34 ALMANAQUE HOJE EM DIA / 25 ABR 2015 BELO HORIZONTE 4 FLIPOÇOS ZIRALDO É PATRONO DA 10ª EDIÇÃO DO FESTIVAL LITERÁRIO, NO SUL DE MINAS “O conjunto promove o diálogo do barroco com o moderno, do profano com o sagrado” TAQUINHO OLIVEIRA [email protected] ELEMARADUARTE I [email protected] A infância, mas “de antigamente”, inspira o 10º Festival Literário de Poços de Caldas (Flipoços), que começa hoje (e segue até 3 de maio). Simultaneamente, acontece a 10ª Feira NacionaldoLivro.Entreos quase 90 convidados estão o cartunista Ziraldo (dia 26), patrono do evento, e Ignácio de Loyola Brandão (27), Stella Maris Rezende (25) e Thalita Rebouças (1º/5). O tema “A literatura como resgate da velha infância” percorre a maior parte da programação deste que é o maior festival literário sul-mineiro: desde a palestrado “pai” do MeninoMaluquinhoaoEspaçoFlipocinhos, destinado às crianças. São esperados 60 mil visitantes. A programação acontece no Teatro da Urca. Tudo gratuito. “Queremos homenagear a criança que habita em cada um de nós, adultos”, diz a curadora Gisele Corrêa Ferreira. A abertura, hoje, às 20h, teráaOrquestra Ouro Preto, com suas “Cantigas de Bem Querer”: para o resgate de tais memórias e para a criação daquilo que Gisele chama de “ambiente lúdico”. Ela frisa que, para algumas das “palestras master”, as entradas, mesmo gratuitas, estão esgota- das. Porém, haverá transmissão por telão. “POÇOSÉ UMA FESTA” A primeira edição do Flipoços, vale lembrar, contouapenascomdoisconvidados – um deles, Ignácio de Loyola. “Por isso, fiz questãodetrazê-lonomarco dos dez anos”, diz Gisele. A curadora lembra que, quando idealizou o Festi- 30 MIL EXEMPLARES FORAM ARRECADADOS, EM DEZ ANOS DE EVENTO, NA TROCA POR ENTRADA DAS PALESTRAS MASTERS val, havia pouquíssimos eventos sobre literatura no país. Nestes dez anos, mais de 800 convidados conversaram com leitores – a maioria, escritores. Já a Feira do Livro, que começoucommenosde30expositores, neste ano terá 80 estandes. Ainda para marcar os dez anos, 14 artistas integramoprojeto dolivro “Poços é Uma Festa”, que irá a pontos ícones da cidade. “E Ziraldo deve fazer uma ilustração sobre este roteiro”,dizGisele.Olançamento será em outubro. Ao lembrar de um dado divulgado na Bienal do LivrodeMinas,noanopassado, a curadora imprime mais importância à cidade anfitriã do evento, agora, no quesito “índice de leitura”. “A Câmara Mineira do Livro fez um levantamentoapontandoPoçosdeCaldas com o maior número de leitores de MG”, lembra. Em tempo: a cidade possui três livrarias. Bibliotecas, são mais de dez. Programaçãoflipocos.com. GUILLERMO LEGARIA/AFP/18/4/2012 ZIRALDO – O mineiro (de Caratinga) participa pela primeira vez do evento: e, de cara, já foi eleito o patrono do Flipoços 2015 PAMPULHA, PATRIMÔNIO MUNDIAL Sou o típico mineiro da gema. Quer dizer, de ferro e de aço. Tanto por parte de pai, quanto de mãe. Os Martins de Souza, do pai, são raça de Furquim de Mariana e de Ouro Preto (onde o pai nasceu). Os Oliveira e Cruz, da mãe, são gente de Caeté e Mariana. Portanto, sou um belo-horizontino cuja raiz está plantada no coração barroco de ferro – que um dia foi de ouro – das Minas Gerais. O seu Xixico enchia o peito para vangloriar-se de sua Ouro Preto querida ter sido agraciada em 1980 pela UNESCO como Patrimônio Cultural da Humanidade. Estivesse vivo, temeria pela perda da titularidade da Vila Rica por causa do descaso com que é reiteradamente tratada pelos que dela deveriam cuidar. Emoção parecida com a que arrebatou meu pai em 1980 fez meu coração pulsar mais forte quando soube que a Pampulha pode também virar patrimônio mundial pela UNESCO em 2016. A candidatura foi encaminhada pela PBH e, pelo que se sabe, tem muitas chances de sucesso. Construído na década de 1940, por encomenda do então prefeito da cidade, Juscelino Kubitscheck, o conjunto distingue-se pela concepção arquitetônica modernista de Oscar Niemeyer, paisagismo de Roberto Burle Marx, pinturas de Cândido Portinari e esculturas de Alfredo Ceschiatti. Trata-se de uma obra surpreendente até hoje pela beleza criativa, inovadora e ousada. É composta pela igrejinha de São Francisco de Assis, pelo Museu de Arte da Pampulha (antigo Cassino), a Casa do Baile, o Iate Tênis Clube, a Casa Kubitscheck e a Lagoa da Pampulha. Fruto de um tempo em que os políticos – como JK – não só tinham compromisso público, mas se permitiam ousar sonhos éticos e estéticos que nos fizessem melhores, a Pampulha embasbacou o mundo por tornar conhecida a obra inovadora do então jovem e desconhecido arquiteto Oscar Niemeyer, que fez o concreto armado virar leveza, sensualidade e flexibilidade; a capacidade de inventar o belo de Roberto Burle Marx, e seu paisagismo de formas inusitadas; a maravilhosa audácia dos pincéis de Cândido Portinari e seu jeito atrevido de ver o mundo; além da plasticidade sensual das esculturas de Alfredo Ceschiatti. Mais que sua sensualidade e encantamento poético, o conjunto da Pampulha promove o diálogo do barroco com o moderno, do profano com o sagrado. Diálogos que quase não se concretizaram porque Dom Cabral, o arcebispo de Belo Horizonte na época, impediu por 14 anos a inauguração e a realização de cultos na Igreja de São Francisco de Assis, por considerá-la anticristã. Na barra do hábito do bispo, as senhoras da Tradicional Família Mineira (TFM) impediram também a inauguração do sensual “O Abraço” de duas mulheres, esculpido pelo filho da terra, Alfredo Ceschiatti. A PBH promete restaurar e recuperar o conjunto e principalmente despoluir o esgoto a céu aberto que é hoje a Lagoa da Pampulha – outro cartão-postal da cidade. Dizem que vão investir R$ 150 milhões na obra. É louvável a promessa, mas de promessa estamos cheios. A real possibilidade de reconhecimento mundial de um monumento que nos identifica e nos distingue mundialmente, torna o compromisso da PBH ainda mais sério. Não cumprido, a cidade, e seus habitantes, viraremos chacota mundial. Está na hora de cuidarmos para que a Lagoa da Pampulha seja limpa e saudável para peixes e gente, como um dia pai me contou que ela foi. O jornalista escreve neste espaço aos sábados