Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 ROBÓTICA EDUCACIONAL E APRENDIZAGEM COLABORATIVA NO ENSINO DE BIOLOGIA:DISCUTINDO O CONCEITO DE SISTEMA NERVOSO Mara Cristina de Morais Garcia (LEQUAL – Universidade Federal de Goiás) Márlon Herbert Flora Barbosa Soares (LEQUAL – Universidade Federal de Goiás) RESUMO A robótica educacional é uma ação pedagógica que utiliza a aprendizagemde conceitos científicos por parte dos alunos através da interação com um robô de maneira colaborativa.Objetiva-se elaborar e desenvolver robôs reaproveitando materiais para debater conceitos de biologia em um ambiente lúdico de aprendizagemverificando como a robótica educacional facilita o aprendizado dos alunos do nível médio de ensino. Esta é uma pesquisa qualitativa do tipo estudo de caso. Os participantessão adolescentes de dezesseis anos em média, voluntários, que participam de encontros semanais no contra turno.A construção do robô que represente o sistema nervoso humano foipropostapelos alunos. A participação deles foi além da discussão do conceito e isso foi possível a partir da construção do protótipo. PALAVRAS-CHAVE Robótica educacional, aprendizagem colaborativa, ensino de biologia. INTRODUÇÃO Atualmente, é perceptível, a importante função de constante inovação do fazer pedagógico por parte do professor, durante as aulas, tendo em vista despertar nos alunos o interesse pelos conteúdos científicos que se encontram sob responsabilidade da escola. Dentre essa necessária inovação metodológica, destaca-se a utilização de recursos tecnológicos e trabalhos em grupos para concretizar a aprendizagem colaborativa. É importante salientar, que pela experiência de uma dos autores dessa pesquisa, professora da rede pública de ensino da região metropolitana de Goiânia há 12 anos, grande parte dos alunos que frequentam as escolas, tanto as que se encontram em regiões periféricas da região metropolitana de Goiânia quanto aquelas que se encontramem regiões centralizadas, apresentam interesse por novas tecnologias e certa recusa em aprender, por encontrarem-se desestimulados com o ensino escolar. Corroborando com essa ideia, a crise no ensino de ciências descrita por Pozo e Crespo (2009), Fourez (1997), Cachapuzet al (2011), dentre outros autores, retrata a falta de interesse dos alunos em relação à uma disciplina/atividade abstrata e complexa como a 5278 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 ciência/biologiae a maneira linear, elitista,deformada, empobrecida e descontextualizada que a mesma é apresentada nas escolas ainda hoje. SegundoSimpson et al. (1994) 1;Giordan(1997)2; Furió e Vilches (1997)3,apudCachapuz et al (2011), pesquisas em didática das ciências mostram reiteradamente o elevado insucesso escolar, a falta de interesse e a repulsa que as matérias científicas geramnos alunos. Essa situação pode ser sinalizada acessando dados de recentes avaliações internacionais pela Academia Brasileira de Ciências (ACADEMIA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS, 2008, p. 5): [...] os resultados apresentados no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), mostram que os jovens brasileiros estão em situação extremamente precária. [...] a grande maioria dos estudantes, mesmo quando oriundos de escolas consideradas de boa qualidade, terminam sua educação básica e chegam ao ensino superior com graves deficiências em sua capacidade de fazer uso de informações e conhecimentos de tipo científico para entender o mundo que os circunda e resolver problemas e questões que lhes são colocados. Uma alternativa que possa respondera superação desta criseé a utilização de tecnologias educacionais nas aulas de ciências, já que as mesmas podem ser utilizadas em qualquer nível de ensino.Segundo Labegalini (2007), as tecnologias educacionais devem ser vistas como meios de contribuir para a aprendizagem por parte dos alunos, tendo em vista as possibilidades que elas oferecem. Os alunos podem ser instigados a tomarem decisões, fazerem reflexões, serem criativos e darem significado aos conteúdos apresentados em sala de aula. Aoenriquecer a educação escolar por viabilizar a interação entre as pessoas participantes do processo educacional, além de estimular diferentes comportamentos nos alunos,considera-se a robótica educacionalcomo tecnologia educacional. Ressalta-se que elanão é inédita, mas pouco voltada, estudada e aplicada no ensino de ciências/biologia. Maisonnette (2002)define robótica educacional como sendoo controle de mecanismos eletroeletrônicos através de um computador, transformando-o em uma máquina capaz de interagir com o meio ambiente e executar ações definidas por um programa criado pelo programador a partir dessas interações. Para Castilho (2002), a robótica educacional é voltada a desenvolver projetos educacionais envolvendo a atividade de construção e manipulação de robôs, mas no sentido de proporcionar ao aluno mais um ambiente de aprendizagem, onde possa desenvolver seu raciocínio, sua criatividade, seu conhecimento em diferentes áreas, a conviver em grupos cujo interesse pela tecnologia e a inteligência artificial é comum a todos. 1 SIMPSON, R. D.,[et al].Researchontheaffectivedimensionofsciencelearning. Em Gabel , D. L. (Ed.), HandbookofResearchon Science Teachingand Learning. New York: MacMillan Pub Co., 211-236, 1994. 2 GIORDAN, A. Lasciencias y las técnicas enla cultura de losaños 2000? 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Este kitfoi criado em 2005 com o objetivo decontrolar protótipos construídos de uma forma menos dispendiosa do que outros sistemas disponíveis no mercado. Além do baixo custo na produção de protótipos, o software do Arduino pode ser instalado em diferentes plataformas, possui concepção open-source eé de fácil entendimento, programação e aplicação. Dessa forma, o kit Arduino pode ser utilizado como ferramenta educacional sem se preocupar que o usuário tenha um conhecimento específico de eletrônica. A utilização da robótica educacional durante as aulas de ciências leva o aluno a trabalhar em grupo, fazendo-o interagir com os colegas, com o professor e com o conteúdo trabalhado. Dessa forma o trabalho se enquadra como atividade colaborativa, na qual o professor é o mediador e o facilitador do debate entre os alunos. Segundo Conceição & Freitas (2006),a aprendizagem colaborativa está baseada na observação das ações realizadas pelos indivíduos representantes de um determinado grupo durante suas interações e que serve como base para a construção de um conhecimento individual.Para Leite et al (2005), aprendizagem colaborativa é um processo no qual os membros do grupo ajudam uns aos outros para atingir determinado objetivo acordado; outra se refere à questão pedagógica, pois considera essa aprendizagem como uma proposta pedagógica na qual os estudantes ajudam-se no processo de ensino aprendizagem, atuando como parceiros entre si e com o professor, com o objetivo de adquirir conhecimento sobre um dado objeto. Dessa forma, a atividade colaborativa assume uma postura emancipatória ou autônoma, que leva o grupo a construir regras próprias para ações mais eficientes, visando atingir objetivos. A partir deste ponto, o grupo se liberta do modelo hierárquico tradicional (LEITE et al, 2005). Um trabalho que utilize a robótica educacional como ferramenta metodológica,pressupõe um trabalho em grupo, colaborativo, para se atingir o objetivo final a aprendizagem de determinado conteúdo e a construção de um robô que executeas tarefas escolhidas pelo grupo.Mas, segundo Santos (2010), esse tipo de trabalho só irá fazer sentido se concebido em parcerias que levem a discussões e a tomadas de novos rumos e caminhos. 5280 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 D’Abreu (2004) nos trazque o ambiente de aprendizagem baseado no uso de dispositivos robóticos tem possibilitado de forma simples, econômica, rápida e segura, disponibilizar recursos tecnológicos para a aprendizagem, não só de robótica, mas de ciências de uma maneira geral, além de criar situações de aprendizagens onde os alunos podem avaliar resultados, experimentar ideias e testar hipóteses de uma forma rápida barata e segura. OBJETIVOS DO TRABALHO Neste artigo apresentar-se-áparte da pesquisa referente à robótica educacional e a aprendizagem colaborativa no ensino de biologia que se encontra em andamento no Colégio da Polícia Militar unidade Polivalente Modelo Vasco dos Reis na cidade de Goiânia/GO. Esta pesquisa tem comoobjetivoselaborar e desenvolver robôs reaproveitando materiais como papelão, jornal e sucata;Debater e desenvolver conceitos de biologia a partir do funcionamento de robôs, como forma de construção conjunta do conhecimento científico em sala de aula;Proporcionar um ambiente lúdico de aprendizagem, em que o conceito científico seja discutido, reelaborado e aplicado à resolução de um problema específico relacionado à robótica ou aos tipos de robôs criados pelos alunos;Verificar como a robótica educacional aplicada no ensino da Biologia facilita o aprendizado do aluno nos conteúdos e conceitos científicos. Apartir desses objetivos, pergunta-se, para esse relato de experiência:Como a robótica educacional a partir da aprendizagem colaborativa contribui na discussão, construção e reconstrução de conceitos de biologia por parte dos alunos que cursam o ensino médio? MÉTODO A abordagem desta pesquisa é qualitativa que, segundo Bogdan e Biklen (1982) apudLudke e André (1986) tem o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador como seu principal instrumento. Os dados coletados são predominantemente descritivos e a preocupação com o processo é muito maior que com o produto. Segundo Ludke e André (1986), os estudos de caso visam à descoberta, enfatizam a ‘interpretação em contexto’, buscam retratar a realidade de forma completa e profunda, usam uma variedade de fontes de informação, revelam experiência vicária e permitem generalizações naturalísticas.A preocupação central é a compreensão de uma instância singular, ou seja, o objeto estudado é tratado como único e historicamente situado. Nossa investigação, dentro desse relato de experiência, caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa, pois tem a preocupação não com o robô, com o produto efetivamente a ser obtido ao final do processo de desenvolvimento, mas, especificamente com a série de 5281 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 colaborações que ocorrerão durante o processo e construção e desenvolvimento do robô proposto. Tais colaborações serão as falas obtidas por meio de filmagens e gravações e de forma mais específica, os diálogos entre os alunos participantes e o professor/pesquisador, presente nas reuniões descritas a seguir. Pensamos que se trata de um estudo de caso, considerando-se que trabalhar com um grupo pequeno de alunos em um ambiente restrito e no contraturno na escola, restringe o resultado a um contexto específico que pode ou não ser alavancado para situações mais gerais. A aprendizagem colaborativa, que pressupõe o diálogo entre os aprendentes, sejam eles o professor mediador ou os alunos presentes no grupo, pode ser avaliada a partir da análise das falas gravadas e das discussões/debates dos participantes do grupo. Nesse caso, nossa preocupação está relacionada com o surgimento, durante a construção dos robôs, de falas ou discussões que nos remetam ao conceito de sistema nervoso. Logo, a construção e o desenvolvimento dos robôs não pode ser o fim, mas o meio para a discussão conceitual. O local da pesquisaé o Colégio da Polícia Militar Unidade Polivalente Modelo Vasco dos Reis com os alunos que se encontram cursando a segundasérie do Ensino Médio.Após o convite, estendido a todos os alunos cursistas da segunda série, dezesseis alunos se propuseram a participar de maneira voluntária do projeto, sendo nove do sexo feminino e sete do sexo masculino. A faixa etária destes é, em média, dezesseis anos. Foram propostos vinte encontros no contra turno (período vespertino), uma vez por semana, às sextas-feiras, de fevereiro a junho do corrente ano. Os encontros já ocorridos e os que estão por vir dar-se-ão no laboratório de ciências da natureza da instituição,com duração de três horas consecutivas. Ao final das vinte reuniões, totalizar-se-ão sessenta horas de trabalho.O espaço do laboratório de ciências foi escolhido por não ser utilizado com frequência por outros professores,ser necessário agendamento para seu uso, ter lugar para os alunos se sentarem, ter energia, lugar para guardar o protótipo e não sermos interrompidos com facilidade.Os registros desta pesquisa dar-se-ão através de filmagens e anotações em diário de campo. RESULTADOS E DISCUSSÕES A priori dezesseis alunos se inscreveram, mas no primeiro encontro apenas doze alunos compareceram.Nesse primeiro encontro o projeto foi explicadonovamente para os alunos, esclarecendo que tentaríamos construir robôs com assuntos relacionados à fisiologia humana - conteúdo visto na segunda série do ensino médio na disciplina de biologia. 5282 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 No início do primeiro encontro foram feitos questionamentos em relação ao conceito de robô. Durante os questionamentos, pôde-se perceber que as várias dúvidas dos alunos em relação ao conceito de robôforam provocadas devido àsmídiasdiversas, principalmente a televisão, que divulgam robôs humanoides diariamente. Logo, foi apresentada a definição de robô segundo o RobotInstituteofAmerica-“Um robô é um manipulador multifuncional reprogramável, concebido para deslocar, por meio de movimentos variáveis programados, peças, utensílios ou instrumentos especializados, de maneira a executar diferentes tarefas.” (GIRALT, 1997). Os conceitos de robôs móveis, imóveis e simuladores estáticos, segundo Soares (2001), também foram apresentados, onde os robôs móveissão aqueles que se movimentam a partir dos comandos definidos no software; os imóveis não se movimentam, mas executam ações a partir de comandos definidos no software; e os simuladores estáticos também não se movimentam, mas de forma fixa, executam outros tipos de ações a partir de comandos definidos no software. Em seguida o software e o hardware do Arduinoforam apresentados como ferramenta de trabalho. Como forma de integrá-los ao que seria o projeto, um semáforo interativo com botoeira de pedestre,construído com a utilização de papelão, palitinhos de picolé, caixinha de remédio, papel colorido e o kit Arduino foi demonstrado, como exemplo de robô imóvel, segundo Soares (2011), conforme apresentado na figura 1. Figura 1 - Semáforo interativo O primeiro encontro foi finalizado com a interação dos alunos com a ferramenta Arduino. Os alunos foram divididos em dois grupos e colocados para executarem quatro projetos iniciais de trabalho com o kit – acender um led e fazê-lo piscar; acender um led RGB e fazê-lo mudar de cor; ligar ledse programar um semáforo simples; e finalmente, ligar ledsde forma a programar um semáforo interativo, com botoeira de pedestre.Para esta interação com a ferramenta, foram utilizados o hardware arduino, uma protoboard, jumpers e leds– materiais que fazem parte do kit. Durante essa atividade, todos os alunos participaram, além de, visualmente, ficarem estimulados para a realização do projeto, como mostra o diálogo a seguir: Aluno 3: “Sinto como se fosse um filho meu.” 5283 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 Aluno 1: “Como se tivesse acabado de parir?” Aluno 3: “É.” A facilidade e as possibilidades de trabalho que o kit Arduino oferece despertou nos alunos a vontade de trabalhar com a robótica educacional, como mostra a fala a seguir: Aluno 3: “Estou me sentindo o Bill Gates agora.” Por sentirem a autoestima elevada e a curiosidade despertada, os alunos seinteressaram na realização do projeto de biologia a partir da robótica.No final do encontrofoi pedido aos alunos que pensassem sobre a fisiologia e a morfologia dos sistemas do corpo humano e como poderiam ser construídos a partir da reutilização de materiais e o kit Arduino. No segundo encontro, três alunos apresentaram propostas de trabalho. O aluno 1 apresentou a proposta da construção de um olho humano, com uma câmera dentro. Ao iniciar a discussão sobre sua proposta, os alunos chegaram à conclusão que esse projeto não conseguiria representar como seriam projetadas as imagens no fundo do olho, tampouco a interpretação da imagem no cérebro. O aluno 2 apresentou a proposta da construção de um sistema cardiovascular. Os demais alunos gostaram da proposta, mas ficaram com dúvidas em relação ao material a ser usado na construção do protótipo e como seria seu funcionamento. O aluno 3 apresentou a proposta da construção de um robô imóvel que represente os sistemas nervosos central e periférico, bem como a transmissão de impulsos nervosos. Na proposta, uma silhueta humana seria construída e um botão seria colocado na mão e outro no pé do protótipo. Ao apertar o botão presente na mão, leds acenderiam representando a condução do impulso nervoso em sentido ao sistema nervoso central e retornaria ao local onde foi gerado o estímulo (botão). Ao pressionar o botão do pé, leds acenderiam representando a condução do impulso nervoso até a medula espinal, onde estaria presente um visor de LCDcoma frase“lesão medular”, logo os leds apagariam. Em complemento à proposta, o aluno 4 propôs o acendimento de leds na parte do cérebro responsável pelo tato. Essa última proposta foi aprovada em comum acordo pelo motivo de apresentar quantidade menor de detalhes no protótipoe, como primeiro projeto a ser construído pelo grupo, a facilidade em sua produçãoseria necessária. Após a apresentação desta últimaproposta, de forma conjunta foram pensados os materiais a serem utilizados no protótipo. O pensamento conjunto, dialogado, discutido entre os pares, até que se chegue a um objetivo comum é uma das características da aprendizagem colaborativa. Dessa forma, todos os alunos ouvem uns aos outros, de modo que os 5284 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 pensamentos e ideias são compartilhados discutidos, criando novos caminhos cognitivos nos participantes, o que leva a novas ideias e novos compartilhamentos (PANITZ, 1996). Os materiais elencados foram papelão e jornal para construir a silhueta humana, os nervos e o sistema nervoso central;os dois botões (mão e pé) para representarcorpúsculos da pele, onde são gerados os impulsos nervosose leds para representar o caminho do impulso nervoso, conforme apresentado na figura 2. Complementação da proposta feita pelo aluno 4 Figura 2: Esquema da proposta feita pelo aluno 3 A partir do terceiro encontro o protótipo começou a ser construído. Começou-se com o molde para cortar o papelão e fazer a silhueta humana. Com a silhueta cortada, fez-se acabamento com jornal. Com ele também foram feitos os nervos e o sistema nervoso central. O protótipo foi então pintado, foram colocados os leds e o LCD, como mostra a figura 3, na próxima página. Da segunda semana em diante, durante os encontros semanais para a construção do protótipo, foram feitas discussões acerca do conteúdo proposto – o Sistema Nervoso. As discussões foram abrangentes, desde a composição do Sistema Nervoso Central e do Periférico, bem como a maneira como os impulsos nervosos são gerados e conduzidos. O diálogo abaixo traz uma discussão sobre o Sistema Nervoso que surgiu a partir da construção do protótipo: Aluno 5: “O Sistema Nervoso Periférico também é formado por órgãos vitais do corpo humano. Será que pode falar isso?” Professora: “Será que pode?” Aluno 5: “Hein? Pode-se dizer que o Sistema Nervoso Periférico pode ser formado por órgãos vitais como o coração, pulmões?” Aluno 3: “Não que eles são formados.” 5285 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 Aluno 5: “Que faz parte...” Aluno 3: “Não. Que comandam eles.” Aluno 5: ”Sim Sim” Aluno 3: ”O Sistema Nervoso Periférico comanda também impulsos involuntários. Nós não ficamos assim: coração bate, mandando o coração bater ou diafragma contraia. Nós não ficamos assim. O Sistema Nervoso Periférico é responsável por movimentos involuntários.” Figura 3 Percebe-se que a participação dos alunos foi além da discussão do conceito de Sistema Nervoso humano, que é dividido em Sistema Nervoso Central (SNC) e Sistema Nervoso Periférico (SNP). Os alunos partiram para as minucias de seu funcionamentono qual, segundo Amabis (2004), o SNP pode ser classificado em somático (SNPS) ou autônomo (SNPA). As ações autônomas resultam da contração da musculatura não estriada e da musculatura cardíaca, controladas pelo SNPA.A função do SNPA é regular o ambiente interno do corpo, controlando a atividade dos sistemas digestório, cardiovascular, urinário e endócrino.Observase queessa discussão deu-se a partir da construção do protótipo. Deve-se salientar, que a colaboração também aparece fortemente, como é o caso, quando os alunos se sentem parte de um grupo, e passam a desenvolver o que Brna (1998) e Silva (2011) chamam de sentimento de pertença, pois, Deve-se destacar, dessa forma, que somente haverá o desenvolvimento cognitivo na aprendizagem colaborativa se o aluno se sentir pertencente ao grupo social que faz parte, pois sem essa sensação o aluno se fecha para as interações sociais e suas mudanças conceituais não poderão ser avaliadas, nem receber o enriquecimento necessário para o seu desenvolvimento (SILVA, 2011). No momento atual, o protótipo encontra-se na fase de conectar os leds ao Arduino e programá-lo para poder desempenhar a atividade proposta. Observa-se a colaboração no 5286 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 registro de um diálogo que se deu em uma reunião onde o aluno 5, queencontra-se pouco mais interagido com os códigos do software, ensina seus colegas a programar. A partir das orientações, o aluno 3colocou em prática o que aprendeu ligando 4 leds. Quando osleds acenderam, disse: Aluno 3: Mas eles não acontecem (acendem) ao mesmo tempo? Aluno 5: Não. Por não estar sequencial ainda. Aluno 3: Tem como colocar os 4 para funcionar ao mesmo tempo? Aluno 1: Tem. Professora: Mas não é o que queremos. Aluno 3: Mas fica tão bonitinho. Professora: No robô, nós queremos desse jeito. Vai acendendo e apagando, não é isso? Aluno 6: É só colocar (para piscar) mais rápido, não? Aluno 3: Não é colocar (para piscar) mais rápido. Se eles estivessem funcionando ao mesmo tempo assim: o primeiro ia acender, depois o segundo, depois o primeiro e o terceiro, depois o primeiro, o quarto e o segundo ao mesmo tempo, entendeu? (Se referindo ao fato de acender o primeiro e o segundo led, depois apaga o primeiro e acende o terceiro led e assim por diante). Aluno 5: Então sabe onde errou? No liga e desliga. Aluno 3: Como assim? Como se colocasse uma sequência de múltiplos? Um, dois, três? Aluno 5: Você queria ligar o primeiro e o segundo, certo? Então você tinha que programar para ligar o primeiro e o segundo. Você mandou ligar o primeiro e desligá-lo. Aluno 3: Ah tá! Então eu teria que tirar todos esses LOW da programação? Aluno 5: Quer ver um negócio interessante? Aluno 3: Qual parte interessante? Ligar e desligar? Aluno 5: Se eu mudar o DELAY do seu código, dá pra eu roubá-lo. Aluno 3: O quê? Como assim? Aluno 5: Professora, o aluno 3 fez o código (de programação) do nosso robô. Para Santos (2010), o sentido do trabalho são parcerias que levam às discussões e tomadas de decisões como as transcritas no diálogo. A partir da proposta do trabalho em grupo, a construção do protótipo alcança um conhecimento que seja satisfatório para todos. O diálogo caracteriza a aprendizagem como colaborativa, pois segundo Leite et al (2005), os estudantes atuam como parceiros entre si e com o professor e as interações servem como base para a construção de um conhecimento individual. Os alunos ajudam uns aos outros com a finalidade de atingir determinado objetivo e, nesse caso, o objetivo de conseguir o código de programação do robô foi alcançado. CONSIDERAÇÕES FINAIS 5287 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014 V Enebio e II Erebio Regional 1 A educação escolar pode ser enriquecida pelas tecnologias educacionais que instiguem os alunos a tomarem de decisões, a fazerem reflexões, a serem criativos e darem significado aos conteúdos apresentados em sala de aula. A robótica educacionalvoltada para a elaboração e o desenvolvimento de robôs, a partir do reaproveitamento de materiais, como papelão, jornal e sucata, com trabalhos em grupo voltados à aprendizagem colaborativa, é uma ferramenta metodológica eficaz no debate e desenvolvimento de conteúdos sobre fisiologia humana, o Sistema Nervoso. Considera-se a robótica educacional voltada à aprendizagem colaborativa uma ferramenta eficaz por proporcionar um ambiente lúdico de aprendizagem, no qual os alunos,de forma descontraída, encontram-se curiososem busca de descobertas, o que facilitao aprendizado de conteúdos e conceitos científicos. Sem a conclusão do protótipo, observa-se que o processo de construção do robô possibilita discussões acerca dos conteúdos de biologia, enaltecendo a preocupação com o processo e não com o produto.O planejamento e o replanejamento das ações pelos alunos, o estímulo ao raciocínio, o baixo custo dos protótipos, o estímulo às habilidades artísticas, o trabalho em grupo, a interação entre os alunos e o professor, o interesse dos alunos e a possibilidade da utilização da robótica educacional em qualquer nível de ensinosão algumas das vantagens da utilização da robótica educacional no ensino de ciências/biologia, ressaltando-se queé pouco voltada, estudada e aplicada no ensino dessa disciplina. 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