II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores série Cadernos do CEJ 27 REALIZAÇÃO Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal Tribunal Regional Federal da 4ª Região Escola da Magistratura do Tribunal Regional Federal da 4ª Região COORDENAÇÃO CIENTÍFICA Márcio Flávio Mafra Leal – juiz federal da Seção Judiciária da Bahia Prof. Dr. Rolf Stürner – Universidade de Friburgo TRADUÇÃO Márcio Flávio Mafra Leal EDITORAÇÃO CENTRO DE ESTUDOS JUDICIÁRIOS Janaína Lima Penalva da Silva – Secretária SUBSECRETARIA DE INFORMAÇÃO DOCUMENTAL E EDITORAÇÃO Raquel da Veiga Araújo de Menêses – Subsecretária COORDENADORIA DE EDITORAÇÃO Milra de Lucena Machado Amorim – Coordenadora Ariane Emílio Kloth – Chefe da Seção de Edição e Revisão de Textos Luciene Bilu Rodrigues – Servidora da Coordenadoria de Editoração Diagramação e Arte-Final Alice Zilda Dalben Siqueira – Servidora da Coordenadoria de Editoração Ilustração da Capa Hélcio Rosa Corrêa PROJETO GRÁFICO Grau Design Gráfico IMPRESSÃO Coordenadoria de Serviços Gráficos do CJF II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores série Cadernos do CEJ 27 Copyright © Conselho da Justiça Federal – 2011 Tiragem: 1.500 exemplares É autorizada a reprodução parcial ou total desde que citada a fonte. As opiniões expressas pelos autores não são necessariamente reflexo da posição do Conselho da Justiça Federal. S471 Seminário Internacional Brasil – Alemanha : Thompson Flores (2. : 2011: Florianópolis, SC). II Seminário Internacional Brasil – Alemanha : Thompson Flores (português – alemão) : 16 e 17 de junho de 2011, Florianópolis, Brasil / Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Judiciários ; coordenação científica Márcio Flávio Mafra Leal – Brasília : CJF, 2011. 129 p. : il. – (Série Cadernos do CEJ ; 27) Em homenagem ao Ministro Thompson Flores (STF) nos 10 anos da EMAGIS. 1. Cooperação Internacional Brasil – Alemanha. 2. Direito público. 3. Processo civil alemão. 4. Jurisdição constitucional. I. Título. II. Leal, Márcio Flávio Mafra. III. Série. CDU 342 (81:430) Ficha catalográfica elaborada pela Coordenadoria de Biblioteca Sumário Dia: 16 de junho de 2011 Presidente de Mesa: Desembargador Federal Vilson Darós – Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região 8 Homenagem ao Ministro Thompson Flores Ministro Francisco Falcão – Corregedor-Geral da Justiça Federal e Diretor do CEJ 9 Agradecimentos pela homenagem Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz – Tribunal Regional Federal da 4ª Região 12 Pretensões positivas contra o Estado e a Reserva do Possível na jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal 13 Leistungsansprüche gegen den Staat und der Vorbehalt des Möglichen in der Rechtsprechung des Bundesverfassungsgerichts Ministro Reinhard Gaier – Tribunal Constitucional Federal Alemão 22 Dia: 17 de junho de 2011 Presidente de Mesa: Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler – Tribunal Regional Federal da 4ª Região 31 Fundamentos do Processo Penal Alemão 32 Grundzüge des Strafprozesses Ministro Ulrich Hebenstreit – Superior Tribunal de Justiça Alemão 45 Presidente de Mesa: Desembargador Federal Tadaaqui Hirose – Presidente da EMAGIS 58 Principais inovações do projeto de Código de Processo Penal Brasileiro Ministra Maria Tereza de Assis Moura – Superior Tribunal de Justiça 59 Presidente de Mesa: Ministro João Otávio de Noronha – Superior Tribunal de Justiça Pressupostos de admissibilidade do Recurso Especial no STJ alemão 68 Zulassungsvoraussetzungen bei der Revision zum BGH Prof. Dr. Alexander Bruns – Universidade de Duke, Carolina do Norte – EUA 79 Presidente de Mesa: Ministro João Otávio de Noronha – Superior Tribunal de Justiça 89 Pressupostos de admissibilidade do Recurso Especial no Superior Tribunal de Justiça Ministro Teori Zavascki – Superior Tribunal de Justiça 90 Presidente de Mesa: Ministro Benedito Gonçalves – Superior Tribunal de Justiça O papel dos Tribunais Superiores Alemães 99 Die Rolle der obersten Gerichte in Deutschland Professor Rolf Stürner – Universidade de Friburgo – Texto em alemão 109 Presidente de Mesa: Ministro Francisco Falcão – Corregedor-Geral da Justiça Federal e Diretor do CEJ 120 Papel constitucional do Conselho Nacional de Justiça Ministra Eliana Calmon – Corregedora Nacional de Justiça 121 série Cadernos do CEJ Dia 16/06 Desembargador Federal Vilson Darós Ministro Francisco Falcão Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz Ministro Reinhard Gaier 8 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Ministro Francisco Falcão, Desembargador Federal Vilson Darós (presidente de mesa) e Ministro Reinhard Gaier.. “ DESEMBARGADOR FEDERAL VILSON DARÓS: Este é o segundo Seminário Brasil-Alemanha, que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região e a Seção Judiciária do Estado de Santa Catarina têm a honra de sediar, e está sendo realizado neste belo Auditório Faço questão de registrar que é o primeiro evento dessa natureza que ocorre neste local, porque o prédio onde estamos foi inaugurado há poucos dias, em 24 de maio deste ano. Aqui, neste evento, além de termos a satisfação de ouvir a manifestação de vários juristas de escol das duas pátrias, Alemanha e Brasil, estaremos também homenageando o Ministro Thompson Flores, do Supremo Tribunal Federal. Por essa razão concedo à palavra ao Ministro Francisco Falcão para a sua manifestação ao homenageado. Homenagem ao Ministro Thompson Flores Ministro Francisco Falcão Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco. Ex-Procurador Judicial do Estado de Pernambuco, foi Juiz do Tribunal Regional Federal da 5ª Região e exerceu sua Presidência no biênio 1997/1999. Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Corregedor-Geral da Justiça Federal, Presidente da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais e Diretor do Centro de Estudos Judiciários. “ Eminente Presidente Des. Federal Vilson Darós, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Dr. Nelson Serpa, que, nesta solenidade, representa o Governador do Estado, Ministro Gaier, da Corte Constitucional Alemã, Ministro Hebenstreit, do BHG1 da Alemanha, Ministro Paulo Gallotti, que integrou o Superior Tribunal de Justiça e nos honra com sua presença, Des. Federal Tadaaqui Hirose, Diretor da Escola da Magistratura da 4ª Região, meu querido amigo Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, Desembargador do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e que, nesta solenidade, representa a família do homenageado, Des. Federal Marga Inge Barth Tessler, Presidente eleita do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Des. Federal Roberto Haddad, Presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, eminentes desembargadores, minhas senhoras e meus senhores: Não é fácil, a quem está jungido à limitação do tempo esboçar o retrato de corpo inteiro da personalidade exuberante do nosso homenageado: Carlos Thompson Flores. 1 Bundesgerichtshof, que vem a ser o equivalente ao Superior Tribunal de Justiça no Brasil. 10 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Nascido no Estado do Rio Grande do Sul a 26 de janeiro de 1911, na cidade de Montenegro, projetou-se no cenário nacional como jurista de elevado conceito. Destacou-se como juiz, desembargador e ministro do Supremo Tribunal Federal, ocupando a sua Presidência no biênio 1977/1979. Além de jurista brilhante, cultivou os melhores sentimentos da convivência humana. Em 1933 se iniciava na magistratura como juiz de Herval do Sul, sem imaginar que o destino lhes reservava quarenta anos adiante a culminância do cargo como chefe do Poder Judiciário Nacional. Esse ponto de chegada, no entanto, não resultou do acaso, não decorreu de felizes coincidências. na escolha de sua vocação, a magistratura, cujo exercício consumiu toda a sua existência. Ao saudar Thompson Flores, que assumia a Presidência do Supremo Tribunal Federal em 1977, assim se pronunciou o então Procurador-Geral da República Dr. Henrique Fonseca de Araújo: “Não posso deixar de volver os olhos para a nossa provinciana Porto Alegre de 1926 quando nos encontramos, de uniforme cáqui, no Ginásio Júlio de Castilhos. Depois, 1930, o ingresso na Faculdade de Direito, com a convivência aí estabelecida, em que lhe fornecia sebentas, por mim preparadas, a ele que não podia freqüentar com assiduidade todas as aulas; as agitações estudantis, em torno de problemas do ensino; a colação de grau, em 7 de dezembro de 1933, quando a cada um dos formandos o saudoso mestre e magistrado ilustre, comercialista de tomo, o Desembargador Manoel André da Rocha, dirigia uma palavra Não é fácil, a quem está jungido à limitação do tempo especial, e prognosticava ao jovem esboçar o retrato de corpo inteiro da personalidade bacharel Carlos Thompson Flores o exuberante do nosso homenageado: Carlos Thompson êxito crescente na carreira que já enFlores. tão abraçara, pois já era, ao tempo, Juiz Distrital de Herval do Sul, termo da comarca de Jaguarão.” Segundo Calamandrei: os advogados nascem e os juízes se fazem, pois as qualidades exigidas para aqueles são próprias da juventude apaixonada e ardente, ao passo que os atributos destes só se adquirem com o passar dos anos. Thompson Flores foi a demonstração inequívoca de que há os que nascem para magistrado. Herdou sem dúvida a vocação do avô paterno. Descendente de uma das famílias ilustres e antigas do Brasil que forneceram ao País políticos do mais alto relevo, como o Marechal Hermes da Fonseca (Presidente do Brasil), diplomatas como o Embaixador Carlos Martins Thompson Flores, médicos como o Conselheiro do Império Dr. Jonathas Abbott, considerado por muitos como o maior luminar da ciência médica brasileira no século XIX. No exemplo de seus ancestrais, colheu a inspiração e o estímulo que lhe serviram de motivação E de Juiz Distrital a Presidente do STF foi uma reta ascendente. Ainda naquela solenidade em que lhes transmitia a Presidência da Corte Suprema o colega e amigo Djaci Falcão assim se pronunciou: “Neste momento tenho a honra de transmitir a Presidência ao eminente Ministro Carlos Thompson Flores. Juiz de carreira, familiarizado com a missão de julgar, possuído de amor à Justiça, daquele amor que cria a plena confiança, soube galgar pelos seus próprios méritos intelectuais e morais todos os degraus da magistratura, iniciada no interior distante no seu Estado natal – Rio Grande do Sul, onde presidiu o Tribunal de Justiça e o Tribunal Regional Eleitoral. Ministro do Supremo Tribunal Federal, em 1968 veio a ser Vice-Presidente e Presidente do TSE, assim como por um biênio a Vice-Presidência desta série Cadernos do CEJ Corte, em cuja Presidência se empossa nesta magnífica solenidade. Ao seu lado, na Vice-Presidência, o eminente Ministro Bilac Pinto, que para aqui trouxe o saber e a experiência de professor de Direito e de parlamentar. A conjugação dos dotes de que ambos são portadores, contribuirá, por certo para o STF, à luz da fidelidade ao Direito, continue dignificando a Justiça da nossa Pátria.” Thompson Flores exerceu todos os cargos administrativos que a alta magistratura do País pode proporcionar. De juiz a Presidente do Supremo Tribunal Federal. No desempenho dessas funções, sempre se houve com invulgar êxito. Recebeu todas as dignidades a que um magistrado pode aspirar e soube realçá-las, inclusive, com a sua dignidade pessoal e funcional. Casado com Dona Anita Thompson Flores, que lhes deu duas filhas: Mariza Thompson Flores Lenz e Beatriz Thompson Flores Brinckmann e cinco netos, um deles, Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, hoje integrando com brilho o Tribunal Regional Federal da 4ª Região de quem herdou o nome e por certo seguirá os passos na carreira. A morte alcançou-o em 2001, aos 90 anos de idade. Repetindo Bento de Faria, o Ministro Carlos Thompson Flores distribuiu justiça sem os excessos da mediocridade exibicionista, praticou o bem sem alardes; elevou o conceito de nossa Pátria, honrou a sua toga, impôs-se ao respeito e admiração dos seus pares e jurisdicionados. Nos merecidos aplausos que rodeiam a longa trajetória do Ministro Thompson Flores, resplandece a qualidade de todo homem marcante: a fidelidade a si mesmo, à sua vocação e aos ideais de justiça. Um novo conceito emerge como resultado da longa e sofrida trajetória traçada pelo homem até o presente momento de nossa história. Esse novo conceito baseado em valores que levam em consideração sobretudo a pessoa humana, exige que nos entendamos acima de injunções culturais e das distâncias geográficas. Está em jogo, a esperar a contribuição da comunidade jurídica internacional, a delicada construção de uma sociedade mais justa e feliz. Este não é, pois um objetivo modesto e por isso necessita do empenho dos governos e da própria sociedade como um todo. Aqui teremos personalidades destacadas do nosso País. Do Poder Judiciário brasileiro, e precisamente do Superior Tribunal de Justiça, a Ministra Eliana Calmon, os Ministros João Otávio de Noronha, Teori Zavascki, Benedito Gonçalves e Maria Thereza de Assis Moura. Representando a nação amiga alemã temos igualmente a satisfação de receber como conferencistas os Ministros Ulrich Hebenstreit (BGH), Reinhard Gaier (Corte Constitucional) e os Professores da Universidade de Friburgo, Dr. Alexander Bruns, LL.M (Duke University) e Dr. Rolf Stürner. A contribuição dos ilustres visitantes, ao revelar-nos aspectos do ordenamento jurídico do seu País, certamente será de grande significado para todos nós, sobretudo tendo em conta que, no mundo de hoje, crescem cada vez mais as questões de legítimo interesse universal. Assim, o conceito de cidadania, em nossos dias, atinge uma dimensão mundial e constrói as bases de uma solidariedade cada vez mais ampla. Dia virá em que as leis internacionais celebrarão com mais eficácia o primado do direito, e facultarão o acesso à justiça a todos os cidadãos. Esta sociedade do futuro não estará tão distante se o caminho que a ela conduz for percorrido adequadamente por todos nós. Concluindo, devo dizer que alimento a convicção de que vivemos no limiar de promissora esperança em torno da vida humana, na certeza de que tudo quanto, em princípio, “é impossível aos homens, é possível a Deus”. Seja este conclave uma efetiva contribuição ao nosso elevado propósito. Meus agradecimentos.” 11 12 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Agradecimentos pela homenagem “ DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ: Sr. Presidente, Vilson Darós, Ministro Francisco Falcão, Corregedor-Geral da Justiça Federal do Brasil, em nome de quem saúdo todas as pessoas já referidas e aqui presentes. Em nome de minha família, só tenho a registrar – e serei breve – um enorme agradecimento. E, por feliz coincidência, Carlos Thompson Flores foi homenageado hoje em um auditório que leva o nome de Luiz Gallotti, de quem era muito amigo e foi justamente como Presidente do Supremo que o recebeu em 14/03/1968, pois foi ele que deu posse ao Ministro Thompson Flores. Então, é uma coincidência muito fortuita termos aqui o nosso estimado Ministro Paulo Gallotti, sobrinho do saudoso Ministro. Realmente emocionado, o Ministro Falcão traçou, com muita fidelidade, a trajetória de Carlos Thompson Flores, e eu me permito aqui agradecer, e muito. Confesso que estou muito emocionado. Carlos Thompson Flores exerceu a jurisdição durante 48 anos. A partir da Constituição de 1934 se exigiu que a idade-limite para a magis- “ DESEMBARGADOR FEDERAL VILSON DARÓS: Essas manifestações do Ministro Francisco Falcão e do Des. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, brilhantes e, sem dúvida nenhuma, emocionantes, a quem agradeço, evidentemente, em homenagem ao grande jurista e magistrado Thompson Flores, que, como se ouviu das duas manifestações, exerceu a magistratura por mais de 50 anos. V. Exa., Des. Carlos Eduardo, tratura fosse 70 anos, e acredito que tenha sido ele desde então o juiz que mais tempo exerceu a magistratura: dos 22 aos 70 anos. V. Exa. referiu há pouco o depoimento do saudoso Prof. Henrique Fonseca de Araújo, na época Procurador-Geral da República, em que ele disse que fornecia sebentas a Carlos Thompson Flores, que não podia comparecer a todas as aulas. Por quê? Porque ele já era, a esse tempo, juiz. Na época, era permitido, ele já era juiz distrital, era o último ano da faculdade, e já podia exercer a magistratura, que, assim, a partir de então, exerceu. De todas as missões que exerceu, vou destacar uma, que considero a mais importante: foi eleito pelo Supremo Tribunal Federal para presidir a Comissão que elaborou o Diagnóstico de Reforma do Poder Judiciário. Na época ele era VicePresidente da Corte e foi eleito por uma delegação do então Presidente Djaci Falcão, pai de V. Exa. Por isso, Ministro Francisco Falcão, em meu nome e no de minha família – vejo aqui o Prof. Paulo Thompson Flores, acompanhado de seus filhos, que veio de Brasília prestigiar esse evento, associando-se a nós –, permito-me agradecer a V. Exa., ao Presidente Darós, ao Diretor da nossa Escola, Tadaaqui Hirose, e a todas as pessoas aqui presentes por permitirem essa homenagem neste magnífico evento, neste belíssimo prédio, neste auditório Luiz Gallotti. Tenho certeza que será muito proveitoso para a cultura brasileira. Muito obrigado. nos deu um dado que realmente eu desconhecia: ele estava ainda estudando, mas já era magistrado. Então, foi magistrado antes de se formar, era permitido, e exerceu, com aquele brilho, desde aquele momento até o último dia, quando teve de se aposentar pela compulsória, essa grande e nobre missão, que é a de julgar, e que muitos de nós aqui, desembargadores, ministros, juízes, a exercem também com muita responsabilidade. Pretensões positivas contra o Estado e a Reserva do Possível na jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal Trad. Dr. Márcio Flávio Mafra Leal Ministro Reinhard Gaier “ I. Fundamentos 1. O acórdão numerus clausus Doutor em Direito Processual Civil pela Universidade de Dresden. Professor honorário da Universidade Leibniz de Hannover, Alemanha. Ex-Juiz da 1ª instância em Darmstadt, no Estado de Hessen. Ex-Juiz do Tribunal de Justiça de Frankfurt, em 2000. Ex-Ministro do Superior Tribunal de Justiça. Ministro do Tribunal Constitucional Federal alemão (Primeiro Senado) desde 2004. Na jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal surge a doutrina da Reserva do Possível pela primeira vez no acórdão denominado “numerus clausus”, de 1972. A Corte submeteu os direitos a prestações positivas decorrentes diretamente da Constituição a essa restrição, desde que esses direitos não se limitem apenas aos chamados “direitos de participação” em institutos que já estiverem disponibilizados ao cidadão. Desse modo, a Reserva do Possível deve limitar pretensões dos cidadãos a prestações positivas estatais àquilo que o indivíduo possa racionalmente exigir da sociedade. O Tribunal remete em princípio ao legislador como esses limites se determinam no caso concreto, e este, por sua vez, encontra-se aqui no exercício de competência própria. Interessante é a detalhada justificativa do Tribunal para essa limitação à pretensão positiva: A Corte indica, em primeiro lugar, que o legislador, no exercício de suas atribuições, deve também observar outros interesses da comunidade e, conforme manda- 14 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores mento expresso na Constituição (Art. 109, inc. 2, da CF), é imprescindível preservar o equilíbrio econômico global, ou seja, não se devem criar custos e endividamentos exagerados. Em outra passagem do acórdão, o Tribunal torna-se mais expressivo e declara, de forma inequívoca, que, no mérito, a concepção de que há uma contínua precedência da liberdade pes soal em detrimento da capacidade funcional e do equilíbrio da sociedade em geral decorre de uma “incompreensão do significado de liberdade“. Arremata-se, como argumento conclusivo, com a remissão aos princípios do Estado Social, pelo qual a tese de uma pretensão subjetiva ilimitada às custas da comunidade é incompatível. 2. Pano de fundo fático De qualquer sorte, a Lei Fundamental, no seu art. 12, inc. 1, confere a todos os alemães “o direito de escolher a profissão, emprego e instituição para sua formação profissional”. 3. Direitos Fundamentais, Direitos de Participação e de Prestações Positivas Se a Corte tivesse compreendido esse direito fundamental apenas no seu sentido tradicional, como direito de defesa contra intervenções do Estado, a decisão seria tomada facilmente. O Estado seria, então, em princípio, obrigado a um não-fazer, enquanto aqui os candidatos inadmitidos exigiam exatamente um fazer estatal, especificamente a criação de vagas suficientes nas universidades. Não se trata de uma proteção contra intervenções estatais no sentido de um dever negativo, mas de um dever de agir positivo do Estado. Aquele que quiser estruturar essa argumentação abstrata corretamente tem de inexoravelmente contextualizar esse caso julgado pelo Tribunal Constitucional. A prerrogativa orçamentária é, consequentemente, um No final dos anos 60 do sédos instrumentos essenciais do controle do Executivo pelo culo passado, o número de canParlamento, e esse controle é, por sua vez, determinante didatos a uma vaga no ensino para uma Democracia observadora do Estado de Direito. superior na Alemanha deu um salto considerável. Uma vez que a ampliação das universidades não acompaTais deveres de agir do Estado não são estranhou essa escalada, muitas faculdades não ofenhos ao direito constitucional alemão, a Corte receram um número suficiente de vagas. O curso Constitucional os extrai até daqueles direitos funde medicina foi especialmente afetado. damentais que precipuamente se dirigem à proPor essa razão, as universidades introduziram teção da esfera de liberdade do cidadão contra limitações ao seu acesso, a fim de conter o númeingerências estatais. Com isso, a Corte recorre à ro de estudantes: o chamado “numerus clausus”. ideia de que os direitos fundamentais, como norComo consequência, em 1970, por exemplo, 71% mas objetivas, estabelecem também uma ordem dos candidatos foram rejeitados na faculdade de de valores; por isso deve-se acrescentar a eles medicina. As vagas foram distribuídas essencialnecessariamente, para além da mera função de mente conforme o princípio do mérito, isto é, de defesa, também o conteúdo de deveres a prestaacordo com as notas finais do Ensino Médio, o ções positivas e de proteção. chamado “Abitur”, e conforme o tempo de espera Uma vez que os direitos fundamentais na por uma vaga. Constituição alemã são de aplicabilidade imeNessa situação, sentida cada vez mais como diata (art. 1, inc. 3, CF), resultam dos conteúdos precária, perguntava-se que medidas poderiam de prestação positiva e de proteção para o ciser exigidas do Estado, a fim de que ele se capadadão individual forçosamente também direitos citasse a oferecer aos candidatos o maior número subjetivos. possível de vagas desejadas no ensino superior. série Cadernos do CEJ Aqui se devem diferenciar direitos ou posições jurídicas derivados dos originários: Os direitos de participação derivados não apresentam problemas, pois conferem um direito ao acesso a instituições e prestações que já são oferecidas pelo Estado. Em casos isolados foram reconhecidos também direitos originários a prestações, pelos quais o Estado deve obrigatoriamente mobilizar os recursos necessários para implementá-los. No processo numerus clausus, o Tribunal tomou em consideração que se tratava efetivamente de uma pretensão originária à prestação positiva, mas somente se houvesse uma limitação absoluta ao acesso às universidades que levasse a que o candidato individual jamais pudesse ingressar no curso almejado. O Tribunal, no entanto, negou, ao final, a possibilidade de existir uma pretensão individual ajuizável para a criação de vagas e, para fundamentar tal rejeição, invocou a Reserva do Possível, o que demonstra que esse princípio não exclui somente a exequibilidade da pretensão, mas impede o surgimento da pretensão mesma. 4. Significado da Reserva do Possível De acordo com o aqui visto, prestações positivas limitam-se àquelas que o indivíduo razoa velmente pode exigir da sociedade, e, no entendimento do Tribunal Constitucional Federal, justamente os direitos a prestações originárias adquirem aqui especial relevo. As razões para isso são evidentes: exatamente num Estado cujo ordenamento se baseia nas liberdades, as disponibilidades financeiras são limitadas, tanto que, na alocação desses recursos, surgem sempre conflitos a serem dirimidos quanto à sua destinação em contraste com outras finalidades. A solução desses conflitos, ou seja, a decisão sobre a alocação dos limitados recursos financeiros para determinadas finalidades é, num Estado democrático e sob o Princípio da Separação de Poderes, tarefa precípua e competência do legislador, ou seja, do Parlamento. Na Lei Fundamental alemã esta competência do legislador encontra seu fundamento na reserva legal geral. Ela decorre, sobretudo, do Princípio Democrático e obriga o legislador a tomar todas as decisões essenciais do Estado e não permite delegá-las ao Executivo. Além disso, essa competência decisória encontra clara expressão na prerrogativa orçamentária do Parlamento. Essa prerrogativa, isto é, a competência de estabelecer o plano orçamentário, nas quais todas as receitas e despesas da União são incluídas, atribui o art. 110 da CF exclusivamente ao legislador. A prerrogativa orçamentária tem, conforme o exposto, portanto, sem dúvida status constitucional. Com a prerrogativa orçamentária, o Parlamento recebe, no âmbito político, ampla competência de definição de prioridades e conformação. Pois, pela alocação de recursos, se exerce uma influência marcante em todas as atividades estatais, o que evoca o reconhecimento banal de que dinheiro também é poder. A isso se acrescenta, como o Tribunal Constitucional Federal acentuou em diversos acórdãos, ainda uma outra função, a saber, o controle do Executivo por meio da alocação de receitas financeiras. A prerrogativa orçamentária é, consequentemente, um dos instrumentos essenciais do controle do Executivo pelo Parlamento, e esse controle é, por sua vez, determinante para uma Democracia observadora do Estado de Direito. Assim, a problemática se torna evidente; pois se o Estado é obrigado diretamente pela Constituição a garantir aos cidadãos prestações positivas, que – em regra – exigem grandes gastos financeiros, então os recursos necessários para isso são forçosamente vinculados e não podem ser utilizados pelo Parlamento para outras finalidades ou tarefas. A margem de manobra do legislador parlamentar se estreita dessa forma: pois se são postos à disposição menos recursos para a definição e conformação política de prioridades, perdem-se, nesse âmbito, igualmente mais opções, possibilidades e oportunidades, além disso, impede-se também o controle parlamentar do Executivo na forma de alocação de recursos. Em outras palavras: o Parlamento sofre perdas no seu poder, que a Constituição quis lhe atribuir. 15 16 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores II. A Reserva do Possível na jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal 1. Aplicação da Exclusão e da Limitação da Prestação No período após o julgamento do numerus clausus, a Reserva do Possível ganhou importância na jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal, sobretudo nas prestações sociais do Estado. Assim, o Tribunal aduziu, num acórdão do ano de 1990, sobre a redução do auxílio-criança para pais abastados, que prestações financeiras do Estado de incentivo à família também se encontram sob a Reserva do Possível. A base constitucional desse acórdão se expressa no art. 6º, inc. 1, da CF 1, segundo o qual o casamento e a família se encontram sob especial proteção do Estado. Diante desse comando de proteção, o Tribunal Constitucional Federal considera o Estado obrigado a dar suporte à família por meio de medidas apropriadas. Essa obrigação não vigora, no entanto, incondicionalmente, antes, a Corte introduz aqui a Reserva do Possível para deixar claro que o Estado necessariamente deve incentivar a família sem negligenciar os demais interesses gerais. Sob esse fundamento, o Tribunal analisou o conjunto de prestações do Estado em favor dos filhos e, em consonância com essa análise, não pôde determinar que incentivos estatais à família eram, à evidência, inadequados e que não correspondiam mais às exigências de proteção do art. 6º, inc. 1, da CF. Nesse acórdão, introduziu-se, portanto, a inadequação evidente de uma prestação devida constitucionalmente como critério. Se, conforme o exposto, aquilo que o Estado efetivamente 1 N. do T, por tradução própria: Art. 6o.(1) Casamento e família encontram-se sob especial proteção do Estado. [...] proporciona em virtude de uma obrigação decorrente da Constituição não for mais adequado, a Reserva do Possível não pode mais justificar essa limitação, pois assim a linha do tolerável é ultrapassada. Obviamente o critério se caracteriza por uma considerável – mas para o Direito Constitucional não incomum – indeterminação. Entretanto, o critério dá contornos mais claros à Reserva do Possível e o torna mais viável pela jurisprudência. Dois anos depois – em 1992, portanto – retomou o Tribunal essa argumentação em uma decisão importante. A questão em pauta concernia ao tempo da educação dos filhos, se este deveria ser considerado para o cálculo da aposentadoria, levando, consequentemente, a um pensionamento de maior valor, embora não se tenha contribuído para a seguridade social por falta de exercício de uma atividade profissional. Aqui também o Tribunal acentuou a Reserva do Possível para prestações que acarretem custos financeiros, no âmbito dos incentivos estatais à família; repetiu, ainda, que o mandamento constitucional de proteção decorrente do art. 6º, inc. 1, da CF é, então, violado, se as obrigações de fazer estatal forem evidentemente inadequadas. Por outro lado, a Corte considerou a Reserva do Possível isoladamente como muito fraca para limitar as pretensões dos pais por apoio financeiro para os custos de seus filhos; assim, o Tribunal acrescentou o argumento da judicial self-restraint: Na concretização de uma repartição de despesas familiares efetiva existe uma liberdade básica do legislador na definição de prioridades, tanto que não se podem derivar pretensões concretas decorrentes desse mandamento constitucional. Em um acórdão de 1998, tratou-se novamente de pretensões positivas estatais para proteção à família, ou seja, de incentivos financeiros para despesas com filhos. O objeto do exame era determinar se taxas, que deviam ser pagas pelo cuidado de crianças em jardins de infância, poderiam ser escalonadas de acordo com a renda da família. série Cadernos do CEJ Em última análise, o que estava em jogo era saber se o Estado pode-se recusar a subvencionar taxas de jardim de infância para pais abastados, mas que são garantidas às famílias mais pobres. No primeiro plano desse acórdão, sobressaiu, assim, o Princípio da Igualdade (art. 3º, inc. 1, CF).2 A Corte examinou se o dever estatal de incentivo decorrente do art. 6º, inc. 1, CF, em favor das famílias também foi cumprido. Sublinhou o Tribunal Constitucional Federal que esse dever de proteção não impede o Estado de diferenciar o valor da subvenção às famílias conforme sua carência financeira. Além disso, o Estado não está obrigado a compensar simplesmente todo encargo da família sem levar em consideração outros interesses públicos. Para fundamentar essa clara imposição de limites, baseou-se o Tribunal na Reserva do Possível. Enquanto nos acórdãos até agora mencionados a Reserva do Possível serviu para excluir totalmente tutelas positivas contra o Estado, o de prover os recursos para o financiamento das gerações mais velhas. A isenção total da contribuição pretendida pelos reclamantes também foi improvida pelo Tribunal com base na Reserva do Possível. Novamente se trouxe o argumento de que o legislador teria de considerar, no interesse do bem comum, além do incentivo à família, outros interesses da comunidade. O Tribunal asseverou que, somente na ponderação de todos os interesses seria possível averiguar se os incentivos à família por meio do Estado são evidentemente inadequados e não cumprem mais o mandamento constitucional de proteção do art. 6, inc. 1, da CF. A Corte acentuou, por sua vez, que aqui se confere um poder discricionário ao Estado. Seus limites não são ultrapassados, se famílias – isto é, cidadãos com filhos – forem onerados com contribuições para assistência social. Entretanto, o Tribunal derivou do art. 6º, inc. 1, da CF, combinado com a isonomia (art. 3º, inc. 1, da CF), a obrigação de considerar a assistência e educação de filhos no cálculo das contribuiÉ tarefa do legislador ajustar as prestações positivas ções a serem pagas. Mediante o a serem implementadas com o respectivo nível de cuidado dos filhos por parte das desenvolvimento da sociedade e das condições de vida existentes. famílias, além da contribuição financeira, é prestada uma “contribuição para as futuras gerações” Tribunal utilizou esse argumento num acórdão para manter, a longo prazo, a capacidade funciopolêmico de 2001, para impor limitações às presnal dos Sistema de Seguridade Social. Isso acartações fundadas na Constituição a um grau rareta uma contribuição mais reduzida em compazoável. Tratava-se de contribuições obrigatórias ração aos segurados sem filhos. Uma outra e – até agora – última aplicação para a assistência social, que se destinavam a da Reserva do Possível ocorreu em um acórdão financiar prestações especialmente para idosos do Primeiro Senado do Tribunal Constitucional necessitados. Federal do ano de 2004. A decisão se refere à Os autores da reclamação constitucional Lei de Indenização de Vítimas, que disciplina o alegaram que já haviam contribuído suficienteincentivo estatal às vítimas de crimes violentos. mente para a assistência de idosos por meio de Segundo essa lei, as viúvas e viúvos das vítimas cuidado e educação de seus próprios filhos; pois de crimes também recebiam benefícios estatais, essas crianças teriam, no futuro, como adultos, caso eles estivessem no cuidado de filho comum. Nenhum benefício recebiam, no entanto, pai e mãe de filhos ilegítimos, mesmo se, após a morte 2 N. do T.: Art. 3o (1) Todas as pessoas são iguais peranviolenta de um deles, sob renúncia de atividades te a lei. 17 18 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores remuneradas, assumisse o pai remanescente a assistência dos filhos comuns. Nisso a Corte viu uma violação do Princípio da Igualdade e declarou a regra incompatível com a Constituição. Por outro lado, o Tribunal alegou que, neste caso, não se estaria deixando de cumprir a determinação de proteção da família decorrente do art. 6º, inc. 1, da CF. Embora o dever estatal de incentivo à família compreenda a garantia de benefício em caso de morte violenta de um dos pais, o Estado não está obrigado, no entanto – e assim se pronunciou mais uma vez claramente – a compensar todo e qualquer gravame financeiro do cônjuge remanescente. O incentivo familiar estatal está, assim, sob a Reserva do Possível, tanto que, para o Estado, remanesce a discricionariedade para a forma e espécie de realização das compensações dos gastos familiares. A Corte considerou como dada uma garantia suficiente especialmente porque se atribui ao próprio filho uma pensão por orfandade e o pai supérstite não deve, paralelamente, receber uma pensão respectiva. A diferença no fundamento da inconstitucionalidade – ofensa à isonomia no lugar do dever de prestação positiva – não pode ser negligenciada. Sendo a lei inconstitucional tão somente por causa da violação ao Princípio da Igualdade, remanescem ao legislador, assim, diferentes possibilidades para uma nova disciplina conforme a Constituição; pois ele poderia corrigir o tratamento desigual, como, por exemplo, na supressão mesmo dos pais de filhos legítimos de qualquer suporte financeiro. Se o Tribunal não tivesse, entretanto, invocado a Reserva do Possível e admitido uma violação ao comando de proteção decorrente do art. 6º, inc. 1, CF, com o consequente dever de prestação positiva do Estado, ao legislador restaria somente uma opção: ao lado dos pais viúvos, pagar uma pensão também aos pais de filhos ilegítimos. 2. Aplicação como Metáfora À primeira vista, afigura-se irritante um acórdão do Segundo Senado do Tribunal Constitucional Federal, na medida em que se refere à Reser- va do Possível num contexto totalmente diferente e que, em última instância, lhe veda a aplicação. Objeto do acórdão foi o emprego de diferentes alíquotas de imposto sobre pensões de funcionários públicos, de um lado, e sobre aposentadorias oriundas de seguridade social obrigatória, de outro. Aludiu a parte estatal às grandes dificuldades práticas na produção de resultados equitativos nos dois diferentes sistemas de aposentadoria. A Corte não convalidou esse argumento, porque a vinculação do legislador à Constituição e porque a exigência de conformidade da lei infraconstitucional com a Lei Maior não estão “sob uma reserva do possível genérica”. Aqui não se tratou de proteger o Estado de uma sobrecarga financeira e de um estreitamento de seu poder discricionário de conformação por intermédio de cortes orçamentários, mas, sim, de questionar quais esforços e quais gastos podem ser exigidos da legislatura. O Segundo Senado utilizou a Reserva do Possível, portanto, não propriamente para uma limitação de pretensões a prestações positivas originárias contra o Estado, mas tão somente como uma metáfora. III. A Reserva do Possível como expressão da autolimitação judicial 1. Desdobramento Esse curto panorama mostra que o Tribunal utiliza a Reserva do Possível para restringir uma ideia exagerada dos cidadãos sobre pretensões positivas. Nos anos 70 do século passado, surgiram demandas sobretudo para uma ampliação maciça da capacidade das universidades com o objetivo de conseguir, para todos os candidatos, a vaga desejada, enquanto, nos últimos 20 anos, se tratou principalmente de confrontar a disseminada ideia de que a Constituição obriga o Estado a isentar os pais virtualmente de todas as desvantagens financeiras decorrentes da assistência e educação dos filhos. série Cadernos do CEJ A larga ampliação das universidades e, sobretudo, a transferência de obrigações para uma isenção completa das famílias teria vinculado o orçamento a um nível tal, que teria limitado sensivelmente a margem de manobra para outras finalidades, e, consequentemente, para a conformação política decorrente de cometimento direto dos cidadãos como soberanos. Com isso tornase claro que a Reserva do Possível é uma forma especial do Princípio da Autolimitação Judicial. O Tribunal também recorre a esse princípio mesmo nos casos como o do já citado acórdão a fim de considerar o tempo de educação das crianças para o cálculo da aposentadoria. A função do judical self-restraint descreveu o Tribunal Constitucional Federal com as seguintes palavras: “não se trata de redução ou enfraquecimento de sua própria competência como Corte Constitucional, mas, sim, de se abster de ‘praticar política’, não se pode intervir, portanto, na área reservada pela Constituição à livre conformação política.” Nesse diapasão, não sobra para a Reserva do Possível nenhum espaço em que a própria Constituição impõe ao Estado uma cogente e irrevogável obrigação positiva. Aqui não existe, desde o princípio, nenhuma discricionariedade de conformação que o legislador poderia reivindicar para si e que exigisse a observância da autolimitação judicial. Assim, o Tribunal não retomou a questão da Reserva do Possível em seu novo acórdão sobre a inconstitucionalidade das regras que determinam prestações estatais para asseguramento das condições de vida dos desempregados (conhecido como “Hartz IV”). A Reserva seria provável só por causa do alto número de 6,5 milhões de beneficiários, e por causa dos – com ele acoplados – altos dispêndios financeiros: em 2010 devem ser gastos apenas pela União 45 bilhões de Euros (isto é, mais de 100 bilhões de reais). Por que não houve aqui, apesar disso, qualquer menção à Reserva do Possível? No acórdão citado, o Tribunal Constitucional Federal extraiu um direito fundamental à garantia de um mínimo existencial humanitariamente digno como decorrência da Garantia da Dignidade Humana (art. 1, inc. 1, da CF)3 combinado com o Princípio do Estado Social (art. 20, inc. 1, da CF)4. Esse direito confere uma pretensão a uma prestação positiva contra o Estado. O indivíduo pode exigir aqueles meios absolutamente necessários para a conservação de uma existência humana digna. Com isso se quer dizer: despesas para a existência física, isto é, alimentação, vestuário, despesas domésticas, habitação, aquecimento no inverno, higiene e saúde, mas, acresça-se também, aqueles gastos para contatos entre as pessoas e para um mínimo de participação na vida social, cultural e política. A Constituição alemã declara no art. 1º, inc. 1, a dignidade humana como inviolável, e confere, portanto, à dignidade humana um significado absoluto e a ela proíbe, com isso, qualquer ofensa. A partir do momento em que a Garantia da Dignidade Humana é diretamente atingida, não pode haver qualquer discricionariedade para o legislador; a Dignidade Humana deve ser observada sem qualquer relativização, não cabe aqui uma ponderação com outros bens constitucionais, ainda que tão valiosos. Entretanto, a Corte não pôde extrair uma pretensão a uma prestação positiva originária do asseguramento a um mínimo existencial da Garantia da Dignidade Humana isoladamente; exigiu-se, pois, o emprego adicional do Princípio do Estado Social. Daí resulta um certo enfraquecimento, mas que nada permite mudar no direito à prestação como tal; o Tribunal o descreve expressamente como “fundamentalmente indisponível”. Ao legislador remanesce apenas uma margem de discricionariedade muito estreita, que, por si só, é causadora da relatividade de um mínimo existencial digno: isso exigiu em um país arrasado pela guerra – como, na Alemanha, por ocasião da entrada em vigor da Lei Fundamental em 1949 – 3 N. do T.: Art. 1o (1) A dignidade do homem é inviolável. É dever de todos os Poderes do Estado protegêla e observá-la. 4 N. do T.: Art. 20 (1) A República Federativa da Alemanha é um Estado Federal democrático e social. 19 20 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores gastos mais modestos do que num país que atual mente é próspero. É tarefa do legislador ajustar as prestações positivas a serem implementadas com o respectivo nível de desenvolvimento da sociedade e das condições de vida existentes. Essa discricionariedade limitada do legislador nada tem a ver com o poder de conformação política, que seria assegurado por meio da Reserva do Possível. Não se trata de decidir conflitos de finalidades conforme critérios políticos. Desse modo não se poderia, para desonerar os cidadãos de pagamentos de tributos, retirar o apoio dos sem-renda aos meios que lhe asseguram a mera sobrevivência. Trata-se de colocar a concretização de uma inevitável indeterminação nas mãos da instituição do Estado competente e democraticamente legitimada para isso. 2. Consequências Em ambos os regimes – isto é, decorrente de ação estatal no “âmbito fiscal” ou âmbito do direito privado administrativo – podem sempre resultar exclusivamente pretensões de direito privado em favor e contra o Estado. Se o Estado não cumprir suas obrigações, então pode e deve, como qualquer ente privado, ser acionado no juízo cível. Alguns poucos privilégios para ele existem apenas no âmbito da execução e, mesmo assim, somente se se tratar de cumprimento de obrigações de dar quantia certa. O chamado “privilégio do Fisco (§ 882a CPCal)” permite uma execução somente após notificação prévia e exaurimento de um prazo de quatro semanas. Desse modo o Estado apenas ganha tempo e chance de obter os recursos necessários que estão fora do planejado e, assim, cumprir a execução voluntariamente. Na hipótese de ele se utilizar de formas de agir de império, extraemse os direitos do cidadão a prestações de direito privado dos institutos de responsabilidade civil do Estado. A abordagem permite alguns desdobramentos. A discricionariedade do legislador não pode ainda ser garantida quando se trata de deveres estatais decorA discricionariedade do legislador não pode ainda ser rentes de direitos infraconstitugarantida quando se trata de deveres estatais decorrentes cionais criados por ele mesmo de direitos infraconstitucionais criados por ele mesmo ou que decorram diretamente ou que decorram diretamente da Constituição. da Constituição. Por isso, é importante a ressalva de que o Estado, no sistema jurídico alemão, como “Fisco”, pode-se engajar em Na Constituição (art. 34 da CF)5 e no direito inrelações de direito privado como qualquer cidadão, fraconstitucional (§ 839 BGB), está disciplinado o ou seja, pode especificamente celebrar contratos. alcance da responsabilidade civil do Estado, que Se o Estado violar deveres em tais relações obricompreende os deveres de restituir e de comgacionais, então ele responde civilmente também pensar do Estado nos casos de atividade ilícita como qualquer pessoa conforme as regras de dido Poder Público. Acrescente-se a isso que outros reito comum. Como Fisco, o Estado surge especialinstitutos da responsabilidade civil do Estado surmente nos chamados “negócios jurídicos” (Hilfsgeschäften), para a obtenção de meios materiais para suas próprias finalidades, ou na administração de 5 N. do. T.: Art. 34. Quando alguém, no exercício de uma função pública que lhe fora confiada, violar os seu próprio patrimônio. deveres que a função lhe impõe em relação a um terCom a mesma consequência, o Estado pode ceiro, a responsabilidade recai, em princípio, sobre o decidir por negócios de direito privado livreEstado ou entidade pública a cujo serviço está comemente, se se tratar do cumprimento de funções tido. No caso de dolo ou culpa grave, abre-se a via administrativas públicas, como no âmbito dos da ação regressiva. Para a pretensão indenizatória e “serviços públicos”. Assim, fala-se de um “direito para a ação de regresso não se deve excluir a via da privado administrativo”. jurisdição ordinária. série Cadernos do CEJ giram na jurisprudência. Também atos de império conformes ao direito podem desencadear o direito à indenização contra o Estado, como no caso de desapropriação. Créditos oriundos dessas situações de responsabilidade do Estado ou de direito indenizatório devem ser cumpridos sem maiores indagações. E não podem ser recusados em virtude de uma precedência do legislador orçamentário ou mesmo apenas postergados. Que aqui ocorre uma ruptura com o Princípio da Separação dos Poderes, é difícil negar, pois o Judiciário decide, afinal, sobre competências do Legislativo. Não se verifica, no entanto, uma situação inconstitucional, pois, na ordem constitucional alemã, a Separação dos Poderes não é percebida como um absoluto isolamento dos Poderes estatais, nem se determina que seja assim. Além disso, encontram-se institutos específicos da responsabilidade civil do Estado – também com fundamento na Constituição, nomeadamente a responsabilidade estatal – no art. 34 CF, enquanto outros deveres de indenizar podem ser fundamentados pela Garantia da Propriedade (art. 14, inc. 1, da CF) 6. Ademais, poderia também o Princípio do Estado de Direito da Constituição (art. 20, inc. 3, da CF)7 exigir um dever de indenizar geral do Estado para atos ilícitos. O conflito na Alemanha entre os princípios da responsabilidade civil fundada na Constituição, de um lado, e a prerrogativa orçamentária do Parlamento, de outro, não deve ser, assim, resolvido de modo a se permitir ao legislador, por conta da referida prerrogativa, a retenção pelo Estado de recursos financeiros para prestações indenizatórias e compensatórias. A prerrogativa orçamentária deve, assim, ceder, desde e na medida em que permita impedir o cidadão o gozo de seus direitos a prestações contra o Estado fundados na Constituição. 6 N. do T.: Art. 14 (1) A propriedade e o direito de sucessão estão garantidos. O conteúdo e os limites serão determinados por lei. 7 N. do T. Art. 20. (3) A legislatura está vinculada à ordem constitucional e o Poder Executivo e o Judiciário estão vinculados à lei e ao direito. IV. Resumo A Reserva do Possível é, portanto, um meio efetivo de o legislador manter a necessária margem de manobra para a conformação política, mesmo diante de obrigações positivas constitucionalmente originárias. Isso decorre do mandamento de autolimitação judicial num sistema constitucional baseado na Separação dos Poderes e a sua aplicação não deve ter lugar, no entanto, onde não houver margem de discricionariedade a ser protegida de outros Poderes do Estado. A Reserva do Possível não deve servir especialmente para contornar pretensões dos cidadãos contra o Estado conferidas pelo direito infraconstitucional ou mesmo decorrentes direta e inexoravelmente da Constituição.” 21 22 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Leistungsansprüche gegen den Staat und der Vorbehalt des Möglichen in der rechtsprechung des Bundesverfassungsgerichts Interessen der Allgemeinheit zu berücksichtigen habe und nach ausdrücklichen Vorgaben der Verfassung (Art. 109 Abs. 2 GG) auch das gesamtwirtschaftliche Gleichgewicht wahren müsse, also sich nicht übermäßig verschulden dürfe. Im weiteren Text der Entscheidung wird das Gericht indessen deutlicher und stellt der Sache nach klar, dass es auf ein „Missverständnis von Freiheit“ hinauslaufe, wenn persönlicher Freiheit auf Dauer der Vorrang gegenüber der Funktionsfähigkeit und dem Gleichgewicht der Gesellschaft insgesamt gegeben werde. Es folgt als abschließendes Argument der Hinweis auf den Sozialstaatsgedanken, mit dem ein unbegrenztes subjektives Anspruchsdenken auf Kosten der Allgemeinheit unvereinbar sei. “ I. Grundlagen 1. Das numerus-clausus-Urteil In der Rechtsprechung des Bundesverfassungsgerichts findet sich der Vorbehalt des Möglichen zum ersten Mal im numerus-clausus-Urteil aus dem Jahr 1972. Dieser Beschränkung hat das Gericht damals Leistungsrechte der Bürger unterworfen, die sich unmittelbar aus der Verfassung ergeben, soweit diese Rechte nicht ohnehin nur auf die Teilhabe an dem begrenzt sind, das bereits vorhanden ist. Dabei soll der Vorbehalt des Möglichen Leistungsansprüche des Bürgers gegen den Staat auf das begrenzen, was der Einzelne vernünftigerweise von der Gesellschaft beanspruchen kann. Wie diese Grenzen im konkreten Fall zu bestimmen sind, überlässt das Gericht in erster Linie dem Gesetzgeber, der hierüber in eigener Verantwortung zu befinden hat. Interessant ist die eingehende Begründung des Gerichts für diese Anspruchsbegrenzung: Das Gericht verweist zunächst eher vordergründig darauf, dass der Gesetzgeber bei seinen Ausgaben auch andere 2. Tatsächlicher Hintergrund We r d i e s e a b s t r a k t e n A u s f ü h r u n g e n r i c h t i g e i n o rd n e n w i l l , m u s s s i c h d e n Fa l l v e rg e g e n w ä r t i g e n , ü b e r d e n d a s Bundesverfassungsgericht zu entscheiden hatte. Ende der sechziger Jahre des vorigen Jahrhunderts hatte sich in Deutschland die Zahl der Bewerber um Studienplätze an wissenschaftlichen Hochschulen sprunghaft erhöht. Da der Ausbau der Hochschulen mit dieser Entwicklung nicht Schritt halten konnte, stand für viele Fachrichtungen keine ausreichende Zahl von Studienplätzen zur Verfügung. Betroffen war insbesondere der Studiengang Humanmedizin. Die Hochschulen führten daher Zulassungsbeschränkungen ein, um die Zahl der Studenten zu begrenzen: den sogenannten numerus clausus. Das hatte zur Folge, dass 1970 zum Beispiel für das Medizinstudium 71 % der Bewerber abgewiesen wurden. Vergeben wurden die Studienplätze im Wesentlichen nach dem Leistungsprinzip, also nach den Abiturnoten, und nach den Wartezeiten auf einen Studienplatz. In dieser zunehmend als prekär empfundenen Situation stellte sich die Frage, welche série Cadernos do CEJ Anstrengungen vom Staat verlangt werden können, um möglichst allen Bewerbern den von ihnen gewünschten Studienplatz anbieten zu können. Immerhin gibt das Grundgesetz in Art. 12 Abs. 1 jedem Deutschen „das Recht, Beruf, Arbeitsplatz und Ausbildungsstätte frei zu wählen.“ 3. Grundrechtliche Teilhabe- und Leistungsrechte Hätte das Gericht dieses Grundrecht nur im überkommenen Sinne als Abwehrrecht gegen staatliche Eingriffe verstanden, wäre die Entscheidung leicht gefallen. und Schutzgehalten für den einzelnen Bürger zwangsläufig auch subjektive Rechte. Hierbei ist zwischen derivaten und originären Rechtspositionen zu unterscheiden: Unproblematisch sind derivate Teilhaberechte, die ein Recht auf Zugang zu ohnehin vom Staat angebotenen Leistungen und Einrichtungen geben. Im Einzelfall werden aber auch originäre Leistungsrechte anerkannt, für die der Staat die notwendigen Ressourcen erst noch bereitstellen muss. Im numerus clausus-Fall hat das Gericht einen originären Leistungsanspruch immerhin in Betracht gezogen, soweit eine absolute Beschränkung des Zugangs zu Universitäten dazu führt, dass einzelne Bewerber niemals den erstrebten Studiengang erreichen könnten. Das Budgetrecht ist danach eines der wesentlichen Instrumente der parlamentarischen Regierungskontrolle und diese Kontrolle ist wiederum prägend für eine rechtsstaatliche Demokratie. Der Staat wäre dann in erster Linie zu einem Unterlassen verpflichtet gewesen, während die abgewiesenen Bewerber hier gerade ein staatliches Tätigwerden verlangten, nämlich die Schaffung einer ausreichenden Zahl von Studienplätzen. Es ging ihnen nicht um die Abwehr eines staatlichen Eingriffs im Sinne einer negativen Verpflichtung, sondern um eine positive Handlungspflicht des Staates. Solche Handlungspflichten des Staates sind dem deutschen Verfassungsrecht allerdings nicht fremd; das Bundesverfassungsgericht entnimmt sie selbst denjenigen Grundrechten, die vorrangig auf die Abwehr staatlicher Eingriffe in die Freiheitssphäre der Bürger gerichtet sind. Dazu greift das Gericht auf die Überlegung zurück, dass die Grundrechte als objektive Normen auch eine Wertordnung statuieren; deshalb muss ihnen über die bloße Abwehrfunktion hinaus auch ein Leistungs- und Schutzgehalt beigelegt werden. Da die Grundrechte in der deutschen Verfassung unmittelbar geltendes Recht sind (Art. 1 Abs. 3 GG), folgen aus den Leistungs- Den damit denkbaren einklagbaren Individualanspruch des Bürgers auf Schaffung von Studienplätzen hat das Gericht aber letztlich verneint und zur Begründung dieser Ablehnung den Vorbehalt des Möglichen herangezogen. Dies zeigt, dass der Vorbehalt des Möglichen nicht erst die Vollstreckung eines Anspruchs ausschließt, sondern schon das Entstehen eines Anspruchs verhindert. 4. Bedeutung des Vorbehalts des Möglichen Hiernach soll die Begrenzung von Leistungen auf dasjenige, was der Einzelne vernünftigerweise von der Gesellschaft beanspruchen kann, nach Auffassung des Bundesverfassungsgerichts gerade bei originären Leistungsrechten besondere Bedeutung erhalten. Die Gründe hierfür liegen auf der Hand: Gerade einem freiheitlich geordneten Staat stehen finanzielle Mittel nur in begrenztem Umfang zur Verfügung, so dass bei dem Einsatz dieser Gelder immer auch Zielkonflikte mit anderen Vorhaben zu bewältigen sind. Die Lösung dieser Konflikte, also die Entscheidung über den Einsatz der begrenzten 23 24 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores finanziellen Ressourcen für bestimmte Zwecke ist in einem demokratischen, gewaltengeteilten Staat zuallererst Aufgabe und Zuständigkeit des Gesetzgebers, also des Parlaments. Im deutschen Grundgesetz findet diese Zuständigkeit des Gesetzgebers zunächst ihre Grundlage in dem allgemeinen Vorbehalt des Gesetzes. Er wird vor allem aus dem Demokratieprinzip hergeleitet und verpflichtet den Gesetzgeber, alle wesentlichen Entscheidungen des Staates selbst zu treffen und nicht der Exekutive zu überlassen. Diese Entscheidungskompetenz findet außerdem im Budgetrecht des Parlaments sichtbaren Ausdruck. Dieses Recht, also die Kompetenz zur Fe s t s t e l l u n g d e s H a u s h a l t s p l a n s , i n d e n alle Einnahmen und Ausgaben des Bundes einzustellen sind, weist Art. 110 GG ausschließlich dem Gesetzgeber zu. Das Budgetrecht hat danach also ohne Frage Verfassungsrang. Mit dem Budgetrecht erhält das Parlament im politischen Bereich weitreichende Gestaltungsu n d S t e u e r u n g s m a c h t . D e n n d u rc h d i e Zuweisung von Geldern wird massiver Einfluss auf jedes staatliche Tätigwerden ausgeübt, was sich auf die einfache Erkenntnis zurückführen lässt, dass Geld auch Macht ist. Daneben tritt, wie das Bundesverfassungsgericht in verschiedenen Entscheidungen betont hat, noch eine weitere Funktion, nämlich die Kontrolle der Exekutive durch Zuweisung finanzieller Mittel. Das Budgetrecht ist danach eines der wesentlichen Instrumente der parlamentarischen Regierungskontrolle und diese Kontrolle ist wiederum prägend für eine rechtsstaatliche Demokratie. Damit wird die Problematik deutlich; denn wird der Staat unmittelbar durch die Verfassung verpflichtet, seinen Bürgern Leistungen zu gewähren, die – wie im Regelfall – hohen finanziellen Aufwand erfordern, so sind die dafür notwendigen Gelder zwingend gebunden und können vom Parlament nicht für andere Zwecke oder Aufgaben genutzt werden. Der Spielraum des parlamentarischen G e s e t z g e b e r s w i rd a l s o e i n g e e n g t : D a weniger Mittel für die politische Gestaltung und Steuerung zur Verfügung stehen, gehen Optionen, Möglichkeiten, Chancen in diesem Bereich verloren; außerdem wird auch die parlamentarische Kontrolle der Exekutive in der Form der Zuweisung von Haushaltsmitteln verhindert. Mit anderen Worten: Das Parlament büßt von der Macht ein, die ihm die Verfassung zuweisen wollte. II. Der Vorbehalt Des Möglichen In Der Rechtsprechung Des Bundesverfassungsgerichts 1. Verwendung zum Leistungsausschluss und zur Leistungsbegrenzung In der Zeit nach dem numerus-claususUrteil hat der Vorbehalt des Möglichen in der Rechtsprechung des Bundesverfassungsgerichts vor allem für Sozialleistungen des Staates Bedeutung erlangt. So hat das Gericht in einer Entscheidung aus dem Jahre 1990 zur Kürzung des Kindergeldes für wohlhabende Eltern ausgeführt, dass auch finanzielle Leistungen des Staates zur Familienförderung unter dem Vorbehalt des Möglichen stehen. Den verfassungsrechtlichen Hintergrund dieser Entscheidung bildet Art. 6 Abs. 1 GG, wonach Ehe und Familie unter besonderem staatlichen Schutz stehen. Durch diesen Schutzauftrag sieht das Bundesverfassungsgericht den Staat verpflichtet, Familien durch geeignete Maßnahmen zu unterstützen. Diese Verpflichtung gilt jedoch nicht unbedingt, vielmehr setzt das Gericht hier den Vorbehalt des Möglichen ein, um klarzustellen, dass der Staat die Familie nicht ohne Rücksicht auf sonstige Interessen der Allgemeinheit fördern muss. Auf dieser Grundlage hat das Gericht dann sämtliche Leistungen des Staates für Kinder insgesamt in den Blick genommen und danach nicht feststellen können, dass die Familienförderung durch den Staat offensichtlich série Cadernos do CEJ unangemessen sei und dem Förderungsgebot des Art. 6 Abs. 1 GG nicht mehr genüge. Mit dieser Entscheidung wird also die offensichtliche Unangemessenheit einer verfassungsrechtlich geschuldeten Leistung als Kriterium eingeführt. Ist danach bei einer aus der Verfassung herzuleitenden Verpflichtung das, was der Staat tatsächlich leistet, offensichtlich nicht mehr angemessen, so kann auch der Vorbehalt des Möglichen diese Beschränkung nicht mehr rechtfertigen, die Grenze des Hinnehmbaren ist damit unterschritten. Selbstredend zeichnet sich auch dieses Kriterium durch beträchtliche, für das Verfassungsrecht aber nicht ungewöhnliche, Unbestimmtheit aus; trotzdem konturiert das Kriterium den Vorbehalt des Möglichen deutlicher und macht diesen für die Rechtsprechung praktikabler. Zwei Jahre später – also 1992 – nimmt das Gericht diese Argumentation in einer wichtigen Entscheidung wieder auf. Es ging um die Frage, ob Zeiten der Kindererziehung bei der Berechnung von Altersrenten berücksichtigt werden müssen, also zu einem höheren Ruhegeld führen, obwohl mangels beruflicher Tätigkeit keine Beiträge zur Sozialversicherung geleistet wurden. Auch hier betont das Gericht den Vorbehalt des Möglichen für finanzielle Leistungen im Rahmen staatlicher Familienförderung; außerdem wiederholt es, dass das verfassungsrechtliche Fördergebot aus Art. 6 Abs. 1 GG dann verletzt ist, wenn die staatlichen Leistungen offensichtlich unangemessen sind. Allerdings hält das Gericht den Vorbehalt allein wohl für zu schwach, um die Begehrlichkeiten von Eltern nach finanzieller Unterstützung für die Kosten ihrer Kinder in Grenzen zu halten; denn das Gericht argumentiert zusätzlich auch mit judicial self-restraint: Bei der Verwirklichung eines wirksamen Familienlastenausgleichs bestehe grundsätzlich Gestaltungsfreiheit des Gesetzgebers, so dass sich konkrete Ansprüche aus diesem Verfassungsgebot nicht herleiten ließen. Auch bei einer Entscheidung aus dem Jahr 1998 ging es um staatliche Leistungen zur Familienförderung, also um Unterstützung bei den Aufwendungen für Kinder. Zu prüfen war, ob die Gebühren, die für die Betreuung in Kindergärten zu zahlen sind, nach dem Familieneinkommen gestaffelt werden können. L etztlich ging es darum, ob der Staat wohlhabenden Eltern eine Subventionierung der Kindergartengebühren verweigern darf, die er ärmeren Familien gewährt. Im Vordergrund der Entscheidung stand deshalb der Gleichbehandlungsgrundsatz (Art. 3 Abs. 1 GG). Das Gericht hat aber auch geprüft, ob die staatliche Förderpflicht aus Art. 6 Abs. 1 GG zugunsten von Familien beachtet wurde. Hierzu betont das Bundesverfassungsgericht, dass diese Schutzpflicht den Staat nicht daran hindere, bei Unterstützung von Familien nach deren finanzieller Bedürftigkeit zu differenzieren. Der Staat müsse zudem nicht schlechthin jede Belastung der Familie ausgleichen und die Familie ohne Rücksicht auf andere öffentliche Belange fördern. Zur Begründung dieser deutlichen Grenzziehung stützt sich das Bundesverfassungsgericht dann auf den Vorbehalt des Möglichen. Während in den genannten Entscheidungen der Vorbehalt des Möglichen dazu diente, Schutzansprüche gegen den Staat völlig auszuschließen, hat das Gericht dieses Argument in einer aufsehenerregenden Entscheidung aus dem Jahr 2001 benutzt, um verfassungsrechtlich fundierte Leistungen auf ein vernünftiges Maß zu beschränken. Es ging um die Pflichtbeiträge zur sozialen Pflegeversicherung, aus der Leistungen für die Pflege insbesondere alter Menschen finanziert werden. Die Beschwerdeführer waren der Ansicht, dass sie bereits durch die Betreuung und Erziehung ihrer Kinder einen ausreichenden Beitrag zur Versorgung alter Menschen leisteten; denn diese Kinder würden in der Zukunft als Erwachsene die Finanzierung der älteren Generationen erwirtschaften müssen. Die von den Beschwerdeführern angestrebte vollständige Befreiung von Beitragsleistungen hat das Gericht auch am Vorbehalt des Möglichen scheitern lassen. 25 26 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Erneut findet sich das Argument, der Gesetzgeber habe im Interesse des Gemeinwohls neben der Familienförderung auch andere Gemeinschaftsbelange zu berücksichtigen. Nur unter Abwägung aller Belange lasse sich ermitteln, ob die Familienförderung durch den Staat offensichtlich unangemessen sei und dem Gebot der Familienförderung aus Art. 6 Abs. 1 GG nicht mehr genüge. Das Gericht betont wiederum, dass dem Staat hiermit ein Spielraum eröffnet sei. Dessen Grenzen seien nicht überschritten, wenn auch Familien – also Bürger mit Kindern – mit Beiträge zur sozialen Pflegeversicherung belastet würden. und erklärte die Regelung für unvereinbar mit der Verfassung. Hingegen hat das Gericht eine Missachtung des Schutzgebots zugunsten von Familien aus Art. 6 Abs. 1 GG verneint. Die staatliche Verpflichtung zur Familienförderung umfasse zwar auch eine Absicherung im Falle des gewaltsamen Todes eines Elternteils, der Staat müsse allerdings, so wird erneut klargestellt, nicht jegliche finanzielle Belastung ausgleichen. Die staatliche Familienförderung stehe eben unter dem Vorbehalt des Möglichen, so dass für den Staat ein weiter Spielraum für die Art und Weise der Verwirklichung des Familienlastenausgleichs verbleibe. Eine ausreichende Absicherung hält das Gericht insbesondere deshalb für gegeben, weil dem Kind selbst eine Waisenrente zustehe und der überlebende Elternteil daneben keine eigene Rente erhalten müsse. Allerdings hat das Gericht aus Art. 6 Abs. 1 GG in Verbindung mit dem Gleichheitssatz (Art. 3 Abs. 1 GG) die Verpflichtung hergeleitet, dass die Betreuung und Erziehung von Kindern bei der Bemessung der Beiträge zu berücksichtigt w e rd e n m ü s s e . Vo n d e n Familien werde nämlich durch Es ist Aufgabe des Gesetzgebers, die hiernach die Versorgung von Kindern zu erbringenden Leistungen an dem jeweiligen neben dem Geldbeitrag Entwicklungsstand der Gesellschaft und den zusätzlich ein „generativer bestehenden Lebensbedingungen auszurichten. Beitrag“ zur Funktionsfähigkeit des Sozialversicherungssystems geleistet. Dies führt im Ergebnis zu geringeren Beitragszahlungen im Vergleich zu Der Unterschied in der Begründung der kinderlosen Versicherten. Verfassungswidrigkeit – Gleichheitsverstoß anstelle von Leistungspflicht – darf nicht vernachlässigt Ein weiteres, bislang letztes Mal findet sich der werden. Da das Gesetz nur wegen eines Verstoßes Vorbehalt des Möglichen in einer Entscheidung gegen den Gleichbehandlungsgrundsatz des Ersten Senats des Bundesverfassungsgerichts verfassungswidrig ist, bleiben dem Gesetzgeber aus dem Jahr 2004. Der Beschluss betrifft das verschiedene Möglichkeiten für eine Opferentschädigungsgesetz, das die staatliche verfassungskonforme Neuregelung; denn er könnte Unterstützung für Opfer von Gewaltverbrechen die Ungleichbehandlung etwa auch dadurch regelt. Nach diesem Gesetz erhielten auch die beheben, dass er auch den Eltern ehelicher Kindern Witwen oder Witwer getöteter Verbrechensopfer keine Unterstützung mehr gewährt. staatliche Leistungen, falls sie ein gemeinsames Kind versorgten. Keine Unterstützung bekamen hingegen Mütter und Väter nichtehelicher Kinder, selbst wenn sie nach dem gewaltsamen Tod des anderen Elternteils unter Verzicht auf eine Erwerbstätigkeit die Betreuung gemeinsamer Kinder übernahmen. Darin sah das Gericht einen Verstoß gegen den Gleichbehandlungsgrundsatz Hätte das Gericht hingegen den Vorbehalt des Möglichen nicht genutzt und eine Verletzung des Schutzgebotes aus Art. 6 Abs. 1 GG und damit auch eine Leistungspflicht des Staates angenommen, wäre dem Gesetzgeber nur die eine Möglichkeit geblieben, neben verwitweten Eltern auch Eltern nichtehelicher Kinder eine Rente zu zahlen. série Cadernos do CEJ 2. Verwendung als Metapher Auf den ersten Blick irritierend erscheint eine Entscheidung des Zweiten Senats des Bundesverfassungsgerichts, die den Vorbehalt des Möglichen in einem völlig anderen Zusammenhang erwähnt und ihm letztlich auch den Erfolg versagt. Gegenstand der Entscheidung war die unterschiedliche Besteuerung von Beamtenpensionen einerseits und Altersrenten aus der gesetzlichen Rentenversicherung andererseits. Hier berief sich die staatliche Seite auf besonders große praktische Schwierigkeiten bei Herbeiführung gleicher Ergebnisse in den beiden verschiedenen Systemen der Altersversorgung. Das Gericht hat dieses Argument nicht gelten lassen, weil die Verfassungsbindung des Gesetzgebers und die Forderung nach Ve r f a s s u n g s m ä ß i g ke i t d e s G e s e t z e s re c h t s nicht „unter einem generellen Vorbehalt des Möglichen“ stehen. Hier ging es also nicht darum, den Staat vor finanzieller Überlastung und einer Einengung von Gestaltungsspielräumen durch Verknappung von Haushaltsmitteln zu schützen, sondern um die Frage, welche Mühe und welcher Aufwand bei der Gesetzgebung verlangt und zugemutet werden dürfen. Der Zweite Senat hat den Vorbehalt des Möglichen hier also nicht zur sachgerechten Einschränkung originärer Leistungsansprüche gegen den Staat verwendet, sondern lediglich den Begriff als Metapher genutzt. III. Der Vorbehalt Des Möglichen Als Ausdruck Richterlicher Selbstbeschränkung 1. Herleitung Dieser kurze Überblick zeigt, dass das Gericht den Vorbehalt des Möglichen nutzt, um überzogenem Leistungsdenken der Bürger entgegenzutreten. Waren es in den 70iger Jahren des letzten Jahrhunderts vor allem Forderungen nach einem massiven Ausbau der Hochschulkapazitäten mit dem Ziel, jedem Bewerber den gewünschten Studienplatz zu verschaffen, so ging es in den letzten zwanzig Jahren eher darum, der verbreiteten Vorstellung zu begegnen, die Verfassung zwinge den Staat dazu, die Eltern schlechterdings von sämtlichen finanziellen Nachteilen aus der Betreuung und Erziehung von Kindern freistellen. Der extensive Ausbau der Hochschulen und noch mehr die Transferleistungen für eine vollständige Entlastung von Familien hätten Haushaltsmittel in einer Höhe gebunden, die Spielräume für andere Zwecke und damit für politische Gestaltung in direkter Verantwortung gegenüber dem Staatsvolk als Souverän empfindlich eingeschränkt hätten. Damit wird deutlich, dass der Vorbehalt des Möglichen eine spezielle Ausprägung des Grundsatzes richterlicher Selbstbeschränkung ist. Auf diesen Grundsatz bezieht sich das Gericht ja auch selbst in der bereits zitierten Entscheidung zur Berücksichtigung von Zeiten der Kindererziehung bei der Berechung von Altersrenten. Die Funktion des judical self-restraint hat das Bundesverfassungsgericht mit den Worten beschrieben, es gehe nicht um eine Verkürzung oder Abschwächung seiner eigenen Kompetenz als Verfassungsgericht, sondern es gehe um „den Verzicht ‚Politik zu treiben’, es darf also nicht in den von der Verfassung geschaffenen und begrenzten Raum freier politischer Ges taltung eingegriffen werden. Demgemäß bleibt für den Vorbehalt des Möglichen dort kein Raum, wo die Verfassung selbst dem Staat eine unbedingte und unabänderliche Leistungspflicht auferlegt. Hier gibt es von Anfang an keine Gestaltungsspielräume, die der Gesetzgeber für sich beanspruchen könnte und die Respekt durch richterliche Selbstbeschränkung erfordern würden. So hat das Gericht in seinem neueren U r t e i l ü b e r d i e Ve r f a s s u n g s w i d r i g k e i t 27 28 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores d e r Re g e l l e i s t u n g e n z u r S i c h e r u n g d e s Lebensunterhalts für Arbeitslose („Hartz IV“) den Vorbehalt des Möglichen nicht aufgegriffen. Nahe gelegen hätte dieser Vorbehalt schon wegen der hohen Zahl von 6,5 Millionen Leistungsbeziehern und der damit verbundenen immens hohen finanziellen Aufwendungen: Im Jahr 2010 sollen allein vom Bund 45 Milliarden Euro (also über 100 Milliarden Reais) ausgegeben worden sein. Warum fand der Vorbehalt des Möglichen hier trotzdem keine Erwähnung? In der genannten Entscheidung hat das Bundesverfassungsgericht ein Grundrecht auf Gewährleistung eines menschenwürdigen Existenzminimums aus der Garantie der Menschenwürde (Art. 1 Abs. 1 GG) in Verbindung mit dem Sozialstaatsprinzip (Art. 20 Abs. 1 GG) hergeleitet. Dieses Recht gibt einen originären L eistungsanspruch gegen den Staat. Der Einzelne kann diejenigen Mittel verlangen, die zur Aufrechterhaltung eines menschenwürdigen Daseins unbedingt erforderlich sind. Damit geht es um: die Aufwendungen für die physische Existenz, also Nahrung, Kleidung, Hausrat, Unterkunft, Heizung, Hygiene und Gesundheit, aber zusätzlich auch um die Au f w e n d u n g e n f ü r z w i s c h e n m e n s c h l i c h e Kontakte und für ein Mindestmaß an Teilhabe am gesellschaftlichen, kulturellen und politischen Leben. Das deutsche Grundgesetz erklärt in Art. 1 Abs. 1 GG die Würde des Menschen für unantastbar, legt der Menschenwürde also absolute Bedeutung bei und verbietet mithin jede Beeinträchtigung. Soweit die Garantie der Menschenwürde unmittelbar berührt ist, kann also von Vornherein kein Spielraum des Gesetzgebers bestehen; die Menschenwürde ist ohne jede Relativierung zu wahren, eine Abwägung mit anderen, noch so gewichtigen Verfassungsgütern findet nicht statt. Allerdings konnte das Gericht originäre L eistungsansprüche auf Sicherung eines menschenwürdigen Existenzminimums nicht allein der Garantie der Menschenwürde entnehmen, vielmehr bedurfte es zusätzlich der Heranziehung des Sozialstaatsgebots. Hieraus ergibt sich eine gewisse Abschwächung, die indes an dem Leistungsanspruch als solchem nichts zu ändern vermag; das Gericht bezeichnet ihn ausdrücklich als „dem Grunde nach unverfügbar“. Dem Gesetzgeber bleibt nur ein sehr enger Gestaltungsspielraum, der allein der Relativität eines menschenwürdigen Existenzminimums geschuldet ist: dieses erforderte in einem schwer kriegszerstörten Land – wie in Deutschland bei Inkrafttreten des Grundgesetzes im Jahr 1949 – geringere Aufwendungen als in einem gegenwärtig eher wohlhabenden Land. Es ist Aufgabe des Gesetzgebers, die hiernach zu erbringenden Leistungen an dem jeweiligen Entwicklungsstand der Gesellschaft und den bestehenden Lebensbedingungen auszurichten. Dieser begrenzte Spielraum des Gesetzgebers hat nichts mit politischer Gestaltungsmacht zu tun, die durch den Vorbehalt des Möglichen abzusichern wäre. Es geht nicht darum, Zielkonflikte nach politischen Maßstäben zu entscheiden. So könnte etwa nicht, um die Bürger von Steuerzahlungen zu entlasten, die Unterstützung der Erwerbslosen auf die Mittel zurückgenommen werden, die das bloße Überleben sichern. Es geht nur darum, die Konkretisierung einer zwangsläufigen Unbestimmtheit in die Hände der dafür verantwortlichen, demokratisch legitimierten staatlichen Institution zu legen. 2. Folgerungen Dieser Ansatz erlaubt weitere Folgerungen. Spielräume des Gesetzgebers müssen nämlich auch dort nicht gesichert werden, wo sich staatliche Verpflichtungen aus dem selbst geschaffenen Gesetzesrecht oder aber unmittelbar aus der Verfassung ergeben. Deshalb ist der Hinweis wichtig, dass der Staat im deutschen Rechtssystem als „Fiskus“ wie jeder Bürger zivilrechtliche Beziehungen eingehen, also insbesondere Verträge abschließen kann. Verletzt der Staat in solchen Privatrechtsverhältnissen schuldrechtliche Pflichten, so haftet er auch série Cadernos do CEJ nach den allgemeinen Regeln wie jedermann. Als Fiskus tritt der Staat insbesondere bei den sogenannten Hilfsgeschäften zur Beschaffung von Sachmitteln für seine eigenen Zwecke oder bei der Verwaltung seines eigenen Vermögens auf. Mit den gleichen Konsequenzen kann sich der Staat aber auch dann frei für privatrechtliches Handeln entscheiden, wenn es unmittelbar um die Wahrnehmung öffentlicher Verwaltungsfunktionen geht, so etwa im Bereich der „Daseinsvorsorge“. Dann wird von „Verwaltungsprivatrecht“ gesprochen. In beiden Konstellationen – also aus staatlichem Handeln im „Fiskalbereich“ oder im Bereich des Verwaltungsprivatrechts – können sich immer nur privatrechtliche Ansprüche für und gegen den Staat ergeben. Erfüllt der Staat hier seine Verpflichtungen nicht, so kann und muss er wie jeder Private vor den Zivilgerichten verklagt werden. Geringe Sonderrechte für den Staat gibt es nur im Bereich der Zwangsvollstreckung und auch dort nur, soweit es um die Durchsetzung von Geldforderungen geht. und Kom pensationspflichten Staates b ei rechtswidriger Ausübung öffentlicher Gewalt umfasst. Hinzu kommen weitere Institute des Staatshaftungsrechts, die richterrechtlich entstanden sind. Auch rechtmäßiges hoheitliches Handeln kann Entschädigungsansprüche gegen den Staat auslösen, so insbesondere im fall einer Enteignung. Forderungen auf diesen Grundlagen des Staatshaftungs- oder Entschädigungsrechts sind vom Staat ohne Weiteres zu erfüllen und können nicht mit Rücksicht auf einen Vorrang des Haushaltsgesetzgebers abgewiesen oder auch nur zurückgestellt werden. D a s s h i e r i n e i n e D u rc h b re c h u n g d e s Grundsatzes der Gewaltenteilung liegt, lässt sich schwerlich leugnen, denn letztlich entscheidet die Judikative über Befugnisse der Legislative. Ein verfassungswidriger Zustand wird gleichwohl nicht geschaffen, denn in der deutschen Verfassungsordnung ist die Gewaltenteilung als absolute Trennung staatlicher Gewalten nicht realisiert und auch nicht geboten. Im Übrigen finden sich für einzelne Institute Spielräume des Gesetzgebers müssen nämlich auch dort der Staatshaftung auch nicht gesichert werden, wo sich staatliche Verpflichtungen Anknüpfungspunkte in der Ve r f a s s u n g , n a m e n t l i c h aus dem selbst geschaffenen Gesetzesrecht oder aber für die Amtshaftung in unmittelbar aus der Verfassung ergeben. Art. 34 GG, während für Entschädigungspflichten Das sogenannte F iskusprivileg (§ 882a auf die Eigentumsgarantie (Art. 14 Abs. 1 GG) ZPO) erlaubt eine Zwangsvollstreckung nur zurückgegriffen werden kann. Außerdem könnte nach vorheriger Ankündigung und Ablauf auch das Rechtsstaatsprinzip der Verfassung (Art. einer vierwöchigen Wartefrist. Hierdurch 20 Abs. 3 GG) eine generelle Entschädigungspflicht soll der Staat lediglich Zeit und Gelegenheit des Staates für rechtswidriges Handeln erfordern. erhalten, die für eine freiwillige L eistung Der Konflikt zwischen den verfassungsrechtlich erforderlichen außerplanmäßigen Mittel zu fundierten Haftungsprinzipen einerseits und dem beschaffen. Soweit sich der Staat hoheitlicher Budgetrecht des Parlaments andererseits darf Handlungsformen bedient, können sich danach in Deutschland nicht so gelöst werden, zivilrechtliche Leistungsansprüche der Bürger dass es dem Gesetzgeber aufgrund seines aus den Instituten des Staatshaftungsrechts Budgetrechts möglich sein kann, den Staat durch herleiten. das Vorenthalten finanzieller Mittel letztlich doch In der Verfassung (Art. 34 GG) und im Gesetzesrecht (§ 839 BGB) geregelt ist hierbei der Bereich der Amtshaftung, der die Restitutions- vor Entschädigungs- oder Ausgleichsleistungen zu bewahren. Das Budgetrecht muss also zurücktreten, wenn und soweit es den Bürger 29 30 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores an der Realisierung seiner verfassungsrechtlich fundierten Leistungsrechte gegen den Staat zu hindern vermag. IV. Resümee Der Vorbehalt des Möglichen ist danach ein effektives Mittel, damit der Gesetzgeber trotz originärer verfassungsrechtlicher Leistungsansprüche die notwendigen Spielräume für politische Gestaltung behält. Er folgt damit aus dem Gebot richterlicher Selbstbeschränkung in einem gewaltengeteilten Verfassungssystem. Seine Anwendung hat aber dort zu unterbleiben, wo schützenswerte Spielräume zugunsten anderer Staatsgewalten nicht bestehen. I n s b e s o n d e re d a r f d e r Vo r b e h a l t d e s Möglichen nicht dazu dienen, gesetzesrechtlich oder sogar verfassungsrechtlich unmittelbar und unabänderlich vorgegebene Ansprüche der Bürger gegen den Staat zu unterlaufen. série Cadernos do CEJ Dia 17/06 Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler Ministro Ulrich Hebenstreit Desembargador Federal Tadaaqui Hirose Ministra Maria Tereza de Assis Moura Ministro João Otávio de Noronha Professor Dr. Alexander Bruns Ministro Teori Zavascki Ministro Benedito Gonçalves Professor Dr. Rolf Stürner Ministra Eliana Calmon Fundamentos do Processo Penal Alemão Trad. Dr. Márcio Flávio Mafra Leal Ministro Ulrich Hebenstreit Graduado em Direito em 1976. Membro da alta Administração da Justiça do Estado de Baden-Württemberg. Convocado pelo Ministério da Justiça do Estado em Stuttgart. Magistrado membro do Ministério Público junto ao Tribunal do Estado e no Supremo Tribunal do Estado. Ex-Procurador-Geral do Ministério Público. Nomeado em 1992 desembargador no Tribunal do Estado, onde esteve lotado na Turma de Crimes Financeiros. Ministro do Superior Tribunal de Justiça desde 2000 e integrante do 1º Senado Criminal. “ É com grande satisfação que hoje estou aqui para falar aos senhores. Isso para mim é uma grande honra. Antes de tudo, algumas palavras sobre a minha pessoa: eu sou juiz na Alemanha junto ao Superior Tribunal de Justiça, em Karlsruhe – desde o ano 2000. Karlsruhe fica no sul da Alemanha. Antes eu era presidente da Câmara de Crimes Econômicos no Tribunal do Estado em Stuttgart. Essa cidade no sul da Alemanha é bem conhecida. Ela fica cerca de 80 km de Karlsruhe. São conhecidos sobretudo alguns produtos de lá. Stuttgart é a casa da Daimler (Mercedes), Porsche e Bosch.Vamos então ao tema: fundamentos do processo penal alemão1. Primeiro, algumas noções gerais. Existem três diferentes tipos ideais de processo penal: o processo inquisitorial, o contraditório e o consensual. O processo penal inquisitorial é caracterizado pelo fato de que todas as informações necessárias para o processo decisório são reunidas de ofício por um órgão do Estado. Para esse fim, disponibilizam-se meios coercitivos para tal. No processo penal contraditório é tarefa das partes – à semelhança do processo civil – trazer e apre1 Parágrafos sem menção à lei são aqueles do Código de Processo Penal. série Cadernos do CEJ sentar as informações para o processo decisório. Encontram-se como partes o acusador estatal ou privado, de um lado, e o réu ou o acusado, de outro. Em vista desse material apresentado pelas partes, o tribunal julga como um terceiro imparcial. No processo penal consensual o réu submetese a uma proposta de pena pela parte estatal. Trata-se frequentemente de um resultado negociado entre o Ministério Público e o réu, que pode abranger não só a pena, mas também a pronúncia de culpabilidade; o chamado “deal”. O processo penal alemão é basicamente inquisitorial. Ele é impregnado do Princípio da Investigação de Ofício. Nas últimas décadas desenvolveu-se na práxis judiciária penal também um proceder consensual em relação à dosimetria de pena. Isso foi e é intensamente controverso. Em 2009 incorporaram-se regras com esse fim na lei, no entanto isso não acalmou os ânimos. Volto-me agora para as fontes do direito do processo penal alemão: as fontes essenciais são o Código de Processo Penal (Strafprozessordnung - StPO) e a Lei Orgânica dos Tribunais (Gerichtsverfassungsgesetz - GVG). O CPP disciplina precipuamente o curso do processo de conhecimento penal. Ele incumbe o Poder Público à apuração de crimes. O direito processual penal é “direito constitucional condensado”; sua configuração e sua concretização na práxis da persecução penal são um sismógrafo para a Constituição 2. A Lei Orgânica dos Tribunais, por sua vez, disciplina especialmente a estrutura e a competência dos tribunais em matéria cível e penal, a competência e o preenchimento dos cargos nas respectivas varas e colegiados, bem como a organização do Ministério Público. Ambas as leis surgiram em 1877 e sofreram, ao longo dos anos, diversas reformas e aditamentos. Isso obviamente não resultou exatamente numa melhora na sua clareza. Um dos autores dos grandes Comentários do CPP disse nesse sentido: O direito processual penal “parece um sistema cheio de diferenças, pouco claro, com muitas modifi- cações pontuais e artesanais, pouco coerente, complexo e incompreensível” 3 . A eficácia do modelo processual subjacente ao, em princípio, inalterado CPP [isto é, um processo inquisitorial] está cada vez mais posta em questão4. Dessa opinião eu não compartilho. O sistema se desenvolveu e passou no teste do tempo. A justiça penal alemã é, comparando-a internacionalmente, definitivamente eficiente e rápida, apesar dos poucos recursos em alguns setores, como na persecução da criminalidade econômica. Uma fonte de direito basilar para o processo penal é, naturalmente nossa Constituição, a Lei Fundamental de 1949 com seus Direitos Fundamentais. Com isso se quer dizer também que: “O Poder Judiciário está confiado aos juízes” 5. Isso não foi, de forma alguma, evidente por muito tempo. Nos crimes tributários existia originalmente um processo de submissão 6. Quando o réu confessava o ilícito tributário sem reservas, ele podia, então, se submeter imediatamente por petição perante a Administração Fazendária a uma pena imposta. Essa sujeição se equiparava a uma condenação transitada em julgado. Precisou-se esperar até 1967 para que o Tribunal Constitucional Federal julgasse7 que penas criminais, conforme a Constituição, poderiam ser impostas apenas por juízes. Também em ilícitos de menor peso do ponto de vista penal e contravenções não podem ser apreciados em processos administrativos. A Constituição menciona também alguns direitos fundamentais relacionados à Justiça8: “perante um tribunal todos têm direito ao contraditório e devido processo legal.” “Um fato só pode ser punido, se tipificado antes de ele ter sido cometido” (nulla poena sine lege). “Ninguém deve ser punido mais de uma vez por causa do mesmo fato” (ne bis in idem). Garantias no caso de uma privação de li3 Kühne in Löwe-Rosenberg, StPO 26. Aufl. Einl. Abschn F, Rn. 190 4 Op. Cit. .Rn. 192 5 Art. 92 CF 6 § 445 Código Tributário do Império de 1919. 2 Kudlich, Strafverfolgung im Internet, GA 2011, 193, 194 7 BVerfGE 22, 49 8 Art. 103 CF 33 34 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores berdade, como na prisão preventiva, encontramse também na Constituição9. Grande importância se atribui ao Princípio da Proporcionalidade, que também tem status constitucional. Entre nós existe o ditado: “não se deve atirar em pardais com canhões”. Isso vale sobretudo em inquéritos criminais. O emprego de medidas coercitivas é indevida, se a intervenção no direito do atingido for desproporcional em comparação com a relevância do fato típico sob investigação e em atendimento ao grau da suspeita de autoria. Assim é determinado, por exemplo, na busca e apreensão para aqueles que guardam sigilo profissional a maior cautela. Portadores de segredo profissional são advogados, contadores, médicos, religiosos, deputados10. nei a insuficiência da estrutura nesse ramo), isso acontece infelizmente com frequencia. O Tribunal Europeu de Direitos Humanos dá grande peso, além disso, à garantia do chamado “direito de confrontação” 12 . Isso quer dizer que o réu deve, em algum momento do processo, ter a oportunidade de fazer perguntas diretamente ou por meio de seu defensor à testemunha que o acusa. O lugar adequado para isso é a audiência principal. Se a testemunha não comparecer lá pessoalmente ou fizer uso, diferentemente do que ocorreu no inquérito, do direito de recusar-se a testemunhar, a referida oportunidade deixa de existir. Se não se franqueou ainda durante o inquérito ao réu ou ao seu defensor nenhuma possibilidade de inquirição direta, o seu direito à confrontação foi violado. Isso A justiça penal alemã é, comparando-a internacionalmente, não leva, segundo a jurisprudefinitivamente eficiente e rápida, apesar dos poucos dência do STJ, à proibição de se avaliarem as declarações recursos em alguns setores, como na persecução da da testemunha, mas se atribui criminalidade econômica. a ela uma importância probatória menor. Exemplificando, Garantias semelhantes oferece a Convenção pode-se ilustrar com a seguinte situação: se muEuropeia de Direitos Humanos de novembro de lheres do leste europeu forem levadas à prosti1950, sobre cujo cumprimento vela o Tribunal tuição contra a sua vontade, as atividades a ela Europeu de Direitos Humanos em Estrasburgo relacionadas podem ser punidas como comérmesmo para a Alemanha. A Convenção prescrecio humano ou caracterizar outro fato típico. 11 ve, de maneira especial , que processos devem Na oitiva dessas mulheres pelo juiz no inquéser resolvidos em um prazo razoável. Esse prerito são os réus, em regra, excluídos, pois não ceito tem grande importância para o processo se pode contar com declarações peremptórias criminal. Nas violações por parte da autoridade por parte das testemunhas. Um defensor, que que preside o inquérito ou pelos tribunais contra teria o direito de estar presente na inquirição, essa determinação de celeridade, faz-se necessáfrequentemente não foi ainda constituído pelo ria uma compensação por esse gravame adicioréu nesse estágio inicial do processo. No mais nal criado para o réu. Essa compensação ocorre, das vezes, as testemunhas desaparecem antes conforme a jurisprudência do STJ, quando o trido início da audiência principal. Elas não pobunal processante considera uma parte da pena dem também ser coercitivamente detidas. Para como já cumprida. Uma parte da pena sentenciasuprir essa prova não existe nenhum outro meio da é quase abonada. Especialmente em longos disponível, assim, será difícil condenar o réu processos de crimes econômicos (eu já mencioapenas com a incriminação das testemunhas durante o inquérito. Por isso, nesses casos é imprescindível o quanto antes constituir um 9 Art. 104 CF defensor público para o réu, para que ele par10Cf. §§ 53, 97. 11Ar.t 6, frase 1, da Convenção de Direitos Humanos (CDH). 12Art. 6, inc. 2, letra “d” da CDH. série Cadernos do CEJ ticipe da inquirição e garanta o direito à confrontação. Assim, passo para o curso do processo criminal como um todo e depois para o processo de conhecimento. O processo penal em sentido amplo dividese em duas fases: processo de conhecimento e – após o trânsito em julgado da sentença – segue a execução da pena ou, ainda, uma medida de segurança e recuperação, como na custódia em casa de reabilitação ou em hospital psiquiátrico. O processo de conhecimento divide-se em três partes: o inquérito, a fase intermediária e o processo principal. Inicia-se com o inquérito 13. O seu objetivo é descobrir se existem contra o réu elementos de autoria suficientes do cometimento do crime – elementos suficientes para se propor uma denúncia. Essa suficiência é alcançada se, após a conclusão do inquérito, a suspeita possa resultar numa provável condenação. “Senhor” do inquérito é o Ministério Público, que o preside. Apenas ele pode decidir sobre a propositura da denúncia ou o arquivamento do procedimento. No inquérito se serve o MP amplamente de seus funcionários. Eles são, essencialmente, a polícia ou também auditores fazendários e inspetores alfandegários. A práxis não espelha mais esse modelo ideal. No âmbito da criminalidade de baixa e média lesividade, a polícia investiga hoje, no mais das vezes, independentemente e submete os autos ao Ministério Público, quando ela entende ter esclarecido suficientemente os fatos. O MP então examina se o processo será arquivado ou se propõe denúncia ou se, conforme o caso, se deve prosseguir na apuração. Na persecução criminal vige, na Alemanha, o Princípio Oficial. Isso significa que a pretensão punitiva do Estado será exercida por um órgão do Estado.14 Palavra-chave: senhor do inquérito é o MP. Mas quase toda regra tem sua exceção. Pois aqui também. Em casos de menor relevância pode o MP, em crimes de difamação, lesão corporal,15 entre outros, recusar a persecução e remeter a ou as vítimas à ação penal privada. A própria vítima pode então propor denúncia contra o causador do dano no tribunal competente. Além disso, vige no processo criminal, na Alemanha, o Princípio da Legalidade em oposição ao Princípio da Oportunidade. O Princípio da Legalidade preconiza que as autoridades persecutórias estão obrigadas a agir contra todos os crimes, desde que haja um ponto de partida fático suficiente para se configurar um crime, ou seja, se existe um início de suspeita16. Contrário ao Princípio, na Alemanha, a persecução de contravenções se baseia no Princípio da Oportunidade.17 Contravenções são violações legais de menor importância, cujo cometimento não acarreta nenhuma mácula criminal no agente. Exemplos são o estacionamento proibido, o excesso de velocidade no trânsito. Aqui se remete à discricionariedade regrada da autoridade administrativa competente, se ela deve intervir 18. As contravenções não são punidas com penas criminais, mas com multas. Entretanto, também na persecução de crimes existem hoje rupturas com o Princípio da Legalidade. Já antes dos anos 90 foram introduzidas normas no CPP, pelas quais a persecução de ilícitos podia ser dispensada por causa de sua diminuta lesividade ou culpa reduzida do agente. Isso pode ocorrer com o estabelecimento de um ônus19, em regra um dever de pagar, ou mesmo sem a fixação de tal ônus 20. Dessa possibilidade faz-se uso generosamente até no âmbito da lesividade média. Além disso, pode-se limitar o conteúdo do processo com cúmulo objetivo, ou seja, com muitos 15Cf. em detalhes § 374, inc. 1. 16§§ 152, inc. 2, 163, 165. 17N. do T.: Aqui empreguei termo “contravenções” – sem o qualificativo “penais”, ao invés de infrações administrativas, para indicar um termo genérico de ilícito não penal. 18§ 47 Lei das Contravenções. 13§§ 151 e segs. 19§ 153a. 14§ 152, inc. 1. 20§ 153. 35 36 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores fatos 21. No âmbito das fraudes em que há captação de poupança, trata-se com frequencia de centenas, milhares de casos individuais. Assim, pode ser conveniente, que casos com pequenos danos, algo abaixo de 5.000,-- € sejam excluídos da persecução. Atos do inquérito implicam amiúde profundas interferências no direito de outras pessoas, como na busca e apreensão, prisões, monitoramento de telecomunicações e muitos outros. Isso não deveria, em princípio, autorizar o MP ou a polícia, por autoridade própria, a emitir tais mandados. Eles carecem para isso de uma autorização do juiz do inquérito.22 O conceito histórico de juiz do inquérito é enganoso. O juiz do inquérito mesmo não investiga nada. Ele apenas examina pontualmente a admissibilidade de uma medida investigativa prevista e realiza alguns atos do inquérito somente a requerimento do MP, como a oitiva judicial de uma testemunha para assegurar a prestabilidade de suas declarações na audiência principal. Foi distribuída aos senhores uma lista dos casos nos quais se deve acionar o juiz para tanto. A eles eu faço referência. Nessa folha pode-se verificar em quais casos o MP ou a polícia podem agir provisoriamente em se tratando de perigo na demora ou iminente. Após a conclusão do inquérito, o MP decide – depois de ouvir o réu, subentende-se –, se o processo deve ser arquivado por falta de elementos suficientes de autoria e materialidade 23, ou, caso os elementos bastem, se se pode propor a denúncia 24 ou se deve o processo ser arquivado por conta de culpa diminuta ou por bagatela 25. No arquivamento do processo por causa – na visão do MP – de falta de elementos, pode a vítima, com a ação de persecução forçada (Klageerzwingungsverfahren), 26 questionar esse arquivamento judicialmente. 21§§ 154, 154a. 22§ 162. 23§ 170, inc. 2. 24§ 170, inc. 1. 25§§ 153, 153a 26§§ 172 e segs. Se o MP oferecer denúncia, deve ele decidir a qual juízo será remetida sua petição inicial. Como os senhores podem verificar na folha constante do anexo – a respeito da tramitação nos diversos graus de jurisdição – existe para isso na Alemanha três possibilidades, o juiz monocrático junto ao Juizado Especial, o Tribunal do Júri no Juizado Especial ou o Tribunal do Estado. Os senhores observam na folha ainda o Tribunal de Justiça (Oberlandesgericht) como 1ª instância em alguns casos. No TJ podem propor ação basicamente o Procurador-Geral lotado no STJ, especialmente em casos graves que envolvem a proteção do Estado, por exemplo, contra terroristas e espionagem. Há pouco adquiriu o Procurador-Geral a competência para presidir inquéritos por graves violações contra a lei de comércio exterior e de controle de armas de guerra Incluo aqui algumas observações sobre a estrutura judiciária e o curso das instâncias em matéria penal. Ambos estão consignados na folha referida. A estrutura judiciária desenvolvida historicamente na Alemanha irrita um pouco os que estão de fora. Os graus de jurisdição são quatro. O juízo mais baixo é o Juizado Especial (Amtsgericht), acima está o Tribunal do Estado (Landgericht), e o Tribunal de Justiça e, por fim, o Superior Tribunal de Justiça. Isso não significa obviamente que o processo penal tenha de seguir esses quatro degraus. Na realidade nós temos – como se verifica nessa folha – às vezes três, outras vezes duas instâncias. Na criminalidade de baixa lesividade, a denúncia vai para o juiz monocrático no Juizado Especial (Amtsgericht), na de média lesividade para o Tribunal do Júri no Juizado Especial. No Tribunal do Júri decidem um juiz togado e dois juízes honorários, os chamados “jurados”. Contra as decisões do Juizado Especial é dado o recurso da apelação. Com ele se abre uma outra instância de fato junto à pequena Câmara Criminal (também um juiz togado e dois jurados) do Tribunal do Estado (Landgericht). Contra as sentenças do Tribunal do Estado pode-se interpor um Recurso Especial para o Tribunal de Justiça. Nos crimes graves abre-se apenas uma instância de fato, mas perante a Grande Câmara Crimi- série Cadernos do CEJ nal do Tribunal do Estado, com dois ou três juízes rejeição pode o MP agravar no prazo.30 Se o jutogados e dois jurados. É discutível se essa estruízo se considerar incompetente, vigoram regras tura corresponde à última flor da sapiência. Eu especiais para a remessa a outro tribunal. 31 Obviamente o réu é ouvido em tudo isso. chego cada vez mais à conclusão de que, também A fase intermediária é frequentemente desprenesses casos, deve-se possibilitar a submissão a zada pelos tribunais, que poderia favorecer o réu uma instância de apelação com questões de fato diante de denúncias injustificadas. O exame dos – talvez limitada a determinados pontos em que elementos suficientes de autoria e materialidade haja prejuízo. Até agora existe contra acórdãos é feito, não raramente, de maneira muito superfida Grande Câmara Criminal do Tribunal do Escial. Entretanto, deve-se enfatizar que a Promototado – como também do Senado do Tribunal de ria não oferece denúncias temerárias. A rejeição Justiça – apenas o recurso especial para o STJ. da denúncia e da abertura do processo ocorre, Por que o curso da instância em ações penais de todo modo, raramente na práxis judicial. no Juizado Especial termina no Tribunal de JusO núcleo do processo principal é a audiência tiça e não no STJ, questiona-se sobre a garantia de uma uniformização da jurisprudência. Garante-se a unidade pela seguinte regra: se um TJ, em uma Na persecução criminal vige, na Alemanha, o questão de direito, pretender diverPrincípio Oficial. Isso significa que a pretensão gir do acórdão de um outro TJ ou do punitiva do Estado será exercida por um órgão do STJ, deverá, desse modo, submeter Estado. a matéria ao STJ para decidir 27. O STJ decide nesse caso somente sobre a questão de direito posta, mas não sobre o recurso especial como um todo, que é reprincipal. Ela tem lugar perante o chamado “juiz tomado depois pelo próprio Tribunal de Justiça. natural”. Isso quer dizer que a competência das Após essa excursão na estrutura judiciária e varas, como uma câmara criminal e o preenchino percurso das instâncias, vamos voltar para o mento de seus cargos não pode ser estabelecido curso do processo de conhecimento. de forma guiada ou arbitrária para um determiDepois da propositura da denúncia segue-se nado processo. Deve-se, antes de tudo, deter28 a chamada “fase intermediária” . Nela o tribuminar com regras abstratas qual juiz ou qual conal examina, com apoio nos autos – lembrando legiado, bem como sua composição, processará que o juízo pode também determinar a compleuma denúncia. Isso é disciplinado por um plano mentação do inquérito –, se, a seu alvitre, exisanual de distribuição estabelecido no início do tem elementos suficientes de suspeita de autoria ano pela presidência de cada tribunal. Além dise materialidade, ou seja, se, conforme o estado so, há, nos órgãos colegiados, um plano interno dos autos, há a probabilidade de uma condenade distribuição de feitos. ção. Se o tribunal responder afirmativamente a Para a audiência principal vige o Princípio do essa potencialidade de condenação, inauguraInquérito de Ofício. A passagem decisiva na lei se o processo principal e a denúncia é recebida com vistas à audiência principal.29 Do contrário, o juízo rejeita a abertura do processo. Contra essa 30§ 210, inc. 2. 27§ 132 da Lei Orgânica dos Tribunais. 28§§ 199 segs. 29§ 207. 31(Pelo tradutor) § 209. Se o juízo, no qual foi proposta a denúncia, considerar um juízo de hierarquia inferior como competente, inicia-se então o processo principal neste. Se o juízo considerar um juízo superior como competente, submete-se a questão ao de maior hierarquia para decidir sobre a avocação do processo. 37 38 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores prescreve: “o tribunal deve estender, na busca da verdade, a produção de provas de ofício a respeito de todos os fatos e meios de prova que forem relevantes para a decisão”32. Para a audiência principal vigoram, além disso, os Princípios da Oralidade 33, da Publicidade34 e da Identidade Física do Juiz35. Só se pode apreciar na sentença o que foi antes discutido oralmente na – em princípio pública36 – audiência principal, na presença contínua do réu e seu defensor e do Ministério Público. O Tribunal deve realizar a tomada de provas e servir-se diretamente dos meios de prova existentes. Testemunhas devem ser ouvidas na audiência principal. Só em casos excepcionais deve-se recorrer a oitivas realizadas anteriormente, como quando a testemunha estiver nesse ínterim inalcançável. Um perito deve expor seu laudo oralmente. Ele não pode recorrer ao seu laudo escrito. Documentos devem ser lidos na audiência. As demais partes do processo podem, pelo exercício de seu direito de requerer a produção de provas 37, influenciar decisivamente no curso e no conteúdo da tomada de provas. Deve-se mencionar, ainda, que o aspecto da proteção da vítima ganhou crescente importância. Sob esse ponto de vista, a jurisprudência admitiu, após um exercício de ponderação, afastar o Princípio da Identidade Física do Juiz na tomada de provas, em determinados casos especiais. Assim, conforme as possibilidades, crianças abusadas sexualmente devem ser poupadas de oitivas seguidas. Se a criança durante o inquérito for ouvida – especialmente por um juiz – essa inquirição é hoje normalmente filmada em vídeo. A essa filmagem se pode recorrer na audiência 32§ 244, inc. 2. 33§§ 261, 249. 34§ 169 da Lei Orgânica dos Tribunais. 35§§ 261, 226. principal, a fim de preservar a criança de uma confrontação com o seu algoz. Um processo penal também pode ser arquivado ainda na audiência principal por bagatela ou por culpa reduzida sem ou com algum ônus para o réu. Senão, vale o preceito legal 38: “A audiência principal se encerra com o pronunciamento da sentença após a sessão.” A sentença contém em regra uma condenação ou uma absolvição. Caso somente na audiência principal se constate que um impedimento processual não pode ser afastado, arquiva-se o processo por sentença.39 Esse é o caso, por exemplo, da prescrição. Em conclusão, devo ainda tratar dos novos preceitos legais muito controversos a respeito de acordos sobre o desfecho do processo 40. Tratase normalmente de um processo difícil, com um réu que fica calado ou questionando tudo, nos quais se acena com a necessidade de uma longa produção de provas. Em tais casos, a práxis judicial celebrava, já há décadas, acordos sobre a diminuição da pena na hipótese de uma confissão. No mais das vezes, seguia-se, então, após a pronúncia da sentença a imediata renúncia ao recurso. O STJ estabeleceu, por conseguinte, determinadas regras para esse fim. Em seguida, o legislador, em 2009, tentou institucionalizar essa prática em lei. Ele estabeleceu dessa forma: em qualquer fase do processo é possível discutir sobre a situação de fato e de direito e também sobre o provável desfecho para o réu. Na verdade, essa possibilidade é uma evidência e não demandaria nenhuma regra expressa para tanto. Se se averiguar nessas negociações a opção de um abreviamento do processo, o tribunal, então, antecipa a pena máxima para o caso de uma confissão do réu. Em outras palavras, deve-se estabelecer um marco de pena. A pena máxima é, assim, decisiva. Isso implica a concordância do réu e do Ministério Público. Se o réu na sequencia confessa, o tribunal está vinculado às suas afirmações. A renúncia ao recurso após a 36O público pode ser excluído em casos excepcionais, quando a esfera íntima do réu ou das testemunhas possa ser atingida. Os processos da infância e juventude correm em sigilo. 38§ 260, inc. 1. 37§ 244, inc. 3-5. 40§§ 257b e segs. 39§ 260, inc. 3. série Cadernos do CEJ pronúncia da sentença foi proibida nesses processos de acordos. Ao réu se deve sempre deixar aberta a possibilidade de refletir com maturidade sobre a interposição de um recurso nas semanas de prazo. Como sempre, muitos veem nesse processo de acordo uma contradição insolúvel em relação ao Princípio da Investigação de Ofício do nosso processo basicamente inquisitorial. Também o perigo de abusos é invocado. Alguns juízes sentem-se obrigados por meio do comportamento de alguns defensores a um acordo nos crimes com penas baixas, por intermédio de constantes pedidos de suspeição e inúmeros requerimentos de prova. Defensores alegam às vezes que, ao contrário, os tribunais forçam os réus à confissão com a ameaça de, caso contrário, impingir uma pena maior. A Advogada-Geral da União reivindicou, no último Congresso Alemão de Juristas, uma efetiva limitação da prática de acordos. Pessoalmente não vejo nenhum problema no processo de acordo feito de maneira regular. Abusos nunca podem ser totalmente excluídos. Por parte dos tribunais isso não é seguramente nenhum problema de relevo. Uma confissão não desonera o tribunal de examinar a sua correção, suprindo-a com a produção de provas, por exemplo pela oitiva de um funcionário que atuou no inquérito. Trata-se de mandamento decorrente do vigente Princípio da Investigação de Ofício41. O juiz togado conhece, de resto, os autos e pode, por isso, avaliar o conteúdo de verdade de uma confissão. O acordo deve-se relacionar apenas ao teto da pena, que deve permanecer razoável. A pronúncia de culpabilidade do réu deve continuar intocada. Se um furto ou um roubo ocorre, isso não é negociável. Mesmo após a requerida regra de medida de segurança e recuperação, como a internação em uma instituição de reabilitação ou em um hospital psiquiátrico, não devem ser objeto de acordo, não devem ser eliminadas da negociação. Tratase apenas do teto da pena, que, mesmo quando ele já, pela confissão naturalmente diminui, ainda tem de ser razoável. 41 § 257c, inc. 1, frase 2: “§ 244 inc. 2 permanece vigente.” O processo de acordo é – se utilizado regularmente – uma possibilidade sensata de abreviar processos difíceis, economizando recursos que podem ser aplicados na persecução criminal, e a garantia de uma persecução efetiva tem status constitucional. Isso é sempre enfatizado pelo Tribunal Constitucional Federal. 39 40 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores ANEXO Juizado Especial e juízes leigos (jurados) Criminalidade leve e média Ingressos: Eingänge: cerca ca. de 880.000 880.000 Verfahren processos p.a. p. a. Juiz togado Apelacao Ingressos: Eingänge: cerca ca.de 57.000 57.000 Verfahren processosp.a. p. a. Tribunal do Estado Pequena Câmara Criminal Revision Ingressos Ingressos: cerca cerca dede 6.000 6.000 p.processos a. p. a. Tribunal de Justiça Senado Criminal Criminalidade grave Tribunal do Estado Grande Câmara Criminal Ingresso: Eingänge: cercaca. de15.000 15.000Verfahren processosp.a. p. a. Recurso Especial Recurso Especial Tribunal de Justiça Senado Criminal como 1a. Instância Ingresso: cerca. 13 processos p.a. Ingresso: cerca de 3.300 processos p.a. Superior Tribunal de Justiça Senado Criminal Curso da Instância em Matéria Criminal série Cadernos do CEJ 41 42 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Controle Judicial dos Inquéritos Criminais na Alemanha Medidas em Inquéritos Criminais que estão sujeitas à reserva judicial zação judicial, ou, de qualquer modo se lhe atribui um valor probatório menor. Medidas sujeitas à reserva judicial em detalhe: Ulrich Hebenstreit Ministro do Superior Tribunal de Justiça (§§ do StPO – CPP-alemão, se não for mencionada outra lei) Tradução Dr. Márcio Flávio Mafra Leal Autorizações judiciais são necessárias, quando uma medida tocar direitos fundamentais das pessoas afetadas, como direito à liberdade, integridade física, propriedade, inviolabilidade de domicilio, postal, de correspondência e de telecomunicações, liberdade de imprensa, liberdade de profissão, autodeterminação de informação. § 51 Medidas contra as testemunhas contra as testemunhas ausentes perante o juiz na fase inquisitorial1 § 70 Medidas contra testemunhas por recusa imotivada de testemunhas ou prestar juramento (nas oitivas judiciais na fase de inquérito1 Competente é basicamente o magistrado atuante no juizado monocrático (Amtsgericht, § 162 StPO, semelhante ao juizado especial brasileiro), em matéria de proteção do Estado (§ 120 Lei Orgânica dos Tribunais) também o juiz ou ministro do inquérito junto ao Tribunal de Justiça ou do Superior Tribunal de Justiça. Outras competências judiciais estão anotadas nas notas de rodapé. § 81 Acomodação do acusado para preparação da perícia sobre o seu estado psíquico2 No “perigo na demora (ou iminente)“ é competente em geral para emitir a ordem o Ministério Público ou mesmo o investigador no inquérito (§ 152 GVG) - policiais. “Perigo na demora” é dado, quando não resta muito tempo para se obter uma decisão judicial sem comprometer o sucesso da investigação. Para se definir “perigo na demora” são estabelecidos, especialmente em atenção à jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal, requisitos bastante rigorosos. A contínua acessibilidade de um juiz é garantida através da Administração da Justiça. Se o “perigo na demora” foi admitido indevidamente, isso pode, consoante a jurisprudência, levar à proibição de apreciação das provas obtidas sem autori- § 81 a, c Exame corporal e de amostra de sangue3 § 81 e Exame de genética molecular3 § 81 g Exame de DNA para identificação3 § 81 h Teste de filamento genético3 § 87 Abs. 3 Exame cadavérico e exumação de cadáver4 § 94 Apreensão de objetos de prova3 § 98a Comparação automatizada e transmissão de dados pessoais (“varredura”)4 § 99 Interceptação de correspondência § 100 a Monitoramente de telecomunicações4 § 100 c Escuta de conversas privadas em residências (“grande operação de escuta”)5 § 100 f Escuta de conversas privadas ambiental ou fora de ambientes fechados (“pequena operação de escuta”)4 série Cadernos do CEJ § 100g levantamento de dados de tráfego das telecomunicações e de localização. 4 § 100 i Investigação de dados identificadores e de localização de aparelhos celulares4 § 100 i Abs. 6 Adiamento da informação sobre pessoas investigadas por medida que não era deste conhecida (por exemplo: monitoramento telefônico, emprego de um policial não-identificado, etc.) por mais de 12 meses (novo exame judicial da medida após informar o investigado: § 101 parágrafo 7 frase 2) § 102 Busca e revista em suspeitos3 § 103 Abs. 1 Satz 1 Busca e revista em outros3 § 103 Abs. 1 Satz 2 Busca e apreensão em todos os recintos de um prédio6 § 110 a Emprego de um investigador sob disfarce ou infiltrado (ainda sem suspeito concreto)7 § 110 b Abs. 2 Emprego de um investigador sob disfarce ou infiltrado contra uma pessoa determinada ou se essa dever entrar em um recinto estranho a sua casa8 § 111 § 126 a Abrigo temporário em hospital psiquiátrico ou em uma instituição de reabilitação.13 § 131 Abs. 3 Busca pública, busca pela televisão e outras mídias14 § 132 § 132 a Proibição temporária de exercício de profissão6 § 138 a Exclusão de um defensor15 § 161 a Medidas contra testemunhas e peritos ausentes perante o Ministério Público16 § 163 c Prorrogação de prisão temporária para fins de identificação17 § 163 d Varredura em rede (reunião de dados no controle de fronteira e postos de controle conforme art. 111)3 § 163 e Autorização para observação policial § 163 f Instalação de postos de controle (“blitz”) em ruas e praças3 § 111 b Apreensão de bens suscetíveis de perda ou recuperação10 §§ 112, 112 a, Mandado de prisão preventiva (ordem de prisão)11 § 119 Medidas executórias da prisão preventiva12 Monitoramento ou vigilância - contínuos – de longo prazo: acima de um mês 18 (até um mês, Ministério Público, até 24 horas, a polícia) § 73 SGB X (Código Social, 10. Livro – procedimento administrativo) Transmissão de dados sociais (p. ex. de seguro-saúde, seguridade social) para a realização de um processo criminal3 § 111 a Perda temporária da permissão de conduzir9 [§ 111 o Arresto de bens para assegurar a pena patrimonial4. (declarada inconstitucional) determinação de fiança para pessoas sem domicílio permanente no país3 1 Pode ser exarada apenas por juiz. 2 O juízo competente é o do início do processo principal. No perigo na demora ou iminente é possível o Ministério Público ou a polícia determinar a medida. 3 No perigo iminente é possível o MP determinar, mas não a polícia. 4 43 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores 44 Competente é a Seção Criminal do Tribunal do Estado, no perigo iminente pode o presidente da Seção determinar sozinho. 5 Só o juiz é competente. Também no perigo iminente nao há atribuição do MP ou da polícia 6 7 Pela polícia com concordância do MP. Pela polícia com concordância do juízo no perigo iminente com concordância do MP. 8 Apenas o juiz é competente. Também no perigo na demora não pode a ordem partir do MP ou da polícia. Na apreensao da carteira de habilitacao vige o § 94. 9 No perigo da demora também é possível a ordem pelo MP ou polícia. Em publicações periódicas é exclusivamente o juiz o competente, noutras publicações também o MP em caso de perigo eminente (§ 111 n). 10 Somente o juiz é competente. Mas se permite prisão temporária pelo MP e pela polícia (§ 127 Abs. 2) e, no caso de flagrante, qualquer pessoa (§ 127 Abs. 1) 11 O juiz é competente. Existe, no entanto, competência cautelar do MP, do diretor da casa prisional ou do agente penitenciário. 12 Somente o juiz é competente. Mas se permite para prisão temporária pelo MP e polícia (§ 127 Abs. 2). 13 Competente é o tribunal ou MP, no perigo iminente também a polícia. 14 O Senado do Tribunal de Justiça ou do STJ é competente. 15 Só o juiz poder ordenar prisão, outras medidas também o MP com direito do atingido exigir um exame judicial. 16 Apenas o juiz pode determinar isso (mesmo assim pelo máximo de 12 horas). 17 Acima de um mês deve o juiz determinar, até um mês o MP, e até 24 horas pode a polícia observar por própria conta. 18 série Cadernos do CEJ ich freue mich, dass ich heute zu Ihnen sprechen darf. Das ist für mich eine große Ehre. Vorab ein paar Worte zu meiner Person: Wie Sie wissen, bin ich in Deutschland Richter am Bundesgerichtshof in Karlsruhe - und zwar seit dem Jahr 2000. Karlsruhe liegt im Süden Deutschlands. Zuvor war ich Vorsitzender einer Wirtschaftsstrafkammer am L andgericht in Stuttgart. Diese Stadt im Süden Deutschlands dürfte Ihnen eher unbekannt sein. Sie liegt etwa 80 km entfernt von Karlsruhe. Bekannt sind aber einige Produkte von dort. Stuttgart ist die Heimat von Daimler (Mercedes), Porsche und Bosch. Nun aber zum Thema: Grundzüge des deutschen Strafprozesses1. Zunächst einige allgemeine Bemerkungen. I d e a l t y p i s c h w e rd e n d re i A r t e n d e s Strafverfahrens unterschieden, das inquisitorische Strafverfahren, das kontradiktorische Strafverfahren und das konsensuale Strafverfahren. Das inquisitorische Strafverfahren ist dadurch gekennzeichnet, dass alle zur Entscheidungsfindung notwendigen Informationen von Amts wegen von staatlichen Organen zusammengetragen werden. Dazu stehen auch Zwangsmittel zur Verfügung. Im kontradiktorischen Strafverfahren ist es – ähnlich wie im Zivilverfahren – Aufgabe der Parteien, die Informationen für die Entscheidungsfindung zusammenzutragen und zu präsentieren. Als Parteien stehen sich ein staatlicher oder privater Ankläger einerseits und der Beschuldigte beziehungsweise Angeklagte andererseits gegenüber. Aufgrund des von diesen vorgetragenen Verfahrensstoffes entscheidet das Gericht als unparteiischer Dritter. Im konsensualen Strafverfahren unterwirft sich der Angeklagte dem Strafangebot einer staatlichen Stelle. Dabei handelt es sich oft um ein zwischen der staatlichen Seite und der Seite des Beschuldigten ausgehandeltes Ergebnis, das nicht nur die Strafe sondern auch den Schuldspruch umfassen kann; der so genannte Deal. Der deutsche Strafprozess ist grundsätzlich inquisitorisch. Er ist beherrscht vom Amtsermittlungsgrundsatz. In den vergangenen Jahrzehnten entwickelte sich in der strafgerichtlichen Praxis bei der Bemessung der Strafe auch eine konsensuale Vorgehensweise. Dies war und ist heftig umstritten. Im Jahre 2009 wurden Regelungen dazu auch ins Gesetz aufgenommen. Dies hat die Gemüter allerdings nicht beruhigt. Dazu später mehr. Ich komme nun zu den Rechtsquellen des deutschen Strafverfahrens: D i e w e s e n t l i c h e n Re c h t s q u e l l e n s i n d die Strafprozessordnung (StPO) und das Gerichtsverfassungsgesetz (GVG). Die Strafprozessordnung regelt im Wesentlichen den Gang des strafrechtlichen Erkenntnisverfahrens. Sie bindet die öffentliche Gewalt bei der Ermittlung von Straftaten. Das Strafverfahrensrecht ist „geronnenes Verfassungsrecht“; seine Ausgestaltung und seine Umsetzung in der Strafverfolgungspraxis sind ein Seismograph für die Staatsverfassung2. Das Gerichtsverfassungsgesetz regelt insbesondere den Aufbau und die Zuständigkeit der Gerichte in Zivil- und in Strafsachen, die Zuständigkeit und die 1 Paragrafen ohne Nennung eines Gesetzes sind solche der Strafprozessordnung. 2 Kudlich, Strafverfolgung im Internet, GA 2011, 193, 194 Grundzüge Des Deutschen Strafprozesses “ 45 46 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Besetzung der einzelnen Spruchkörper sowie die Organisation der Staatsanwaltschaft. Beide Gesetze stammen aus dem Jahre 1877. Sie haben im Laufe der Jahrzehnte zahlreiche Änderungen und Ergänzungen erfahren. Dies hat die Übersichtlichkeit natürlich nicht gerade erhöht. Einer der Autoren des größten Kommentars zur StPO meint deshalb: Das Strafprozessrecht „erscheint als ein aufs Höchste ausdifferenziertes, wenig übersichtliches, weil durch zu viele Einzeländerungen patch-workartig nur noch mit Mühe kohärentes, kompliziertes und kaum noch verständliches Rechtssystem“ 3. Die Leistungsfähigkeit des der StPO im Grundsatz unverändert zugrunde liegende Prozessmodells [also das inquisitorische Verfahren] wird zunehmend fragwürdig“4. Diese Auffassung teile ich nicht. Das System hat sich über lange Zeit entwickelt und bewährt. Die deutsche Strafjustiz ist im internationalen Vergleich durchaus leistungsfähig und vergleichsweise schnell, trotz zu geringer Ressourcen in einigen Teilbereiche, wie etwa bei der Verfolgung von Wirtschaftstraftaten. Eine grundlegende Rechtsquelle für das Strafverfahren ist naturgemäß unsere Verfassung, das Grundgesetz aus dem Jahre 1949 mit seinen Grundrechten. Darin heißt es aber auch: „Die rechtsprechende Gewalt ist den Richtern anvertraut“5. Das war lange keineswegs selbstverständlich. In Steuerstrafsachen gab es ursprünglich noch ein Unterwerfungsverfahren6. Wenn der Beschuldigte das Steuervergehen vorbehaltlos einräumt hat, so konnte er sich der in einer Niederschrift bei der Finanzverwaltung festzusetzenden Strafe sofort unterwerfen. Die Unterwerfung stand einer rechtskräftigen Verurteilung gleich. Es dauerte immerhin bis zum Jahre 1967 bis das Bundesverfassungsgericht 3 Kühne in Löwe-Rosenberg, StPO 26. Aufl. Einl. Abschn F, Rn. 190 entschied 7 , dass Kriminalstrafen nach dem Grundgesetz nur durch Richter verhängt werden dürfen. Auch bei minder gewichtigen strafrechtlichen Unrechtstatbeständen geht dies nicht in einem Verwaltungsverfahren. Das Grundgesetz nennt auch einige Justizgrundrechte 8: „Vor Gericht hat jedermann Anspruch auf rechtliches Gehör.“ „Eine Tat kann nur bestraft werden, wenn die Strafbarkeit bestimmt war, bevor die Tat begangen wurde“ (nulla poena sine lege). „Niemand darf wegen derselben Tat aufgrund der allgemeinen Strafgesetze mehrmals bestraft werden“ (ne bis in idem). Auch Rechtsgarantien im Falle einer Freiheitsentziehung, etwa im Falle von Untersuchungshaft, finden sich im Grundgesetz9. Große Bedeutung kommt dem Grundsatz d e r Ve r h ä l t n i s m ä ß i g ke i t z u , d e m a u c h Verfassungsrang zukommt. Bei uns gibt es das Sprichwort: „Man darf nicht mit Kanonen auf Spatzen schießen“. Das gilt vor allem im strafrechtlichen Ermittlungsverfahren. Der Einsatz an sich gegebener Zwangsmaßnahmen ist unzulässig, wenn der damit für den Betroffenen verbundene Eingriff in seine Rechte im Vergleich mit der Bedeutung der Straftat, die im Raum steht, und im Hinblick auf den Grad des Tatverdachts unverhältnismäßig wäre. So ist etwa bei der Durchsuchung bei Berufsgeheimnisträgern größte Zurückhaltung geboten. Berufsgeheimnisträger sind z.B. Rechtsanwälte, Steuerberater, Ärzte, Geistliche, Abgeordnete10. Ähnliche Rechtsgarantien bietet die Europäische Konvention zum Schutze der Menschenrechte und Grundfreiheiten (Menschenrechtskonvention – MRK –) vom 4. November 1950, über deren Einhaltung auch für Deutschland der Europäische Gerichtshof für Menschenrechte in Straßburg wacht. Die MRK schreibt insbesondre auch vor 11, dass Verfahren 7 BVerfGE 22, 49 8 Art. 103 Grundgesetz 4 aaO.Rn 192 9 Art. 104 Grundgesetz 5 Art. 92 Grundgesetz 10Vgl. §§ 53, 97 6 § 445 Reichsabgabenordnung von 1919 11Art 6 Satz 1 MRK série Cadernos do CEJ in einer angemessenen Frist verhandelt werden oder aufgrund anderer Tatbestände strafbar müssen. Dieser Bestimmung kommt gerade in sein. Bei der Vernehmung der Frauen durch Strafverfahren eine große Bedeutung zu. Bei einen Richter im Ermittlungsverfahren wird der Verstößen gegen dieses Beschleunigungsgebot Beschuldigte in der Regel ausgeschlossen, da durch Ermittlungsbehörden oder Gerichte, sonst nicht mit offenen Angaben der Zeuginnen m u s s d i e d a d u rch f ü r d en A n g e k l a g t e n zu rechnen ist. Einen Verteidiger, der ein Recht entstandene zusätzliche Belastung ausgeglichen hätte, bei der Vernehmung dabei zu sein, hat - kompensiert - werden. Dies geschieht nach der Beschuldigte in diesem frühen Stadium der Rechtsprechung des Bundesgerichtshofs des Verfahrens häufig noch nicht beauftragt. dadurch, dass das verurteilende Gericht Meist verschwinden die Zeuginnen vor Beginn anordnet, dass ein Teil der Strafe als vollstreckt der Hauptverhandlung. Sie können auch nicht gilt. Ein Teil der ausgesprochenen Strafe wird zwangsweise festgehalten werden. Stehen quasi erlassen. Insbesondere in langwierigen dann keine ergänzenden Beweismittel mehr zur Wirtschaftsstrafverfahren – ich erwähnte bereits Verfügung, dann wird es schwierig sein, den die unzureichende Ausstattung in diesem Bereich Angeklagten allein aufgrund der Angaben der - kommt dies leider nicht selten vor. Zeuginnen während des Ermittlungsverfahrens Großes Gewicht legt der Europäische zu verurteilen. Es ist deshalb in derartigen Fällen G e r i c h t s h o f f ü r M e n s c h e n re c h t e z u d e m unerlässlich, dem Beschuldigten frühzeitig einen auf die Gewährleistung des so genannten Pflichtverteidiger zu bestellen, der dann an der 12 Konfrontationsrechts . Das heißt der Angeklagte Vernehmung teilnimmt zur Gewährleistung des muss in irgendeinem Stadium des Verfahrens Konfrontationsrechts. Gelegenheit gehabt haben, den oder die Belastungszeugen selbst unmittelbar zu befragen Die deutsche Strafjustiz ist im internationalen Vergleich oder durch seinen Verteidiger durchaus leistungsfähig und vergleichsweise schnell, unmittelbar befragen zu lassen. trotz zu geringer Ressourcen in einigen Teilbereiche, Der passende Ort dazu ist an wie etwa bei der Verfolgung von Wirtschaftstraftaten. sich die Hauptverhandlung. Steht der Zeuge aber dort nicht mehr persönlich zur Verfügung oder macht er anders als während Damit komme ich zum Gang des des Ermittlungsverfahrens nunmehr von einem Strafverfahrens in seiner Gesamtheit und dann Zeugnisverweigerungsrecht Gebrauch, entfällt zum Erkenntnisverfahrens. diese Gelegenheit. Wurde dann auch während Das Strafverfahren im weiteren Sinne gliedert des Ermittlungsverfahrens dem Angeklagten sich in zwei Teile: In das Erkenntnisverfahren oder seinem Verteidiger keine Möglichkeit zur und – nach Eintritt der Rechtskraft eines Urteils – unmittelbaren Befragung, eröffnet, ist das Recht folgt die Vollstreckung der Strafe oder auch einer auf Konfrontation verletzt. Dies führt nach der Maßregel zur Sicherung und Besserung, etwa der Rechtsprechung des Bundesgerichtshof zwar nicht Unterbringung in eine Entziehungsanstalt oder in zu einem Verwertungsverbot, der Aussage des einem psychiatrischen Krankenhaus. Zeugen kommt aber geringere Beweisbedeutung Uns geht es heute um das Erkenntnisverfahren. zu. Als Beispiel sei folgende Situation geschildert: D i e s e s g l i e d e r t s i c h i n d re i Te i l e , d a s Werden Frauen aus Osteuropa gegen ihren Ermittlungsverfahren, das Zwischenverfahren Willen der Prostitution zugeführt können damit und das Hauptverfahren. verbundene Vorgänge als Menschenhandel Hierzu wurde Ihnen eine Übersicht ausgehändigt. 12 Art 6 Abs. 2 lit d MRK 47 48 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Am Anfang steht das Ermittlungsverfahren 13. Dessen Ziel ist es herauszufinden, ob der Beschuldigte der ihm zur Last gelegten Straftat hinreichend verdächtig ist - hinreichend verdächtig, um Anklage gegen ihn erheben zu können. Er ist dann in diesem Maße verdächtig, wenn nach Abschluss der Ermittlungen seine spätere Verurteilung als wahrscheinlich erscheint. „Herrin“ des Ermittlungsverfahrens ist die Staatsanwaltschaft. Sie leitet die Ermittlungen. Nur sie kann über die Anklageerhebung oder die Einstellung eines Verfahrens entscheiden. Zu den Ermittlungen bedient sich die Staatsanwaltschaft weitegehend ihrer Ermittlungsbeamten. Das sind im Wesentlichen die Beamten der Polizei oder auch der Steuerfahndung und der Zollfahndung. Die Praxis entspricht aber nicht mehr diesem Idealmodell. Im Bereich der kleineren und mittleren Kriminalität ermittelt die Polizei heute weitgehend selbständig und legt erst dann, wenn sie meint, den Sachverhalt ausreichend aufgeklärt zu haben, die Akten der Staatsanwaltschaft vor, die dann prüft ob das Verfahren eingestellt wird oder ob Anklage erhoben wird oder ob unter Umständen auch weiter ermittelt werden muss. Bei der Verfolgung von Straftaten gilt in Deutschland das Offizialprinzip. Das heißt der staatliche Strafanspruch wird durch staatliche Organe durchgesetzt. 14 Stichwort: Herrin des Ermittlungsverfahrens ist die Staatsanwaltschaft. Aber nahezu jede Regel kennt auch Ausnahmen. So auch hier. In Fällen von geringerer Bedeutung kann der Staatsanwalt bei den Tatbeständen der Beleidigung, der Körperverletzung u.a. 15 die Verfolgung ablehnen und die oder den Geschädigten auf den so genannten Privatklageweg verweisen. Das Tatopfer kann dann selbst eine Anklageschrift gegen den Schädiger beim zuständigen Gericht einreichen. Außerdem gilt bei der Verfolgung von Straftaten in Deutschland das Legalitätsprinzip im Gegensatz zum Opportunitätsprinzip. Das Legalitätsprinzip besagt, dass die Strafverfolgungsbehörden verpflichtet sind, gegen alle Straftaten einzuschreiten, sofern hinreichende tatsächliche Anhaltspunkte für eine Straftat vorliegen, wenn also ein Anfangsverdacht gegeben ist16. Im Gegensatz dazu liegt in Deutschland der Verfolgung von Ordnungswidrigkeiten das Opportunitätsprinzip zugrunde. Ordnungswidrigkeiten sind unbedeutendere Regelverstöße, bei deren Begehung dem T ä t e r ke i n k r i m i n e l l e r M a ke l a n h a f t e t . Beispiele sind etwa falsches Parken oder Geschwindigkeitsüberschreitungen im Straßenverkehr. Hier liegt es im pflichtgemäßen Ermessen der zuständigen Verwaltungsbehörde, o b s i e e i n s c h re i t e t 1 7 . G e a h n d e t w e rd e n Ordnungswidrigkeiten auch nicht mit Kriminalstrafen, sondern mit Geldbußen. Aber auch bei der Verfolgung von Straftaten gibt es inzwischen Durchbrechungen d e s L e g a l i t ä t s p r i n z i p s . B e re i t s v o r e t w a 90 Jahren wurden Bestimmungen in die Strafprozessordnung eingefügt, wonach von der Verfolgung von Vergehen wegen Geringfügigkeit beziehungsweise bei geringer Schuld des Täters abgesehen werden kann. Dies kann mit einer Auflage 18 , in der Regel eine Zahlungspflicht, geschehen oder auch ohne Auflage19. Sie sehen das auf der Übersicht unter „Einstellung gemäß §§ 153, 153a“. Von diesen Möglichkeiten wird heute relativ großzügig Gebrauch gemacht bis hinein in den Bereich der mittleren Kriminalität. Außerdem kann der Verfahrensstoff bei einer Vielzahl von Taten begrenzt werden 20. Bei Betrügereien im Bereich von eingeworbenen Geldanlagen handelt es sich oft um hunderte, ja tausende von Einzelfällen. Da kann es zweckmäßig sein, Fälle mit geringerem Schaden, etwa unter 5.000,-- € von der Verfolgung auszunehmen. 16§§ 152 Abs. 2, 163, 165 17§ 47 Ordnungswidrigkeitengesetz 13 §§ 151 ff 18§ 153a 14 § 152 Abs. 1 19§ 153 15vergleiche im Einzelnen § 374 Abs. 1 20§§ 154, 154a série Cadernos do CEJ Ermittlungshandlungen sind häufig mit gewichtigen Eingriffen in die Rechte anderer v e r b u n d e n , e t w a b e i D u rc h s u c h u n g e n , Ve r h a f t u n g e n , Überwachung der Te l e k o m m u n i k a t i o n u n d b e i v i e l e m mehr. Dies dürfen dann im Grundsatz d i e S t a a t s a n w a l t s c h a f t o d e r d i e Po l i z e i nicht aus eigener Machtvollkommenheit anordnen. Sie benötigen dazu die Erlaubnis des Ermittlungsrichters 21 . Der historische Begriff Ermittlungsrichter ist irreführend. Der Ermittlungsrichter ermittelt nämlich nicht selbst. Er prüft nur punktuell die Zulässigkeit einer vorgesehenen Ermittlungsmaßnahme. Einzelne Ermittlungshandlungen nimmt er nur auf Antrag der Staatsanwaltschaft vor, etwa die richterliche Vernehmung eines Zeugen, um die Verwertbarkeit der Aussage in der Hauptverhandlung zu sichern. Eine Liste der Fälle, in denen es der Einschaltung eines Richters bedarf, haben Sie erhalten. Darauf darf ich verweisen. Dem Blatt können Sie auch entnehmen, in welchen Fällen die Staatsanwaltschaft oder die Polizei bei Gefahr im Verzug vorläufig tätig werden dürfen. Nach Abschluss der Ermittlungen entscheidet der Staatsanwalt - nach Anhörung des Angeklagten, versteht sich -, ob das Verfahren mangels hinreichenden Tatverdachts eingestellt wird 22, oder, falls der Tatverdacht genügt, ob Anklage erhoben 23 oder das Verfahren wegen geringer Schuld beziehungsweise wegen Geringfügigkeit eingestellt wird 24 . Bei einer Einstellung des Verfahrens mangels – aus Sicht der Staatsanwaltschaft - genügendem Tatverdachts kann das ein Geschädigter mit dem Klageerzwingungsverfahren 25 gerichtlich überprüfen lassen. Erhebt der Staatsanwalt Anklage, so muss er entscheiden, zu welchem Gericht er die Anklageschrift sendet. Wie Sie auf einem 21§ 162 22§ 170 Abs. 2 23§ 170 Abs. 1 24 §§ 153, 153a 25 §§ 172 ff weiteren Blatt – zum Instanzenzug -, das Ihnen ausgehändigt wurde, entnehmen können, gibt es dazu in Deutschland drei Möglichkeiten, den Einzelrichter beim Amtsgericht, das Schöffengericht beim Amtsgericht oder das Landgericht. Sie sehen auf dem Blatt noch das Oberlandesgericht als 1. Instanz in wenigen Fällen. Zum Oberlandesgericht klagt im Grundsatz nur der Generalbundesanwalt beim Bundesgerichtshof an und zwar in Staatsschutzsachen von Gewicht, etwa gegen Terroristen oder bei Spionage. Seit Kurzem hat der Generalbundesanwalt auch die Ermittlungszuständigkeit bei schwerwiegenden Verstößen gegen das Außenwirtschafts- oder Kriegswaffenkontrollgesetz. Ich schiebe hier nun einige Anmerkungen zum Gerichtsaufbau und zum Instanzenzug in Strafsachen ein. Beides ist auf besagtem Blatt aufgezeichnet. Der historisch gewachsene Gerichtsaufbau in Deutschland irritiert Außenstehende zunächst etwas. Der Gerichtsaufbau ist vierstufig. Das unterste Gericht ist das Amtsgericht, darüber steht das Landgericht, dann das Oberlandesgericht und schließlich der Bundesgerichtshof. Das bedeutet natürlich nicht, dass Strafverfahren diese vier Stufen durchlaufen können. Vielmehr haben wir - wie Sie dem Blatt entnehmen können - teilweise drei Instanzen, teilweise nur zwei Instanzen. Bei der kleineren Kriminalität geht die Anklage zum Einzelrichter beim Amtsgericht, bei der mittleren Kriminalität zum Schöffengericht beim Amtsgericht. Beim Schöffengericht entscheidet ein Berufsrichter mit zwei ehrenamtlichen Richtern, den so genannten Schöffen. Gegen die Entscheidungen der Amtsgerichte ist das Rechtsmittel der Berufung gegeben. Damit wird eine weitere Tatsacheninstanz bei der kleinen Strafkammer (ebenfalls ein Berufsrichter und zwei Schöffen) des Landgerichts eröffnet. Gegen die Urteile des Landgerichts kann dann Revision zum Oberlandesgericht eingelegt werden. Bei schwerer Kriminalität wird demgegenüber nur eine Tatsacheninstanz eröffnet, dann aber vor der großen Strafkammer des Landgerichts mit zwei oder drei Berufsrichtern und zwei 49 50 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Schöffen.. Ob das letztlich der Weisheit letzter Schluss ist, darüber kann man streiten. Ich komme immer mehr zu dem Schluss, dass auch in diesen Fällen eine – vielleicht auf bestimmte Beschwerdepunkte beschränkte – tatsächliche Überprüfung in einer Berufungsinstanz möglich sein sollte. Bislang gibt es aber gegen die Urteile der großen Strafkammern beim Landgericht - wie auch der Senate des Oberlandesgerichts - nur das Rechtsmittel der Revision Über diese entscheidet dann der Bundesgerichtshof. Da der Instanzenzug bei einer Anklage zum Amtsgericht bei den Oberlandesgerichten endet, stellt sich die Frage nach der Gewährleistung einer einheitlichen Rechtsprechung. Diese wird durch folgende Regelung gesichert: Will eine Oberlandesgericht in einer Rechtsfrage v o n e i n e r E n t s c h e i d u n g e i n e s a n d e re n Oberlandesgerichts oder des Bundesgerichtshofs abweichen, dann muss es die Rechtsfrage dem Bundesgerichtshof zur Entscheidung vorlegen26. Der Bundesgerichtshof entscheidet dann aber nur über die Rechtsfrage, nicht über die Revision im Ganzen. Das macht dann später wieder das Oberlandesgericht. gegeben ist. Bejaht das Gericht diese Frage, dann eröffnet es das Hauptverfahren und lässt die Anklage zur Hauptverhandlung zu28. Andernfalls lehnt es die Eröffnung ab. Dagegen steht der Staatsanwaltschaft die befristete Beschwerde zu 29. Hält das Gericht seine Zuständigkeit nicht für gegeben, gibt es für die Übertragung auf ein anderes Gericht spezielle Regelungen.30 Natürlich wird der Angeklagte zu allem auch gehört. Dem Zwischenverfahren wird von den Gerichten häufig nicht die Bedeutung zugemessen, die ihm zum Schutz des Angeklagten vor unberechtigten Anklagen zukommen sollte. Die Prüfung des hinreichenden Tatverdachts erfolgt nicht selten zu oberflächlich. Allerdings muss dabei auch betont werden, dass die Staatsanwaltschaften nicht leichtfertig Anklage erheben. Eine Ablehnung der Eröffnung kommt daher in der gerichtlichen Praxis ohnehin nur selten in Betracht. Kernstück des Hauptverfahrens ist die Hauptverhandlung. Sie findet vor dem so genannten gesetzlichen Richter statt. Das heißt die Zuständigkeit einer Gerichtsabteilung, etwa einer Strafkammer und deren Besetzung darf nicht gezielt oder willkürlich für ein bestimmtes Verfahren festgesetzt werden. Vielmehr Bei der Verfolgung von Straftaten gilt in Deutschland das muss von vorneherein nach Offizialprinzip. Das heißt der staatliche Strafanspruch abstrakten Regeln bestimmt wird durch staatliche Organe durchgesetzt. sein, welcher Richter oder welcher Spruchkörper in welcher Besetzung über eine bei Gericht eigehende Nach diesem Ausflug in den Gerichtsaufbau Anklage zu entscheiden haben wird. Dies und in den Instanzenzug zurück zum Gang des Erkenntnisverfahrens. 28§ 207 Nach der Anklageerhebung folgt das so 29§ 210 Abs. 2 genannte Zwischenverfahren 27 . In ihm prüft 30§ 209 Hält das Gericht, bei dem angeklagt wurde, das Gericht anhand der Akten – das Gericht ein Gericht niederer Ordnung für zuständig, dann kann auch ergänzende Ermittlungen anordnen eröffnet es das Hauptverfahren bei diesem. Hält das – ob auch aus seiner Sicht hinreichender Gericht eine Gericht höherer Ordnung für zuständig, Tatverdacht besteht, ob also nach Aktenlage dann legt es die Sache dem höheren Gericht zur die Wahrscheinlichkeit einer Verurteilung Entscheidung über die Übernahmne des Verfahrens 26 § 132 Gerichtsverfassungsgesetz 27 §§ 199 ff vor.Hält das Gericht eine Gericht höherer Ordnung für zuständig, dann legt es die Sache dem höheren Gericht zur Entscheidung über die Übernahme des Verfahrens vor. série Cadernos do CEJ regeln die für jedes Jahr vor Jahresbeginn vom Präsidium des jeweiligen Gerichts beschlossenen Geschäftsverteilungspläne. Hinzu kommen bei Kollegialspruchkörpern internen Geschäftsverteilungspläne. Für die Hauptverhandlung gilt der Amtsermittlungsgrundsatz. Der entscheidende Passus im Gesetz lautet: „Das Gericht hat z u r E r f o r s c h u n g d e r Wa h r h e i t d i e d i e Beweisaufnahme von Amts wegen auf alle Tatsachen und Beweismittel zu erstrecken, die für die Entscheidung von Bedeutung sind“31. Für die Hauptverhandlung gelten weiter die Grundsätze der Mündlichkeit32, der Öffentlichkeit33 und der Unmittelbarkeit 34. Nur das darf in das Urteil einfließen, was zuvor in der – grundsätzlich öffentlichen 35 - Hauptverhandlung mündlich verhandelt wurde, in ständiger Anwesenheit des Angeklagten, seines Verteidigers und des Vertreters der Staatsanwaltschaft. Das Gericht muss die Beweisaufnahme selbst durchführen und auf die vorhandenen Beweismittel unmittelbar zugreifen. Ein Zeuge ist in der Hauptverhandlung zu vernehmen. Nur in Ausnahmefällen darf auf frühere Vernehmungen zurückgegriffen werden, etwa wenn der Zeuge inzwischen unerreichbar ist. Ein Sachverständiger muss sein Gutachten mündlich vortragen. Es kann nicht auf das schriftliche Gutachten zurückgegriffen werden. Urkunden sind zu verlesen. Die übrigen Verfahrensbeteiligten können durch Ausübung ihres Beweisantragrechts 36 auf den Ablauf und den Inhalt der Beweisaufnahme maßgeblich Einfluss nehmen. Erwähnt sei noch, dass der Gesichtspunkt des Opferschutzes zunehmend an Bedeutung 31§ 244 Abs. 2 32§§ 261, 249 33§ 169 Gerichtsverfassungsgesetz 34§§ 261, 226 gewonnen hat. Unter diesem Gesichtspunkt hat die Rechtsprechung in einer Abwägung auch zugelassen, den Grundsatz der Unmittelbarkeit in der Beweisaufnahme in bestimmten besonderen Fällen zurückzustellen. So sollen etwa ei n em sexu el l m i ssb r au c h ten K in d mehrfache Vernehmungen nach Möglichkeit erspart bleiben. Wenn das Kind während des Ermittlungsverfahrens – insbesondere richterlich - vernommen wird, wird die dies heutzutage regelmäßig auf Video aufgenommen. Darauf kann dann auch in der Hauptverhandlung zurückgegriffen werden, um dem Kind eine erneute Konfrontation mit dem Erlittenen zu ersparen. Ein Strafverfahren kann auch noch in der Hauptverhandlung wegen Geringfügigkeit oder wegen geringer Schuld ohne oder mit einer Auflage für den Angeklagten eingestellt werden. Sonst gilt die gesetzliche Vorschrift 37 : „Die Hauptverhandlung schließt mit der auf die Beratung folgende Verkündung des Urteils.“ Das Urteil enthält in der Regel entweder eine Verurteilung oder einem Freispruch. Stellt sich erst in der Hauptverhandlung ein nicht zu beseitigendes Verfahrenshindernis heraus, dann wird das Verfahren durch Urteil eingestellt 38 . Ein solches Verfahrenshindernis ist etwa die Verjährung einer Straftat. Zum Abschluss darf ich noch auf die sehr umstrittenen neueren gesetzlichen Bestimmungen zur Verständigung über das Verfahrensergebnis39 eingehen. Es geht regelmäßig um schwierige Verfahren mit einem schweigenden oder bestreitenden Angeklagten, in denen sich die Notwendigkeit einer langwierigen Beweisaufnahme abzeichnet. In derartigen Fällen hatte die gerichtliche Praxis schon seit Jahrzehnten Absprachen über die - verminderte - Strafhöhe im Falle eines Geständnisses getroffen. Meist folgte dann nach Urteilsverkündung ein sofortiger Verzicht auf Rechtsmittel. Der Bundesgerichtshof 35Die Öffentlichkeit kann in Ausnahmenfällen ausgeschlossen werden, etwa wenn die Intimsphäre des Angeklagten oder eines Zeugen betroffen ist. Jugendgerichtsverfahren sind nicht öffentlich. 37 § 260 Abs. 1 36§ 244 Abs. 3-5 39 §§ 257b ff 38 § 260 Abs. 3 51 52 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores hat dann bestimmte Regeln dazu aufgestellt. Nun hat der Gesetzgeber im Jahre 2009 versucht, dies in gesetzliche Regeln zu fassen. Er hat bestimmt: In jedem Stadium des Verfahrens sind Erörterungen über den Sach- und Rechtsstand und auch über ein mögliches Verfahrensergebnis für den Angeklagten möglich. Das ist eigentlich eine Selbstverständlichkeit und hätte keiner ausdrücklichen Regelung bedurft. Zeichnet sich in diesen Gesprächen die Möglichkeit einer Verfahrensabkürzung ab, so nennt das das Gericht die Höhe der maximalen Strafe im Falle eines Geständnisses des Angeklagten. Genauer gesagt muss eine bestimmter Strafrahmen genannt werden. Entscheidend ist aber meist allein die Obergrenze. Dies bedarf dann der Zustimmung des Angeklagten und der Staatsanwaltschaft. Legt der Angeklagte anschließend ein Geständnis ab, so ist das Gericht an seine Zusage gebunden. Ein Rechtsmittelverzicht nach Urteilsverkündung wurde in diesen Verständigungsverfahren verboten. Dem Angeklagten soll immer die Möglichkeit erhalten bleiben, sich während der gesamten Wochenfrist zur Einlegung eines Rechtsmittels dies reiflich zu überlegen. Viele sehen in diesem Verständigungsverfahren einen unauflösbaren Widerspruch zum nach wie vor geltenden Amtsermittlungsgrundsatz unseres grundsätzlich inquisitorischen Verfahren. Auch die Gefahr des Missbrauchs wird heraufbeschworen. Manche Richter f ü h l e n s i c h d u rc h d a s P ro z e s s v e r h a l t e n einzelner Verteidiger zu einer Verständigung mit zu geringen Strafen geradezu genötigt, etwa durch permanente Befangenheitsanträge und unzählige Beweisanträge. Verteidiger behaupten demgegenüber zuweilen, Gerichte zwängen den Angeklagten zum Geständnis mit der Androhung sonst sehr hoher Strafen. Die Generalbundesanwältin forderte auf dem letzten deutschen Juristentag eine effektive Eingrenzung der Absprachepraxis. Ich persönlich sehe bei einem ordnungsgemäß durchgeführten Verständigungsprozess kein P roblem. Missbrauch ist zwar nie völlig auszuschließen. Seitens der Gerichte ist das aber sicher kein Problem von Gewicht. Ein Geständnis entbindet das Gericht nicht, dieses auf seine Richtigkeit zu überprüfen, etwa durch eine ergänzende Beweiserhebung, z.B. durch Anhörung eines Ermittlungsbeamten. Das gebietet der auch in diesen Fällen geltende Amtsermittlungsgrundsatz 40. Die Berufsrichter kennen im Übrigen auch die Akten und vermögen schon deshalb den Wahrheitsgehalt eines Geständnisses zu beurteilen. Die Vereinbarung darf sich nur auf die Strafhöhe beziehen, die angemessen bleiben muss. Der Schuldspruch bleibt davon unberührt. Ob ein Diebstahl oder ein Raub vorliegt, ist nicht verhandelbar. Auch nach der Sach- und Rechtslage gebotene Maßregeln der Sicherung und Besserung, wie die Unterbringung in einer Entziehungsanstalt oder in einem psychiatrischen Krankenhaus dürfen nicht Gegenstand der Verständigung sein, dürfen nicht wegverhandelt werden. Es geht allein um die Höhe der Strafe, die, auch wenn sie bei einem Geständnis naturgemäß niedriger ausfällt, noch angemessen sein muss. D a s Ve r s t ä n d i g u n g s v e r f a h r e n i s t ordnungsgemäß gehandhabt - eine sinnvolle M ö g l i c h ke i t z u r A b k ü r z u n g s c h w i e r i g e r Ve r f a h r e n . D i e s s p a r t R e s s o u r c e n , d i e anderweitig zur Strafverfolgung eingesetzt werden können. Und die Sicherung effektiver Strafverfolgung hat Verfassungsrang. Dies hat das Bundesverfassungsgericht immer wieder betont. Damit darf ich schließen. Ich danke für Ihre Aufmerksamkeit. 40§ 257c Abs. 1 Satz 2: „§ 244 Absatz 2 bleibt unberührt.“ série Cadernos do CEJ ANHANG 53 Amtsgericht und Schöffengericht Leichte und mittlere Kriminalität Eingänge: ca. 880.000 Verfahren p.a. Strafrichter Berufung Eingänge: ca. 57.000 Verfahren p.a. Landgericht Kleine Strafkammer Revision Eingänge: ca. 6.000 Verfahren p.a. Oberlandesgericht Strafsenat Schwere Kriminalität Revision Eingänge: ca. 13 Verfahren p.a. Oberlandesgericht Strafsenat als 1. Instanz Eingänge: ca. 3.300 Verfahren p.a. Bundesgerichtshof Strafsenat Eingänge: ca. 15.000 Verfahren p.a. Landgericht Große Strafkammer Revision Instanzenzug in Strafsachen 54 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores série Cadernos do CEJ Gerichtliche Kontrolle des strafrechtlichen Ermittlungsverfahrens in Deutschland Die Maßnahmen unter Richtervorbehalt im Einzelnen: Maßnahmen im Ermittlungsverfahren, die unter Richtervorbehalt stehen (§§ der StPO, soweit kein anderes Gesetz genannt) Ulrich Hebenstreit Richter am Bundesgerichtshof Richterliche Gestattungen sind dann erforderlich, wenn eine Maßnahme Grundrechte des Betroffenen berührt, etwa die Rechte auf Freiheit, körperliche Unversehrtheit, Eigentum, Unverletzlichkeit der Wohnung, B r i e f - , Po s t - u n d Fe r n m e l d e g e h e i m n i s , Pressefreiheit Berufsfreiheit, informationelle Selbstbestimmung. Zuständig ist grundsätzlich der Richter am Amtsgericht (§ 162 StPO), in Staatsschutzsachen (§ 120 Gerichtsverfassungsgesetz) auch der Ermittlungsrichter am Oberlandesgericht beziehungsweise des Bundesgerichtshofs. Andere richterliche Zuständigkeiten sind in den Fußnoten vermerkt. Bei „Gefahr im Verzug“ ist meist zunächst die Anordnung durch die Staatsanwaltschaft oder auch durch deren Ermittlungspersonen (§ 152 GVG) - Polizeibeamte - zulässig. „ G e f a h r i m Ve r z u g “ i s t d a n n g e g e b e n , wenn nicht genügend Zeit bleib, eine richterliche Entscheidung einzuholen, ohne den Ermittlungserfolg zu gefährden. An die Feststellung von „Gefahr im Verzug“ sind insbesondere nach der Rechtssprechung des Bundesverfassungsgerichts sehr hohe A n f o rd e r u n g e n z u s t e l l e n . D i e s t ä n d i g e Erreichbarkeit eines Richters ist durch die Justizverwaltung sicher zu stellen. Wurde „Gefahr im Verzug“ zu Unrecht angenommen, kann dies nach der Rechtsprechung zu einem Verbot der Verwertung der ohne richterliche Gestattung erlangten Beweismittel führen, jedenfalls kommt ihnen minderer Beweiswert zu. § 51 Maßnahmen gegen den beim Richter im Ermittlungsverfahren ausgebliebenen Zeugen1 § 70 Maßnahmen gegen Zeugen bei grundloser Zeugnis- oder Eidesverweigerung (bei richterlicher Vernehmung im Ermittlungsverfahren)1 § 81 Unterbringung des Beschuldigten zur Vorbereitung eines Gutachtens über den psychischen Zustand des Beschuldigten2 § 81 a, c Körperliche Untersuchung, Entnahme einer Blutprobe3 § 81 e Molekulargenetische Untersuchung3 § 81 g DNA-Identitätsfeststellung3 § 81 h Reihengentests3 § 87 Abs. 3 Leichenöffnung und Ausgrabung einer Leiche4 § 94 B e s c h l a g n a h m e Beweisgegenständen3 v o n § 98a Maschineller Abgleich und Übermittlung personenbezogener Daten („Rasterfahndung“)4 § 99 Postbeschlagnahme4 § 100 a Überwachung der Telekommunikation4 § 100 c A b h ö r e n d e s n i c h t ö f f e n t l i c h gesprochenen Wortes in Wohnungen („Großer Lauschangriff “)5 55 56 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores § 100 f § 100g § 100 i Abhören des nichtöffentlich gesprochenen Wortes außerhalb von Wohnungen („Kleiner Lauschangriff “)4 E r h e b u n g v o n Telekommunikationsverkehrs- und -standortsdaten 4 Ermittlung von Kenndaten und des Standorts bei Mobilfunkgeräten 4 § 100 i Abs. 6 Zurückstellung der Information eines von einer Maßnahme Betroffenen, der vorher hierzu nicht gehört wurde (z.B: Telefonüberwachung, Einsatz eines verdeckten Ermittlers usw.) über 12 Monate hinaus1 (erneute richterliche Überprüfung der Maßnahme nach Information des Betroffenen: § 101 i Abs. 7 Satz 2) § 102 Durchsuchung beim Verdächtigen3 § 103 Abs. 1 Satz 1 Durchsuchung bei anderen3 Diese wurde aber für verfassungswidrig erklärt] §§ 112, 112 a,Anordnung von Untersuchungshaft (Haftbefehl)11 § 119 Maßnahmen im Untersuchungshaft12 Vo l l z u g der § 126 a Einstweilige Unterbringung in einem psychiatrischen Krankenhaus oder in einer Entziehungsanstalt 13 § 131 Abs. 3 Öffentlichkeitsfahndung, Fahndung über das Fernsehen, sonstige Medien14 § 132 Festsetzung einer Sicherheitsleistung bei Personen ohne festen Wohnsitz im Inland3 § 132 a Vorläufiges Berufsverbot6 § 138 a Ausschließung eines Verteidigers15 § 103 Abs. 1 Satz 2 D u r c h s u c h u n g a l l e r Wohnungen in einem Gebäude6 § 161 a M a ß n a h m e n g e g e n d e n b e i d e r Staatsanwaltschaft ausgebliebenen Zeugen oder Sachverständigen16 § 110 a Einsatz eines verdeckten Ermittlers (noch kein konkret Verdächtiger)7 § 163 c Länger währende Freiheitsentziehung zur Feststellung der Identität17 § 110 b Abs. 2 E i n s a t z e i n e s v e r d e c k t e n Ermittlers gegen eine bestimmte Person oder wenn dieser eine fremde Wohnung betreten soll8 § 163 d Schleppnetzfahndung (Sammlung von Daten bei Grenzkontrollen und Kontrollstellen nach 111)3 § 111 Einrichtung von Kontrollstellen auf Straße und Plätzen3 § 111 a Vo r l ä u f i g e Fahrerlaubnis9 Entziehung der § 111 b Beschlagnahme von Gegenständen die voraussichtlich dem Verfall oder der Einziehung unterliegen10 [§ 111 o Anordnung eines dinglichen Arrests zur Sicherung einer Vermögensstrafe4. § 163 e Au s s c h re i b u n g z u r p o l i z e i l i c h e n Beobachtung § 163 f L ä n g e r f r i s t i g e - d u rc h g e h e n d e Observation über 1 Monat 18 (bis 1 Monat Staatsanwaltschaft, bis 24 Stunden Polizei) § 73 SGB X (Sozialgesetzbuch, 10. Buch Verwaltungsverfahren)Übermittlung von Sozialdaten (z.B. von Krankenkassen, Rentenversicherungsträgern) für die Durchführung eines Strafverfahrens3 série Cadernos do CEJ 1 Kann naturgemäß nur vom Richter angeordnet werden. und der Polizei (§ 127 Abs. 2) und bei antreffen auf frischer Tat durch Jedermann (§ 127 Abs. 1) Zuständig ist das Gericht für die Eröffnung des Hauptverfahrens. 12 2 Bei Gefahr im Verzug ist auch Anordnung durch die Staatsanwaltschaft oder die Polizei möglich. 3 Bei Gefahr im Verzug ist auch Anordnung durch die Staatsanwaltschaft möglich, nicht aber durch die Polizei. 4 Zuständig ist eine große Strafkammer beim Landgericht, bei Gefahr im Verzug bei deren Vorsitzendem allein. Der Richter ist zuständig. Es gibt aber Eilzuständigkeit der Staatsanwaltschaft, des L eiters der Vollzugsanstalt bzw. von Vollzugbeamten). Nur der Richter ist zuständig. Aber Recht zur vorläufigen Festnahme der Staatsanwaltschaft und der Polizei (§ 127 Abs. 2). 13 Zuständig sind Gericht oder Staatsanwaltschaft, bei Gefahr im Verzug auch die Polizei. 14 5 Nur der Richter ist zuständig. Auch bei Gefahr im Verzug keine Anordnungskompetenz bei der Staatsanwaltschaft oder der Polizei 6 Durch die Polizei mit Zustimmung der Staatsanwaltschaft. Zuständig ist ein Senat des Oberlandesgerichts oder des Bundesgerichtshofs. 15 Haft kann nur ein Richter anordnen, sonstige Maßnahmen auch ein Staatsanwalt mit dem Recht des Betroffenen, eine richterliche Überprüfung zu verlangen. 16 7 Durch die Polizei mit Zustimmung des Gerichts bei Gefahr im Verzug mit Zustimmung der Staatsanwaltschaft. Nur der Richter kann dies anordnen (auch dann maximal 12 Stunden). 17 8 Nur der Richter ist zuständig. Auch bei Gefahr im Verzug keine Anordnungskompetenz bei der Staatsanwaltschaft oder der Polizei. Für Beschlagnahme des Führerscheins gilt aber § 94. 9 Bei Gefahr im Verzug ist auch Anordnung durch die Staatsanwaltschaft oder die Polizei möglich. Bei periodischen Druckwerken ist ausschließlich der Richter zuständig, bei sonstigen Druckwerken ist bei Gefahr im Verzug auch die Staatsanwaltschaft zuständig (§ 111 n). 10 Nur der Richter ist zuständig. Aber Rechts zur vorläufigen Festnahme der Staatsanwaltschaft 11 Über einen Monat muss der Richter anordnen, bis zu einem Monat genügt die Anordnung der Staatsanwaltschaft, bis zu 24 Stunden darf die Polizei in eigener Verantwortung observieren. 18 57 58 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Desembargador Federal Tadaaqui Hirose e Ministro Ulrich Hebenstreit. “ DESEMBARGADOR FEDERAL TADAAQUI HIROSE: Vamos dar prosseguimento aos nossos trabalhos. Tenho a honra e a satisfação de apresentar a segunda palestrante da data de hoje, a Exma. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, do Superior Tribunal de Justiça, que proferirá a palestra “Principais inovações do projeto do Código de Processo Penal Brasileiro”. Farei um pequeno resumo do currículo de S. Exa. Ministra do Superior Tribunal de Justiça, doutora e mestre em Direito Processual pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, especialista em Direito Processual Penal da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Especialista em Direito Penal Econômico Europeu pela Faculdade de Coimbra, Instituto de Direito Penal Econômico Europeu, e do IBCrim. Então, tenho a honra de passar a palavra à eminente Ministra. Principais inovações do projeto de Código de Processo Penal Brasileiro Ministra Maria Thereza de Assis Moura Doutora em Direito Processual pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Especialista em Direito Processual Penal da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e em Direito Penal Econômico e Europeu pela Faculdade de Coimbra – Lisboa. Professora Doutora da Universidade de São Paulo e professora convidada em diversas instituições fora do Estado de São Paulo. Atualmente é Ministra do Superior Tribunal de Justiça, membro da Terceira Turma e Presidente da Sexta Turma. “ Antes de mais nada, gostaria de agradecer ao Desembargador Federal Tadaaqui Hirose pelo convite que me foi feito para estar aqui hoje para conversarmos um pouco sobre as principais inovações do projeto de Código de Processo Penal Brasileiro. 1 Escorço histórico Para que possamos fazer uma análise das principais inovações do projeto do Código de Processo Penal, penso que é interessante e importante fazer uma pequena digressão a respeito da inserção do CPP no seu tempo e das alterações que advieram nesse período, porque o nosso Código é de 1941 e, portanto, estamos completando os seus 70 anos. O Código entrou em vigor na década de 1940 em pleno Estado Novo. A característica da época era a primazia do interesse do Estado sobre o particular e sobre o interesse privado. Na Exposição de Motivos daquela época, vê-se que o CPP foi marcado por aquelas influências políticas insertas na Carta de 1937. Tanto é que, originariamente, o Código previa a prisão preventiva obrigatória nos processos por crimes a que fosse cominada a pena de reclusão por tempo igual ou superior 60 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores a 10 anos. A fiança não era admitida para deliAlgumas regras postas na Constituição como, tos apenados com reclusão, exceto se o réu fosse por exemplo, a necessidade de que a busca e menor de 21 ou maior de 70 anos, ou se a pena apreensão se fizesse por meio de mandado, acamáxima não excedesse a dois anos. bou prevalecendo, e inúmeras outras disposições A apelação da sentença absolutória em protiveram de ser interpretadas de acordo com a cesso por crime cuja pena fosse igual ou superior Constituição, mas que não estavam expressamena oito anos tinha efeito suspensivo, impedindo a te previstas no CPP. Dou outro exemplo: o direito soltura do réu que tivesse sido absolvido. No júri, ao silêncio, que a Constituição foi expressa em o recurso do acusado só não tinha efeito suspenprever e o Código era expresso em punir. Então sivo da soltura se a absolvição tivesse sido unâpassamos a conviver com regras constitucionais nime. A decisão de pronúncia implicava prisão que estavam em contradição com o que dispunha obrigatória do pronunciado, se o crime não fosse o Código de Processo Penal. afiançável. O acusado só poderia apelar em liberdade se a infração fosse afiançável ou permitisse a liberdade A alteração com a Constituição foi estrutural e isso sem fiança. trouxe, então, a necessidade de se revisarem as regras Todos esses dispositivos estado Código de Processo Penal, de forma a modificá-las vam inteiramente harmônicos ou de se fazer uma leitura do CPP à luz da Constituição. com os princípios até então adotados pelo Estado, como eu disse, eram fruto daquele mo3 O movimento reformista mento político vivido. E as pequenas reformas que se seguiram a partir do Código de 1941, no Assim, no ano de 2000, formou-se uma Comiscurso do tempo, não tiveram o condão de afastar são de reforma que apresentou 11 anteprojetos, aquele caráter autoritário que até então se punha em um primeiro momento, que foram discutidos no Código de Processo Penal. com a sociedade, e que resultaram na apresentação de oito projetos de lei. E qual foi a proposta 2 A Constituição de 1988 da Comissão? A ideia – acredito eu – era a de que, tal como acontecera já com o Código CiO momento por nós hoje vivido é bem difevil, nós precisaríamos de um Código de Processo rente daquele de 1941. Nós não vivemos sob o Penal inteiramente novo para adequar as regras influxo de golpes de estado e os ideais que inspiprocessuais à Constituição. Porém, a Comissão de raram a Constituição de 1988 são bem diversos reforma entendeu que, naquele momento, apredaqueles do Código de 1941. A alteração com a sentar um Código inteiramente novo seria difícil. Constituição foi estrutural e isso trouxe, então, a E por quê? Alguns temas são extremamente comnecessidade de se revisarem as regras do Código plexos, dentre eles o inquérito policial. Discutir, de Processo Penal, de forma a modificá-las ou de por exemplo, a respeito do inquérito policial dese fazer uma leitura do CPP à luz da Constituição. manda aprofundamentos. O nosso instituto vem Passamos então a conviver com uma situação de 1870 e, portanto, não só o inquérito, mas inúestranha. Porque, enquanto a reforma não se fez meras outras exposições requerem uma discus– e essa ideia da reforma foi-se forjando e só a são mais complexa. Então a Comissão optou por partir de 2000 a primeira Comissão de reforma se reforma pontual, apresentando vários projetos e constituiu –, passamos a conviver com uma Consesses projetos entre si guardavam uma coerência. tituição que elenca inúmeros direitos e garantias, E o que aconteceu? Na verdade, como toda com um Código com uma estrutura como aquela a reforma pontual, alguns projetos passaram a a que me referi, que, no curso das décadas subseser aprovados paulatinamente e, portanto, isso quentes, acabaram tendo modificações pontuais. acabou trazendo um descompasso no sistema série Cadernos do CEJ processual penal a tal ponto, que os projetos encaminhados ao Congresso Nacional em 2001 passaram, então, em 2003, com algumas alterações, mas em 2008 tivemos a aprovação e chamamos a reforma processual penal por meio de três projetos de lei que modificaram as regras relativas a provas, procedimento e júri. Com isso, passamos a ter, ainda que de forma parcial, algumas regras já de acordo com os ideais forjados pela Comissão de reforma de um processo penal acusatório, de um processo penal com a garantia para o acusado, de tudo o que a Constituição assegura. 4 O projeto do novo CPP Mas vejam a curiosidade em relação às leis que foram aprovadas exatamente há três anos atrás, em junho de 2008. Duas delas foram aprovadas no dia 9 e uma no dia 20 de junho, para entrar em vigor em agosto de 2008. Essas leis juntas alteraram mais de cem artigos do Código de Processo Penal, direta ou indiretamente. No dia 19 de junho, portanto exatamente na data da publicação das leis, o Senado Federal constituiu uma Comissão externa de juristas, que foi presidida pelo Ministro Hamilton Carvalhido, do Superior Tribunal de Justiça, para a elaboração de um projeto inteiro de Código de Processo Penal. A partir daí nós tivemos naquele mês as novas leis para entrar em vigor em agosto, e já em julho a Comissão iniciou os seus trabalhos para a elaboração de um projeto de Código inteiramente novo. Com a publicação de três leis novas, faltaram, ainda para completar aquela ideia da reforma pensada em 2001, os projetos de prisão e medida cautelar, projeto de recursos e projeto de inquérito policial. Então nós ficamos com uma reforma parcial e agora a ideia de um Código de Processo Penal inteiramente novo a um só tempo. E só para adiantar, para que possamos tentar compreender esse movimento da reforma, no mês de maio, portanto já agora em pleno andamento do projeto de Código inteiramente novo, há a promulgação da lei que altera a prisão em medida cautelar aprovando um dos outros pro- jetos daquela reforma. Passaremos então a conviver com uma reforma ainda não completa, já imaginada em 2001, vamos ter uma nova lei que disciplina a prisão em medida cautelar e, ao mesmo tempo, discutindo outras propostas colocadas no projeto de Código de Processo Penal. Então parece-me que vivemos um momento difícil de reforma do Código de Processo Penal, tentando a um só tempo conviver com o que temos, ainda não aprovado totalmente para acabar uma sistemática posta em 2001, e a discussão de um projeto totalmente novo. E qual me parece – já adiantando uma das minhas conclusões – a dificuldade maior? Todos sabemos que a tramitação no Congresso Nacional de um projeto de Código novo demanda discussão e tempo. Exemplo disso é o Código Civil, mais de 25 anos até que fosse definitivamente promulgado. Então ainda teremos um tempo pela frente para que essa proposta seja discutida e efetivamente aprovada e não sabemos de que forma. Enquanto isso, teremos de conviver com a reforma levada a efeito em 2008 e 2011. 5 A tramitação e estrutura do novo CPP A respeito propriamente do projeto, ele também merece aqui um esclarecimento. A Comissão externa de juristas, nove meses depois de constituída, apresentou o seu trabalho para o Congresso Nacional. Esse projeto é conhecido como Projeto de Lei do Senado 156. Pensou-se então em um texto original. A Comissão invoca todo arcabouço constitucional, elaborou, de forma sistemática, todas as suas propostas e esse projeto teve a sua tramitação no Senado Federal. No Senado sofreu o projeto dois substitutivos, só ao segundo foram apresentadas 215 emendas, sendo que dessas cerca de cem emendas e subemendas foram aprovadas e temos agora um projeto de Código tramitando na Câmara dos Deputados que já não é mais aquele texto originalmente concebido. Ele guarda a sua base, mas várias previsões contidas no texto original já foram alteradas. Até tive bastante trabalho para tentar entender o que restou do texto original, 61 62 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores o que foi trazido como emendas já ao segundo substitutivo, de maneira que várias das disposições já não foram aprovadas nesta primeira fase de discussão. O projeto de Código de Processo Penal está dividido em seis livros. Possui uma Exposição de Motivos muito bonita, que invoca o compromisso com a Constituição e com as garantias individuais. Esse comprometimento com os direitos fundamentais consta na Exposição de Motivos, de forma bastante enfática, reconhece, e afirma os direitos fundamentais e diz que esse Código vai reger-se pela Constituição e pelos tratados de que o Brasil é signatário. Esse projeto adota, portanto, assim como já fizera a Comissão de reforma de 2000, o princípio e o modelo acusatório. Tal como acontece no Direito alemão, existem com este muitas semelhanças em razão de se prever a possibilidade de participação do juiz eventualmente de forma complementar na colheita da prova. Também temos todo um histórico de inquérito policial feito de forma administrativa, chamada de “forma inquisitorial”. Mas a proposta do projeto é de modelo acusatório e cria a figura muito controvertida do chamado “juiz das garantias”. 6 Inovações do novo CPP O juiz das garantias nada mais é – em comparação com o modelo alemão – do que a presença do juiz no inquérito policial para decidir acerca daquelas medidas que se podem eventualmente tomar e que são restritivas em relação ao acusado. Então o juiz das garantias irá examinar a necessidade de uma constrição à liberdade, de uma medida cautelar e de todas aquelas postulações que demandam a presença de um juiz em um inquérito. Isso separa o juiz do inquérito do juiz do processo. Esta é uma novidade no nosso ordenamento, embora, por exemplo, em São Paulo já exista a figura do juiz que trata apenas do inquérito policial. O Código então traz essa nova figura e diz a Comissão que isso se faz para manter o distanciamento do juiz do processo em relação àqueles elementos trazidos no inquérito policial. 7 Inovações no inquérito policial Eu gostaria de fazer aqui uma pequena análise de alguns aspectos do projeto que consubstanciam alterações e novidades no processo penal. A primeira delas refere-se à investigação criminal. O texto aprovado pelo Senado simplifica o inquérito policial e traz uma diferença entre a figura do investigado daquela do indiciado. Quando se reúnem os elementos para o indiciamento, propõem-se e asseguram-se ao indiciado todas as garantias constitucionais e legais. Mas tanto ao investigado quanto ao indiciado é garantido o acesso a todo o material do inquérito policial – obviamente restritas aqui àquelas diligências que estiverem em andamento – e se possibilita àquele que é investigado e ao indiciado ter acesso a todas as peças dos autos, com direito a tirar cópias e de outros meios técnicos que possam existir, como por exemplo, colheita de depoimento por meio de audiovisual. Prevê-se que possa ser dada à defesa cópia de todo esse material. Assim, é possível, desde logo, que o investigado possa também atuar no inquérito policial, propor meios de prova, e traz aqui, não de forma explícita, aquela consideração da investigação defensiva, possibilitando à defesa também fazer uma prova que possibilite um resultado para ele positivo ainda durante o inquérito policial. Traz também uma modificação para nós, no Brasil, muito relevante. Temos, no nosso ordenamento, prazo para conclusão do inquérito policial, porém nenhuma sanção caso esse prazo seja desrespeitado. Agora, de acordo com a previsão, se for aprovado, o prazo máximo de duração do inquérito policial será de 720 dias, após o que, se não estiver concluído, os autos serão encaminhados ao juiz das garantias para arquivamento. Também se simplificam os atos de investigação e se possibilita que as diligências sejam feitas de forma mais informal e no menor prazo possível. A autoridade pode colher informações no local, e eventualmente colher um depoimento que não seja unicamente de forma escrita, ou seja, uma filmagem, gravação de vídeo, e, neste caso, o resultado poderá ser transcrito ou conservado em áudio. série Cadernos do CEJ Uma matéria que não foi acolhida em relação ao texto original do projeto é a relativa ao arquivamento. Hoje, temos o arquivamento pedido pelo Ministério Público, mas determinado pelo juiz. A proposta original da Comissão, que repetia neste passo também a proposta feita em 2000, é de que o arquivamento deveria se dar no Ministério Público. Mas o texto agora aprovado que seguiu para a Câmara no final de dezembro conserva o arquivamento nas mãos do Poder Judiciário. Assim, há várias alterações que são relevantes em se tratando do inquérito policial. Outra inovação prevista no projeto é a possibilidade de ingresso da vítima enquanto parte civil nos autos. Ela poderá atuar não apenas como assistente do Ministério Público, mas também, se desejar, como parte processual a ser alcançada na sentença. E aqui o projeto disciplina um ponto bastante polêmico, que diz respeito à possibilidade de imposição, já no âmbito penal, de dano moral a ser arbitrado pelo juiz. Uma observação: se eu não estiver equivocada, com a reforma de 2008, possibilitou-se ao juiz na sentença estipular um valor de reparação de danos. Hoje não se diz se isso é dano material ou dano moral. Pressupõe-se muito mais a possibilidade de O projeto abre espaço para a chamada “justiça restaurativa” um dano material, que é mais ao instituir a possibilidade de composição civil dos danos quantificável, mas o projeto com efeitos de extinção da punibilidade no curso do processo não faz distinção e possibilita relativamente às infrações de menor potencial ofensivo. a imposição na sentença penal de dano moral, coisa absolutamente nova e não pensada 8 Inovações no processo penal entre nós, no âmbito da justiça criminal. Sempre costumamos fazer uma diferenciação entre a jusQuanto à ação penal, também o projeto de tiça criminal e a justiça civil para entender que Código traz uma alteração que me parece subso juiz criminal não deve ater-se à imposição de tancial. Hoje, temos a ação penal de iniciativa danos morais. pública pelo Ministério Público, a ação penal condicionada à representação do ofendido e a 9 Inovações no sistema probatório ação penal privada. A proposta extingue a ação penal privada e prevê que a ação é de exclusiva Outra alteração prevista no projeto diz resiniciativa do Ministério Público, mas, em alguns peito a uma distinção que se faz entre meios de casos, poderá ser dependente de representação. obtenção da prova e meios de prova. Nesse conE prevê a ação penal subsidiária da pública pelo texto, por exemplo, a busca e apreensão é tida particular em caso de morosidade do poder púcomo meio de obtenção de prova, ao lado do blico. acesso a informações sigilosas e à interceptação Mas há várias novidades no projeto relativadas comunicações telefônicas. A esse respeito, o mente à ação penal. O projeto abre espaço para Código passará a disciplinar a interceptação das a chamada “justiça restaurativa” ao instituir a comunicações telefônicas, o que hoje é objeto possibilidade de composição civil dos danos com de lei especial. De acordo com o projeto, a inefeitos de extinção da punibilidade no curso do terceptação não poderá exceder 60 dias, porém processo relativamente às infrações de menor popermite prorrogações por igual período, desde tencial ofensivo. Trata-se aqui de uma novidade que continuem presentes os elementos que a auem relação aos crimes contra o patrimônio, quantorizaram, até o máximo de 360 dias, salvo se se do atingirem bens exclusivamente de particular tratar de crime permanente enquanto não cessae desde que praticados sem violência ou grave da a permanência. ameaça e, mais, torna esses crimes dependentes Portanto, é uma disciplina também inteiramende representação, uma modificação muito signite nova daquela hoje existente, embora tenhamos ficativa em relação ao que temos hoje. 63 64 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores toda uma discussão se o prazo hoje previsto para a interceptação de 15 dias, prorrogável por mais 15, é único ou se, eventualmente, merece uma prorrogação. 10 Inovações quanto aos procedimentos No que diz respeito aos procedimentos, o projeto incorpora várias das modificações que estão em vigor desde 2008, porém com algumas alterações. Só para exemplificar, a reforma se caracteriza pelo fato de prever uma audiência una de instrução – e já aqui no projeto se possibilita o fracionamento da audiência em determinados casos. Há uma novidade bastante importante, que diz com o procedimento sumário. O projeto do novo CPP permite que, antes de realizada a audiência no procedimento comum, haja a possibilidade de acordo entre as partes, com a imediata aplicação de pena mínima ou reduzida nos crimes cuja pena máxima cominada não seja superior a oito anos. Assim, até o início da instrução, o Ministério Público e o acusado, por seu defensor, poderão realizar acordo, desde que haja a confissão total ou parcial em relação aos fatos, e, nesse caso, as partes pedirão a dispensa da produção de provas com a aplicação de uma pena no mínimo previsto na lei e que poderá ser diminuída de um terço, se as condições do agente e a menor gravidade da infração possibilitarem. Nunca tivemos isso no nosso ordenamento. No que diz respeito ao procedimento do júri, também há uma mudança que me parece significativa. Desde os bancos escolares, sempre aprendemos que a competência do tribunal do júri é para julgar crimes dolosos contra a vida e os crimes que lhe são conexos. Mas essa regra é alterada pelo projeto. O júri só julgará em conjunto, quando houver a continência. Em se tratando de conexão, o que acontece? A reunião dos processos cessará com a pronúncia, e caberá, então, ao juiz sentenciar o crime conexo – ao juiz que estiver fazendo a instrução do procedimento do júri, ou, se for já durante o julgamento pelo tribunal do júri, pelo juiz presidente. O projeto do novo Código também passa a disciplinar, no seu bojo, o procedimento dos juizados especiais criminais, o que hoje é objeto de lei especial. Ele prevê, entre outras coisas, que, no caso de descumprimento da transação penal, poderá o Ministério Público oferecer denúncia, coisa que hoje também, pelo menos na nossa jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não se admite. 11 Medidas cautelares Uma questão muito importante refere-se às medidas cautelares, que se torna, a meu ver, mais importante diante da aprovação da lei, agora em maio de 2011, que trata do mesmo assunto. O projeto adota relativamente às medidas cautelares alguns princípios, postos na Exposição de Motivos: princípio da presunção de não culpabilidade, a estrutura do modelo acusatório, proibindo que o juiz decrete medidas cautelares de ofício no curso da investigação. Também adota o princípio da proporcionalidade, e aqui posto da seguinte maneira, hoje já adotada na lei, que está no período de vacatio legis: a prisão se transforma na última opção no caso de as medidas cautelares alternativas à prisão não se recomendarem e não se fizerem suficientes para a cautela no processo penal. Adota-se também uma grande novidade, o princípio do prazo razoável para a prisão. Temos, na Constituição, assegurada a garantia do prazo razoável do processo, mas o Código estabelece um prazo para a prisão cautelar. Em regra, decorridos 90 dias – e se eu não estiver equivocada em relação ao processo penal alemão – , o juiz deverá, terminado esse prazo, fazer uma análise da necessidade ou não da manutenção dessa prisão. O Código, então, estabelece prazos: primeiro, prazo para a prisão até a sentença; depois, prazo para a prisão entre a sentença e o trânsito em julgado, prevendo a possibilidade de aumento desse prazo se houver a interposição de recurso especial ou extraordinário. Prevê-se, ainda, que, em determinados casos, esse prazo poderá ser dobrado, no caso, por exemplo, de a pena máxima ser superior a 12 anos. Assim, série Cadernos do CEJ somando-se todos esses prazos, o Código estabelece, pelo menos de uma maneira mais objetiva, que, em nenhuma hipótese, a medida superará quatro anos. Em relação ao que hoje se põe no nosso ordenamento, é uma alteração significativa, porque, embora não tenhamos no Código vigente uma disposição explícita e expressa quanto a prazo, criou-se, com o decurso do tempo, uma jurisprudência, embora hoje já bastante alargada, no sentido de que a prisão teria o prazo de 90 dias. Hoje, nós sabemos, isso não acontece, até em razão das modificações que foram já levadas a efeito com a reforma. Agora, com a audiência una, em que tudo se passa na audiência com o interrogatório do acusado ao final, isso trouxe, na prática, um aumento do prazo de prisão. Agora, com a previsão aqui expressa de duração de 180 dias até a sentença, podendo ser dobrado (mais 360 dias), com a soma dos prazos não se poderá ultrapassar quatro anos, coisa que hoje consideramos, em regra, como excesso de prazo. De qualquer forma, há essa previsão. Mas a grande novidade do projeto em sede de medida cautelar pessoal acaba de se transformar em lei, que é a possibilidade das medidas cautelares alternativas à prisão, denominadas no projeto de “outras medidas cautelares pessoais”. E a ideia de que a prisão preventiva deve ser a ultima ratio, ou seja, somente se essas medidas não se revelarem adequadas e suficientes, ainda que aplicadas de forma cumulativa, é que a prisão se dará. Outra previsão é de que não caberá a prisão preventiva naqueles crimes cuja pena máxima não ultrapasse três anos. De acordo – e chamo aqui a atenção – com a lei que entrará em vigor no mês que vem, a prisão só caberá para aqueles crimes cuja pena máxima seja superior a quatro anos. O projeto faz algumas ressalvas: se o crime for praticado com violência ou grave ameaça, será possível a decretação da prisão preventiva, ainda que a pena não supere esses três anos, mas a lei que vai entrar em vigor em julho não faz essa ressalva. Então, o que eu chamei a atenção no início da minha fala, essa perplexidade, de termos, a um só tempo, duas reformas em andamento, com previsões que ainda não entraram em vigor e um projeto que disciplina de forma diferente. O projeto também traz a revigoração do instituto da fiança, coisa que a lei que vai entrar em vigor em julho já faz. Agora a fiança tem previsão expressa de sua decretação em número muito maior de casos. Inclusive, pelo projeto, só não se fixará uma fiança se verdadeiramente o acusado não tiver condições de arcar com o seu pagamento e se os valores fixados forem muito significativos. Ainda relativamente ao tema, uma novidade: hoje, no nosso ordenamento, se o crime for apenado com pena maior que dois anos, a autoridade policial não pode arbitrar a fiança. Agora poderá, nos crimes apenados até cinco anos, exceto se praticados com violência ou grave ameaça. O instituto da prisão temporária é trazido para o Código de Processo Penal. Hoje a prisão temporária é regulamentada em lei especial. O projeto original tinha uma previsão que não foi acolhida nessa primeira fase, e neste texto que agora está em discussão no Congresso se retoma a ideia de um rol dos crimes passíveis de prisão temporária, mas se prevê expressamente que ela não poderá ser utilizada como único objetivo de interrogar o investigado, coisa que muitas vezes se verifica na prática. O projeto também traz, de uma forma bastante detalhada a disciplina das medidas cautelares reais, como o sequestro de bens, em que se prevê a possibilidade de alienação antecipada dos bens sequestrados em caso de fundado receio de depreciação do patrimônio ou do seu perecimento, e cria também a figura do administrador judicial, quando não for o caso de alienação antecipada. 12 Os recursos No que diz respeito aos recursos, o projeto altera, de forma bastante significativa, o que hoje existe, e aqui também merece um parênteses. Um dos projetos não aprovados ainda da Comissão de 2000 foi o relativo aos recursos e 65 66 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores 13 As ações de impugnação o projeto de novo Código de Processo Penal utiliza boa parte das previsões daquele projeto Outro aspecto diz respeito às chamadas “ações original com algumas alterações. Analisandode impugnação”, e aqui temos o ponto nodal, as, cheguei à conclusão de que há uma aproxique é o habeas corpus. A Comissão de 2009 resmação entre o processo civil e o penal, na metringiu o cabimento do habeas corpus somente ao dida em que traz para o bojo do projeto várias acusado preso. Isso causou uma grande divergêndisposições hoje vigentes no processo civil. E cia e discussão no mundo jurídico, principalmenisso significa para o processo penal uma restrite pelos advogados, que entendem que o último ção ao recurso de embargos infringentes, tradiinstrumento que se tem em favor do acusado é o cionalmente tidos como um recurso favorável habeas corpus e que não deve se restringir apenas à defesa sempre que for desfavorável a decisão às hipóteses do acusado preso. Houve toda uma no Tribunal, em determinados casos. Agora os discussão a respeito da constitucionalidade desembargos infringentes tramitarão mais ou meses dispositivos, que estavam previstos no projenos nos moldes do processo civil: só quando to, de maneira que o texto aprovado no Senado, houver pelo Tribunal a alteração de decisão em dezembro, retomou o que hoje temos como que reforme a sentença de primeiro grau por previsão do habeas corpus, vale dizer, a restrição decisão não unânime. imaginada pela Comissão não passou no Senado Também o nosso recurso em sentido estrito, Federal. da década de 1941, no Código de Processo Penal, vira recurso de agravo. E aqui também o projeto [...] a grande novidade do projeto em sede de medida cautelar aprovado no Senado alterou o texto da Comissão externa, pessoal acaba de se transformar em lei, que é a possibilidade que foi constituída em 2009. das medidas cautelares alternativas à prisão, denominadas A Comissão tinha imaginado, no projeto de “outras medidas cautelares pessoais”. como no processo civil, que todas as decisões interlocutóO projeto regula, ainda, o mandado de segurias seriam passíveis de recurso de agravo, mas rança em matéria penal. Hoje não temos uma isso não foi aprovado. Voltou-se à ideia de um rol disposição expressa relativamente ao tema. O Códe possibilidades de recurso de agravo, de madigo traz as regras para o mandado de seguranneira que também prevê, assim como no procesça, para a sua apreciação no caso de não caber, so civil, a interposição deste recurso diretamente obviamente, habeas corpus ou habeas data contra no Tribunal, sistemática hoje totalmente diversa ilegalidade ou abuso de poder. Porém, não se para o recurso em sentido estrito. admitirá o mandado de segurança para atribuir Também quanto à apelação as alterações se efeito suspensivo a recurso ou contra ato judicial dão para, basicamente, uniformizar o processo contra o qual caiba um recurso com efeito suscivil com o penal. Hoje a nossa sistemática propensivo ou contra a decisão transitada em julgacessual penal é bastante peculiar, com dois modo. Assim, há essa normatização do mandado de mentos distintos de interposição e de apresentasegurança em matéria penal, inédita no nosso ção das razões, e passará a um único prazo de 15 ordenamento. dias, já com a apresentação das razões. E, por fim, temos um Livro do projeto de CóHá uma previsão, que hoje já é lei, no que digo, que trata da cooperação jurídica internadiz respeito a recurso especial e extraordinário, cional. Hoje, o Código de Processo Penal dedica de que, quando a decisão negar seguimento ao cerca de 20 artigos a este tema. O projeto dobra o recurso, caberá o agravo, agora já nos próprios número de disposições e prevê, aqui, a disciplina autos do processo, como previsto expressamente não só da carta rogatória e da homologação de para o processo civil. série Cadernos do CEJ sentença estrangeira, mas também da extradição passiva e ativa, o auxílio direto, a transferência de pessoas condenadas e a transferência dos processos penais. 14 Conclusão Então, basicamente estas são as matérias que me pareceram mais significativas de novidades e de alteração que estão no projeto de Código de Processo Penal. Porém chamo a atenção: o Senado aprovou o texto em dezembro de 2010, que seguiu imediatamente para a Câmara dos Deputados. O último andamento que eu obtive é que, desde que chegou lá, nenhuma comissão foi constituída ainda, o que leva à conclusão de que teremos uma longa temporada de discussões. E mais: enquanto tramitava o projeto no Senado Federal, várias entidades manifestaramse no sentido de apresentar sugestões de modificação do texto, incluindo o Supremo Tribunal Federal, e eu não sei se também no âmbito do Conselho Nacional de Justiça. Várias sugestões foram levadas diretamente ao Ministério da Justiça, e tudo se espera que seja trazido agora na discussão na Câmara dos Deputados. Vejam que nós teremos ainda todo um período de discussão desse projeto e, de outro lado, não tivemos tempo ainda de absorver as reformas de 2008. E quando mais não fosse, com toda essa reforma aí em curso, foi promulgada a lei que altera a prisão e medidas cautelares que entrará em vigor agora em julho. Por outro lado, temos um sistema carcerário reconhecidamente falido. Temos, para falar em números redondos, cerca de 500 mil presos, sendo destes mais ou menos 40% de presos provisórios que aguardam ansiosamente por uma definição do legislador acerca das regras postas para a liberdade e a prisão. Então, eu temo que tenhamos aqui, falando já de Superior Tribunal de Justiça, mais uma avalanche de habeas corpus agora, com a entrada em vigor da lei, porque todos aqueles que estão presos irão pretender que o juiz reveja a sua situação para saber se cabe alguma medida cautelar alternativa à prisão. Isso no curso da reforma. Então, trago aqui a minha preocupação com este tema. Entendo que é indispensável que tenhamos, de uma vez por todas, um Direito Processual Penal Constitucional colocado em prática com regras claras, bem postas, com garantias para os cidadãos que estão se vendo às barras da Justiça. Espero que possamos ter uma reforma que seja concluída num espaço de tempo suficientemente rápido e também que se possa conciliar, em termos de regras, algo que já está sendo instituído com a reforma de 2008, já que a ideia básica é a mesma, de garantia dos direitos fundamentais e da instituição de um processo acusatório. 67 Pressupostos de admissibilidade do Recurso Especial no STJ alemão (Trad. Dr. Márcio Flávio Mafra Leal) Professor Dr. Alexander Bruns Graduado em Direito na Universidade de Constança em 1992. Doutor em Direito pela Universidade de Freiburgo em 1996; Master of Laws pela Duke University School of Law, na Carolina do Norte; Pesquisa pós-doutoral na Harvard Law School, Habilitação (Tese de Cátedra) em Direito Civil, Processual Civil, Comercial e Direito Comparado; Catedrático de Direito Civil e de Seguros na Universidade de Göttingen; Decano da Faculdade de Direito da Universidade de Göttigen, Catedrático de Direito Civil e Processo Civil na Universidade de Friburgo; Diretor do Instituto de Direito Processual Civil Alemão e Comparado. “ I Escopo do trabalho O recurso especial, como remédio processual contra erro na aplicação de direito pelos tribunais, conhece, em códigos de processo importantes, configurações divergentes. A questão de se saber sob quais pressupostos as partes obtém acesso à instância especial, é de interesse prático e científico de relevo, afinal a resposta a isso abriga, para as perspectivas de êxito em impugnar o acórdão recorrido, um juízo prévio. Uma análise de direito comparado é proveitosa exatamente porque informa sobre como uma cultura processual civil lida com a possibilidade de tratamento judicial de erros e de sua reparação por iniciativa das partes. Na Europa, dada a total ausência de um acesso individual ao recurso especial perante o Tribunal de Justiça Europeu, surge, ainda, a questão da futura configuração e desenvolvimento do direito processual no plano da Europa. No direito processual alemão, o recurso especial é classificado – diferentemente do Brasil (art. 102 e 105 da Constituição Federal brasileira) – no âmbito dos recursos ordinários. Desde a reforma de 2002, o recurso especial tem lugar somente, conforme a processualística alemã, se o Tribunal série Cadernos do CEJ de Apelação, no acórdão recorrido (§ 543, I, n. 1, do CPC)1 ou o Tribunal do Recurso Especial,2 ao julgar o agravo de não admissibilidade (§ 543, I, n. 2), o admitirem, decisão esta que é vinculante. O antigo Recurso Especial pelo valor da causa está revogado. Para se entender o direito ao recurso especial são de particular importância a interpretação e a aplicação prática dos pressupostos de admissibilidade pelo Tribunal de Apelação e STJ. Após um breve esboço do enquadramento constitucional serão apresentados primeiro os pressupostos de admissibilidade do direito ao recurso especial alemão. Na sequência serão analisados e classificados esses pressupostos do direito alemão em comparação com a França, Inglaterra e EUA. Ao final, segue-se um resumo das teses. especificamente do processo de conhecimento processual civil, mas também a possibilidade de execução forçada, como instituto jurídico corolário. Assim, garante-se, consoante opinião do Tribunal Constitucional Federal e da doutrina dominante, o acesso à Justiça, mas não o percurso das instâncias subsequentes. A Constituição assegura – assim o argumento principal do art. 19, IV, da CF 3 – tutela jurídica através do juiz e não contra o juiz. O Tribunal Constitucional Federal modificou essa assertiva em uma decisão plenária, no sentido de que o legislador está obrigado constitucionalmente a criar expressamente um recurso judicial suficientemente disciplinado para o caso de violação do contraditório. É verdade que, com isso, a tutela jurídica contra decisões judiciais é garantida parcialmente, mas não forçosamente por uma instância superior. Se esse princípio relativamente O recurso à subsidiária reclamação constitucional em restritivo de fato se constitui grande medida não se faz mais necessário, conforme o numa resposta definitiva, ou caso, embora obviamente nem todos os litígios possam se a garantia de jurisdição – ou devam ser afastados do Tribunal Constitucional Federal. que o Tribunal Constitucional extrai dos Direitos Fundamentais em conjunto com o Princípio do Estado de II Enquadramento constitucional Direito (art. 2, I; 14, I; 20 III da CF) e não do art. 19, IV, da CF – não exige, pelo menos em razão da A garantia constitucional da jurisdição asseguConstituição, um controle de erros judiciais pela ra ao indivíduo um acesso desimpedido à Justiça instância superior – já que um exame no seio da para fazer valer suas posições jurídicas radicadas própria instância ou pelo mesmo órgão julgador em direito substantivo. O Estado de Direito litipicamente fracassa – é um amplo campo, que, no beral, que reivindica o monopólio dos poderes presente contexto, será abordado exaustivamente. estatais e proíbe, em princípio, a autotutela, deve Isso corresponde, no entanto, a uma jurispruao jurisdicionado, conforme doutrina majoritária, dência constitucional, que, sempre quando o lenão apenas tutela jurídica em forma de processo, gislador – como no CPC e em praticamente todos os códigos de processo – prevê um recurso, o 1 N. do T.: CPC aqui se refere à Zivilprozessordnung acesso à próxima instância não deve ser dificul(ZPO) alemã, que será omitida nas próximas citatado de forma inexigível e por razões não mais ções, por estar implícito que é o Código de Processo justificáveis constitucionalmente. Os dispositivos Civil. 2 N. do T.: O Professor Bruns se refere a todos os tribunais superiores alemães que julgam em instância que no Brasil se chama de “especial“ (Revision), ou seja, o Superior Tribunal de Justiça (Bundesgerichtshof), o Tribunal Superior do Trabalho (Bundesarbeitsgericht), o Tribunal Federal Administrativo (Bundesverwaltungsgericht), o Tribunal Federal Social (Bundessozialgericht), e a Corte Financeira (Finanzgerichtshof). 3 CF refere-se à Constituição Federal alemã, chamada Grundgesetz (Lei Fundamental). O art. 19, IV, pode ser assim traduzido: “se alguém tiver seus direitos violados pelo Poder Público, ser-lhe-á franqueada uma via judicial. Desde que nenhuma outra jurisdição seja estabelecida, a via judicial será a jurisdição comum [...].” 69 70 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores legais de admissibilidade cumprem, em princípio, esse parâmetro relativamente generoso. O Tribunal Constitucional Federal confirmou grosso modo, de forma coerente, a constitucionalidade das normas que preveem pressupostos de admissibilidade em dois acórdãos: da 1ª Câmara do Primeiro Senado. Segundo eles o legislador esgotou a sua ampla margem de discricionariedade e preservou os limites da clareza e determinabilidade da norma e princípios gerais de isonomia. Os tribunais tinham de concretizar as condições fáticas da regra de admissibilidade – segundo o acórdão da Câmara – como acontece, após as dificuldades iniciais, até hoje, e com isso se chega a uma linha uniforme e clara para os jurisdicionados. A primeira Câmara do Primeiro Senado não aprofundou, no entanto, e não disse uma só palavra sobre a tensão entre a necessária uniformização da jurisprudência e a independência judicial (art. 97, I, CF). Podem-se ter opiniões divididas, se a apreciação da Câmara do Tribunal sobre a constitucionalidade das regras de admissibilidade do recurso tiver sido uma decisão feliz, mas se deve reter dela que a Corte, em princípio, confirmou inteiramente essa nova disciplina. Sem uma modificação dessa linha geral, pode-se questionar a constitucionalidade desse regramento de admissibilidade com perspectiva de êxito, quando muito, por causa de sua aplicação prática. III A admissibilidade do recurso especial no Direito Processual Civil alemão 1 Fundamentos O direito processual civil alemão permite o acesso individual ao STJ na forma de recurso especial, que em alemão leva o nome de Revision, contra decisões definitivas na instância de apelação (§ 133, GVG,4 §§ 542, segs. do CPC). O STJ registra em matéria civil atualmente cerca de 3.200 a 3.600 ingressos anuais de recursos espe4 N. do T.: Gerichtsverfassungsordnung (GVG) = Lei Orgânica dos Tribunais. ciais e agravos de não admissibilidade. O recurso especial pode se basear somente na violação pelo acórdão recorrido de direito federal ou de um preceito, cujo âmbito de validade se estenda para além da jurisdição do Tribunal de Justiça do Estado – Oberlandesgericht – (§ 545, I), embora violações de normas de competência não sejam nele apreciadas (§ 545, II). O recurso especial tem lugar, desde a reforma do CPC em 2002, somente com a admissão pelo Tribunal de Apelação (§ 543, I, n. 1) ou – com provimento de um agravo de não admissibilidade – pelo próprio STJ (§§ 543, I, n. 2, 544). A revisão deve ser admitida – em princípio à semelhança do Brasil, no caso o recurso especial para Superior Tribunal de Justiça brasileiro, conforme o art. 105, inc. III, da CF –, quando a matéria for relevante e não repetitiva (§ 543, II, 1, n. 1); quando for exigido um pronunciamento do STJ para o desenvolvimento do Direito; ou para o asseguramento de uma jurisprudência uniforme (§ 543, II, 1, n. 2). Não há discricionariedade judicial para se definir qual o momento determinante para a presença desses pressupostos de admissibilidade; basicamente o momento é o do acórdão do Tribunal de Apelação, no agravo de não admissibilidade excepcionalmente é por ocasião do acórdão que decide a admissão pelo STJ. Em princípio, o STJ está vinculado pela decisão de admissibilidade do Tribunal da Apelação (§ 543, II, 2), no entanto, pode o STJ, se considerar que os pressupostos de admissibilidade não estão presentes, advertir as partes e dar vista ao recorrente para que se manifeste e, por decisão unânime, rejeitá-la, decisão essa cujo fundamento deve apenas fazer remissão à advertência anteriormente feita (§§ 552a, 522, II, 2 e 3). Essa ruptura da – em princípio – vinculação do STJ à decisão de admissibilidade do Tribunal da Apelação deve-se à compreensível pretensão de se imporem limites ao volume de trabalho; entretanto, sob o aspecto dogmático, o preceito, que foi introduzido na primeira Lei de Modernização da Justiça é, em última instância, uma quebra no sistema, embora venha resistindo ao controle judicial de constitucionalidade. série Cadernos do CEJ Excepcionalmente, com a concordância do recorrido, admite-se, presentes os mesmos pressupostos e com a supressão da instância de apelação, um envio do recurso especial diretamente ao STJ, chamado “recurso especial saltado” (§ 566). A tutela jurídica individual como finalidade do recurso especial é fortemente sobreposta pelo interesse público sob o pretexto de relevância fundamental (repercussão geral), desenvolvimento do direito e uniformização da jurisprudência. Ao lado do recurso especial em matéria cível, tem-se o agravo de não admissibilidade (Art. 93, I, n. 4a, da CF, § 13, n. 8a, da Lei Orgânica do TCF 5), quando se pode questionar um erro cardeal na aplicação e desenvolvimento do direito. Na prática, as fronteiras entre as lides de direito civil oriundas de lei ordinária e a garantia constitucional de jurisdição não raramente são difíceis de se determinarem. Uma alta densidade de controle de constitucionalidade e uma relativamente pequena barreira de intervenção podem dar a impressão, em alguns ramos do direito civil, de que às vezes se tem um recurso especial de constitucionalidade ou uma espécie de recurso extraordinário no STJ. Nos últimos anos, os números de ingressos de reclamações constitucionais (Verfassungsbescherde) têm apontado para uma tendência crescente contra acórdãos cíveis, passando de 1.859 (2005) para 2.587 (2009), e têm ocupado a maior parte da distribuição do Tribunal Constitucional Federal. O recurso especial, fortemente marcado pelos pressupostos de admissibilidade, tem, diante desse pano de fundo, também uma função de desafogar o Tribunal Constitucional Federal de uma carga de trabalho desproporcionalmente alta de decisões em reclamações constitucionais, fazendo com que a correção constitucional devida se dê na instância comum. O recurso à subsidiária reclamação constitucional em grande medida não se faz mais necessário, conforme o caso, embora obviamente nem todos os litígios possam ou devam ser afastados do Tribunal Constitucional Federal. 5 N. do T.: TCF = Tribunal Constitucional Federal 2 Relevância fundamental ou “repercussão geral” da matéria A primeira bastante ampla e indeterminada cláusula geral para a admissibilidade do recurso especial, prevista na lei é a relevância da matéria de mérito. (§ 543, II, 1, n. 1).6 Os requisitos de aperfeiçoamento ou desenvolvimento do direito e asseguramento da uniformização da jurisprudência (§ 543, II, 1, n. 2) são, conforme doutrina majoritária, apenas a concretização da relevância fundamental. Uma lide possui, assim, relevância fundamental, se ela levanta uma questão jurídica passível de recurso e carente de esclarecimento e que pode potencialmente se repetir em um número significativo e indeterminado de outros casos. Uma questão jurídica é, conforme a tese dominante, em princípio carente de esclarecimento, se sua resposta é controversa, se existe uma corrente doutrinária oposta ou, ainda, se não houver nenhum precedente de Corte superior que a pacifique. Como exemplos, as justificativas do projeto do governo aprovado – em parte confirmadas pelo STJ nesse ínterim – sobre processos-modelo ou testes, bem como processos, nos quais se trata de interpretação ou eficácia de cláusulas contratuais típicas, taxas contratuais, contratos de adesão, ou outras condições gerais de contratação. Relevância fundamental se atribui a uma questão jurídica que está na iminência de modificação jurisprudencial. O STJ reconhece relevância fundamental também, por exemplo, na ofensa a princípios processuais. Assume-se como relevante, que implica admissibilidade do recurso especial, quando se supere o caso concreto individual, conforme a doutrina amplamente majoritária, quando o vício jurídico exige que se dê à práxis, por meio de um julgado paradigmático, uma orientação referida àquele conjunto fático para os casos futuros. 3 Requisito da exigência para o desenvolvimento do direito O segundo pressuposto de admissibilidade de recurso especial para o STJ é a exigência de um 6 N. do T.: No Brasil, a relevância poderia ser tra- duzida por a repercussão geral. 71 72 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores acórdão com a finalidade de “aperfeiçoamento do nal de Justiça Europeu, de acordo com o art. direito” (§ 543, II, 1, n. 2, alt. 1). Segundo a algo 234 da EG (Art. 267 da AEUV). Essa ampliação nebulosa exposição de motivos do governo, à do fundamento de admissibilidade, que pretenqual o STJ aderiu na sua jurisprudência, este funde levar em consideração as particularidades damento revisional é admissível, quando o caso do direito civil e processual civil europeu, não concreto der margem para se estabelecer uma inencontra qualquer base na letra da lei. A sua terpretação de preceitos legais de direito material juridicidade é duvidosa, porque, em casos de ou processual ou preencher lacunas legais. Este possíveis diretrizes do Tribunal de Justiça Euroconceito dominante é, por vezes, tomado mais peu, em última análise e sem esforço, pode-se amplamente do que a versão legal; outras vezes, acolher no pressuposto da relevância fundaporém, mais estreitamente. Uma primeira ampliamental, conforme § 543, II, 1, n. 1. Muito meção verifica-se no fato de que a necessidade de nos é necessária – contra as justificativas da lei um acórdão paradigmático para a interpretação e do STJ – uma ampliação da admissibilidade legal nada tem a ver com o aperfeiçoamento do pelo aperfeiçoamento do direito a casos de indireito em sentido metodológico. Uma segunda terpretação legal, que, de certa forma, tocam ampliação da letra da lei ocorre no objetivo de a rotina dos tribunais de todas as instâncias e, colmatar lacunas de modo geral, de forma que por isso, devem ser atribuídos aos demais presnão só o aperfeiçoamento do direito para além supostos legais de admissibilidade (§ 543, I,1, da lei é incluído, mas também a analogia. n. 1, n. 2, alt. 2). A admissão do recurso especial com a finalidade do reconhecimento jurisprudencial A proibição geral de arbitrariedade é violada, quando o acórdão de uma analogia é sem dúvido Tribunal da Apelação não for sustentável juridicamente da plena de sentido, como no sob nenhum aspecto e se baseie em ponderações estranhas caso do aperfeiçoamento do ao objeto do litígio (“ilegalidade palpável“) [...] direito clássico, e deveria ter sido acolhida na ideia normativa do legislador da reforma de 2002. Além disso, o recurso especial será tamMais estreita é a fórmula interpretativa domibém admitido, conforme o § 543, II, 1, n. 2, alt. nante da exposição de motivos do governo, na 1, se o STJ almejar não seguir uma analogia ou medida em que ela estabelece a necessidade de desenvolvimento do direito adotado no acórum acórdão paradigma. Em razão dessa limitadão impugnado, sem que se necessitasse um ção, o STJ parte do princípio de que os pressuexame posterior da relevância fundamental, postos de admissibilidade só são preenchidos se, segundo o § 543, II, 1, n. 1. Isso não resulta da para o julgamento, faltarem total ou parcialmente letra da lei do pressuposto de admissibilidade, fatos passíveis de serem generalizados e tipificamas, sim, do sentido e finalidade positivada de dos para uma orientação paradigmática. A crítica forma inacabada na lei para colocar questões a essa restrição é, por um lado, de se acolher, pois de aperfeiçoamento do direito em sentido o material legislativo não contém nenhum ponto amplo nas mãos das instâncias superiores. Se de apoio expresso para a redução dos pressuhouver dúvida se as razões do acórdão quespostos feito pela instância especial. Entretanto, tionado se baseiam na interpretação da lei a opinião do STJ é baseada no critério normatiou no aperfeiçoamento do direito, leva-se à vo da exigência de uma decisão por parte do admissibilidade do recurso especial. tribunal revisional e deve ser aceita, em última A doutrina dominante quer admitir o recurso análise – principalmente por falta de garantia especial, por conta do aperfeiçoamento do constitucional do acesso individual das partes ao direito, se se cogitar de uma diretriz do Triburecurso especial na Alemanha. série Cadernos do CEJ 4 Exigência do asseguramento da uniformização da jurisprudência O maior campo de aplicabilidade prática é provavelmente o requisito de que o acórdão em sede especial atenda ao asseguramento da uniformização da jurisprudência (§ 543, II, 1, n. 2, alt. 2). Divergências em sentido estrito ocorrem quando o acórdão recorrido estabelece uma assertiva jurídica abstrata que diverge objetivamente de um acórdão de um tribunal superior ou de mesmo nível hierárquico ou de um colegiado do mesmo tribunal. Nas divergências na jurisprudência de diferentes tribunais de justiça estaduais, o STJ procura averiguar, se o acórdão que é parâmetro de comparação já era conhecido do Tribunal de Justiça no seu acórdão divergente, o que, eventualmente pode conduzir a um estreitamento não previsto na letra da lei, tampouco nos materiais legislativos e até contraria a sua finalidade de guarda da consistência da jurisprudência. Além disso, o asseguramento da uniformização da jurisprudência pode exigir a admissibilidade do recurso especial, conforme a doutrina dominante, também em casos de divergência em sentido mais amplo, na medida em que se deve evitar que “diferenças difíceis de tolerar surjam ou persistam na jurisprudência”, na qual a relevância do acórdão recorrido seja crucial para o direito como um todo. Julgamentos diversos em quadros fáticos idênticos sem signifcado especial para a jurisprudência em geral não se constituem em fundamento para a admissibilidade. Mesmo erros evidentes na aplicação do direito não fundamentam a admissibilidade do recurso especial, salvo se houver o perigo de repetição e reprodução do julgado. Isso vale, segundo a doutrina dominante, em princípio, tanto para violações contra o direito material, quanto processual. O STJ exige aqui pontos de referência concretos. Admite-se o perigo de repetição no caso de afastamento contínuo da jurisprudência do tribunal superior, e neste caso o STJ exige adicionalmente que o Tribunal de Apelação tenha adotado uma decisão divergente “de ma- neira censurável“, isto é, com conhecimento da jurisprudência do STJ. Perigo de repetição e reprodução ocorre, por exemplo, quando o fundamento do acórdão recorrido se baseia numa compreensão equivocada da jurisprudência do STJ ou quando se espera uma generalização e uma grande quantidade de casos futuros, ou, ainda, quando o Tribunal da Apelação reconhecidamente partiu de uma premissa equivocada não presente no texto. O critério decisivo é, portanto, sempre, se e em que medida o erro na decisão prejudica duradouramente o interesse geral. Independentemente de perigos concretos de repetição e reprodução, o interesse geral na manutenção da confiança na jurisprudência é tangenciado, especialmente, por ofensa a Direitos Fundamentais processuais previstos na CF ou outros acórdãos carentes de correção em virtude da Constituição. Em tais casos, que são raros na prática, a admissão do recurso especial contribui para uma desoneração do Tribunal Constitucional Federal, seja pelo afastamento da violação à Constituição, seja por causa de uma pré-apreciação do caso por um Tribunal Superior devido ao reforço da ideia de subsidiariedade da reclamação constitucional. Exemplos de violações de Direitos Fundamentais processuais são a ofensa contra a garantia do juiz natural (art. 101, I, 2, da CF) pela desconsideração arbitrária de normas de competência ou de deveres de submissão da questão atacada à instância competente, bem como a não observância do contraditório (art. 103, I, da CF) pela não apreciação de alegações das partes ou omissão de uma instrução judicial obrigatória (§, 139, II – V). Segundo a doutrina dominante, viola-se a garantia de tutela judicial constitucionalmente assegurada e, por isso, deve-se admitir o recurso especial, quando o Tribunal de Apelação recusa ao apelante a devolução de prazos para apelar ou para arrazoar a apelação por conta de exigência excessiva imposta ao seu procurador. A proibição geral de arbitrariedade é violada, quando o acórdão do Tribunal da Apelação não for sustentável juridicamente sob nenhum aspecto e se baseie em ponderações estranhas ao objeto do litígio 73 74 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores (“ilegalidade palpável“), ou quando imposições excessivas em relação à perspectiva de sucesso das alegações desembocam em tratamento desigual indevido. Uma violação do Tribunal da Apelação dos limites constitucionais do aperfeiçoamento judicial do direito, como se extrai dos Direitos Fundamentais em conjunto com o Princípio do Estado de Direito e da Separação dos Poderes, obriga da mesma forma à admissibilidade do recurso especial, por causa da divergência de característica constitucional (§ 543, II, 1, n. 2, alt. 2) e deveria, compreendendo-se corretamente o preceito, também ser um caso de admissibilidade para desenvolvimento do direito (§ 543, II, 1, n. 2, alt. 1). 5 Relevância do erro judicial para a decisão? Não esclarecido e em parte controverso é se e em que medida a admissibilidade do recurso especial depende da relevância do vício jurídico para a decisão. Conforme a jurisprudência do STJ, condiciona-se a admissibilidade do recurso como um pressuposto não escrito, que o erro de direito carente de correção seja relevante para a decisão no recurso especial. Devese, assim, indeferir, se o acórdão recorrido se mostrar correto em seu resultado por outros fundamentos. De modo geral o fundamento da admissibilidade está ausente também quando o Tribunal de Apelação rejeita a ação em decorrência de dois fundamentos, dos quais apenas a um deles se deve atribuir a relevância fundamental, enquanto o outro isoladamente considerado não preenche o pressuposto de admissibilidade, a ponto de ao STJ não decidir de maneira discrepante. O STJ também inadmite se o fundamento do acórdão recorrido contiver, além do vício passível de admissão do REsp, um ou mais erros, que, por sua vez, numa análise isolada, não permitem fundamentar a admissibilidade, ou se muitos erros do Tribunal de Apelação, atuando conjuntamente, no resultado conduzem a uma decisão correta. A limitação à admissibilidade de recursos especiais contida nessa jurisprudência vai muito longe, porque ela transforma questões de mérito do recurso especial num pressuposto de admissibilidade, sobrecarregando, dessa forma, o procedimento de admissibilidade. Por isso, afigura-se preferível a decisão de admissibilidade, contra a jurisprudência do STJ e a doutrina dominante, e renunciar inteiramente à exigência de relevância do erro jurídico para a decisão. 6 Avaliação dos pressupostos de admissibilidade do recurso especial alemão A admissibilidade do recurso especial, como ela foi concebida em essência pelo legislador da reforma do CPC, cumpre em princípio as expectativas legislativas, ao franquear o REsp naqueles casos que para a Administração da Justiça como um todo tem maior relevância. Com isso o recurso especial fica em relação de tensão com a tutela jurídica individual. A configuração em forma de obrigações a serem cumpridas para a admissibilidade é de se aplaudir, em princípio, mas encerra a dificuldade de uma concretização dificilmente objetivável de descrições normativas artesanais e, em parte, em forma de cláusulas gerais na formulação nem sempre feliz. Consequencia da admissibilidade do recurso especial, após a reforma, é a consideravelmente fortalecida ingerência, em determinados ramos do direito, da jurisprudência dos tribunais superiores, que frequentemente leva à precisão, mas às vezes também a uma casuística difícil de compreender. O esforço por uma decisão de admissibilidade transparente e vinculada juridicamente na forma de filigranas legislativas naufraga num preciosismo detalhista, como a jurisprudência e doutrina demonstram na realidade da práxis do recurso especial, que a decisão de admissibilidade orientada ao bem comum, sem deixar espaço para quaisquer discricionariedade judicial – quando muito – pode ser tomada em situações limítrofes apenas em parte e com enorme esforço. Uma restrição da admissibilidade de recursos especial com base no critério da relevância para a decisão do vício atacado é de se rejeitar no direito processual civil alemão, por falta de uma base jurídica suficiente. série Cadernos do CEJ IV Modelos de admissibilidade de recurso especial em Direito Comparado jurídico e declara em todos os casos anulação do acórdão da instância inferior e, conforme a circunstância, também do processo e remete a A tentativa de uma classificação do Direito aleuma outra Cour d’Appel (Art. 626, 627 C.p.c.). mão, em tema de pressupostos de admissibilidaForte acúmulo de trabalho e lentidão do processo de de recurso especial, começa com um quadro de cassação moveram o legislador já em 1991, comparativo com o Direito francês, inglês e o ao lado do recurso de cassação, estabelecer um dos EUA. processo incidente em matéria civil (saisine pour avis). Tribunais de instância podem com isso submeter à Cour de cassation uma quesLimitações do acesso individual às instâncias cíveis superiores tão jurídica até então não resão compensadas no sistema de recursos alemão na forma solvida pela mais alta Corte de reclamação constitucional (Verfassungsbeschwerde) para que ela decida – o papara o Tribunal Constitucional Federal [...] ralelo com o Vorabentscheidungsverfahren (processo incidente) do direito europeu é inconfundível. Ao 1 Europa contrário do Direito alemão, o direito processual constitucional francês não conhece a reclamação a) França constitucional individual. Um processo modelo incidental de direito constitucional existe na FranO direito processual civil francês qualifica o reça somente a partir de 1º de março de 2010 (saicurso de cassação para a Cour de Cassation (poursine par voie d’exception, Art. 61-1 Const.). voi en cassation) como recurso extraordinário, b) Inglaterra pois não se atribui efeito suspensivo que impeça a execução. Conforme o art. 605 C.P.C., cabe a Na Inglaterra, com efeito a partir de 1º de cassação apenas quando o acórdão recorrido outubro de 2009, ingressou a Supreme Court of não seja atacável por nenhum outro recurso. A the United Kingdom em lugar da House of Loradmissibilidade pelo Tribunal de Apelação (cour ds como mais alta instância em matéria civil. d’appel) não é necessária. Originalmente a Cour Como acontecia sob o direito anterior, o acesso de cassation não podia recusar o recebimento de a essa mais alta instância é condicionada à adum recurso de cassação. Consequentemente remissibilidade do appeal, que deve ser pleiteada gistrava a Cour de cassation em matéria civil cerca primeiro junto ao tribunal inferior (em regra de cinco a seis vezes mais ingressos de recursos a Court of Appeal) (S. C. R. 10 [2]). A admissido que o STJ alemão. A reforma de 2001 permitiu bilidade pelo iudex a quo é vinculante para a o rechaço de recursos de cassação inadmitidos Supreme Court, o indeferimento pelo tribunal ou improvidos por meio de uma Câmara de três inferior abre a possibilidade de um pedido de magistrados sem qualquer fundamentação (déciadmissão pela Supreme Court. A decisão está sion de non-admission), na qual é duvidoso afinal, – diferentemente da Alemanha – em qualquer se se cuidou de uma inadmissibilidade ou rejeicaso na livre discricionariedade do tribunal ção, ou se se tratou de um não conhecimento envolvido, excepcionalmente pode vir à baila por inadmissibilidade ou improvimento evidente uma apelação saltada vinda de uma High Court no mérito. ou de uma Divisional Court diretamente para A Cour de cassation registrou, em 2008, 18.684 a Supreme Court, caso uma parte de acordo julgamentos em matéria cível, dentre elas cerca com a outra assim requererem e a High Court e de 21% decisions de non-admission. A decisão poSupreme Court admitirem. sitiva da Cour de cassation decorre de um exame 75 76 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Em 2007 foram, ao todo, 172 petitions protocoladas em matéria civil e for leave to appeal 46 admitidas – para a escala continental-europeia números reduzidíssimos. Enquanto para o direito inglês é estranha a ideia de verdadeiros direitos fundamentais e um tribunal constitucional à parte com acesso a cidadãos, a exemplo da reclamação constitucional de proveniência alemã, pode ser objeto do appeal para a Supreme Court mesmo a violação das garantias do Human Rights Act de 1998 (S. C. R. 40), que a Convenção Europeia de Direitos Humanos transformou em direito nacional. 2 EUA a) A separação entre jurisdição federal e estadual Inicialmente, existe nos EUA uma clara separação entre as jurisdições federal e estaduais. O Poder Judiciário basicamente fica nas mãos dos Estados, desde que não haja transferência expressa da matéria a um tribunal federal. Em federal question-cases e diversity of citizenshipcases é competente a jurisdição federal, apesar de questões relevantes envolvendo tanto normas federais quanto estaduais opcionalmente possam ser apreciadas pelos tribunais estaduais. Já nas causas baseadas em diversidade de domicílio de autor e réu, embora se possa processar e negociar perante cortes estaduais, pode o réu, no entanto, obrigar à remessa ao juízo federal competente (removal). b) O acesso à U.S. Supreme Court A U.S. Supreme Court funciona primariamente como o mais alto tribunal de recursos da jurisdição federal. Apeláveis são os acórdãos das U.S. Courts of Appeal, caso a U.S. Supreme Court conceda um writ of certiorari (28 U.S.C. § 1254 [1]). Aqui vale o princípio da discretionary review, do acesso das partes ao recurso extraordinário ou especial condicionada à discricionariedade da U.S. Supreme Court. A decisão de admissibilidade decorre, em princípio independente de qual- quer vinculação jurídica, de uma petition de uma parte, se no mínimo quatro em nove ministros votarem favoravelmente (“rule of four”). Muito excepcionalmente se encontra uma direct appeal para Supreme Court com preterição da instância de apelação e sem writ of certiorari diretamente contra as injunctions emanadas por três juízes da District Courts (28 U.S.C. § 1253). Além disso pode um writ of certiorari ser concedido também contra acórdãos de última instância dos tribunais estaduais, caso a violação de uma norma federal – seja ela constitucional ou infraconstitucional – seja demonstrada de maneira plausível (28 U.S.C. § 1257 [a]). Ao lado do acesso discricionário, existe a possibilidade da submissão de uma questão jurídica à Supreme Court pela U.S. Court of Appeals (certification 28 U.S.C. § 1254 [2]). Em cerca de 7.700 novos processos no ano judiciário de 2008/09 foram deferidos, em apenas 85 casos, um writ of certiorari, que permitiram um exame de mérito. Embora em geral a U.S. Supreme Court tenha, em concorrência com os tribunais de instância, a função de um guardião de último grau de todo o direito federal, não existe uma reclamação constitucional específica no sentido de uma pretensão individual de exame constitucional. c) O acesso às Supreme Courts dos Estados O sistema judicial estadual é em regra estruturado em três níveis, em alguns casos, porém, sem uma instância intermediária. Em matéria cível o acesso individual é regrado eventualmente conforme o Estado, mas, numa primeira análise, apresenta linhas mestras comuns. Predomina também nos Estados o recurso especial discricionário. Em parte a discricionariedade das Supreme Courts é restringida na forma de alguns parâmetros de apreciação, os quais obrigatoriamente ou em regra devem ser preenchidos para vir à instância revisional, ou na forma de alguns requisitos alternativos de admissibilidade, cuja ocorrência resulta normalmente na aceitação do recurso. Além disso, existem processos incidentais para solucionar questões submetidas a requerimento de tribunais inferiores na própria série Cadernos do CEJ jurisdição estadual ou federal ou, em certas circunstâncias, também das últimas instâncias de tribunais estaduais de mesmo grau (certification). Não há Tribunais Constitucionais específicos; e na jurisdição estadual existem processos constitucionais individuais para casos de habeas corpus. 3 Avaliação dos três modelos básicos de acesso ao recurso especial O estudo comparativo demonstra três modelos básicos de acesso individual às instâncias superiores em matéria civil. As duas posições extremas ocupam o modelo francês e o norte-americano, que equivale, em princípio, também ao modelo da Supreme Court inglesa. No modelo francês há originalmente um direito ilimitado à Cour de cassation, que, entretanto, é visivelmente relativizada pela possibilidade de recusa desmotivada por inadmissão ou improvimento evidente. A U.S. Supreme Court decide, ao contrário, conforme a livre discricionariedade judicial sobre a admissibilidade de um recurso especial ou extraordinário; de forma semelhante julga a Supreme Court inglesa tanto por admissibilidade discricionariamente do iudex a quo, quanto pelo exercício desse poder discricionário na Corte. Uma solução intermediária pratica o direito alemão e – de forma parecida – o californiano com um direito à admissibilidade condicionado e, em parte, o direito processual dos Estados norteamericanos, que restringem a discricionariedade pelo estabelecimento de parâmetros a esse poder. Assim, verifica-se claramente que a admissibilidade condicionada em lei do acesso ao STJ alemão é reforçada pela possibilidade de uma reclamação constitucional individual e, em comparação com o direito californiano, a tutela individual em matéria cível é fortalecida. Um sistema processual sem qualquer acesso individual às instâncias supremas não se verifica no Direito Comparado. A submissão de questões incidentes confere acesso individual às instâncias civis mais altas e podem abrandar as debilidades da tutela individual pelo menos em parte. Nenhum dos modelos examinados remete a questão incidental controvertida em matéria cível de um jurisdicionado iso- ladamente. Trata-se aqui de processos incidentais como puro remédio constitucional, a exemplo do controle concreto de normas de origem alemã, na qual se submete a questão constitucional pelo juiz (art. 100 da CF), ou o novo incidente para o Conseil constitutionnel francês, como também na forma de puro instrumento de simplificação e desoneração processual civil, como por exemplo, a questão cível incidente submetida à Cour de cassation. Uma forma mista são os processos incidentais do direito federal e estadual norteamericano, que servem para esclarecer questões constitucionais e infraconstitucionais. Limitações do acesso individual às instâncias cíveis superiores são compensadas no sistema de recursos alemão na forma de reclamação constitucional (Verfassungsbeschwerde) para o Tribunal Constitucional Federal, enquanto nos outros modelos processuais examinados não se confere nenhuma tutela jurídica comparável. Pode até haver uma razão para que a recém-introduzida non-admission do pourvoi en cassation sem motivação, que, essencialmente se afigura uma ruptura no sistema, seja confrontada na doutrina francesa e, às vezes, com críticas contundentes. V Síntese 1. O legislador não é constitucionalmente obrigado a franquear um recurso especial; se ele, no entanto, previr uma instância revisional, não deve ser o seu acesso dificultado de forma inexigível, nem razões objetivas devem, mesmo de forma justificável, dificultá-lo ainda mais. Além disso, a margem de apreciação legislativa é limitada, na concepção dos pressupostos de admissibilidade, por meio dos Princípios da Clareza e Determinação das Normas, bem como da Isonomia. Os tribunais são designados constitucionalmente para concretizar pressupostos de admissibilidade dispostos em forma de cláusulas gerais e para se alcançar um parâmetro uniforme e claro para o jurisdicionado. A disciplina infraconstitucional dos pressupostos de admissibilidade e sua aplicação pelos tribunais de instância e STJ-alemão correspondem a essas exigências constitucionais. 77 78 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores 2. O recurso especial deve ser admitido se a matéria litigiosa tiver relevância fundamental. Assume-se que ela incide quando se tratar de questão jurídica recorrível e carente de esclarecimento e que pode surgir para um conjunto indeterminado de outros casos, como, por exemplo, em processos-modelos, litígios sobre interpretação de cláusulas contratuais típicas ou condições gerais de contratação, violação de princípios processuais ou quando se estiver na iminência de modificação na jurisprudência. 3. O pressuposto de admissibilidade de exigência de uma decisão do STJ para o desenvolvimento do direito, como caso particular da relevância fundamental, é uma interpretação por demais extensiva. Ele compreende não só a colmatação de lacunas pelo desenvolvimento do direito para além da lei, mas também casos de analogia. Nesse caso, o recurso especial deve ser admitido se o STJ quiser ou tiver de confirmar ou realizar uma colmatação de lacuna por esse fundamento, como também quando ele não pretender a colmatação de lacuna realizada pelo acórdão recorrido. A possibilidade de submissão da questão em processo incidental ao Tribunal de Justiça Europeu não é, ao contrário da doutrina dominante, normalmente caso de desenvolvimento ou aperfeiçoamento do direito, mas de relevância fundamental. 4. Por fim, exige-se, para a admissibilidade do recurso especial, que o acórdão revisional sirva para assegurar a uniformização da jurisprudência. Divergência jurisprudencial pode se basear em discrepâncias na jurisprudência dos Tribunais de Justiça dos Estados (Oberlandesgerichte) ou por afastamento de arestos do STJalemão. Para preencher excepcionalmente esse requisito independentemente dessa exigência, faz-se necessário, de acordo com a jurisprudência do STJ, de se citar um acórdão paradigma, em regra, para os casos de perigo de repetição ou reprodução, trata-se de recurso especial por erros de direito de qualidade ou característica constitucional. 5. A relevância do erro de direito, em oposição à jurisprudência do STJ-alemão, à falta de base legal, não deve ser reconhecida como pressuposto de admissibilidade, e fica reservada à questão de mérito do recurso especial. 6. A comparação entre Alemanha, França, Inglaterra e EUA demonstrou existir três modelos básicos de acesso à instância especial: basicamente, ilimitado acesso na França; a admissibilidade sujeita à livre discricionariedade na U.S. Supreme Court e na Supreme Court inglesa; e a admissibilidade legalmente condicionada no processo civil alemão, que implementou uma solução intermediária com esforço na simetria e transparência, cuja concretização e aplicação prática, no entanto, é bastante dispendiosa. série Cadernos do CEJ Zulassungsvoraussetzungen bei der Revision zum BGH I.Aufgabenstellung Die Revision als prozessuales Remedium gegen Rechtsanwendungsfehler der Gerichte erfährt in wichtigen Prozessordnungen teilweise stark divergierende Ausgestaltung. Die Frage, ob unter welchen Voraussetzungen die Prozessparteien Zugang zur Revisionsinstanz erlangen, ist dabei von herausgehobenem wissenschaftlichem und praktischem Interesse, birgt die Antwort darauf doch für die Erfolgsaussichten der Urteilsanfechtung eine Vorentscheidung. Eine rechtsvergleichende Betrachtung ist schon deswegen lohnend, weil sie Aufschluss über den Umgang einer Prozessrechtskultur mit der Möglichkeit fehlsamer justizförmiger Rechtspflege und der Remedur auf Initiative der Prozessparteien gibt. In Europa stellt sich angesichts völligen Fehlens eines individuellen Revisionszugangs zum Europäischen Gerichtshof zudem die Frage künftiger Ausformung und Fortentwicklung des europäischen Zivilprozessrechts. Im deutschen Zivilprozess rangiert die Revision – anders als in Brasilien (Art. 102 und 105 Constituiçao Federal) – im Kreis der ordentlichen Rechtsmittel. Seit der Reform 2002 findet die Revision nach deutschem Zivilprozessrecht nur statt, wenn entweder das Berufungsgericht im Berufungsurteil (§ 543 I Nr. 1 ZPO) oder das Revisionsgericht auf Nichtzulassungsbeschwerde (§ 543 I Nr. 2 ZPO) sie zugelassen hat, wo- bei die gerichtliche Zulassungsentscheidung rechtlich gebunden ist. Die Wertrevision alten Rechts ist abgeschafft. Für das Verständnis des Revisionsrechts sind Auslegung und praktische Handhabung der Zulassungsvoraussetzungen durch die Berufungsgerichte und den Bundesgerichtshof von besonderer Bedeutung. Nach einer kurzen Skizze der verfassungsrechtlichen Rahmung (II.) sind zunächst die Zulassungsvoraussetzungen des deutschen Revisionsrechts darzustellen (III.). Anschließend werden die Zulassungsvoraussetzungen des deutschen Rechts im Rechtsvergleich mit Frankreich, England und den USA eingeordnet und gewürdigt (IV.). Am Schluss erfolgt eine Zusammenfassung in Thesen (V.) II.Verfassungsrechtliche Rahmung Die verfassungsrechtliche Justizgewährleistung garantiert dem Einzelnen den ungehinderten Zugang zur gerichtlichen Verwirklichung seiner materiellrechtlich radizierten Rechtspositionen. Der freiheitliche Rechtsstaat, der das Gewaltmonopol für sich beansprucht und Selbsthilfe grundsätzlich untersagt, schuldet dem Rechtsunterworfenen nach h.M. nicht nur verfahrensförmigen Rechtsschutz in Gestalt des zivilprozessualen Erkenntnisverfahrens, sondern auch die Möglichkeit zur Zwangsvollstreckung als Rechtsinstitut des Zivilverfahrensrechts. Gewährleistet ist damit nach Ansicht des BVerfG und h.M. zwar der Zugang zu Gericht, nicht aber ein Instanzenzug. Die Verfassung garantiere – so das Hauptargument aus Art. 19 IV GG – Rechtsschutz durch den Richter und nicht gegen den Richter. Dieses Diktum hat das BVerfG in einer Plenarentscheidung dahingehend modifiziert, dass der Gesetzgeber kraft Verfassung gehalten sei, eine ausdrückliche umfassende Regelung fachgerichtlicher Abhilfe bei Gehörsverletzung zu schaffen. Damit ist zwar Rechtsschutz gegen richterliche Entscheidungen sektoral gewährleistet, nicht aber unbedingt durch eine höhere Instanz. Ob diese relativ restriktive Grundlinie tatsächlich der Weisheit letzter Schluss ist oder ob die Justizgewährleistung, die das BVerfG aus den Grundrechten in Verbindung 79 80 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores mit dem Rechtsstaatsprinzip (Art. 2 I, 14 I, 20 III doch festzuhalten, dass das BundesverfassungsgeGG) und nicht aus Art. 19 IV GG entnimmt, eine richt die Neuregelung im Prinzip voll sanktioniert Fehlerkontrolle durch die nächsthöhere Instanz hat. Ohne eine Änderung dieser Grundlinie kann von Verfassungs wegen nicht doch zumindest dort ein verfassungsrechtlicher Angriff gegen die Zuerfordert, wo eine Überprüfung innerhalb dersellassungsregelung mit Aussicht auf Erfolg allenfalls ben Instanz oder gar durch denselben Spruchköraufgrund der praktischen Handhabung geführt per typischerweise versagt, ist ein weites Feld, das werden. im vorliegenden Zusammenhang allerdings nicht III. Die Revisionszulassung im voll ausgeschritten werden soll. deutschen Zivilprozessrecht Es entspricht indessen gefestigter verfassungsgerichtlicher Judikatur, dass immer dann, wenn der Gesetzgeber – wie in der ZPO und in praktis1. Grundzüge ch allen Verfahrensordnungen – ein Rechtsmittel vorsieht, der Zugang zur nächsten Instanz von Das deutsche Zivilprozessrecht eröffnet indiviVerfassungs wegen nicht in unzumutbarer, aus duellen Zugang zum BGH in Gestalt der Revision Sachgründen nicht mehr zu rechtfertigender gegen Endurteile der Berufungsinstanz (§ 133 Weise erschwert werden darf. Diesem relativ GVG, §§ 542 ff. ZPO). Der BGH verzeichnet in großzügigen Maßstab hält die gesetzliche ZuZivilsachen gegenwärtig jährlich rund 3.200 bis lassungsregelung im Prinzip stand. Das Bundes3.600 Neueingänge (Revisionen und Nichtzulasverfassungsgericht hat die Verfassungsmäßigkeit sungsbeschwerden). Die Revision kann nur dader Regelung der Zulassungsvoraussetzungen rauf gestützt werden, dass die Entscheidung des konsequenterweise in zwei Entscheidungen der Berufungsgerichts auf der Verletzung von Bun1. Kammer des Ersten Senats grundsätzlich besdesrecht oder einer Vorschrift beruht, deren Geltätigt. Danach hat der Gesetzgeber seinen weiten tungsbereich sich über den Bezirk eines OberlanGestaltungsspielraum ausgeschöpft und die Grendesgerichts hinaus erstreckt (§ 545 I ZPO), wobei zen der Normenklarheit, Normenbestimmtheit Verstöße gegen Zuständigkeitsvorschriften außer und des allgemeinen Gleichheitssatzes gewahrt. Betracht bleiben (§ 545 II ZPO). Die Gerichte müssten die Tatbestandsvoraussetzungen der Zulassungsregelung Des Rekurses auf die subsidiäre Verfassungsbeschwerde bedarf – so die Kammerentscheies dann unter Umständen nicht mehr, wenngleich zwar eine dungen – wie es nach anVielzahl, aber selbstverständlich keineswegs alle Streitigkeiten vom fänglichen Schwierigkeiten Bundesverfassungsgericht ferngehalten werden können noch sollen. schon bislang in genügender Weise geschehen sei, weiter konkretisieren und Die Revision findet seit der ZPO-Reform 2002 dabei zu einer einheitlichen und für den Rechtsunur statt bei Zulassung durch das Berufungsgechenden eindeutigen Linie kommen. Dabei geht richt (§ 543 I Nr. 1) oder – auf Nichtzulassundie 1. Kammer des Ersten Senats auf das Spangsbeschwerde – durch den BGH selbst (§§ 543 nungsverhältnis zwischen der eingeforderten I Nr. 2, 544 ZPO). Zuzulassen ist die Revision – Rechtsprechungseinheitlichkeit und der richterim Prinzip ähnlich wie in Brasilien die einfache lichen Unabhängigkeit (Art. 97 I GG) allerdings Revision zum Superior Tribunal de Justiça gemäß mit keinem Wort ein. Mag man auch geteilter Art. 105 Abs. 3 Constituiçao Federal –, wenn die Meinung darüber sein, ob die verfassungsgeriRechtssache grundsätzliche Bedeutung hat (§ 543 chtliche Behandlung der Verfassungsmäßigkeit II 1 Nr. 1 ZPO) oder wenn die Rechtsfortbildung der Revisionszulassungsregelung durch Kammeoder die Sicherung einer einheitlichen Rechtsprerentscheidungen eine glückliche Lösung ist, so ist série Cadernos do CEJ chung eine Entscheidung des Revisionsgerichts erfordern (§ 543 II 1 Nr. 2 ZPO). Es besteht kein gerichtliches Ermessen. Maßgeblicher Zeitpunkt für das Vorliegen der Zulassungsvoraussetzungen ist grundsätzlich der Zeitpunkt der Entscheidung durch das Berufungsgericht, bei Nichtzulassungsbeschwerde ausnahmsweise der Zeitpunkt der Entscheidung über die Zulassung durch den BGH. Das Revisionsgericht ist zwar an die Zulassungsentscheidung des Berufungsgerichts grundsätzlich gebunden (§ 543 II 2 ZPO), doch kann der BGH, falls er dafür hält, dass die Voraussetzungen für die Zulassung der Revision nicht vorliegen, die Revision nach Hinweis an die Parteien und möglicher Stellungnahme durch den Revisionskläger durch einstimmigen Beschluss zurückweisen, der nur insoweit der Begründung bedarf, als die Gründe nicht bereits im vorangegangenen Hinweis genannt worden sind (§§ 552a, 522 II 2 und 3 ZPO). Diese Durchbrechung der grundsätzlichen Bindung des BGH an die Zulassungsentscheidung des Berufungsgerichts ist dem verständlichen Bestreben nach einer Beschränkung des Arbeitsaufkommens geschuldet, in dogmatischer Hinsicht ist die Vorschrift, die durch das 1. Justizmodernisierungsgesetz eingefügt worden ist und verfassungsgerichtlicher Kontrolle standhält, allerdings letztlich gleichwohl ein Systembruch. Ausnahmsweise ist mit Zustimmung des Prozessgegners bei sonst gleichen Voraussetzungen und unter Übergehung der Berufungsinstanz eine Sprungrevision zulässig (§ 566 ZPO). Der Individualrechtsschutz ist als Revisionsziel durch das öffentliche Interesse in Gestalt von Grundsatzbedeutung, Rechtsfortbildung und Rechtsprechungseinheit stark überlagert. Neben die Revision in Zivilsachen tritt die Verfassungsbeschwerde (Art. 93 I Nr. 4a GG, § 13 Nr. 8a BVerfGG), mit der Kardinalfehler bei der Anwendung und Fortbildung des Zivilrechts geltend gemacht werden können. Praktisch sind die Grenzen zwischen einfachgesetzlicher Zivilrechtsstreitigkeit und verfassungsrechtlicher Gewährleistung nicht selten schwer zu bestimmen. Hohe verfassungsgerichtliche Kontrolldichte und relativ niedrige Interventionsschwellen können in manchen Gebieten des Zivilrechts zeitweise durchaus den Eindruck einer verfassungsbasierten Superrevision entstehen lassen. In den letzten Jahren bewegten sich die Eingangszahlen für Verfassungsbeschwerden gegen Zivilurteile mit steigender Tendenz zwischen 1.859 (2005) und 2.587 (2009) und nehmen damit den Löwenanteil aller Eingänge beim Bundesverfassungsgericht in Anspruch. Die Revision, wie sie durch die zivilprozessualen Zulassungsvoraussetzungen maßgeblich geprägt ist, hat vor diesem Hintergrund letztlich auch die Funktion, das Bundesverfassungsgericht von einer unverhältnismäßig starken Belastung mit Urteilsverfassungsbeschwerden zu entlasten, indem verfassungsrechtlich gebotene Korrektur im ordentlichen Instanzenzug erfolgt. Des Rekurses auf die subsidiäre Verfassungsbeschwerde bedarf es dann unter Umständen nicht mehr, wenngleich zwar eine Vielzahl, aber selbstverständlich keineswegs alle Streitigkeiten vom Bundesverfassungsgericht ferngehalten werden können noch sollen. 2.Grundsätzliche Bedeutung der Rechtssache Der erste im Gesetz genannte Grund und gleichsam die sehr weit und unbestimmt gefasste Generalklausel für die Zulassung der Revision ist die grundsätzliche Bedeutung der Rechtssache (§ 543 II 1 Nr. 1 ZPO). Rechtsfortbildung und Sicherung der Rechtsprechungseinheitlichkeit (§ 543 II 1 Nr. 2 ZPO) sind nach h.M. lediglich Konkretisierungen der Grundsatzbedeutung. Eine Rechtssache ist dann von grundsätzlicher Bedeutung, wenn sie eine revisible und klärungsbedürftige Rechtsfrage aufwirft, die sich in einer unbestimmten Vielzahl weiterer Fälle stellen kann. Eine Rechtsfrage ist nach h.L. grundsätzlich klärungsbedürftig, wenn ihre Beantwortung zweifelhaft ist oder wenn zu ihr gegenläufige Literaturstimmen vorliegen und noch keine höchstrichterliche Klärung erfolgt ist. Als Beispiele nennt die Regierungsbegründung – teilweise inzwischen durch den BGH bestätigt – Modell- oder Musterprozesse sowie Verfahren, in denen es um die Auslegung oder Wirksamkeit typischer Vertragsbestimmungen, Tarife, Formu- 81 82 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores larverträge oder anderer allgemeiner Geschäftsbedingungen geht. Grundsatzbedeutung kommt einer Rechtsfrage bei bevorstehender Änderung der Rechtsprechung zu. Der BGH erkennt Grundsatzbedeutung beispielsweise auch bei der Verletzung von Verfahrensgrundsätzen an. Eine über den Einzelfall hinausweisende Bedeutung, die eine Zulassung der Revision gebietet, soll nach weitgehender wohl h.L. schon dann anzunehmen sein, wenn der Rechtsfehler es erfordert, der Praxis durch eine Leitentscheidung sachverhaltsbezogene Orientierung für künftige Fälle zu geben. 3. Erforderlichkeit zur Rechtsfortbildung Der zweite Zulassungsgrund für die Revision zum BGH ist die Erforderlichkeit der revisionsgerichtlichen Entscheidung zum Zwecke der Rechtsfortbildung (§ 543 II 1 Nr. 2 Alt. 1 ZPO). Nach der in diesem Punkt etwas unscharfen Regierungsbegründung, welcher der BGH in seiner Rechtsprechung folgt, ist dieser Zulassungsgrund dann einschlägig, wenn der Einzelfall Veranlassung gibt, Leitsätze für die Auslegung von Gesetzesbestimmungen des materiellen oder des Verfahrensrechts aufzustellen oder Gesetzeslücken auszufüllen. Diese herrschende Formel ist einerseits weiter gefasst als die Gesetzesfassung, andererseits aber auch enger. Die erste Weiterung zeigt sich darin, dass die Notwendigkeit einer Leitentscheidung zur Gesetzesauslegung mit Rechtsfortbildung im methodischen Sinne nichts zu tun hat. Die zweite Ausdehnung des Gesetzeswortlauts liegt im Abheben auf Lückenschließung allgemein, so dass nicht nur die gesetzesübersteigende Rechtsfortbildung, sondern auch die Analogie erfasst ist. Die Zulassung der Revision zum Zwecke der höchstrichterlichen Anerkennung einer Analogie ist zweifelsohne ebenso sinnvoll wie im Fall der klassischen Rechtsfortbildung und dürfte in den Regelungswillen des Reformgesetzgebers 2002 mit aufgenommen sein. Darüber hinaus wird die Revision auch dann nach § 543 II 1 Nr. 2 Alt. 1 ZPO zuzulassen sein, wenn der BGH einer im angefochtenen Urteil zugrunde gelegten Analo- gie oder Rechtsfortbildung nicht zu folgen beabsichtigt, ohne dass es einer weiteren Prüfung der Grundsatzbedeutung nach § 543 II 1 Nr. 1 ZPO bedürfte. Das ergibt sich zwar nicht aus dem Wortlaut des Zulassungstatbestandes, wohl aber aus dem unvollkommen formulierten Sinn und Zweck des Gesetzes, Fragen der Rechtsfortbildung im weiteren Sinne in die Hände der höchsten Instanz in Zivilsachen zu legen. Soweit unklar ist, ob sich die Begründung des angefochtenen Urteils auf Gesetzesauslegung oder Rechtsfortbildung stützt, ist die Revision im Zweifel zuzulassen. Die wohl h.L. will die Revision aus Gründen der Rechtsfortbildung auch dann zulassen, wenn eine Vorlage an den EuGH nach Art. 234 EG (Art. 267 AEUV) in Betracht kommt. Diese Ausdehnung des Zulassungsgrundes, die den Besonderheiten des europäischen Zivil- und Zivilprozessrechts Rechnung tragen soll, findet im Gesetzeswortlaut ebenfalls keine Stütze. Ihre Berechtigung ist zweifelhaft, weil in Fällen möglicher Vorlage an den EuGH letztlich zwanglos Grundsatzbedeutung nach § 543 II 1 Nr. 1 ZPO angenommen werden kann. Ebenso wenig bedarf es – entgegen Gesetzesbegründung und BGH – einer Ausdehnung des Zulassungsgrundes der Rechtsfortbildung auf Fälle der Gesetzesauslegung, die gewissermaßen das Tagesgeschäft der Gerichte aller Instanzen betreffen und deshalb in den übrigen Zulassungstatbeständen zu verorten sind (§ 543 I 1 Nr. 1, Nr. 2 Alt. 2 ZPO). Enger ist die herrschende Auslegungsformel der Regierungsbegründung insoweit, als sie das Erfordernis einer Leitentscheidung aufstellt. Auf der Grundlage dieser Einschränkung geht der BGH davon aus, die Zulassungsvoraussetzung sei nur erfüllt, wenn es für die Beurteilung typischer oder verallgemeinerungsfähiger Lebenssachverhalte an einer richtungweisenden Orientierung ganz oder teilweise fehle. Der Kritik an dieser Restriktion ist zwar zuzugeben, dass die Gesetzesmaterialien keinen ausdrücklichen Anhaltspunkt für die höchstrichterliche Verengung der Zulassungsvoraussetzung beinhalten. Doch lässt sich die Auffassung des BGH insoweit auf das Tatbestandsmerkmal der Erforderlichkeit der revisionsgerichtlichen Entscheidung stützen und dürfte – nicht zuletzt mangels verfassungsrechtli- série Cadernos do CEJ cher Gewährleistung des individuellen Zugangs der Prozessparteien zur Revision in Deutschland – letztlich vertretbar sein. Rechtsprechung insgesamt sind kein Zulassungsgrund. Selbst offensichtliche Rechtsanwendungsfehler begründen nicht die Pflicht zur Zulassung der Revision, es sei denn, es besteht Wiederho4.Erforderlichkeit zur Sicherung der lungs- oder Nachahmungsgefahr. Das gilt nach Einheitlichkeit der Rechtsprechung h.M. im Prinzip sowohl für Verstöße gegen das materielle als auch gegen das Verfahrensrecht. Den praktisch wohl größten AnwendungsbeDer BGH verlangt konkrete Anhaltspunkte. Wiereich hat die Erforderlichkeit revisionsgerichtliderholungsgefahr ist etwa anzunehmen bei stäncher Entscheidung zur Sicherung der Einheitlidiger Abweichung von höchstrichterlicher Rechkeit der Rechtsprechung (§ 543 II 1 Nr. 2 Alt. chtsprechung, wobei der BGH zusätzlich verlangt, 2 ZPO). Divergenz im engeren Sinne liegt dann das Berufungsgericht müsse „in vorwerfbarer vor, wenn die angefochtene Entscheidung eiWeise“, also in Kenntnis von der Rechtsprechung nen tragenden abstrakten Rechtssatz aufstellt, des BGH abgewichen sein. der von einem tragenden abstrakten Rechtssatz Wiederholungs- und Nachahmungsgefahr in der Entscheidung eines höherrangigen oder sind beispielsweise indiziert, wenn die Begrüngleichrangigen Gerichts oder eines Spruchkördung der angefochtenen Entscheidung auf einem pers desselben Gerichts objektiv abweicht. Bei grundlegenden Missverständnis der höchstriAbweichungen in der Rechtsprechung unterschterlichen Rechtsprechung beruht oder wenn chiedlicher Oberlandesgerichte stellt der BGH sie sich verallgemeinern lässt und eine kritische darauf ab, ob die Vergleichsentscheidung dem Masse künftiger Fälle zu erwarten ist oder wenn Berufungsgericht bei seiner objektiv divergierendas Berufungsgericht erkennbar von einem nicht den Entscheidung bereits bekannt war, was unter formulierten unrichtigen Obersatz ausgegangen Umständen zu einer weder im Gesetzeswortlaut ist. Entscheidendes Kriterium ist mithin auch insonoch in den Gesetzesmaterialien vorgezeichneten weit stets, ob und inwieweit die Fehlentscheidung Verengung führen kann und dem Gesetzeszweck das Allgemeininteresse nachhaltig berührt. der Wahrung der Konsistenz der Rechtsprechung Unabhängig von konkreter Wiederholununter Umständen zuwiderläuft. gs- oder Nachahmungsgefahr ist das Interesse der Allgemeinheit an der Wahrung des Vertrauens Das allgemeine Willkürverbot ist verletzt, wenn die in die Rechtsprechung tanEntscheidung des Berufungsgerichts unter keinem denkbaren giert, insbesondere bei VerAspekt rechtlich vertretbar ist und daher auf sachfremden letzungen von VerfahrensErwägungen beruht („greifbare Gesetzeswidrigkeit“) [...] grundrechten oder bei sonst von Verfassungs wegen korrekturbedürftiger EntscheiDarüber hinaus kann die Sicherung der Einheidung. In solchen praktisch eher seltenen Fällen tlichkeit der Rechtsprechung die Zulassung der trägt die Zulassung der Revision zur Entlastung Revision nach h.M. auch in Fällen der Divergenz des Bundesverfassungsgerichts bei, sei es durim weiteren Sinne erfordern, sofern vermieden ch Behebung des Verfassungsverstoßes, sei es werden soll, dass „schwer erträgliche Unterschiedurch höchstrichterliche Vorklärung im Sinne de in der Rechtsprechung entstehen oder fortbeseine Stärkung der Subsidiarität der Verfassuntehen“, wobei die Bedeutung der angefochtenen gsbeschwerde. Beispiele für die Verletzung von Entscheidung für die Rechtsprechung im Ganzen Verfahrensgrundrechten sind der Verstoß gegen maßgeblich ist. die Garantie des gesetzlichen Richters (Art. 101 Unterschiedliche Beurteilungen identischer I 2 GG) in Gestalt willkürlicher Missachtung von Sachverhalte ohne besondere Bedeutung für die Zuständigkeitsvorschriften oder Vorlagepflichten 83 84 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores sowie die Nichtgewährung rechtlichen Gehörs (Art. 103 I GG) durch Nichtberücksichtigung von Parteivortrag oder Unterlassung eines gebotenen richterlichen Hinweises (§ 139 II – V ZPO). Nach wohl h.M. ist die verfassungsrechtlich garantierte Rechtsschutzgewährleistung verletzt und die Revision deshalb zuzulassen, wenn das Berufungsgericht dem Berufungskläger aufgrund verfassungsrechtlich überspannter Sorgfaltsanforderungen an dessen Prozessbevollmächtigten die Wiedereinsetzung in versäumte Berufungsoder Berufungsbegründungsfristen versagt. Das allgemeine Willkürverbot ist verletzt, wenn die Entscheidung des Berufungsgerichts unter keinem denkbaren Aspekt rechtlich vertretbar ist und daher auf sachfremden Erwägungen beruht („greifbare Gesetzeswidrigkeit“) oder wenn überzogene Anforderungen an die Erfolgsaussichten des Vorbringens in sachwidriger Ungleichbehandlung münden. Ein Verstoß des Berufungsgerichts gegen die verfassungsrechtlichen Grenzen richterlicher Rechtsfortbildung, wie sie den Grundrechten in Verbindung mit dem Rechtsstaatsprinzip und dem Gewaltenteilungsgrundsatz zu entnehmen sind, verpflichtet ebenfalls zur Zulassung der Revision wegen Divergenz von verfassungsrechtlicher Qualität (§ 543 II 1 Nr. 2 Alt. 2 ZPO) und dürfte bei richtigem Verständnis überdies ein Fall der Zulassung aus Gründen der Rechtsfortbildung sein (§ 543 II 1Nr. 2 Alt. 1 ZPO). 5. Entscheidungserheblichkeit des Rechtsfehlers? Unklar und teilweise umstritten ist, ob und inwieweit die Zulassung der Revision von der Entscheidungserheblichkeit des Rechtsfehlers abhängt. Nach der Rechtsprechung des BGH setzt die Zulassung der Revision als ungeschriebenes Tatbestandsmerkmal grundsätzlich voraus, dass der korrekturbedürftige Rechtsfehler im Revisionsverfahren entscheidungserheblich ist. Das ist z.B. zu verneinen, wenn sich die angegriffene Entscheidung aus anderen Gründen im Ergebnis als richtig erweist. Fehlen soll der Zulassungsgrund insgesamt etwa auch dann, wenn das Berufungsgericht die Klage aus zwei Gründen zurückweist, von denen nur einem Grundsatzbedeutung beizulegen ist, während der andere isoliert für sich genommen keinen Zulassungsgrund erfüllt, so dass der BGH insoweit nicht abweichend entscheiden dürfe. Darüber hinaus verneint der BGH einen Zulassungsgrund, wenn die Begründung der angefochtenen Entscheidung neben dem zulassungswürdigen Rechtsfehler noch einen oder mehrere andere Fehler enthält, die ihrerseits bei isolierter Betrachtung die Zulassung nicht zu begründen vermögen, oder wenn mehrere Fehler des Berufungsgerichts im Zusammenwirken im Ergebnis zu einer richtigen Entscheidung führen. Die in dieser Rechtsprechung liegende Einschränkung der Zulassung von Revisionen geht sehr weit, weil sie Fragen der Begründetheit der Revision zur Zulassungsvoraussetzung erhebt und das Zulassungsverfahren damit überfrachtet. Deshalb erscheint es letztlich vorzugswürdig, für die Zulassungsentscheidung entgegen der Rechtsprechung des BGH und h.M. auf das Erfordernis der Entscheidungserheblichkeit des Rechtsfehlers ganz zu verzichten. 6. Bewertung der Zulassungsvoraussetzungen der deutschen Revision Die Zulassungsrevision, wie sie der ZPO-Reformgesetzgeber im Wesentlichen geschaffen hat, erfüllt im Grundprinzip die legislativen Erwartungen, indem sie in denjenigen Fällen die Revision eröffnet, die für die Rechtspflege in der Gesamtrechtsordnung die größte Bedeutung haben. Dabei steht die Revision notwendigerweise in einem Spannungsverhältnis zum Individualrechtsschutz. Die Ausgestaltung in Form von Zulassungspflichten ist zwar im Grundansatz zu begrüßen, birgt allerdings die Schwierigkeit gültig schwer objektivierbarer Konkretisierung von handwerklich teilweise nicht uneingeschränkt geglückten generalklauselartigen Einzeltatbeständen. Konsequenz der reformierten Zulassungsrevision ist die beträchtlich verstärkte Durchdringung bestimmter Rechtsgebiete von höchstrichterli- série Cadernos do CEJ cher Rechtsprechung, die häufig zu Präzisierung, teilweise aber auch zu unübersichtlicher Kasuistik führt. Das Bemühen um transparente und rechtlich gebundene Zulassungsentscheidung in Gestalt legislativen Filigranwerks bricht sich bei aller perfektionistischen Akribie, wie sie Rechtsprechung und Wissenschaft aufbringen, an der Realität revisionsrechtlicher Praxis, die am Allgemeinwohl orientierte Zulassungsentscheidungen ohne Raum jedwedes richterliches Ermessen – wenn überhaupt – in Grenzbereichen teilweise nur mit enormem Aufwand treffen kann. Eine Einschränkung der Revisionszulassung anhand des Kriteriums der Entscheidungserheblichkeit des gerügten Rechtsfehlers ist mangels hinreichender Rechtsgrundlage im deutschen Zivilprozessrecht abzulehnen. IV.Modelle der Revisionszulassung im Rechtsvergleich Der Versuch einer rechtsvergleichenden Einordnung des deutschen Rechts der Revisionszulassungsgründe beginnt mit einer Skizze des französischen, englischen und U.S.-amerikanischen Rechts. 1.Europa a) Frankreich Das französische Zivilprozessrecht qualifiziert die Kassationsbeschwerde zur Cour de cassation (pourvoi en cassation) als außerordentlichen Rechtsbehelf, dem kein Suspensiveffekt im Sinne eines Vollstreckungsaufschubs zukommt. Gemäß Art. 605 C.p.c. findet die Kassation nur statt, wenn gegen das angefochtene Urteil kein anderer Rechtsbehelf statthaft ist. Eine Zulassung durch das Berufungsgericht (cour d’appel) ist nicht notwendig. Ursprünglich konnte die Cour de cassation die Annahme einer Kassationsbeschwerde auch nicht ablehnen. Dementsprechend verzeichnete die Cour de cassation in Zivilsachen rund fünf- bis sechsmal mehr Eingänge als der deutsche BGH. Die Reform 2001 eröffnete die Möglichkeit der Verwerfung unzulässiger oder unbegründeter Kassationsbeschwerden durch eine Kammer von drei Magistratsrichtern ohne jede Begründung (décision de non-admission), wobei letztlich etwas unklar ist, ob es sich dabei um eine Nichtzulassung oder eine Verwerfung oder eine Zurückweisung als offensichtlich unzulässig bzw. unbegründet handelt. Die Cour de cassation verzeichnete im Jahr 2008 18.684 Erledigungen in Zivilsachen, davon rund 21 % decisions de non-admission. Die positive Entscheidung der Cour de cassation ergeht aufgrund einer Rechtsprüfung und lautet in aller Regel auf Aufhebung der instanzgerichtlichen Entscheidung und unter Umständen auch des Verfahrens und Zurückverweisung an eine andere Cour d’Appel (Art. 626, 627 C.p.c.). Starke Arbeitsbelastung und Schwerfälligkeit des Kassationsverfahrens haben den Gesetzgeber bereits 1991 bewogen, neben der Kassationsbeschwerde ein Vorlageverfahren in Zivilsachen zu etablieren (saisine pour avis). Instanzgerichte können danach der Cour de cassation bislang nicht höchstrichterlich geklärte Rechtsfragen zur Entscheidung vorlegen – die Parallele zum europarechtlichen Vorabentscheidungsverfahren ist unverkennbar. Im Gegensatz zum deutschen Recht kennt das französische Verfassungsprozessrecht keine Individualverfassungsbeschwerde. Ein verfassungsprozessuales Vorlageverfahren gibt es in Frankreich erst seit 1. März 2010 (saisine par voie d’exception, Art. 61-1 Const.). b) England In England ist mit Wirkung zum 1. Oktober 2009 der Supreme Court of the United Kingdom an die Stelle des House of Lords als höchste Instanz in Zivilsachen getreten. Wie bereits unter altem Recht ist der Zugang zur obersten Zivilinstanz von der Zulassung des appeal abhängig, die zunächst beim Untergericht (i. d. R Court of Appeal) beantragt werden muss (S. C. R. 10 [2]). Die Zulassung durch den iudex a quo ist für den Supreme Court bindend, die Versagung der Zulassung durch das Untergericht eröffnet die Möglichkeit eines Zulassungsantrags beim Supreme Court. Die Zulassungsentscheidung liegt – anders als in Deutschland – in jedem Fall im freien Ermessen des befassten Gerichts, ausnahmsweise kommt Sprung-Appellation vom High 85 86 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Court oder von einem Divisional Court zum Supreme Court in Betracht, wenn eine Prozesspartei im Einvernehmen mit dem Gegner es beantragt und High Court sowie Supreme Court zustimmen. Im Jahr 2007 wurden von insgesamt 172 in Zivilsachen eingelegten petitions for leave to appeal 46 zugelassen – für kontinentaleuropäische Verhältnisse verschwindend geringe Zahlen. Während dem englischen Recht echte Grundrechte und ein gesondertes Verfassungsgericht mit Individualzugang, wie ihn die Verfassungsbeschwerde deutscher Provenienz eröffnet, fremd sind, kann Gegenstand des appeal zum Supreme Court auch die Verletzung von Gewährleistungen des Human Rights Act 1998 sein (S. C. R. 40), der die Europäische Menschenrechtskonvention in nationales Recht transformiert. 2. USA a) Die Trennung zwischen Bundes- und Einzelstaatengerichtsbarkeit Court einen writ of certiorari gewährt (28 U.S.C. § 1254 [1]). Dabei gilt das Prinzip des discretionary review, des ermessensabhängigen Zugangs der Prozessparteien zur Revision durch den U.S. Supreme Court. Die Annahmeentscheidung ergeht grundsätzlich völlig unabhängig von jedweder rechtlichen Gebundenheit auf petition einer Partei in der Regel, wenn mindestens vier der neun Richter es befürworten („Rule of Four“). Nur ganz ausnahmsweise findet ein direct appeal zum Supreme Court unter Übergehung der Berufungsinstanz und ohne writ of certiorari unmittelbar gegen die von drei Richtern erlassenen injunctions der District Courts statt (28 U.S.C. § 1253). Darüber hinaus kann ein writ of certiorari auch gegen letztinstanzliche Entscheidungen von Einzelstaatengerichten gewährt werden, falls die Verletzung einer bundesrechtlichen Norm – sei sie verfassungsrechtlicher oder nichtverfassungsrechtlicher Art – plausibel dargetan ist (28 U.S.C. § 1257 [a]). Einschränkungen des Individualzugangs zur höchsten Zivilinstanz In den USA besteht im Auswerden am ehesten im deutschen Rechtsbehelfssystem gangspunkt eine klare Trennung in Form der Individualverfassungsbeschwerde zum zwischen den Gerichtsbarkeiten Bundesverfassungsgericht kompensiert [...] des Bundes und der Einzelstaaten. Die Jurisdiktionsgewalt liegt grundsätzlich bei den Einzelstaaten, soweit sie nicht ausdrücklich auf die Neben dem ermessensabhängigen Zugang Bundesgerichte übertragen ist. In federal quesbesteht die Möglichkeit einer Vorlage von Retion-cases und diversity of citizenship-cases ist die chtsfragen an den Supreme Court durch den U.S. Bundesgerichtsbarkeit zuständig, wobei Fälle mit Court of Appeals (certification 28 U.S.C. § 1254 [2]). Entscheidungserheblichkeit von bundes- und Bei rund 7.700 Neueingängen im Geschäftsjahr einzelstaatenrechtlichen Vorschriften wahlweise 2008/09 wurde nur in 85 Fällen ein writ of certiorari grundsätzlich auch vor Staatengerichten verhangewährt, der eine Sachprüfung eröffnet. Insgesamt delt werden können, während bei Diversität von hat der U.S. Supreme Court zwar in Konkurrenz Kläger- und Beklagtensitz zwar auch vor Staatenmit den Instanzgerichten die Funktion eines letgerichten geklagt und verhandelt werden kann, ztinstanzlichen Hüters des gesamten Bundesrechts, der Beklagte aber Verweisung an das zuständige eine spezifische Individualverfassungsbeschwerde Bundesgericht erzwingen kann (Removal). im Sinne eines Anspruchs auf verfassungsrechtliche Überprüfung existiert aber nicht. b) Der Zugang zum U.S. Supreme Court Der U.S. Supreme Court fungiert zunächst als oberstes Rechtsmittelgericht der Bundesgerichtsbarkeit. Appellabel sind die Entscheidungen der U.S. Courts of Appeal, falls der U.S. Supreme c) Der Zugang zu den Supreme Courts der Einzelstaaten Die Gerichtssysteme der Einzelstaaten sind in der Regel dreistufig ausgestaltet, teilweise fehlt série Cadernos do CEJ allerdings eine Zwischeninstanz. Der individuelle Zugang in Zivilsachen ist im Detail teilweise divergierend ausgeformt, zeigt aber im ersten Zugriff durchaus gemeinsame Grundlinien. Vorherrschend ist auch im einzelstaatlichen Zivilprozessrecht die ermessensabhängige Revision. Teilweise wird das Ermessen der Supreme Courts eingeschränkt in Gestalt von Ermessensparametern, von denen einzelne oder mehrere zwingend oder regelmäßig erfüllt sein müssen, um nach Ermessen in die Revisionsinstanz zu kommen, oder in Form bestimmter alternativer Zulassungsgründe, bei deren Vorliegen eine Revisionszulassung regelmäßig erfolgt. Daneben bestehen Vorlageverfahren auf Antrag von Gerichten der eigenen Gerichtsbarkeit oder des Bundes oder unter Umständen auch von letztinstanzlichen Schwesterstaatengerichten (certification). Besondere Verfassungsgerichte bestehen nicht, spezielle verfassungsprozessuale Individualschutzverfahren existieren auch in der Einzelstaatengerichtsbarkeit für habeas corpus-Fälle. 3.Würdigung der drei Grundmodelle des Revisionszugangs Die rechtsvergleichende Bestandsaufnahme fördert drei Grundmodelle des Individualzugangs zur höchsten Instanz in Zivilsachen zutage. Die beiden Extrempositionen besetzen das französische Modell und das U.S.-amerikanische Modell, dem auch der Zugang zum englischen Supreme Court im Prinzip entspricht. Im französischen Modell besteht im Ausgangspunkt unbeschränkter Anspruch auf Zugang zur Cour de cassation, der allerdings durch die Möglichkeit unbegründeter Ablehnung als offensichtlich unzulässig oder unbegründet deutlich relativiert wird. Der U.S. Supreme Court entscheidet dagegen nach freiem richterlichem Ermessen über die Annahme einer Revision; ähnlich entscheidet der englische Supreme Court entweder auf Zulassung nach freiem Ermessen des iudex a quo oder aufgrund eigener Ermessensausübung. Eine Zwischenlösung verwirklichen das deutsche und – ähnlich – das kalifornische Recht mit einem bedingten Zugangsrecht und teilweise das Prozessrecht der nordamerikanischen Einzelstaaten, soweit es die Ermessenausübung durch ermessenslenkende Vorschriften kanalisiert. Dabei muss man klar sehen, dass der gesetzlich bedingte Zugang zum BGH durch die Möglichkeit der Individualverfassungsbeschwerde flankiert wird und dadurch der Individualrechtsschutz in Zivilsachen im Vergleich zum kalifornischen Recht deutlich gestärkt ist. Ein Prozessrechtssystem ohne jedweden Individualzugang zur höchsten Instanz zeigt sich im Rechtsvergleich nicht. Vorlageverfahren flankieren den Individualzugang zur höchsten Zivilinstanz und mögen Schwächen des Individualrechtsschutzes zumindest teilweise auffangen. Keines der untersuchten Prozessmodelle verweist die Rechtsuchenden in Zivilsachen indessen auf Vorlageverfahren allein. Dabei begegnen Vorlageverfahren sowohl als rein verfassungsprozessuale Remedien, wie etwa die konkrete Normenkontrolle deutscher Provenienz auf Richtervorlage (Art. 100 GG) oder die neue Vorlage zum französischen Conseil constitutionnel, als auch in Gestalt rein zivilprozessualer Vereinfachungs- und Entlastungsinstrumente, wie z.B. die Vorlage an die Cour de cassation. Eine Mischform sind die Vorlageverfahren nach US-Bundesrecht und Einzelstaatenrecht, die zur Klärung einfachrechtlicher und verfassungsrechtlicher Fragen dienen. Einschränkungen des Individualzugangs zur höchsten Zivilinstanz werden am ehesten im deutschen Rechtsbehelfssystem in Form der Individualverfassungsbeschwerde zum Bundesverfassungsgericht kompensiert, während in den anderen untersuchten Prozessmodellen kein vergleichbarer flankierender Rechtsschutz gewährt wird. Das mag mit ein Grund dafür sein, dass die neu eingeführte non-admission des pourvoi en cassation ohne Begründung, die im Grunde genommen einen Systembruch darstellt, in der französischen Literatur mit zum Teil heftiger Kritik konfrontiert ist. V. Zusammenfassung 1. Der Gesetzgeber ist zwar von Verfassungs wegen nicht gezwungen, eine Revision zu eröff- 87 88 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores nen; wenn er jedoch eine Revisionsinstanz vorsieht, darf der Zugang nicht unzumutbar, auch Sachgründen nicht mehr zu rechtfertigender Weise erschwert werden. Darüber hinaus ist der gesetzgeberische Gestaltungsspielraum bei der Ausformung der Zulassungsvoraussetzungen durch die Grundsätze der Normenklarheit und Normenbestimmtheit sowie durch den allgemeinen Gleichheitssatz beschränkt. Die Gerichte sind verfassungsrechtlich gehalten, generalklauselartige Zulassungstatbestände zu konkretisieren und dabei zu einer einheitlichen und für den Rechtsuchenden eindeutigen Linie zu kommen. Die einfachgesetzliche Regelung der Zulassungsvoraussetzungen und ihre Handhabung durch die Instanzgerichte und BGH entsprechen diesen verfassungsrechtlichen Anforderungen. 2.Die Revision ist zuzulassen, wenn die Rechtssache grundsätzliche Bedeutung hat. Das ist dann anzunehmen, wenn sie eine revisible und klärungsbedürftige Rechtsfrage aufwirft, die sich in einer unbestimmten Vielzahl weiterer Fälle stellen kann, wie beispielsweise bei Musterprozessen, Streitigkeiten über die Auslegung typischer Vertragsklauseln oder allgemeiner Geschäftsbedingungen, bei Verletzung von Verfahrensgrundsätzen oder bei bevorstehender Änderung der Rechtsprechung. 3.Der Zulassungsgrund der Erforderlichkeit revisionsgerichtlicher Entscheidung zur Rechtsfortbildung als Sonderfall der Grundsatzbedeutung ist weit auszulegen und umfasst nicht nur die Lückenschließung durch gesetzesübersteigende Rechtsfortbildung, sondern auch Fälle der Analogiebildung. Dabei ist die Revision sowohl zuzulassen, wenn der BGH eine Lückenschließung auf diesen Grundlagen bestätigen oder vornehmen will oder soll, als auch dann, wenn er einer entsprechenden Lückenschließung durch die angefochtene Entscheidung nicht folgen will. Die Möglichkeit einer Vorlage an den EuGH ist entgegen der h.M. im Regelfall kein Fall der Rechtsfortbildung, sondern ein Fall der Grundsatzbedeutung. 4. Schließlich verpflichtet die Erforderlichkeit revisionsgerichtlicher Entscheidung zur Sicherung der Einheitlichkeit der Rechtsprechung zur Zulassung der Revision. Divergenz der Re- chtsprechung kann beruhen auf Unterschieden in der Rechtsprechung der Oberlandesgerichte oder auf Abweichungen der obergerichtlichen Rechtsprechungen von der Judikatur des BGH. Erforderlich ist eine Leitentscheidung nach der Rechtsprechung des BGH im Regelfall bei Wiederholungs- oder Nachahmungsgefahr, ausnahmsweise unabhängig von diesem Erfordernis zuzulassen ist die Revision bei Rechtsfehlern verfassungsrechtlicher Qualität. 5.Die Entscheidungserheblichkeit des Rechtsfehlers ist entgegen der Rechtsprechung des BGH mangels hinreichender Grundlage im Gesetz nicht als Zulassungsvoraussetzung anzuerkennen, sondern bleibt der Frage der Begründetheit der Revision vorbehalten. 6. Im Rechtsvergleich zwischen Deutschland, Frankreich, England und den U.S.A. zeigen sich drei Grundmodelle des Zugangs zur Revisionsinstanz: grundsätzlich unbeschränkter Zugang in Frankreich, Zulassung nach freiem gerichtlichem Ermessen zum U.S. Supreme Court sowie zum englischen Supreme Court und bedingte rechtlich gebundene Zulassungsentscheidung im deutschen Zivilprozess, der eine deutlich um Gleichmäßigkeit und Transparenz bemühte Zwischenlösung verwirklicht, deren Konkretisierung und praktische Handhabung allerdings durchaus aufwendig ist. série Cadernos do CEJ Ministro Teori Zavascki e Ministro João Otávio de Noronha “ MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA: Após ouvirmos uma palestra sobre os pressupostos da admissibilidade do recurso especial ou assim nominado “recurso equivalente ao nosso recurso especial na Alemanha”, vamos ouvir agora o segundo palestrante da tarde, que é o Exmo. Sr. Ministro Teori Zavascki, do Superior Tribunal de Justiça, portanto nosso colega, que falará sobre “pressupostos de admissibilidade do recurso especial no Superior Tribunal de Justiça”. O Ministro Teori já é por demais conhecido dos juízes, dos jurisdicionados da 4ª Região, Tribunal que congrega Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina. É Ministro do Superior Tribunal de Jus- tiça, Doutor e Mestre em Direito Processual Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, foi Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Professor na Universidade do Vale do Rio do Sinos, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e na Universidade de Brasília. Autor de obras como a “Eficácia da Sentença na Jurisdição Constitucional e Processo Coletivo”, “Tutela de Direitos Coletivos e Tutela Coletiva de Direito”, dentre outras publicações, além de artigos científicos em revistas especializadas. Além de notável jurista, é também um notável magistrado do Superior Tribunal de Justiça. Apenas é torcedor do Grêmio... Ninguém é perfeito. Com a palavra o Ministro Teori Zavascki. 89 Pressupostos de admissibilidade do recurso especial no STJ Ministro Teori Albino Zavascki Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Mestre e doutor pela mesma instituição de ensino. Professor da Faculdade de Direito da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e na Universidade de Brasília. Advogado do Banco Central. Juiz do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul. Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Atualmente é Presidente da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça. “ Sr. Presidente da mesa, Ministro João Otávio de Noronha, dileto amigo e colega do STJ; Sra. Ministra Eliana Calmon, Corregedora-Geral do CNJ; Sra. Ministra Maria Thereza, colega do STJ; Sr. Presidente do TRF da 4ª Região, Dr. Vilson Darós; Ministro Francisco Falcão, Corregedor-Geral da Justiça Federal; senhores Juízes; Sr. Professor Alexander Bruns; senhores professores alemães que nos honram com sua visita ao Brasil; colegas magistrados; demais participantes deste evento: Gostaria inicialmente de me associar às justas homenagens que são prestadas ao grande Ministro Thompson Flores, que honrou o Supremo Tribunal Federal e a Magistratura do Rio Grande do Sul. Gostaria de manifestar a minha alegria por ter sido convidado pelo Ministro Francisco Falcão para proferir essa palestra sobre recurso especial no sistema normativo brasileiro. Gostaria de manifestar aos coestaduanos a alegria de estar de volta ao Estado de Santa Catarina, especialmente nesta Casa, que ainda tem o cheirinho de nova e que, modéstia à parte, alguma colaboração dei para que se concretizasse. Foi na minha gestão que se projetou essa casa, começaram os primeiros entendimentos no sentido de obtenção de verbas para a sua construção, de modo que é uma alegria enorme vê-la construída, habitada e, certamente, destinada a prestar grandes serviços à Justiça brasileira. série Cadernos do CEJ A minha tarefa é falar sobre os requisitos de admissibilidade do recurso especial no sistema normativo brasileiro. 1 Natureza dos recursos extraordinários no Brasil: cassação ou revisão? Desde logo, gostaria de dizer que os recursos extraordinários no Brasil, de cujo gênero são espécies o recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal e o recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça, sofrem há muito tempo de uma severa crise de identidade, até hoje não resolvida. Diria que essa crise de identidade se manifestava desde quando o Supremo Tribunal Federal, por meio do recurso extraordinário, julgava matéria de ofensa à Constituição e ofensa às leis federais. E essa crise de identidade foi acentuada com a Constituição de 1988, quando houve uma repartição desse recurso, criando-se, ao lado do recurso extraordinário, que, desde então, se destina precipuamente a examinar controvérsias a respeito da aplicação das normas constitucionais, o recurso especial stricto sensu, a ser julgado por uma outra Corte, que é o Superior Tribunal de Justiça, encarregada fundamentalmente de julgar controvérsias que envolvem ofensa a normas federais infraconstitucionais. Falo em crise de identidade porque até hoje e desde sempre nunca ficou bem identificado no sistema brasileiro se esse é um recurso de cassação ou se é um recurso de revisão. A prática tem mostrado que os dois tribunais encarregados de julgar esses recursos ora os tratam como recursos de cassação, ora como de revisão. O texto constitucional não auxilia muito na solução dessa natureza do recurso, porque o texto constitucional, quando fala no recurso extraordinário para o Supremo, diz: “compete ao Supremo Tribunal Federal julgar mediante recurso extraordinário as causas decididas.”1. A mesma linguagem é usada 1 “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Fede- ral, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: quando trata do recurso especial: “compete ao Superior Tribunal de Justiça julgar em recurso especial as causas decididas”,2 de modo que, até hoje, não se resolveu adequadamente esse problema de saber se, afinal de contas, se julga o recurso ou se julga a causa. A minha exposição, portanto, embora enfoque os requisitos de admissibilidade, pretende, aproveitando esse ambiente acadêmico e essa tão importante e seleta participação de juízes e estudiosos, discorrer, mostrar exatamente essa crise de identidade. Obviamente não vou trazer aqui nenhuma solução porque, se fosse uma solução encontrável facilmente, certamente nós não teríamos uma crise dessa natureza por tanto tempo. De qualquer modo, penso que é um momento oportuno para que se medite a respeito, especialmente às vésperas de uma possível mudança constitucional, justamente em relação ao recurso extraordinário e ao recurso especial, que está sendo proposta pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, a chamada “PEC dos recursos”. Digo que a Constituição de 1988 não facilitou a solução da natureza dos recursos extraordinários, pelo contrário, de certo modo acentuou essa controvérsia, porque a Constituição de 1988 veio trazer alguns problemas adicionais. Ela, de certo modo, fatiou o julgamento da causa. As causas decididas nas instâncias ordinárias têm seu julgamento eventualmente dividido, repartido entre as Cortes Superiores, de modo que nenhuma das Cortes Superiores, em muitos casos, está habilitada a julgar a causa isoladamente. Assim, embora a Constituição diga que o Supremo Tribunal Federal, em recurso extraordinário, julga a causa, assim como o Superior Tribunal [...] III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: 2 Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: [...] III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida:” 91 92 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores de Justiça, diante da possibilidade de interposição desses dois recursos simultaneamente, temos muitos casos em que o julgamento da causa não se dá, a não ser de modo fatiado, repartido. dinário diz respeito ao mérito e quando o recurso especial diz respeito à preliminar. Nesses casos, o próprio Código de Processo estabelece que, em princípio, julga-se primeiro o recurso especial; depois, se for o caso, há um julgamento do recurso extraordinário pelo Supremo. 2 Recursos repartidos entre STF e STJ Eventualmente, quando o recurso extraordiA repartição dos recursos pode acontecer em nário é prejudicial, sobresta-se o julgamento do duas situações: quando o acórdão do tribunal de recurso especial e determina-se o julgamento do apelação tenha duplo fundamento, cada qual surecurso extraordinário. Quando, por exemplo, o ficiente para a mesma pretensão. Por exemplo, recurso extraordinário versa sobre uma questão a alegação de que o acórdão recorrido aplicou preliminar e o recurso especial sobre questão do uma norma inconstitucional e, mesmo que fosse mérito da demanda, ou quando o julgamento do constitucional, a norma não teria o sentido atrirecurso extraordinário diz respeito à pretensão buído pelo acórdão. Quando se diz isso, propiciaprincipal e o recurso especial diz respeito aos se e, mais do que isso, torna-se indispensável a acessórios dessa pretensão principal. Em todos interposição de dois recursos, de maneira que esses casos há um fatiamento do julgamento da um vai julgar a constitucionalidade da norma, e, causa, com a repartição de matérias perante dois superado isso, ainda não se pode julgar a causa, tribunais, de modo que a Constituição de 1988 porque a interpretação da norma considerada não resolveu, pelo contrário, acentuou essa quesconstitucional deverá ser feita por outro tribunal. tão de crise de identidade. Afinal, quando se diz que rejulga a causa, está-se atribuindo ao recurso uma natureza revisional. Agora, [...] o recurso extraordinário para o Supremo quando isso não é possível – como se destina a tutelar a Constituição, e o recurso não é possível –, na prática, o que os especial para o Superior Tribunal de Justiça se tribunais têm feito em geral é atribuir destina a tutelar o sistema normativo federal. ao recurso uma natureza de cassação, ou seja, determina-se que a causa seja novamente examinada pela instância Temos até uma súmula no STJ – Súmula 126 –,3 de origem. Isso como introdução para mostrar que, que diz que, num caso desses, havendo dois fundana verdade, temos um problema antigo no nosso mentos por si sós suficientes para manter o acórdão sistema, um problema que era mais fácil de se rerecorrido, é preciso a interposição tanto do recurso solver à época em que havia apenas um tribunal especial quanto do recurso extraordinário, o que superior encarregado de julgar de modo extraorenseja esse fatiamento do julgamento da causa. dinário essas controvérsias e que hoje se acentua A outra hipótese é quando existe duplo fundamais profundamente. mento para pretensões diferentes. Por exemplo, quando o recurso extraordinário diz respeito a 3 Admissibilidade do recurso especial uma preliminar e o recurso especial diz respeito no STJ ao mérito. Ou o inverso: quando o recurso extraorVou falar sobre a questão específica do recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça, que, de certo modo, reproduz as mesmas ques3 Súmula 126/STJ: “É inadmissível Recurso Especial, quando o acórdão recorrido assenta em fundamentos tões enfrentadas pelo Supremo Tribunal Federal constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suna técnica e na admissibilidade desses recursos. ficiente, por si só, para mantê-lo, e a parte vencida não Os dois são recursos ditos extraordinários pormanifesta recurso extraordinário.” série Cadernos do CEJ que se destinam fundamentalmente a tutelar o direito objetivo e não o direito subjetivo da parte propriamente dita. Primordialmente, o recurso extraordinário para o Supremo se destina a tutelar a Constituição, e o recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça se destina a tutelar o sistema normativo federal. Então, trata-se de recursos extraordinários nesse sentido. Em segundo lugar, trata-se de recursos com a chamada “motivação vinculada”; ao contrário dos recursos ordinários, que têm motivação livre. Motivação vinculada porque, em recurso extraordinário, só se pode alegar ofensa à Constituição Federal; em recurso especial, se pode alegar fundamentalmente ofensa à lei federal. 4 Conceito de causa decidida como pressuposto O recurso especial cabe contra causas decididas. Temos uma história no Direito brasileiro, já sedimentada, que foi formada por uma jurisprudência provavelmente numa época em que nunca se atentou muito para essa função uniformizadora dos recursos extraordinários. Firmou-se um entendimento que predomina até hoje, no sentido de que, por causas decididas, se entendem não apenas as causas julgadas de modo definitivo, mas também os incidentes dessas causas, que produzem decisões interlocutórias, de modo que tais decisões ensejam a possibilidade de recurso especial ou extraordinário, embora, a rigor, isso configure uma interpretação ampliativa do que seja causa decidida. Não se considera causa decidida aquelas controvérsias que os tribunais resolvem e que têm uma natureza administrativa. Por exemplo, o processamento de precatórios. Tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o Superior Tribunal de Justiça têm até súmula a respeito – Súmula 733 do STF4 e Súmula 311 do STJ5 –, que deixam claro que, no 4 Súmula 733/STF: “Não cabe recurso extraordinário contra decisão proferida no processamento de precatórios.” 5 Súmula 311/STJ: “Os atos do presidente do tribunal que disponham sobre processamento e pagamento de precatório não têm caráter jurisdicional.” processamento de precatórios, as decisões têm natureza administrativa e não jurisdicional, de modo que não se consideram causas para esse efeito. O mesmo ocorre com as decisões dos tribunais estaduais sobre pedidos de intervenção estadual em município. Também nesses casos se considera, e tem-se aqui a Súmula do Supremo de n. 637, 6 que trata de processo de natureza administrativa e não jurisdicional. Portanto, o ataque a essas causas ou a essas decisões poderia ser feito, como comumente acontece, por meio de mandado de segurança para o próprio tribunal, com recurso ordinário ou recurso extraordinário, conforme o caso, para as instâncias superiores quando do julgamento desses mandados de segurança. (Art. 105, III da CF) “Causas decididas pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais de Justiça dos Estados.” Tivemos aqui, com a criação dos juizados especiais, uma lacuna importante no recurso especial, porque no recurso extraordinário para o Supremo não se diz que são causas decididas pelos tribunais federais e pelos tribunais de justiça. Quando se fala em recurso extraordinário, a Constituição fala simplesmente em causas decididas em única e última instância. Portanto, para efeito de acesso ao Supremo Tribunal Federal, temos recursos extraordinários das decisões de juizados especiais federais e estaduais, mas tínhamos essa lacuna em relação aos juizados especiais estaduais e federais no que se refere ao recurso especial. Isso se superou, de certo modo, pela legislação infraconstitucional. Hoje temos, tanto para efeito de juizados especiais federais quanto para juizados estaduais, o chamado “pedido de uniformização de interpretação federal”, que é um sucedâneo de recurso especial, que permite acesso ao STJ para uniformizar interpretação de lei federal, que é, afinal de contas, uma das finalidades mais importantes, essa finalidade uniformizadora que o Superior Tribunal de Justiça exerce. Diz a Constituição que “são causas decididas por esses tribunais em única ou última instância.” 6 Súmula 637/STF: “Não cabe recurso extraordinário contra acórdão de tribunal de justiça que defere pedido de intervenção estadual em município.” 93 94 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Como eu disse, nós incluímos nessas causas as decisões interlocutórias, as decisões de tribunais sobre incidentes do processo. Mais recentemente, está havendo, com toda a razão, uma modificação da jurisprudência do STF e do STJ, pelo menos na minha Turma isso tem acontecido, relativamente à revisibilidade das decisões sobre liminares. 5 RE e REsp contra liminares Quanto a isso, o Supremo editou a Súmula 735, que diz o seguinte: “Não cabe recurso extraordinário contra acórdão que defere medida liminar.” Essa Súmula diz menos do que poderia dizer e, em alguma medida, diz mais do que deveria dizer. Ela diz menos, porque as mesmas razões que levam ao não cabimento do recurso extraordinário contra decisão que defere medida liminar conduzem ao não cabimento de recurso contra decisões que não a deferem. Por quê? Porque os fundamentos dessa Súmula são os seguintes: o juízo que um juiz ou tribunal faz em liminar não pode ser enquadrado como causa definitiva. Não é por se tratar de decisão interlocutória. Porém, quando um tribunal ordinário ou o juiz decide a respeito de uma medida de urgência, uma medida provisória, ele está fazendo um juízo de plausibilidade, sujeito à revisão pelo próprio tribunal ou pelo próprio juízo ordinário. De modo que, se se trata de decisão sujeita a revisão pelas próprias instâncias ordinárias, não se trata de causa decidida definitivamente, nem de um incidente e muito menos do mérito. Desse modo, não cabe recurso especial, e o Supremo diz que não cabe recurso extraordinário das decisões que fazem juízo de probabilidade a respeito do direito federal ou do direito constitucional. Em um dos precedentes dessa Súmula se fala claramente também do recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça. Os fundamentos são os mesmos, de maneira que aqui está havendo, com toda a razão, uma revisão da ideia tradicional de que se pode interpor recurso extraordinário de decisões que fazem um juízo perfunctório a respeito de determinada norma federal ou constitucional. Como eu disse, na minha Turma, isso já está mais ou menos sedimentado e, quanto à existência, ou não, do periculum in mora, geralmente envolve matéria de fato, da qual também não se pode conhecer, porque matéria de fato não significa ofensa à Constituição ou ofensa à lei federal diretamente. A Súmula diz mais do que deveria dizer, porque não é também tão absoluta essa limitação de acesso à instância extraordinária em matéria de liminar, especialmente em se tratando de Superior Tribunal de Justiça. Por exemplo: se um juiz defere uma liminar em um caso em que ela está proibida, temos aí uma ofensa à norma que estabelece a regra sobre liminar, não é o direito material que foi objeto de uma apreciação, vamos dizer assim, provisória. Aí é a própria concessão da medida liminar, a própria regra a respeito da sua concessão que foi ofendida, e, em um caso desses, obviamente que vai caber recurso especial. Temos, portanto, avanços e acho que esse é um avanço importante no sentido de estabelecer os adequados limites. A revisibilidade das medidas de urgência pelos recursos extraordinários deve ser limitada e com toda razão. 6 REsp contra negativa de vigência de lei federal ou tratado Diz a Constituição sobre o cabimento do recurso especial que este tem lugar em “casos decididos quando o acórdão recorrido contrariar tratado ou lei federal ou negar-lhes vigência.” “Contrariar” significa dar um sentido contrário ou negar a sua aplicação, daí a distinção entre contrariar diretamente, dar um sentido, uma interpretação inadequada ou deixar de aplicar, ou contrariar indiretamente, ou seja, dar um sentido, uma interpretação correta, mas aplicar em situação de fato inadequada. Aqui, em geral, o juízo a respeito de ser, ou não, adequada à situação concreta incidente da norma não é um juízo de direito, mas um juízo de fato e aí esbarramos na impossibilidade de revisar puramente fatos. O conceito de lei federal também é um conceito que tem de ser limitado, não é qualquer norma produzida por um órgão federal, uma fonte normativa federal, que é considerada norma, lei série Cadernos do CEJ federal para esse efeito. Considera-se lei federal hoje, depois da Constituição de 1988, não mais – eu estou dizendo que se considera baseado no aplicar a Súmula 399 do Supremo. que tem decidido a jurisprudência do STJ e o que Também se diz, e o Supremo tem a Súmula decidia a jurisprudência do Supremo – aqueles 636,7 que se aplica perfeitamente ao recurso especial do Superior Tribunal de Justiça, que não se atos normativos de caráter geral e abstrato proconsidera ofensa à lei federal ou à Constituição, duzidos por órgão da União com base em compara esse efeito, quando o exame dessa ofensa depetência derivada da própria Constituição. Nós pender de exame de legislação de outra natureza. temos fontes normativas produzidas por órgãos Por exemplo, se para saber se houve ofensa à lei que têm tal competência derivada diretamente federal for necessário examinar legislação estadual da Constituição e normas produzidas por órgãos ou municipal. Nesse caso, a ofensa seria indireta; federais por competência não prevista diretaa ofensa direta seria a esses normativos infraconsmente na Constituição. Somente as primeiras são titucionais e, aí não se admitiria o especial. consideradas, ou seja, normas de caráter geral, como são as leis complementares, ordinárias, delegadas, as medidas provisórias, os decretos autônoO Supremo Tribunal Federal tinha a Súmula 399, mos e regulamentares expedidos anterior à Constituição de 1988, que dizia que os pelo Presidente da República. atos regimentais dos tribunais, os seus regimentos Nós temos uma dificuldade, internos não são considerados leis federais. por não se incluírem nesse conceito do ato normativo federal os Nós temos também sedimentado que, em reatos secundários produzidos, por exemplo, por curso especial, não se examina matéria de fato, autoridades administrativas, tais como resolunão se verifica conteúdo de petição ou peças proções, circulares e portarias, instruções normacessuais porque isso é revolver um exame, não é tivas. Nós temos muitos casos de provimentos fazer juízo sobre lei federal, mas sobre o conteúda OAB, que temos dito que não são lei fededo de uma peça processual ou de uma prova. Isso ral, exatamente porque a fonte de competência eu deixarei para a parte final da minha exposição, normativa, legislativa não deriva diretamente da porque não é bem assim. Se chegarmos à conConstituição. clusão de que estamos diante de um recurso de O Supremo Tribunal Federal tinha a Súmula revisão e não de um recurso de cassação. Esse é 399, anterior à Constituição de 1988, que dizia o grande dilema que temos de enfrentar. que os atos regimentais dos tribunais, os seus regimentos internos não são considerados leis federais. Eu não sei se isso é correto afirmar, depois 7 Conflito de lei federal com lei local da Constituição de 1988. Não tive oportunidade Também cabe recurso especial quando o acórde examinar a nossa jurisprudência específica sodão recorrido “julgar válido o ato de governo local bre esse assunto, porque não temos muitos casos contestado em face de Lei Federal”. Até recentedesses, mas eu não sei se seria correto, porque os mente, até a Emenda Constitucional 45, se não tribunais ganharam, com a Constituição de 1988, me engano, dizia-se que cabia recurso extraordiuma competência normativa importante, e me nário quando o acórdão local julgava válida a lei parece que, quando exercem essa competência normativa naqueles temas admitidos com base na própria Constituição, isso em relação aos tribunais da União, estou falando dos tribunais supe7 Súmula 636/STF: “não cabe recurso extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legariores, dos tribunais regionais federais, tribunais lidade, quando a sua verificação pressuponha rever a do trabalho, Tribunal Superior Eleitoral, Superior interpretação dada a normas infraconstitucionais pela Tribunal Militar. Nesse caso, creio que se poderia decisão recorrida.” 95 96 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores ou ato de governo local em face de lei federal. Essa competência para julgar válida a lei local em face de lei federal foi atribuída pela Emenda 45 ao recurso extraordinário (Supremo Tribunal Federal) com toda a razão, porque o conflito entre uma lei local e uma lei federal não é um conflito que se resolva à base de direito infraconstitucional. Esse é um conflito constitucional típico, porque envolve o exame das competências normativas que estão na Constituição. Para resolver o conflito entre uma lei local e uma lei federal, não resolvemos isso pelo princípio da hierarquia, porque não existe tal hierarquia, existe a competência legislativa. A Constituição que diz quem é competente para legislar sobre aquela matéria. 8 Danos morais, honorários advocatícios e equidade Nós temos enfrentado dificuldades no STJ, assim como o Supremo já tinha. Acho que o Supremo resolveu melhor do que o Superior Tribunal de Justiça do ponto de vista técnico, embora essas questões envolvam também um juízo político importante. É a questão de saber se cabe recurso especial, ou não, quando se alega ofensa ao princípio da equidade, especialmente em matéria de valoração de danos morais e, o que ocorre mais frequentemente, em matéria de fixação de honorários advocatícios. Há jurisprudência no sentido de que não se admite recurso especial a não ser que sejam fixados valores extravagantes para mais ou para menos. De qualquer modo, até para saber se houve fixação extravagante, de alguma forma temos que fazer um juízo a respeito. 9 Prequestionamento Outro problema importante, que está na base dessa questão toda, é o prequestionamento. Prequestionamento significa dizer que a Constituição exige como requisito de admissibilidade, tanto de recurso especial, quanto extraordinário, que o acórdão tenha violado a Constituição ou a lei. Para tanto, é preciso que tenha havido essa violação, que a matéria objeto dessa norma constitucional ou dessa lei federal tenha sido enfrentada. Não há necessidade de que o acórdão tenha mencionado o texto normativo. É indispensável que tenha havido o enfrentamento daquela matéria. Se o acórdão não citou o texto normativo, considera-se um prequestionamento implícito, e isso atende ao requisito do prequestionamento. Porém, o recurso tem de dizer qual é a lei federal que foi violada ou qual é a norma federal que foi violada. Isso é um requisito de admissibilidade formal. A parte recorrente tem, assim, de dizer qual é a norma federal ou a norma constitucional que tenha sido violada. No Superior Tribunal de Justiça acontece seguidamente de se considerar, às vezes, dispensável a indicação da norma federal tida por violada quando o recurso especial é baseado em divergência jurisprudencial. Então se diz que bastaria – acredito que sejam posições minoritárias – indicar o acórdão paradigma que decidiu o contrário, não precisaria explicitamente indicar no recurso qual é o dispositivo federal que está em questão. Eu acho que essa interpretação não tem assento na Constituição. A Constituição diz que cabe recurso especial, e, no caso da alínea c, diz assim: “quando o acórdão recorrido der a lei federal interpretação divergente.” Então é preciso que o recurso diga qual é a lei federal que foi objeto de interpretação divergente. Não vejo como fugir disso. Esse é o sentido da exigência constitucional. Temos outras questões envolvendo prequestionamento: a questão de ofensa a preceito normativo federal surgida no próprio julgamento, error in judicando; a questão do direito superveniente, quando há direito superveniente à decisão do acórdão recorrido. Nós, obviamente, não podemos imaginar a exigência de prequestionamento. Isso seria possível examinar no Superior Tribunal de Justiça? A questão do prequestionamento e a sua harmonização com o princípio iura novit curia. A questão mais delicada lá no Superior Tribunal de Justiça, pelo que eu vejo, é o chamado “efeito translativo”, e todos os recursos que, a rigor, têm que é a possibilidade de, no julgamento do recurso, conhecer de matéria que qualquer juiz série Cadernos do CEJ pode examinar de ofício. Existe isso nas instâncias extraordinárias? No meu entender, tanto o exame da prova quanto todas essas questões de prequestionamento, são controvérsias que estão na base daquela crise de identidade que falei no início. Depende, para respondê-las adequadamente, se o recurso especial e o recurso extraordinário são recursos de revisão ou são recursos de cassação. E às vezes nós jogamos em um lado e às vezes nós jogamos no outro; às vezes nós torcemos para o Grêmio e às vezes nós torcemos para o Atlético Mineiro ou para o Cruzeiro. Todos nós temos razão e ninguém tem razão. 10 Exame tripartido dos recursos extraordinário e especial No meu entender, e deixo aqui como um tema para meditação, nós deveríamos considerar a base do texto constitucional que temos hoje, de que esses recursos, tanto o extraordinário quanto o especial –, ao contrário dos recursos comuns, cujo julgamento é bipartido entre juízo de admissibilidade, oportunidade em que se faz um exame dos requisitos extrínsecos e intrínsecos para julgamento do mérito do recurso –, os recursos extraordinários no Direito brasileiro, na verdade, são tripartidos. Recurso ordinário reparte em juízo de admissibilidade e juízo de mérito. Nos recursos extraordinários, no meu entender, a rigor, teríamos que fazer um julgamento tripartido. Primeiro, um juízo de admissibilidade stricto sensu – que é comum a todos os recursos. Examinar os requisitos extrínsecos e intrínsecos, tempestividade, pagamento de custas etc. Em uma segunda etapa de julgamento, seria um julgamento de mérito stricto sensu, teria por objeto o exame dos chamados “fundamentos vinculados”, ocorrência ou não de violação à interpretação, divergência à lei federal ou de violação à Constituição. Os resultados possíveis: confirmar decisão recorrida, negando provimento; anular a decisão por error in procedendo ou reformar a decisão recorrida – eventualmente fazer isso mediante provimento parcial. Claro que cada uma dessas etapas supõe a superação positiva da etapa anterior. E a terceira etapa, se se der provimento nessa segunda, seria o julgamento da causa propriamente dito. Essa tripartição está muito clara na situação que temos na Constituição e no nosso Regimento Interno. O Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça diz assim: “No julgamento do recurso especial, verificar-se-á preliminarmente se o recurso é cabível” – admissibilidade. “Decidida a preliminar pela negativa, a Turma não conhecerá do recurso; se pela afirmativa, julgará a causa, aplicando o direito à espécie.” Essa norma regimental foi inspirada na Súmula 456 do Supremo, que diz a mesma coisa: “O Supremo Tribunal Federal, conhecendo do recurso extraordinário, julgará a causa aplicando o direito à espécie.” Só que temos um contexto histórico importante. O Supremo Tribunal Federal, quando falava em conhecer do recurso, significava um juízo positivo quanto àquilo que chamei aqui de “segunda etapa”, ou seja, quando considerava presente uma ofensa à lei federal ou à Constituição, porque se o Supremo entendia que não havia ofensa à lei federal ou à Constituição, dizia: não conheço do recurso. De modo que esse verbo conhecer, na linguagem do Supremo, que foi transposta para o Superior Tribunal de Justiça, tinha um sentido diferente do comum dos requisitos de admissibilidade previstos para os demais recursos ordinários. Portanto, diferentemente do que ocorre com o comum dos recursos, quando o julgamento é apenas bipartido entre juízo de admissibilidade – que pode resultar em conhecimento ou não conhecimento – e o de mérito – do qual deriva o provimento ou improvimento dos recursos extraordinários – o julgamento comporta três etapas sucessivas, cada qual subordinada à superação positiva da que lhe antecede. Juízo de admissibilidade, semelhante aos juízos ordinários; juízo sobre alegação de ofensa a direito constitucional ou a direito federal, que, na terminologia da Súmula do Supremo, compunha, conforme já registrado, juízo de conhecimento, e, finalmente, se for o caso, novo julgamento da causa. Essa técnica é muito semelhante ao do 97 98 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores julgamento das ações rescisórias, nas quais, também há, além do juízo sobre os pressupostos e condições da ação, um segundo juízo sobre a rescisão, propriamente dita, e um novo julgamento da causa, se for o caso. Quero dizer que essa PEC, que o Presidente do Supremo está propondo, aproxima-se disso, de certo modo, resgata isso, embora, a rigor, poderíamos obter esses mesmos resultados da PEC por uma interpretação constitucional, por uma nova visão desses requisitos constitucionais. 11 A PEC dos recursos O que diz a PEC? A PEC simplesmente propõe que a admissibilidade – esse é o termo que ela usa, poderia dizer a interposição – de recurso extraordinário ou especial não inibe o trânsito em julgado da decisão recorrida. Obviamente que vamos aqui criar muitos problemas, entre os quais saber, tendo havido trânsito em julgado, qual será a decisão objeto de uma eventual futura ação rescisória. No meu entender, nessas matérias objeto de recurso extraordinário ou especial, o próprio recurso já fará esse papel de rescisória, e eu acho que é isso que faz hoje. Mas, de qualquer modo, penso que a PEC até aproxima essa ideia que estou aqui colocando para a reflexão dos colegas. 12 Conclusão Percebe-se assim como é equivocada a ideia de que há integral interdição ao exame dos fatos e da prova no julgamento do recurso especial extraordinário. A rigor, essa interdição existe apenas em relação à primeira e à segunda etapa do julgamento do recurso. Uma vez superada essa fase, cumprirá ao tribunal julgar a causa aplicando o direito à espécie. Diz assim o nosso Regimento e a Súmula. Esse é um novo julgamento da causa, que não se faz em ação rescisória, oportunidade em que terá cognição ampla, poderá ter, não somente a respeito das questões de direito constitucional ou federal, mas também na matéria de ordem pública conhecida de ofício, e de todas as demais questões discutidas, sejam de Direito, inclusive de direito local, sejam de fato. Se vamos julgar a causa de novo, temos de julgar integralmente, como acontece no recurso de apelação. Quando se considera que um dos fundamentos do recurso é procedente, temos de examinar, por força do art. 515, § 2º, do Código de Processo, todos os demais, isto é, fazer uma reapreciação da causa. No fundo, o modelo imaginado pelo nosso constituinte é esse. E, para finalizar, é preciso reconhecer que a prática das nossas Cortes Superiores não abona inteiramente o significado da natureza revisional do recurso extraordinário, cuja principal consequência é justamente esta, de, na sua etapa final de julgamento, permitir a ampla cognição de todas as questões postas na causa. Por uma razão ou por outra, quase sempre de ordem prática, e por imposição da descomunal carga de processos submetida à sua apreciação, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça preferem, com muita frequência, recorrer à alternativa – justificável, em alguns casos, mas não em todos – de devolver à origem a apreciação dessas questões, conferindo ao recurso uma natureza muito mais de cassação do que de revisão, o que, a rigor, não é compatível com a Súmula/STF 456, nem com o art. 257 do Regimento Interno. Essa prática evidencia, no fundo, que não está inteiramente definida em nosso sistema a sua real natureza, se de cassação ou de revisão dos recursos extraordinários. Essa é a mensagem, Sr. Presidente, que eu gostaria de deixar como colaboração a esse importante evento, com os meus agradecimentos e, mais uma vez, com as minhas homenagens ao grande jurista e Ministro Thompson Flores. Muito obrigado. O Papel dos Tribunais Superiores na Alemanha Trad. Dr. Márcio Flávio Mafra Leal Professor Dr. h.c. Rolf Stürner Doutor em Direito pela Universidade de Tübingen. Professor Catedrático de Direito Civil, Processual Civil e Direito Comparado da Universidade de Friburgo. Diretor do Instituto de Processo Civil e Comparado Alemão da Faculdade de Direito da Universidade de Friburgo-Alemanha; Membro da Academia de Ciências de Heidelberg; Membro do American Law Institute. Ex-Desembargador do Estado de Baden-Württemberg-Alemanha. “ 1 Introdução Não é nenhuma tarefa fácil descrever o papel e posição dos tribunais superiores na Alemanha. O sistema judicial alemão é extraordinariamente complexo. Isso vale também em relação à jurisdição alemã com os dois tribunais europeus, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos, com sede em Estrasburgo, e o Tribunal de Justiça da União Europeia 1, em Luxemburgo. Na exposição sobre o papel dos tribunais superiores alemães, deve-se necessariamente, ainda, considerar as significativas mudanças sociais e políticas ao longo do tempo nos diferentes ramos do direito. Esta palestra deve começar com a curta enumeração dos seis tribunais superiores situados no topo do Sistema Judicial. Concluirei com um exame do significado político e social desses tribunais. A terceira parte dessa palestra dedica-se à coexistência nem sempre livre de conflitos dos tribunais superiores com os tribunais europeus. 1 N. do T.: Tradução tirada da página portuguesa da União Europeia. Doravante, chamar-se-á tão somente de Tribunal de Justiça Europeu. 100 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores 2 O sistema judicial alemão e os tribunais superiores da Alemanha mesmo senado, que, por sua vez, são nomeados pelo Conselho de presidentes dos tribunais superiores por dois anos. Os juízes 3 dos tribunais superiores federais 2.1 As diferentes jurisdições são escolhidos por uma comissão parlamentar, a chamada “Comissão Parlamentar de Seleção A atividade judicial na Alemanha divide-se de Juízes”. A Comissão é formada por 16 secreentre uma jurisdição geral e algumas jurisdições tários de justiça de cada Estado Federal alemão, especiais. Os tribunais da justiça comum, chabem como por um número idêntico de membros mada ordinária, exercem a jurisdição em todos escolhidos pelo Parlamento. A composição da os conflitos que não são remetidos às justiças Comissão selecionadora espelha a estrutura fedeespeciais. As justiças especializadas consistem ral e a respectiva divisão do Parlamento alemão essencialmente nas jurisdições trabalhista, admicom suas duas casas, a Câmara dos Deputados nistrativa, social e financeira. No topo de cada e o Conselho Federal. Os membros do Conselho jurisdição encontra-se um tribunal superior: o Federal são os representantes dos Estados. Os Tribunal Superior do Trabalho, o Tribunal Fedemembros da Câmara dos Deputados são eleitos ral Administrativo, o Tribunal Federal Social e diretamente pelo povo alemão uniformemena Corte Financeira Federal e, para a jurisdição te no território federal. A forma federal alemã comum, o Superior Tribunal de Justiça. Somente espelha-se também na estrutura das instâncias esses tribunais de última instância são federais. As dos tribunais. Como já exposto, os tribunais de instâncias inferiores são, ao contrário, estaduais. primeira e segunda instância vinculam-se aos EsUm paralelo de jurisdição federal e estadual com tados e não à União. instâncias próprias, como é o caso do Brasil, não A estrutura da jurisdição superior na Alemaexiste na Alemanha. nha segue três princípios básicos: equilíbrio de poder entre os órgãos jurisdicionais, legitimação democrática Tarefa da Corte Constitucional é interpretar a dos juízes por eleição parlamenConstituição e assegurar a primazia da sua validade, bem tar, bem como participação de como decidir sobre conflitos entre Estados federados e juízes leigos naqueles tribunais órgãos executivos de cada um desses Estados superiores federais, a cuja jurisdição se atribui especial significado de aspecto social, como O sistema alemão de divisão em cinco jurisdié o caso do Tribunal Superior do Trabalho e do ções com respectivos tribunais superiores no topo Tribunal Social Federal. O contexto institucional é previsto pelo art. 95 da Lei Fundamental, da torna claro que os pais da Constituição alemã de Constituição alemã. Ao legislador ordinário – sem 1949 e o legislador ordinário, na promulgação de que haja emenda constitucional – não é, portanleis federais concretizadoras da Lei Maior, estato, possível fundir as diversas jurisdições em uma vam totalmente conscientes do papel político e justiça unitária. Para evitar que os tribunais supesocial desses Tribunais e de seu status de poder e riores federais emitam decisões contraditórias, a influência. Uma compreensão apolítica da função Constituição prevê um Conselho formado pelos do Judiciário seria incompatível com a estrutupresidentes dos tribunais superiores, pelos preração prevista pela Constituição e suas leis ordisidentes de senados do respectivo tribunal que nárias concretizadoras. Mesmo se muitos autores cuida da matéria2, e por um dos ministros desse 2 N. do T.: a expressão “senado” corresponde às turmas ou câmaras dos tribunais brasileiros. 3 N. do T.: na Alemanha não há o título “ministro” para designar os juízes dos tribunais superiores. Todos são “juízes”. série Cadernos do CEJ alemães e estrangeiros controvertam sobre isso, os tribunais superiores alemães reconheceram muito bem o interesse público nos conflitos privados de relevância para sociedade, e em muitos casos ocuparam – para benefício do cidadão e da sociedade como um todo – o lugar de um hesitante legislador. 2.2 O Tribunal Constitucional Federal A descrição do sistema judicial alemão e seus tribunais superiores federais seria incompleta sem uma análise sobre o Tribunal Constitucional Federal. À Corte Constitucional se confere a tarefa primária de examinar a compatibilidade de atos do Executivo, do Legislativo e também do Judiciário com a Constituição e, se for o caso, declarar a sua inconstitucionalidade. O Tribunal Constitucional Federal, na sua forma atual, foi instituído pela Lei Fundamental de 1949. Como órgão constitucional encontra-se no topo do Sistema Judiciário – no mesmo plano dos órgãos constitucionais do Legislativo e do Executivo. Regras sobre a competência, atribuições decisórias e processos junto ao Tribunal Constitucional Federal se encontram na própria Constituição e na Lei Orgânica do Tribunal Constitucional Federal. Tarefa da Corte Constitucional é interpretar a Constituição e assegurar a primazia da sua validade, bem como decidir sobre conflitos entre Estados federados e órgãos executivos de cada um desses Estados. As decisões do Tribunal Constitucional Federal são vinculantes para os demais órgãos constitucionais da União, dos Estados e para todas as autoridades e tribunais. Em determinados casos, confere-se à decisão do Tribunal Constitucional Federal força de lei. O Tribunal Constitucional Federal é composto de dois Senados e cada um deles possui oito juízes. O primeiro Senado decide primariamente sobre reclamações constitucionais (Verfassungsbeschwerden), pelas quais uma ofensa a um direito fundamental é apreciada. O segundo Senado é competente preponderantemente para processos que afetem conflitos sobre a estrutura federal da Alemanha ou sobre a posição e atribuições dos órgãos da União e dos Estados. Apenas em casos excepcionais, que toquem a competência de ambos os Senados, eles atuam em Plenário. No Tribunal Constitucional Federal os processos podem ser iniciados por meio de uma reclamação individual ou reclamação de uma pessoa jurídica com a alegação de que a lei ou outro ato do Poder Público ou, ainda, ato de uma pessoa de direito privado tenha violado a Constituição. Um processo pode também ser iniciado por determinados órgãos políticos ou do Governo, para se examinar a constitucionalidade de atos da legislatura, do Executivo ou do Judiciário. Se, no bojo de uma lide comum, uma das partes questionar a constitucionalidade de uma lei e o tribunal processante entender que essa questão é relevante para a decisão do litígio, esse tribunal suspende o processo e remete a matéria à Corte Constitucional Federal, que então decide sobre isso. Mesmo o acórdão de um tribunal comum pode violar a Constituição. Tal ofensa pode resultar não só de um preceito legal que o tribunal aplicou, mas também da interpretação realizada do preceito ou dos próprios fundamentos da decisão. Num caso como este a reclamação ao Tribunal Constitucional Federal pode ser o único recurso efetivo. O juiz da Corte Constitucional é escolhido por ambas as casas do Legislativo alemão. Uma metade por uma comissão eleitoral da Câmara dos Deputados, a outra pelo Conselho Federal. Recrutam-se juízes do Tribunal Constitucional na política, entre professores das faculdades de direito e na magistratura dos tribunais superiores federais. O juiz da Corte Constitucional é nomeado para uma investidura de 12 anos, excluída a recondução. O processamento perante o Tribunal Constitucional Federal corresponde, em muitos aspectos, àquele perante tribunais comuns, obviamente com algumas exceções. Assim, por exemplo, uma decisão é proferida no tribunal por maioria de votos no Senado, contudo, diferentemente dos tribunais comuns, os juízes constitucionais que não compartilham da tese majoritária têm a possibilidade de declarar o voto divergente (dissenting opinion), e na práxis isso é feito mesmo que parcialmente. 101 102 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Erros graves de outros tribunais na aplicação e interpretação do direito podem se constituir uma violação à Constituição. Decisões judiciais e outros atos estatais que se baseiam numa interpretação insustentável do direito e, por isso, arbitrária, ou que padecem de um grave erro processual, podem ser compreendidos como violação do Direito Fundamental de acesso à jurisdição contra atos estatais arbitrários. A compreensão, de certo modo ampla, do Tribunal Constitucional Federal sobre sua própria competência e papel a tornou a mais poderosa instituição do Judiciário alemão e o órgão federal superior que goza de maior prestígio. Sua função de guardião confiável do Princípio do Estado de Direito e da Constituição é um elemento central da identidade alemã moderna. O Tribunal Constitucional alemão não é apenas um tribunal, ele é um poderoso e ativo formador do processo de tomada de decisão política. Quando a Corte Constitucional, em um dos seus mais importantes acórdãos, sobre um canal de televisão federal que se pretendia implantar, se pronunciou e decidiu que carecia o governo federal de competência para tal, o então chanceler e presidente do conselho parlamentar Konrad Adenauer assim se manifestou criticamente: “Desse jeito nós não tínhamos previsto.“ Ele queria dizer: quando nós preceituamos na nova Constituição a instituição de um Tribunal Constitucional, não pensamos tamanha ingerência contundente na política. Nesse ínterim, a política se acostumou a esse poderoso contrapeso e respeita a função integrativa do altamente considerado Tribunal Constitucional Federal. 3 Significado político e social dos tribunais superiores federais alemães 3.1 Nenhuma personificação da jurisprudência no âmbito judicial continental europeu Um processo judicial na Europa continental não é nenhum palco público com advogados-celebridades como seus protagonistas. A atmosfera de uma audiência judicial na Ale- manha evoca mais uma reunião entre homens de negócio no curso de um diálogo objetivo e racional. A função social e política e significado dos tribunais superiores alemães no seu desempenho não deve, assim, em princípio, ser julgada pelo público geral e pela mídia. É certo que nas últimas décadas alguns julgados importantes tenham atraído cada vez mais a atenção de jornais e alguns veículos midiáticos de massa. Entretanto, a personificação de decisões judiciais não corresponde à cultura jurídica alemã, nas quais se atribuem a juízes e advogados o status de celebridades, como é o caso dos EUA e conduz em parte a formas exageradas ou mesmo idolatria de algumas pessoas. A maioria das decisões, que toca questões de significado social, é tomada sob influência de uma constante discussão científica e pública. Os acórdãos são pronunciados pelo Tribunal ou pelo respectivo Senado julgador como um todo. Juízes, que tenham opinião divergente do Senado não podem sobressair, não é permitido nos tribunais superiores, diferentemente do Tribunal Constitucional, publicar o voto vencido. A sessão de julgamento e o voto no acórdão se dão de maneira fechada e, após a pronúncia do acórdão, deve permanecer em sigilo o que foi discutido. Como dito, apenas no Tribunal Constitucional Federal se permite ao juiz publicar o seu voto divergente. Alguns observadores anglo-americanos descrevem esse modo de julgamento como burocrático. Mas ele tem a vantagem de dar preferência a uma bem ponderada argumentação jurídica, que não expõe o juiz à tentação de se destacar politicamente. Tudo isso não significa, entretanto, que acórdãos que são julgados dessa forma não possam influenciar fortemente o desenvolvimento político e social na Alemanha. Se alguns autores constatam um forte predomínio da advocacia no desenvolvimento da sociedade norte-americana, a gente pode descrever, em termos comparativos, que a sociedade alemã é dominada por juízes – assim como a influência dos tribunais alemães se realiza mais em silêncio e, em parte, de maneira sinuosa. série Cadernos do CEJ 3.2 Exemplos selecionados da forte influência dos tribunais superiores federais no desenvolvimento do direito e da sociedade 3.2.1 Direito do Trabalho tantes dos trabalhadores nas decisões dos empresários – uma particularidade da ordem econômica alemã e uma razão para o seu poderio. 3.2.2 Direito Administrativo O Direito Administrativo alemão moderno Após a Segunda Guerra Mundial e com o iníexemplifica outro ramo jurídico, no qual a juriscio da reestruturação econômica da Alemanha, prudência dos tribunais superiores se substituiu no era necessário, no âmbito do Direito Coletivo inicio ao legislador e foi posteriormente um norte do Trabalho, desenvolver regras em relação aos para promulgação de normas legais. Nos anos 50 dissídios coletivos, aos conflitos entre empregae 60 do século passado havia na Alemanha uma dores e representantes dos empregados, espenecessidade urgente de novas regras ou, no mícialmente sobre greve e outros atos próprios da nimo, de reformas nas existentes para disciplinar luta dos trabalhadores nos conflitos de classes. O as relações jurídicas entre autoridades estatais ou governo e o Parlamento não se sentiam fortes o públicas e os cidadãos. A democracia do império bastante nessa época em conceber e promulgar alemão antes da Primeira Guerra era bem difenormas abrangentes, como um código do trabarente do que se poderia chamar de “perfeita”, e a lho. De um lado, receavam os então deputados e República de Weimar encontrava-se sob permaintegrantes do governo conflitos profundos com nente ameaça econômica e não estava, assim, na os recém-criados e já poderosos sindicatos. De condição de estruturar uma verdadeira adminisoutro, pretendia-se que o cada vez mais exitoso tração pública democrática, que pudesse trazer desenvolvimento do mercado aberto não fosse uma relação equilibrada entre a liberdade indiimpedido por limitações à livre iniciativa. vidual, de um lado, e a ordem pública, do outro. Na sequência foram disciplinadas por lei apeNo pós-guerra existia então um Tribunal Federal nas áreas parciais do Direito Coletivo do TrabaAdministrativo, que estabeleceu em muitas áreas lho, muitas áreas importantes, como, por exemregras detalhadas para condicionar a legalidade plo, o direito de greve, foram configuradas pelos das ações governamentais e atos administrativos e, tribunais do trabalho – especialmente pelo TST, com isso, criou um equilíbrio entre a necessidade que desenvolveu um sistema de Direito Coletide eficácia da Administração Pública e os direitos vo do Trabalho que funcionou bem. O sucesso de liberdade dos jurisdicionados. da economia alemã é, assim, em parte também mérito das capacidades e da saudável compreensão humana com O Superior Tribunal de Justiça alemão, como mais a qual o TST equilibrou os interesalto tribunal federal para lides cíveis em geral, exarou ses antagônicos de trabalhadores, diversos acórdãos paradigmáticos, que modificaram, sindicatos e sindicatos patronais. de modo bastante significativo, o direito então vigente A participação de juízes classistas experimentados junto ao Tribunal de última instância se mostrou, nesse aspecto, bastante vantajoso e comprovou, A jurisprudência do Tribunal Federal Adminisao mesmo tempo, o caráter político destacado trativo instituiu, entre outras coisas, uma diferendessa jurisprudência. ciação precisa entre atos administrativos nulos e O TST surgiu, portanto, em um campo jurídico anuláveis – conforme a importância do vício que a no lugar do legislador, que era de importância autoridade na emissão do ato cometeu. O resultacrucial para o desenvolvimento econômico da do dessa jurisprudência foi um denso emaranhado Alemanha do pós-guerra. A jurisprudência do de regras a guiar os procedimentos administrativos TST era a base para a participação dos represen- 103 104 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores e que deveriam ser observados pelos administradores, ao tempo em que se estabeleceu um sistema de recursos contra atos administrativos defeituosos. Quando o legislador ordinário federal e os legisladores estaduais finalmente promulgaram leis procedimentais para a Administração, recorreram em parte ao velho direito regional como modelo. Mas a jurisprudência do Tribunal Federal Administrativo serviu também, nesse aspecto, como um fundamento muito útil. As inovações das leis procedimentais administrativas trazidas pelo legislador não foram de grande relevância e também influenciaram raramente o desenvolvimento posterior deste ramo jurídico. Nesse ponto, é preciso dizer, ainda, que a jurisprudência do Tribunal Federal Administrativo se aproveitou de um intenso diálogo entre juízes de tribunais superiores e de importantes doutrinadores daquele tempo. Até hoje continuam perceptíveis os méritos da jurisprudência do Tribunal Federal Administrativo para a liberalização e democratização do direito administrativo alemão. 3.2.3 Direito Civil e o Código Civil alemão Poder-se-ia aceitar que não existe a necessidade e o respectivo espaço para um desenvolvimento judicial do significado social no Direito Civil, que, desde muito tempo, é marcado por uma codificação abrangente, como é o caso do direito alemão em matéria civil com seu Código correspondente. Essa presunção, numa análise mais próxima, não se sustenta, mesmo se ela em parte coincida com a percepção de um observador estrangeiro, especialmente dos países do case law. O Superior Tribunal de Justiça alemão, como mais alto tribunal federal para lides cíveis em geral, exarou diversos acórdãos paradigmáticos, que modificaram, de modo bastante significativo, o direito então vigente. Conforme preceitos expressos no Código Civil alemão não se podiam conferir dano moral ou compensação com o caráter sancionatório na forma de punitive damages naqueles casos em que se tratasse de difamação ou ofensa pela mídia de massa ao direito à privacidade. O STJ garantiu, embora num primeiro passo, danos morais, e uma década depois, também uma compensação sancionatória robusta, Nos casos de ofensa repetitiva e persistente do direito à privacidade ou à incolumidade da personalidade. Também não foi o legislador, mas o STJ que flexibilizou a restrição do Código Civil, na qual apenas danos materiais concretos sofridos e lucros cessantes são indenizáveis, e atribuiu também compensação para a mera perda da possibilidade de uso de um objeto, como, por exemplo, de veículo particular, da casa ou apartamento próprio, bem como, em determinados casos, por prejuízo em férias após a quebra contratual decorrente de ato ilícito danoso. Em casos de violação de patentes, direitos autorais e concorrência desleal, o STJ desenvolveu um método particular de cálculo dos danos, que se orientam pelo lucro obtido pela violação do direito. As regras detalhadas de responsabilidade civil profissional, incluindo-se normas probatórias específicas nos casos de responsabilidade de médicos, advogados e emitentes e negociantes de valores mobiliários, foram e são ainda o resultado da jurisprudência do STJ. A atividade legislativa não conduz na maioria das vezes a inovações, mas se esgota na mera incorporação ao direito positivo de princípios desenvolvidos pela jurisprudência do STJ. O direito alemão vigente sobre a garantia de valores mobiliários e créditos foi inovação do STJ e de seu tribunal predecessor, o Tribunal Imperial Alemão. A tese de se admitir penhora de garantia pignoratícia para todos os valores mobiliários e direitos sem que o proprietário seja excluído de continuar a se utilizar dos objetos, e que ele possa mesmo continuar dispondo das coisas, foi tão brilhante, que foi incluída no Uniform Commercial Code; embora, conforme os seus preceitos, contrariamente ao direito alemão sobre o efeito contra terceiros da garantia pignoratícia, fosse exigível, a requerimento, uma forma de apossamento ou registro. A defesa dos consumidores diante de cláusulas desvantajosas em contratos de adesão foi estimulada pelo STJ. A legislação alemã e, posteriormente, a europeia exerceu aqui também mais o papel de chanceladora das regras desenvolvidas judicialmente pelo STJ do que inovou legislativamente. série Cadernos do CEJ O direito alemão permite ações coletivas e de grupos apenas em casos especiais, e o mesmo vale para processos coletivos congêneres de consumidores e associações. Isso não significa, no entanto, que ações civis não possam influenciar decisivamente o desenvolvimento jurídico e social. Frequentemente um único portador de um direito transfere o seu crédito ajuizável por força de lei a um seguro privado ou de direito público, a fim de que o réu se veja confrontado por uma poderosa parte adversa. Sobre as consequencias jurídicas da crise financeira mundial são decididas preponderantemente por tribunais, não apenas nos EUA, mas também na Alemanha. Muitas questões controversas sobre responsabilidade civil são assim decididas pelo STJ, no sentido de uma responsabilização mais acentuada, ou serão futuramente por ele decididas. 3.2.4 O Tribunal Constitucional Federal – formador da sociedade alemã A importância do Tribunal Constitucional Federal para a determinação da autocompreensão da Alemanha do pós-guerra não é superdimensionada. Não existe nenhuma questão política ou social no período após a Segunda Guerra e nas últimas décadas, após a reunificação, que não tenha sido objeto de um conflito constitucional e sobre o qual não tenha havido decisão do Tribunal Constitucional Federal. Não se pode nesse ponto enumerar os processos em detalhes, apenas a título de clarificação, citem-se os seguintes exemplos: o rearmamento da Alemanha Ocidental; a integração da Alemanha na Comunidade Europeia dos primeiros dias até o Tratado de Lisboa; o enquadramento jurídico da reunificação alemã; a união monetária e a moeda europeia; a equiparação de direitos entre homens e mulheres sob o Código Civil; o direito de filhos ilegítimos; o casamento entre pessoas do mesmo sexo e seu status no direito de família e tributário; o direito do inquilinato e suas implicações sociais; rádio e televisão pública e privada, bem como mídia eletrônica; liberdade de expressão e de imprensa e o direito do indivíduo à esfera privada e proteção contra ofensa à identidade; tributação de casais e família; fundamentos da proteção de dados; o direito ao aborto e à reprodução assistida; direito de autodeterminação de pacientes sobre o seu destino; o direito de decisão do empregador; seguro-saúde público e privado e aposentadoria; participação da Alemanha em ações militares da OTAN e das Nações Unidas; garantia do devido processo legal; proteção do réu em processos penais; o direito ao livre exercício profissional e muito mais. Algumas decisões do Tribunal Constitucional Federal foram revolucionárias e motivaram o legislador a agir, outros acórdãos levaram a uma confirmação das soluções legislativas. De especial significância é – e isso precisa ser destacado – , que ultimamente quase todos os acórdãos do Tribunal Constitucional Federal são aceitos pela política e sociedade alemãs – alguns só após debates intensos e emocionais. Em muitos conflitos sociais a Corte Constitucional desempenha um papel de mediador confiável, cujas decisões levam em conta normalmente todos os aspectos dos desdobramentos sociais e econômicos futuros. Nessa tarefa o Tribunal Constitucional Federal não pretende, no entanto, ocupar o lugar do legislador parlamentar. O Tribunal na age de forma politicamente ativa, no mais das vezes apenas tem posição reativa. A iniciativa permanece com o Parlamento, mesmo se o Tribunal Constitucional em alguns casos possa dar diretrizes para a futura legislação, nos quais as leis vigentes são declaradas inconstitucionais. 4 A difícil coexistência do Tribunal Constitucional Federal e os tribunais europeus 4.1 Os tribunais europeus A Alemanha é membro da União Europeia e signatária da Convenção Europeia de Direitos Humanos. Os tribunais alemães estão assim em estreita relação com o Tribunal de Justiça da União Europeia em Luxemburgo e com o Tribunal Europeu de Direitos Humanos em Estrasburgo, e estão submetidos em boa medida à jurisprudência destes tribunais. 105 106 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores O Tribunal de Justiça Europeu foi instituído em 1957 como órgão judiciário com a tarefa de interpretar os tratados e acordos europeus e a dar unidade e uniformização na aplicação desses tratados, bem como assegurar o direito secundário neles baseado no seio de toda Comunidade. Em 1989 foi criado o Tribunal Geral da União Europeia de primeira instância, que é competente para determinados conflitos entre pessoas privadas e órgãos da União Europeia. Segundo o Tratado de Lisboa, o Tribunal de Justiça Europeu é dividido em três: o Tribunal de Justiça da União Europeia propriamente dito, o Tribunal Geral da União Europeia e o Tribunal da Função Pública da União Europeia (art. 19 do Tratado da União Europeia). As competências do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral da União Europeia, o então tribunal europeu de primeira instância, foram em parte modificadas pelo Tratado de Lisboa, mas permaneceram essencialmente as mesmas. to Comunitário é vinculante para o tribunal do país-membro. A remessa pode ser requerida pelas partes ao final do processo, mas pode o próprio tribunal assim decidir de ofício. Na práxis, os tribunais inferiores alemães – os juizados especiais e os tribunais de 1ª instância – raramente submetem uma questão ao Tribunal de Justiça Europeu. Remessas pelos Tribunais de Justiça dos Estados e pelo STJ são mais frequentes. Cada ano são submetidas cerca de 80 questões controvertidas de interpretação de direito europeu ao TJ Europeu por tribunais alemães. Se o STJ ou outro tribunal de última instância se recusar remeter a questão sem um motivo racional, pode isso acarretar a violação da garantia constitucional à jurisdição, que pode ser reparada no Tribunal Constitucional Federal. Aquela parte que foi prejudicada pela recusa de remessa ao Tribunal de Justiça Europeu pode ingressar com uma reclamação constitucional junto à Corte Constitucional e esta pode determinar, na sua decisão, que a O Tribunal Europeu de Direitos Humanos exerce uma matéria seja, enfim, enviada ao espécie de instância de recurso especial supranacional TJ Europeu. em questões, que tocam Direitos Humanos garantidos O Tribunal Europeu de Dipela Convenção Europeia respectiva. reitos Humanos exerce uma espécie de instância de recurso especial supranacional em O Tribunal de Justiça Europeu funciona como questões, que tocam Direitos Humanos garantiuma Corte Constitucional em relação aos tratados dos pela Convenção Europeia respectiva. Os Pae acordos de fundação da União Europeia, como íses signatários dessa Convenção não são apenas tribunal de recursos do Tribunal Geral (Tribunal os países membros da União Europeia, mas pratieuropeu de primeira instância) e como tribunal camente todos os países do continente, inclusive de interpretação vinculante para questões do a Turquia e a Rússia. Uma parte que pretenda Direito Comunitário europeu para os tribunais propor ação junto ao Tribunal Europeu de Direinacionais dos Países-Membros. Em todas as lides tos Humanos por violação de direito garantido pode em princípio qualquer tribunal alemão rena Convenção por parte de uma pessoa privada meter questões inconclusivas de interpretação ou por atos de um dos países membros, sejam lede Direito Comunitário ao Tribunal de Justiça, gislativos, sejam outros atos de império, inclusive sobre as quais depende uma resposta para um decisões judiciais, deve primeiro esgotar todos os caso concreto a decidir, a fim de que se exare um recursos previstos no respectivo País-signatário. esclarecimento vinculante. Para a Alemanha isso inclui também a proAqueles tribunais nacionais, cujas decisões positura de uma reclamação constitucional ao não possam mais ser atacadas por recursos inTribunal Constitucional Federal. Caso a pretensão ternos, são obrigados a efetuar a remessa da ajuizada também lá não tenha êxito, então pode questão. Como dito, o acórdão do Tribunal de o autor interpor agravo para o Tribunal de JustiJustiça Europeu sobre a interpretação do Direiça Europeu em Estrasburgo. O seu acórdão tem série Cadernos do CEJ efeito vinculante para o Estado alemão como um todo. O Tribunal Europeu de Direitos Humanos pode exarar uma sentença declaratória, cujo comando deve ser convertido em legislação, ato administrativo ou decisão judicial do país respectivo. O Tribunal Europeu de Direitos Humanos pode, ainda, atribuir ao autor uma indenização. Se o Tribunal decidir que um acórdão de última instância de um tribunal alemão ofende o direito da parte previsto na Convenção, pode este exigir em rescisória o afastamento do acórdão original. 4.2 A doutrina da Responsabilidade Compartilhada do Tribunal Constitucional Federal alemão Uma primeira análise do sistema judicial europeu poderia sugerir que ambos os tribunais europeus estariam no topo da hierarquia judiciária, tanto que mesmo os tribunais constitucionais estão submetidos a eles. Em caso de um conflito entre o Tribunal Constitucional Federal alemão e um tribunal europeu, seria vinculante para os tribunais nacionais inferiores a decisão deste último. Tal compreensão hierárquica da relação entre os tribunais europeus e o Tribunal Constitucional Federal alemão é incompatível com a doutrina desenvolvida pela Corte alemã da responsabilidade compartilhada. Segundo esta, tanto os tribunais europeus quanto os tribunais constitucionais de cada país devem velar para o asseguramento da tutela dos direitos fundamentais na União Europeia e nos respectivos Países-Membros. Essa concepção aplica o Tribunal Constitucional Federal tanto na sua relação com o Tribunal de Justiça Europeu quanto com o Tribunal Europeu de Direitos Humanos. A Corte Constitucional alemã reconhece, em princípio, a competência do Tribunal de Justiça Europeu para todas as questões de direito europeu. Entretanto, existem limites para o reconhecimento dessa posição de precedência do Tribunal continental. A Corte alemã não permite às autoridades implementar aquelas decisões do tribunal europeu que violem princípios básicos da Constituição alemã. Conforme essa concepção, permanece com o Tribunal Constitucional Federal o simples controle sobre o que deve ser preservado do núcleo do Princípio Democrático, do Estado de Direito e dos Direitos Fundamentais. Desde que o Tribunal Europeu garanta esse nível de proteção, a Corte Constitucional alemã não exercerá nenhum controle sobre a jurisprudência do Tribunal Europeu e da interpretação por ele realizada do direito continental. O Tribunal Constitucional alemão extrai sua competência para o exercício desse controle último pelo fato de que a Constituição alemã não permite e jamais permitiu a transferência da soberania estatal para organizações supranacionais sem que os limites descritos fossem observados. A União Europeia não é, conforme a doutrina do Tribunal Constitucional Federal, um País-membro, mas apenas uma reunião de países soberanos, que ademais são os “senhores do Tratado Europeu”, sem renunciar a sua própria identidade. A ideia de si próprio, que o Tribunal Constitucional cultiva, é aquela de um guardião dessa identidade do Estado. O possível conflito ainda se dá no plano teórico, mas na prática ainda não aconteceu. Todavia, a posição do Tribunal Constitucional significa um alerta ao Tribunal de Justiça Europeu, para que, com a ampliação da competência da União Europeia por meio de interpretação extensiva dos corpos de regras europeus, não se vá tão longe. Em relação à Convenção Europeia de Direitos Humanos, o Tribunal Constitucional defende a posição de que ela é um Tratado de Direito Internacional Público com caráter vinculante para Alemanha e que a Constituição alemã não pode mudar, tampouco limitar a sua validade. Consequentemente a Convenção de Direitos Humanos prevalece, no caso de conflito com a Constituição. Não existe, pois, nenhuma primazia do Tribunal da Convenção sobre o Tribunal Constitucional. Isso significa que, em caso de interpretação divergente de Direitos Fundamentais e Humanos, o Tribunal Constitucional tem posição firme de que a ele cabe a última palavra. Até o momento isso redundou essencialmente em dois casos de conflitos sérios. Em um caso, decidiu o Tribunal Europeu de Direitos Humanos que um acórdão do Tribunal Constitucional Federal violou o Direito à Intimi- 107 108 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores dade. A causa para essa interpretação conflituosa de um Direito Fundamental foi um peso e uma ponderação diversa do contraste entre a liberdade de imprensa com o direito à privacidade. Em um acórdão posterior acentuou o Tribunal Constitucional Federal mais uma vez o seu ponto de vista, de que não há ordem hierárquica entre ambos os tribunais. Ao final, porém, o Tribunal Constitucional Federal adaptou com muita cautela sua jurisprudência à abordagem dada pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos em relação à proteção do direito à esfera privada, nos casos de intervenções indevidas pela mídia de massa. O conflito mais recente relacionava-se com medidas de segurança de criminosos perigosos, que foi violado, segundo o Tribunal Europeu de Direitos Humanos pelo direito penal alemão. O STJ alemão confirmou o seu ponto de vista até aquele momento e respeitou a partir dali as diretrizes do acórdão do Tribunal de Direitos Humanos, sem que o STJ fizesse referência à anterior posição divergente do Tribunal Constitucional Federal. O legislador modificou mais tarde os preceitos de direito penal sobre medida de segurança, mas o Tribunal Constitucional Federal persistiu em um maior alinhamento dos tribunais alemães com a jurisprudência do Tribunal Europeu de Direitos Humanos. A doutrina da responsabilidade compartilhada teve um efeito reduzido para a práxis dos tribunais inferiores alemães. Apesar disso, a doutrina é um instrumento útil para a cultura jurídica de alguns países europeus, para protegê-los dos desdobramentos de uma arrogância exagerada dos juízes e tribunais europeus. Para o cidadão alemão a reclamação constitucional perde em parte o seu efeito protetivo, se competências abrangentes forem transferidas para os tribunais europeus, ainda mais por não existir lá o acesso do jurisdicionado por meio de uma reclamação europeia individual. A reclamação de direitos humanos para o Tribunal Europeu da Convenção compensa só em parte essa perda. Aos olhos da população alemã os tribunais europeus não ganharam até agora a autoridade de um guardião confiável dos direitos fundamentais. 5 Resumo Do significativo papel político e social dos tribunais superiores federais alemães nas últimas décadas não se pode duvidar. A população confia nos seus tribunais superiores, especialmente no Tribunal Constitucional Federal. A impressão de uma Justiça apolítica na Alemanha pode ser o resultado de um estilo sóbrio dos processos judiciais, que estão em nítida oposição com os dramas judiciais espetaculares, como se verifica nos tribunais angloamericanos. Não há nenhum motivo para uma mudança de estilo e da configuração do processo perante os tribunais alemães modernos e especialmente nos Tribunais Superiores. Existem observadores do processo alemão, que se queixam de uma carência de peso político e, irrefletidamente, equiparam um papel judicial político influente com a capacidade de encenar um drama judicial público. A essa análise superficial não se deve atribuir, no entanto, muita importância. série Cadernos do CEJ Die Rolle der obersten Gerichte in Deutschland 1. Einleitung Es ist keine ganz leichte Aufgabe, die Rolle und Stellung der obersten Gerichte in Deutschland zu beschreiben. Das deutsche Gerichtssystem ist außerordentlich kompliziert. Das gilt auch für das Verhältnis der deutschen Gerichtsbarkeit zu den beiden europäischen Gerichten, dem Europäischen Gerichtshof für Menschenrechte mit Sitz in Straßburg und dem Gerichtshof der Europäischen Union in Luxemburg. Bei der Darstellung der Rolle der deutschen obersten Gerichte muss man zudem die sich im Laufe der Zeit verändernde soziale und politische Bedeutung der verschiedenen Rechtsgebiete berücksichtigen. Dieser Vortrag soll mit einer kurzen Aufzählung der sechs obersten Gerichte an der Spitze des deutschen Gerichtssystems beginnen. Im Anschluss daran folgt eine Untersuchung der politischen und sozialen Bedeutung dieser Gerichte. Der dritte Teil des Vortrages widmet sich dann der nicht immer reibungsfreien Koexistenz der deutschen obersten Gerichte und der europäischen Gerichte. 2. Das deutsche Gerichtssystem und die deutschen obersten Gerichte 2.1 Die unterschiedlichen Gerichtsbarkeiten Die Rechtsprechungstätigkeit in Deutschland teilt sich auf zwischen einer allgemeinen Gerichtsbarkeit und mehreren Spezialgerichtsbarkeiten. Die Gerichte der allgemeinen Gerichtsbarkeit, die sogenannten ordentlichen Gerichte, üben die Rechtsprechung in allen Rechtsstreitigkeiten aus, die nicht speziellen Gerichtsbarkeiten zugewiesen sind. Die Spezialgerichtsbarkeiten b e s t e h e n i m We s e n t l i c h e n a u s d e n Gerichten der Arbeitsgerichtsbarkeit, der Verwaltungsgerichtsbarkeit, den Sozialgerichten und den Finanzgerichten. An der Spitze einer jeden Gerichtsbarkeit findest sich ein oberstes Bundesgericht: das Bundesarbeitsgericht, das Bundesverwaltungsgericht, das Bundessozialgericht, der Bundesfinanzhof und für die ordentliche Gerichtsbarkeit der Bundesgerichtshof. Nur bei diesen Gerichten der letzten Instanz handelt es sich um Bundesgerichte. Die unterinstanzlichen Gerichte sind dagegen Gerichte der einzelnen Bundesstaaten. Eine Parallelität von Bundesgerichtsbarkeit und einzelstaatlicher Gerichtsbarkeit im Instanzenzug, wie dies in Brasilien der Fall ist, existiert in Deutschland nicht. Das deutsche System der Aufteilung in fünf Gerichtsbarkeiten mit jeweils einem obersten Bundesgericht an der Spitze ist durch Art. 95 des Grundgesetzes, der deutschen Verfassung, vorgegeben. Dem Gesetzgeber ist es – ohne Verfassungsänderung – daher nicht möglich, die verschiedenen Gerichtsbarkeiten zu einem einheitlichen Gerichtswesen zusammenzulegen. Um zu verhindern, dass die obersten Bundesgerichte sich widersprechende Entscheidungen fällen, sieht die Verfassung einen Gemeinsamen Senat vor, der sich zusammensetzt aus den Präsidenten der obersten Bundesgerichte, den Vorsitzenden Richtern der betroffenen Senate der obersten Bundesgerichte sowie aus je einem weiteren Richter dieser Senate, die jeweils für die Dauer von zwei Geschäftsjahren von den Präsidien der obersten Bundesgerichte bestimmt werden. Die Richter der obersten Bundesgerichte werden von einem parlamentarischen Gremium, d em s o g en a n n t en R i c h ter wa h l a u s s c h u s s , gewählt. Der Richterwahlausschuss besteht aus 109 110 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores den 16 Justizministern der einzelnen deutschen Bundesstaaten sowie einer gleichen Anzahl von Mitgliedern, die vom deutschen Bundestag gewählt werden. Die Zusammensetzung des Richterwahlausschusses spiegelt die föderale Struktur Deutschlands und die entsprechende Aufteilung des deutschen Parlaments mit seinen beiden Häusern, dem Bundestag und dem Bundesrat, wider. Die Mitglieder des Bundesrates sind Vertreter der Einzelstaaten. Die Mitglieder des Bundestages werden dagegen direkt vom deutschen Volk in bundesweit einheitlichen Wa h l e n g e w ä h l t . D i e f ö d e r a l e S t r u k t u r Deutschlands zeigt sich auch im Gerichtsaufbau. Wie bereits geschildert, handelt es sich bei allen Gerichten der ersten und zweiten Instanz um Gerichte der Einzelstaaten, nicht um Gerichte des Bundes. durch die Verfassung und die konkretisierenden einfachen Bundesgesetze vorgegebenen Struktur unvereinbar. Auch wenn dies viele deutsche und ausländische Autoren bestreiten, so haben die deutschen obersten Bundesgerichte sehr wohl das öffentliche Interesse an bedeutsamen privaten Rechtsstreitigkeiten erkannt, und in vielen Fällen haben sie sich – zum Vorteil der einzelnen Bürger und der Gesellschaft als Ganzes – an die Stelle eines zögerlichen Gesetzgebers gestellt. besondere Bedeutung in gesellschaftlicher Hinsicht zukommt, nämlich beim Bundesarbeitsgericht und Bundessozialgericht. Der institutionelle Hintergrund macht deutlich, dass die Väter der deutschen Verfassung von 1949 und der einfache Gesetzgeber bei Erlass der die justiziellen Bestimmungen des Grundgesetzes konkretisierenden Bundesgesetze sich der sozialen und politischen Rolle der obersten Bundesgerichte und deren mächtiger und einflussreicher Stellung voll bewusst waren. Ein unpolitisches Verständnis der Funktion der Judikative wäre mit der ihr Aufgabe des Bundesverfassungsgerichtes i s t e s , d i e Ve r f a s s u n g a u s z u l e g e n u n d ihren Geltungsvorrang zu sichern sowie Streitigkeiten zwischen den bundesstaatlichen u n d e i n z e l s t a a t l i c h e n E x e k u t i v o rg a n e n zu entscheiden. Die Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts sind bindend für die übrigen Verfassungsorgane des Bundes, für die Verfassungsorgane der Bundesländer sowie für alle Behörden und Gerichte. In bestimmten Fällen kommt der Entscheidung des Bundesverfassungsgerichts Gesetzeskraft zu. 2.2 Das Bundesverfassungsgericht Eine Beschreibung des deutschen Gerichtssystems und seiner obersten Bundesgerichte wäre unvollständig ohne Berücksichtigung des Bundesverfassungsgerichts. Dem Bundesverfassungsgericht kommt die primäre Aufgabe zu, Gesetzgebung und exekutives, aber auch judikatives Handeln auf seine Vereinbarkeit mit Aufgabe des Bundesverfassungsgerichtes ist es, die der Verfassung zu überprüfen Verfassung auszulegen und ihren Geltungsvorrang zu und gegebenenfalls für sichern sowie Streitigkeiten zwischen den bundesstaatlichen verfassungswidrig zu erklären. und einzelstaatlichen Exekutivorganen zu entscheiden. Das Bundesverfassungsgericht in seiner heutigen Form wurde durch das Grundgesetz von 1949 eingerichtet, als Verfassungsorgan steht Die Struktur der deutschen obersten es an der Spitze der deutschen Judikative Gerichtsbarkeit folgt drei grundlegenden – auf einer Ebene mit den legislativen und Prinzipien: Machtgleichgewicht zwischen den exekutiven Verfassungsorganen. Regelungen zur Re c h t s p re c h u n g s o rg a n e n , d e m o k r a t i s c h e Zuständigkeit, zu den Entscheidungskompetenzen L egitimation der Bundesrichter durch und zum Verfahren beim Bundesverfassungsgericht parlamentarische Wahl sowie Beteiligung finden sich in der Verfassung selbst und im von L aienrichtern bei denjenigen obersten Bundesverfassungsgerichtsgesetz. B u n d e s g e r i c h t e n , d e re n Re c h t s p re c h u n g série Cadernos do CEJ Das Bundesverfassungsgericht setzt sich aus zwei Senaten zusammen, jeder Senat besteht aus acht Richtern. Der erste Senat entscheidet in erster Linie über Verfassungsbeschwerden, mit denen eine Verletzung der Grundrechte geltend gemacht wird. Der zweite Senat ist überwiegend für Verfahren zuständig, die Streitigkeiten über die föderale Struktur Deutschlands oder über Stellung und Aufgaben der Organe des Bundes und der Länder betreffen. Nur in Ausnahmefällen, die die Zuständigkeiten beider Senate berühren, verhandeln diese gemeinsam. Ve r f a h r e n können beim Bundesverfassungsgericht eingeleitet werden durch Individualbeschwerde oder Beschwerde einer privatrechtlichen juristischen Person mit der Behauptung, dass ein Gesetz, ein sonstiger Akt öffentlicher Gewalt oder auch das Handeln ein anderen Privatperson die Verfassung verletzt. Ein Verfahren kann auch eingeleitet werden durch bestimmte politische Organe oder Teile der Regierung, um Akte der Gesetzgebung oder Handlungen der Exekutive oder auch der Judikative auf ihre Verfassungsmäßigkeit überprüfen zu lassen. Wird im Rahmen eines gewöhnlichen Rechtsstreites von einer Partei die Verfassungsmäßigkeit eines Gesetzes in Frage gestellt und ist das Gericht der Auffassung, dass diese Frage für die Entscheidung des Rechtsstreites von Bedeutung ist, so setzt das Gericht das Verfahren aus und legt die Frage dem Bundesverfassungsgericht vor, das hierüber dann entscheidet. Auch das Urteil eines gewöhnlichen Gerichts kann die Verfassung verletzen. Solch eine Verfassungsverletzung kann sich aus den Rechtsvorschriften ergeben, die das Gericht angewandt hat, aber auch aus der vom Gericht vorgenommenen Auslegung der Vorschriften oder aus der Begründung der Entscheidung selbst. In solch einem Fall mag die Beschwerde zum Bundesverfassungsgericht der einzig effektive Rechtsbehelf sein. Die Richter des Bundesverfassungsgerichts werden durch die beiden Häuser des deutschen Parlamentes gewählt. Eine Hälfte durch einen Wahlausschuss des Bundestages, die andere Hälfte durch den Bundesrat. Die Richter des Bundesverfassungsgerichts rekrutieren sich aus der Politik, aus Professoren der juristischen Fakultäten der Universitäten wie auch aus der Richterschaft der obersten Bundesgerichtsbarkeit. Die Richter des Bundesverfassungsgerichts werden für eine Amtszeit von 12 Jahren ernannt, eine Wiederwahl ist ausgeschlossen. Das Ve r f a h r e n vor dem Bundesverfassungsgericht entspricht in vielerlei Hinsicht dem Verfahren vor den gewöhnlichen Gerichten, natürlich mit einigen Ausnahmen. So wird beispielsweise eine Entscheidung beim Bundesverfassungsgericht durch die Stimmenmehrheit im Senat getroffen, aber anders als Richter der gewöhnlichen Gerichte haben Verfassungsrichter, die der Mehrheitsmeinung nicht zustimmen, die Möglichkeit, eine dissenting opinion zu verfassen, und in der Praxis tun sie dies auch teilweise. Schwerwiegende Fehler anderer Gerichte bei der Anwendung und Auslegung des Rechts können eine Verfassungsverletzung begründen. Gerichtliche Entscheidungen und andere staatliche Handlungen, die auf einer objektiv unhaltbaren und damit willkürlichen Auslegung d e s Re c h t s b e r u h e n o d e r d i e a n e i n e m schwerwiegenden Verfahrensfehler leiden, können als Verletzung des grundrechtlich gewährten Schutzes vor willkürlichem staatlichem Handeln verstanden werden. Das teilweise etwas weitgehende Verständnis des Bundesverfassungsgericht von der eigenen Zuständigkeit und den eigenen Aufgaben machte es zur mächtigsten Institution der deutschen Judikative und zu demjenigen obersten Bundesorgan, das von den Bürgern die größte Achtung erfährt. Seine Funktion als verlässlicher Wächter des Rechtsstaatsprinzips und der Verfassung ist ein ganz zentrales Element der modernen deutschen Identität. Das Bundesverfassungsgericht ist nicht nur ein Gericht, es ist ein mächtiger und aktiver Gestalter des P rozesses politischer Entscheidungsfindung. 111 112 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Als das Bundesverfassungsgericht eines seiner ersten bedeutenden Urteile zu einem geplanten staatlichen Bundesfernsehen fällte und entschied, dass es der Bundesregierung hierfür an der Kompetenz fehle, soll der frühere Bundeskanzler und Vorsitzende des Parlamentarischen Rates Konrad Adenauer kritisch geäußert haben: „So haben wir uns das nicht vorgestellt.“ Er wollte sagen: Als wir in der neuen Verfassung die Einrichtung eines Verfassungsgerichts vorsahen, dachten wir nicht an solch rigide richterliche Einmischung in die Politik. Mittlerweile hat sich die Politik aber an dieses machtvolle Gegengewicht gewöhnt und respektiert die integrative Funktion des hoch geachteten Bundesverfassungsgerichts. 3. Politische und soziale Bedeutung der deutschen obersten Bundesgerichte 3.1 Keine Personifizierung der Rechtsprechung im kontinentaleuropäischen Rechtsraum Ein Gerichtsverfahren in Kontinentaleuropa ist kein öffentliches Schauspiel mit prominenten Anwälten als dessen P rotagonisten. Die Atmosphäre einer Gerichtsverhandlung in Deutschland gleicht mehr der einer Sitzung von Geschäftsleuten mit einem sachlichen und rationalen Gesprächsverlauf. Die soziale und politische Funktion und Bedeutung der deutschen obersten Bundesgerichte darf daher nicht in erster Linie auf Grundlage ihrer Wahrnehmung durch die Allgemeinöffentlichkeit und die Medien beurteilt werden. Zwar haben in den letzten Jahrzehnten bedeutsame Gerichtsentscheidungen die Aufmerksamkeit der Zeitungen und sonstiger Massenmedien in verstärktem Maße auf sich gezogen. Dennoch entspricht es nicht der deutschen Rechtskultur, Gerichtsentscheidungen zu personifizieren, indem sie prominenten Richtern oder Anwälten zugeschrieben werden, wie dies in den USA der Fall ist und teilweise zu Formen übersteigerter Bewunderung oder gar Anbetung einzelner Personen führt. Die meisten Entscheidungen, die Fragen von gesellschaftlicher Bedeutung betreffen, werden unter dem Einfluss einer anhaltenden wissenschaftlichen oder öffentlichen Diskussion getroffen. Entscheidungen werden durch das Gericht bzw. den entscheidenden Senat als Ganzes gefällt. Richtern, die sich mit ihrer Urteilsmeinung in der senatsinternen Abstimmung nicht durchsetzen können, ist es bei den obersten Bundesgerichten anders als beim Bundesverfassungsgericht nicht gestattet, ihre abweichende Meinung öffentlich zu machen. Die Urteilsberatungen und die Abstimmung über das Urteil erfolgen geheim und müssen auch nach Verkündung des Urteils geheim bleiben. Wie erwähnt, besteht lediglich beim Bundesverfassungsgericht die Möglichkeit, dass Richter ihr dissenting vote veröffentlichen. Einige anglo-amerikanische Beobachter des deutschen Prozesses bezeichnen diese Art der Entscheidungsfindung als bürokratisch. Sie hat aber den Vorzug einer wohlausgewogenen juristischen Argumentation, die nicht durch Versuche einzelner Richter gefährdet wird, sich politisch zu profilieren. All das bedeutet indessen nicht, dass Entscheidungen, die auf diese Art und Weise gefällt werden, die gesellschaftliche und politische Entwicklung in Deutschland nicht stark beeinflussen könnten. Wenn einige Autoren für die USA einen starken Einfluss der Anwaltschaft auf die Entwicklung der U.S.-amerikanischen Gesellschaft konstatieren, so könnte man im Vergleich dazu die deutsche Gesellschaft als Richter-dominiert beschreiben – wenn auch der Einfluss der deutschen Gerichte sich eher leise und teilweise nur schleichend vollzieht. 3.2. Ausgewählte Beispiele starker Einflüsse oberster deutscher Bundesgerichte auf die Rechtsentwicklung und die Gesellschaft 3.2.1. Arbeitsrecht Nach dem Zweiten Weltkrieg und mit dem Beginn des wirtschaftlichen Wiederaufbaus Deutschlands war es notwendig, im Bereich d e s ko l l e k t i v e n A r b e i t s re c h t s Re g e l n i n série Cadernos do CEJ Bezug auf Tarifverhandlungen, in Bezug auf Streitigkeiten zwischen Arbeitgebern und Arbeitnehmervertretern, insbesondere Streiks und sonstige Arbeitskampfmaßnahmen, zu entwickeln. Die Regierung und das Parlament fühlten sich zu dieser Zeit nicht stark genug, um ein umfassende Regelungen enthaltendes Arbeitsgesetzbuch zu entwerfen und zu verabschieden. Zum einen befürchteten die damaligen Parlamentarier und Regierenden tiefgreifende Konflikte mit den neu entstandenen und mächtigen Gewerkschaften. Zum anderen wollte man die immer erfolgreichere Entwicklung der freien Marktwirtschaft nicht durch Beschränkung unternehmerischer Freiheit behindern. 3.2.2. Verwaltungsrecht Das moderne deutsche Verwaltungsrecht stellt ein weiteres Rechtsgebiet dar, in dem die Rechtsprechung eines obersten Bundesgerichtes zunächst den Gesetzgeber ersetzte und für diesen dann später Richtschnur beim Erlass gesetzlicher Regelungen war. In den fünfziger und sechziger Jahren des letzten Jahrhunderts bestand in Deutschland ein dringendes Bedürfnis nach neuen oder zumindest reformierten Vorschriften zur Regelung der Rechtsbeziehungen zwischen den staatlichen oder anderen öffentlichen Behörden und den Bürgern. Die Demokratie des deutschen Kaiserreichs vor dem Ersten Weltkrieg war alles andere als perfekt, und die Weimarer Republik befand sich unter permanenter wirtschaftlicher Bedrohung und war daher nicht in der Lage, eine wirklich demokratische Ve r w a l t u n g a u f z u b a u e n , d i e p e r s ö n l i c h e Freiheit einerseits und öffentliche Ordnung andererseits in ein ausgewogenes Verhältnis hätte bringen können. In der Nachkriegszeit war es dann das Bundesverwaltungsgericht, das in weiten Bereichen detaillierte Regeln für die Voraussetzungen der Rechtmäßigkeit von Regierungs- und Verwaltungshandeln aufstellte und dabei ein Gleichgewicht zwischen dem Bedürfnis nach Effektivität der öffentlichen Verwaltung und den Freiheitsrechten der Bürger schuf. In der Folge wurden nur Teilgebiete des kollektiven Arbeitsrechtes durch Gesetz geregelt, viele zentrale Bereiche, wie beispielsweise das Streikrecht, wurden dagegen durch die Arbeitsgerichte gestaltet – insbesondere durch das Bundesarbeitsgericht, das ein gut funktionierendes System kollektiven Arbeitsrechts entwickelte. Der Erfolg der deutschen Wirtschaft ist damit zum Teil auch ein Verdienst der Fähigkeiten und des gesunden Menschenverstandes, mit dem das Bundearbeitsgericht die widerstreitenden Interessen von Arbeitnehmern, Gewerkschaften und Arbeitgeberverbänden in Ausgleich brachte. Die Mitwirkung von erfahrenen Laienrichtern beim Bundesarbeitsgericht als einem Gericht der letzten Instanz erwies sich insoweit als großer Vorteil und belegt zugleich den überaus politischen Charakter Der deutsche Bundesgerichtshof als das oberste dieser Rechtsprechung. Bundesgericht für allgemeine zivilrechtliche Streitigkeiten Das Bundesarbeitsgericht trat erließ zahlreiche grundlegende Entscheidungen, die das insoweit in einem Rechtsgebiet an bestehende Recht ganz erheblich veränderten. die Stelle des Gesetzgebers, das von grundlegender Bedeutung für die wirtschaftliche Entwicklung Nachkriegsdeutschlands war. Die Rechtsprechung Die Rechtsprechung des des Bundesarbeitsgerichts war die Grundlage Bundesverwaltungsgericht schuf unter anderem für die Mitwirkung der Arbeitnehmervertreter eine präzise Unterscheidung zwischen nichtigen bei unternehmerischen Entscheidungen – eine und lediglich anfechtbaren Verwaltungsakten – je Besonderheit der deutschen Wirtschaftsordnung, nach der Bedeutung des Fehlers, der den Behörden die mit ein Grund für die wirtschaftliche Stärke bei Erlass dieses Aktes unterlaufen war. Das Deutschlands ist. Ergebnis dieser Rechtsprechung war ein dichtes 113 114 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Geflecht von Regeln, die das von den Behörden zu beachtende Verwaltungsverfahren bestimmten und zugleich ein System von Rechtsbehelfen g e g e n f e h l e r h a f t e s Ve r w a l t u n g s h a n d e l n schufen. Als der Bundesgesetzgeber und die Gesetzgeber der einzelnen Bundesländer schließlich Verwaltungsverfahrensgesetze erließen, griffen sie zum Teil auf altes regionales Gesetzesrecht als Vorlage zurück. Aber auch die Rechtsprechung des Bundesverwaltungsgerichts diente insoweit als hilfreiche Grundlage. Die auf den Gesetzgeber zurückgehenden Neuerungen der Verwaltungsverfahrensgesetze waren von keiner großen Bedeutung und beeinflussten die spätere Entwicklung dieses Rechtsgebietes dann auch kaum. Es muss an dieser Stelle noch gesagt sein, dass die Rechtsprechung des Bundesverwaltungsgerichts von einem intensiven Dialog zwischen den Bundesrichtern und bedeutenden Rechtswissenschaftlern jener Zeit profitierte. Bis heute wirken die Verdienste der Rechtsprechung des Bundesverwaltungsgerichts für die Liberalisierung und Demokratisierung des deutschen Verwaltungsrechts uneingeschränkt fort. 3.2.3. Zivilrecht und das deutsche Bürgerliche Gesetzbuch Man könnte annehmen, dass ein Bedürfnis und entsprechender Raum für richterliche Rechtsbildung von gesellschaftlicher Bedeutung nicht besteht in Rechtsgebieten, die seit langer Zeit durch umfassende gesetzliche Kodifikation geprägt sind, wie dies im deutschen Recht für das Zivilrecht mit seiner Kodifizierung im Bürgerlichen Gesetzbuch zutrifft. Diese Annahme ist bei näherer Betrachtung allerdings so nicht aufrecht zu erhalten, auch wenn sie teilweise der Wahrnehmung ausländischer Beobachter, insbesondere solcher aus Ländern des case law, entspricht. Der deutsche Bundesgerichtshof als das oberste Bundesgericht für allgemeine zivilrechtliche Streitigkeiten erließ zahlreiche grundlegende Entscheidungen, die das bestehende Recht ganz erheblich veränderten. Nach den ausdrücklichen Vorschriften des deutschen Bürgerlichen Gesetzbuches durfte Schadensersatz in Form von Schmerzensgeld oder Schadensersatz mit Strafcharakter als eine Form der punitive damages auch in solchen Fällen nicht zugesprochen werden, in denen es um Diffamierungen oder Verletzungen des Rechts auf Privatsphäre durch Massenmedien ging. Der Bundesgerichtshof gewährte in diesen Fällen aber gleichwohl in einem frühen ersten Schritt Schmerzensgeld, und Jahrzehnte später sprach er auch einen maßvollen Strafschaden zu in Fällen von wiederholter und hartnäckiger Verletzung des Rechts auf Privatsphäre oder des Rechts auf unverletzte Identität. Es war auch nicht der Gesetzgeber, sondern der Bundesgerichtshof, der die strikte Beschränkung des Bürgerlichen Gesetzbuchs aufgab, wonach nur konkret erlittene materielle Schäden ersatzfähig sind, und Schadensersatz auch für den bloßen Verlust der Nutzungsmöglichkeit eines Gegenstandes zusprach, beispielsweise des eigenen Fahrzeuges, der eigenen Wohnung oder des eigenen Hauses, sowie in bestimmten Fällen auch für die Beeinträchtigung von Urlaubszeit infolge deliktischer Schädigung oder Vertragsbruchs. In Fällen der Verletzung von Patenten oder Urheberrechten sowie in Fällen des unlauteren Wettbewerbs entwickelte der Bundesgerichtshof eine besondere Methode der Schadensberechnung, die sich am durch die Rechtsverletzung erzielten Gewinn orientiert. Die detaillierten Regelungen beruflicher Haftung einschließlich besonderer Beweisregeln in Fällen der Arzt- oder Anwaltshaftung oder der Haftung der Emittenten und Veräußerer von Wertpapieren waren und sind immer noch das Ergebnis der Rechtsprechung des Bundesgerichtshofs. Gesetzgeberisches Tätigwerden führt insoweit meist nicht zu Neuerungen, sondern erschöpft sich in der bloßen Übernahme der durch die Rechtsprechung entwickelten Grundsätze in Gesetzesrecht. Das geltende deutsche Recht der Sicherheiten an Mobilien und Forderungen war eine Innovation des Bundesgerichtshofs und seines Vorgängergerichts, des deutschen Reichsgerichts. Der Gedanke, die Bestellung von Sicherheiten série Cadernos do CEJ an allen Mobilien und Rechten zuzulassen, ohne dass deren Inhaber von der weiteren Nutzung der Gegenstände ausgeschlossen wird und er über die Gegenstände sogar weiterhin verfügen kann, war so hervorragend, dass er auch im Uniform Commercial Code Aufnahme fand; allerdings ist nach dessen Vorschriften im Gegensatz zum deutschen Recht zur Drittwirksamkeit der Sicherheitenbestellung eine Form der Besitznahme oder Registrierung auf Antrag erforderlich. Der Schutz von Verbrauchern vor benachteiligenden Klauseln in vorformulierten Verträgen wurde durch den Bundesgerichtshof angestoßen, die deutsche und später die europäische Gesetzgebung war auch hier mehr eine Bestätigung der richterrechtlich entwickelten Regeln des Bundesgerichtshofs als legislative Innovation. Das deutsche Recht gestattet Verbands- oder Gruppenklagen nur in speziellen Fällen, und dasselbe gilt für ähnliche kollektive Verfahren durch Verbraucher oder Verbände. Das bedeutet aber nicht, dass zivilrechtliche Klagen die rechtliche und gesellschaftliche Entwicklung nicht erheblich beeinflussen können. Oft tritt der einzelne Anspruchsinhaber seine klageweise geltend zu machenden Ansprüche kraft Gesetzes an eine privatrechtliche oder öffentlich-rechtliche Versicherung ab, die dem Beklagten dann als mächtiger P rozessgegner gegenübersteht. Über die rechtlichen Folgen der weltweiten Finanzkrise wird überwiegend durch Gerichte entschieden werden, nicht nur in den USA, auch in Deutschland. Viele umstrittene Haftungsfragen sind insoweit bereits durch den Bundesgerichtshof im Sinne strenger Haftung entschieden oder werden in Zukunft durch diesen entschieden werden. 3.2.4. Das Bundesverfassungsgericht – Gestalter der deutschen Gesellschaft Die Bedeutung des Bundesverfassungsgerichts für die Bestimmung des Selbstverständnisses des Deutschlands der Nachkriegszeit kann nicht überbewertet werden. Es gibt keine bedeutende politische oder gesellschaftliche Frage in der Zeit nach dem Zweiten Weltkrieg und in den letzten Jahrzehnten nach der Wiedervereinigung, die nicht Gegenstand einer verfassungsrechtlichen Streitigkeit war und über die durch das Bundesverfassungsgericht entschieden wurde. Es können an dieser Stelle nicht alle Verfahren im Einzelnen aufgezählt werden, zur Verdeutlichung seinen lediglich einige Beispiele genannt: die Wiederbewaffnung Westdeutschlands; die Integration Deutschlands in die Europäische Gemeinschaft von den ersten Tagen bis zum Vertrag von Lissabon; der rechtliche Rahmen der deutschen Wiedervereinigung; Europäische Währungsunion und Europäische Währung; Gleichberechtigung von Mann und Frau unter dem Recht des deutschen Bürgerlichen Gesetzbuchs; das Recht der nichtehelichen Kinder; Eheschließung zwischen Gleichgeschlechtlichen und deren Status im Steuer- und Familienrecht; das Mietrecht und seine sozialen Implikationen; öffentlicher und privater Rundfunk und Fernsehen sowie elektronische Medien; Meinungs- und Pressefreiheit und das Recht des Einzelnen auf Privatsphäre und Schutz vor Identitätsverletzungen; Besteuerung von Ehegatten und Familien; Grundlagen des Datenschutzes; das Recht der Abtreibung und Reproduktionsmedizin; Selbstbestimmungsrecht von Patienten über ihr Schicksal; das Recht der Arbeitnehmermitbestimmung; öffentliche und private Krankenkassen und Rentenversicherung; Mitwirkung Deutschlands bei militärischen Handlungen der NATO und der Vereinten Nationen; Gewährleistung des Rechts auf richterliches Gehör; Schutz des Angeklagten im Strafverfahren; das Recht der freien Berufe und des Handwerks und vieles mehr. Manche Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts waren revolutionär und veranlassten den Gesetzgeber zum Handeln, andere Entscheidungen führten zu einer Bestätigung der gesetzgeberischen Lösungen. Von besonderer Bedeutung ist – und das muss betont werden – , dass letztendlich nahezu alle Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts von der deutschen Politik und auch der deutschen Gesellschaft akzeptiert wurden – 115 116 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores einige erst nach intensiver und emotionaler Debatte. In vielen gesellschaftlichen Streitigkeiten spielte das Bundesverfassungsgericht die Rolle eines verlässlichen Streitschlichters, dessen Entscheidungen meist alle wichtigen Aspekte der zukünftigen sozialen und wirtschaftlichen Entwicklung in den Blick genommen haben. Die Rolle des Bundesverfassungsgerichts zielt jedoch nicht darauf ab, an die Stelle des parlamentarischen Gesetzgebers zu treten. Das Gericht agiert nicht aktiv politisch, meistens reagiert es nur. Die Initiative verbleibt beim Parlament, wenn auch das Bundesverfassungsgericht Vorgaben für zukünftige Gesetzgebung machen kann in Fällen, in denen bestehende Gesetze für verfassungswidrig erklärt werden. Gericht erster Instanz geschaffen, das für bestimmte Streitigkeiten zwischen Einzelpersonen und Organen der Europäischen Union zuständig ist. Gemäß dem Vertrag von Lissabon setzt sich der Gerichtshof der Europäischen Union zusammen aus drei verschiedenen Gerichten: dem Europäischen Gerichtshof, dem Gericht der Europäischen Union sowie dem Gericht für den öffentlichen Dienst der Europäischen Union (Art. 19 EUV). Die Kompetenzen des Europäischen Gerichtshofs und des Gerichts der Europäischen Union, das frühere Europäische Gericht erster Instanz, wurden durch den Vertrag von Lissabon etwas modifiziert, blieben aber im Wesentlichen unverändert. Der Europäische Gerichtshof wurde 1957 als judikatives Organ der Europäischen Gemeinschaft eingerichtet mit der Aufgabe, die Europäischen Verträge und Vereinbarungen auszulegen und die Einheit und Einheitlichkeit der Anwendung dieser Verträge und des auf sie gestützten Sekundärrechts innerhalb der gesamten Gemeinschaft sicher zu stellen. 1989 wurde zusätzlich ein Europäisches über die Auslegung des Gemeinschaftsrechts ist für die Gerichte der Mitgliedsstaaten verbindlich. Die Vorlage kann von den Parteien des Ausgangsverfahrens angeregt werden, aber auch vom Gericht selbst beschlossen werden. In der Praxis legen die unteren Gerichte, in Deutschland die Amtsgerichte und die Landgerichte, dem Europäischen Gerichtshof nur selten Fragen Der Europäische Gerichtshof wirkt als Ve r f a s s u n g s g e r i c h t i m Hinblick auf die Verträge Der Europäische Gerichtshof für Menschenrechte übt eine Art u n d Ve r e i n b a r u n g e n supranationaler Revisionsgerichtsbarkeit in Angelegenheiten aus, zur Gründung der welche die durch die Europäische Menschenrechtskonvention Europäischen Union, als gewährleisteten Menschenrechte berühren. Rechtsmittelgericht für das Gericht der Europäischen Union (Europäisches Gericht erster Instanz) und als verbindliches 4. Die schwierige Koexistenz des Auslegungsgericht in Fragen des europäischen deutschen Bundesverfassungsgerichts Gemeinschaftsrechts für die nationalen Gerichte und der europäischen Gerichte der Mitgliedsstaaten. In allen Rechtsstreitigkeiten kann grundsätzlich jedes deutsche Gericht offene Auslegungsfragen des europäischen 4.1. Die europäischen Gerichte Gemeinschaftsrechts, auf deren Beantwortung es Deutschland ist Mitgliedstaat der Europäischen für den konkret zu entscheidenden Fall ankommt, Union und Unterzeichner der Europäischen dem Europäischen Gerichtshof zur verbindlichen Menschenrechtskonvention. Die deutschen Klärung vorlegen. Gerichte stehen daher in enger Beziehung zum Diejenigen nationalen Gerichte, deren Europäischen Gerichtshof in Luxemburg und dem Entscheidungen selbst nicht mehr mit Europäischen Gerichtshof für Menschenrechte in innerstaatlichen Rechtsmitteln angegriffen Straßburg und sind der Rechtsprechung dieser werden können, sind zur Vorlage verpflichtet. Gerichte in gewisser Weise unterworfen. Die Entscheidung des Europäischen Gerichtshofs série Cadernos do CEJ vor. Vorlagen von den Berufungsgerichten der Bundesländer und dem Bundesgerichtshof sind dagegen häufiger. J e d e s J a h r w e rd e n r u n d 8 0 Fr a g e n der Auslegung europäischen Rechts dem Europäischen Gerichtshof von deutschen Gerichten vorgelegt. Lehnt der Bundesgerichtshof oder ein sonstiges letztinstanzliches Gericht die Vorlage ohne sachlichen Grund ab, so kann dies eine Verletzung des durch die deutsche Verfassung gewährleisteten Rechts auf den gesetzlichen Richter bedeuten, die beim Bundesverfassungsgericht geltend gemacht werden kann. Diejenige Partei, die durch die Ablehnung der Vorlage an d e n E u ro p ä i s c h e n G e r i c h t s h o f b e l a s t e t wird, kann Verfassungsbeschwerde beim Bundesverfassungsgericht erheben, das in seiner Entscheidung hierüber dann anordnen kann, dass die Frage dem Europäischen Gerichtshof vorgelegt wird. Der Europäische Gerichtshof für Menschenrechte übt eine Art supranationaler Revisionsgerichtsbarkeit in Angelegenheiten aus, welche die durch die Europäische Menschenrechtskonvention gewährleisteten Menschenrechte berühren. Unterzeichnerstaaten dieser Konvention sind nicht nur die Mitgliedstaaten der Europäischen Union, sondern nahezu alle europäischen Staaten einschließlich der Türkei und Russland. Eine Partei, die beim Europäischen Gerichtshof für Menschenrechte die Verletzung eines durch die Menschenrechtskonvention gewährleisteten Rechts durch eine andere Privatperson oder durch Maßnahmen eines Unterzeichnerstaates, seien es legislative, administrative oder andere hoheitliche Handlungen einschließlich gerichtlicher Entscheidungen, geltend machen will, muss zunächst im jeweiligen Unterzeichnerstaat alle gegebenen Rechtsbehelfe ausschöpfen. Für Deutschland schließt dies auch die E r h e b u n g e i n e r Ve r f a s s u n g s b e s c h w e rd e zum Bundesverfassungsgericht ein. Hat das klägerische Begehren auch dort keinen Erfolg, so kann der Kläger Beschwerde zum Europäischen Gerichtshof für Menschenrechte in Straßburg erheben. Dessen Entscheidung hat Bindungswirkung für den deutschen Staat als Ganzes. Der Europäische Gerichtshof für Menschenrechte kann ein feststellendes Urteil erlassen, das dann umgesetzt wird durch nationale Gesetzgebung, Verwaltungshandeln oder Maßnahmen der nationalen Gerichte. Der Europäische Gerichtshof für Menschenrechte kann dem Kläger aber auch finanzielle Entschädigung zusprechen. Entscheidet der Europäische Gerichtshof für Menschenrechte, dass ein Urteil eines letztinstanzlichen deutschen Gerichts die Konventionsrechte einer Verfahrenspartei verletzt, so kann diese vor den deutschen Gerichten eine Wiederaufnahme des Verfahrens verlangen mit dem Ziel, das ursprüngliche Urteil zu beseitigen. 4.2. Die Doktrin von der geteilten Verantwortung des deutschen Bundesverfassungsgerichts E i n e e r s t e A n a l y s e d e s e u ro p ä i s c h e n Gerichtssystems mag zu dem Ergebnis kommen, die beiden europäischen Gerichte stünden an der Spitze der judikativen Hierarchie, so dass auch nationale Verfassungsgerichte diesen unterworfen seien. Im Falle eines Konfliktes zwischen dem deutschen Bundesverfassungsgericht u n d e i n e m e u ro p ä i s c h e n G e r i c h t w ä re für die unterinstanzlichen nationalen Gerichte folglich nicht die Entscheidung des Bundesverfassungsgericht, sondern diejenige des europäischen Gerichts bindend. Ein solches hierarchisches Verständnis der Beziehung zwischen den europäischen Gerichten und dem deutschen Bundesverfassungsgericht ist mit der vom Bundesverfassungsgericht entwickelten Doktrin geteilter Verantwortung aber nicht vereinbar. Nach ihr haben sowohl die europäischen Gerichte als auch die nationalen Verfassungsgerichte Sorge zu tragen für die Sicherung des Grundrechtsschutzes in der Europäischen Union und den einzelnen Mitgliedstaaten. Diese Konzeption wendet das Bundesverfassungsgericht sowohl auf seine 117 118 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Beziehung zum Europäischen Gerichtshof als auch zum Europäischen Gerichtshof für Menschenrechte an. Das deutsche Bundesverfassungsgericht anerkennt im Grundsatz die Kompetenz des Europäischen Gerichtshofs für alle Fragen des europäischen Rechts. Dennoch existieren Grenzen für die Anerkennung dieser Vorrangstellung des Europäischen Gerichtshofs. Das Bundesverfassungsgericht gestattet es deutschen B e h ö rd e n n i c h t , s o l c h e E n t s c h e i d u n g e n des Europäischen Gerichtshofs umzusetzen, die grundlegende Prinzipen der deutschen Verfassung verletzten. Nach dieser Konzeption verbleibt beim Bundesverfassungsgericht damit lediglich eine Kontrolle darüber, dass der Kern des Demokratieprinzips und des Rechtsstaatsprinzips sowie der Grundrechte der einzelnen Bürger gewahrt werden. Solange der Europäische Gerichtshof dieses Schutzniveau gewährleistet, wird das Bundesverfassungsgericht keine Kontrolle über die Rechtsprechung des Europäischen Gerichtshofs und die von diesem vorgenommene Auslegung des Europarechts ausüben. Das Bundesverfassungsgericht leitet seine Kompetenz zur Vornahme dieser Letztkontrolle aus dem Umstand ab, dass die deutsche Verfassung die Übertragung von Staatsgewalt a u f ü b e r n a t i o n a l e O rg a n i s a t i o n e n n i c h t gestattet und nie gestattet hat, ohne dass die beschriebenen Grenzen beachtet werden. Die Europäische Union ist nach dem Verständnis des Bundesverfassungsgerichts kein Bundesstaat, sondern nur ein Verbund souveräner Staaten, die weiterhin „Herren der europäischen Verträge“ sind, ohne ihre eigenstaatliche Identität aufzugeben. Das Selbstverständnis, welches das Bundesverfassungsgericht pflegt, ist das eines Hüters dieser staatlichen Identität. Bis jetzt blieb der mögliche Konflikt Theorie, praktisch wurde er noch nicht. Dennoch bedeutet die Position des Bundesverfassungsgerichts eine Warnung an den Europäischen Gerichtshof, bei der Ausweitung von Kompetenzen der Europäischen Union durch extensive Auslegung des europäischen Regelwerkes nicht zu weit zu gehen. In Bezug auf die Europäische Menschenrechtskonvention steht das deutsche Bundesverfassungsgericht auf dem Standpunkt, dass diese Konvention ein für Deutschland bindender völkerrechtlicher Vertrag ist, der die deutsche Verfassung aber weder verändert noch in ihrer Geltung beschränkt. In der Konsequenz setzt sich im Konfliktfall die Verfassung gegenüber der Menschenrechtskonvention durch. Es existiert daher auch kein Vorrang des Konventionsgerichts g e g e n ü b e r d e m Ve r f a s s u n g s g e r i c h t . D a s b e d e u t e t , d a s s i m Fa l l e d i v e rg i e re n d e r Auslegung von Grund- und Menschenrechten das Bundesverfassungsgericht wiederum auf einer Position besteht, die ihm das letzte Wort sichert. Bisher kam es im Wesentlichen in zwei Fällen zu einem ernsthaften Konflikt. In einem Fall urteilte der Europäische Gerichtshof für Menschenrechte, dass eine Entscheidung des Bundesverfassungsgerichts das Recht auf Privatsphäre verletze. Ursache für diese konfligierende Auslegung eines Grundrechts war eine unterschiedliche Gewichtung bei der Abwägung der Pressefreiheit mit dem Recht auf Privatsphäre. In einer späteren Entscheidung betonte das Bundesverfassungsgericht dann noch einmal seinen Standpunkt, dass es keine hierarchische Ordnung zwischen den beiden Gerichten gebe. Letztendlich aber passte das Bundesverfassungsgericht seine Rechtsprechung in Bezug auf den Schutz des Rechts auf Privatsphäre vor Eingriffen durch Massenmedien in sehr behutsamer Weise dem Ansatz des Europäischen Gerichtshofs für Menschenrechte an. Der jüngste Konflikt betraf die Sicherungsverwahrung gefährlicher Straftäter, wo der Europäische Gerichtshof die Menschenrechte durch das deutsche Strafrecht verletzt sah. Der deutsche Bundesgerichtshof gab daraufhin seinen bisherigen Standpunkt auf und berücksichtigte fortan die Vorgaben der Entscheidung des Europäischen Gerichtshofs für Menschenrechte, ohne dass er noch auf die abweichende frühere Position des Bundesverfassungsgerichts Bezug nahm. Der Gesetzgeber änderte später die relevanten strafrechtlichen Vorschriften, wurde dann aber vom Bundesverfassungsgericht zu série Cadernos do CEJ stärkerer Anpassung an die Rechtsprechung des Europäischen Gerichtshofs für Menschenrechte angehalten. Die Doktrin der geteilten Verantwortung wird nur sehr selten bedeutsame Konsequenzen für die Praxis der unteren deutschen Gerichte zeitigen. Gleichwohl ist sie aber ein hilfreiches rechtliches Instrument, um die Rechtskultur der einzelnen europäischen Staaten vor den Folgen eines übersteigerten Selbstbewusstseins e u ro p ä i s c h e r R i c h t e r u n d G e r i c h t e z u schützen. Für den deutschen Bürger verliert die Verfassungsbeschwerde einen Teil ihrer schützenden Wirksamkeit, wenn umfangreiche Kompetenzen auf den Europäischen Gerichtshof übertragen werden, zu dem direkter Zugang des einzelnen Bürgers in Form einer europäischen Individualbeschwerde nicht besteht. Die Menschenrechtsbeschwerde zum Europäischen Gerichtshof für Menschenrechte kann diesen Verlust nur zum Teil ausgleichen. In den Augen der deutschen Bevölkerung haben die europäischen Gerichte bisher nicht die Autorität eines verlässlichen Hüters der Grundrechte erlangt. 5. Zusammenfassung An der politisch und gesellschaftlich überaus bedeutsamen Rolle der deutschen obersten Bundesgerichte in den letzten Jahrzehnten kann nicht gezweifelt werden. Die deutsche Bevölkerung vertraut auf seine obersten Gerichte und insbesondere das Bundesverfassungsgericht. Der Eindruck einer unpolitischen Justiz in Deutschland mag die Folge des nüchternen Stils deutscher Gerichtsverfahren sein, der in deutlichem Gegensatz zum spektakulären Justizdrama steht, wie es vor Gerichten d e s a n g l o a m e r i k a n i s c h e n Re c h t s r a u m e s stattfindet. Für eine Änderung des Stils und der Ausgestaltung des Verfahrens vor modernen deutschen Gerichten und insbesondere der obersten Gerichte besteht aber kein Anlass. Es gibt Beobachter des deutschen Prozesses, die einen Mangel an politischem Gewicht beklagen und ohne gründliche Überlegung die politisch einflussreiche richterliche Rolle mit der Fähigkeit gleichsetzen, ein öffentliches Gerichtsdrama zu inszenieren. Diesen oberflächlichen Analysen sollte man allerdings nicht zu viel Bedeutung zumessen. 119 120 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores Ministro Francisco Falcão (presidente de mesa), Desembargador Federal Vilson Darós, Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz e Professor Dr. Rolf Stürner “ MINISTRO FRANCISCO FALCÃO: Eminentes autoridades que compõem a Mesa, seleto auditório. Eliana Calmon é Ministra do Superior Tribunal de Justiça, Corregedora Nacional, Especialista em Processo pela Fundação de Direito da Universidade Federal da Bahia, foi Procuradora da República no Estado de Pernambuco e Professora de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade Católica de Salvador e de Direito Processual Civil da Universidade Federal da Bahia. Eliana Calmon é exemplo para todos nós, que fazemos a Justiça Brasileira. V. Exa. honra o Superior Tribunal no Conselho Nacional de Justiça, como seu representante e é a quem, neste momento, tenho o prazer de passar a palavra. Papel constitucional do Conselho Nacional de Justiça Ministra Eliana Calmon Graduada em Direito pela Universidade Federal da Bahia. Especialista em processos pela mesma instituição. Professora da Faculdade de Direito da Universidade Católica de Salvador e da Universidade Federal da Bahia. Procuradora da República no Estado de Pernambuco, Coordenadora do Núcleo de Preparação e Aperfeiçoamento dos Magistrados Federais do TRF da 1ª Região e Presidente da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça. Ministra do Superior Tribunal de Justiça. Colaboradora das organizações não governamentais a Associação de Mulheres de Carreira Jurídica (ABMCJ) e o Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA). Corregedora Nacional de Justiça. “ Exmo. Sr. Ministro Francisco Falcão, em nome de quem eu saúdo os ministros aqui presentes, professores estrangeiros, que nos brindaram com magníficas palestras neste dia, meus colegas magistrados, advogados, minhas senhoras, meus senhores. É sempre muito bom estar junto aos magistrados, especialmente os magistrados federais, com quem tive uma convivência maior na minha vida profissional. 1 Introdução Hoje estou aqui para falar sobre um assunto que não é de Direito, mas de Administração de Justiça e que me encanta: estar no exercício da atividade de Corregedora Nacional. Nunca me senti tão perto da Justiça como neste momento em que estou a exercer esta função. É uma função muito árdua, muito difícil, e algumas pessoas chegam a dizer que é um lugar onde se colecionam inimizades. Mas eu discordo na medida em que a Corregedoria é muito mais do que um órgão disciplinador: ele é um órgão de corregência, como tentarei passar para os senhores, dando a ideia do que seja o Conselho Nacional de Justiça. 122 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores 2 A estrutura judiciária brasileira grande dificuldade de gestão em quase todos os tribunais, e que estava difícil de se amoldar aos novos tempos, conforme estabelecido na Constituição de 88. E por quê? Porque a Constituição de 88 recortou a ordem jurídica por inteiro. Nós, brasileiros, fizemos uma revisão crítica do nosso Direito a partir da Constituição de 88, e foi exatamente no momento em que modernizamos a Administração do Estado e estabelecemos certos e determinados padrões de natureza federal para serem seguidos por todos, como por exemplo, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei Orçamentária, que foram criadas para serem obedecidas por todos os tribunais. Verificaram-se práticas corporativas na Administração, políticas de pessoal e salarial absolutamente diversas, e inação das Corregedorias e dos Órgãos Especiais em matéria disciplinar e de orientação. A Justiça brasileira hoje está formada pelo Supremo Tribunal Federal, como órgão de cúpula, e, a partir daí, vêm todos os outros órgãos ensejadores desta estrutura complexa e superdimensionada. Observem que, abaixo dos pés do STF, temos o CNJ e, em seguida, uma dualidade: a Justiça Comum, a Justiça Comum Especializada. Temos na Justiça Comum, a Justiça Estadual e a Federal, a Justiça do Trabalho, a Justiça Militar e a Justiça Eleitoral. Observem, então, a dificuldade. Nesse universo, além do aspecto da dualidade da Justiça Comum Federal e a Estadual, temos um país de dimensões continentais, como o Brasil. Marchamos com esse modelo de Justiça, dual e as Justiças especializadas, de tal forma que chegamos à Constituição de 88 tendo como modelo a Justiça Comum Federal, que é uma Justiça pequena, funcionando relativamente bem, porque haVerificaram-se práticas corporativas na Administração, via um órgão de gestão admipolíticas de pessoal e salarial absolutamente diversas, nistrativa e financeira que fazia e inação das Corregedorias e dos Órgãos Especiais em a concentração das normas dismatéria disciplinar e de orientação. ciplinadoras e de gestão dessa Justiça, o Conselho da Justiça Federal. Ora, a partir da Constituição de 88 foi necesDo mesmo modo, a Justiça do Trabalho, fedesário um maior incremento ao Poder Judiciáralizada, possui um Conselho. Tinha ela um único rio porque – como nação que marchava para Conselho antes da Emenda n. 45, onde estava o Estado democrático de Direito – houve naconcentrada a emissão de normas de gestão e turalmente uma ampliação dos direitos de cifinanceiras. Daí porque essas duas Justiças fundadania, os quais foram ainda mais ampliados cionavam relativamente bem. pelas técnicas de comunicação que chegavam ao século XXI. 3 A crise de gestão dos Tribunais E, dessa forma, houve a necessidade de auEstaduais mentar a base, chamando novos juízes para o Poder Judiciário. Esse aumento da base gerou A Justiça Comum Estadual era composta por maiores dificuldades, porque a cúpula não foi ca27 tribunais de justiça, independentes, autônopaz de nutrir esses novos magistrados com uma mos, com uma estrutura administrativa peculiar formação adequada para caminharmos para uma a cada Estado, cujo controle disciplinar ficava a nova estrutura de Poder Judiciário. cargo da Corregedoria e do Órgão Especial. Essa ideia de independência e autonomia mostrava4 Consequências da crise se, na prática, totalmente diferenciada das Justiças Federais. O que aconteceu? Verificamos que Quais as consequências de todos esses males essa estrutura já vinha de muitos anos, com uma que estavam muito claros em alguns diagnósti- série Cadernos do CEJ cos realizados? Os efeitos imediatos se deram na ponta ou na atividade fim, na aplicação do Direito. Começamos a ficar bastante lentos, com dificuldades de realização. Encontramos uma Justiça morosa, de custo processual muito alto, com grandes divergências, acúmulos de processos, retardo do desenvolvimento nacional, desestímulo dos investimentos, inadimplência, impunidade, descrédito dos cidadãos no Estado e na democracia. Tais consequências começaram a ser sentidas pelo jurisdicionados, e não raro encontrávamos nas páginas dos jornais críticas muito severas a respeito da situação do Poder Judiciário. Isso começou a incomodar a cúpula do Judiciário, os magistrados e os magistrados de primeiro grau, que foram os primeiros a se levantar contra esse estado de coisas. 5 Reforma do judiciário e controle externo Nesse momento de perplexidade começou-se a falar em uma solução para o Poder Judiciário. Veio à tona, então, a reforma do Judiciário, que passou a ser praticamente uma forma de coação. Todas às vezes em que estava em julgamento uma questão de grande interesse político se acenava para a reforma do Judiciário, e isso fez com que o Judiciário ficasse bastante amedrontado e com dificuldade em fazer com que tais reformas pudessem ser realizadas com perda de prerrogativas. Nós magistrados caminhávamos para a reforma do Judiciário na defensiva, porque diziam que haveria o controle externo. Ora, esse controle é exatamente uma típica atividade própria dos regimes parlamentaristas quando é preciso que o Parlamento exerça o controle da atividade do Judiciário. No regime presidencialista, como o brasileiro, falar em controle externo soa como algo bastante diversificado para a nossa estrutura. Mas essa ideia de controle externo era como se fosse um castigo para a magistratura, que não se amoldava ao modelo traçado na Constituição de 88. Nesse momento, começamos a nos preocupar com uma interferência política na atividade ju- dicante, e a magistratura marchou pesadamente contra o controle externo. 6 O Conselho Nacional de Justiça Graças a Deus, cabeças pensantes foram capazes de traçar novos rumos para o que se chamou de controle externo, mas, na realidade, de controle externo não se tratava. E por quê? Nós chegamos ao “controle externo”, entre aspas, com o Conselho Nacional de Justiça. E por que não se pode dizer que se trata de um controle externo? Porque ele tem uma formação eclética, e, dos 15 membros existentes, nove são da carreira de magistrados. É uma composição bastante equilibrada. Por exemplo: fala-se muito que o Conselho Nacional de Justiça, com a composição atual, não deveria ser integrado por magistrados de primeiro grau, porque, na realidade, em se tratando de um órgão que tem função de normatização e também função disciplinar, não seria possível que um magistrado de primeiro grau participasse de um julgamento disciplinar de magistrados de segundo grau. O legislador foi muito preciso quando tirou do Conselho Nacional de Justiça a questão da hierarquização e da verticalização, proporcionando a todos os conselheiros a mesma igualdade. Dessa forma, sim, é possível, porque nesse Tribunal administrativo a visão não é verticalizada, mas precisamente de administração, e, como administrador, tanto faz se tratar de juiz de primeiro grau como de segundo, porque eles têm visões diferentes a partir das suas próprias atividades. Portanto, esse Conselho está composto de magistrados de primeiro, segundo e terceiro graus, pois tem integrantes ministros e é presidido pelo chefe do Poder Judiciário, o Presidente do Supremo Tribunal Federal. A cidadania participa desse órgão por meio de seus representantes da Câmara e do Senado eleitos sem qualquer interferência do Poder Executivo porque são escolhidos e sabatinados pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Dessa forma, não se pode falar em controle externo, pois este seria aquele órgão próprio de domínio do Parlamento sobre o Executivo nos 123 124 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores países parlamentaristas, e a escolha para compor o controle externo é sempre do Poder Executivo. A composição e a atuação do Conselho Nacional de Justiça fogem inteiramente da pecha de controle externo, apesar de até hoje enfrentarmos uma grande resistência por uma parte considerável da magistratura, que teima em não aceitar o Conselho Nacional. 7 A questão dos Tribunais Estaduais no CNJ Ora, no universo que tínhamos, constatamos que os tribunais estavam absolutamente desalinhados. Observem que, quando o Conselho Nacional de Justiça começou a funcionar, encontrou 27 ilhas isoladas funcionando em cada Estado com absoluta independência. Cada tribunal tinha um sistema de informática que não se comunicava com os outros tribunais. E em alguns deles havia três sistemas de informática funcionando dentro do mesmo tribunal. Em algumas cortes estaduais foram encontrados funcionários fazendo as mesmas atividades em regimes jurídicos diferenciados. No meu Estado da Bahia, por exemplo, foram encontrados cinco regimes jurídicos diferentes para os servidores de um só tribunal, porque cada desembargador criava um sistema de gratificação, contemplando 10, 15, 20 servidores, e isso chegou a distorção tal, que foi preciso criar no Estado da Bahia uma autarquia para tomar conta da administração de pessoal. Essa desordem naturalmente era levada à atividade fim, que era a prestação jurisdicional. 8 Responsabilidade, democratização interna e planejamento estratégico O Conselho Nacional de Justiça nasceu com objetivos macros, que são a responsabilidade, a democratização interna e o planejamento estratégico. E podemos dizer que, dentro desse critério, foi preciso, no que toca à responsabilização, verificar o que aconteceu efetivamente. Pretendeu-se dar aos tribunais a responsabilidade de se autocontrolarem, de se autogerirem, de se autoadministrarem, porque era absolutamente irresponsá- vel a administração encontrada nesses tribunais. Dessa forma, estabeleceram-se planejamentos plurianuais, para serem seguidos de uma forma absolutamente correta e até com imposição por parte do Conselho Nacional de Justiça, para que os tribunais se gerissem devidamente. Nessa ideia de responsabilizar os tribunais pela sua administração, houve necessidade de repormos uma democratização interna. E por que isso se tornou tão importante? A democratização interna do Poder Judiciário visou subtrair a verticalização administrativa incompatível com qualquer modelo administrativo. Como a carreira é hierarquizada e existem primeiras e segundas instâncias, isso praticamente passou também para a administração como uma ideia de que também ela deveria ser verticalizada e, dessa forma, inteiramente dificultada pela ingerência de um componente estranho a qualquer sistema de administração. A atividade judicial deve ser independente e desatrelada de ordens, instruções e orientações. Mas o que se observou na prática foi a concreta ameaça à independência na atividade judicante, por pressões internas, oriundas dos órgãos de cúpula do Poder Judiciário que comprometia a imparcialidade do julgador. Refiro-me a práticas de obrigar o magistrado a aceitar servidores que estavam a serviço da cúpula. O magistrado não tinha qualquer liberdade de administrar o seu gabinete, por imposição verticalizada. Pela via administrativa, invadia-se ou pressionava-se a esfera de competência do juiz de primeiro grau, moldando-se consciências e comportamentos, no dizer do então juiz federal Flávio Dino, que participou do Conselho Nacional de Justiça e hoje se dedica à carreira política. A verticalização encontrada nos intestinos do Poder Judiciário confundia a hierarquia de carreira, formada por juízes de instâncias inferiores e superiores, com hierarquização administrativa, vedando-se a participação e o debate de juízes de primeiro grau nas deliberações sobre planejamento e gestão, dos quais os juízes só eram partícipes como assessores. A prática autoritária e antidemocrática interferia diretamente na priorização de obras, na aqui- série Cadernos do CEJ sição de equipamentos, realizações de programas e funcionalidade das instalações. Ainda se encontra, em alguns tribunais, a máxima “tudo para a segunda instância, nada para a primeira”. Há 20 magistrados em cada gabinete no Estado de Alagoas, e encontramos juizados especiais, que é o figurino do Poder Judiciário, com dois servidores. Um dos aspectos prioritários na atuação do Conselho Nacional de Justiça foi o de impor o planejamento estratégico, porque os projetos eram de cada administrador, e modificavam-se a cada dois anos, quando mudava a mesa com o Presidente, Vice-Presidente e Corregedor. Dessa forma, era um sempre começar e nunca terminar. Por isso, foi necessário, objetivando-se um planejamento maior, que se estabelecesse, pela primeira vez, um Poder Judiciário com um projeto, por meio do planejamento estratégico. 10 Outros objetivos do CNJ A ideia foi de publicizar a atividade administrativa do Poder Judiciário, sem qualquer interferência, portanto, com a atividade judicante propriamente dita. Observem que, nesses objetivos macros, podemos ainda detalhar os objetivos imediatos, como: a) a reformulação dos quadros de pessoal; b) o controle da administração, por meio do controle interno estabelecido, e da verificação de toda a contabilidade que se fazia dentro dos tribunais; c) transparência e publicidade para esse controle financeiro; e d) ações de planejamento, coordenação e controle administrativo. A regra é: controle, controle e controle, para, dessa forma, chegarmos ao planejamento com as metas estabelecidas pelo CNJ. Foram estabelecidos, no ano de 2009, ou seja, somente cinco anos depois de existir o CNJ, vários cadastros. Os magistrados, [...] estabeleceram-se planejamentos plurianuais, para inclusive, ficam muito amolaserem seguidos de uma forma absolutamente correta dos, porque têm que, a toda e até com imposição por parte do Conselho Nacional de hora, preencher cadastro. Justiça, para que os tribunais se gerissem devidamente. Mas foi a única forma possível de se ter o controle do que se passa no Judiciário. 9 Publicidade Assim, temos hoje: a) o cadastro de todos os processos existentes; b) o cadastro das ações de Por fim, a publicidade. Todos falavam que o improbidade – e descobrimos que existem tribuPoder Judiciário brasileiro era uma caixa preta, e nais que nunca julgaram uma ação de improbinós não aceitávamos isso. E eu, como magistrada dade –; c) cadastro sobre os bens apreendidos; antecedente à Constituição de 88 e vivenciando d) cadastro de menores que estão para a adotoda a problemática de aprovação do controle ção; e) cadastro de pessoas que se oferecem para externo do Poder Judiciário, posso dizer que tamadoção, a fim de evitar os atravessadores que bém achava que não havia caixa preta. E eis que comercializam pessoas como o tráfico de seres a caixa preta foi aberta com o Conselho Nacional humanos com bebês. de Justiça, e ela era tão hermética e tão preta, que nós mesmos não sabíamos o que tinha dentro dela. 11 As metas Quando abrimos a caixa, a primeira coisa foi contar os processos, e, pela primeira vez, este O planejamento foi estabelecido por meio de País contou os processos, para saber quantos dez metas, e todo o trabalho do Conselho Nadeles tramitavam pelo Poder Judiciário. Nesse cional de Justiça parte destas. Todas às vezes que momento, o Conselho Nacional de Justiça cria se tem uma grande tarefa é preciso repartir para, o “Justiça Aberta”, onde estão e devem estar todessa forma, conseguir ir em frente. dos os processos, para assim termos a ideia da A primeira meta foi planejar, e a segunda foi quantidade. contar os processos e, a partir daí, começar a 125 126 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores julgar os processos mais antigos, aqueles que chegaram ao Judiciário até dezembro de 2005. Isso foi um sucesso absoluto. Do Oiapoque ao Chuí, nós todos, magistrados, começamos a contar os processos, do juiz substituto aos ministros do Superior Tribunal de Justiça. Eu não sei se o Supremo contou, mas sei que o Superior Tribunal de Justiça assim o fez e descobriu muitas coisas. Descobriu processos que estavam distribuídos erradamente, que estavam em tribunais equivocados, processos que já precisavam estar no arquivo, e, dessa forma, fez-se uma limpeza. Não conseguimos terminar essa meta, mas digo aos senhores que, por meio do mutirão, que está no maior Tribunal Regional Federal, que é o da 3ª Região, nós já conseguimos julgar dois terços dos processos da Meta 2, que encontramos no mês de outubro do ano passado. Essa meta foi, portanto, eficaz, e alguns tribunais já estão praticamente zerados com os processos da Meta 2. Partimos, então, para a terceira meta, que é a informatização dos tribunais, pois a informática era um caos total. Por quê? Porque os tribunais não contavam com sistemas de intercomunicação. E tem sido uma luta para conseguir que os tribunais se comuniquem entre si, com o Conselho Nacional de Justiça e com o Superior Tribunal de Justiça. A Meta 4 é a informatização da distribuição. Lógico que essa caótica situação não foi encontrada na Justiça Federal, nem na Justiça do Trabalho; mas essa era a realidade da Justiça Comum Estadual. Iniciou-se, então, a informatização da distribuição, para que não fosse possível burlá-la. E chegamos, então, à Meta 5, com a informatização das Varas de Execução. Na Vara das Execuções havia um absoluto caos em relação às prisões provisórias. Foram encontrados presos provisórios há cinco, dez anos, sem sentença, sem carta de guia. O preso sem carta de guia não pode usufruir de nenhum benefício; é como se fosse um morto, ele não existe para o sistema do Judiciário. Dessa forma, foi preciso, sim, estabelecer o controle, informatizando-se a Vara de Execuções Penais. Este ano, há quatro meses, cheguei à Vara de Execuções Penais do Pará e encontrei 700 presos e 11.000 processos em curso. Cada requerimento de um preso gerava um processo, e esses processos se acumulavam de tal forma que o juiz despachava nos autos gerados por aquele pedido de benefício sem ver os autos principais. Lógico que isso tinha um endereço certo, que era a correição. Foi preciso então fazer um expurgo, e hoje estão presos quatro servidores dessa Vara. A responsável que tinha ligações com uma desembargadora está foragida. Limpamos tudo que era possível, pela coragem de uma juíza que hoje está com escolta 24 horas, pois, naturalmente, ela começou a desagradar segmentos consideráveis que se locupletavam dessa desordem total. E aí passamos para a Meta 7 – capacitação de gestores nas rotinas –, porque foram encontrados servidores em situação abismal, sem qualquer qualificação. Dessa forma, foi possível a capacitação dos gestores e a informatização de todos os processos em cadastros eletrônicos. O acesso dos magistrados aos cadastros eletrônicos foi viabilizado e eles podem fazer bloqueio de recursos, penhoras, etc., on line. O controle interno também foi informatizado e chegamos, por fim, à última meta, estabelecida em 2009, que foi o processo eletrônico. 12 Balanço Posso dizer aos senhores que nenhuma meta se completou totalmente. Cada meta é estabelecida dentro de um prazo, e o prazo maior foi de cinco anos. Como foi fixado em 2009, ainda temos um pouquinho de tempo para realizá-las. Dentro desse critério e dessa realidade, digo aos senhores que hoje me encanta fazer parte desse trabalho de reconstrução do Poder Judiciário. Nós temos muito que fazer, mas já fizemos muitas coisas, coisas impensáveis, como, por exemplo, na parte de cartórios e serventias extrajudiciais, que está uma bagunça. Encontramos, por exemplo, alguns cartórios onde os livros de registros de imóveis estão carcomidos pelas traças e pelos cupins, sendo guardados no chão. Os servidores e os juízes auxiliares que foram ao interior do Piauí, do Pará, do Amazonas, trazem as fotografias do que são os cartórios de registro série Cadernos do CEJ imobiliário, que causam, sem dúvida alguma, o grande problema de conflitos fundiários, nascidos exatamente dessa desordem sob o ponto de vista administrativo da Justiça. 13 A Corregedoria Nacional Dentro do Conselho Nacional de Justiça funciona o órgão de disciplina, que é a Corregedoria Nacional de Justiça. A Corregedoria Nacional de Justiça tem previsão constitucional e, é importante dizer, não está atrelada à Presidência do Conselho Nacional, porque foi pensado para ser um órgão disciplinar e orientador, isto é, tem funções executivas e disciplinares. Desempenhando função executiva, a Corregedoria fiscaliza a implementação das políticas traçadas pelo Conselho Nacional. Daí porque todo o desenvolvimento das políticas que hoje estão sendo executadas para reorganizar o sistema carcerário brasileiro, que estava absolutamente no chão, é fiscalizado pela Corregedoria. Por isso chegamos às Varas de Execução, onde é a finalização de todo o processo; e aos presídios para fazermos as verificações nas instalações. Observem que o que nós tínhamos era um serviço perverso para com a magistratura. Tudo estava sob a responsabilidade desta, que não sabia de absolutamente nada. No sistema carcerário, o juiz das execuções é o responsável por todos os presos que estão no presídio, mas quem manda naquele preso é o carcereiro, o diretor do presídio, o secretário de Administração, o secretário de Justiça, porque os presídios, de modo geral, são estaduais. Mas quem assina todos os papéis no sistema de extrajudiciais é o juiz, que é responsável por tudo. É ele quem fiscaliza os cartórios extrajudiciais e diz se está tudo em ordem, dando e mostrando a sua responsabilidade. Mas nunca disseram a ele o que era fazer parte da administração e ser fiscal dos cartórios extrajudiciais. Existem magistrados que nunca pisaram em um presídio. Nunca. E mandam os presos para presídios que não conhecem e não sabem como funcionam. Isso era uma verdadeira esquizofrenia, em que o magistrado era um funcionário público assinador de papel e bajulado por segmentos consideráveis que se locupletavam e se enriqueciam com a inação do Poder Judiciário. A função de fiscalizar é muito árdua, mas é preciso que haja fiscalização. Porém, antes de qualquer ato de punição, pelo que eu encontrei e pela história do Poder Judiciário, precisamos, antes de punir, exercer a atividade de corregência. É preciso correger a administração dos juízes e tribunais, orientando, ajudando, facilitando a execução das políticas traçadas pelo Conselho Nacional de Justiça. Essa é a atividade preponderante da atual Corregedoria. Peço parceria dos tribunais. Tenho a ideia de chamar para a minha atividade e dizer: “não sou intrometida, respeito a independência dos tribunais, mas o que quero é ajudar para gerir, e bem gerir, os tribunais.” Posso dizer que hoje há cinco tribunais que já estão em parceria íntima com a Corregedoria, aonde os Presidentes vão com a finalidade de organizar os tribunais, e todas às vezes que eles têm dificuldades na imposição de algumas situações, e eles chegam a dizer “meu tribunal não aprovará isso”, eu digo: “não tem problema, vai como ordem da Corregedoria”. E a Corregedoria apresenta a necessidade de realizar aquela atividade ou tarefa, e, dessa forma, consegue-se resgatar essa nossa história, mas muito a longo prazo. Finalmente, tenho, na Corregedoria, a função disciplinar. Essa é mais árdua, mais dura, porque, quando se recebem reclamações e representações, é preciso investigar os desmandos, os vícios e as situações calamitosas. Não quero falar sobre elas; elas são a doença do Judiciário. Com elas sou absolutamente intolerante, mas sei que sou impotente para resolver. Na realidade, grandes são as dificuldades nessa atividade, porque é muito fácil chegar a um tribunal pequeno, de um desembargador modesto, que tenha cometido algumas falhas. O difícil, para qualquer corregedor, é chegar às raposas cabeludas, que têm muito apoio de todos os rincões da sociedade. Mas, sem dúvida alguma, isso será resolvido com o tempo. Não posso resolver sozinha; em dois anos não se faz isso, não se muda a história, mas nós a mudaremos com persistência, insistência. Vamos mudar para ser grandes, e um dia dizer 127 128 II Seminário Internacional Brasil – Alemanha Thompson Flores que temos orgulho do nosso Poder Judiciário; que temos a estrutura adequada. 14 Limites do CNJ Quais são as maiores dificuldades que enfrentamos hoje no Conselho Nacional de Justiça? De duas ordens: a primeira é estabelecer qual o limite de competência do Conselho Nacional de Justiça. A Constituição estabelece as atribuições do Conselho, mas não as detalha. E isso tem sido modulado pelo Supremo Tribunal Federal. Porém o STF ainda não decidiu totalmente: é uma liminar aqui, outra acolá, e não se tem padrão para solucionar. O certo é que nós somos um tribunal administrativo, e como tal não podemos nos imiscuir nas decisões judiciais. Mas existe um ponto que é de uma delicadeza enorme. A delicadeza é pela dificuldade, que nós não queremos, de haver intervenção na atividade judicante do magistrado, o que não se compatibiliza com qualquer sociedade democrática. Mas há absoluta certeza de que o ato de improbidade do magistrado é cometido no exercício da atividade jurisdicional. E nós encontramos decisões judiciais que fogem a qualquer padrão. E é exatamente a partir daí que perguntamos: a Corregedoria pode interferir em decisões judiciais deformadas, totalmente teratológicas, sem estar invadindo a esfera judicante? Qual é a resposta? A resposta tem sido dada pelo Supremo Tribunal Federal: às vezes pode, às vezes não. E isso é o que nos deixa, ainda, em uma grande confusão. Esperamos que isso seja estabelecido na Lei Orgânica da Magistratura, que está sendo gestada no seio do Supremo Tribunal Federal. Qual é o outro problema em relação ao Conselho Nacional de Justiça? O Poder Judiciário tem os seus limites traçados na Constituição, mas a pergunta é: como vamos solucionar os problemas de indisciplina que foram juridicionalizados propositalmente? Encontramos, em um determinado Estado, no qual fomos fazer a correição, a seguinte situação: um magistrado cometeu uma falta, houve um processo disciplinar, aplicou-se a pena de exoneração. Aplicada a pena, o magistrado in- terpôs mandado de segurança. O mesmo tribunal se reuniu, e a pena foi reduzida para advertência. Dessa forma o Conselho Nacional de Justiça não pode fazer nada, porque está judicializado. 15 Subsidiariedade A outra questão é em relação à subsidiariedade. Quem tem o poder disciplinar? As Corregedorias têm um papel que historicamente nunca funcionou e não é por causa da personalidade do Corregedor. É porque não há clima para termos – dentro da cultura brasileira, que é muito ligada ao compadrio, à amizade, à afetividade pelas pessoas – alguém que tenha vida tão longa para fazer a correção de um colega seu. Então, verificam-se que as Corregedorias, com o tempo, não têm funcionado. O Supremo Tribunal Federal, por meio de alguns ministros, diz que o Conselho Nacional de Justiça só pode interferir disciplinarmente após a Corregedoria local já ter feito. É difícil, porque não sabemos sequer a notícia dos processos disciplinares. Quando alguém denuncia, muitas vezes a pena a ser aplicada já está prescrita. Observem que são problemas efetivos, mas que a lei e a sociedade brasileira irão resolver. 16 Conclusão O último ponto que quero abordar é que o Conselho Nacional de Justiça incomoda tanto que hoje, pelo Congresso, tramitam cinco projetos de emenda constitucional (PEC) para que o Conselho Nacional tome outro rumo. Uma aumenta para 27 membros o Conselho, colocando representante até dos oficiais de justiça. Outra, que me parece de uma perversidade enorme, é a que foi apresentada e chegou aos jornais com um aumento de apenas dois magistrados: um da Justiça Eleitoral e outro da Justiça Militar para formar o colegiado do CNJ. Mas embutida tinha uma coisa muito interessante, que é a existência de um conselho, dentro do CNJ, formado de desembargadores estaduais, como auxiliares da Corregedoria, para ser o órgão por onde seria feita a triagem dos processos disciplinares. Dessa série Cadernos do CEJ forma, o Corregedor só teria acesso aos processos disciplinares que fossem devidamente passados pelo crivo desse conselho, que estaria inserido na estrutura do Conselho Nacional de Justiça. Essa é a realidade, e se essas emendas me contrariam um pouco, digo o seguinte: o Conselho está trabalhando e fazendo alguma coisa. Enfim, essas são as impressões de alguém apaixonado, e não acreditem muito em alguém apaixonado, porque, naturalmente, a paixão obnubila as mentes e também os olhos. Muito obrigada a todos. 129