A MISSÃO HOJE
Jovem universitária vive experiência inesquecível em Cabo Verde
Portadora do amor
entrevista E. Assunção foto Mariana Nabais
“Fiz a aventura mais profunda
e desafiante da minha vida”,
confessa Mariana Nabais.
Passou um mês em Cabo
Verde, na Escola Salesiana de
Artes e Ofícios do Mindelo,
de São Vicente. Agosto foi
demasiado pequeno para
concretizar “o que levava na
mente e no espírito”. Muitas
ideias ficaram por realizar. Na
breve experiência “misturou
o sonho com a realidade”.
Mariana relembra as actividades com saudade: “Jogos,
ateliers, idas à praia, dança e
muita música a embalar uma
experiência inesquecível. Os
dias começavam bem cedo. A
alegria era constante”. Entre o
crioulo e o português, as vozes
das crianças enchiam todos os
cantos. “O riso trazia-nos a
certeza do seu agrado a cada
momento do dia”.
O sonho chegou ao fim demasiado depressa. A 29 de
Agosto, despediu-se de Cabo
Verde, com um balanço claramente positivo. “Regressei
com a alma cheia da profundidade do trabalho com as
crianças”. As dificuldades não
a esmoreceram, antes reforçaram a aposta. “Deus acompanhou-me do princípio ao
fim. Nele encontrei a força
que me levou e me trouxe de
volta, segura de que repetirei a
experiência, ali ou em qualquer
outra parte do mundo”. Mas
deixemos a Mariana descrever
a experiência: “Na hora da
partida, senti-me muito feliz
por realizar o sonho que sempre
tive. Estava entusiasmada por
tudo o que queria fazer com
as crianças; estava ansiosa por
conhecê-las. Sentia que ia ser
uma experiência única na
minha vida”.
Que realizaste num mês?
Realizei o meu sonho de fazer
esta experiência. Consegui dar
muito amor, muito carinho,
muita atenção. Ensinei-lhes
músicas, jogos, actividades de
expressão plástica e aspectos
relacionados com a Catequese
e a Eucaristia. Consegui pro-
porcionar-lhes um mês muito
alegre, muito divertido e ao
mesmo tempo formativo.
Que ficou por realizar?
Foi pena não poder acompanhar as crianças durante mais
tempo, compreender melhor as
suas dificuldades. Tive pena de
não ter podido ser útil a outras
crianças, que eu vi e que calculo
que também precisavam.
Como te sentiste num país
tão diferente?
Encontrei uma realidade bastante pobre, com paisagens
muito frias e vazias, casas
muito pequenas e com poucas condições, onde viviam
famílias grandes, com poucos recursos, mas inteli-
Mariana Nabais
22 anos, estudante
universitária,
do 4º ano de Ciências
Farmacêuticas.
Catequista
em Bicesse pertence
ao Movimento Juvenil
Salesiano, onde
recebeu formação.
Acompanha
pré-adolescentes
e crianças, nos
tempos livres dá
explicações e é
voluntária na Aldeia
de Crianças S.O.S.
Gosta de ler, ouvir
música e ir ao cinema
Jenifer e Carlina (à direita), ambas de 10 anos e naturais de São Vicente, com Mariana Nabais
FÁTIMA MISSIONÁRIA
10
ANO LIV | Novembro de 2008
AVENTURAS
de Deus
gentes e com mui­ta vontade
de par­­tilhar o que sabem e
o que têm. São curiosos de
ver e aprender coisas novas.
En­contrei uma realidade e
cul­tura bem diferentes. Fo­
ram essas diferenças que
mais me ca­tivaram. Poder
vivê-las, du­ran­te um mês,
enriqueceu-me muito.
Como são as crianças com
quem trabalhaste?
São as minhas crianças! To­­
das me cativaram, cada uma
à sua maneira, com o seu
encanto. Extrovertidas, amá­
veis, bondosas, cheias de von­
tade de aprender e de ter expe­
riências novas, adoram par­
tilhar o pouco que têm. São
humildes e muito carinhosas.
Têm uma necessidade enorme
de ser amadas, compreendidas
e de terem alguém totalmente
disponível para elas. Dão
muito mais do que muitas ve­­
zes recebem.
Como conseguiste “pintar”
os seus olhos e rostos?
Consegui “pintá-los” com a
alegria e divertimento que lhes
proporcionei, com o amor que
lhes dei, com a dis­po­nibilidade
total que tinha para elas, com
a confiança e se­gurança que
sentiam comi­go. Sabiam que
eu estava sempre ali para
brincar, ensi­nar e partilhar;
para ajudar, es­cutar e dar
carinho. Até nos momentos
em que não es­ta­vam comigo.
Porque decidiste partir?
Tenho um grande amor pelas
crianças e uma grande von­
ta­de de me dar aos outros,
principalmente aos que mais
precisam. Um mês não dá para
Realizei o meu
sonho de fazer
esta experiên­cia.
Consegui dar muito
amor, muito ca­rinho,
mui­ta atenção
realizar tudo o que se quer. A
minha aposta foi fazer tudo o
que estava ao meu al­cance por
aquelas crianças. Fui pre­pa­rada
e entusiasmada para fazer de
tudo, dentro das possibilidades
que tínhamos. Que­ríamos
melhorar a vida daqueles que
eu tive o prazer de conhecer.
Quais as dificuldades que
te custaram mais?
Dificuldades foram poucas!
Fui muito bem recebida. Ape­
sar de tudo, tínhamos boas
condições na Escola Salesiana,
onde realizámos as acti­vidades.
Foi mais difícil arranjar al­
guns bens materiais necessá­
rios para o nosso dia-a-dia.
Quando não havia dinheiro
ou não conseguia arran­jar
materiais ou alimentos, não
esmorecia. Tentava en­con­trar
outras formas para encontrar
o que era preciso.
Gostávamos de ter dado al­
mo­ço a todos, mas apenas
con­­se­guimos dar o lanche.
Em­bora fossem almoçar a ca­
sa, ficávamos sempre com dú­
vidas que tivessem comido.
O que me custou mais foi
ter que os deixar, quando
regressei. Nunca me vou es­
que­cer dos olhares tristes, das
lágrimas e dos abraços sen­
tidos e saudosos que todos me
deram no dia da despedida.
Foi muito comovente!
FÁTIMA MISSIONÁRIA
Pipo em casa do avô
texto Júnior ilustração H. Mourato
– Ó Pipo, vens hoje com má cara. Que aconteceu?
– Foi um facto que se passou com o meu avô. Estava ele
a jogar às cartas com uns amigos quando lá chegou uma
senhora com dois rapazitos, para aí da minha idade. O meu
avô achou-os tão jeitosos que lhes disse: “Pelo menos um de
vocês era bom que fosse padre”.
Muito repentino, grita logo o primeiro: “Eu não!”.
O outro, mais humilde, respondeu: “Eu talvez não me
importasse”. E logo o outro a rebater: “Ah! Vais para padre?
Eu vou para polícia e depois pum!”.
Dizia aquilo certamente por brincadeira. Mas fez-me
impressão ver um rapaz tão pequeno a meter medo ao outro
só porque ele queria ser padre. E depois admiramo-nos
quando ouvimos dizer que, lá por fora, os missionários são
perseguidos! O que vale é que isso não afecta nada a minha
vocação. Eu estou decidido e atrás é que não volto. Hei-de
ser padre e, para mais, missionário.
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ANO LIV | Novembro de 2008
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Portadora do amor de Deus Mariana Nabais