UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO
JOÃO ANDERSON DA SILVA
JOGOS COOPERATIVOS E INCLUSÃO NO PROJETO INTENSIVO NO
CICLO – PIC
SÃO PAULO
2010
1
JOÃO ANDERSON DA SILVA
JOGOS COOPERATIVOS E INCLUSÃO NO PROJETO INTENSIVO NO
CICLO – PIC
Dissertação apresentada como exigência
para obtenção do título de Mestre em
Educação, na Universidade Cidade de São
Paulo, sob a orientação da Profa. Dra.
Edileine Vieira Machado
SÃO PAULO
2010
2
___________________________________
___________________________________
___________________________________
COMISSÃO JULGADORA
3
DEDICATÓRIA
Dedico àqueles que em algum momento sentiram na pele o peso da exclusão, de
qualquer natureza.
À minha esposa e meu filho, pessoas por quem sigo em frente hoje.
À minha família, pessoas fantásticas que sempre me ensinaram a desfrutar do
bálsamo que é o ato de incluir, meu pai, minha mãe e minhas irmãs.
Àqueles que não poderão ler esta dedicatória por ainda estarem às margens da
educação formal.
4
AGRADECIMENTOS
Primeiro a DEUS, por me permitir chegar tão longe do ponto onde comecei.
À minha orientadora, Dra. Edileine Vieira Machado, por me acompanhar e
orientar nesta caminhada.
Aos profs dors. Jair Militão da Silva e Marcos Garcia Neira, pelas valiosas
contribuições e apontamentos precisos na construção deste trabalho.
Agradeço também a Secretaria Estadual de Educação do Estado de São
Paulo pelo apoio financeiro, sem o qual não seria possível a realização da
presente pesquisa.
5
Se você quer transformar o mundo,
mexa primeiro em seu interior.
Dalai Lama
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ___________________________________________________ 11
CAPÍTULO 1_____________________________________________________ 14
1.1 Referencial teórico ____________________________________________ 14
1.1.1 O jogo na Grécia antiga ______________________________________ 14
1.1.2 Jogos cooperativos _________________________________________ 16
1.1.3 Falando em inclusão escolar __________________________________ 18
1.1.4 Projeto Intensivo no Ciclo (PIC) _______________________________ 22
1.1.5 Abordagem pedagógica da educação física escolar______________ 24
1.1.6 Novo público, novas necessidades ____________________________ 25
1.1.7 Legislação _________________________________________________ 28
1.1.8 Direito à permanência________________________________________ 29
CAPÍTULO 2_____________________________________________________ 32
2.1 Objetivos ____________________________________________________ 32
2.1.1 Objetivo geral ______________________________________________ 32
2.1.2 Objetivos específicos ________________________________________ 32
CAPÍTULO 3_____________________________________________________ 33
3.1 Metodologia __________________________________________________ 33
3.1.1 Pesquisa-ação ______________________________________________ 33
3.1.2 Amostra ___________________________________________________ 34
3.1.3 O grupo ___________________________________________________ 35
7
3.1.4 Espaços utilizados __________________________________________ 36
3.1.5 Aplicação dos jogos cooperativos _____________________________ 40
3.1.6 Avaliação do Projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa ___________ 41
CAPÍTULO 4_____________________________________________________ 42
4.1 Resultados e discussão ________________________________________ 42
4.1.1 Reunião com os pais ________________________________________ 42
4.1.2 Quebrando paradigmas ______________________________________ 45
4.1.3 Por que cooperar? – 31/03/2009 _______________________________ 46
4.1.4 Vamos cooperar?– 01/04/2009 _________________________________ 49
4.1.5 Salto triplo – 07/04/2009 ______________________________________ 50
4.1.6 Refletindo– 08/04/2009 _______________________________________ 51
4.1.7 Resgatando – 14/04/2009 _____________________________________ 53
4.1.8 Após o salvamento – 15/04/2009 _______________________________ 54
4.1.9 Levante-me – 22/04/2009 _____________________________________ 55
4.1.10 Relembrando os conflitos – 28/04/2009 ________________________ 56
4.1.11 Futebol cooperativo – 29/04/2009 _____________________________ 57
4.1.12 Contemplando nossa criação – 05/05/2009 _____________________ 58
4.1.13 Compartilhando nossa criação – 06/05/2009 ____________________ 60
4.1.14 Apoie-me – 12/05/2009 ______________________________________ 60
4.1.15 Reflexão – Estamos no caminho certo? 13/05/2009 ______________ 61
4.1.16 Cooperando e evoluindo – 19/05/2009 _________________________ 64
4.1.17 Um dia para relaxar – 20/05/2009 ______________________________ 66
4.1.18 Pingabola - 26/05/09 ________________________________________ 68
4.1.19 Registros - 27/05/2009 ______________________________________ 68
8
4.1.20 Volençol - 02/06/2009 _______________________________________ 69
4.1.21 Reflexão - 03/06/2009 _______________________________________ 70
4.1.22 Reunião de pais – 09/06/2009_________________________________ 70
4.1.23 Futebol cooperativo com as mães ____________________________ 72
4.1.24 Como a professora da sala PIC via seus alunos _________________ 73
4.1.25 Relatório-diagnóstico do desempenho escolar da turma: 4ª série PIC –
2009 - 2º semestre, após o término da pesquisa, na visão do coordenador
pedagógico _____________________________________________________ 74
4.1.26 Os professores falam sobre a pesquisa ________________________ 75
CONCLUSÕES___________________________________________________ 76
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS __________________________________ 79
9
RESUMO
Este trabalho analisa a contribuição dos jogos cooperativos para a melhoria
do relacionamento entre os alunos da sala do Projeto Intensivo no Ciclo (PIC) e para
constituição de espaço inclusivo. Partiu-se da hipótese de que desenvolvendo a
capacidade de se relacionar em grupo e se sentido parte dele, os educandos
poderiam expressar, sem medo, os seus problemas e dúvidas, o que poderia criar
um ambiente propício para o aprendizado. Em 2008 a Secretaria de Educação do
Estado de São Paulo iniciou o Projeto Intensivo no Ciclo- PIC, voltado para alunos
considerados com dificuldades de aprendizagem, visando alfabetizá-los e inseri-los
nas classes regulares em condições de acompanhar os demais educandos. Ao
ministrar aulas de Educação Física em uma das salas desse projeto, pudemos
constatar a grande dificuldade de relacionamento entre os alunos, o que tornava o
ambiente dentro da sala de aula muito difícil, com constantes práticas agressivas,
tanto entre os alunos como dos alunos direcionados à professora. Assim
percebemos a possibilidade de utilizar jogos cooperativos com o objetivo de
melhorar o relacionamento, ensinar o respeito ao próximo, levar o aluno a se sentir
parte de um grupo e criar espaços inclusivos. Como metodologia, foi adotada a
Pesquisa-Ação. Os sujeitos da pesquisa foram os alunos da sala PIC da Escola
Estadual Sylvio Gueratto, na região de Mauá-SP. Referencial teórico: SILVA
(2004;1999);
BROTTO
(2001);
MACHADO
(2009;
2008;
2007);
MATTOS
(2006;1998), entre outros. A aplicação dos jogos cooperativos durante as aulas de
Educação Física se mostrou eficaz para uma mudança de postura dos alunos,
contribuindo para a diminuição de ações agressivas na turma, para a criação de
vínculos entre eles e, consequentemente, para a constituição de espaços inclusivos.
Palavras-chave: Políticas públicas de educação; Projeto Intensivo no Ciclo (PIC);
jogos cooperativos; relação aluno-aluno/professor-aluno; espaço
inclusivo
10
ABSTRACT
The aim of this work was to analyze the possible contribution of cooperative
games to improvement of relationship among students of “Projeto Intensivo no Ciclo”
class (PIC) and to constitution of inclusive space. The hypothesis assumes that
developing the ability to relate in group and felt part of it, the students could express
their problems and doubts without fear, creating a propitious environment to the
learning. In 2008, the Education Department of São Paulo State started the “Projeto
Intensivo no Ciclo”, a project to students considered with learning difficulties, aiming
alphabetize and insert them on the regular classes with conditions to accompany the
other students. When we ministered Physical Education classes to a class of this
project, we could perceive the great difficult on relationship among the students,
resulting in a hostile environment, with constant aggressive practices both among
students and the students directed to the teacher. So, we realize the possibility to
use the cooperative games with the goal of improving the relationship, teaching
respect for others and making the student to feel part of a team, creating inclusive
spaces. As methodology, we adopted the Research-Action. The research subjects
were the students of PIC class of “Escola Estadual Sylvio Gueratto”, Mauá-SP.
Theoretical framework: SILVA (2004;1999); BROTTO (2001); MACHADO (2009;
2008; 2007); MATTOS (2006;1998), and others. The application of cooperative
games during Physical Education classes was effective to a change of attitude of the
students, contributing to the decrease of aggressive actions in the class, creating
links among them and, thus, forming inclusive spaces.
Keywords: Public Politics of Education; “Projeto Intensivo no Ciclo” (PIC);
cooperative games; student-student/teacher-student relation; inclusive
space.
11
INTRODUÇÃO
Este trabalho analisa a contribuição dos jogos cooperativos para a melhoria
do relacionamento entre os alunos da sala do Projeto Intensivo no Ciclo (PIC),
acreditando que, pelas relações humanas, podemos constituir espaços inclusivos.
Busca-se por meio dos jogos cooperativos promover um ambiente mais
propício para a aprendizagem, já que as crianças se envolvem frequentemente em
discussões e em agressões físicas.
Tem-se como hipótese que, desenvolvendo a capacidade de relacionar-se
em grupo e sentindo-se parte dele, os educandos podem expressar, sem medo, os
seus problemas e dúvidas, criando um ambiente propício para o aprendizado.
Em 2008, o Estado de São Paulo, pela Secretaria de Educação, iniciou um
projeto intitulado Sala PIC (Projeto Intensivo no Ciclo), no qual o corpo docente
relaciona os alunos considerados com dificuldades de aprendizagem, visando
alfabetizá-los e inseri-los nas classes regulares em condições de acompanhar os
demais educandos.
Tendo em vista que a questão do acesso à educação formal está quase que
totalmente
solucionada,
como
educador,
acredito
na
necessidade
da
democratização da educação formal, que possibilite a todos, em especial ao
educando, condições de vivenciar as diversas possibilidades dentro da escola, além
de expor suas vivências e pontos de vista.
Ao ministrar aulas de Educação Física em uma das salas do PIC, pude
constatar a grande dificuldade de relacionamento entre os alunos, o que tornava o
ambiente dentro da sala de aula muito difícil, com constantes práticas agressivas
tanto entre os alunos como dos alunos direcionados à professora.
A observação do comportamento dos alunos durante o ano de 2008, as
discussões com a coordenadora pedagógica, a professora da sala e a professora de
Arte deixaram claro que os problemas de relacionamento do grupo eram tais, que
desgastavam as relações, tornando quase insuportável, para todos os envolvidos,
conviver sem o mínimo de respeito.
12
Em 2008, no Mestrado em Educação, levantei, juntamente com os
professores do curso, as possibilidades de intervenção na sala PIC a fim de
amenizar os conflitos e possibilitar melhoria na qualidade das relações do grupo.
Após algumas pesquisas bibliográficas e com a valiosa ajuda do prof. Jair
Militão, vislumbramos a possibilidade de ação junto aos alunos por intermédio dos
professores da turma.
Utilizamos a disciplina Educação Física por se tratar de um campo que
permite maior contato com os alunos, talvez pela característica informal do espaço
utilizado para as atividades, como quadra, pátio, entre outros, sentindo que seria
necessária a aplicação de uma pesquisa que conferisse à dinâmica da aula uma
movimentação acompanhada da participação de todos.
Se traçarmos um paralelo entre a Educação Física e os jogos cooperativos,
podemos observar a forma exemplar de atuação do corpo humano, onde cada órgão
adapta-se para a realização da ação. Da mesma forma, entendemos os jogos
cooperativos como atividades que desenvolvem a capacidade de o aluno relacionarse e transformar o meio competitivo em que vive em um ambiente agradável,
inclusivo, onde cada um busca não apenas a sua, mas também a evolução do
grupo.
Nosso objeto de estudo é a análise das relações entre os alunos de uma sala
do Projeto Intensivo no Ciclo (PIC), de uma escola estadual da cidade de Mauá-SP.
Vislumbramos os jogos cooperativos como uma ferramenta que pode
contribuir para melhorar o relacionamento e a criação de espaços inclusivos.
Optamos pelo método Pesquisa-Ação, cujas características, como os jogos
cooperativos, possibilitam a participação direta de todos os envolvidos na pesquisa.
Os sujeitos da pesquisa são os alunos da sala PIC da Escola Estadual Sylvio
Gueratto, na região de Mauá, Estado de São Paulo. Os jogos foram realizados nas
aulas de Educação Física, no primeiro semestre de 2009, após reunião com os
professores da turma, pais e alunos. Explicitados os procedimentos e objetivos,
iniciaram-se as atividades com a observação de todos os participantes para fins de
análise.
Para aqueles que não enxergam a educação como uma ação que promove a
evolução do ser humano em qualquer situação, as próximas páginas mostram a
inabalável crença na capacidade de transformação pela relação humana.
13
Este trabalho caminha no sentido de viabilizar o objetivo do PIC, como um
apoio à prática educativa pelo desenvolvimento das aulas de Educação Física
permeadas pela aplicação de jogos cooperativos. Em hipótese alguma se pretende
aqui colocar a disciplina Educação Física na condição de coadjuvante no processo
de educação formal, mas, sim, elevar esta disciplina ao patamar que acreditamos
lhe é de direito.
Na realização da pesquisa, deparamo-nos com a falta de bibliografia sobre a
Sala PIC), por se tratar de um projeto novo, que teve início em 2008. Todas as
referências tratam de projetos parecidos, porém, com diferenças consideráveis na
sua aplicação.
14
CAPÍTULO 1
1.1 Referencial teórico
1.1.1 O jogo na Grécia antiga
Devido a sua localização, a Grécia fazia parte das rotas comerciais marítimas
e com sua região montanhosa o deslocamento pelo seu território se apresentava
como um desafio para aqueles que não estivessem fisicamente preparados. Além
disso, as constantes batalhas por conquistas territoriais exigiam, cada vez mais,
cidadãos fortes e capazes de se lançar nos campos de guerra.
A força humana também era desafiada na prática da agricultura com pouco
ou nenhum apoio de animais ou máquinas.
Platão aponta em sua “Crítica à Ginástica e à Medicina” que o hábito de
praticar atividades físicas pode não alcançar os objetivos, sendo necessário integrálas com a música e a filosofia:
Quem deixar que os sons da flauta derramem-se constantemente em sua
alma começa a abrandar como o ferro duro e começa a se por em
condições de ser trabalhado, mas com o tempo se amolecerá e se
convertera em papa, até que sua alma fique completamente sem nervos.
Quem, pelo contrário, se submeter ao esforço da ginástica e comer
abundantemente, sem em nada cultivar a música e a filosofia, sentirá em
princípio crescer em si a coragem e o orgulho, graças a sua energia
corporal, e ficará cada vez mais violento. Mas, ainda que se suponha que
na sua alma abrigue de início algum desejo natural de aprender, à força de
não se alimentar com nenhuma ciência nem investigação, acabará por ficar
cego e surdo, um tal homem se tornará “misólogo”, inimigo do espírito e
das musas, já que não conseguirá persuadir ninguém, nem se deixar
persuadir pelas palavras, e o único recurso que disporá para alcançar o que
se propuser será a força bruta, exatamente como um bruto qualquer. Foi por
isso que Deus deu aos homens a música e a ginástica como a unidade
individual da Paidéia, não como educação separada do corpo e do espírito,
mas como as forças educadoras da parte corajosa e da parte da natureza
humana que aspira à sabedoria. (JAEGER, 2003, p. 799).
15
Atuar nas lavouras e nos campos de guerra não eram as únicas atividades
destinadas aos cidadãos, que tinham também a obrigação de representar sua
cidade nos grandes Jogos Públicos, onde os campeões eram ovacionados e
tratados como heróis (GODOY, 1996).
Com caráter totalmente religioso, os jogos tiveram início no reinado de
Cronos, o que lhes dava a condição de sagrados com o poder de interromper
guerras durante sua realização, período denominado
“Trégua Sagrada”, sendo
considerada grave a infração a esta regra. Considerando a importância social dos
jogos, o atleta vitorioso era motivo de orgulho para sua família e cidade (TOLEDO,
2006).
Dominada por um exército mais forte, a civilização grega vê a decadência em
todas as áreas de suas atividades.
Há um colapso em todos os setores da atividade humana, quer no domínio
dos jogos, quer nas manifestações da inteligência e da arte. A
profissionalização e a corrupção dos atletas, a venalização dos juízes e a
exacerbação do público determinam a decadência dos Jogos Olímpicos
finalmente mandados suprimir pelo imperador romano Teodósio, no ano de
394 d.C.” (ACCIOLY, 1956, p. 57).
À decadência da civilização grega segue a ascendência dos romanos, povo
que também elaborava e realizava seus jogos de maneira peculiar, como concursos
de pesca, corridas de sacos e os jogos da vitória de César. Os imperadores
deixavam-se dominar tanto pelas competições que chegavam a
intervir
violentamente.
Mesmo os imperadores se deixavam dominar pela paixão durante as
corridas de carros, tomando um partido ou um favorito, que deveria vencer
em qualquer circunstância. Vitélio, por exemplo, mandou executar os
adversários dos azuis e Caracala condenou a morte os aurigas dos verdes.
(ACCIOLY, 1956, p. 63).
Algum tempo depois da invasão dos bárbaros, no ano 521 da era cristã, os
jogos foram abolidos em Roma.
16
Com este pequeno passeio pela história podemos notar como o jogo está
presente de forma contundente em nossa sociedade.
1.1.2 Jogos cooperativos
Segundo Brotto (2001), os jogos cooperativos datam de milhares de anos,
praticados por comunidades tribais, como os Inuits no Alasca, os aborígines na
Austrália, os tasaday na África, os índios kanela no Brasil, entre outros. Não eram
raros os momentos em que estes povos se reuniam para dançar e celebrar a vida
em jogos e rituais.
A exploração do homem pelo homem aumenta no cotidiano da humanidade
com a busca incessante pela riqueza, onde alguns poucos se apossam do poder
(SOLER, 2006).
Segundo SOLER (2006) e TEIXEIRA (2001), nos Estados Unidos, na década
de 1950, é que os jogos cooperativos começam a ser pesquisados por Ted Lentz,
tendo como base suas próprias vivências e experiências.
Os exageros na competição da vida moderna, em especial pelo povo
ocidental, são apontados por BROTTO (2001) e TEIXEIRA (2001) como os fatores
desencadeadores do desenvolvimento da prática dos jogos cooperativos.
Um grande nome dentro dos jogos cooperativos é Terry Orlick, considerado
como um dos maiores estudiosos do assunto. Sua obra “Winning Throught
Cooperation”, traduzida no Brasil como “Vencendo a Competição”, em 1978, figura
como uma das maiores e mais importantes fontes de pesquisa sobre o assunto.
Segundo BROTTO (2001),os jogos cooperativos podem ser utilizados em
uma Visão-Ação (Filosofia-Pedagogia) promovendo a ética da Cooperação e
desenvolvendo competências para a melhoria da qualidade de vida.
O jogo possibilita observar as possibilidades variadas na realização dos
movimentos do corpo e perceber que cada ação faz parte de um grande organismo,
trabalhando no sentido de realizar um objetivo maior. O corpo humano pode ser
visto como exemplo de que a atividade realizada de forma cooperativa pela ajuda
mútua para o bem-estar de cada segmento promove o equilíbrio geral.
17
Aceitar as diferentes possibilidades e perceber o indivíduo como parte
integrante do grupo contempla a celebração de ser diferente dentro de uma
igualdade desigual em sentimentos e reações, mas semelhante na essência de ser
humano.
Segundo Brotto (2001), a prática dos jogos cooperativos desenvolve a
capacidade de enxergar a realidade da vida refletida no jogo. O autor aponta que as
diferentes formas de jogos cooperativos podem ser aplicadas às variadas situações
do cotidiano, proporcionando a cada um ver e viver a seu jeito determinada situação.
Os jogos cooperativos podem e devem ser estimulados durante as aulas de
Educação Física escolar, como aponta ALMEIDA (2009).
O jogo cooperativo é uma proposta na qual jogamos juntos, resolvemos
nossas dificuldades juntos, descobrimos como estamos no mundo,
percebemos o presente e como podemos alcançar vôos para o futuro.
Quando jogamos de forma cooperativa começamos a trilhar um caminho
alternativo de brincar, de ensinar e de solucionar conflitos para viver em paz
(p. 1).
Diferentes ações pautadas por diferentes estratégias tendem a enriquecer as
aulas. Nesse sentido os jogos cooperativos apresentam-se como uma variação
possível nas aulas de Educação Física onde alunos e professores podem apropriarse de novos conhecimentos.
Inúmeros estudos comprovam a eficácia dos jogos cooperativos no que tange
ao relacionamento humano, entre eles BATISTA e OSBORNE (2010), que afirmam
que os jogos cooperativos contribuem para o desenvolvimento sustentável, que
concilia desenvolvimento econômico, conservação da natureza e bem-estar da
comunidade.
Para os autores, a união dos jogos cooperativos com os competitivos
contribui para a formação do cidadão, o que contempla os objetivos da escola, neste
caso, em especial, a Educação Física.
Müller e Natali (2009) comentam:
A brincadeira, o lúdico, os jogos cooperativos como meio da ação educativa
somente se caracterizam assim quando se concretizam como uma opção
do educador pelo respeito à cultura dos seus educandos e principalmente
pela imaginação e pelo direito de sonhar (p. 302).
18
O respeito pela pluralidade humana, tratando cada pessoa como singular
dentro dos jogos, proporciona o exercício de cidadania onde a importância das
variadas manifestações e interpretações da realidade se torna mais evidente.
Pocera (2008), desenvolvendo jogos cooperativos com os alunos do colégio
agrícola Senador Carlos Gomes de Oliveira aponta:
A pesquisa mostrou também que, ao desenvolvermos atividades que
despertem o diálogo entre os alunos do CASCGO, aumenta neles a autoestima, o respeito, a integração e a cooperação, motivando todos eles a
praticarem atividades esportivas, independentemente da aptidão atlética
(p.62).
O diálogo promovido na e após a aplicação dos jogos cooperativos pode
promover um entendimento mais amplo das atitudes do outro, o que propicia maior
aceitação do grupo.
Pesquisas sobre o tema e reflexões sobre as ações contribuem para que não
se percam pelo caminho os objetivos cooperativos e, principalmente, os objetivos da
escola.
Tendo em vista experiências anteriores, procuramos promover, no presente
trabalho, a aplicação dos jogos cooperativos seguidos de reflexões com o grupo,
construção e aplicação das ações de intervenção debates e conclusões.
1.1.3 Falando em inclusão escolar
Traumatizada pelos conflitos em escala mundial, a humanidade passou a se
preocupar com possíveis recaídas, colocando os direitos humanos na pauta de
discussões sobre a educação.
A afirmação da democracia, após a Segunda Guerra Mundial, como valor a
ser buscado universalmente pelos governos e pelos povos, atingiu a escola,
apresentando-se sob a forma de reivindicação do direito ao acesso, por
todos os interessados, ao ensino (Silva, 1999. p. 67).
19
Os esforços não resultaram em mudanças imediatas devido à complexidade
da questão educacional, porém, a escola passa a ser vista, por muitos estudiosos,
como o espaço possível para estabelecer um elo com a comunidade.
É no âmbito do espaço escolar que todos os outros níveis de análise e de
intervenção devem ser equacionados. Nessa perspectiva o olhar centrado
nas organizações escolares não deve servir para excluir, mas antes para
contextualizar todas as instâncias e dimensões presentes no acto educativo.
(Nóvoa, 1992, p. 20).
Levar em conta quem são os envolvidos e o que esperam do ambiente
escolar é de extrema importância para a evolução da educação formal. O indivíduo
não deixa fora dos muros escolares suas experiências, suas angústias para
enquadrar-se em um papel que lhe é imposto.
A necessidade de mudança assusta os educadores e provoca um grande
questionamento naqueles que atuam na educação formal, trazendo à tona a
necessidade de mudanças.
Comenta Silva ( 1999):
•
a garantia de todos ao acesso promoveu um aumento considerável do
sistema educacional e implicou contratações, reorganizações, etc.
•
com a reunificação do conhecimento, a escola deve oferecer um
conhecimento interligado onde todas as disciplinas caminhem juntas.
•
a reorganização dos grandes sistemas deve proporcionar mais
agilidade nas respostas às necessidades de cada região.
Para Stainback & Stainback (apud Carmo, 2002), a palavra inclusão, do inglês
“full inclusion”, indica que todas as crianças devem ser incluídas no ambiente
escolar,
não bastando a matrícula da criança com necessidades educacionais
especiais na escola, sendo necessária a garantia de uma permanência de
qualidade.
Para Machado (2009), inclusão é
...acolher o outro, respeitando e levando em conta suas singularidades para
se fazer uma proposta de situação educativa. É preciso dedicar um tempo
ao ponto de partida (aspectos gnosiológicos e antropológicos) tanto do
20
educador quanto do educando. Para isso, é preciso me ver e considerar o
educando, ambos como sujeitos dessa ação. E para a concretização dessa
situação educativa, faz se necessária a adesão voluntária dos envolvidos e
a possibilidade de ir adequando o método escolhido para que se alcancem
os objetivos propostos. O valor da convivência e das relações interpessoais
são imprescindíveis e mais importantes tanto no processo de inclusão,
quanto em qualquer processo de aprendizagem (p. 24).
O professor precisa retirar-se do “palco” onde exibia seu total e indiscutível
domínio sobre o saber e com os alunos refletir juntos, conscientes de que todos são
e devem se sentir parte ativa do processo educacional. Segundo MACHADO (2009),
“o exercício da cidadania e a prática da inclusão devem ocorrer em todos os
momentos e espaços, para que se torne um ato natural e corriqueiro em nossas
vidas.”
Em muitos casos as pessoas acreditam saber o que é necessário para o outro
e tentam trazê-lo para seu círculo, sem levar em conta a sua história. O efeito da
ação é contrário, por afastá-lo da sua realidade humana e tentar incluí-lo em um
novo círculo sem significado para sua vida.
O círculo de segurança de cada pessoa o circunda e aproxima dela tudo que
acredita ser necessário para viver bem. Quando alguém entra nesse círculo, as
coisas que estão lá se desarrumam e a inclusão se torna algo incômodo, que muitos
encaram como sacrifício ou modismo.
A cidadania e a inclusão têm como base o respeito à singularidade dos
sujeitos, o combate aos privilégios, as discriminações econômicas, sociais,
culturais, sexuais, etc. e participação coletiva e solidária, que não deve ser
fruto de uma concessão, um presente (Machado, 2009. p. 38).
A escola deve participar ativamente de toda ação inclusiva e procurar
melhorar suas capacidades para atender e ensinar a todos, respeitando suas
características e buscando caminhos para que as crianças e adolescentes sintam-se
contemplados.
Diferentes estratégias pedagógicas que lhes possibilitem o acesso à
herança cultural, ao conhecimento socialmente construído e à vida
21
produtiva, condições essenciais para a inclusão social e o pleno exercício
da cidadania. (CNE/CEB, 2001, p. 357).
Como trocar o pneu do carro em movimento, a inclusão escolar tem que ser
feita com as crianças e adolescentes já dentro da escola, o que gera um grande
conflito entre todos os envolvidos.
Se consultarmos o dicionário, verificamos que a palavra incluir significa
compreender, abranger, fazer parte, pertencer, processo que pressupõe,
necessariamente e, antes de mais nada, uma grande dose de respeito
(SARTORETTO, 2007, p. 273).
Qualquer ação dentro do ambiente escolar “deve” ter como princípio a
inclusão, já que o respeito às diferenças deve ser parte integrante de qualquer
iniciativa educacional.
Comenta MARTINS (1997:
O educador se defronta todo o tempo com a muralha de palavras sem
sentido, da conceituação rotuladora que veste a realidade fluida e conflitiva
com a camisa de força dos enquadramentos preconcebidos para tentar dar
sentido ao que parece dele privado, a realidade dura dos pobres. (p. 7)
Ainda segundo Martins (1997), a sociedade promove a exclusão para depois
tentar efetivar a inclusão.
Para SILVA (2008), é necessário mais que coração, ou seja, para a inclusão,
é de extrema importância a organização, o consenso da comunidade escolar sobre o
que é realmente importante para o educando, levando em consideração quem é, o
que espera e de que precisa.
A necessidade de respostas imediatas aos questionamentos pode ser um
fator determinante para a melhoria do sistema educacional. No caso da inclusão,
não é diferente. MACHADO e CHAMLIAN (2005) apontam a necessidade de criar
um espaço propício para a prática da inclusão, sem pressões em busca de
resultados imediatos.
22
A inclusão das pessoas ocorre em “espaços específicos” que integram uma
instituição mais ampla, não de modo imediato e na sua totalidade, mas é
mediada pelo “espaço inclusivo”. Para a constituição desse espaço
inclusivo, é necessária a criação de ambientes em que as relações
humanas constituem-se em “espaços inclusivos” com condições ambientais
e humanas propícias. (apud MACHADO, 2008 p. 9).
A falta de um foco, já que os objetivos são mudados de acordo com as
necessidades do momento, provoca descrença nas ações que visam à mudança.
Para SILVA (2008), é necessário estar atento às constantes mudanças no
sistema educacional.
As mudanças e as iniciativas para dotar a escola de um ambiente físico e
cultural propício ao acolhimento e inclusão de todos, para que não findem,
quando da saída de seus iniciadores, necessitam institucionalizar-se, ou
seja, tornar-se práticas consagradas, incidentes no tempo, no espaço e no
orçamento da entidade (p. 24).
Levar em consideração as pessoas envolvidas no processo de inclusão e o
local onde o processo deverá acontecer é determinante para o sucesso da ação.
Variadas ações no sentido de promoção da inclusão são sempre bem-vindas,
porém, é preciso atentar para as armadilhas que se apresentam como soluções,
mas podem revelar-se como ações excludentes.
1.1.4 Projeto Intensivo no Ciclo (PIC)
“Os resultados do Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de
São Paulo (SARESP 2005) apontaram claramente a necessidade de se atuar com
mais foco na alfabetização dos alunos das séries iniciais” (Castro, p. 4, 2008).
Em 2008, a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo iniciou o Projeto
Intensivo no Ciclo – PIC, com alunos considerados, pelo professores, com
dificuldades de aprendizagem, com o objetivo de alfabetizá-los e reinseri-los nas
classes regulares em condições de acompanhar os demais educandos.
23
Quando um estudante não se alfabetiza plenamente no começo de sua
escolaridade, fica sem condições de seguir aprendendo os conteúdos das
diversas áreas de conhecimento e isso compromete seu avanço ao longo
das séries. (Castro, 2008, p. 4).
É esperado que, ao final do Ciclo I (1ª a 4ª série), a criança consiga ler e
escrever, o que nem sempre ocorre.
Como já se encontram em defasagem idade-série e com a auto-estima
comprometida, queremos garantir-lhes um atendimento diferenciado: um
material feito especialmente para eles, classes com número menor de
alunos... (Castro. p. 5, 2008).
A proposta caminha no sentido de dar aos alunos um acompanhamento mais
próximo por parte do professor, levando em conta sua autoestima e autoconceito,
que podem ser afetados, ao se perceberem em uma sala separada dos demais.
O Projeto Intensivo no Ciclo uma ação tem como fio condutor a questão da
inclusão escolar, o que nos leva a refletir sobre seus princípios.
O alicerce do projeto pedagógico que, respeitando as diferenças individuais,
se detém na organização de um currículo que possibilite a todos os alunos
se desenvolverem de acordo com suas capacidades, ritmos e
possibilidades. Esses princípios representam ainda a base das adaptações
curriculares e de toda ajuda pedagógica que se pode oferecer àqueles que
dela necessitam (Ribeiro, 2003, p. 44, apud Neres, p. 22).
Para contemplar as necessidades de todos os educandos, é necessária a
adaptação do currículo, não dos educandos, o que pode desencadear traumas que
geram maior resistência ao ambiente escolar. Expor estes educandos frente aos
outros afeta sua autoestima, já
abalada pela incompatibilidade com a proposta
escolar.
As propostas de inclusão escolar devem
contrário.
adaptar-se às pessoas, não o
NERES (2010) aponta a necessidade de uma proposta igualitária e
flexível para todos.
24
Uma visão ampla e detalhada do ambiente possibilita localizar e eliminar
ações que promovam a exclusão e facilitem a inclusão.
A riqueza pedagógica necessária à escola inclusiva beneficia todos os
alunos tanto no aspecto pedagógico quanto no relacional e cívico. Novas
práticas pedagógicas passam a ser exploradas, favorecendo a
aprendizagem de um maior número de alunos. Inaugura-se uma nova
cultura pedagógica ancorada na exploração de novos modos de
conhecimento e de uma outra maneira de pensar o humano num registro da
diversidade. (Marques, 2007, p. 314).
Ações inclusivas não beneficiam apenas as pessoas a que se destinam. A
prática de procurar soluções e aplicá-las promove o desenvolvimento de novas
formas de abordagem, visando à adesão do educando. Propostas, estratégias e
soluções prontas, sem reflexão e conhecimento da realidade, podem ter efeito
contrário ao que se espera.
Caminhar pelo incerto mundo das reações e relações humanas exige ficar
atento, pois o menor deslize ou abordagem equivocada pode comprometer o êxito
dos trabalhos.
1.1.5 Abordagem pedagógica da educação física escolar
No processo ensino-aprendizagem é preciso construir o conhecimento a partir
daquilo que o educando traz da sua vivência e experiências extraescolares.
A intenção é a construção do conhecimento a partir da interação do sujeito
com o mundo, numa relação que extrapola o simples exercício de ensinar e
aprender. A proposta está baseada no resgate dos jogos e das brincadeiras
da cultura popular. (MOREIRA, 2005, p. 2).
Mais do que explorar o conhecimento da criança, hoje, a Educação Física
escolar leva em conta suas experiências, ou seja, a forma como ela viveu os
25
momentos de sua vida e a leitura que faz de cada experiência, abordagem
pedagógica definida por GO TANI como Abordagem Construtivista-Interacionista.
Para NEIRA (2006), a escola pauta-se em uma cultura elitista e, apesar de,
com o decorrer dos anos, passar a receber representantes das mais variadas
culturas, ainda age como se atendesse apenas a um grupo específico, o que o autor
denomina “alta cultura” ou “cultura de elite”.
Apesar da proposta de Neira (2006) para a reestruturação do conteúdo, para
todas as disciplinas a partir da 5ª série fundamental, poroposta em 2008, ainda
podemos perceber uma resistência, por parte de alguns professores, no que tange à
aplicação dessa proposta.
Neira (2006) comenta a dificuldade de assimilação do novo:
Se a perturbação for sentida de modo mais intenso (se o objeto novo se
mostrar inassimilável), o sujeito poderá negar o fator perturbador
negligenciando-o ou afastando-o. Em outro sentido, quando a perturbação
pode ser vencida com algum esforço por parte do sujeito, ele não mais
tentará anular o elemento perturbador, mas buscará modificar o
conhecimento disponível, de modo a ajustá-lo à situação de desequilíbrio (p.
109).
Após a reestruturação daquilo que é ensinado nas aulas de Educação Física,
é necessária a capacitação adequada dos professores a fim
de viabilizarem a
proposta.
1.1.6 Novo público, novas necessidades
Com melhor organização e diretrizes bem definidas, percebe-se considerável
diminuição da prática competitiva que creditava ao corpo status e posição de
liderança.
Aos educadores de nossos dias apresentam-se demandas inexistentes há
quatro ou cinco décadas. Com a valorização da democracia como forma de
organizar a sociedade na qual a liberdade e a igualdade são buscadas,
26
tendo como critério para avaliar sua efetivação o grau de participação nas
decisões fundamentais da vida individual e social, os educandos que
chegam à escola, de modo especial, pública, mas, de certo modo, também
particular, apresentam uma visão dos docentes e das relações destes com
os alunos, baseada na noção de igualdade fundamental entre parceiros,
havendo diminuição do poder coercitivo e aumento da necessidade de
convencimento. (Silva, 2008, p. 52).
Com o aumento e a mudança de seu público, o formato escolar deve
adaptar-se para recebê-lo. Com a Educação Física não é diferente. Uma visão mais
completa do ser humano se faz necessária, para contemplar todos os direitos e
necessidades do educando na sua formação como cidadão.
Entende-se a Educação Física Escolar como uma disciplina que introduz e
integra o aluno na cultura corporal de movimento, formando o cidadão que
vai produzi-la, reproduzi-la e transformá-la, capacitando-o para usufruir os
jogos, os esportes, as danças, as lutas e as ginásticas em benefício do
exercício crítico da cidadania e da melhoria da qualidade de vida.
(CONFEF, 2002, p. 4).
A necessidade de adaptação da Educação Física promoveu um salto
qualitativo em seus objetivos e estratégias
Quase sempre o formato escolar cobra dos educandos uma postura que não
condiz com as condições atuais da sociedade, o que transforma o ambiente da
escola em um período diário a ser suportado como algo necessário para uma futura
colocação no concorrido mundo real.
Mudar é tarefa difícil, já que a idéia de competição para sobreviver é
compartilhada e aceita por grande parte da sociedade. Assim, a criança deve
aprender desde cedo a competir para tornar-se um adulto atuante e competitivo,
principalmente no campo profissional.
Essas crianças enxergarão outras pessoas sempre como adversárias a serem
derrotadas, lutando contra tudo e contra todos, o que perpetua a idéia de a atuação
da Educação Física Escolar estar ligada, necessariamente, à competição, em
detrimento da cooperação.
Para Bertrand (2001), a educação do futuro deverá exigir a formação de
valores diferentes da competição, pautados na extinção de todos os tipos de
27
segregação e racismo. A Educação Física escolar, utilizando-se dos Jogos
Cooperativos, pode e deve assumir tal desafio (Correia, 2006a).
Com a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) 9394/96 e os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs), podemos vislumbrar novos horizontes para a Educação Física
escolar.
Em 2002, a Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas (CENP)
implantou o Projeto Correção de Fluxo do Ciclo II, com o objetivo de corrigir a
defasagem idade/série causada pelos sistemas de avaliação e reprovação. No caso
da disciplina Educação Física, o Projeto é desenvolvido em três fases:
Prática: os educandos vivenciam uma determinada atividade (brincadeiras,
jogos, etc.);
Reflexão: o professor promove uma discussão sobre o assunto por meio de
questionamentos (Qual parte do corpo foi mais utilizada? Em que momento vocês
sentiram mais dificuldades ou mais facilidades?);
Registro: os alunos produzem, pela escrita, desenhos ou recorte e colagem,
trabalhos que representam aquilo que foi trabalhado, buscando ressaltar as
habilidades necessárias para a realização de cada atividade.
Com o sucesso obtido nas salas do Projeto Correção de Fluxo do Ciclo, os
trabalhos foram expandidos para as demais séries onde também apresentaram
resultados satisfatórios. Em 2002, por meio da Resolução 184/02, a disciplina de
Educação Física foi implantada nas séries iniciais do Ensino Fundamental, sendo
ministrada pelo professor especialista da área, o que provocou a necessidade de
inovações nos trabalhos dos dois níveis.
Hoje, a Educação Física escolar promove discussões sobre a área do
conhecimento que corresponde à cultura do movimento, trabalhando em prol da
formação de um cidadão autônomo, crítico e participativo, capaz de atuar com
competência, responsabilidade e dignidade na sociedade em que vive e assim
contribuir para a sua constante transformação.
A disciplina Educação Física atua como um “manual do corpo humano”,
possibilitando aos educandos usarem o corpo para a prática esportiva e reflexão.
28
A Educação Física, se bem direcionada, possibilita melhoria da qualidade de
vida por intermédio do trato com o corpo.
1.1.7 Legislação
A democratização do acesso à educação é realidade no Brasil, a partir da
Constituição de 1998 e da LDB 9394/96, que, no artigo 3º, dispõe:
O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o
pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas;
IV - respeito à liberdade e apreço à tolerância;
V - coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
VI - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
VII - valorização do profissional da educação escolar;
VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da
legislação dos sistemas de ensino;
IX - garantia de padrão de qualidade;
X - valorização da experiência extra-escolar;
XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.
O direito ao respeito à autonomia tem garantia legal.
O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física,
psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação
da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos
espaços e objetos pessoais (Lei nº. 8.069, art. 18, 1990).
O sistema educacional deve possibilitar todos os meios e condições para o
desenvolvimento integral do educando.
É dever do Estado assegurar a criança e ao adolescente:
I – ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que não
tiveram acesso na idade própria;
29
II – progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;
III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino.
IV – atendimento em creche e pré escola as crianças de zero a seis anos de
idade;
V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação
artística, segundo a capacidade de cada um;
VI – oferta de ensino noturno regular, adequado as condições do
adolescente trabalhador;
VII – atendimento no ensino fundamental, através de programas
suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e
assistência a saúde (Art. 54, Lei nº 8.069, 1990).
Visando no pleno desenvolvimento das crianças e adolescentes, cabem
também aos pais ou responsáveis legais deveres e direitos no que tange à
educação dos menores.
“É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem
como participar da definição das propostas educacionais” (Parágrafo único, Cap. IV
Lei nº. 8.069, 1990).
Amparada pelas leis, a população tomou conta dos espaços públicos, o que
iniciou um novo ciclo de discussões. A partir do momento em que tantas pessoas
ocupam ambientes que antes eram ocupados por poucos, surgem novas demandas
às quais a comunidade educacional deve adaptar-se.
1.1.8 Direito à permanência
Após vencer a primeira batalha pelo direito ao acesso ao sistema
educacional, surge um novo dilema: a permanência e, com ela, a necessidade de
uma nova e revolucionária visão sobre a educação. Não devem mais caber somente
a alguns as tomadas de decisões no ambiente escolar, que deve estender-se para
além dos muros da escola, aceitando as experiências de cada indivíduo.
A lei nº. 8.069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no artigo 53,
estabelece:
A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno
desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e
qualificação para o trabalho, assegurando-lhes:
30
I- igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II – direito de ser respeitado por seus educadores;
III – direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instancias
escolares superiores;
IV – direito de organização e participação em entidades estudantis.
As leis indicam a necessidade de uma nova postura dos envolvidos com a
educação e uma posição mais amigável por parte da escola com a comunidade.
Com a popularização do acesso ao sistema educacional e o inevitável
aumento do fluxo de pessoas dentro das escolas, os problemas aumentaram. A
dificuldade no trato dos relacionamentos interpessoais vem se tornando insuportável
em algumas unidades escolares. Não podemos pensar em voltar no tempo e, muito
menos, em restringir o direito ao acesso ao sistema educacional, porém, é de
extrema importância pensar em ações que promovam, efetivamente, uma educação
de qualidade, pois uma educação carente seria tão prejudicial quanto a falta do
acesso.
A partir do momento em que adentramos o ambiente escolar, temos a
impressão de um local confuso com pessoas infelizes por estarem ali. Ações
violentas no cotidiano escolar têm presença constante na imprensa.
A diminuição das tensões no relacionamento entre professor e aluno pode
colaborar para uma melhoria na qualidade do processo ensino-aprendizagem,
principalmente pelo diálogo entre escola e comunidade.
O planejamento de ações de política educacional não se concretiza sem
que se leve em conta o cotidiano das unidades escolares, com as
características culturais de seus participantes, que, para aderirem às
propostas, devem ser persuadidos e não meramente comunicados (SILVA,
1996. p. 111).
Não é suficiente proporcionar o acesso. A participação nas tomadas de
decisões no ambiente no qual o indivíduo está envolvido, mais do que oferecida,
deve ser estimulada, pois o processo de inclusão não pode ser considerado
completo apenas com a introdução física do indivíduo no prédio escolar, é a sua
participação na construção diária daquele espaço que vai definir a qualidade da sua
permanência.
31
Muitos educandos têm suas matrículas aceitas por força da legislação e
tornam-se um número nas estatísticas educacionais. Frequentam as aulas,
são integrados nas salas de aulas, mas não são incluídos e, muitas vezes,
tornam-se “invisíveis” aos olhos dos colegas e de muitos educadores, que
não atendem suas necessidades e singularidades, contribuindo para o
fracasso e a exclusão escolar e social desses cidadãos (MACHADO e
MAZZARO, 2008. p. 17).
Para os autores, os educandos “invisíveis” são as pessoas com
necessidades educacionais especiais e outros que se tornam invisíveis aos olhos
daqueles que participam ativamente do processo educacional.
Nas diversas ocorrências são relatadas ações violentas contra professores
e alunos, muitas vezes, noticiadas pela mídia.
Faz parte igualmente do pensar certo a rejeição mais decidida a qualquer
forma de discriminação. A prática preconceituosa de raça, de classe, de
gênero ofende a substantividade do ser humano e nega radicalmente a
democracia. (FREIRE, 1996, p. 39).
A dificuldade para praticar a democracia frente ao diferente, dentro de uma
rotina onde o respeito é imprescindível, transforma o ambiente escolar em um
espaço de julgamentos e punições que deixa para segundo plano o ato de educar.
Nesse contexto, inúmeros projetos procuram caminhos que proporcionem aos
educandos condições básicas para desenvolverem suas habilidades e competências
no que tange aos conteúdo e, principalmente, para que se desenvolvam como
seres integrantes e pensantes de um grupo social.
32
CAPÍTULO 2
2.1 Objetivos
2.1.1 Objetivo geral
Investigar se os jogos cooperativos contribuem para a melhoria do
relacionamento entre os alunos da sala PIC e constituição de espaços inclusivos.
2.1.2 Objetivos específicos
Fortalecer o espírito de grupo dos educandos.
Diminuir as agressões físicas e verbais.
Criar um ambiente propício para a aprendizagem.
Elevar a autoestima dos educandos.
Contribuir para a constituição de espaços inclusivos.
Apresentar sugestão de prática pedagógica para melhor efetivação do Projeto
Intensivo no Ciclo - PIC - em escola de Mauá SP.
33
CAPÍTULO 3
3.1 Metodologia
3.1.1 Pesquisa-ação
A Pesquisa-Ação é um método que reúne a coleta e análise dos dados e
aplicação das atividades, com o intuito de promover o redirecionamento da ação, no
caso, o desenvolvimento educacional das crianças.
A participação possibilita aos envolvidos uma relação mais estreita com os
fatos, já que fazem parte do cotidiano e da discussão, apropriando-se do problema
estudado.
Para Thiollent (1988), a Pesquisa Ação é
...um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e
realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um
problema coletivo e na qual os pesquisadores e os participantes
representativos de situação ou do problema estão envolvidos de modo
cooperativo ou participativo. ( p. 14).
Segundo o autor, não existe pré-orientação ou valorização da ação nem um
pré-determinado grupo social, o que restringiria o uso da Pesquisa Ação.
A opção pelo método Pesquisa Ação neste trabalho deve-se à utilização das
aulas de Educação Física como momento de aplicação das atividades cooperativas,
onde os alunos vivenciam as diversas possibilidades de relações humanas
baseadas no respeito ao outro.
Aprendemos melhor com a experiência, mas não podemos fazê-lo, se não
vivenciamos as conseqüências de muitas de nossas decisões mais
importantes nem podermos nos introduzir nas experiências dos que o
fazem. (SENGE, 1990, p. 23).
34
O dinamismo de uma aula de Educação Física proporciona a vivência de uma
situação em sua plenitude, onde o aluno pode tomar decisões, colocá-las em prática
e avaliar seus efeitos nas outras pessoas e em si.
Segundo Thiollent (1998), tal metodologia consiste em gerar idéias, hipóteses
ou diretrizes para orientar a pesquisa e as interpretações. Para o autor, os
problemas levantados devem estar claros desde o início da pesquisa e a atenção
deve ser constante a fim de que as discussões teóricas não se tornem
desestimulantes aos participantes, afetando sua compreensão e atuação no
processo. A teoria deve iluminar o caminho para alcançar os objetivos entendidos
como solução para o problema.
3.1.2 Amostra
Seguindo o método Pesquisa-Ação, formou-se um grupo de pais ou
responsáveis pelos alunos da sala PIC, coordenadora pedagógica, diretora,
professora de artes e professor de Educação Física. Todos tomaram ciência do teor
da pesquisa, entendendo o problema, o método, as hipóteses e os resultados
vislumbrados. O grupo mostrou interesse em conhecer os relatos sobre o
comportamento das crianças, quanto ao seu relacionamento com outras pessoas.
Ao final da aplicação da pesquisa, o grupo reuniu-se novamente para apontamentos
sobre a mudança, ou não, do comportamento das crianças.
O foco principal da pesquisa foram 18 alunos, entre 9 e 11 anos de idade,
considerados com dificuldades de aprendizagem, da sala do PIC da 4ª série da E.E.
Sylvio Gueratto, Mauá/SP, com o intuito de superar sua defasagem de alfabetização.
Além de pesquisador, fui professor da disciplina Educação Física, em 2008 e
no primeiro semestre de 2009, da turma citada. Os critérios para escolha do grupo
foram os registros escolares e observação dos educadores, que apontam constante
agressividade
entre os alunos. Quando da discussão com os envolvidos, todos
foram unânimes em afirmar a necessidade de ações para minimizar os problemas de
relacionamentos.
35
A coleta de dados se deu por observações e registros em diário de campo, ao
término de cada aula, do que aconteceu durante as atividades, além de minhas
percepções do grupo.
No diário de campo também registrei falas dos pais, alunos e professores
envolvidos com a pesquisa, com apontamentos da coordenadora pedagógica,
professora da turma e pais, informações utilizadas para neste trabalho. Algumas
conversas ocorreram no portão e corredores da escola, onde pais e demais
envolvidos faziam apontamentos sobre o andamento dos trabalhos.
Nas reuniões de Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC), os
professores, o coordenador pedagógico e a diretora faziam comentários sobre a
pesquisa.
O diário permaneceu durante todo o tempo em um armário, ao qual apenas
eu tinha acesso, com o objetivo de garantir a ética e privacidade dos envolvidos na
pesquisa.
3.1.3 O grupo
O grupo foi formado por 18 alunos, entre 9 e 11 anos de idade. Em uma
classe tradicional, geralmente os alunos se posicionam em colunas de duas
carteiras, sentando-se em duplas. O lugar de cada um é marcado por uma placa de
cartolina com o seu nome.
A sala de aula, a menor da escola, tem por volta de 18m². As aulas
acontecem geralmente dentro deste espaço, exceção feita às aulas de Educação
Física, que são realizadas na quadra ou em outros ambientes dentro da escola,
como pátio, gramado, etc.
Uma observação prévia, baseada nas afirmações dos profissionais envolvidos
com o grupo, apontou que, de forma geral, os alunos têm baixa autoestima, além de
grande dificuldade de relacionamento em diversos momentos, dentro e fora da sala
de aula.
36
3.1.4 Espaços utilizados
O espaço mais vezes utilizado, como geralmente acontece nas aulas de
Educação Física, é a quadra, frequentemente sem cobertura e sem proteções
laterais, porém, com bom piso, o que assegura a integridade física das crianças.
(Figura 1).
FIGURA 1: Quadra Poliesportiva.
“O cantinho”, à beira do pátio, denominado jardim pelos próprios alunos, é
pequeno, porém, aconchegante, cultivado por funcionários da escola. (Figura 2).
37
FIGURA 2: Jardim ao lado do pátio.
No pátio, outro espaço, lugar amplo e arejado, com mesas e cadeiras,
utilizado com frequência, durante a pesquisa, realizamos discussões e registros pela
escrita e desenhos. (Figura 3).
38
Figura 3: Pátio da escola.
Outro espaço, usado algumas vezes pelo grupo para se reunir e refletir sobre
nossos encontros, à sombra de belas árvores, está localizado atrás das salas de
aulas (Figura 4).
39
Figura 4: Espaço atrás das salas de aula.
Procuramos evitar o espaço das salas de aula, pois, os alunos aí passavam
grande parte de seu tempo, enquanto estavam na escola (Figura 5).
40
FIGURA 5: Sala de aula utilizada pelos alunos da sala PIC, em 2009, já em fase de
desativação.
3.1.5 Aplicação dos jogos cooperativos
Os jogos cooperativos foram aplicados aos alunos da sala de PIC nas aulas
de Educação Física durante o primeiro semestre do ano letivo de 2009. A aula de
Educação Física tem a duração de 50 minutos, duas por semana, desenvolvendo-se
em três momentos:
- Explicação da atividade
- Realização da atividade
- Reflexão sobre a atividade
A aplicação dos jogos cooperativos não afetou o andamento das aulas de
Educação Física, tendo em vista que as capacidades físicas que deviam ser
trabalhadas nas aulas puderam ser adequadas e apontadas nessas atividades.
41
3.1.6 Avaliação do Projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Cidade de São
Paulo – UNICID, em 18/03/2009.
Os responsáveis pelos alunos envolvidos na pesquisa tomaram ciência de
todos os procedimentos e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido,
autorizando a participação na pesquisa.
42
CAPÍTULO 4
4.1 Resultados e discussão
4.1.1 Reunião com os pais
Iniciamos os trabalhos com um encontro com pais ou responsáveis, alunos,
professores, coordenadora e direção da escola, visando explicitar os sentidos e
objetivos da pesquisa, as condições e importância de cada um no processo.
Neste primeiro momento, creio ser de grande relevância destacar a sentida
ausência da maioria dos pais ou responsáveis pelos alunos participantes da
pesquisa, sendo que em uma sala de 18 alunos, apenas três responsáveis legais
compareceram. Forçado pela situação, após alguns esclarecimentos aos presentes,
nova reunião foi marcada. Cabe ressaltar o comprometimento e o empenho da
diretora da escola no sentido de viabilizar a pesquisa, enviando, por iniciativa
própria, convocação para os pais ou responsáveis com uma nova data para a
reunião, para dar início aos trabalhos.
No novo encontro, com presença maior dos participantes, pudemos expor o
trabalho e discutir os caminhos a serem tomados. A princípio, o mais importante era
discutir o problema que levou à necessidade de uma intervenção na sala PIC.
Após a explanação do trabalho, seus objetivos, método e esperado impacto
dos jogos cooperativos no comportamento dos alunos, a expectativa de uma
discussão se viu frustrada devido ao silêncio que teimava em permanecer, vendo-se
apenas
um enorme ponto de interrogação no olhar dos pais e dos alunos. Os
professores e gestores também permaneciam calados.
O cidadão precisa ter consciência da necessidade de compartilhar
ativamente das discussões da sua comunidade, seja qual for a forma
adotada na defesa dos interesses da sociedade. É sabido que o
fortalecimento da sociedade civil é e sempre foi resultado da cooperação ou
da ação conjunta e criativa entre o cidadão e o Estado. Os principais temas
da sociedade civil, como saúde, educação, segurança, cultura e justiça,
somente por encontrar conclusões ideais, se tiverem a natural colaboração
43
do cidadão, isoladamente ou como participante de entidades comunitárias.
É um processo educativo, estimulante e profícuo, que pode ser considerado
o melhor e mais persuasivo instrumento para a formação do espírito
democrático. (MACHADO, MAZZARO, 2008 p. 19.).
Visando obter adesão maior ao projeto, tornar as relações do grupo mais
espontâneas e aumentar a autoconfiança, propus a realização de um jogo
cooperativo, antes de continuarmos os trabalhos.
O Jogo
Utilizando uma corda grande, pedi para que a segurassem em algum ponto,
para ficarmos todos ligados naquele momento. Utilizando um aparelho de som com
uma música agitada, iniciamos com a comanda:
- Alguém pode começar um movimento no ritmo da música e os outros irão segui-lo.
Como não podia ser diferente, tive que dar início à atividade e, com uma
timidez claramente refletida nos movimentos, todos começaram a me seguir. Iniciei
com movimentos de fácil execução, com braços e mãos. Após alguns instantes,
apontei para uma das crianças e pedi que desse sequência à atividade e, assim,
fomos passando por vários integrantes do grupo, alunos e pais, até que quase todos
a tivessem realizado, sem pressão sobre os que não aceitaram fazer o papel de
líder.
Após essa atividade, passamos à segunda parte, com a comanda:
- Quem está segurando a ponta da corda deve se deslocar pelo espaço e os outros
irão segui-lo. Não importa o caminho que será feito, ninguém pode soltar a corda.
Quando a música terminou, estávamos totalmente enrolados com a corda e
ligados, pois ninguém havia soltado a corda. Nesse momento, demos a terceira
comanda:
44
- Todos juntos, vamos nos desenrolar, sem soltar a corda, uns ajudando os outros
até voltarmos a posição inicial.
Esse momento foi o mais gratificante, todos davam risadas espontâneas,
enquanto tentavam se desvencilhar do emaranhado de cordas, braços e pernas.
Colhendo os frutos
Com a participação de todos, o clima no grupo teve uma mudança
considerável. O gelo foi quebrado e todos puderam contemplar o efeito imediato no
momento em que voltamos à sala de reunião. Conversas paralelas, risos e
exclamações davam o tom do ambiente. Um momento rico foi vivenciado: pessoas
que há pouco estavam inseguras e resistentes ao diálogo agora falavam como se
estivessem em meio a velhos conhecidos.
A participação é de extrema importância não apenas na presente pesquisa,
mas na história da humanidade, como aponta MARTINS (1999):
Etimologicamente, participar significa tomar uma parte (do latim "partem
capere"). No entanto, a melhor noção de participação vem da etimologia
grega, que significa ter conjuntamente ou ter com outro (metekó). Daí os
dois sentidos básicos da palavra participação: Sentido Material (latino) –
dividir um todo material entre aqueles que dele participarão: o todo
desaparecerá e cada sujeito participante terá uma parte do objeto
participado, guardando uma relação apenas histórica com o antigo todo;
Sentido Espiritual (grego) – ter parcialmente o que outro possui
integralmente: uma alegria que é plena no sujeito que obteve uma vitória, é
participada em menor intensidade naquele que recebe a comunicação da
vitória e com ela se alegra, sem que a participação diminua a alegria do
sujeito que obteve a vitória, antes a tem aumentado (apud FERRAZ, 2008,
p. 37-38).
Com o aumento da alegria pela sensação de participação e percepção de
estar dentro de um grupo com os mesmos objetivos, medos e dúvidas, reiniciamos
as discussões.
Após esse primeiro contato, iniciamos novamente as explicações sobre a
pesquisa, desta vez, com uma participação mais intensa do grupo. Os pais relataram
de forma resumida o comportamento das crianças fora da escola e de forma geral
45
apontaram comportamentos diferentes daqueles vislumbrados no ambiente escolar,
onde os atos violentos são constantes. Sua leitura é parecida com a dos
professores, quando falam do comportamento das crianças no ambiente escolar. Ao
serem questionados sobre a variação de comportamento, apontam a possível
sensação de liberdade por estarem distantes de casa e do olhar dos pais.
4.1.2 Quebrando paradigmas
No início das atividades, como era esperado, os alunos relutaram muito em
realizar os jogos, alegando que a ausência de um vitorioso tirava toda a graça do
jogo. A ânsia pela competição estava enraizada em sua formação assim como na
formação da grande maioria de nós.
Considerada como um valor natural e normal da sociedade humana, a
competição tem sido adotada como uma regra em praticamente todos os
setores da vida social. Temos competido em lugares, com pessoas e em
momentos que não precisaríamos, e muito menos deveríamos. Temos
agido assim como se essa fosse a única opção. (BROTTO, 2001, p. 45).
Procurei explicar aos alunos que, mais que a competição, aquele momento da
aula de Educação Física era de construir um espaço de aprendizagem, onde todos
teriam um papel importante e indispensável, seriam parceiros na aprendizagem e a
vitória seria daqueles que conseguissem trabalhar coletivamente e jogar juntos.
A quebra desse paradigma é um dos passos mais difíceis, pois, em qualquer
segmento onde os jogos cooperativos são implantados, o questionamento é sempre
o mesmo: “O que tenho que fazer para ganhar”?
Após o primeiro encontro com familiares, educadores e educandos, uma
empolgação tomou conta dos alunos que todos os dias, ao nos encontrarmos nos
corredores da escola, vinham em disparada, sempre com o mesmo questionamento:
“Professor, quando vão começar os jogos cooperativos”? Resposta: aguardar o dia
das aulas de Educação Física daquela turma.
46
4.1.3 Por que cooperar? – 31/03/2009
O tão esperado dia chegou. Dirigimo-nos para o pátio, pois nesse primeiro dia
algumas explicações se faziam necessárias, além de uma discussão sobre aquilo
que as crianças esperavam dos jogos com o intuito de sondar seu conhecimento
prévio sobre o assunto jogos cooperativos.
As pessoas não podem ser meros instrumentos de projetos mesmo que
estes sejam os mais belos e bem elaborados teoricamente. Dessa forma, as
mudanças nas redes de ensino não podem prescindir da participação de
todos os envolvidos. (SILVA, J. M. 2009 p. 26).
A participação consciente de todos os envolvidos deve permear cada ação
para obter sua autorização na prática educacional.
Para tal atividade o pátio parecia o ambiente mais propício, dentro da escola,
por ser um local arejado e bastante amplo, diferente da sala de aula, e onde também
podíamos contar com o conforto dos bancos.
Sentamo-nos em um círculo formado com os bancos arrumados pelos alunos
no pátio, o “canto” escolhido por eles, o mais próximo do belo jardim.
Falando da criação e utilização de recursos pedagógicos, MACHADO e
MAZZARO (2008) comentam:
...para causar o impacto esperado, é importante você planejar o encontro
dos educandos com as histórias
O ideal é criar um clima de alegria, curiosidade, magia, afetividade e
informalidade na sala de aula, no pátio, embaixo de uma árvore ou na
biblioteca. ( p. 27).
A visualização do espaço escolar por outro prisma que não entre as quatro
paredes da sala de aula pode e deve valorizar os diversos ambientes escolares,
fazendo com que os frequentadores valorizem o local onde passaram várias horas
por dia.
47
Após a pergunta sobre quem sabia alguma coisa sobre jogos cooperativos,
pude perceber que as definições não ultrapassavam aquelas da reunião inicial com
os pais. Quando o questionamento foi sobre a vivência de cada um nos jogos
cooperativos, tudo que se podia ouvir eram os belos cantos dos pássaros que
brincavam, pulando de galho em galho nas pequenas arvores que compunham o
belo cenário de nosso encontro. Triste por interromper aquele valioso momento de
contemplação da natureza, porém, certo da necessidade de saciar a curiosidade
daqueles olhinhos inquietos, convidei-os a observarem o comportamento das aves.
O exercício da curiosidade convoca a imaginação, a intuição, as emoções, a
capacidade de conjecturar, de comparar, na busca da perfilização do objeto
ou do achado de sua razão de ser. Um ruído, por exemplo, pode provocar
minha curiosidade. Observo o espaço onde parece que se está verificando.
Aguço o ouvido. Procuro comparar com outro ruído cuja razão de ser já
conheço. Investigo melhor o espaço. Admito hipóteses várias em torno da
possível origem do ruído. Elimino algumas até que chego a sua explicação.
(FREIRE, 1999, p. 98).
Exercitar a curiosidade das crianças e dos professores e utilizar espaços
diferentes da sala de aula é uma estratégia ainda pouco explorada dentro de nossas
escolas, que pode nos surpreender de forma positiva, proporcionando descobertas a
cada instante.
Devemos lembrar, neste ponto, o princípio fundamental da teoria de Piaget,
que coloca o desenvolvimento normal da inteligência como uma sucessão
estritamente invariável de fases (sensório-motora, pré-operatória, operatória
concreta e formal), na qual o acesso à fase seguinte necessita da
integração da fase precedente, sendo que qualquer perturbação numa fase
acarreta perturbação na seguinte (BOSSA. 2000, p. 17).
Sem pretensões técnicas ou embasamentos teóricos sobre o comportamento
das aves, iniciamos, após alguns poucos minutos de observação, uma reflexão
sobre aquilo a que assistíamos. Ao descrever o comportamento dos pássaros, os
alunos apontaram, de maneira geral, o que estava acontecendo. Os pássaros pulam
de galho em galho e cantam bastante foi a observação predominante no grupo.
48
Questionei se eles achavam que os pássaros estavam felizes e todos de
forma unânime afirmaram que sim, pois o comportamento não demonstrava de
forma alguma qualquer vestígio de tristeza.
Perguntei, então, se eles seriam capazes de definir quem estava vencendo a
brincadeira. Nesse momento, novamente o silêncio tomou conta do pátio, só se
ouviam as vozes de outras crianças distantes dentro das salas de aula e novamente
o cantar dos pássaros. Após alguns segundos de reflexão, um aluno, o mais falante
da turma, apontou um dos pássaros e disse:
- Aquele é o que está vencendo.
Formatado
Pedi que nos explicasse como chegou a essa conclusão e ele disse:
- Eu acho, não sei por quê.
Outros alunos discordaram, alguns apontando outro pássaro. Uma menina
questionou se eles realmente estavam disputando ou apenas brincando. Pedi
atenção para a pergunta e a grande maioria concordou imediatamente, enquanto
apenas alguns continuaram em dúvida. Um deles questionou:
- Como você pode saber que eles não estão disputando?
Finalmente ouvi aquilo que esperava desde o início do nosso encontro. A
menina, a mesma que questionou se os pássaros estavam realmente disputando,
justificou:
- Eu acho que eles não estão disputando, porque todos parecem estar felizes do
mesmo jeito e, se alguém estivesse perdendo, não estaria feliz, mas sim triste ou
bravo.
A explicação foi de tamanha precisão e contemplava de forma tão ampla
aquilo que eu gostaria de passar aos alunos, que me dei por satisfeito. Todos
entenderam a explicação da menina e concordaram com ela.
Como afirma Machado (2009), o diálogo com os autores possibilita:
Formatado
49
...reflexões e melhor compreensão sobre conhecimentos fundantes da
situação educativa, que levam em consideração, necessariamente, o ponto
de partida dos educandos (gnosiologia, antropologia), o ponto de chegada
(os fins e objetivos educacionais) e o caminho (procedimentos
educacionais) ( p. 31).
Momentos como esse, mais que dar andamento à pesquisa, possibilitaramme entender realmente o papel do educador e vivenciar a formação do educando
paralelamente a minha própria formação.
A educação se faz na ação e, ao mesmo tempo, reflete sobre ela. A
formação contínua deve ocorrer numa perspectiva reflexiva e de pesquisa,
para que os professores possam tecer uma rede de conexões para si, para
sua prática, para seus alunos e a sociedade. A capacitação de professores
em serviço é indispensável para a introdução de novas alternativas
educacionais, o que causa um impacto diferencial sobre a aprendizagem.
(MACHADO, 2001, p 26).
É importante que o professor tenha a sensibilidade para extrair de cada
momento uma aprendizagem, tornando a própria prática pedagógica um instrumento
poderoso de formação contínua.
4.1.4 Vamos cooperar?– 01/04/2009
Ainda feliz com o desfecho das discussões da última aula, deparei-me com
uma sala novamente afoita por atividades físicas. Após breve explicação sobre o
jogo que faríamos na quadra, saímos da sala de aula e fomos para o espaço mais
desejado pelos alunos.
Para este primeiro dia, uma atividade de fácil compreensão foi proposta: o
jogo “O macaco vê, o macaco faz”. Após reunir as crianças em círculo, a criança
escolhida para iniciar a brincadeira cria ou relembra algum movimento, explica para
os demais como realizá-lo e, a partir daí, todos tentam imitar. Após todos terem
conseguido imitar, o grupo aplaude o criador em sinal de respeito pela sua ação.
Nesta primeira atividade prática, quase tudo correu bem. Os alunos
entenderam o espírito da brincadeira, porém, alguns insistiam em desvalorizar os
50
movimentos criados pelos colegas o que, como já era corriqueiro, transformava o
final da aula em momentos de agressões verbais e até físicas.
A insistência de alguns alunos em se afastar do grupo ou permanecer
indiferentes às manifestações dos outros pode ser entendida, como explica Bossa
(2000):
A criança ou adolescente muitas vezes prefere acreditar, e fazer os outros
acreditarem, que vai mal na escola porque é desinteressada. Aceitar que
não entende a matéria, para esses jovens, significa ser ”burro”. Quando nos
sentimos “burros”, ferimos o nosso narcisismo. Podemos dizer que o
narcisismo é o nosso amor próprio. Um sentimento que nutrimos por nós
mesmos e que, na medida certa, é muito importante para a nossa saúde
mental (p. 13).
Nesse sentido, Bossa, uma atitude seria promover a aceitação das crianças
que se mostravam arredias, como parte integrante e importante da turma. Para tanto
o jogo elaborado e aplicado na próxima aula deveria proporcionar uma construção
coletiva, onde cada um tivesse contribuição decisiva para a obtenção de êxito.
O dia não terminou de forma tão agradável quanto o anterior. Ainda havia
inúmeras possibilidades, pois, estávamos só começando.
4.1.5 Salto triplo – 07/04/2009
Neste dia, o objetivo era proporcionar momentos em que os alunos pudessem
criar algo em conjunto e o jogo “Salto triplo” pareceu uma atividade adequada, já que
unia a construção coletiva com a atividade física.
Na Educação Física Escolar, a cultura corporal se manifesta pelo jogo,
esporte, dança, ginástica e luta como formas de comunicação e expressão
entre os alunos. Por seu caráter democrático, produzem benefícios
psicológicos, desenvolvendo as potencialidades pessoais. (MATTOS, 2006,
p. 87).
51
Para este jogo utilizamos um espaço logo atrás da quadra poliesportiva, por
um espaço grande com piso que absorve o impacto dos saltos (gramado). O muro
que demarca a delimitação da área da quadra foi utilizado como banco por se tratar
de uma estrutura baixa com aproximadamente um metro de altura. O jogo: um aluno
por vez, carregando um pequeno bastão de 30 cm improvisado com um pedaço de
cabo de vassoura, executa três saltos consecutivos (sem exigência técnica). Ao
término dos três saltos, o aluno coloca o bastão no chão, no ponto aonde chegou. O
próximo aluno parte daquele ponto, segurando o bastão para a realização de mais
três saltos consecutivos. Assim, continuamos, até que todos tivessem executado os
saltos. Ao final, marcamos a distância percorrida e desafiamos os alunos a
conseguirem aumentá-la.
Desta vez, vislumbramos algo diferenciado naquela turma: uns estavam
torcendo pelos outros, pois sabiam que o sucesso do outro seria seu próprio
sucesso, como reconheceram os alunos, ao término da aula.
Quando educadores, alunos e comunidade reconhecerem que eles têm
participação nas tomadas de decisões, maior apego às normas práticas,
materiais e procedimentos adotados podem ser esperados. Eles se tornam
acionistas na operação do sistema. (STAINBACK, 2006 p. 8).
A percepção de seu lugar dentro de um mundo tão complexo como o escolar
deve acontecer aos poucos e trabalhado diariamente.
4.1.6 Refletindo– 08/04/2009
Neste dia, voltamos ao espaço onde havíamos iniciado os trabalhos,
sentamo-nos em círculo nos bancos junto às mesas organizadas no pátio para o
momento do intervalo.
Uma reflexão sobre os jogos levou-nos a “repensar nossos atos”. As ideias,
impressões e sentimentos dos alunos fluíram naturalmente
52
- Eu não consegui pular muito.
- Mas, se faltasse um pulo, a gente não tinha chegado aonde chegamos.
Tal fala mostra a conscientização sobre os objetivos do jogo: reconhecer a
importância do outro para a efetivação da atividade.
Para SILVA (2008), para se tornar uma escola que realmente atua de forma
inclusiva, as práticas devem ser desenvolvidas repetidas vezes a fim de que se
institucionalizem.
Quando o aluno percebe, por si só, a necessidade da participação do outro,
torna-se acolhedor e procura ajudar.
Após os alunos falarem sobre as dificuldades de realização das atividades e
sobre o prazer em completar cada etapa, iniciamos os registros. Devido à grande
dificuldade da maioria dos alunos no que tange à escrita, optamos pelo registro com
desenhos. Os que já dominavam a escrita, mesmo de forma simples, optaram por
registrar dessa forma.
No momento do registro, a participação do professor da sala, denominado
“polivalente” na rede estadual de São Paulo, é de grande importância, pois é o
momento em que a criança procura expressar péla escrita tudo o que viveu no jogo,
tornando-se um espaço rico de criação e aprendizagem.
Acredita-se que o jogo proporcione duas grandes vantagens ao ser
trabalhado desta maneira: pelo fato de ser um elemento da cultura infantil e
pela sua capacidade de trazer questionamentos das mais diversas
naturezas às crianças de maneira conectada. Isso implica dizer que a
fragmentação dos saberes, uma das principais dificuldades vividas dentro
da educação seria, se não eliminada, pelo menos reduzida. (André, 2007. p.
23).
É necessário que os educadores se conscientizem quanto à importância da
realização de ações em conjunto, que promovem um ambiente único de
aprendizagem e rico em relações humanas.
53
4.1.7 Resgatando – 14/04/2009
Neste jogo simulamos um salvamento. O ambiente foi criado com mesas
formando um círculo. O aluno a ser resgatado ficava no meio do círculo como se
estivesse em um buraco. Passamos uma corda por cima de uma viga de concreto.
Após tudo organizado, um aluno se posicionou dentro do “buraco” e começou a
gritar por socorro. Os outros alunos, posicionados a alguns metros, ficavam
conversando e, quando um deles ouvia o pedido de socorro, corria até o local para
iniciar o salvamento. Jogada a corda, o aluno que estava no buraco a segurava e o
salvador começava a puxar. Se não aguentasse o peso do aluno a ser resgatado,
podia pedir a ajuda a outro colega ou até a mais um e, assim, sucessivamente, até
que fosse possível levantar o acidentado até à altura das mesas.
Neste dia os alunos ficaram eufóricos, todos queriam ser o resgatado e as
discussões foram constantes, como dizia um dos alunos que ajudou a preparar o
ambiente do jogo:
- Eu primeiro, fui eu que montei tudo.
Segundo MOREIRA (2005) é importante construir o conhecimento a partir da
interação do sujeito com o mundo, oferecendo a todos as mesmas oportunidades de
acesso ao conhecimento.
Pensando em como definir quem iniciaria o jogo, uma aluna disse:
- Cada um pode escolher quem será o próximo e o professor escolhe o primeiro.
Os alunos concordaram prontamente, porém, achei melhor que ela
começasse, já que tinha dado a idéia. Todos concordaram e iniciamos as atividades.
Segundo BROTTO (2001), as diversas possibilidades do jogo, como as
decisões, ações e observações, podem refletir-se na vida fora do jogo,
instrumentando o aluno para uma vida em uma sociedade mais saudável.
Uma ocorrência chamou a atenção: quando o aluno a ser salvo estava quase
atingindo a altura das mesas, um dos salvadores soltou a corda e o resgatado caiu
sobre os colchões. Neste momento fizemos um intervalo para conversar. Expliquei
54
sobre os riscos envolvidos e sobre a confiança que o aluno resgatado depositara em
seus salvadores e continuamos o jogo, deixando maiores discussões para o próximo
dia.
4.1.8 Após o salvamento – 15/04/2009
No dia após a atividade de salvamento, tivemos momentos tensos no grupo,
pois o aluno que havia sido solto,nervoso, discutia muito, chegando a tentar agredir
seus salvadores. Após alguns minutos de discussões e empurrões, sentamo-nos
para refletir sobre o ocorrido, atendendo ao que expõe BLANCO (2007):
O indivíduo forma-se, apropriando-se dos resultados da história e
objetivando-se no interior desta história, ou seja, sua formação realiza-se
por meio da relação entre objetivação e apropriação. Essa relação se
efetiva no interior de relações concretas com outros indivíduos, que atuam
como mediadores entre ele e o mundo humano, o mundo da atividade
humana objetivada (p. 69).
O exercício da reflexão, levando a uma maior conscientização, proporcionaria
ao aluno a apropriação das discussões e a consciência de fazer parte do grupo.
O grupo apresentava altos e baixos no que tange às relações, o que pode ser
visto como uma evolução, considerando que, no início das atividades, as relações
eram invariavelmente conturbadas e agressivas.
Neste momento, a ocorrência abalou as relações do grupo que começavam a
se tornar mais amigáveis. Todos tomaram uma posição e os conflitos se
multiplicaram, por isso, resolvemos fazer uma pausa nas discussões e registrar a
atividade pelo desenho e escrita.
55
4.1.9 Levante-me – 22/04/2009
Pensando nos acontecimentos do último jogo, optei, neste dia, por um jogo
que proporcionasse maior aproximação física e reforçasse a necessidade de
confiança entre os membros do grupo.
As interações criança-criança também devem ser privilegiadas, já que,
quando agem conjuntamente na realização de alguma atividade comum,
permitem: a auto-regulação do comportamento, a detecção de
incongruências e lacunas, o direcionamento consciente da fala para a
comunicação mais precisa e explicita, a intencionalidade para encontrar
formulações alternativas para uma mesma idéia e agregar exemplos de
forma coerente. (BLANCO, 2007, p. 74).
O principal objetivo do jogo, neste momento, era provocar a percepção de
problemas, esperando que, perante a necessidade de adaptação, o grupo
procurasse meios para transpor os obstáculos de forma coletiva e democrática.
Com os alunos dispostos em fila, o jogo consistia em um ajudar o outro a
levantar-se. O primeiro senta-se no chão e o segundo tenta levantá-lo, puxando-o
pelas mãos; se não conseguisse, pedia ajuda ao terceiro ou a quantos precisasse.
Após levantar o primeiro aluno, todos que ajudaram sentavam-se e o próximo da fila
tentava levantar o grupo que ficava abraçado; sendo necessário, o próximo da fila
pode pedir ajuda de outros e assim segue o jogo até que todos façam parte do
mesmo grupo.
A aplicação desta atividade mostrou outra característica dos alunos: a escolha
de quem ficaria próximo de quem, o que quase criou um novo conflito entre os
alunos, porém, ao explicar que a atividade seria repetida várias vezes e que a ordem
da fila seria alterada em todas as oportunidades, os alunos se acalmaram.
Comenta LEONARDE (2005):
Devemos, nestes contextos violentos, observar duas dimensões essenciais:
a primeira social e a segunda subjetiva. O entendimento da relação entre
estas duas dimensões deve, no ambiente escolar, promover a consolidação
de uma perspectiva ética e de valorização do outro, do acolhimento e da
compreensão do diferente. (p. 3).
56
A
frequente
variação
de
atividades
proporciona
aos
participantes
conhecerem melhor cada um e desenvolver um respeito maior entre todos os
envolvidos, já que todos terão conhecimento dos pensamentos e necessidades de
cada um.
A atividade deste dia foi realizada de forma tranquila e sem ocorrências. A
aproximação maior entre os alunos tornou a atividade divertida e gratificante para
todos.
4.1.10 Relembrando os conflitos – 28/04/2009
O encontro deste dia foi realizado em um gramado ao lado de algumas salas
de aula, um cenário perfeito para sentar e discutir os motivos pelos quais estávamos
ali. No primeiro momento pedi para que os alunos comentassem sobre aquilo que
estavam vivenciando e o que achavam de suas atitudes e das atitudes do grupo.
É preciso reorganizar a estrutura escolar, rever seus conceitos de
transmissão de conhecimentos, refletir sobre sua finalidade e criar espaços
para relações comunicacionais abertas, possibilitar aos alunos trazerem
suas vivências, realidades e dúvidas e explorar tais informações,
transformando-as em meios para a construção do conhecimento.
(MACHADO, 2001, p. 15).
O primeiro aluno a se pronunciar, por vontade própria, o mesmo que havia
soltara o amigo, ao largar a corda na atividade, pediu desculpas ao grupo, afirmando
que não faria aquilo novamente.
- Desculpa! Eu só estava brincando.
Comentou uma aluna:
- Você está errado. Não podia ter largado a corda.
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Promete o aluno:
- Eu não vou fazer isso de novo.
Percebeu-se que a ocorrência ainda incomodava o aluno, que, por iniciativa
própria, tocou no assunto. O grupo deu-se por satisfeito e terminamos as discussões
sobre o ocorrido.
Em sua grande maioria, o grupo se mostrava feliz com as atividades, porém,
dois alunos reclamaram pela ausência do futebol:
- Professor, não dá pra gente jogar um pouco de futebol?
Sem dúvida, isso era possível e foi o ponto de partida para o próximo
encontro.
4.1.11 Futebol cooperativo – 29/04/2009
Atendendo ao pedido dos dois alunos no último encontro e levando em
consideração o caráter empolgante do futebol para a grande maioria dos brasileiros,
no caso escolar, inclusive as meninas, decidi desenvolver uma atividade que, apesar
de fundamentada no competitivo futebol, pudesse proporcionar a cooperação que
tanto buscávamos.
Sentamo-nos na quadra e perguntei para os alunos como poderíamos
transformar o futebol em um jogo cooperativo.
Mais do que criar um “novo jogo”, a proposta naquele momento era provocar
a criação coletiva com o intuito de reforçar os laços do grupo.
Darido (2003), citando Go Tani, aponta como objetivo da Educação Física o
reconhecimento e o respeito cultural, além de explorar as múltiplas possibilidades
educativas e gradativamente propor tarefas cada vez mais complexas, visando à
construção do conhecimento, que somente pode ocorrer de forma coletiva onde
cada vivência individual soma-se às vivências de outros integrantes.
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Depois de muito pensar e discutir, desenvolvemos um jogo criado pelos
alunos em que não haveria goleiros e todos pertenceriam à mesma equipe, com os
jogadores distribuídos pela quadra. O jogo começou. Cada jogador podia tocar
apenas uma vez na bola e chutaria para o gol o último aluno que a recebesse.
Paramos várias vezes para discutir as regras e alterá-las, quando o grupo julgava
necessário.
O encontro deste dia foi especial, pois estávamos criando algo juntos.
Ao participar da criação e formulação de uma atividade, além de poder parar
a ação, refletir e redirecionar os encaminhamentos, de acordo com as possibilidades
e necessidades do grupo, o educando sente-se como parte da comunidade escolar,
não mais simples ouvinte, mas atuante no cenário educativo
Convidar o aluno a participar diretamente da criação daquilo que vivenciará
no ambiente escolar contribui para a diminuição de ações violentas, já que se
reconhecerá como parte integrante do espaço e das práticas ali desenvolvidas.
Lannone (2004) recomenda
...demonstrar a associação entre jovens e violência, dando relevo ao lado
luminoso da juventude, à sua capacidade de criar novas sensibilidades,
novos valores, novas atitudes na escola e na comunidade escolar em
Educação para o desenvolvimento humano. (p. 117).
Antes de cobrar dos alunos o envolvimento consciente e entusiasmado com
as atividades escolares, a prática dos educadores deve ser consciente e motivadora.
4.1.12 Contemplando nossa criação – 05/05/2009
Para refletir sobre o que aconteceu na última aula, escolhemos o local que a
turma elegeu como “nosso espaço”, um dos cantos do pátio, próximo ao jardim onde
nos reunimos pela primeira vez.
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As discussões neste dia giraram em torno da feliz criação do dia anterior.
Todos estavam satisfeitos por terem participado da elaboração do jogo, como disser
um aluno:
- Esse jogo é só nosso, não vamos contar pra ninguém!
Outro aluno retrucou:
- Não é não, eu vou contar pra todo mundo.
- Fofoqueiro!
Assim gritaram alguns alunos, protestando contra a ideia.
Nesse momento, para não perder o foco das discussões, questionei:
- Qual é o objetivo dos jogos cooperativos?
Gritaram os alunos:
- Ajudar os outros!
- Se nós contarmos para outras pessoas sobre nossa criação podemos ajudá-los?
Responderam alguns:
- Sim.
Um menino comentou:
- A gente pode ensinar para outra classe.
Sentindo a empolgação dos alunos, propus passar nossa experiência para
outras pessoas. Decidimos então, convidar os alunos da 4ª série C para participarem
da atividade.
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4.1.13 Compartilhando nossa criação – 06/05/2009
Como havíamos combinado no último encontro, fomos à sala da 4ª série C e
os convidamos para ir até a quadra onde realizaríamos o futebol cooperativo.
A empolgação dos alunos com a chance de mostrar para os colegas aquilo
que haviam criado transformou a aula em uma grande confusão. Em alguns
momentos, precisei intervir para que o jogo acontecesse, o que se revelou uma
experiência muito gratificante para todos.
Há para nós educadores um compromisso pessoal e profissional de
favorecer nossos educandos na aquisição e domínio de códigos que lhes
permitam conviver em círculos amplos da sociedade e não apenas em
“tribos” exclusivas, com linguagens restritas e inúteis para um
relacionamento com a totalidade da população (SILVA, 2009, p. 27).
Percebemos, nesse encontro, as dificuldades no momento de ultrapassar os
limites das “tribos”. A paciência frente ao aparente caos deve ser exercitada, pois o
que parece grande bagunça pode representar um momento de reorganização das
crianças, em seu primeiro contato com um mundo diferente daquele em que vivem
habitualmente.
4.1.14 Apoie-me – 12/05/2009
Iniciamos o encontro com o jogo Apoie-me, uma atividade que estimula o
contato físico e a cooperação.
O jogo foi desenvolvido da seguinte forma: os alunos, de costas, formaram
duas fileiras, deram-se as mãos e, ao sinal do professor, tentaram levantar-se, uma
fila apoiando-se nas costas da outra.
A atividade foi realizada de forma perfeita e os alunos perceberam sua
importância.
61
Notou-se um entrosamento que antes não existia entre os alunos. Discussões
sobre a atividade aconteceram durante toda a ação, porém, pautadas no respeito,
sem brigas ou qualquer outra atitude agressiva, pois, como afirma Machado (2001),
“a aprendizagem cooperativa é uma relação social circular, multiplicadora de
interação, de ajuda entre as pessoas do grupo” (p. 8).
Os alunos sentiram-se participantes do processo e, mais que isso, tiveram a
consciência de sua participação, o que aumenta sua autoestima e confiança de que
suas propostas e idéias serão consideradas e respeitadas pelo grupo.
4.1.15 Reflexão – Estamos no caminho certo? 13/05/2009
Com o passar dos encontros foi possível perceber que o grupo estava
vivendo uma mudança positiva. Os encontros em que apenas alguns falavam deram
lugar a momentos de debates calorosos em que todos queriam dar sua opinião.
Neste dia coloquei em pauta a questão: Vocês acham que estamos no
caminho certo?
Após uma avalanche de comentários e alguns pedidos de organização,
conseguimos ouvir alguns alunos.
Uma menina:
- Eu acho que a gente está melhorando.
O comentário provocou algumas brincadeiras. Um dos alunos, o mais falante,
disse:
- Eu já sou bom, não preciso melhorar.
O grupo ficou eufórico, risadas se misturavam com exclamações. Uma alunas
disse:
- Você era o pior aqui.
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Outro falou:
- Eu acho que a gente está melhor, sim. A gente não briga muito mais. Só às vezes.
Outro completou:
- A gente só briga nas outras aulas.
O comentário chamou minha atenção. Perguntei aos alunos o porquê desse
comportamento. Vieram as respostas:
- Professor, a gente coopera na Educação Física, fora daqui é cada um por si.
Um meninos disse:
- Eu acho que nós temos que cooperar em qualquer lugar.
Outro retrucou:
- Eu não acho. A gente ajuda só quem é nosso amigo de verdade.
Era evidente que os alunos criaram um vínculo com a aula de Educação
Física e com aquele espaço. As atitudes e reflexões desenvolvidas naquele
ambiente não estavam sendo levadas para outros.
Como adverte Silva (1998), é preciso repensar as relações, aceitar a si
mesmo e os outros como pessoas que têm seu valor e dignidade no meio em que
vivem.
Comenta MACHADO (2008):
O artigo 7º da declaração Mundial sobre Educação para Todos (UNICEF,
1991) destaca a importância da participação e união de profissionais de
educação, famílias, comunidades locais e órgãos governamentais que
“contribuem significativamente para o planejamento, a implementação, a
administração e a avaliação dos programas de educação básica. (p. 16).
63
A lei garante o acesso de todos à educação formal, porém, sem o esforço de
todos os envolvidos as políticas não ultrapassam o proclamado.
É necessário que os profissionais de educação mudem de atitude,
repensem sua prática, sua maneira de ensinar, ver o mundo, o ser humano,
pensem seus valores, enxerguem o outro como um ser de relações, capaz
de aprender, mudar e transformar. (MACHADO, 2008, p. 17).
Em alguns momentos, dentro da escola, a preocupação dos educadores é
manter a ordem, o que promove a falsa impressão de um ambiente em que estão
todos quietos e por isso aprendendo.
É preciso quebrar o paradigma de que as crianças só aprendem, quando
estão em silêncio. O barulho e a aparente desorganização quando realizam alguma
atividade são inerentes às crianças e adolescentes, comportamento que também se
percebe em pessoas de mais idade.
Transformar todos os ambientes escolares em espaços de criação permeados
pela cooperação, mais que um dever, é garantia do direito de todos se manifestarem
de acordo com suas crenças e experiências, expressando física e verbalmente a
bagagem que trazem consigo e que faz parte de sua formação como seres
integrantes da sociedade.
Ao perguntar se haviam gostado do futebol cooperativo com a outra turma,
todos se expressaram positivamente.
- Eu achei a aula mais legal!
- A gente devia chamar outras salas pra fazer também.
As falas expressam a intenção do grupo em expandir para toda a escola
aquele ambiente, que se tornava agradável. Mesmo o menino que havia falado
sobre as brigas fora das aulas de Educação Física mostrava-se disposto a cooperar.
Não foi possível repetir a experiência com outras salas, porém, a questão
estava colocada.
64
4.1.16 Cooperando e evoluindo – 19/05/2009
Percebendo a evolução dos alunos nos jogos cooperativos, partimos para
outra atividade: a brincadeira que há várias gerações vem sendo praticada por
crianças de todas as idades: Batata Quente, de fácil execução e que se enquadra
em nossos objetivos, como descreve Deacove (2002):
os alunos formam duas rodas, uma em pé e outra no centro da primeira com os
alunos sentado em frente dos que estão em pé. Um aluno é escolhido para tirar a
música que define quem ficará com a “batata na mão”. Neste momento, a criança
que está com a “batata” deve jogá-la para outra que também esteja sentada e que
tenha um parceiro em pé. Se a “batata” for agarrada, a criança que está atrás
daquela que segurou a “batata” pode sentar-se no círculo central; se a “batata” cair
no chão, o jogador deve levantar-se. O jogo é considerado finalizado e vencido,
quando todos conseguirem entrar no círculo central. Se todos estiverem no círculo
maior, em pé, o jogo é considerado perdido.
Partimos para o jogo, no gramado, já usado algumas vezes. Antes, era
necessário definir o que usaríamos como “batata”. Convidei os alunos para uma
atividade rápida que ajudaria todo mundo: saímos pela escola recolhendo os papéis
que encontrávamos pelo chão, com os quais poderíamos confeccionar a bola ou
“batata” para o jogo.
Após alguns poucos minutos, tínhamos material suficiente para confeccionar
uma bolinha de papel para cada aluno. Foi o que fizemos. Terminada a atividade,
pedi para que guardassem as bolinhas de papel para uma brincadeira posterior,
fomos ao gramado e iniciamos o jogo.
Ao invés de colocar uma música no aparelho de som, optei por pegar o violão
e tocar uma música que ia interrompendo aleatoriamente. Por alguns instantes os
alunos ficaram mais interessados no violão do que no jogo. Paramos a atividade e
conversamos sobre a necessidade de nos concentrarmos naquilo que estávamos
fazendo. Com a promessa de ensiná-los um pouco do instrumento, em um outro dia,
reiniciamos o jogo. Posicionei-me em uma cadeira, de costas para o grupo, e iniciei
a música.
65
A atividade foi realizada de forma tranquila, com a participação de todos. A
única ocorrência, motivo de reclamações de todo o grupo foi esta: um aluno lançava
a bola longe do alcance do amigo com o intuito claro de provocar o erro.
Uma aluna comentou:
- Professor, é sempre ele... tira ele do jogo.
Provoquei o grupo:
-O que vocês acham que devemos fazer, quando alguém não está agindo da forma
como o grupo espera?
Um silêncio, que não acontecia com frequência no grupo, tomou conta do
ambiente por alguns segundos até que foi quebrado pelo aluno que estava sendo
alvo das acusações:
- Professor, eu vou me comportar.
Respondi ao aluno:
- Eu acredito que você poderia conversar com o grupo. Não acho que você deva se
preocupar com seu comportamento, antes precisamos saber como você se sente
dentro da turma, se algo o está incomodando.
O aluno refletiu por alguns instantes e disse:
- Eu fico irritado com eles, porque são muito lerdos.
O comentário provocou algumas exclamações no grupo. Uma menina falou:
- Por que você não muda de escola, então?
O aluno respondeu:
- Muda você...
66
E xingou a colega.
Percebi neste momento que estávamos indo para um caminho que não era o
desejado. Pedi calma para todos e tentei explicar que é natural discordar dentro de
um grupo, porém, o importante é respeitar o ponto de vista de cada um e debatê-lo,
sem ofensas, até chegar a um ponto comum que seja bom para todo o grupo.
Sabemos que o sentido das aprendizagens é único e particular na vida de
cada um e que inúmeros são os fatores afetivo-emocionais que podem
impedir o investimento energético necessário às aquisições escolares.
(BOSSA, 2000, p. 18).
Um dos pontos mais difíceis, em especial no ambiente escolar, é procurar
recriar-se a cada dia, pautando as ações na ampla variedade humana e sua
capacidade de enxergar com olhares diversos o mesmo acontecido.
4.1.17 Um dia para relaxar – 20/05/2009
As diversas possibilidades dentro de uma aula de Educação Física, no caso,
no Ensino Fundamental, são animadoras por abrirem um leque de ações para
abordar o mesmo assunto de inúmeras formas.
Depois do ocorrido no dia anterior, acreditei ser a hora de dar uma parada. O
meu objetivo era convidar os alunos para um piquenique, para o que seria
necessário saber se estavam dispostos.
Antes de ir para a sala de aula, busquei na escola uma tabela nutricional com
informações sobre diversos grupos de alimentos. Organizei 17 sacolinhas,
colocando em algumas apenas alimentos de alto valor nutritivo e nas outras,
alimentos de baixo valor nutritivo.
Ao chegar à sala de aula a curiosidade das crianças era tanta que quase
descobriram o conteúdo das sacolas, antes mesmo que eu pudesse lhes falar.
67
Quando perguntei se topariam fazer um piquenique, a aceitação foi unânime.
Sem perda de tempo, saímos da sala e os alunos apontaram o gramado como o
local ideal para nosso lanche.
Cada um recebeu sua sacolinha e começou a verificar o conteúdo. Pedi que
não começassem nada antes que todos estivessem acomodados e pudéssemos
conversar um pouco. Então, iniciei a comanda:
- Cada um pode tirar o que tem na sacolinha e colocar a sua frente.
Neste momento, todos tiveram contato pela primeira vez com o que havia na
sacola do outro e surgiram diversas exclamações no sentido de trocar aquilo que
não agradava. Foi, então, que expliquei o que fazer antes de comermos:
- Esta é uma pirâmide que nos mostra quais grupos de alimentos devemos comer e
de que forma podemos combiná-los. Vocês podem trocar os alimentos até
conseguirem montar uma sacola ideal com suas necessidades alimentares.
Foi um momento muito interessante em que os alunos descobriam coisas
novas sobre os alimentos.
Após muitas discussões, trocas e organizações, os alunos se deram por
satisfeitos e pudemos iniciar a parte mais esperada com a comanda:
- Agora podemos comer. Se alguém quiser trocar algum alimento, pode fazer.
Fiquem à vontade!
A troca realizada nesta atividade, por mais despretensiosa que pareça, é mais
um exercício de prática cooperativa onde os educandos relacionam-se, expressam
seu ponto de vista ou vontades, ouvem e respeitam as manifestações dos outros.
Como explica MACHADO (2008), o professor deve repensar suas atitudes e
passar a ver o aluno como uma pessoa capaz de relacionar-se com o outro e trocar
experiências e interpretações de suas vivências.
68
4.1.18 Pingabola - 26/05/09
A esta altura partimos para o jogo Pingabola: com os alunos formando dois
grupos, os jogadores fazem rodízio entre as equipes.
Fomos à quadra e, por sorteio, formamos duas equipes.
No jogo, uma equipe lança a bola para cima e a bate para o outro lado. A
equipe adversária pode deixar a bola quicar no chão uma vez e deve rebatê-la para
o outro lado.
A atividade correu normalmente apesar de algumas discussões que podemos
considerar normais em qualquer atividade esportiva. Ao final, os alunos saíram
conversando, cada um contando seus feitos.
A atividade deste dia possibilitou observar as crianças desenvolvendo uma
atividade cooperativa, porém, em lados opostos, em algum momento do jogo, o que
me deixou apreensivo. Logo depois, veio a satisfação ao perceber que era um jogo
entre amigos, acontecendo de forma saudável.
De acordo com MACHADO (2009), as relações interpessoais são importantes
em qualquer ambiente, para que se torne inclusivo e, no momento de aprendizagem,
para que ocorra troca de experiências com respeito mútuo.
4.1.19 Registros - 27/05/2009
Como de costume, fizemos os registros das atividades do dia anterior,
debatendo os acontecimentos e as ações de cada um.
Um menino comentou as relações do grupo:
-Eu acho que a gente está bem melhor.
Outro completou:
- Está bem melhor assim, antes era ruim, todo mundo ficava xingando.
69
Parece que os alunos estavam percebendo melhor o que era cooperação e
como agir ou reagir dentro do grupo.
A capacidade de discernimento liga-se, por sua vez, à reflexão e ao
conhecimento, que se constituem em pressupostos, portanto, do exercício
da cidadania. O direito à cultura, à informação, ao debate público pode ser
considerado como pré requisito para a tomada de decisões que dizem
respeito diretamente ao bem-estar da coletividade, como é o caso, por
exemplo, da escolha daqueles que, pelo voto, serão investidos do poder de
governar ou de legislar (CARMO, 1999, p. 21).
A valorização das ideias e propostas dos alunos deve ser uma prática diária
do professor a fim de aprenderem a debater, questionar, conhecer e aceitar as
opiniões alheias.
4.1.20 Volençol - 02/06/2009
Para esta atividade pedi que os alunos trouxessem, de casa, lençóis ou
cobertores.
A execução da atividade é simples. Formamos várias equipes, cada uma com
três ou quatro participantes. Cada equipe segura um cobertor ou lençol e procura
mantê-lo aberto na altura da cintura com uma bola no meio. Fazendo um movimento
em conjunto, a equipe tenta lançar a bola para o outro time.
O objetivo é fazer com que a bola dê uma volta em torno da quadra sem cair.
Se a bola cair, volta à primeira equipe e reinicia-se o percurso.
O jogo foi gratificante, todos participaram e se empenharam ao máximo para
que cumprir o objetivo.
Muitos alunos, com explicações e orientações, procuraram ajudar as equipes
a realizarem a atividade.
Ao relacionar-se com o outro de forma respeitosa e construtiva, a criança
exercita sua capacidade de agir em sociedade, o que mostra a importância dos
jogos cooperativos para o bem-estar da comunidade, como apontam Batista e
Osborne (2010).
70
A capacidade de intervir e aceitar intervenções, com respeito e sem
agressões, deve ser trabalhada pelo professor. Quanto aos sujeitos desta pesquisa,
a cada atividade, percebia-se que evoluíam nesse aspecto.
4.1.21 Reflexão - 03/06/2009
Discutimos o comportamento dos alunos que passaram suas experiências
positivas aos colegas de outra equipe, para obter êxito na realização da atividade.
Os alunos estavam satisfeitos com a realização da atividade e com o
comportamento de seus amigos.
Para BOSSA (2000), interferem na aplicação de energias nas atividades
escolares fatores afetivos, emocionais e outros. Quanto mais tranquilo e agradável
for o relacionamentos entre os integrantes do grupo, mais fácil será a convivência e
mais proveitosa a aplicação nos estudos.
4.1.22 Reunião de pais – 09/06/2009
Para o encerramento das atividades, organizei um café para os pais, alunos,
professores, funcionários e gestores. Para que o café não parecesse um prêmio aos
que “resistissem” à reunião, providenciei para que fosse oferecido antes das
discussões.
Na sala de reunião, com as cadeiras dispostas em círculo, iniciei a conversa:
- Alguém pode apontar se percebeu alguma mudança no comportamento das
crianças fora do ambiente escolar?
Algumas mães se manifestaram reforçando aquilo que já haviam falado na
primeira reunião: em casa o comportamento de seus filhos era de uma criança
tranquila e participativa, porém, todas afirmaram que as crianças comentavam,
71
muitas vezes, em casa, sobre o ocorrido nas aulas de Educação Física e a forma
agradável como realizaram as atividades.
- Agora é jogo cooperativo pra cá, Educação Física pra lá!
As mães afirmaram que os alunos passaram a ter respeito muito maior pelas
aulas de Educação Física, porém, seu comportamento em outros ambientes
escolares permanecia o mesmo, repleto de inúmeras reclamações das professoras,
inspetora e coordenadora.
Em conversas com a professora da sala, esta aponta e registra em seu
Relatório uma evolução nos relacionamentos da turma.
Expliquei que a variação de comportamento também foi notada e discutida
pelo grupo.
Perguntei para as mães se a convivência familiar era baseada na
cooperação:
- As tarefas em casa são divididas de acordo com as possibilidades de cada um? As
decisões são tomadas em conjunto com as crianças?
Esses questionamentos levaram as mães a refletirem sobre suas ações.
Algumas afirmaram que seus filhos se expressam livremente em casa:
- Lá em casa o meu filho pode falar à vontade.
Outra mãe comenta:
O meu fala até demais, ele se mete muito na vida dos adultos.
Parece que as crianças não eram convidadas a opinarem nas decisões da
família e suas idéias e propostas não eram levadas a sério.
Após alguns apontamentos e promessas de mudar o olhar sobre a
participação das crianças nas decisões da família, convidei os presentes para uma
atividade em conjunto na quadra.
72
4.1.23 Futebol cooperativo com as mães
Para encerrar nossas atividades, realizamos o futebol cooperativo com as
mães.
Coube aos alunos ensinar as suas mães as regras da atividade.
O futebol cooperativo desenrolou-se de forma tranquila, os alunos
demonstraram interesse em explicar cada passo do jogo e as mães se mostraram
entusiasmadas com a oportunidade de vivenciar com as crianças este momento de
descontração.
O ponto mais gratificante ficou por conta do círculo que formamos. Ao final do
jogo, uma mãe sugeriu que fizéssemos uma oração em agradecimento pelo
momento.
Lembrei a todos que se tratava de um momento de agradecimento e alegria,
sem vínculo com qualquer religião ou crença. Todas participaram de forma
espontânea, algumas não escondendo sua emoção, como a mãe que iniciou a
atividade:
- Que todos nós que estamos aqui tenhamos luz nas nossas decisões, que estas
crianças entendam a luz divina da vida e que todo mundo aprenda a compartilhar e
pensar no próximo.
Neste momento, vivenciamos um ambiente familiar: todos em pé, mãos
dadas, cabeça baixa, inclusive as crianças, uns segurando as mãos dos outros, um
aperto cordial e caloroso, como de verdadeiros amigos.
Ao término dos agradecimentos e da oração, um clima de paz e tranquilidade
perpassava o ambiente. Com o intuito de não interromper momento tão agradável e
importante, iniciei os cumprimentos com um aperto de mãos e um abraço, o que foi
seguido e imitado por todos.
Este último encontro evidenciou a necessidade da participação mais ativa da
família na escola, o que pode proporcionar momentos ímpares de aprendizagem e
troca de experiências.
Com o término da pesquisa, retirei-me da escola para atuar como professor
coordenador em outra unidade escolar, porém, a coordenadora pedagógica
73
continuou suas observações sobre as relações dos alunos e de todos os envolvidos
na pesquisa, como relata a seguir.
4.1.24 Como a professora da sala PIC via seus alunos
Os alunos matriculados na sala PIC são crianças que, mesmo frequentando
as séries iniciais, não conseguiram se alfabetizar.
Na sala em que lecionei havia 18 alunos, todos com baixa autoestima,
extremamente preconceituosos consigo mesmos e agressivos.
São crianças mal assistidas, com problemas familiares gravíssimos, que
transferiram para a escola toda a violência sofrida em casa.
Dentro da sala, por várias vezes, presenciei atos de agressão física e verbal
entre os alunos, e qualquer pequena confusão que normalmente é resolvida por
meio de conversa era motivo de brigas e discussões, onde os alunos utilizavam
palavreado de baixo calão e não respeitavam o ambiente escolar.
Vivenciei também alunos apossando-se de objetos alheios, chegando ao
ponto de um deles roubar o meu telefone celular, que eu deixava sobre a mesa para
ver as horas.
Quanto ao aprendizado, percebia pouco ou nenhum interesse por parte dos
alunos, que muitas vezes dispersavam-se e não se concentravam para realizar as
atividades.
Senti muita falta de acompanhamento familiar destes alunos, pois algumas
crianças passavam a noite fora de casa e chegavam à escola cansados, exalando
bebida alcoólica, fumaça etc. Outras necessitavam de acompanhamento médico e
psicológico e, por mais que eu encaminhasse esses casos aos órgãos competentes,
nunca obtive uma devolutiva dos pais ou responsáveis.
Cresci muito lecionando para estes alunos. Foi cansativo e ao mesmo tempo
gratificante. Aprendi que aprendizagem anda de mãos dadas com afetividade e é
preciso ser bem mais do que apenas professora.”
74
4.1.25 Relatório-diagnóstico do desempenho escolar da turma: 4ª série PIC –
2009 - 2º semestre, após o término da pesquisa, na visão do coordenador
pedagógico
Itens observados:
Hábitos e atitudes;
Socialização e relação eu/outro;
Participação durante as atividades;
Trabalho em grupo, divisão de tarefas;
Respeito a limites e regras;
Capacidade de seguir rotina;
Parecer da Turma
É uma turma que se mostrou bem agitada no início do ano por sua dificuldade
em ouvir o que era proposto pelo professor e também pela individualidade de cada
um, necessitando a retomada de regras diariamente, para que fosse construída uma
relação de respeito entre todos.
Alguns alunos encontravam dificuldades nos relacionamentos interpessoais e
em acompanhar a rotina diária da turma, demonstrando enfoque em si mesmos todo
o tempo. Esse egocentrismo dificultou a partilha de materiais e espaços e mesmo a
comunicação com os companheiros.
Com
as
práticas
cooperativas
nas
aulas
de
Educação
Física
os
alunos tornaram-se, em sua maioria, nas atividades propostas pelo professor, bem
autônomos e gradativamente solidários com os colegas.
Já conseguem compreender que é preciso parar e escutar tanto o professor
como os outros colegas. Também já estão adaptados à rotina diária, mas entendem
quando acontece algum imprevisto.
75
4.1.26 Os professores falam sobre a pesquisa
Na maioria dos momentos, percebi resistência muito grande por parte do
grupo de professores e gestores em se manifestar. Mais de uma vez, ao perguntar
aos profissionais sobre sua visão a respeito da pesquisa, ouvi:
- Você não vai colocar meu nome aí, né?
Mesmo após explicar ao professor que suas falas e identidade estariam
protegidas e ninguém teria acesso ao conteúdo do diário, as informações eram raras
e breves, como esta:
- Eu acho que não muda o comportamento, tem que ser trabalhado em casa.
Outros professores afirmaram:
- Eu acho interessante, sim, novas formas de abordagens, só devem somar.
- Eu acredito que com essa melhoria nos relacionamentos do grupo todos nós
vamos ganhar.
Os professores participaram de todo o processo, em alguns momentos de
forma mais ativa, em outros, apenas observando. O medo do novo aponta a
necessidade de uma nova visão do professor no que tange às ações a serem
pensadas e desenvolvidas no ambiente escolar.
76
CONCLUSÕES
Este trabalho teve como objetivo investigar se os jogos cooperativos
contribuem para a melhoria do relacionamento entre os educandos da sala do PIC e
para a constituição de espaços inclusivos. Esperávamos que os jogos cooperativos
pudessem fortalecer o espírito de grupo, diminuir as agressões físicas e verbais;
criar um ambiente propício para a aprendizagem, elevar a autoestima dos
educandos e contribuir para a constituição de espaços inclusivos.
Ao iniciarmos os trabalhos, tínhamos como hipótese que poderíamos
modificar espaços de conflitos constantes em espaços onde todos se respeitassem,
aceitando a pluralidade e, mais do que isso, percebendo a necessidade da
convivência em grupo e a importância da participação de cada um para a construção
de momentos agradáveis de aprendizagem.
Sempre com o intuito de promover a inclusão, este trabalho levantou
questões, como as ações típicas da disciplina Educação Física dentro do ambiente
escolar. Apoiados em vários estudiosos, como DAOLIO (1996). LOVISOLO (2001) e
MATTOS (2006), percebemos que a Educação Física, apesar de grandes evoluções,
ainda procura acomodar-se no campo escolar e extinguir antigos hábitos para
tornar-se uma aula mais agradável, que contribua para a evolução educacional do
grupo.
Procuramos averiguar também se a aplicação jogos cooperativos para um
grupo de educandos da sala do Projeto Intensivo no Ciclo (PIC) poderia auxiliar na
construção de um espaço inclusivo, concluindo que, no espaço da disciplina
Educação Física, colaboraram para o desenvolvimento do respeito dos alunos entre
si
A aplicação dos jogos cooperativos durante as aulas de Educação Física se
mostrou eficaz para uma mudança de postura dos alunos, contribuindo para a
diminuição de ações agressivas na turma, para a criação de vínculos entre eles,
constituição de espaços inclusivos.
Durante a aplicação dos jogos, ficou clara a necessidade de um olhar
diferenciado sobre cada educando, olhar que, na escola em que foi desenvolvida a
pesquisa, ainda não contempla as necessidades individuais.
77
Quanto às políticas que procuram mover a inclusão, não se nega a boa
intenção, porém, ações que não contemplam a equidade, mas sim a igualdade,
podem causar reações desastrosas na sociedade, neste caso, na comunidade
escolar.
A princípio, parece claro que, mesmo nos dias em que vivemos, quando os
discursos primam pela igualdade, talvez inconscientemente, valorizamos e
repetimos ações exclusivas.
Uma constatação relevante foi a grande mudança no comportamento das
crianças, quando os pais estiveram presentes na escola. Nesses momentos, todos
pudemos vislumbrar uma postura de alegria e, principalmente, respeito pelos
colegas na realização das atividades.
O material coletado e as observações durante os trabalhos apontam um
distanciamento considerável entre professores e pais, o que se refletiu nas reuniões,
momento em que os professores se posicionaram de um lado da sala e os pais do
outro.
Em seus discursos não foi difícil perceber que alguns professores enxergam
os pais como adversários a serem mantidos longe do ambiente escolar. Por outro
lado,
alguns pais viam o convite para ir até à escola como um castigo a ser
suportado, como uma obrigação legal.
As constatações a respeito das relações entre pais e professores tiveram
como base a observação, além de conversas com os envolvidos que pediram para
que o conteúdo não fosse publicado no trabalho.
A pesquisa aponta a clara necessidade do envolvimento da família com o
ambiente escolar, aspecto que deve ser mais bem trabalhado pela escola, visando a
um acolhimento dos familiares, ao contrário das maçantes e cansativas reuniões de
pais, com o objetivo de mostrar como seus filhos não foram bem educados.
A pesquisa aponta, também, a necessidade de um olhar mais profundo sobre
as relações de todos os envolvidos no processo educacional, para que o ambiente
escolar se torne uma extensão de sua casa, o que trará mais segurança para a
criança.
Acreditamos que os jogos cooperativos podem ter maior eficácia com grupos
maiores, que envolvam toda a comunidade escolar, para a aprendizagem e
exercícios nas mais variadas situações vivenciadas pela criança.
78
Para a efetivação de uma educação realmente de qualidade, é preciso confiar
aos envolvidos diretamente com o processo, ou seja, a comunidade escolar, as
rédeas da escola. Uma escola de qualidade deve ser construída pelos que a cercam
e por aqueles que vivem seu interior.
Quando aberto um espaço, dentro da escola, onde todos podem se
manifestar livremente e respeitam o outro, as relações melhoram e fazem fluir
momentos inclusivos, ricos de aprendizagem que refletem a mais pura sabedoria
manifestada pelas relações humanas.
Transformar os ambientes escolares em espaços de criação permeados pela
cooperação é a garantia do direito de todos se manifestarem de acordo com suas
crenças e experiências, expressando física e verbalmente a bagagem que trazem
consigo e que fazem parte de sua formação como seres integrantes da sociedade.
79
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