Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de
São Paulo – Campus São Paulo
Relações de Poder, Gênero e a Sexualidade na Educação
de Jovens e Adultos
ELISABETE SALES DE MELO
São Paulo
Março - 2010
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de
São Paulo – Campus São Paulo
Relações de Poder, Gênero e a Sexualidade na Educação
de Jovens e Adultos
ELISABETE SALES DE MELO
Monografia apresentada ao curso de Pós Graduação
Especialização Latu Sensu em Educação Profissional
Integrada à Educação Básica com a Modalidade de
Educação de Jovens e Adultos – Proeja, do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo
– IFSP – Campus São Paulo, como parte dos requisitos
para a obtenção de certificado de Especialista em
Educação de Adultos.
Orientador:
Prof. Dr. Antônio Carlos da F. Bragança Pinheiro
São Paulo
Março- 2010
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador Professor Doutor Antônio Carlos da F. Bragança Pinheiro que muito
colaborou no processo de construção de trabalho contribuindo na minha formação.
Aos entrevistados por colaborarem com seus relatos de vida .
Agradeço primeiramente a Deus que sempre me
iluminou, dando força para eu confiar e vencer
todos os desafios.
Dedico este trabalho aos meus filhos Vinícius e
Fabrício pela compreensão, companheirismo,
amor, carinho e dedicação, em todos os
momentos da minha vida.
Aos mestres e colegas que me proporcionaram
desenvolvimento e crescimento e na minha
formação.
A todas as pessoas que fizeram parte de minha
vida, em outros momentos, que me levaram a
realizar este trabalho.
Aos familiares e amigos que estiveram comigo
nas horas mais difíceis e também em todas as
alegres.
Em especial uma amiga do coração Maria José
Pereira da Silva, que
momentos.
é parceira em todos os
“Sou o que quero ser, porque possuo apenas uma vida e nela
só tenho uma chance de fazer o que quero.
Tenho felicidade o bastante para fazê-la doce, dificuldade
para fazê-la forte, tristeza para fazê-la humana e esperança
suficiente para fazê-la feliz.
As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas, elas
sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em
seus caminhos”.
Clarice Lispector
RESUMO
O papel da mulher e do homem é constituído culturalmente e muda conforme a
sociedade e o tempo. Esse papel começa a ser construído desde que o bebê está na barriga
da mãe, quando a família, de acordo à expectativa, começa a preparar o enxoval. Depois
que nasce o bebê, a primeira coisa que se identifica é o sexo: “menina ou menino” e a
partir desse momento começará a receber mensagens sobre o que a sociedade espera desta
pessoa. É percebido que os fatores ligados ao gênero têm interferido na participação
feminina nas turmas da Educação de Jovens e Adultos, sobretudo, quanto ao casamento e
a maternidade.
O gênero refere-se às relações sociais desiguais de poder entre homens e mulheres,
que são o resultado de uma construção social do papel do homem e da mulher a partir das
diferenças sexuais. Assim, como as diferenças polares entre homens e mulheres, nesse
modelo de feminilidade, fortemente enraizado na relação mulher-mãe, tem origem nas
transformações ocorridas no século 18. Objetivou-se apontar algumas pistas, sobre as
relações de poder, gênero e sexualidade na educação de Jovens e Adultos, assim como:
promover reflexões, sugerir algumas ações que propicie a auto-estima com respeito às
diferenças nos gêneros e a partir de entrevistas, com mulheres e homens na Educação de
Jovens e Adultos.
Os sujeitos envolvidos nessa pesquisa serão mulheres e homens alunos do CIEJA
Campo Limpo. A partir dos relatos, observou-se que convivem numa desigualdade social e
que as relações de gênero é uma questão de poder construída na sociedade ocidental.
Portanto, espera-se, que o processo de desconstrução e construção de conceitos de
sexualidade no gênero e na educação, passem por momentos de mudanças significativas na
vida, e que atitudes preconceituosas e termos pejorativos deixem de ser repetidos.
Palavras-chave: Gênero, Sexualidade, Educação,
ABSTRACT
The role of man and woman is culturally constituted and as society changes and
time. This paper begins to be built since the baby in the womb, when the family, according
to expectation, begins to prepare the trousseau. After the baby is born, the first thing that
identifies the sex: "girl or boy" and from that moment begin to receive messages about
what society expects of this person. It is perceived that the factors related to gender have
affected the participation of women in the adult education classes, especially regarding
marriage and motherhood.
Gender refers to social relations of unequal power between men and women that
are the result of a social role of woman and men from sexual differences. Thus, as the polar
differences between men and women, this model of womanhood, deeply rooted in the
woman-mother, can be traced to changes occurring in the 18th century. The objective was
to point out some clues about the relationships of power, gender and sexuality in the
education of youngsters and adults as well as promote reflections suggest some actions that
fosters self-esteem with respect to differences in genders and from interviews with women
and men in adult education.
The subjects involved in this research students will be women and men CIEJA
Field Clean. It was observed that live in social inequality and gender relations is a question
of power built in Western society. Therefore, it is expected that the process of
deconstruction and construction of concepts of sexuality and gender in education, pass
through times of significant changes in life, and that prejudiced attitudes and derogatory
terms are no longer repeated.
Keywords: Gender, Sexuality, Education.
Lista de Abreviaturas e Siglas
CIEJA
Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos
CDHEP
Centro de Direitos Humanos e Educação Popular
GTPOS
Grupo de Trabalho e Pesquisa Pesquisa em Orientação Sexual
MEC
Ministério de Educação e Cultura
PCNs
Parâmetros Curriculares Nacionais
ONU
Organização das Nações Unidas
UBS
Unidade Básica de Saúde
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO
10
1.1 Objetivo Geral
16
1.2 Objetivos Específicos
16
1.3 Metodologia da Pesquisa
17
2. A MULHER E O PODER
17
2.1 O Poder nas Relações de Gênero
18
2.2 O Poder na Sexualidade
20
2.3 Os Sentidos da Sexualidade: Natureza, Cultura e Educação
23
2.4 A Importância da Sexualidade nas Ações Pedagógicas na Sala de Aula
24
3. ESTUDO DE CASO
28
3.1 Caracterização Ambiental
28
3.2 Caracterização da Escola
29
3.3 Pesquisa de Campo
31
3.3.1 Direito de Estudar
31
3.3.2 Interrupção dos Estudos
32
3.3.3 Diferença de Gênero
34
3.3.4 Convivência entre Mulheres e Homens
35
3.3.5 CIEJA e Mudança na Vida
36
3.4 Análise sobre os relatos
37
3.5 Considerações sobre a Pesquisa de Campo
38
4. CONCLUSÃO
40
REFERÊNCIAS
41
Apêndice: A
Apêndice: B
Apêndice: C
1. INTRODUÇÃO
“A humildade exprime, uma das raras certezas de que estou
certo: a de que ninguém é superior a ninguém”.
Paulo Freire
O papel do homem e da mulher é constituído culturalmente e muda conforme a
sociedade e o tempo. Esse papel começa a ser construído desde que o (a) bebê está na
barriga da mãe, quando a família, de acordo à expectativa, começa a preparar o enxoval
conforme o sexo do bebê. Dessa forma, em geral na sociedade ocidental é escolhida a cor
de rosa para as meninas e azul para os meninos. Depois que nasce o bebê, a primeira coisa
que se identifica é o sexo: “menina ou menino” e a partir desse momento começará a
receber mensagens sobre o que a sociedade espera desta pessoa. Ou seja, por ter genitais
femininos ou masculinos, eles são ensinados pelo pai, mãe, família, escola, mídia,
sociedade em geral, diferentes modos de pensar, de sentir, de atuar (CABRAL; DÍAZ,
1999, p. 142-150).
É percebido que os fatores ligados ao gênero têm interferido na participação
feminina nas turmas da EJA, sobretudo, quanto ao casamento e a maternidade (GARCIA,
2006).
O gênero refere-se às relações sociais desiguais de poder entre homens e mulheres,
que são o resultado de uma construção social do papel do homem e da mulher a partir das
diferenças sexuais. Assim, como as diferenças polares entre homens e mulheres, nesse
modelo de feminilidade, fortemente enraizado na relação mulher-mãe, tem origem nas
transformações ocorridas no século 18. Porém, mesmo sendo resultante de uma construção
cultural de significados baseados na capacidade biológica de reprodução da mulher,
apresenta-se como natural instintivo e inevitável (CARVALHO; VIANA 1994, p.125).
As relações de gênero são produto de um processo pedagógico que se inicia no
nascimento e continua ao longo de toda a vida, reforçando a desigualdade existente entre
homens e mulheres. Cabral e Díaz (1999) consideram quatro eixos:
- sexualidade;
- reprodução;
- divisão sexual do trabalho;
- âmbito público/cidadania .
Os mesmos autores afirmam que, segundo a ciência, sexo refere-se às
características biológicas de homens e mulheres, ou seja, às características específicas dos
aparelhos reprodutores femininos e masculinos, ao seu funcionamento e aos caracteres
sexuais secundários decorrentes dos hormônios.
A sexualidade na mulher tem sido relacionada com a reprodução, ou seja, para a
mulher o centro da sexualidade é a reprodução e não considera o prazer. A sexualidade
reduzida à genitalidade se apresenta para as mulheres como algo “sujo”,vergonhoso,
proibido (CABRAL; DÍAZ,1999,p.142-150).
A mulher pode gerar um filho, e isto em si pode ser considerada uma fonte de
poder. A maternidade, tem sido controlada e tem determinado outros papéis, diminuindo as
possibilidades de participação social e limitando a vida das mulheres em outros âmbitos,
como por exemplo, no campo do trabalho.
No campo da divisão sexual do trabalho, pelo fato biológico, ainda a mulher é
quem engravida e quem alimenta. Assim, tem sido atribuído à ela a totalidade do trabalho
reprodutivo. Às mulheres, portanto, se atribui o ficar em casa, cuidar dos filhos e realizar o
trabalho doméstico, que é desvalorizado pela sociedade ocidental. Esse comportamento
deixa as mulheres com o papel de “donas de casas”, limitadas ao mundo do lar, com menos
possibilidade de educação, menos acesso à informação, à formação profissional etc.
Em relação ao espaço público e ao reconhecimento da cidadania, no início do
século 21, é comum que grande proporção de mulheres trabalhe e muitas delas sejam a
principal fonte para o sustento da família, isto não tem significado um maior
desenvolvimento e reconhecimento de sua cidadania. Em todos os países da América
Latina, incluindo o Brasil, os dados mostram que existe uma grande diferença entre
homens e mulheres e que a falta de eqüidade prejudica as mulheres (CABRAL; DÍAZ,
1999). Por exemplo, as meninas são incentivadas a serem passivas, sensíveis, frágeis,
dependentes e todos os brinquedos e jogos infantis reforçam o seu papel de mãe e dona de
casa.
Segundo Medeiros (2008), depois de muitos anos de estudos e lutas das mulheres,
foi sendo elaborado o conceito de gênero, que é o termo que busca explicar as relações
sociais entre homens e mulheres. O conceito de gênero foi utilizado como categoria de
análise primeiramente pela antropologia, que coloca o "ser mulher" ou "ser homem" como
uma construção social. A palavra gênero, tirada da gramática, foi utilizada para identificar
essa construção, diferenciando-a do sexo biológico. Este conceito está intimamente ligado
ao processor de acumulação de riquezas do capitalismo, que precisou garantir que a
descência paterna fosse determinada, para que assim os homens pudessem legar somente
aos seus filhos legítimos os bens que acumularam em vida através do excedente de
produção. Assim, com a consolidação da propriedade privada, tem-se a primeira divisão
sexual do trabalho reservando para as mulheres a esfera doméstica (MEDEIROS, 2008).
Desde então, a história da mulher foi a história da sua opressão. É, portanto com o
capitalismo, que nascem as condições objetivas para a opressão feminina (BARBOSA,
2008 ). É importante definir cada conceito já que, com freqüência, eles erroneamente são
usados como sinônimos.
O gênero, é o conjunto de crenças, prescrições e atribuições que se constroem
socialmente tendo por base a diferença sexual. Esta construção social funciona como uma
espécie de “filtro” cultural, com o qual se interpreta o mundo, e também como uma espécie
de armadura com a qual se constringem as decisões e oportunidades das pessoas,
dependendo se têm corpo de mulher ou corpo de homem. Todas as sociedades classificam
o que é “próprio” das mulheres e o que é “próprio” dos homens, e a partir dessas ideias
culturais estabelecem-se as obrigações sociais de cada sexo, com uma série de proibições
simbólicas (LAMAS, 2000) .
A palavra “gênero” começa a ser utilizada a partir da década de 1980, pelas
feministas1 americanas e inglesas, para explicar a desigualdade entre homens e mulheres,
concretizada em discriminação e opressão das mulheres. Nessa época, as investigações
sobre a condição social das mulheres já apontavam uma forte desigualdade entre homens e
mulheres, que tendia a aumentar conforme a classe social, raça, etnia e outras condições de
vida. Segundo o Dicionário dos Direitos Humanos (ESMPU, 2006), ”o sexo é uma
categoria biológica insuficiente para explicar os papéis sociais atribuídos ao homem e à
mulher”. A frase representa a ideia de que mulheres são passivas, emocionais e frágeis, e
que os homens são ativos, racionais e fortes. Na perspectiva de gênero, essas características
1. Feminista, concernente do feminismo, sistema dos que preconizam a ampliação legal dos direitos civis e
políticos da mulherou a igualdade dos direitos dela aos do homens (Antônio Olinto) .
são conseqüências de uma situação histórico-cultural e política; as diferenças são produto
de uma construção social.
Portanto, não existe naturalmente o gênero masculino e feminino. Gênero é uma
categoria relacional do feminino e do masculino.
O conceito de gênero considera as diferenças biológicas entre os sexos, reconhece a
desigualdade, mas não admite como justificativa para a violência, exclusão e para a
desigualdade de oportunidades no trabalho, na educação e na política (DDH, 2006 ).
Gênero tem a ver com feminismo, mas não é igual à mulher ou a feminismo. As
relações de gênero podem ser estudadas a partir da identidade feminina e masculina. Uma
análise de gênero pode se limitar a descrever as relações entre homens e mulheres. O
feminismo vai além, ao mostrar que essas relações são de poder e que produzem injustiça
(DDH, 2006) .
A expressão gênero vem, naturalmente, se incorporando nos instrumentos
normativos internacionais e na legislação dos países. No Brasil, foi introduzida na
Convenção de Belém do Pará (Decreto n. 1.973, de 01/08/1996), com o objetivo de
conceito de violência contra a mulher como qualquer ato ou conduta baseada no gênero.
Na questão da violência, não há definição de gênero, mas do contexto se infere o conceito
de relação de poder. Aparece, também, no Estatuto de Roma (Decreto nº.4.388, de
25/09/2002), com um significado mais restrito.
O Tribunal Penal Internacional, criado pelo Estatuto de Roma, incorpora:
a) uma definição de gênero;
b) o princípio da não-discriminação baseada em gênero;
c)
normas de procedimento e prova proteção e participação em relação a vítimas e
testemunhas de crimes de violência sexual;
(d)
criminaliza
em
nível
internacional
a
violência
sexual
e
de
gênero.
O primeiro ponto notável no estatuto, é a introdução do conceito de gênero em um
instrumento legal internacional. De acordo com o art. 7º, item 3, entende-se que o termo
“gênero” abrange os sexos masculino e feminino, dentro do contexto da sociedade, não lhe
devendo ser atribuído qualquer outro significado. É uma redação que resultou intensa
negociação com o Vaticano e os países Islâmicos, que reduzem o gênero a uma questão
biológica. A expressão, dentro do contexto da sociedade, dá-lhe a perspectiva cultural
necessária, embora de forma imprecisa e insuficiente.
Com a criação, no Brasil, da Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres, em
2003, fortaleceu-se a perspectiva de gênero em todas as políticas públicas.
O conceito de gênero ainda segue em construção. A identidade sexual, antes
dicotômica (masculino-feminino), ampliou-se para abranger homossexuais, lésbicas,
transexuais, travestis etc., que não se identificam como homens ou mulheres. Em 2008, se
sabe que o suposto sexo biológico e a identidade subjetiva nem sempre coincidem (DDH,
2006).
Uma das versões utililizadas em 2008 do conceito de gênero, de Marta Lamas
(2000), alude a uma rede de inter-relações e interações sociais que se constroem a partir da
divisão simbólica dos sexos. A mesma autora, nega qualquer base biológica e mesmo
cultural à noção de gênero. A seu ver, é uma lógica de pensamento, emoções e
representação da subjetividade íntima das pessoas.
Segundo Lamas (2000), elaborou uma cuidadosa análise sobre a categoria de gênero
apresentando dados históricos relacionados com essa categoria, bem como os diversos
estudos realizados até este momento sobre o tema. Também aborda os debates mais
significativos dessa problemática teórica, como: o viés androcêntrico da antropologia, a
definição da categoria gênero, a oposição natureza/cultura, em que retoma Sherry Ortner e,
por fim, analisa as instâncias que conformam o gênero.
Depois de muitos anos de estudos e lutas das mulheres, foi sendo elaborado o
conceito de gênero, que é o que busca explicar as relações sociais entre homens e
mulheres, o conceito de gênero foi utilizado como categoria de análise primeiramente pela
antropologia, que coloca o "ser mulher" ou "ser homem" como uma construção social. A
palavra gênero, tirada da gramática, foi utilizada para identificar essa construção,
diferenciando-a do sexo biológico (LAMAS, 2000).
Teoricamente, parte da compreensão de que a divisão sexual do trabalho entrelaça-se
à divisão social do trabalho, por este pressuposto, mulheres e homens participam de modo
desigual da produção. Entende-se que no desenrolar da história a opressão de gênero ligase à opressão de classes.
Para acorrente emancipacionista, o conceito se constrói historicamente considerando
os valores culturais atribuídos às diferenças de sexo, é por este caminho que irão se
desenvolver valores e práticas sistemáticas que diferenciam o feminino do masculino.
Este sistema que se forma do surgimento entrelaçado das duas opressões, é que
influencia diretamente nas relações desiguais de gênero, que por possuírem esta
característica se dão nas diferenciadas camadas sociais fundadas na opressão de classe
(VALADARES, 1999).
Por este raciocínio, a teoria emancipacionista entende que a opressão de gênero
possui bases culturais e se constrói culturalmente, o que possibilita uma aparente
independência conceitual, uma vez que esta interage com as demais opressões, sobretudo
com a de classe.
Desta forma, agir contra a opressão de gênero significa reagir contra toda forma de
opressão, buscando atribuir ao conceito de gênero um significado radical que busque
romper tanto o elo estrutural levando-a para a busca da emancipação social, como o elo
cultural, percorrendo caminhos próprios nas diversas esferas da sociedade, reafirmando
que o socialismo, apesar da derrota de algumas experiências, “é o único projeto capaz de
atribuir passagem a um processo que vise o fim das discriminações de gênero
(VALADARES,1999).
Portanto, a história de luta das mulheres por seus direitos, pelo reconhecimento de
sua condição humana desnuda a raiz da opressão empreendida pelo sistema capitalista em
sua afirmação sendo, aqui no Brasil, tão longa quanto à história deste país, embora ela não
seja contada senão pelos esforços das próprias mulheres e alguns homens em visibilizá-la.
Assim, como o racismo, conseqüência do colonialismo, excluiu os povos de
origem africana e promoveu o genocídio dos povos indígenas na formação do povo
brasileiro, o sexismo2 eliminou quase todos os registros de resistência e luta da parcela
feminina da sociedade brasileira.
Entretanto, embora geralmente não conste dos registros documentados, as mulheres
protagonizaram importantes mudanças no Brasil, durante o século 20 em
que foi
significativo o desempenho sócio econômico do país.
Até a presente data, o movimento feminista ou variados contextos provocando
profundas mudanças no ambiente doméstico e nos espaços públicos indicando que em
casa, no mercado de trabalho e na política, as mulheres brasileiras já não são mais as
2- Sexismo é a discriminação ou tratamento indigno a um determinado gênero ou ainda determinada
identidade sexual. Para a Psicolgia, o Sexismo é m regine cultral onde um sexo teta sobrepor ao outro
(Antônio Olinto).
mesmas, estão em luta permanente para mudar seu país e construir um mundo fraterno,
sem desigualdades, com justiça social e livre de toda opressão.
No decorrer de sua história o movimento tem ressaltado a compreensão de que a
construção do ser mulher, inclusive na luta feminista, não é homogênea.
Há especificidades a serem compreendidas implicando tanto para dentro de sua
construção como para fora relações de poder, tensões e conflitos.
Percebe-se que as mulheres e homens no Brasil tiveram uma história de conquista
no espaço social, na família, na escola e no trabalho. Com a pesquisa, pode-se verificar se
os alunos no bairro do Capão Redondo no Centro Integrado de Educação de Jovens e
Adultos vivem a desigualdade social; se a relação de gênero é uma questão de poder; se
vivem assim ao longo da história; se as mulheres podem ser frágeis; se os homens podem
cuidar das mulheres e se cada família pode ressignificar as relações de gênero.
1.1 Objetivo Geral
Apontar algumas pistas, sobre as relações de poder, gênero e sexualidade na
Educação de Jovens e Adultos.
1.2 Objetivos Específicos
Este Trabalho de Conclusão de Curso tem como objetivos específicos:
1. Promover algumas reflexões sobre as relações de poder, gênero e sexualidade no
processo de ensino aprendizagem.
2. Refletir sobre o “ser biológico” e o “ser cultural”, respeitando as diferenças de
gênero.
3. Apontar algumas ações na sala de aula para que contribuam nas relações de
gênero sem preconceito.
1.3 Metodologia da Pesquisa
O trabalho foi desenvolvido através de Artigos, Literaturas, Depoimentos e
Pesquisa de Campo.
Participaram da pesquisa de campo: 03 mulheres e 03 homens de faixa etária entre
30 e 58 anos que estudam no Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos,
localizado no bairro do Capão Redondo, periferia da região Sul, de São Paulo.
O questionário foi utilizado na Pesquisa de Campo organizado com questões
abertas de cunho qualitativo, favorecendo as questões no âmbito social, com a intensão de
provocar uma reflexão quanto a mudança de estereótipo.
O método utilizado inclui concepções teóricas de abordagens e como instrumentos
investigativos de amostragem.
Foram realizadas entrevistas e relatos de vivêncas gravados, com autorização
envolvidos, de modo que os registros são de maior fidelidade dos dados obtidos que
possibilitamram a apreensão da realidade desse universo.
Foram apresentados os objetivos da pesquisa ao gestor do Centro Integrado, e em
seguida, à alunos da EJA em dia e horário pré-estabelecido pelo gestor.
Os alunos que voluntariamente aceitaram participar da pesquisa de campo,
receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para tomarem ciência e
responderem as questões. Em seguida, participaram da entrevista e fizeram relatos de
vivências para a coleta de dados.
Por questões de fidelidade, os alunos entrevistados serão chamados por: A, B, C, D,
E e F.
Após a Pesquisa de Campo, os dados coletados foram processados e
sistematizados, tendo em consideração o referêncial teórico que fundamenta e orienta a
presente pesquisa.
2. A MULHER E O PODER
Defini-se poder, na sua mais pura essência, como capacidade ou possibilidade de
agir, de produzir efeitos. Essa capacidade é bastante abrangente pode se referir a pessoas
e/ou grupos sociais, coisas e animais. Todavia, a acepção que nos interessa neste trabalho é
o poder na sua relação com o homem na sociedade, ou seja, como ela se dá quais os seus
componentes e funções.
Vários autores definiram poder como algo que se possui e do qual se faz uso
voluntário, para o beneficio de quem o possui, sempre.
No entanto, não existe poder se não existe ao lado de quem induz a quem induzir
daí esse caráter relacional inerente ao poder "o poder social não é uma coisa ou sua posse:
é uma relação entre pessoas," e como em toda a relação há um propósito que une os
integrantes dela, daí o poder ser considerado uma relação triádica (IZQUIERDO, 1994).
De acordo com Kant (1998), liberdade e lei (pela qual a liberdade é limitada) são
os dois eixos em torno dos quais gira a legislação civil. Mas, a fim de que a lei seja
eficaz, em vez de ser uma simples recomendação, deve ser acrescentado um meio-termo, o
poder, que, ligado aos princípios da liberdade, garanta o sucesso dos da lei. É possível
conceber apenas quatro formas de combinação desse único elemento com os dois
primeiros:
A. Lei e liberdade sem poder (Anarquia).
B. Lei e poder sem liberdade (Despotismo).
C. Poder sem liberdade nem lei (Barbárie).
D. Poder com liberdade e lei (República).
Segundo Izquierdo (1994), as posições ocupadas por homens e mulheres na
sociedade Ocidental, especialmente em determinados segmentos sociais, são ainda
marcadas pela simetria e por uma desproporção na divisão de poder, quase sempre
favorecendo os homens. Essa assimetria, está também presente na escola como um espaço
de acomodação e resistência.
Na sociedade ocidental, coloca masculino e feminino como oposição, estende-se
para as definições do que é ser homem e mulher, professora e professor. São atribuídas às
mulheres características culturalmente definidas que, nessa sociedade, são muitas vezes
naturalizadas como base nas diferenças físicas que as distinguem dos homens.
2.1 O Poder nas Relações de Gênero
Os significados de gênero, vinculam-se a muitos tipos de representações culturais e
estabelecem termos pelos quais as relações entre mulheres e homens são organizadas e
compreedidas. O cuidado, por exemplo, é visto como uma característica de gênero
feminino, para alguns um sentimento natural, para outros fruto da socialização das
mulheres.
Segundo Izquierdo (1994), considera que o ato de cuidar, fundamental na relação
com a criança, deve ser encarado como uma atividade que envolve compromisso moral de
dedicação ao outro e independente do sexo de quem executa.
Reforça-se a desigualdade de gênero quando não posiciona-se criticamente, e sem
maiores ponderações, diante de atitudes preconceituosas (IZQUIERDO, 1994).
A opressão na mulher, portanto, não seria algo natural, mas determinado pelo
posicionamento na mulher, e do homem no sistema de produção e reprodução de
sociedades determinadas.
A origem da opressão na mulher está, portanto, ligada às transformações ocorridas
nas relações humanas desde as primeiras sociedades que se conhece. As descobertas
antropológicas permitem afirmar que a mulher, embora não oprimida em se nascimento,
passa a sê-lo devido a inúmeroas fatores, dentre os quais os decisivos foram as relações
econômicas, que depois determinaram toda a superestrutura ideológica de sustentação
dessa opressão: as crenças, valores, costumes, cultura em geral (TOLEDO, 2005, p. 32).
O trabalho não criativo, aliena o homem e a natureza, a sua função ativa própria, a
sua atividade vital, e com issso, aliena do homem o gênero. Ele o aliena dos outros
homens. Nesse momento surge a alienação sexual, a separação, desigualdade entre os
sexos. Essa separação é , portanto, um fato histórico, tanto quanto a alienação do
trabalhador em relação a seu trabalho, o surgimento da exploração, da propriedade privada
e a divisão da sociedade em clases (TOLEDO, 2005, p. 36).
Para Scott (1992), a noção política de igualdade inclui o reconhecimento da
existência da diferença, pois, do contrário, a igualdade poderia ser definida como uma
indiferença deliberada diante das distinções específicas para um determinado contexto.
Evidentemente, como bem assinalado por Correa e Petchesky (apud- Scott, 1992), para o
exercício pleno de direitos são necessárias condições de possibilidades, ou seja, condições
sociais que garantam de maneira democrática o livre exercício desses direitos, e para isso
são necessárias transformações sociais que eliminem toda e qualquer forma de
diferenciação e exclusão social, não somente a de gênero.
Existem muitos caminhos pelos quais se pode conseguir essas transformações, porém
entende-se que a educação é a principal via para isso, e no que diz respeito às questões de
gênero, especificamente a Educação Sexual.
Todavia, ao pensar em gênero culturalmente pode-se perceber a divisão de tarefas, de
posturas sociais, de vestimentas que define as bases do papel da mulher e que tem
determinado sua posição na sociedade ao longo da história humana, à raiz de uma
conseqüência biológica, a capacidade de gerar filhos. A partir disto, se estabelece um dos
mais importantes mecanismos de controle e poder, o controle da reprodução, que não
podendo ser desvinculada da mulher, determina “esse seu lugar social”.
Portanto, a
diferença de gênero é um desafio permanente, e é preciso estar atento para a utilização
social e política de seus significados, que podem resultar em preconceitos.
2.2 O Poder na Sexualidade
A sexualidade como objeto de estudo, tem sido investigada e discutida nas mais
diversas disciplinas. A experiência sexual humana, assim como qualquer outra experiência
humana, é produto de um complexo conjunto de processos sociais, cultural, históricos e
também, biológico. O corpo e seus usos se estruturam como linguagem que simboliza,
significa e comunica as expectativas abarcadas por um determinado contexto histórico e
cultural ( CHACHAM; MAIA, 2004, pp.75-79).
Segundo essas autoras, pensar corpo e sexualidade da mulher brasileira, a inclusão de
questões de diversidade e diferença, dentro de uma realidade maior, é importante nas
tentativas de entender as características da vida sexual, que toma formas plurais.
Os direitos sexuais incluem, entre outros: a liberdade de finalidade do exercício da
sexualidade, seja recreativa, comunicativa, ou reprodutiva; o respeito às decisões pessoais
em torno da preferência sexual; a expressão e o livre exercício da orientação sexual; a
liberdade de escolha de companheira/o sexual; escolha de atividades sexuais de preferência
da pessoa.
A expansão dos direitos ligados ao exercício da sexualidade, ou direitos sexuais, tem
avançado de maneira progressiva, ainda que lenta e comparada ao nível de reconhecimento
obtido pelos direitos reprodutivos por organismos e documentos internacionais, como os da
Organização das Nações Unidas (ONU).
Um longo caminho que vem desde o levante da “segunda onda”3 da feminista nas
décadas de 1960 e 1970, perpassando a chamada “revolução sexual”4, da invenção da
pílula anticoncepcional e as Conferências mundiais da ONU sobre população e
desenvolvimento, culminando,apesar de tantas disputas, na plataforma de ação elaborada
para IV Conferência Mundial da Mulher em Pequim, em 1995. A referida Conferência
avançou alguns passos no sentido de afirmar o direito do livre exercício da sexualidade
como parte dos direitos humanos. Pela primeira vez em um documento da ONU, as
mulheres são consideradas seres sexuais além de seres reprodutivos, detentoras de direitos
humanos para decidir livremente sobre sua sexualidade, sem qualquer menção qualificando
sua idade, estado civil ou orientação sexual, apesar da expressão “direitos sexuais” ter sido
substituída por “direitos humanos” na versão final (PETCHESKY, 1999, p. 20).
A concepção de direitos sexuais tal como estabelecida nessa declaração está
baseada na construção destes como direitos “negativos”: o direito de não ser vítima de
estupro, abuso, tráfico, exploração, mutilação e de outras formas de violência sexual.
Obviamente, é indiscutível que ser livre de coação, violência e abusos sexuais é um
direito fundamental da mulher (nenhuma mulher pode gozar plenamente de sua
sexualidade sob ameaça de estupro, espancamento e de uma gravidez indesejada).
No entanto, o fato de as mulheres só constarem como vítimas em vez de como
agentes no exercício da sua sexualidade reforça a visão patriarcal na qual as mulheres são
seres dessexualizados, sem poder e vítimas passivas da violência do homem
(PETCHISKY,1999, p. 21).
Ao mesmo tempo, Corrêa (2002) aponta algumas questões que podem ser
levantadas em relação à adoção desses preceitos:
3. Segunda Onda, após a segunda Guerra Mundial, trouxe novas reinvindicações de direitos, deu prioridade
às lutas pelo direito ao corpo, ao prazer, e contra o patriarcado, na década de 60 (LOURO, 1997).
4. Revolução sexual,
movimento sócio-político, sociedade ocidental, séc XX, século de repressão,
testemunhado entre meados dos anos 60 e início dos anos 70 (SILVA, 2010).
•
Pode-se assumir que igualdade,neste caso, significa que todos os parceiros devam
ser “iguais”?
•
O que significa ser igual na sexualidade?
•
Significa que tudo é permitido entre adultos ou deve-se falar sempre de adultos que
consentem?
•
Como discutir relações entre adultos com posições de poder diferenciadas?
•
Pode a idade adulta constituir o domínio exclusivo da sexualidade e ser definida
exclusivamente em termos civis e legais por meio da idade?
•
Ou deve incluir aspectos relatados ao poder diferenciado entre pessoas?
Para Miller (2001), uma importante implicação prática para entender como
discriminações se interrelacionam será testar qualquer conceituação teórica dos direitos
sexuais em sua capacidade de servir igualmente bem as pessoas de diferentes práticas e
identidades: identidade de gênero, orientação sexual, idade, raça, condições de saúde física
e mental e diferentes capacidades.
A reprodução se processa no corpo e, portanto, a pessoa poderá enfrentar conflitos
para seu controle.
A sexualidade, reprodução e controle social do corpo, estão diretamente ligados à
estratégia das relações de poder sexual. É importante observar que o corpo, e não só a
consciência das pessoas tem sido objeto de dominação. Toda e qualquer sociedade têm
práticas regulatórias do corpo.
No caso específico da cultura Ocidental, esse controle tem sido exercido através da
sexualidade visando não só sua execração, mas sua normatização e disciplinariedade, pois
afinal o que está supostamente em questão é a espécie e a própria ordem social, dentro de
um contexto basicamente econômico. O que vai justificar uma intervenção pública, no que
é de domínio privado, desconsiderando totalmente a autonomia sexual e cidadã das
pessoas, principalmente das mulheres e não só nas questões de gênero.
Se a educação, sem dúvida, é um dos processos pelos quais se facilita a construção e
estruturação da identidade e da autonomia dos indivíduos, esse processo se intensifica
quando as ações se localizam na área que faz parte de todo o ciclo vital dos seres humanos
que é a sexualidade (LOURO,1997).
A escola é um espaço social que pode propiciar o sexismo que permeia toda a
sociedade. Chamando a atenção para a “força” mitificadora e padronizadora dos
preconceitos.
Meirelles (1997, p.78), recupera frases do cotidiano que atribuem aos significados
femininos conotações negativas, como as lembradas por Costa (1995) em relação às
professoras que fala que a “fómula do casamento duradouro: sopa quente, sexo sempre” ,
“ meu lado feminino é lésbico”,
O preconceito nas questões de gênero, pode afetar meninas e meninos, mulheres e
homens, nas salas de aula ou no espaço escolar, tem base em um sistema educacional que
reproduz, em alguns momentos, as estruturas de poder, de previlégios de um sexo sobre o
outro na Sociedade Ocidental e aparecem até mesmo nos livros didáticos e nas relações
escolares (ROSEMBERG,1997).
O ambiente escolar, pode reproduzir imagens negativas e preconceituosas, por
exemplo, quando professores relacionam o rendimento de suas alunas ao esforço e ao bom
comportamento, ou quando tratam apenas como foram esforçadas e quase nunca como
potencialmente brilhantes, capazes de ousadia e liderança. O mesmo pode ocorrer com os
alunos quando estes não correspondem a um modelo masculino predeterminado. Essa
situação pode ser ampliada para professoras e professores. Estes se espera um
comportamento mais enérgico, fruto da qualificação positiva atribuída à relação entre
feminino e masculinidade /agressividade: já as professoras são tidas como afetivas e ternas,
e quando expressam agressividade, são consideradas pouco femininas ou com problemas
hormonais (ROSEMBERG, 1997, p. 102-103).
2.3 Os Sentidos da Sexualidade: Natureza, Cultura e Educação
Existem questões centrais quando se fala de sexualidade:
O que é uma sexualidade verdadeiramente humana?
Pensar a sexualdade é pensar em tudo que é vida?
O espaço da sexualidade é o espaço do corpo físico, do corpo biológico, do corpo
pulsional, com suas cargas e tensões (MEIRELLES, 1997, p. 76).
Considerar a sexualidade como uma função biológica ou algo determinado pela
cultura é reforçar a problemática constante: “irracionalidade biológica versus racionalidade
social” (LORENCINI JÚNIOR, 1997, p. 92).
O autor, apresenta a sexualidade sob duas perspectivas distintas, porém
complementares. A primeira se refere à natureza do sexo na espécie humana, no aspecto
biológico. Já a segunda perspectiva se refere à sexualidade cultural, examinando como os
aspectos culturais influem sobre o indivíduo e sua herança bilógica, delimitando uma
“cultura da sexualidade” (LORENCINI JÚNIOR,1997, p. 88).
Pensar em sexualidade, família e escola pelo princípio da não exclusão, isto é,
pensar em
sistemas interagentes por intermédio de processos cujos princípios de
convergência (vinculação, união) e complementariedade ( respeito pelas diferenças)
estejam estabelecidos (MEIRELLES, 1997, p.82).
Tendo em vista que tanto os aspectos biológicos como os culturais são igualmente
importantes, propõe-se uma unidade entre eles que possibilite compreender a sexualidade
humana e dotá-la de sentidos. Dessa forma, o processo educativo no âmbito escolar pode
ser um possível caminho para que ocorra a ressignificação da sexualidade (LORENCINI
JÚNIOR, 1997, p.88-89).
2.4 A Importância da Sexualidade nas Ações Pedagógicas na Sala de
Aula
Muitas escolas abriram espaço para a temática da sexualidade na década de 80, no
Município de São Paulo, apenas por meio de palestras, encontros e debates a cargo de
psicólogos, médicos, ou pela abordagem ampliada dos conteúdos relativos à reprodução
humana na disciplina de ciências.
Em 1989, a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, sob a responsabilidade
do Professor Paulo Freire5, decidiu implantar a Orientação Sexual inicialmente nas escolas
de Ensino Fundamental I (1º a 4º ano) e depois nas de Educação Infantil.
A formação dos educadores ficou sob a responsabilidade do GTPOS6. Em 1992, o
trabalho nas escolas Municipais de São Paulo atingiu cerca de 12 mil alunos.
5. Paulo Freire, Pernambucano de nascimento (1921-1997), foi um educador brasileiro. Destacou-se por seu
trabalho na área da educação popular, voltada tanto para a escolarização como para a formação da
consciência. É considerado um dos pensadores mais notáveis na história da pedagogia mundial, tendo
influenciado o movimento chamado pedagogia crítica (PAULO FREIRE, 2009).
Já em 1995, o MEC coordenou a elaboração dos PCNs7. Essa proposta incluiu a
Orientação Sexual como um dos temas transversais a serem abordados em todas as séries
de forma articulada com as disciplinas e outros temas como Ética, Saúde, Meio Ambiente e
Pluralidade Cultural.
Evidentemente incorporar gênero de maneira transversal na escola, é a
possibilidade de ampliar o debate, conhecer e reconhecer que existem relações desiguais
6. GTPOS: Grupo de Trabalho e Pesquisa em Orientação Sexual. Psicólogos e Pedagogos que dedicam
desde 1987, à formação dos profissionais para o trabalho com orientação sexual, na área da educação e da
saúde (GTPOS, 1994).
7. PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais, são referências de qualidade para os Ensinos Fundamental e
Médio do país, elaboradas pelo Governo Federal. O objetivo é propiciar subsídios à elaboração e
reelaboração do currículo, tendo em vista um projeto pedagógico em função da cidadania do aluno e uma
escola em que se aprende mais e melhor (BRASIL, 1998, p. 62).
entre homens e mulheres, e poder com isso refletir e visualizar a possibilidade de
construção de novas relações. Todavia, trabalhar gênero, em um espaço específico junto à
sexualidade, é a possibilidade de garantir ações mais efetivas na desconstrução desse
modelo tão arraigado, construído e estruturado no desenvolvimento sexual que tanto tem
prejudicado as mulheres e consequentemente os homens também.
Refletir sobre a importância do trabalho de orientação sexual, relações de poder no
gênero, propiciando alguns momentos de debates, leituras e integração dos profissionais da
educação num possível trabalho interdisciplinar com temas relevantes.
Na escola, a sala de aula poderá representar um espaço onde diferentes aspectos
que configuram a cultura poderão estar presentes: valores, interesses, ideologias, costumes,
crenças, atitudes, tipos de organização familiar, econômica e social, como também
diferentes padrões de comportamento sexual. Desse modo, a sala de aula porerá se tornar
um ambiente cultural onde encontramos tensões, contradições e conflitos (LORENCINI
JÚNIOR, 1997, p.93).
A ressignificação da sexualidade só será possível se a própria sala de aula for
ressignificada, passando a se construir como um espaço realmente democrático, onde as
opiniões, incertezas, divergências, sentimentos, vontades e diferenças forem consideradas,
discutidas, e quando possível, superadas.
Como diz Freire (1997, 95):
Mulheres e homens, seres histórico-sociais, nos tornamos capazes
de comparar, de valorar, de intervir, de escolher, de decidir, de
romper, por tudo isso, nos fizemos seres éticos. Só somos porque
estamos sendo. Estar sendo é a condição, entre nós, para ser. Não é
possível pensar os seres humanos longe, sequer, da ética, quanto
mais fora dela. Estar longe ou pior, fora da ética, entre nós,
mulheres e homens, é uma transgressão. É por isso que
transformar a experiência educativa em puro treinamento técnico é
amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício
educativo: o seu caráter formador. Se se respeita a natureza do ser
humano, o ensino dos conteúdos não pode dar-se alheio à
formação moral do educando. Educar é substantivamente formar.
O ser humano é um “todo” corpo e mente agindo ao mesmo tempo. Na prática
geralmente se apresenta uma separação entre o corpo e mente. Ao acreditar nisso, os
educadores entram na sala de aula para ensinar como se apenas a mente estivesse presente,
e não o corpo. Chamar a atenção para o corpo é trair o legado de repressão e de negação
que nos tem sido assado por nossos antecessores na profissão docente.
Todos esses temas demonstram a complexidades de fatores e aspectos que estão
interligados e que influem sobre a sexualidade humana. Portanto, somente informações e
orientaçãos a respeito da anatomia e fisiologia do aparelho reprodutor, muito embora sejam
necessárias, não são suficientes para que possamos compreender a problematização que
envolve um determinado tópico da “biologia sexual” . Assim, a partir de um tema amplo,
delimitado e envolvido por aspectos culturais pode-se buscar o conhecimento, o
entendimento e a compreensão dos aspctos biológicos da sexualidade humana
(LORENCINI JÚNIOR, 1997, p.94).
Lorencini Júnior (1997), propõe uma reflexão sobre a questão da sexualidade:
•
Sexualidade e família a escola.
•
Qual sexualidade, qual família, qual escola?
•
Escola e família na sexualidade.
•
Por que escola, por que família, por que sexualidade?
•
Sexualidade e escola na família.
•
Para que sexualidade, para que escola, para que família?
•
Sexualidade e família na escola, quando?
•
Escola e família na sexualidade, onde?
Resta ainda um desafio, porém, não basta que o tratamento das diferenças de
gênero no espaço escolar embase relaçãoes de complementariedade entre mulheres e
homens, pois neste caso o que é complementar pode também supor relação hierárquica de
poder; assim a subordinação entre mulheres e homens não necessariamente desapareceria
(LOURO, 1997, p. 127).
3. ESTUDO DE CASO
[...] muitas vezes basta ser: Colo que acolhe, braço que envolve,
palavra que conforta, silêncio que respeita [...]
CoraCoralina
3.1 Caracterização Ambiental
O estudo de caso deste Trabalho de Conclusão de Curso foi desenvolvido no
Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos- CIEJA, que pertence à Subprefeitura
de Educação do Campo Limpo. Ele está localizado no bairro do Capão Redondo, na
periferia da região Sul da Cidade de São Paulo.
A Região apresenta uma população de 270.826 habitantes, distribuídos em várias
faixas etárias conforme dados do IBGE, (2008):
DISTRITO DE CAPÃO REDONDO
Pertencente à Subprefeitura do Campo Limpo
População total: 270.826 habitantes
População de 0 a 9 anos: 50.291 habitantes
População de 10 a 14 anos: 22.665 habitantes
População de 15 a 19 anos: 21.063 habitantes
População de 20 a 29 anos: 45.607 habitantes
População de 30 a 59 anos: 111.182 habitantes
População com 60 anos ou mais: 20.018 habitantes
A comunidade conta com poucas empresas, portanto a população local vê-se
obrigada a grandes deslocamentos diários, em busca de trabalho em outros bairros da
Capital e Grande São Paulo, despendendo nisso muitas horas e grande sacrifício em
transportes coletivos precários e com superlotação.
O atendimento médico à região é precário, havendo algumas UBS e postos de
saúde. Quanto ao atendimento hospitalar, somente o Hospital Municipal de Campo Limpo
ou o recém inaugurado Hospital de M’ Boi Mirim, um pouco distante, com uma grande
demanda de atendimento.
A falta de áreas de recreação e lazer adequadas para os jovens aprofunda ainda
mais a instabilidade social do bairro, pois, aliada à falta de oportunidades de emprego,
deixa-os vulneráveis, canalizando as energias da clientela para a violência e a
criminalidade.
Culturalmente , a região é desprovida de recursos públicos destinados à cultura.
Possuem muitas iniciativas de grupos que são sensíveis a essa questão e se organizam em
prol da comunidade, produzindo cultura a todo vapor com o melhor recurso, o recurso
humano, necessitando de ampliações por não atenderem a demanda local. Assim como:
•
Sacolão das Artes: oferece programação de teatro, música, oficinas, filmes,
debates.etc;
•
CDHEP (Centro de Direitos Humanos e Educação Popular): que articula os
trabalhos de vários espaços dessa comunidade com ações sociais e políticas;
•
Casa do Zezinho: desenvolve um trabalho com crianças e jovens, despertando-os
para as artes e ofícios;
•
Cooperifa (Cooperativa Cultural da Periferia): que realiza saraus de poesias e
músicas, sessões de filmes, amostra cultural, debates...;
•
Casa de Cultura de M’Boi Mirim: oferece cursos, aulas de danças, esportes, festas
“Panelafro”;
•
Liga do Vinil: grupo que organiza encontros, bailes com melodias nostálgicas,
valorizando as relações do passado e estabeler novos vínculos.
A diversidade da população é que faz a riqueza da região.
3.2 Caracterização da Escola
Trata-se de um projeto da prefeitura de São Paulo, Ensino Fundamental –EJA, para
atender jovens e adultos, com necessidades especiais, moradores de rua, jovens em risco
social, donas de casa, profissionais que têm horários flexíveis (plantonistas) e moradores
da região. Acreditam no respeito, na solidariedade, na sustentabilidade, criticidade e muito
diálogo. A educação é para a vida.
O atendimento do CIEJA acontece em seis turnos distribuídos em 4 (quatro)
Módulos, cada um com duração de 1 (um) ano, 200 dias letivos, sendo cada período de
2h15, com possibilidade de flexibilização ao educando.
Módulo I-Alfabetização;
Módulo II- Pós- alfabetização;
Módulo III-Complementar;
Módulo IV-Final.
Oferece, também, o Itinerário Formativo: É uma qualificação profissional na área
de Informática, inicial, básica, Intermediário e avançado.
O curso é organizado segundo a Base Nacional Comum do Currículo do Ensino
Fundamental, composto por Áreas de Conhecimentos, com duração e carga horária
definida e freqüência obrigatória. As aulas são ministradas com dupla docência, sendo:
•
Linguagens e Códigos (Português, Inglês, Artes e Ed. Física);
•
Ciências da Natureza (Ciências e Matemática);
•
Ciências Humanas (História e Geografia).
O CIEJA tem como missão: “Integrar e reintegrar o ser educando, elaborar e
transformar os seus conhecimentos em ferramentas para atuar em seu meio,
transformando-o”. Oferece, também, um trabalho que favorece o desenvolvimento de
competências e habilidades, considerando e respeitando a diversidade, na motivação do
saber fazer, saber ser, saber aprender e saber conviver, em busca de visão de um mundo
melhor para todos.
É uma educação voltada para o exercício da cidadania, para a solidariedade, a
justiça social e postura crítica frente à realidade, visando à satisfação das necessidades
básicas de aprendizagem dos jovens e adultos, de modo que possam alcançar patamares
comuns de escolaridade, percorrendo trajetórias escolares distintas.
O CIEJA, realiza ações que promove as relações, sem nenhum tipo de preconceito
ou discriminação, entre pessoas com diferenças de cultura, etnia, idade, gênero, orientação
sexual, ascendência nacional, origem e posição social, profissão, religião, opinião política,
estado de saúde, portador de necessidade, aparência física, ou outra diversidade.
Os educandos do CIEJA, residem nesta região, especificamente nos bairros Capão
Redondo, Parque Santo Antônio e Jardim Ângela, Bairros conhecidos pela violência que
marca o seu dia a dia. Há maioria da população é carente, geralmente migrada de outros
Estados do Brasil da região Nordeste.
A estrutura urbana oferece água encanada em boa parte das casas, assim como
eletricidade. Poucas, porém, usufruem de esgotos públicos, calçamento e iluminação.
Esse contexto transforma os alunos em verdadeiros sobreviventes, para os quais o
dia-a-dia é uma batalha pela manutenção da vida e dos poucos bens materiais de que
dispõem. São heróis todos os dias.
Dentro desse quadro, estudar, para uns, torna-se a única forma de escapar desse
ambiente, e, para outros, uma atividade de rotina, desvinculada das finalidades que levam a
direção, coordenação e docentes à tarefa diária de oferecer-lhes as melhores condições
possíveis de educação e inserção no ambiente social.
3.3 Pesquisa de Campo
A Pesquisa foi realizada com 06 alunos, sendo 03 do sexo feminino e 03 do sexo
masculino. Para referir aos entrevistados, foram denominados de A (fem), B (fem), C
(fem), D (masc), E (masc) e F (masc).
3.3.1. Direito de Estudar
Ao serem questionados sobre de quem é o direito de estudar? Estes responderam
que:
a) Entrevistado: A (fem)
“....ainda criança costumava ouvir meu pai dizendo, pra que mulher tem que ir para
o grupo escolar”?
Para fazer a comida, lavar os pratos e cuidar de menino, não precisa......Sonhava em
aprender a ler e escrever, queria escrever carta.........Até que um dia apareceu um moço da
cidade e começou ensinar os meninos (homens), ficava escutando de longe e assim aprendi
o ABC.
“Passado muito tempo , muitas coisas aconteceram, casei,........ separei, hoje estou
aqui nesta escola, tentando aprender a ler e escrever”.
b) Entrevistado: B (fem)
“....meu esposo também não teve oportunidade de terminar os estudos, mas achava
que eu deveria voltar para escola, trabalho e chego mais cedo em casa....ficava sem
coragem de deixar as crianças a noite, e o tempo foi passando.............. até que um dia, uma
colega me disse que tinha uma escola com horários diferentes e com menos tempo de aula,
fui conhecer, adorei, estou agora fazendo o módulo III e o que aprendo, consigo ajudar
meus filhos nas lições...meu esposo começa no ano que vem....O direito é de todos”!
c) Entervistado: D (masc)
“.....não sou contra a mulher estudar, só que a mulher tem muitas coisas de casa
para fazer, então fica difícil.
Aqui na escola tem mais mulher do que homem, acho bom e não vejo elas reclamarem do
serviço e da escola, são lutadoras...”
É possível perceber divergências nas falas dos entrevistados, quando se trata dos
direitos da mulher ou do homem. A esse respeito, Scott (1992), comenta que:
Ao pensar em gênero culturalmente pode-se perceber a divisão de tarefas, posturas
sociasis, de vestimentas que define as bases do papel da mulher e que tem determinado sua
posição na sociedade ao londo da história. (...) Portanto, a diferença de gênero é um desafio
permanente, e é preciso estar atento para a utilização social e política de seus significados,
que podem resultar em preconceitos.
3.3.2. Interrupção dos Estudos
Em seguida, indagou-se : Existiu alguma razão para você ter interrompido os
estudos? Nesta questão, foram obtidas as seguintes respostas:
a)Entrevistado: A (fem)
“.... eu não estudei, nasci em PE, meu pai achava que mulher não precisava de
estudo. Em 2001, quando cheguei em São Paulo, conheci meu esposo. A partir desse dia,
minha vida não foi mais minha.
Esse homem decidia tudo por mim, o que vestir, onde ir, com quem falar, o que
falar, .....Fui me acomodando, não via nenhua chance de voltar para escola, fui permitindo
tudo isso...
Depois de 07 anos ao lado dessa pessoa, dei um basta, foi complicado, envolveu
família, vizinhos e até polícia. Más não me arrependo. Hoje estudo, busco vencer minhas
dificuldades para realizar meu sonho que é fazer enfermagem.
Sinto que estava adormecida e hoje tive a oportunidade de viver novamente...”
b) Entrevistado: C (fem)
“...olha...... eu já sofri muito por isso, antes foi meu pai, depois os filhos que eram
pequenos e agora enfrento o desafio de convencer meu esposo à deixar eu terminar...Ele
fala que já não tenho mais idade, e as vezes fica me julgando , diz que venho só para
passear...”.
c) Entrevistado: E ( masc)
“...quando jovem não estudei porque só queria ficar na rua e namorar...meu pai me
fez procurar trabalho e assim a escola ficou para trás.
É o meu segundo ano aqui na escola, me arrependo do tempo que perdi, mas ao mesmo
tempo, sou feliz por estar aqui e de conhecer muitas pessoas da minha idade, mais novos e
mais velhos , tem muitas mulheres, ...é bom... sentamos tudo misturado mulher com
homem....a gente aprende muito... A única razão foi minha falta de interesse.”
Ver-se que as dificuldades apresentadas pelos educandos do sexo feminino, sempre
sob subordinação ao homem, e as razões do sexo masculino foi por decisão pessoal, foram
com razões diferentes. Para Scott (1992), o exercício pleno de direitos são necessárias
condições de possibilidades, ou seja, condições sociais que garantam de maneira
democrática o livre exercício desses direitos, e para isso são necessárias transformações
sociais que eliminem toda e qualquer forma de diferenciação e exclusão social, não
somente de gênero.
Conforme visto na parte teórica, Lamas (2000), afirma que :
Todas as sociedades classificam o que é “próprio” das mulheres e o que é “próprio”
dos homens, e a partir dessas ideias culturais estabelecem-se as obrigações sociais de cada
sexo, com uma série de proibições simbólicas.
3.3.3. Diferença de Gênero
Ao perguntar aos educandos, como eles observam as relações entre mulheres e
homens no CIEJA, a maioria respondeu:
a) Entrevistado: A (fem)
“... quando fiz minha matrícula, estranhei um pouco, era todo mundo junto na
mesa, as vezes chegava atrasada tinha mais homens que mulher onde sobrava um lugar,
ficava sem jeito,
passava o encontro todo sem falar com ninguém, depois fui
acostumando, eles também...hoje a gente brinca, fala da família, dos problemas, resolve as
atividades juntos .... Só que lá fora isso não acontece”.
b) Entrevistado: E (masc)
“...não vejo problemas nas relações entre os homens e as mulheres aqui, tem
professoras e professores, eles debatem bem essa questão, a gente é tradado igual.....estuda
tudo junto...mais novo com mais velho....homem ...com mulher....…sentamos na mesma
mesa....Não existe diferença. Pena que em outros lugares não é assim.”
Foi muito clara a fala dos educandos, que perceberam a diferença nas relações de
gênero dentro do CIEJA, consideram as ações propostas pelos educadores muito boas e
que assim tem contribuido nas relações de gênero.
Nesse aspecto cabe ressaltar as palavras de Lorencini Júnior (1997), quando afirma
que:
[...] na escola, a sala de aula poderá representar um espaço onde diferentes aspectos
que configuram a cultura poderão estar presentes: valores, interesses, ideologias, costumes,
crenças, atitudes, tipos de organização familiar econômica e social, como também
diferentes padrões de comportamento sexual. Desse modo, a sala de aula poderá se tornar
um ambiente cultural onde encontramos tensões, contradições e conflitos.
Lorencini Junior (1997), também, considera que tanto os aspectos biológicos como
os culturais, são igualmente importantes, propõe-se uma unidade entre eles que possibilite
compreeder a sexualidade humana e dotá-la de sentidos. Dessa forma, o processo
educativo no âmbito escolar pode ser um possível caminho para que ocorra a
ressignificação da sexualidae nos gêneros.
3.3.4. Convivência entre Mulheres e Homens
Ao serem interrogados sobre: Como é a convivência entre mulheres e homens na
família? Estes relataram que:
a) Entrevistado: B (fem)
“....não vejo problemas, ou seja, na minha casa, é claro.
Tenho duas meninas e um menino, ensinei tudo igual para os três, no início a minha
sogra dava palpites, queria me ensinar diferente, achava que as meninas ficavam muito
soltas, só porque brincavam com os meninos da rua.
Não deixei ela atrapalhar nossa vida, meu marido aceitava do meu jeito, hoje eles
estão adolescentes, me ajudam, estudam...acredito que deveria ser assim em todas as
famílias.......”.
b) Entrevistado: E (masc)
“... lá em casa....(risos).... sempre foi muito separado, mulher e homem, faziam
coisas diferentes, até hoje, quando tem encontro da família, as mulheres sempre ficam na
cozinha, preparando tudo e ali mesmo que conversam sobre os filhos, os homens vendo
TV, falando do trabalho, dos cursos ou jogando cartas.....
As vezes as mais jovens reclamam e pedem ajuda na hora de recolher a louça, já
acostumamos assim, não muda mais”.
c) Entrevistado: F (masc)
“....em casa eu não falo muito das conversas da escola e do trabalho, acho que
minha esposa não vai gostar........nem trouxe na festa junina...ela iria dizer que venho para
arranjar outra na escola......então não falo muita coisa...
Ela também não conta, se conversa com os homens no trabalho.. O que os olhos não vê, o
coração não sente.
A gente não faz muita coisa de casa juntos...”.
Os três relatos demonstram as marcas do preconceito a relação de poder no gênero,
mesmo destacando em uma família uma relação de igualdade de oportunidade, de direitos
e deveres, não é maioria ainda.
Conforme visto na parte teórica, Meirelles (1997, p. 75,76) defende que abordar a
sexualidade e família na escola é mostrar processos interativos dentro de sistemas
humanos, nos quais a unidade individual básica é um sujeito biopsíquico, social, de
natureza trigeracional, que se integra à natureza como espécie biológica com características
específicas: que, para sua sobrevivência e subsistência, se apropria dessa mesma natureza
com responsabilidade dos mecanismos dessa apropriação: que é produto da evolução
histórica da humanidade: que determina e é determinado pelas inter-relações entre os
substratos naturais e os diversos tipos de organizações familiares: que aceita, reconhece e
valoriza as diversidades culturais, a sociogênese: que crê no futuro aberto da sociedade na
qual está inserido.
Meirelles (1997, p. 85), ainda afirma que :
Educar ecologicamente (por meio de múltiplas linguagens, do mais simples para o
mais complexo, do eu para o mundo, da ação concreta mais próxima para a abstração mais
distante, e de atitudes contínuas de reciclágem do saber, procurando conhecer como
conhecemos, aprender como percebemos e construímos realidades) é o pleno exercício de
todas as “inteligências”, da sexualidade na teoria e na prática. Esse é o compromisso
fundamental da família e da escola.
3.3.5. CIEJA e Mudança na Vida
Finalizando as questões, indagou-se: O CIEJA influenciou em alguma mudança na
sua vida? E os comentátios foram:
a) Entrevistado: A (fem)
“....Olha professora, eu disse a senhora que hoje estou vivendo tudo que não vivi, e
então, aqui tenho amigos, sou respeitada, posso falar o que penso, pergunto quando não
entendo, sabe como é?
Sou feliz de verdade, e quem me conhece há muito tempo, diz que estou até mais
moça, que a escola me faz bem de verdade.
Não tenho pressa pra sair, quero é viver assim..... feliz”!
b) Entrevistado: C (fem)
“...quando iniciei, tinha algumas atitudes que achava normal.......não sentava ao
lado de homem no ônibus, evitava conversar com qualquer pessoa que não conhecesse...
Hoje eu me comporto de forma diferente, , aqui sentamos juntos na mesma mesa e
isso me fez deixar meus receios, se alguém pergunta alguma coisa, procuro responder, em
casa também sou mais amiga. Todo mundo tem que respeitar e pronto”.
c) Entrevistado: D (masc)
“...bem, a escola sempre faz a gente pensar no que faz e como faz.....hoje fico mais
tempo observando as pessoas, que antes não via as diferenças no jeito que eram tratadas.
Com as conversas sobre racismo, ética, e junto com os mais novos, sou uma pessoa
melhor, ainda acho que tenho que melhorar mais, ajudar mais os outros”.
d) Entrevistado: F (masc)
“... eu sempre achei que homem tem que ter amigos homens e mulher amigas
mulheres, e assim eu agia na rua onde moro, no trabalho, os cumprimentos às mulheres
eram só por educação.
.........(risos)....aqui no Centro, começou a mudar issso, confesso que no início fiquei
assustado, pensei , porque todos se cumprimentam, todo mundo está todo dia aqui, não
precisa esse oi,oi,oi....
Com as aulas, o jeito dos professores ensinarem e as atividades que a gente faz
junto, fui me soltando e percebi que homem e mulher podem ser amigos, sem problema
nenhum...Só que preciso mudar em casa e no trabalho também, minha esposa não sabe que
aqui sento perto de outras mulheres todos os dias”.
3.4. Análise sobre os Relatos
Os relatos dos educandos foram de emocionar, com muita simplicidade e de forma
verdadeira, perceberam o significado nas mudanças no modo de pensar e de agir, mesmo
considerando que ainda precisam romper com alguns estígmas sociais, contruídos ao longo
da história.
É preciso que significados e valores masculinos e femininos, que definem as
relações escolares, caminhem mútua e recíprocamente a fim de que, no campo político,
econômico e social colaborem para a superação das desigualdades e subordinações de
gênero.
Nesse sentido, Lorencini Júnior (1997, p. 95), acredita que a sala de aula pode ser
uma espécie de laboratório de possibilidades de expressão da liberdade, permitindo que as
(os) alunas (os), pensem e reflitam sobre si. Essa atitude crítica promove a autonomia
pessoal com confiança e auto-estima, qualidades fundamentais para traduzir e transformar
a decisão em ação. A tomada de decisão passa por uma dimensão ética: a liberdade de agir
para dar sentido à sexualidade não pode interferir na liberdade e na ressignificação do
outro.
Dessa maneira, as práticas educativas poderiam ser questionadas de um modo
novo, possivelmente mais subversivo. Talvez assim fôssemos mais capazes de descobrir
relações até então não percebidas ou rever processos “generificados”
(e até agora
inquestionados) de produção de sujeitos (LOURO, 1995, p. 127).
3.5. Considerações sobre a Pesquisa de Campo
Em diversos momentos da pesquisa é possível destacar uma expressão positiva, de
auto-afirmação dos educandos. Mas, ao mesmo tempo, é curioso perceber o quanto papéis
e referências tradicionais de gênero reaparecem denunciando a força de relações sociais
desiguais impregnadas na sociedade ocidental. Seja no peso da violência de gênero, na
desigualdade quanto à liberdade, no excesso de responsabilidade com o trabalho doméstico
e a vida familiar, nas desigualdades no âmbito do trabalho ou em vários outros momentos,
aparece a tensão que marca as relações sociais ainda profundamente desiguais entre os
sexos. O quanto estas relações ainda permanecem impregnadas em uma parcela importante
das mulheres demonstra a força das estruturas de dominação de gênero.
A análise da escola como um espaço de práticas e de relações de gênero que podem
produzir estereótipos e preconceitos, mas também resistências, novos valores e atitudes,
talvez ajude a estabelecer um distanciamento crítico que permita enxergar para além das
visões dominantes sobre as relações entre mulheres e homens e sobre os significados
femininos e masculinos presentes na sociedade ocidental. A escola não só recria em seu
interior preconceitos de gênero como também prepara mulheres para posições mais
competitivas no mercado de trabalho, bem como estimula os homens para assumirem
funções de provedores de cuidado, numa relação de igualdade e responsabilidade mútua,
garantindo a convivência nos espaços em que circulam os diferentes gêneros.
4. CONCLUSÃO
Como apresentado no desenvolvimento do trabalho, a construção dos papéis de
gênero conduz suas implicações na elaboração das identidades masculina e feminina. As
relações de gênero determinam uma dinâmica de relação de poder, que na maioria das
vezes na Sociedade Brasileira são favoráveis ao homem.
Nesse sentido, isso tem sérias implicações no exercício dos direitos sexuais e
reprodutivos e da própria sexualidade por parte das mulheres com graves conseqüências
para o exercício pleno da cidadania, onde esses direitos sexuais incluem o direito a ter
controle e decidir livre e responsavelmente nos assuntos relacionados com a sua
sexualidade, incluindo a saúde sexual reprodutiva, livre de coerção, discriminação e
violência.
A desigualdade de gênero, como outras formas de diferenciação social, trata-se de um
fenômeno da sociedade com raízes complexas e instituído social e culturalmente de tal
forma, que se processa cotidianamente de maneira quase imperceptível e com isso é
disseminada deliberadamente, ou não, por certas instituições sociais como escola, família,
sistema de saúde, igreja etc.
Os sistemas de diferenciação social como classe, raça, etnia, geração, além de gênero,
propõe o exercício e manutenção de poder implicando muitas vezes em relações desiguais
e de submissão com conseqüências importantes para a autonomia individual e coletiva, e
para o exercício pleno da cidadania, quando se considera o ser humano como agente
protagonista de sua própria transformação em um contexto bio-psico-social.
Considerando que os indivíduos ou grupos sociais, têm presentes valores, normas e
condutas que determinam comportamentos e atitudes institucionais e, portanto, normativas,
eles também refletem e reagem, modificam ou mesmo interpretam essas regras. Não
devendo esquecer que grupos e indivíduos inseridos nesse contexto estão sob mecanismos
estruturados de coerção como os contextos sócio-político, econômico, cultural etc, que não
só criam a desigualdade entre segmentos sociais, como as mantém como processo de
garantia dos privilégios dos que exercem o poder.
Se as relações de gênero construídas a partir da diferença sexual é um dos mecanismos
que têm sido usado para determinar condições desiguais entre homens e mulheres, então é
a partir da educação e reeducação nesse campo que pode-se conseguir um nível de
relações mais justas. E nesse caso, a educação sexual é um dos espaços mais importantes
para trabalhar essa questão, tão estreitamente ligada ao contexto da sexualidade.
A educação sexual pode oferecer uma possibilidade real de minimizar as
ineqüidades e desigualdades existentes.
Para isto, como sugestão, seria necessário implementar um Programa de Educação
Social que valorize temas como gênero, relações de poder, sexualidade etc. E não somente
que informasse e denunciasse que essas desigualdades existem, mas também facilitasse um
processo de reflexão sobre as conseqüências dessas desigualdades, no âmbito social e
pessoal, no sentido de motivar as pessoas para se comprometerem com as diferentes
estratégias e ações para mudanças necessárias.
Trabalhar os mitos, crenças e preconceitos abordados no início deste texto, que não
só reforçam como tornam cristalizados e “naturais” os papéis de gênero (construídos sobre
o mito da superioridade masculina), facilita esse processo pedagógico que visa a
desconstrução e reconstrução desses papéis.
Espera-se que o processo de construção dos conceitos de sexualidade no gênero e
na educação, passe por momentos de mudanças significativas, na vida escolar, profissional
e pessoal para que atitudes preconceituosas e termos pejorativos deixem de ser repetidas
dificultando a convivência dos gêneros nos diversos espaços da sociedade.
O tema é amplo e este trabalho abordou alguns aspectos. É sugerido que novos
trabalhos teóricos e práticos devam ser produzidos para uma melhor compreensão do
assunto.
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APÊNDICE
Materiais para fins da pesquisa de campo do Trabalho de Conclusão de Curso
“Relações de Poder, Gênero e a Sexualidade na Educação de Jovens e Adultos”
APÊNDICE A
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Prezado(a) Sr. (a)
O projeto intitulado “Relações de poder, gênero e sexualidade na Educação de Jovens e
Adultos”, é uma pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética do IFSP de São Paulo, orientado
pelo Profº. Dr. Antonio Carlos da F. Bragança Pinheiro e conduzido pela aluna Elisabete
Sales de Melo, que tem como objetivo geral apontar algumas pistas sobre relações de
poder, gênero e a sexualidade da mulher na EJA. Onde a cultura está representada nos seus
diferentes valores, interesses, ideologias, costumes, crenças, atitudes e tipos de organização
familiar, econômica e ou social, como também diferentes padrões de comportamento
sexual. Tendo também, como objetivo específico, a promoção de reflexões no processo de
ensino aprendizagem para que possam contribuir no desenvolvimento da auto-estima, no
acesso e permanência na escola e na descoberta de suas potencialidades, buscando o
conhecimento do ser biológico e do ser cultural.
A realização desta pesquisa é de fundamental importância para propor ações que possam
contribuir com melhor desempenho das alunas com maior motivação, favorecendo a
sensibilização e percepção com o corpo no trabalho da orientação sexual, relações de poder
e gênero, a partir de leituras, pesquisas, filmes, debates, bem como servir como base para
novas pesquisas.
Durante a atividade será realizada entrevista e questionário, no qual a entrevistada terá
livre arbítrio para escolher se quer ou não participar. A atividade que será realizada é
considerada sem risco. Porém, se este procedimento gerar desconforto, constrangimento ou
outra situação negativa qualquer, a participação poderá ser interrompida sem qualquer
prejuízo.
A entrevistada ficará livre para interromper a qualquer momento a sua participação na
atividade de campo. Essa participação na atividade de campo é voluntária, sendo que não
haverá qualquer forma de remuneração.
Os dados pessoais serão mantidos em sigilo e os resultados gerais obtidos através da
atividade de campo, serão utilizados apenas para alcançar os objetivos do trabalho exposto
acima, incluída sua participação em sala de aula ou congressos.
A entrevistada poderá entrar em contato com o responsável pela atividade de campo, Prof.
Laerte Moreira dos Santos, sempre que julgar necessário através do telefone: (11) 67637601 e/ou a aluna Elisabete Sales de Melo, pelo telefone (11) 5893-2266, ou com o Comitê
de Ética e Pesquisa do IFSP de São Paulo, pelo telefone: (11) 6763-7546.
Esse Termo de Consentimento é feito em 2 (duas) vias, de maneira que uma permanecerá
em meu poder e a outra com a aluna responsável e obtive todas as informações necessárias
para poder decidir conscientemente sobre minha participação na referida atividade de
campo.
Eu___________________________________________________,__________anos
RG_____________________,
telefone (
a
________________________________________,
) _________________, abaixo assinado, dou meu consentimento livre e
esclarecido para participar como voluntária da atividade de campo supracitada, sob
responsabilidade da estudante Elisabete Sales de Melo, aluna do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, e do prof.Dr. Antônio Carlos da F.
Bragança Pinheiro, professor do curso de Pós-Graduação.
São Paulo,______,de________________________2009.
Nome e/ou assinatura do voluntário
_________________________________ ________________________________
Antônio Carlos da F. Bragança Pinheiro
Elisabete Sales de Melo
Endereço: Rua Pedro Vicente, 625 Canindé - Endereço: Rua Leonilda Kimore, 24, Jd.
SP
Klein- SP
e-mail: [email protected]
e-mail: [email protected]
Tel: (11) 6763-7601
Tel (11) 5893-2266
APÊNDICE B
Questões mediadoras para Pesquisa de Campo.
Idade:
menor que 30 (
)
maior que 30 ( )
Vive com companheira (o)? ( ) sim
Tem filhos? ( ) sim
Quantos (
( ) não
)
(
) não
O que fez você decidir voltar a estudar?
Alguma circunstância ou alguém facilita ou dificulta sua vida ao freqüentar a escola?
Existiu uma razão para você ter interrompido os estudos?
Estudar é um direito de quem ? Comente.
É maior o número de mulheres ou de homens na escola? Qual a razão?
Como você observa a relação entre mulheres e homens no Centro?
Como você percebe a relação entre mulheres e homens na família?
Você abandonou algum sonho na sua vida? Comente.
Do que você se arrepende de não ter feito?
A escola influenciou em alguma mudança na sua vida? Comente.
Fale um pouco dos seus sonhos.
Deixe um recado ou conselho para as (os) alunas (os) do Centro.
APÊNDICE C
Relato Pessoal
Guerra dos Sexos
Chácara Santana, fim dos anos 80.... Tardes e tardes na carteira da EMEF.”Bel.
Mário Moura e Albuquerque”, e várias manhãs na quadra esportiva.
Como era então meu cotidiano? Morava perto da escola, casa simples de madeira,
pai, mãe, eu e mais quatro irmãos. Eu a segunda dos cinco. Fazer lições, dividir com minha
irmã mais velha Elizete as tarefas domésticas e cuidados com os menores, brincar,
almoçar, tomar banho, ir para escola, muitos papos, aulas, briguinhas e paqueras.Voltar,
jantar, lavar a louça, tomar banho, cantar hinos da igreja e dormir. Ainda não tínhamos TV.
Quando dava, assistíamos pela janela ou pelo muro do vizinho, meu pai não gostava.
Minha alegria, era ir para a escola, amigas especiais (Iolanda, Suzana, Celma com
“C”, Nalva), e muitas outras.
Eu, falante, briguenta, chorona e muito amiga.
Quando percebi o que me incomodava?
Não gostava das competições em algumas aulas, o famoso jogo meninos X
meninas, era na tabuada, nos verbos, nos questionários, estados e capitais, jogo da forca...
Isso gerava briga na saída e reforçava a competição entre nós, era a “guerra dos
sexos”.
Quando os garotos provocavam, porque tinham ganhado, não era nada bom. Eu
sempre destemida, dizia para as outras meninas:
___Vocês seguram pelo avental, que eu “bato”.
Assim, foram muitas vezes, que resultaram em muitas idas na direção da escola.
Nas aulas de Educação Física, me encontrei, ficava atenta a cada jogada das
meninas de outras séries, elas eram demais.
Não esqueço de dois professores da época, Profª Shiro e profº Léo, fui gostando
cada dia mais das aulas, eles agiam dando força, despertando em cada um as
potencialidades. Me fizeram ser diferente.
Nas vésperas das aulas de educação física, fazia minhas tarefas domésticas a noite,
só para passar a manhã toda na escola.
Como os professores viam que eu ficava atenta a cada jogada, a cada orientação,
me pediam ajuda na organização dos materiais, mastros, bolas, redes, uniformes, enfim,
tudo que era necessário para usar na quadra.
A felicidade era geral, me interessei por tudo, em especial, o volei e o hand bol, a
pesar do meu tamanho minúsculo, tinha habilidades com a bola, articulava bem as jogadas,
era rápida e corria muito.
Assim fui entrando nos times, treinando, observando, até que comecei a fazer parte
das meninas selecionadas pelo profº Léo, isso era um mérito. Sinal de bom desempenho.
Léo, muito exigente, dizia o tempo todo “vamos suas raposas, estão pensando que
aqui tem areia, corre atrás, arremeça, atenção!”. Ganhamos muitas medalhas e troféus nos
campeonatos inter-escolas.
Percebi que cada um pode e deve conquistar seu espaço, desenvolver suas
potencialidades, buscar a mudança.
Fui ficando fortalecida com o que fui aprendendo, pelo meu jeito de falar, sempre
segura e imponente, enfrentando os desafios e dividindo o que aprendia.
Nesse período, conheci um grupo de garotos nas aulas de educação física, uns dois
ou três anos mais velhos, nos tornamos dois grupos, “o das meninas e o dos meninos”. Foi
assim que comecei a ver as coisas de forma diferente, as relações de gênero acontecendo
sem a “guerra dos sexos”.
Nós fazíamos questão de estarmos juntos, decidíamos sobre os jogos, treinos, os
bailes de garagem, passeios, ajudávamos até nos encontros entre os paqueras. Nos treinos,
os times eram mistos, não tinha o forte e o fraco, todos se fortaleciam, o bom era jogar e
pronto.
Nesse grupo, dois amigos se destacavam, por estar sempre procupados com a
segurança, as regras, a alimentação e o transporte, Márcio Batista e Sérgio Vaz.
Crescemos, amadurecemos, cada um tomou seu destino, e alguns de nós temos
contato e nos vemos até hoje. É grandioso!
Portanto, sou assim, mulher guerreira, questionadora, que buscou nas vivências da
adolescência e na fase adulta valores que me deixaram forte, determinada, destemida e
inconformada com as injustiças, hipocrisias, indiferenças, diferenças, principalmente com
os preconceitos sociais, de gênero e etnia.
Com essa “histórinha”, fragmento da minha vida, despeço-me do (a) leitor(a),
esperando que tanto a história como o texto tenham propiciado momentos de reflexão.
E desejando que essa reflexão possa levar a eventuais questionamentos sobre as
relações de poder no gênero em vários contextos da sociedade.
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relações de poder, gênero e sexualidade na educação de