entre o estímulo e o
organismo, enviando, de forma sistemática ou assistemática, situações que levem ao
desenvolvimento do potencial educativo dos “alunos com deficiência”, independentemente
de suas limitações;
• Promover a realização de atividades de estudo, pesquisa e/ou extensão que envolvam
temas relacionados com a inclusão de “alunos com deficiência”, à luz da teoria SócioHistórico-Cultural de Vigotsky e seus seguidores;
93
• Estabelecer relações de parceria e colaboração com diferentes instituições educativas, de
modo a promover um contato direto dos estudantes de Pedagogia com “alunos com
deficiência”, em escolas especiais e/ou inclusivas;
• Contribuir para que os sujeitos do curso de Pedagogia possam manejar deferentes
estratégias de comunicação do conteúdo, sabendo eleger as mais adequadas, considerando a
diversidade dos alunos, os objetivos das atividades propostas e as características do próprio
conteúdo;
• Possibilitar aos sujeitos do curso de Pedagogia a aquisição de competências para analisar
o percurso de aprendizagem formal e informal dos “alunos com deficiência”, identificando
características cognitivas, afetivas, sensoriais, físicas e formas de acessar e processar
conhecimentos, possibilidades e necessidades;
• Possibilitar aos docentes e estudantes do curso de Pedagogia orientar suas escolhas e
decisões metodológicas, a partir de princípios da proposta de inclusão de “alunos com
deficiência” à luz da teoria Sócio-Histórico-Cultural de Vigotsky;
• Contribuir para que docentes e estudantes do curso de Pedagogia possam utilizar
conhecimentos da realidade brasileira (econômica, cultural, educacional, política, social
etc.), para compreender o contexto de relações em que encontra-se inserida a proposta de
inclusão de “alunos com deficiência”.
94
3.
Estrutura e modo de funcionamento
3.1 - Pressupostos
• O curso de Pedagogia deve manter uma formação generalista calcada em pressupostos da
teoria Sócio-Histórico-Cultural de Vigotsky, uma vez que a demanda da Educação
Inclusiva exige a atuação de um profissional polivalente, instrumentalizado para atuar com
a diversidade;
• O curso de Pedagogia deve desenvolver competências intelectuais que permitam ao
professor fazer análises e gerar proposições que contemplem o contexto histórico, social e
político contemporâneo, a partir de uma dimensão ético-valorativa, na qual a Educação
Inclusiva está colocada numa perspectiva emancipatória dos homens;
• O curso de Pedagogia deve levar os estudantes à aquisição de uma competência reflexiva
que lhes permita, autonomamente, tomar sua prática educativa como objeto de análise.
3.2 - Operacionalização
• Contato com a coordenação do Colegiado do curso de Pedagogia propor a apresentação
da pesquisa de mestrado - Representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre
“alunos com deficiência”;
• Apresentação da pesquisa;
• Discussão e esclarecimentos de dúvidas sobre a pesquisa;
• Apresentação geral da PPACP – Proposta Pedagógica de Aperfeiçoamento do curso de
Pedagogia – Recomendações para uma formação inicial necessária à inclusão de “alunos
com deficiência”;
95
• Apreciação da PPACP. Sugerimos que se deixe um tempo de aproximadamente um mês
para os docentes apresentarem uma apreciação mais aprofundada da PPACP;
• Detalhamento da PPACP em grupo de professores por disciplina;
• Detalhamento da PPACP no Departamento;
• Detalhamento da PPACP junto aos funcionários do corpo técnico-administrativo;
• Detalhamento da PPACP no núcleos de pesquisa e/ou extensão;
• Detalhamento da PPACP no diretório acadêmico dos estudantes de Pedagogia;
• Realização de reunião, em pequenos grupos por área de conhecimento, para
esclarecimentos específicos da PPACP, conforme as necessidades de cada grupo;
• Discussão da PPACP em pequenos grupos;
• Levantamento das possibilidades e limites da PPACP em suas respectivas ações,
conforme as necessidades de cada grupo;
• Delimitação do papel de cada disciplina no processo de execução da PPACP;
• Encaminhamento por escrito do que foi delineado pelos docentes de cada disciplina do
curso de Pedagogia com relação a PPACP;
• Realização de contatos individuais com os docentes do curso de Pedagogia para
esclarecimentos de dúvidas sobre PPACP;
96
• Apreciação aprofundada da PPACP, na qual serão ouvidas as posições dos docentes,
estudantes, funcionários do corpo técnico-administrativo, diretor(a) de Departamento,
coordenador(a) de Colegiado, coordenadores de núcleos, entre outros, a fim de fazer os
ajustes necessários para colocar a proposta em prática;
• Realização de cursos, seminários, grupos de estudo etc. a fim de subsidiar
o
aprofundamento da temática da inclusão de “alunos com deficiência”, à luz da teoria SócioHistórico-Cultural de Vigotsky;
• Criação de cursos de pós-graduação nas áreas de Deficiência Visual, Deficiência Auditiva
e/ou Deficiência Mental, a fim de possibilitar a formação de profissionais especializados
para subsidiarem os docentes responsáveis pela inclusão de “alunos com deficiência”.
• Realização de atividades de pesquisa e/ou extensão, envolvendo comunidade na
conscientização sobre a realidade educacional de “alunos com deficiência”;
• Criação de um núcleo de apoio pedagógico para promoção da proposta de inclusão de
“alunos com deficiência”;
• Promoção de experiências na prática educativa de “inclusão de alunos com deficiência”
de que resultem trabalhos monográficos;
3.3 - Resultados desejados
• Ampliação da formação inicial em Pedagogia, para além das atividades de ensino, ou seja,
articulação entre ensino, pesquisa e extensão, na preparação profissional de educadores
para Educação Inclusiva;
• Atualização da literatura sobre o processo de ensino e aprendizagem ”, com base nos
novos paradigmas educacionais, a fim de atender às necessidade da proposta de inclusão de
“alunos com deficiência;
97
• Desenvolvimento de projetos e pesquisas em escolas e instituições que trabalhem na
perspectiva da inclusão de “alunos com deficiência”;
• Intercâmbios de cooperação técnico-científica com instituições nacionais e internacionais
ligados à educação;
• Intercâmbios entre formação inicial em Pedagogia e formação continuada de educadores,
para atuarem na inclusão de “alunos com deficiência”, por meio da criação do núcleo de
apoio pedagógico para Educação Inclusiva ;
• Promoção de cursos, seminários, grupos de estudos e reuniões sistemáticas no núcleo de
apoio pedagógico para Educação Inclusiva, para análise da prática educativa de inclusão de
“alunos com deficiência”;
• Constituição de um acervo de trabalhos internos e externos ao curso de Pedagogia com
informações sobre prática educativa de inclusão de “alunos com deficiência” em:
- outros centros que estão desenvolvendo estudos e pesquisas sobre a Educação
Inclusiva;
- documentos de organismos nacionais e internacionais sobre a Educação
Inclusiva;
- documentos legais que defendem os direitos de pessoas com deficiência;
- monografias e teses referentes à Educação Inclusiva.
3.4 - Avaliação
• A avaliação se dará em todos os momentos de execução da proposta. Serão utilizados
registros escritos, para acompanhar o processo de desenvolvimento das ações previstas na
PPACP.
98
4. Validação da Proposta:
A validação dessa proposta ocorreu através de uma avaliação feita por uma
comissão formada por oito especialistas da área de formação de professores. Os critérios
para escolha desses especialistas consideraram os seguintes aspectos: apresentar, no
mínimo, cinco anos de experiência comprovada na formação inicial em Pedagogia; atuar
como docente em universidades; ter feito um curso de mestrado e/ou doutorado na área de
formação de professores e/ou em áreas afins; possuir alguma experiência de contato com
pessoas com deficiência. Os especialistas selecionados são docentes de universidades com
mais de oito anos de experiência na formação inicial de educadores, quatro são mestres e
quatro são doutores na área de Educação e/ou em áreas afins, conforme se verifica no item
de apresentação do Guia com critério para Avaliação de Especialista (anexo G),
preenchido pelos especialistas no processo de validação da proposta. Esse guia apresentou
questões para conduzir o processo de validação da PPACP pelos especialistas consultados.
Na seqüência, após a apresentação do especialista, a guia contém 10 questões de apreciação
da proposta para os especialistas se posicionarem. As questões de 1 a 7 são de assinalar e as
questões de 8 a 10 exigem uma posicionamento escrito do especialista.
Na tabela abaixo, encontram-se os resultados da apreciação dos oito especialistas
referentes às questões de assinalar:
APRECIAÇÃO DA PROPOSTA PELOS ESPECIALISTAS
QUESTÕES
SIM
NÃO
1. Considera a proposta importante?
8
-
2. É compreensível?
8
-
3. Seus objetivos são coerentes?
6
2
4. Possui aplicabilidade?
7
1
5. É possível identificar seus
pressupostos teóricos?
6. Os procedimentos da PPACP estão
coerentes?
7.Oferece novidades?
6
2
7
1
7
1
Referente às questões de 1 a 7, no guia com Critério para Avaliação de
Especialista
99
A tabela demonstra, nas questões 1 e 2, que os oito especialistas selecionados
apresentaram uma posição de unidade: consideram a PPACP importante e compreensível.
Nas questões 3 e 5 - que se referem a coerência dos objetivos e a visibilidade acerca dos
pressupostos teóricos da proposta - houve uma variação nas respostas, pois dos 8
especialistas consultados, 6 assinalaram sim e 2 assinalaram não. Esses dados levaram a
uma revisão nos objetivos da PPACP e uma maior ênfase nos seus pressupostos teóricos.
Numa freqüência pequena, apenas 1 especialista, assinalou não para as questões 4, 6 e 7.
Uma releitura da PPACP possibilitou algumas reformulações no sentido de tornar mais
clara sua aplicabilidade e seus procedimentos. Quanto a questão, que se refere a novidade
da PPACP, não foi possível fazer reformulações, porque essa proposta é o resultado de um
trabalho de pesquisa e as novidades, que apresentamos, resultaram da produção da
investigação acerca das Representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre “alunos
com deficiência”.
As questões de 8 a 10 foram escritas pelos especialistas. O item 8, que se refere ao
que os especialistas gostariam de retirar da PPACP, apenas 1 especialista sugeriu retirar “o
foco no conteúdo das disciplinas e na fragmentação do processo educacional. A dicotomia
“objetivos – proposta” (Especialista da UFBA, Doutora em Educação Especial). Cabe
ressaltar que o foco no conteúdo das disciplinas ocorreu porque o tema sobre educação de
“alunos com deficiência” encontra-se ausente no processo de formação inicial do pedagogo.
Paralelamente, sugerimos a implementação de ações que ultrapassam o foco das
disciplinas: divulgação da pesquisa, criação de um núcleo de apoio à Educação Inclusiva,
promoção de eventos abertos à comunidade com temas sobre a educação de “alunos com
deficiência”, criação de cursos de pós-graduação na área de educação especial, etc. Na
questão 9, os especialistas expressaram sugestões sobre o que gostariam de acrescentar a
PPACP. Dos 8 especialistas consultados, 6 apresentaram as seguintes sugestões:
-
Contemplar na proposta o uso das “novas tecnologias, no sentido de descobrir
novas/diferentes formas de aprender/incluir” (Especialista da UNEB, Mestre em
Educação);
-
Acrescentar à proposta uma ênfase para o estudo e a prática de atividades de
diagnóstico, a fim de que os futuros pedagogos possam diagnosticar e encaminhar
mais rapidamente os “alunos com deficiência”, para o tratamento com especialistas
100
capacitados. (Especialista da UEFS, UNEB e UECE, Mestre em Educação Especial
e Doutor em Ciências Pedagógicas)
-
Ampliar a discussão sobre a formação do professor no curso de Pedagogia nos
seguintes aspectos: “a) O que precisa o professor para a sua prática?; b) A quem se
destina o curso?; c) Qual o perfil desse profissional?” (Especialista da UFBA,
Doutora em Educação Especial);
-
“Propor que antes dos seminários e eventos abertos a toda comunidade acadêmica,
sejam
previstas
atividades
especificamente
dirigidas
ao
corpo
técnico-
administrativo” (Especialista da UNEB, Mestre em Educação);
-
Propor aos docentes de disciplinas relacionadas a Arte, que incluam a abordagem de
temas, que tratem da educação de “alunos com deficiência”, numa dimensão de
integrar arte/educação/deficiência/diferenças (Especialista da UEFS, Doutora em
História da Educação);
-
“Reorganização da proposta para revelar melhor suas contribuições e ações
inovadoras” (Especialista da UNEB, Mestre em Educação).
Essas sugestões foram incorporadas à proposta
recomendaram
e
aprovaram
a
PPACP,
(anexo F). Todos os especialistas
conforme
verifica-se
no
parecer
Científico/Acadêmico, no Guia com critério para avaliação de especialistas (apreciação
dos especialistas). Cabe ressaltar que a validação da proposta se constituiu num momento
importante porque permitiu nossa reflexão e crescimento profissional. Voltamos à prática
educativa com uma proposta, ouvimos a análise dessa por parte de colegas experientes,
competentes, responsáveis e comprometidos em melhorar a formação inicial de educadores
do curso de Pedagogia.
101
CONCLUSÃO
A pesquisa empírica, apresentada nesta dissertação, comprovou a seguinte idéia a
defender: as representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre “alunos com
deficiência” orientam suas atitudes com relação à inclusão desses alunos. Os resultados da
investigação levaram à construção da PPACP – Proposta Pedagógica de Aperfeiçoamento
do Curso de Pedagogia: Recomendações para formação inicial de educadores necessária à
inclusão de “alunos com deficiência”. Portanto, os objetivos do trabalho estão cumpridos:
1) conhecemos as representações sociais, dos estudantes de Pedagogia, sobre “alunos com
deficiência” e identificamos suas atitudes com relação à inclusão desses alunos; 2)
apresentamos uma proposta pedagógica de aperfeiçoamento para o curso de Pedagogia
contribuir na formação inicial de educadores, no contexto de implementação das políticas
de Educação Inclusiva no Brasil. As tarefas científicas foram executadas com dedicação,
procuramos aprofundar ao máximo os referenciais que subsidiaram este trabalho, desde a
consolidação do marco teórico/metodológico da pesquisa até a elaboração e validação da
proposta. Nesse sentido, temos a consciência do dever cumprido e o desejo de melhorar a
realidade educacional brasileira, pois o destino de uma dissertação de mestrado não pode se
limitar, apenas, ao cumprimento de um ritual acadêmico. Esperamos que os resultados
deste trabalho possam contribuir, de alguma forma, para inclusão de temas relativos à
educação de “alunos com deficiência”, na formação inicial em Pedagogia. A universidade
não deve silenciar diante da situação educacional desses alunos, especialmente no contexto
de implementação das políticas públicas de Educação Inclusiva no Brasil. Ressaltamos que,
no início do século passado, os estudos de Vigotsky já evidenciaram as possibilidades de
desenvolvimento do potencial educativo desses alunos. Produções científicas mais recentes
comprovam as possibilidades de desenvolvimento e aperfeiçoamento das funções psíquicas
superiores, através dos estudos da plasticidade cerebral e da modificabilidade cognitiva. As
universidades têm o papel social de disseminar essas informações e promover uma
formação docente comprometida com a inclusão social e educacional dos “alunos com
deficiência”. É função dessas instituições, também, cobrar das autoridades competentes,
condições necessárias para a concretização responsável de uma “educação para todos”,
enfatizando que os “alunos com deficiência” fazem parte desse “todos”. É importante
102
salientar que a presente pesquisa revelou a predominância de atitudes de negação e
indiferença nos estudantes de Pedagogia, com relação à inclusão de “alunos com
deficiência”. Esse dado é um alerta para as instituições universitárias e os governos,
responsáveis pela implementação das políticas de Educação Inclusiva, repensarem sobre a
necessidade de articular políticas públicas, reflexões teóricas, formação inicial docente,
representações sociais e prática educativa. As representações sociais dos estudantes de
Pedagogia sobre “alunos com deficiência” podem “denunciar a rejeição, quer
inconsciente, quer inconfessa, identificar seus disfarces, propiciar o arrancar de máscaras”
(Amaral, 1994, p. 33) das reais condições da formação inicial docente, no contexto de
implementação das políticas de Educação Inclusiva no Brasil e/ou na Bahia. A modificação
das representações sociais e das atitudes de negação e indiferença, com relação à inclusão
de “alunos com deficiência”, implica em confrontar preconceitos construídos socialmente
no decorrer da história. Esse confronto deve estar sustentado em novos paradigmas
educacionais, dando ênfase aos pressupostos da teoria Sócio-Histórico-Cultural de
Vigotsky, precursora da visão otimista sobre o potencial educativo dos “alunos com
deficiência”. Nesse sentido, buscamos subsidiar a presente investigação com estudos de
paradigmas educacionais, coerentes com as produções científicas mais recentes e
comprometidos com os princípios da proposta de inclusão de “alunos com deficiência”.
Enfim, esperamos que o presente estudo possa ajudar na construção/reconstrução de
práticas educativas inclusivas, por meio da formação inicial de educadores no curso de
Pedagogia, em universidades baianas.
103
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SAWAIA, Bader (Org.). As artimanhas da exclusão: análise psicossocial e ética da
desigualdade social. Petrópolis/RJ: Vozes, 1999.
SCHEIB, Leda. A formação do pedagogo no Brasil. In: ENDIPE - ENCONTRO
NACIONAL DE DIDÁTICA E PRÁTICA DE ENSINO. Ensinar e Aprender: sujeitos,
saberes e pesquisas. Rio de Janeiro: DP&A, 2001, p. 9-22.
SILVA, Carmem S. Bissolli da. Curso de Pedagogia no Brasil: história e identidade.
Campinas, SP: Autores Associados, 1999. (coleção polêmicas de nosso tempo).
SILVA, Luciene Maria da. A diferença/deficiência no contexto da educação especial.
Revista da FAEEBA – Revista do Departamento de Educação da UNEB. Salvador, n. 13,
p. 175-183, jan. a jun. 2000.
SPINK, Jane Mary. Desvendando as teorias implícitas: uma metodologia de análise das
representações sociais. In: GUARESCHI, Pedrinho; JOVCHELOVITCH, Sandra (Org.).
Textos em representações sociais. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.
p. 117-145.
[prefácio Serge Moscovici]
SKLIAR, Carlos (Org.). Educação e exclusão: abordagens sócio-antropológicas em
Educação Especial. Porto Alegre: Mediação, 1997.
TEVES, Nilda. A representação do próprio corpo na ressocialização de jovens de rua. In:
TEVES, Nilda; RANGEL, Mary. Representação Social e Educação: temas e enfoques
contemporâneos de pesquisa. Campinas, SP: Papirus, 1999, p.11-45. (coleção magistério:
formação e trabalho pedagógico).
VIGOTSKY, L. S. Formação Social da Mente. 6.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
______. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987
_____. Obras Completas - tomo cinco - fundamentos de defectología. Primera
reimpresión. Ciudade de La Habana: Editorial Pueblo e Educacion, 1989.
WERNECK, Claúdia. Sociedade Inclusiva. quem cabe no seu todos. Rio de Janeiro: WVA
Editora, 1999.
111
XAVIER, Maria Elizabete. História da Educação: a escola no Brasil. São Paulo: FTD,
1994.
Outras referências;
TEXTOS complementares das disciplinas: Fundamentos Pedagógicos e Psicológicos da
Educação Especial; Problemas Contemporâneos da Educação Especial ministradas pela
professora Josefina Franco no curso de Mestrado em Educação Especial: UEFS/Brasil e
CELAEE/Cuba;
TEXTOS Complementares das disciplinas: Metodologia da Investigação I e II ministradas
pelo professor Luiz Rodriguez Alvaréz no Curso de Mestrado em Educação Especial:
UEFS/Brasil e CELAEE/Cuba;
TEXTOS Complementares das disciplinas: Deficiências Auditiva e Visual ministradas pela
professora Rosa Maria Castellanos Peréz no Curso de Mestrado em Educação Especial:
UEFS/Brasil e CELAEE/Cuba;
TEXTOS Complementares das disciplinas: Psicoterapia Familiar e a Familia e a
Comunidade do aluno com Necessidades Educativas Especiais ministradas pelo professor
Félix M. Diaz Rodríguez no Curso de Mestrado em Educação Especial: UEFS/Brasil e
CELAEE/Cuba;
TEXTOS Complementares das disciplinas: Desvios da Linguagem e Deficiência Físicomotora ministradas pelo professor Santiago A. Borges no Curso de Mestrado em Educação
Especial: UEFS/Brasil e CELAEE/Cuba;
TEXTOS Complementares das disciplinas: Avaliação e Diagnóstico e Taller I ministradas
pela professora Carmen Alvaréz Cruz no Curso de Mestrado em Educação Especial:
UEFS/Brasil e CELAEE/Cuba.
112
WEBSITES:
URL: <http://www.caleidoscópio.aleph.com.br>
URL: <http://www.bauru.unesp.br/fc/boletim/indices/edusp>
URL: <http://www.mec.gov.br>
URL: <http://www.ines.org.br>
URL: <http://www.regra.com.br/educação>
URL: <http://www.nuteses.ufu.br>
URL: <http://www.niee.ufrgs.br>
URL: <http://www.mec.gov.br/seesp>
URL: <http://inep.gov.br>
URL: <http://ibge.gov.br>
URL: <http://estatisticaseducacionais.gov.br>
113
ANEXO A
OPERACIONALIZAÇÃO DE TERMOS
Na seqüência abaixo, encontram-se os significados dos termos-chave do presente
trabalho, com o objetivo de favorecer uma melhor compreensão na sua leitura.
- Teoria da Representação Social
“É uma modalidade de conhecimento particular que tem por função a elaboração de
comportamentos e a comunicação entre indivíduos” (Moscovici, 1978, p. 26). Tal
conhecimento é constituído por um conjunto de informações, crenças, opiniões e atitudes
partilhadas por um grupo a respeito de um dado objeto social. Não se trata apenas de
“opiniões sobre” ou “imagens de”, mas de teorias coletivas sobre o real que “determinam
um campo das comunicações possíveis, dos valores ou das idéias presentes nas visões
compartilhadas pelos grupos, e regem, subseqüentemente, as condutas desejáveis ou
admitidas” (Moscovici, 1978, p. 51): “segundo o que o indivíduo diz, pode-se deduzir o
que ele vai fazer” (Id., p. 46).
- Teoria Sócio-Histórico-Cultural de Vigotsky
É o enfoque teórico que deu bases científicas (Neurologia, Psicologia e Pedagogia) para a
construção de uma concepção otimista sobre o potencial educativo dos alunos com
deficiência, pois defende a tese que “el niño com defecto no es indispensablemente un niño
deficiente. El grado de su anormalidad depende del resultado de la compensación social , es
dicir, de la formación final de su personalidad en general.” (Vigotsky, 1995, p. 10)
- Aluno com deficiência
É o aluno que apresenta em caráter permanente ou temporário alguma deficiência física,
sensorial (auditiva e visual), mental e/ou múltipla, e por isso, necessita de apoio pedagógico
para superar e/ou compensar suas necessidades educativas especiais.
114
- Inclusão de “alunos com deficiência”
É uma proposta educativa que visa incluir os “alunos com deficiência” na rede regular de
ensino comum, em todos os níveis de ensino, da Educação Infantil ao Ensino Superior. Esta
proposta parte do pressuposto de que “as diferenças humanas são normais e que a
aprendizagem deve se adaptar às necessidades” (Declaração de Salamanca, 1994, p. 04) dos
alunos, independente de seus limites.
115
ANEXO B
FICHA DE IDENTIFICAÇÃO DO ENTREVISTADO
Nome .........................................................................................................................
Endereço ...................................................................................................................
....................................................................................................................................
....................................................................................................................................
Telefone residencial ........................................... Celular ..........................................
E-mail .................................@...................................................................................
Melhor horário para contato por telefone ..................................................................
Data prevista para conclusão do estágio ....................................................................
116
ANEXO C
ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM ESTUDANTES DE PEDAGOGIA
APRESENTAÇÃO
Esta entrevista faz parte do nosso trabalho de pesquisa no Mestrado em Educação
da Universidade Estadual de Feira de Santana. A pesquisa aborda temáticas referentes à
formação inicial em Pedagogia. Solicitamos sua autorização para gravar a entrevista, a
fim de não distorcer o que for dito. Asseguramos o anonimato das pessoas entrevistadas,
devendo este instrumento ser utilizado apenas para intenção científica deste trabalho.
Parte I – Dados de Identificação dos Ingressos no Curso de Pedagogia
01. Sexo:
02. Idade:
03. Estado civil:
04. Possui filhos?
Se sim: Quantos filhos?
Qual a idade dos seus filhos?
05. Qual foi o seu curso(s) de formação no ensino médio?
06. Quando você iniciou o curso de Pedagogia?
07. O que o levou a ingressar nesse curso?
08. Antes de iniciar no curso de Pedagogia, você já atuou como professor(a)?
Se sim: Onde?
Quando?
Por quanto tempo?
117
Em que turmas?
Como avalia a experiência?
09. Antes de ingressar no curso de Pedagogia, você tentou outro(s)vestibular(s)?
Se sim: Para qual(s) curso(s)?
Em que universidades ou Faculdades?
Quando?
Foi aprovado?
Se foi aprovado e não cursou, o que o levou a desistir?
Se ingressou: Como avalia a experiência?
Chegou a se formar?
10. Antes de ingressar no curso de Pedagogia, já participou de seminários, palestras,
simpósios ou cursos de aperfeiçoamento na área de educação?
Se sim: Quais?
Onde?
Quando?
Como você avalia essa experiência?
11. Antes de ingressar no curso de Pedagogia você conhecia pessoas da área de Educação?
Se sim: Quem eram essas pessoas?
Qual era a atividade dessas pessoas na área de Educação?
Qual era o tipo de relacionamento que você tinha com
essa(s) pessoa(s)?
12. Na história de aluno(a), desde a educação infantil até o momento atual, algum(a)
professor(a) lhe marcou?
Se sim:
Como era esse(a) professor(a):
Seu contato com ele se deu em que momento de sua formação?
Sua relação com esse professor foi predominantemente positiva ou
negativa?
118
13. Aspectos que lhe agradam no curso de Pedagogia:
14. Aspectos que lhe desagradam no curso de Pedagogia:
15. Desde que iniciou o curso de Pedagogia, aconteceu alguma mudança em você?
Se sim: Qual?
16. Você está concluindo o curso de Pedagogia no tempo regular?
Se não: Por que não o fez no tempo regular?
17. Já possui alguma atividade profissional paralela ao curso de Pedagogia?
Se sim: Qual?
Onde?
Desde quando?
Qual a carga horária da sua atividade profissional?
18. Como aluno(a) que está concluindo o curso de Pedagogia, na sua opinião, o que
representa a Educação?
19. Que características deve ter um bom professor:
20. Que características deve ter um professor para atuar com crianças:
21. Que características deve ter um professor para atuar em equipe dentro de uma Escola?
22. Na sua opinião, as mulheres exercem o trabalho docente de maneira diferente dos
homens?
119
Se sim: Em quê?
23. O curso de Pedagogia é freqüentada sobretudo por mulheres. Você acha que isso
deveria ser mudado ou que não há razão de mudar?
24. De modo geral, os homens ocupam, com mais freqüência, empregos de
responsabilidade. Na sua opinião, quais são as razões?
25. Para os entrevistados que tem filhos: Você interrompeu suas atividades profissionais
quando seus filhos nasceram?
E seu marido (ou mulher)?
Se não: Ele(a) já pensou em interromper?
26. Para os entrevistado que não possuem filhos: Você pensa em interromper suas
atividades profissionais quando seus filhos nascerem?
E seu marido (ou mulher)?
27. Se seus filhos escolhessem a profissão de professor você ficaria satisfeito(a)?
Se não:
Por quê?
Que profissões você gostaria que seus filhos escolhessem?
28. Na sua opinião, uma pessoa que estuda Pedagogia é mais preparada para criar seus
filhos?
29. Na sua opinião, para uma mulher ter um emprego é tão indispensável ou menos
indispensável que para um homem?
120
30. O que você acha mais importante: uma realização profissional ou uma realização
familiar?
Parte II – Prática Educativa
31. Você já ouviu falar na expressão “pessoa com deficiência”?
Se sim:
Onde?
Quando?
Se foi no curso de Pedagogia, esclarecer em que disciplina como o assunto
foi abordado?
32. Você já teve algum contato com alguma “pessoa com deficiência”?
Se sim: Com quem?
Quando?
Onde?
Como foi a experiência?
33. Você possui alguma pessoa com deficiência na sua família?
Se sim: Quem?
Que relação você tem com ele (a)?
34. Conhece alguém que tem um (a) filho (a) com deficiência?
121
Se sim: Quem?
Que relação você tem com essa família?
35. O que você entende pela expressão “aluno com deficiência”?
36. Na sua opinião, o “aluno com deficiência” apresenta dificuldades de aprendizagem?
Se sim: Qual (s)?
Por quê?
37. Você já teve algum contato com alunos com de deficiência?
Se sim: Onde?
Quando?
Obs: Se foi através do curso de Pedagogia, esclarecer em que disciplina e como foi a
experiência.
38. Você já teve alguma experiência como professora de “aluno com deficiência”?
Se sim: Onde?
Quando?
Como você avalia essa experiência?
Obs: Caso essa experiência esteja vinculada ao curso de Pedagogia, esclarecer mais
detalhes sobre como se deu a referida experiência;
122
39. Como você se sentiria, na condição de mãe, se na classe de seu filho estudasse um
aluno com deficiência?
40. Como você se sentiria, na condição de colega de classe, de uma pessoa com
deficiência?
41. Na sua opinião, quais os lugares mais adequados para se educar um aluno com
deficiência?
42. Como se sentiria na condição de professora de ensino regular, se tivesse que receber
em sua classe um “aluno com deficiência”?
43. Você já ouviu falar na expressão “aluno portador de Necessidade Educativa
Especial”?
Se sim: Onde?
Com quem?
Quando?
Se foi no curso de Pedagogia, esclarecer em que disciplina e foi a respeito
de quê?
44. O que você entende pela expressão “aluno portador de Necessidade Educativa
Especial”?
45. Você estabelece alguma relação entre a expressão “aluno portador de Necessidade
Educativa Especial” e “aluno com deficiência”?
Se sim: Que relação?
123
46. Você já ouviu falar na expressão “Educação Inclusiva”?
Se sim: Onde?
Quando?
Se foi no curso de Pedagogia, esclarecer em que disciplina ou curso e de
que forma essa informação foi passada:
47. O que você entende pela expressão “Educação Inclusiva”?
48. Na sua opinião, é necessário que o curso de Pedagogia ofereça possibilidade para se
estudar temáticas referentes à Educação Inclusiva?
Se sim: De que forma?
49. Que características deve ter um professor para atuar na “Educação Inclusiva”?
50. Você considera a “Educação Inclusiva” uma proposta adequada para a realidade
educacional brasileira? Em quê?
124
ANEXO D
GUIA DE ANÁLISE DE CONTEÚDO
01. Pré-análise:
-
Transcrição das entrevistas;
-
Leitura das entrevistas para caracterização do perfil das entrevistas;
-
Elaboração do perfil das entrevistadas conforme quadro em anexo;
02. Exploração do material:
-
Leitura flutuante das entrevistas – deixar-se invadir pelo texto das entrevistas para
identificar as linhas gerais material através da leitura vertical (ler individualmente cada
entrevista) e da leitura horizontal (ler o conjunto das entrevistas de acordo com a ordem
das questões levantadas no roteiro da entrevista);
-
Preparação do material para análise de conteúdo (fazer anotações sobre os discursos
com base na problemática da pesquisa);
03. Tratamento dos dados:
-
Fazer releituras no material acompanhado das anotações, a fim de extrair as unidades de
registro (temática), que servirão para compor as categorias;
-
Definição de categorias;
-
Codificação das categorias com recortes do discurso que servirão de unidade de análise
do tipo temática;
04. Inferências:
-
Descrição do conteúdo das categorias de acordo com o referencial da teoria das
representações sociais;
-
Explicação do conteúdo das categorias de acordo com todo o referencial teórico da
pesquisa;
-
Comprovação da idéia defendida na pesquisa;
125
ANEXO E
PERFIL DAS ENTREVISTADAS
TRAJETÓRIA
IDADES DAS ENTREVISTADAS
PESSOAL
21 - 22 - 24 - 25 - 26 - 27 - 29 - 31 - 42 - 45 - 49
Nº de alunas
02
01
02
02
01
02
02
01
01
01
01
Estado Civil
S
S
S
S
S
S
C
S
C
C
C
Possui Filhos
N
N
N
N
N
S
N
N
S
S
N
TRAJETÓRIA ACADÊMICA
ANO DE INGRESSO
1994
1995
1996
1997
1998
UCSAL
01
-
-
03
04
UNEB
01
-
-
03
-
UFBA
-
01
02
02
-
TRAJETÓRIA DOCENTE
INSTITUIÇÃO
UCSAL
UNEB
UFBA
ATUOU COM DOCENTE
03
02
-
FEZ MAGISTÉRIO
04
02
01
CONTATO COM PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
ONDE
UCSAL
UNEB
UFBA
Na família
01
03
02
No trabalho
04
03
02
Na comunidade
06
04
05
126
ANEXO F
PPACP - Proposta Pedagógica de Aperfeiçoamento do Curso Pedagogia –
Recomendações para formação inicial de educadores necessária à inclusão de “alunos
com deficiência”
01. Objetivos gerais
-
Contribuir para o aperfeiçoamento do curso de Pedagogia por meio de um conjunto
de recomendações que favoreça a formação inicial de educadores, com competência
para atuar na prática educativa, conforme princípios da proposta de inclusão de
“alunos com deficiência”.
-
Propor ao curso de Pedagogia uma formação inicial, com preparação teórica e
didática, que leve em consideração as representações sociais dos estudantes de
Pedagogia sobre “alunos com deficiência” e suas atitudes com relação à inclusão
dos referidos alunos.
-
Propiciar aos docentes e discentes do curso de Pedagogia uma reflexão sobre a
prática educativa necessária à inclusão de “alunos com deficiência”, à luz da teoria
Sócio-Histórico-Cultural de Vigotsky e de seus seguidores.
-
Favorecer a formação de um educador comprometido, sensível às necessidades do
ser humano e aberto a fazer revisão no seu referencial teórico, de modo a
acompanhar o desenvolvimento das ciências e das novas tecnologias no seu campo
de trabalho
127
-
02. Operacionalização
OBJETIVOS
(para que fazer?)
CONTEÚDOS
(o que fazer?)
ESTRATÉGIAS
(como fazer?)
(com o que fazer?)
Propor
ao
Colegiado
do
curso
de
Pedagogia
a
apresentação
da
pesquisa
Representações
sociais
dos
estudantes
de
Pedagogia sobre
“alunos
com
deficiência”
responsável pela
elaboração
da
PPACP
Importância
da
pesquisa
Representações
sociais
dos
estudantes
de
Pedagogia sobre
“alunos
com
deficiência” - para
repensar
a
formação inicial
do pedagogo no
contexto
de
implementação
das políticas de
inclusão
de
“alunos
com
deficiência”
no
Brasil
1.Sensibilização
dos membros do
Colegiado
do
curso
de
Pedagogia
para
refletir sobre a
importância dessa
pesquisa
2.Apresentação da
pesquisa
como
requisito
necessário
para
compreensão da
PPACP
3.Discussão
4.Esclarecimento
de dúvidas
Transparências com
resumo
dos
resultados
da
pesquisa
Retroprojetor
Quadro
Piloto
Ampliar
a
discussão
da
pesquisa
Representações
sociais
dos
estudantes
de
Pedagogia sobre
“alunos
com
deficiência” - com
os docentes do
curso
de
Pedagogia
enfatizando
as
• Trajetória do
curso
de
Pedagogia
no
Brasil de acordo
com o marco
teórico da pesquisa
• Características
do
perfil
profissional
das
estudantes
de
Pedagogia
de
acordo com os
dados recolhidos
1.Exposição
participada sobre a
trajetória do curso
de Pedagogia e as
características do
perfil profissional
das estudantes do
referido curso
2.Provocação dos
docentes,
no
sentido de pensar
numa proposta de
aperfeiçoamento
Transparências com
resumo da trajetória
do
curso
de
Pedagogia e as
características
do
perfil profissional
das estudantes do
referido curso
Retroprojetor
Transparências
Quadro
Piloto
128
seguintes
questões: 1) a
quem se destina o
curso
de
Pedagogia; 2) qual
o perfil desse
profissional; e 3) o
que os professores
precisam
para
atuar na prática
educativa
de
inclusão
de
“alunos
com
deficiência”
na investigação
•
PPACP
–
Proposta
Pedagógica
de
Aperfeiçoamento
do
curso
de
Pedagogia
–
Recomendações
para
formação
inicial
de
educadores
necessária
à
inclusão
de
“alunos
com
deficiência”
para o curso de
Pedagogia atender
às
necessidades
das políticas de
Educação
Inclusiva no Brasil
3. Levantamento
dos conhecimentos
prévios
dos
docentes
acerca
dessa proposta
Criar
condições
para os docentes
do
curso
de
Pedagogia
relacionar
suas
disciplinas com o
conjunto
de
recomendações
apresentadas pela
PPACP
PPACP – Proposta
Pedagógica
de
Aperfeiçoamento
do
curso
de
Pedagogia
–
Recomendações
para
formação
inicial
de
educadores
necessária
à
inclusão
de
“alunos
com
deficiência
1.Apresentação
geral da PPACP
• Objetivos
•
Pressupostos
teóricos
•
Operacionalização
• Validação
2.Discussão
3.Esclarecimento
de dúvidas
Transparências com
resumo da PPACP
em
Retroprojetor
Quadro
Piloto
129
OBJETIVOS
(para que fazer?)
CONTEÚDOS
(o que fazer?)
ESTRATÉGIAS
(como fazer?)
(com o que fazer?)
Propor
aos
docentes
da
disciplina
de
Didática
a
promoção
de
experiências que
favoreçam
a
prática educativa
dos estudantes de
Pedagogia com a
inclusão
de
“alunos
com
deficiência” e a
socialização
dessas
experiências à luz
da teoria SócioHistórico-Cultural
Prática educativa
de inclusão de
“alunos
com
deficiência” à luz
da teoria SócioHistórico-Cultural
de Vigotsky e de
seus seguidores
1.Visitas
às
escolas inclusivas
2.Relatos
de
docentes
que
atuam
com
a
inclusão
de
“alunos
com
deficiência”
3.Leitura
de
pesquisas
que
abordem a prática
educativa
de
inclusão
de
“alunos
com
deficiência” à luz
da teoria SócioHistórico-Cultural
de Vigotsky e de
seus seguidores
TV
Vídeo
Papel
Lápis
Quadro
Piloto
Caderno de registro
Sugerir
aos
docentes
da
disciplina
de
Estágio
Supervisionado à
inclusão
de
contatos
diretos
com “alunos com
deficiência”
nas
atividades
de
estágio
desenvolvidas no
curso
de
Princípios
proposta
Inclusão
“alunos
deficiência”
1. Exposição sobre
os princípios da
proposta
de
Inclusão
de
“alunos
com
deficiência”
2.
Debate
da
temática Educação
e Diversidade com base nos
princípios
da
proposta
de
Inclusão
Transparências com
resumo
dos
princípios
da
proposta de Inclusão
Retroprojetor
Quadro
Piloto
da
de
de
com
130
Pedagogia
Sensibilizar
os
docentes
da
disciplina
Estrutura
e
Funcionamento
de Ensino da
necessidade
de
abordar
as
políticas
de
Inclusão
de
“alunos
com
deficiência”
no
Brasil, como parte
integrante
do
estudo
das
Políticas Públicas
do
Sistema
Educacional
Brasileiro
Políticas
Inclusão
“alunos
deficiência”
Brasil
de
de
com
no
1.Exposição das
políticas
de
Inclusão
de
“alunos
com
deficiência”
no
Brasil
2.Debates
3.Entrevistas com
representantes da
Secretaria
de
Educação (Estado
e
Município),
responsáveis pela
implementação
das
referidas
políticas
Transparências com
resumo
dos
documentos
das
políticas de Inclusão
de “alunos com
deficiência”
no
Brasil
Retroprojetor
Quadro
Piloto
Lápis
Papel
131
OBJETIVOS
(para que fazer?)
CONTEÚDOS
(o que fazer?)
ESTRATÉGIAS
(como fazer?)
(com o que fazer?)
Propor
aos
docentes
das
disciplinas
de
História
da
Educação
e
Filosofia
da
Educação
o
acréscimo
de
temas relativos aos
aspectos históricos
e filosóficos da
educação
de
“alunos
com
deficiência”
Aspectos
1.Exposição
históricos
e participada sobre
filosóficos
na os
aspectos
educação
de históricos
e
“alunos
com filosóficos
da
de
deficiência”
em educação
“alunos
com
diferentes
contextos
deficiência”
em
socioculturais
diferentes
contextos
socioculturais
2.Relação desses
aspectos
no
contexto
de
implementação
das políticas de
inclusão
de
“alunos
com
deficiência”
no
Brasil
3.Debates
Transparências com
resumo dos aspectos
históricos
e
filosóficos
da
educação de “alunos
com
deficiência”
Retroprojetor
Quadro
Piloto
Lápis
Papel
.
Propor
aos
docentes
da
disciplina
de
Psicologia
a
abordagem
de
temas referentes à
prevenção,
diagnóstico
e
tratamento
da
deficiência
Prevenção,
diagnóstico
tratamento
deficiências
Transparências com
resumo acerca das
possibilidades
de
prevenção,
diagnóstico
e
tratamento
da
deficiência
Retroprojetor
Quadro
Piloto
1.Exposição
e participada sobre
das as possibilidades
prevenção,
diagnóstico
e
tratamento
da
deficiência
2.Debates
132
Enfatizar o estudo Atividades
de 1.Exposição
Retroprojetor
e a prática de diagnóstico inicial acerca
da Transparências
atividades
de
importância
das Quadro
diagnóstico inicial
atividades
de Piloto
na disciplina de
diagnóstico inicial Lápis
Avaliação
para
na formação do Papel
os
futuros
pedagogo
TV
pedagogos
2.Apresentação de Vídeo
descobrirem
algumas atividades
precocemente as
de
diagnóstico
inicial necessárias
necessidades
educativas
a prática educativa
especiais
dos
de inclusão de
“alunos
com
“alunos
com
deficiência”
deficiência”
133
OBJETIVOS
(para que fazer?)
CONTEÚDOS
(o que fazer?)
ESTRATÉGIAS
(como fazer?)
(com o que fazer?)
Contemplar o uso
das
Novas
Tecnologias para
descobrir
novas/diferentes
formas
de
aprender/incluir na
prática educativa
de inclusão de
“alunos
com
deficiência”
Novas
Tecnologias
e
prática educativa
de inclusão de
“alunos
com
deficiência”
1.Apresentação de
experiências com
o uso das novas
tecnologias
na
educação
de
“alunos
com
deficiência”
2.Debates
TV
Vídeo
Computador
Quadro
Piloto
Realizar atividades
específicas com o
corpo
técnico
administrativo da
universidade,
relativas à inclusão
de “alunos com
deficiência”
no
sistema
educacional
brasileiro
1.Sensiblização do
corpo
técnicoadministrativo da
universidade para
apresentação dos
princípios
da
proposta
de
inclusão
de
“alunos
com
deficiência”
2.Apresentação
breve da PPACP
Transparências com
resumo
dos
princípios
da
proposta de inclusão
de “alunos com
deficiência”
Retroprojetor
Propor
ao
Colegiado
do
curso
de
Pedagogia
a
realização
de
eventos aberto a
toda comunidade
Seminário
Cursos
Palestras
Simpósios
Jornadas
Pedagógicas
Cartazes
divulgação
Boletins
informativos
Quadro
Piloto
de
134
universitária que
tratem de temas
relacionados
à
inclusão
de
“alunos
com
deficiência”
Sugerir
ao
Departamento
do
curso de Pedagogia a
criação de cursos de
Pós-graduação
para
atender, inicialmente,
à
formação
de
especialistas nas áreas
de deficiência visual,
auditiva e/ou mental
1.Apresentação
das
experiências
de
universidades
brasileiras
que
oferecem cursos de
pós-graduação
para
formação
de
especialistas nas áreas
de deficiência visual,
auditiva e/ou mental
Transparências
com
resumo das experiências
de
universidades
brasileiras que oferecem
os referidos cursos;
Sugerir aos núcleos de
pesquisa e/ou extensão
que
estimulem
o
desenvolvimento de
atividade
que
envolvam “alunos com
deficiência”.
1.Apresentar
experiências
de
atividades
de
pesquisas
e/ou
extensão envolvendo
“alunos
com
deficiência”.
Transparências
Retroprojetor
Papel
Lápis
Quadro
Piloto
ANEXO G
Retroprojetor
Quadro
Piloto
135
GUIA COM CRITÉRIO PARA AVALIACÃO DE ESPECIALISTA
01. APRESENTAÇÃO DO ESPECIALISTA
Nome_____________________________________________________________
Formação__________________________________________________________
Universidade onde leciona____________________________________________
Curso e disciplinas que leciona ________________________________________
Tempo de experiência no Magistério Superior ____________________________
02. APRECIAÇÃO DA PROPOSTA
Analise a PPACP - Proposta Pedagógica de Aperfeiçoamento do curso de Pedagogia:
recomendações para formação inicial necessária à prática educativa de inclusão de
‘alunos com deficiência’. Marque sim ou não:
01. Considera a Proposta importante? ( ) SIM ( )NÃO
02. É compreensível? ( ) SIM ( )NÃO
03. Seus objetivos são coerentes? ( ) SIM ( )NÃO
04. Possui aplicabilidade? ( ) SIM ( )NÃO
05. É possível identificar seu enfoque principal? ( ) SIM ( )NÃO
06. Os procedimentos da PPACP estão coerentes? ( ) SIM ( )NÃO
07. Oferece novidades? ( ) SIM ( )NÃO
136
08. O que você gostaria de retirar da PPACP?
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
09. O que você gostaria de acrescentar na PPACP?
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
10. Parecer Científico/Acadêmico:
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
_____________________________________________________
Assinatura do Especialista
137
Salvador, ________de _______________de____________
Prezado Especialista,
Solicito sua colaboração na análise da presente proposta que se destina ao curso de
formação inicial em Pedagogia de universidades. Trata-se de uma proposta elaborada, a
partir do trabalho de pesquisa no Mestrado em Educação Especial, realizado na UEFS –
Universidade Estadual de Feira de Santana – Brasil, em convênio com o CELAEE – Centro
de Referencia Latinoamericano para la Educación Especial – Cuba. Esta investigação teve
como objetivo identificar as representações sociais dos estudantes de Pedagogia sobre
“alunos com deficiência” e conhecer suas atitudes com relação à inclusão dos referidos
alunos. Os resultados da pesquisa apontaram muitas pistas para repensar o curso de
Pedagogia, no contexto de implementação das políticas de Educação Inclusiva no Brasil.
Tais pistas propiciaram a construção da PPACP – Proposta Pedagógica de
Aperfeiçoamento do curso de Pedagogia: Recomendações para a formação inicial
necessária à inclusão de “alunos com deficiência”. Na certeza de contar com sua
competência para fazer a apreciação desta proposta, segue Guia com Critério para
Avaliação de Especialista.
Atenciosamente,
Jaciete Barbosa dos Santos
138
ANEXO H
APRECIAÇÃO DOS ESPECIALISTAS
139
RECOMENDAÇÕES
Em termos da pesquisa:
-
Entregar uma cópia do trabalho para Direção de Departamento do curso de
Pedagogia das universidades onde a pesquisa foi realizada;
-
Colocar-se à disposição para esclarecimentos e/ou apresentação da pesquisa
nessas universidades;
-
Ampliar análise da pesquisa, estudando o processo de ancoragem das
representações sociais apresentadas pelos estudantes de Pedagogia sobre “alunos
com deficiência”;
-
Reformular a tese numa linguagem apropriada para publicação de artigo e/ou
livro.
Em termos da Proposta:
-
Aplicar a PPACP – Proposta Pedagógica de Aperfeiçoamento do curso de
Pedagogia: recomendações para formação inicial de educadores necessária à
inclusão de “alunos com deficiência”, no Departamento de Educação do
Campus XI da UNEB, onde atuamos como docente no curso de Pedagogia;
-
Enriquecer a PPACP – Proposta Pedagógica de Aperfeiçoamento do curso de
Pedagogia: recomendações para formação inicial de educadores necessária à
inclusão de “alunos com deficiência”, a partir das experiências apresentadas em
sua execução;
-
Propor a aplicação da PPACP – Proposta Pedagógica de Aperfeiçoamento do
curso de Pedagogia: recomendações para a formação inicial de educadores
necessária à inclusão de “alunos com deficiência”, nos diferentes Departamentos
da UNEB que oferecem o curso de graduação em Pedagogia;
140
-
Divulgar os resultados da aplicação da PPACP – Proposta Pedagógica de
Aperfeiçoamento do curso de Pedagogia: recomendações para formação inicial
de educadores necessária à inclusão de “alunos com deficiência”, em seminários
organizados para discutir a formação inicial de docentes no contexto da
Educação Inclusiva;
-
Sugerir a realização de outros estudos dessa natureza em cursos de licenciaturas
em Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, Geografia, História e Artes, a fim
de ampliar esta proposta a partir da contribuição desses estudos.
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JACIETE BARBOSA DOS SANTOS