UMA LEITURA POPULAR... SOBRE MUDANÇAS DE ESTRUTURAS 1 O QUE É A FAMÍLIA VICENTINA? 2 A Família Vicentina é o conjunto de congregações, organismos, movimentos, associações, grupos e pessoas que, de forma direta ou indireta prolonguem no tempo o carisma vicentino, seja porque fundados diretamente por São Vicente de Paulo, seja por encontrar nele a fonte de sua inspiração e dedicação ao serviço dos Pobres. A Família Vicentina possui hoje no Brasil 22 grupos já identificados e no mundo mais de 165 grupos, que têm como herança o nosso Patrono. 3 EM TORNO DA FONTE De uns tempos para cá, felizmente, ao se falar sobre Família Vicentina, percebe-se o número crescente de vozes que vão tomando consciência do seu papel, enquanto ramos unidos, na sociedade. 4 Tanto para a Família Vicentina como para cada ramo em particular é necessário, cumprir a sua missão junto aos pobres, e estar em constante renovação para responderem à dinamicidade da história. Para isso vários elementos devem ser constantemente trabalhados, dentre eles, destacamos dois: A) A SEIVA DE SÃO VICENTE DE PAULO; B) A CORRENTE DA CARIDADE; 5 A SEIVA VICENTE DE PAULO “... É pela árvore que se conhece os frutos”. (Mt 12,33). A existência de cada ramo adquire robustez à medida que percorre dois movimentos: 6 MOVIMENTO INTERNO: Como os troncos são alimentados pela seiva que vem da raiz, assim é cada ramo que se deve alimentar do carisma e espiritualidade de Vicente de Paulo. Quanto mais se faz uma “caminhada regressiva” às origens do Fundador, mais lhe é dada a “água viva”. Não tem como o ramo e cada um em particular serem frutos férteis se não conhecerem a fundo a vida, a mística e ação do Fundador. 7 CUIDADO Atenção a dois perigos: Academismo: não levar em conta o gosto pelo Fundador. Isto pode cair em uma teorização vazia; 8 Ativismo: atenção apenas a vocação missionária de Vicente, esvaziando ou até mesmo anulando a vida de oração do Santo, caindo em um ativismo desenfreado, que conduz à vaidade, tendo a presunção de serem os “donos da caridade”, onde o sucesso, fruto das ações bem realizadas, seria creditado a si próprio. 9 Vicente de Paulo e os fundadores de cada ramo convergiram o olhar para o mesmo ponto: o Pobre. Para eles, a dignidade, o respeito e os direitos como pessoa e cidadão eram pontos sagrados, que deviam ser recuperados urgentemente. Neste sentido, pode-se dizer que ao recuperar a dignidade, o pobre recupera também as rédeas de sua vida. Ao recuperar as rédeas de sua vida, ele sai da condição de objeto ou dependente para a condição de sujeito de sua história. 10 Quando se opta pelo academicismo e o ativismo, o olhar se converge para o pobre, certamente, mas segundo a inspiração evangélica e vicentina, o pobre, “nosso mestre e senhor” torna-se objeto para o ego pessoal. Ele continuaria dependente da boa vontade daquele que tem algo. É por isso que o verdadeiro “expoente vicentino” é aquele se torna servo. É aquele que “lava os pés” dos pobres de forma sincera, pois ao virar a medalha, consegue ver e fazer um encontro com o Senhor. 11 12 MOVIMENTO EXTERNO: Neste segundo plano, cada ramo e cada vicentino em particular são impelidos a fazerem um movimento para fora. Cada um é chamado a fazer com que o carisma vicentino, já alimentado, não fique para si, mas “brilhe para todos os que estão em casa” (Mt 5,15), e fora da casa também. 13 CUIDADO Neste movimento externo também somos alertados para duas situações pertinentes: O risco da teorização – Academismo. Não se pode transformar o carisma vicentino em eloqüentes e refinados discursos e teses. 14 Fala-se do pobre, fala-se de pobre, fala-se de sua realidade, mas passou sua vida sem ir religiosamente até lá. Seria uma ferida profunda, se houvesse filho de Vicente que soubesse na ponta da língua tudo sobre o seu ramo, sobre análise de conjuntura, análise social e política, mas não conseguisse fazer um encontro verdadeiro e real com Cristo nos pobres. Poder-se-ia dizer que a caridade não foi completa. 15 O segundo alerta revela que: Não basta assimilar a vida do Fundador (mística e ação), mas é preciso dar um passo a frente e avançar, precisamos ter conhecimento e consciência da realidade em que o pobre vive. É preciso que o vicentino configure o pobre dentro da história. 16 A CORRENTE DA CARIDADE Como foi dito no início do texto, o tema Família Vicentina “pegou embalo” há pouco tempo. À medida que o tempo foi passando, cada ramo sentiu a necessidade de aprofundar o ser Família. Dois aspectos ajudaram construir esse itinerário de unidade. A necessidade de cada ramo se conhecer melhor; A tomada de consciência. 17 São Vicente de Paulo, que na sua época leu os sinais de contradição do tempo. Percebeu a profundidade do trabalho junto aos pobres. Ao fundar os três ramos deunos a entender que a Caridade deve ser feita na união dos dons e talentos. Frederico Ozanan que teve um sonho ousado: formar uma corrente de Caridade para que os pobres e o mundo fossem abraçados. Tanto um como outro nos ensinam que a “globalização da caridade” é uma vertente que leva à Caridade, no sentido mais profundo. 18 TATEANDO A CARIDADE 19 Exemplos / definições de Caridade... Uns, infelizmente, dão a ajuda e pronto. Talvez para tirar o peso da consciência ou para ficar livre do “estorvo”. Mas quando a ajuda é realizada por um sentimento de comoção e em conseqüência de um ato de solidariedade evangélica – estar com – a ajuda que chega ao pobre toma um novo sentido: de Caridade, baseada no estar com e em nome de alguém: de Cristo “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou pela unção para evangelizar os pobres.” (Lc 4,18). 20 RECADO DE SÃO VICENTE... Fazer de sua vida o que fez Jesus Cristo. Estar a serviço dos pobres. Fazer da Caridade o alimento de suas vidas. Ver a CRISTO no rosto do POBRE. 21 INSTÂNCIA IMEDIATA 22 Complexidade; Surgimento de novas formas de pobreza; Situações de vulnerabilidade; Horizonte de vida e de futuro diferente dos outros e, em situação de desvantagem; Diante de tal realidade, é inegável que a chamada caridade imediata ou emergencial é necessária; Evitar o Assistencialismo / Paternalismo; Reduzir o potencial da Caridade á simples “ajuda fraterna”; 23 lavar as mãos e remeter “o problema” para o Estado; O que fazer diante de uma legislação que nem sempre cumpre o que foi aprovado? Vencer a lerdeza da burocracia; A assistência aos carentes torna-se um objeto de troca; O gestor torna-se o “pai dos pobres”; Ver o pobre é um “estorvo”; Ter um padrão de qualidade e de dignidade; 24 Agir como bom samaritano que não espera as leis se concretizarem, deixa tudo para trás e vai servir àqueles que gritam por socorro. “Vai, e também tu, faze o mesmo”. (Lc 10,37) 25 A chamada Caridade emergencial é necessária. Ela é uma resposta imediata aos gritos desesperados brandindo pela vida. A ajuda não pode ser negada. Lá está um ser humano que vive no seu limite, no mais profundo desespero. Lá está um filho (a) de Deus, crucificado pela história; crucificado pelo sistema. Pela fé, pela compaixão, e movido pela indignação, cada vicentino deve se colocar neste itinerário: ajudar duplamente o pobre, na ajuda imediata e na libertação dessa forma de vida. 26 PONTO DE PARTIDA 27 CONSTATAÇÃO: Quando se realiza a caridade imediata, levando o auxílio ao pobre, seguramente, a vida e a situação da família estão sendo aliviados. INTERPELAÇÃO: Alargando um pouco mais o horizonte do sentido de Caridade, faz-se a seguinte pergunta: “Ao dar aquela ajuda emergencial e imediata, o pobre deixou de ser pobre? Ele, com aquele auxílio, saiu da situação de pobreza?” 28 INSTÂNCIA MEDIATA 29 TOMADA DE CONSCIÊNCIA... É quando se percebe que os auxílios dados são de grande importância, mas não resolvem a situação na perspectiva libertadora do pobre. QUESTIONAMENTOS? “De que modo o pobre deixará essa triste e injusta situação?” “Qual seria o ponto de partida para que a Caridade mediata ou estrutural se efetive?” 30 Para que a Caridade seja efetivamente plena é preciso que conduza a uma Mudança de Estruturas. Para que a Caridade atinja seu sentido pleno, que é a libertação do pobre da condição de miséria e dependência, é preciso mudar toda estrutura que rege uma sociedade. Para que essas mudanças estruturais ocorram e atinjam seu objetivo é preciso que a Família Vicentina com seus ramos e cada um em particular caminhe em dois movimentos: 31 MOVIMENTO INTERNO: Para que o vicentino seja um servo fiel de Vicente de Paulo, além daqueles elementos ditos acima, é preciso ter um aguçado interesse pela análise da realidade. O gosto pela análise de conjuntura e o interesse pelas leis sociais e econômicas ajudarão o vicentino a exercer a Caridade de forma completa. 32 MOVIMENTO EXTERNO: Á medida que o vicentino vai assimilando o sentido mais profundo da Caridade dentro dessa história que não para de evoluir e criar novos desafios e exigências a cada instante, ele vai se tornando um sinal de luz e força para os pobres. Não esquecer de envolver o pobre neste processo de libertação. 33 CONSTATAÇÃO: A estrutura da sociedade com um espaço maior para os ricos; O pobre que busca seus direitos que lhe são garantidos pela lei civil e pela Lei de Deus (dignidade e vida em abundância), mas que são desrespeitados; O clamor desesperado pela vida, de quem está no fim da linha; A meta final da Caridade é mudar todo um paradigma de sociedade... 34 DIMENSÃO EDUCACIONAL: Mas será que isso é verdade? A aprovação do aluno nem sempre foi medida pelo conhecimento; Desmotivação do professor, que foi perdendo o seu “status” de educador; Outro resultado agravante: o aluno ao concluir o Ensino Médio não consegue um bom emprego, não consegue uma boa faculdade; O aprendizado não deu ao aluno nem competitividade e nem consciência cidadã. 35 DIMENSÃO CULTURAL: Evitar um pensamento de que ser elite é aderir à cultura que vem de fora; Não ser contra a globalização, pois hoje isso é quase impossível; É questionável supervalorizar só expressões culturais estrangeiras e no máximo algumas locais, de modo especial aquelas que vêm de um ambiente mais elitizado. 36 DIMENSÃO “SOCIAL”: A posse e o uso da terra são questões muito espinhosas; A captação e o uso da água se tornam um problema grave; O uso desordenado solo; Impacto ambiental; O sistema de saúde injusto; A política habitacional nem sempre é elaborada a partir da justiça social; Os conselhos municipais; Outras instâncias. 37 LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social (Lei 8.742-Dez 93) Art. 6º As ações na área de assistência social são organizadas em sistema descentralizado e participativo, constituído pelas entidades e organizações de assistência social abrangidas por esta lei, que articule meios, esforços e recursos, e por um conjunto de instâncias deliberativas compostas pelos diversos setores envolvidos na área. 38 Não desanime! São Vicente nos mostra muitos sinais de mobilização pela libertação dos mais pobres e também, pela mudança de estruturas. 39 PARÊNTESES O filme 2012 estruturas. X Mudança de Retrata uma série de catástrofes em escala mundial devido ao aumento de temperatura. Os cientistas têm uma perplexa e assustadora visão: os eixos ou placas não estão nos mesmos lugares. O pólo norte já não está no mesmo lugar, fora deslocado. Com isso a sobrevivência da humanidade é condicionada àquele que se adapta às novas mudanças; A sociedade atual, em si, não vê a necessidade nenhuma de mudar as estruturas vigentes; 40 A outra vertente busca a raiz no anúncio de Cristo: o Reino de Deus deve ser implantado. Para que haja direitos para todos, é preciso que se percorram as instâncias que levam a cabo tais mudanças: nos planos político, jurídico, cultural, trabalhista, educacional, saúde, habitacional, fundiária... Olhando pela vertente cristã, algo nos deve chamar a atenção. Todos estão no mesmo barco, chamado vida... 41 TODOS SÃO CHAMADOS... O vicentino sozinho não conseguirá levar essa meta até o fim... É preciso unir mais forças... A Família Vicentina sozinha não terá condição de levar avante o firme propósito de mudar as estruturas. 42 Quanto mais o leque de adesão se abrir, mais viveremos o sonho de Ozanam: a corrente da Caridade abraçando e mudando o mundo. 43 PENSAMENTO “É muito pouco aliviar o indigente dia-a-dia; é necessário pôr as mãos nas raízes do mal e, por prudentes reformas, diminuir as causas reais da miséria pública”. (Frederico Ozanam) 44