O CASAMENTO NA FREGUESIA MADRE DE DEUS DE PORTO ALEGRE: A POPULAÇÃO LIVRE E SUAS RELAÇÕES MATRIMONIAIS DE 1772-1835 DENIZE TEREZINHA LEAL FREITAS Palavras-chave: Casamento; Porto Alegre; Registros paroquiais; Demografia Histórica Resumo A presente comunicação procura investigar as principais características referentes à população livre que casa na Paróquia Nossa Senhora da Madre de Deus de Porto Alegre entre 17721835. Essa apresentação pretende destacar o papel das escolhas matrimoniais na constituição populacional porto-alegrense durante o final do século XVIII e meados do século XIX. Por meio da análise quantitativa dos registros paroquiais de casamentos verificamos aspectos significativos sobre as relações matrimoniais, tais como: a sazonalidade do evento, índice de legitimidade dos nubentes, etc. Desta forma, procuramos evidenciar como se deu o processo de mobilidade através do processo de formação da Freguesia e estabilidade populacional à medida que a localidade transformava-se em Vila e, posteriormente, na cidade de Porto Alegre. Trabalho apresentado no XVII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, realizado em Caxambu- MG – Brasil, de 20 a 24 de setembro de 2010. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em História e bolsista Milton Valente – UNISINOS – São Leopoldo – RS. 1 O CASAMENTO NA FREGUESIA MADRE DE DEUS DE PORTO ALEGRE: A POPULAÇÃO LIVRE E SUAS RELAÇÕES MATRIMONIAIS DE 1772-1835 DENIZE TEREZINHA LEAL FREITAS Introdução O presente estudo pretende analisar as características da população livre que casa em Porto Alegre entre 1772-1835 compreendendo a importância do casamento, enquanto sacramento, mas também como um evento civil, sobretudo, devido ao fato dos registros paroquiais da Igreja Católica até o início do período republicano terem um caráter oficial na ausência do registro civil, iniciado no final do século XIX. Além disso, as uniões sacramentadas pelo pároco significavam a partir da institucionalização do casamento, a criação de uma nova família, e a partir daí, simbolizavam um código de conduta e uma série de preceitos a serem seguidos antes e depois do ato matrimonial. Segundo VAINFAS (1992) a sacralização do matrimônio tinha como objetivo ―remediar‖ a incapacidade do celibato e normatizar as condutas de reprodução. Neste sentido, procuramos através dos assentos de casamento da localidade responder como, quando, quem e com quem os noivos e noivas porto-alegrenses contraiam matrimônio. Sendo assim, a análise realizada tem como base 2.884 assentos de casamentos de casamentos referentes ao período correspondente à fundação da freguesia (1772) até o ano de 1835 quando teve início a Revolução Farroupilha (1835-1845). Os registros contemplam os atos matrimoniais celebrados pela Paróquia Nossa Senhora Madre de Deus de Porto Alegre correspondentes à população livre que opta pelo casamento. Este estudo busca identificar de que forma o casamento fazia parte do cotidiano da população livre que optava pelo sacramento, bem como, identificar as diferentes redes sociais traçadas pelos sujeitos a beira do altar. 1 - O SIGNIDICADO DE CASAR O casamento tornou-se ao longo do final da Idade Média e durante o período Moderno um importante veículo encontrado pela Igreja para legitimar as uniões entre homens e mulheres, conforme revela GUIMARÃES (1999). Para a Igreja Católica o matrimônio se Trabalho apresentado no XVII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, realizado em Caxambu- MG – Brasil, de 20 a 24 de setembro de 2010. Digite aqui a filiação institucional do(a) primeiro(a) autor(a). 2 transformará em um dos mais importantes meios de controle da população cristã. Isto é, ao transformar-se em sacramento, o matrimônio passou a marcar mais uma etapa na vida dos fiéis e, sobretudo, permitiu a Igreja influenciar com mais ênfase na vida familiar. Além disso, conforme BOTELHO (2004) as escolhas matrimoniais variavam-se conforme os tipos de famílias dos nubentes e do status dos mesmos. Segundo o autor: O matrimônio é um momento crucial dentro das estratégias de reprodução social. Ao estabelecer laços entre grupos familiares, ele torna-se o garantidor da perpetuidade de tais grupos ao mesmo tempo em que amplia as redes sociais dos indivíduos envolvidos. Em razão dessa sua enorme importância, as decisões em torno da escolha dos nubentes sempre recaíram sobre o grupo familiar mais amplo. Definir o cônjuge de um filho ou uma filha era uma tarefa decisiva para a família, e não podia ser deixada sob responsabilidade dos jovens. No cálculo matrimonial entravam diversas variáveis, ligadas sobretudo às possibilidades de manutenção do status quo ou de ascensão social do grupo.(BOTELHO, 2004, p. 2) A partir do Concílio de Trento (1543-1563), a Igreja Católica definiu uma postura mais firme quanto às normas e regras que regiam o mundo católico. Afirmando-se como uma reação direta a Reforma Religiosa que se expandia pela Europa, foram renovadas e reforçadas inúmeras questões referentes à formação e atuação eclesiásticas, dentre elas, destaca-se a sacramentação do matrimônio. Segundo GUIMARÃES (1999), o casamento passou por algumas transformações: A renovação do matrimônio feita pelo Concílio de Trento passou pela instituição deste acto como um sacramento religioso. E foi esta sacralização do casamento que o tornou acto e assunto exclusivo da competência eclesiástica. Porque se tratava de um sacramento, foram definidas as regras de sua ministração (GUIMARÃES, 1999, p. 56) Com isso, a legislação matrimonial constituída e normatizada pelo Concílio de Trento estabeleceu uma série de preceitos a serem rigorosamente seguidos pelos párocos, nubentes e testemunhas do casamento, sob pena de excomunhão (na maioria dos casos, e/ou degredo da localidade). Segundo GUIMARÃES (1999), dentre as regras indispensáveis para a realização e validade do casamento, destacam-se: a obrigatoriedade da presença do pároco e, não menos, que duas ou três testemunhas, as denunciações ou banhos, o reforço do consentimento paterno, o consentimento mútuo dos contraentes, a disciplina do clero, a obrigatoriedade da abertura de um livro de registros dos matrimônios e a delimitação dos tipos de impedimentos. Segundo VAINFAS (1992), as questões envolvendo as uniões estáveis e instáveis estão em debate desde o mundo romano, isto é, desde as origens da cristandade. Conforme o autor enfatiza, o casamento servirá como uma espécie de ―remediação‖ para todos aqueles que não conseguissem manter-se no estado entendido como o mais próximo de Deus, ou seja, a castidade, ou melhor, a incorrupção carnal do corpo. Todavia, para além das demandas teológicas, o casamento irá adquirir um papel de destaque na atuação da Igreja durante o período Moderno. Conforme GHIRARDI (2004) o matrimônio tornar-se-á um dos principais meios da Igreja conhecer e influenciar nas vidas familiares. Para GHIRARDI (2004) os sistemas implantados na América Espanhola tornam-se bastante equivalentes aos encontrados na América Portuguesa, pois salienta que o matrimônio e as famílias são elementos ímpares para a organização e construção da ordem social. Para FIGUEIREDO (1997) com a valorização dos sacramentos e a expansão do cristianismo aliados aos interesses do Império luso, constituíram o cenário da atuação do denominado Padroado na América Portuguesa. À medida que intensificava-se a mão da Igreja 3 na formação das Freguesias e Vilas ao longo do território tupiniquim, concomitantemente, estendiam-se os interesses de colonização e expansão das áreas meridionais por parte da Coroa Portuguesa. Além disso, a ordenamento das populações sob a organização eclesiástica beneficiava o controle da população por parte do Império, pois esses párocos mais do que representantes religiosos, atuavam como, para e conforme determinações do D’El Rei. 2 - QUANDO CASAVAM OS FREGUESES DA MADRE DE DEUS DE PORTO ALEGRE? Para NADALIN (2004) os deslocamentos migratórios impulsionam momentos de mobilidade geográfica de acordo com as necessidades individuais e/ou coletivas de cada grupo populacional que visa, em grande medida, deslocarem-se em função de áreas que apresentem maiores possibilidades de melhores condições econômicas, sociais e/ou políticas e, posteriormente há o processo inverso, isto é, a estabilidade, no qual à medida que pessoas vão adaptando-se as novas localidades a conseqüentemente a fixação dos mesmos. Observando o gráfico abaixo se pode constatar que houve um aumento considerável no número de casamentos por décadas. Desta forma, podemos constatar que os casamentos aumentam em função do próprio crescimento e desenvolvimento da localidade, isto é, as gerações seguintes tendem a multiplicar-se, somando ainda, evidentemente, as novas ondas migratórias que vem compor o quadro populacional da Província. Com isso, entendemos que ao longo das primeiras décadas do século XIX a população porto-alegrense tende a estabilizar-se conforme vão sobrepondo-se as gerações subseqüentes ao período de formação da localidade. Tabela 1: Distribuição dos casamentos entre 1772-1835 Distribuição de Casamento por décadas N° % 1772-1779 94 3% 1780-1789 162 6% 1790-1799 284 10% 1800-1809 488 17% 1810-1819 498 17% 1820- 1829 772 27% 1830-1835 586 20% 4 Total 2884 100% Fontes: Registros Paroquiais da Freguesia Nossa Senhora Madre de Deus de Porto Alegre (1772-1835) 3 - A SAZONALIDADE DOS CASAMENTOS De acordo com o Capítulo X, Sessão 24 do Concílio Tridentino é proibido a realização de matrimônio durante os ditos ―tempos proibidos‖, isto é, os períodos correspondentes à quaresma e ao advento. Segundo as normativas do concílio deveriam ser evitadas as celebrações de casamento desde a quarta-feira de cinzas até o oitavo domingo de Páscoa e, durante o período do advento, isto é, correspondente as quatro semanas que antecedem o natal. Vale salientar que segundo as normativas, o matrimônio é ―cousa santa e se deve tratar santamente‖ (p.27), portanto podemos constatar que a sacralização do matrimônio buscava atender ao emprego do que estava previsto nas normativas e, principalmente, da ritualização do casamento. Todavia, por mais que a Igreja buscasse a plenitude da aplicação das normativas, as adaptações e remediações a realidade luso-brasileira flexibilizaram muito as normativas, tornando nem sempre a prática um reflexo da teoria. As exceções praticadas tornam-se bons exemplos, pois encontramos casamentos nos quais os nubentes contraem matrimônio, porém não recebem as bênçãos. Segundo ANDREAZZA (2009), outros fatores interfeririam na escolha da data de casamento, para além da época da Quaresma e do advento e/ou outros interditos religiosos para a autora: No que se refere à celebração das núpcias, a legislação matrimonial não interditou qualquer data. Portanto, a distribuição desigual dos casamentos ao longo do ano não se associa a questões canônicas que fundamentam o consórcio conjugal, devendo-se, assim, apenas ao seu calendário litúrgico, para o qual a instituição recomenda respeito. Dentre os autores que ocupam com essa questão, François Lebrun é um dos poucos que menciona que o direito matrimonial clássico teria proibido casamentos em tempos feriarum, qual seja, no Advendo e na Quaresma, considerados períodos de mortificações e, portanto, inadequados aos festejos que tradicionalmente acompanham as bodas.(ANDREAZZA, 2009, 144 p.) Gráfico 1: Distribuição dos casamentos por mês 5 de z v no t ou ag os to se t ho ju l ju n o il m ai ab r m ar fe v jan 100% 80% 60% 40% 20% 0% -20% -40% -60% -80% -100% Fontes: Registros Paroquiais da Freguesia N. Sra. Madre de Deus de Porto Alegre (17721835) Observando o gráfico correspondente à distribuição de casamentos por mês pode-se identificar que a população livre que contraia matrimônio procura atuar de acordo com os interditos religiosos. Quanto aos casamentos realizados durante os ditos ―tempos proibidos‖ o pároco salienta que os contraentes não receberam as bênçãos. Assim a partir do gráfico acima podemos constatar que os casamentos realizados em Porto Alegre ascendem consideravelmente de abril até novembro onde observamos a maior concentração de casamentos. Durante os meses de dezembro e março a um declive no número de casamentos, voltando apenas a elevar-se sutilmente no mês de fevereiro. É interessante salientar que a estratégia do pároco e dos contraentes porto-alegrenses é optar pelos casamentos no período anterior ao advento e/ou retardar as celebrações para o período posterior a quaresma, isto é, a partir de abril. Além disso, devemos levar em consideração a própria distribuição das atividades econômicas que ocorrem na localidade, tais como: período da colheita, atividades comerciais, etc. que possam interferir diretamente no calendário matrimonial influenciando na decisão do casamento muito mais do que o próprio calendário de interditos religiosos. Comparando a distribuição de casamentos por mês para outras regiões percebemos que este comportamento também é equivalente para outras regiões. Para a Capitania das Minas Gerais, LOTT (2008) a partir de seus estudos referentes à Freguesia Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto entre o período de 1804-1839, destaca que a concentração dos casamentos na localidade ocorre durante o mês de fevereiro, isto é, a estratégia dos fregueses de Ouro Preto era optar pelos casamentos entre os interditos religiosos, isto é, caso as celebrações não pudessem ocorrer durante os outros meses do ano, os casamentos tendiam a serem celebrados no mês de fevereiro. 6 No caso de Sorocaba, importante interposto comercial dos tropeiros na Capitania de São Paulo, os estudos de BACELLAR (2001) apontam que a predominância dos casamentos em determinadas épocas do ano podem significar para além da obediência do calendário religioso uma adaptação às atividades produtivas e/ou comerciais. No caso da Vila paulista, o autor identificou que o acentuado número de casamentos realizados no mês de fevereiro correspondia ao período e, que se realizavam as feiras comerciais, isto é, representavam uma oportunidade importante para fazer negócios no âmbito material e imaterial. Segundo BACELLAR (2001): Em outras palavras, este era exatamente o início do período de maior abundância de gêneros de primeira necessidade, momento em que as famílias renovavam seus fôlegos, concretizavam eventuais negócios com excedentes, e, portanto, estavam mais preparadas para lançar seus filhos na vida autônoma e para promover as inevitáveis festas nupciais (BACELLAR, 2001, p. 77). No caso da Madre de Deus de Porto Alegre podemos através das observações do viajante Saint-Hilaire que a regimentos das plantações de trigo podem ter sido um dos fatores a ter contribuído para que os casamentos ocorrerem entre os interditos religiosos, sobretudo, durante o mês de fevereiro, pois segundo seu relato: Depois do dia 21 (julho), o minuano cessou; o tempo está bem calmo, o céu sem nuvens e o termômetro marca de 74° Farenheit ao meio dia. Nesta época, as chuvas caem geralmente com abundância, e os mais antigos moradores daqui não recordam de seca igual à deste ano. Ela força os agricultores a adiarem suas semaduras de trigo e as plantações de laranjeiras, que se fazem normalmente nesta estação. Colhe-se o trigo em dezembro. (SAINTHILAIRE, 2002, p. 32) 4 - COM QUEM CASA OS FREGUESES DA MADRE DE DEUS DE PORTO ALEGRE? Dentre as questões que envolvem as uniões matrimoniais destacam-se as escolhas dos cônjuges, isto é, quais são os arranjos que constituem os laços do casamento entre a população livre que casa em Porto Alegre. Tendo como objetivo caracterizar os nubentes propomos analisar quem se casa e com quem se casa na localidade. Portanto, pretendemos identificar esses sujeitos históricos através da distribuição de matrimônios por estado matrimonial dos cônjuges, a naturalidade dos contraentes e os tipos de casamentos. Gráfico 2: Distribuição de Casamentos por Estado Matrimonial dos Nubentes 7 Distribuição de Casamentos por Estado Matrimonial dos Nubentes 8% 2% 8% SOLTEITO + SOLTEIRA SOLTEIRO + VIÚVA VIÚVO + SOLTEIRA VIÚVO + VIÚVA 82% Fontes: Registros Paroquiais da Freguesia Nossa Senhora Madre de Deus de Porto Alegre (1772-1835) Observando o gráfico acima podemos perceber que 82% dos casamentos realizados eram contraídos por homens e mulheres solteiros e que apenas 18% dos demais matrimônios davam-se entre viúvos e/ou quando um dos cônjuges já contraíra as primeiras núpcias. Esses indicadores nos fornecem indícios da importância dada às primeiras núpcias e um baixa procura na prática das segundas núpcias. Segundo do Concílio de Trento, na sessão XXIV, diz sobre a Doutrina do Sacramento do Matrimônio a união sacramentada por Cristo ―confirma a unidade indissolúvel, sanctifica os esposos‖ (D’ALMEIDA, 1900, p.5), isto é, enquanto sacramento, vale a máxima de que ―o que Deus, pois juntou, não o separa o homem‖ (D’ALMEIDA, 1900, p.5). No entanto assim que o compromisso espiritual fosse terminado sob pena da morte do primeiro cônjuge e sobre a presença da certidão de óbito do mesmo as segundas núpcias poderiam ser realizadas, pois conforme as adaptações responsáveis pelas Constituições Sinodais de D. Sebastião de Matos e Noronha, GUIMARÃES (1999) aponta que: As segundas núpcias foram proibidas enquanto um dos cônjuges fosse vivo e aqueles que o tentassem seriam remetidos para o tribunal da Inquisição por esse comportamento ser considerado matéria de fé. A ausência prolongada de um dos cônjuges não era motivo válido e suficiente para a realização de um segundo matrimônio sendo estritamente necessária prova documental do seu óbito. Considerou-se ser inválido um segundo esponsal sempre que não tivesse havido a quitação do compromisso assumido com o primeiro. (GUIMARÃES, 1999. p. 110) Quanto às segundas núpcias, encontramos nas atas de Porto Alegre a reiteração do pároco em afirmar o não recebimento das bênçãos, quando a contraente fosse viúva. De acordo com VAINFAS (1989) o segundo casamento era estigmatizado, seja por questões econômicas ligadas a distribuição patrimonial entre os filhos, seja por questões direcionadas a disputa no mercado matrimonial. Embora não seja mencionada a idade dos contraentes, podese constatar que a procura pelo casamento dava-se entre solteiros e solteiros, isto é, o que nos 8 remete a ligação do casamento com a formação de novos núcleos familiares. Por isso, GHIRARDI (2004) compreende o matrimônio como um importante veículo de controle familiar, pois: El matrimonio religioso constituía, tanto para la Iglesia como para el Estado el único espacio aceptado para la reprodución. Engrendar hijos legítimos, criarlos e educarlos en el santo temor de Dios constituía el mandato asignado a los cónyuges. De acuerdo a esta interpretacíon, la sexualidad sólo era posible en le ámbito específico de la relacíon conyugal. (GHIRARDI, 2004, 63 p.) Tabela 2: Estado Matrimonial dos nubentes (Porto Alegre - 1772-1835) Estado Matrimonial N° % Noivas Solteiras 2579 89% Noivas Viúvas 298 10% Noivos Solteiros 2586 90% Noivos Viúvos 305 10% Total 2884 100% Fontes: Registros Paroquiais da Freguesia Nossa Senhora Madre de Deus de Porto Alegre (1772-1835) Conforme a tabela acima, percebemos que 89% das noivas e 90% dos noivos são ―solteiros, livres e desimpedidos‖ para contrair matrimônio. Sendo assim, podemos constatar que o matrimônio atua como um importante agente que viabiliza a formação de novos elos familiares. Para regiões como Porto Alegre, o casamento desde o início da Freguesia tornarse-ia um veículo de povoamento, posteriormente ao longo do século XIX, se transformaria num vasto e complexo eixo das mais distintas constituições famílias das mais diferentes redes sociais. Considerando que um dos fundamentos do sacramento matrimonial é a procriação, o incentivo a formação de novos casais, isto é, casamentos entre nubentes solteiros, transformar-se-ia ao longo do século XIX numa prática recorrente. Portanto podemos apontar dois fatores que contribuem para que os casamentos em sua grande maioria sejam realizados entre nubentes solteiros, isto é, o estímulo dado pela Igreja em sacramentar as uniões e controlar a população cristã e o recebimento das bênçãos. Segundo LOTT (2008) o casamento entre viúvos e/ou viúvos(as) com solteiras(os) eram vistos com ―maus olhos‖ pela Igreja, tanto que no caso de casamentos entre viúvas e solteiros e/ou viúvos, o pároco não concedia as bênçãos. 9 5 - QUEM CASA NA FREGUESIA MADRE DE DEUS DE PORTO ALEGRE? Os registros paroquiais de casamento apresentam uma série de informações, pelas quais, podemos caracterizar a população livre que casou entre 1772 a 1835. Durante este período podemos perceber dois grandes movimentos migratórios que irão interferir diretamente nas características da população livre casadoura e nas suas respectivas escolhas matrimoniais. O primeiro grande fluxo migratório dá-se com a vinda da população lusobrasileira que corresponde ao momento de formação da freguesia, posteriormente, a partir de 1824, temos a segunda onda migratória relacionada a política de estimulo a migração de homens e mulheres européias de origem germânica. Sendo assim, pretendemos caracterizar essas noivas e noivos que casaram em Porto Alegre através do índice de legitimidade dos nubentes, condição sócio-jurídica, naturalidade e ocupação. Através dessas informações disponíveis nos assentos de casamento procuraremos apresentar ao leitor quem casa em Porto Alegre durante o período de transição do século XVIII para o século XIX. 6 - ÍNDICE DE LEGITIMIDADE O casamento exerce um papel fundamental na tentativa de organização do mundo cristão e serve, muitas vezes, de extensão do braço eclesiástico na formação e manutenção das famílias. Entretanto, a ascensão ao matrimônio nem sempre se tornou uma opção unânime entre a população. Compreendendo o conceito de família como ―célula constitutiva de todo ente social, como fuente esencial de la socialización de los indivíduos, y como motor propulsor de las iniciativas individuales‖ (p.13), conforme MORENO (2004) aponta e seguindo as conclusões de FARIA (1998) referentes a pluralização do conceito de família para a realidade brasileira, podemos constatar que o matrimônio e a emergência da familiar nuclear nem sempre tornou-se um padrão correspondente a realidade das populações lusobrasileiras. Mas como identificar a parcela da população livre que não optou e/ou não conseguira acender ao altar a partir das atas de registros matrimoniais? A resposta encontra-se no fato do pároco identificar entre os nubentes a sua filiação e obviamente, indicar aqueles que são frutos de relações ilícitas, isto é, os ilegítimos – filhos de relações carnais fora dos laços sacramentais do casamento. Todavia alertamos que o cruzamento com os dados referentes às atas de batismo torna esse trabalho ainda mais enriquecedor e talvez possibilitem mostrar com maior clareza a quantidade de ilegítimos, e por conseqüência, a importância das uniões não sacramentadas pela Igreja. Com isso, através do índice de legitimidade podemos observar que o caminho até o altar não fazia parte da realidade de todos. Além disso, temos que levar em consideração a posição e as influências sociais, políticas e econômicas que colocavam os sujeitos com intenção de se casar em uma posição favorável e/ou desfavorável para contrair os votos de casamento. Sendo assim, a disposição dos interessados em casar no mercado matrimonial era fundamental. Por exemplo, GOLDSCHIMIDT (1986) salienta que no caso de casamento entre mulheres pobres com escravos poderiam significar uma importante estratégia de sobrevivência e de ―amparo material‖. Já FARIA (1998) salienta que mulheres mães solteiras 10 adquiriam um status inferior no mercado matrimonial, entretanto, com o passar do tempo, conforme suas proles iam crescendo a expectativas de casamento ia gradativamente aumentando, pois para as populações rurais, os filhos simbolizavam um importante veículo de mão de obra no sustento familiar. Vale salientar que concomitantemente ao temor contra as pressões eclesiásticas e a eminência do castigo eterno, pelas quais, poderiam estimular a legitimidade das uniões, outros obstáculos e dificuldades ao acesso ao casamento também atuaram em favor das relações ilícitas. Segundo BASSANEZI (1994): As dificuldades impostas pela burocracia e exigências da Igreja e as altas taxas cobradas pelos processos de dispensa e realização das cerimônias matrimoniais, a ausência ou displicência do clero e a situação de grande mobilidade populacional são apontadas como responsáveis pelo volume de uniões consensuais existentes. (BASSANEZI, 1994, p.383). Gráfico 3: Índice de Legitimidade: noivos e noivas Índice de Legitimidade: noivos e noivas 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% 77% 73% Noivo 17%18% 6% 9% ILEGÍTIMOS LEGÍTIMOS Noiva NÃO DECLARADOS Fontes: Registros Paroquiais da Freguesia Nossa Senhora Madre de Deus de Porto Alegre (1772-1835) De acordo com o gráfico acima podemos observar que aproximadamente 80% dos nubentes são legítimos, isto é, são frutos de relações lícitas, enquanto cerca de 20% dos contraentes compõe a parcela dos ilegítimos, o que nos permite constatar que 1/5 dos casamentos correspondem a noivos e/ou noivas ilegítimas, isto é, que nasceram de uniões não consagradas pela Igreja. Esses indicadores nos mostram que a prática do casamento dá-se muito mais na esfera da disponibilidade dos sujeitos perante o mercado matrimonial e que, a ilegitimidade não se apresenta como um obstáculo para aqueles que pretendem contrair matrimônio. Além disso, SCOTT (1999) conclui que: 11 Enquanto as instituições dominantes procuravam ―domesticar‖ a família e a vida familiar, fazendo com que elas transcorressem sob a égide das tradições consagradas a partir do Concílio de Trento, e cumprissem o seu papel de gerar bons cidadãos através do matrimônio, como pretendiam os moralistas, as condições efectivas em que viviam algumas populações tornavam virtualmente impossível que todos alcançassem aqueles ideais de vida familiar, baseados nos laços do sagrado matrimônio tal como era instituído nas diversas constituições sinodais que vigoravam no Arcebispado de Braga no período pós-tridentino. (SCOTT, 1999, p. 399) Além disso, a ilegitimidade nestes casos vem reafirmar que o casamento não era a única via de acesso a vida conjugal. No entanto, a busca pelo matrimônio por filhos oriundos de relações fora do sacramento do matrimônio indicam que a Igreja buscou atuar no sentido de tornar o matrimônio o principal veículo de acesso a formação de novos núcleos familiares. Parafraseando PRAXEDES (2004) ―a condição de nascimento, a cor e os privilégios definiam, posicionavam e distinguiam os indivíduos‖ (PRAXEDES, 2004, p. 2), não obstante, como o próprio autor enfatiza essas ―marcas‖ serão registradas nos documentos, principalmente, nas de cunho eclesiástico. Conforme SOCOLOW (2005) afirma não podemos compreender o casamento como única via de acesso ao relacionamento das pessoas. Segundo a autora a ilegitimidade é o principal indicador de o casamento é uma variável social, isto é, opta-se pelo casamento dependendo as condições sociais, políticas, culturais e econômicas são relativizadas a viabilidade de casar. No entanto, a autora indica que isso não fornecia impedimento para outros relacionamentos dentro ou fora dos laços matrimonias. Conforme a autora: Relativamente poça gente se casaba, pero esto no significaba que muchos adultos se mantivieran castos. La frecuente manisfestacíon de uniones consensuales, ―matrimonios‖ que podían durar desde algunos meses hasta varios años, es en parte responsable por los altos índices de ilegitimidad encontrado a lo largo de la América Latina Colonial (SOCOLOW, 2005, p. 32) 7 - OS CASAMENTOS MISTOS A dinâmica entre a prática e a teoria no campo da legislação canônica e da Doutrina Católica já evidenciam que as demandas sociais, políticas, econômicas e temporais influenciam diretamente os usos e costumes dos sujeitos. De acordo com PRAXEDES (2004) existe uma ―tensão dinâmica‖, isto é, existe uma ação pendular que move estratégias ora a favor, ora contra as leis em benefício próprio. Desta forma, os casamentos mistos nos são reveladores do ponto de vista social, pois nos permitem entender quais os mecanismos, os caminhos e as estratégias tecidas pelos nubentes ao escolherem seus respectivos cônjuges. Por tratar-se de livros destinados ao registro da população livre de Porto Alegre, naturalmente encontramos apenas a denominação da cor para os nubentes que são forros e/ou escravos que se casam com livres e/ou libertos. Sendo assim, criamos a categoria ―indeterminados‖ para indicar àqueles indivíduos que não são indicadas a ―cor‖. Sendo assim, podemos perceber que o padre apenas indica a cor quando seguida da condição jurídica dos 12 nubentes, por exemplo: ―pardo forro‖, isto é, essas características demarcam um lócus social, pelo qual, aquele noivo e/ou noiva pertencem. De acordo com MACHADO (2002): O Brasil escravista pode evidentemente ser caracterizado como um meio social profundamente hierarquizado — pois que se constituiu, em sua essência, a partir da diferenciação entre livres e escravos. Por uma combinação de nascimento, raça e condição socioeconômica, contudo, essa hierarquia comportava, entre o seu topo — onde predominava a população branca de cabedais, nascida em Portugal — e a sua base — onde estava à população de escravos africanos —, uma infinidade de categorias intermediárias historicamente construídas, as quais são o mais contundente testemunho da complexidade das relações que envolviam livres e escravos, e de que as categorias "livre" e "escravo" eram (e precisavam ser) a todo momento redefinidas. (MACHADO, 2002, p.18-19) Portanto, estudar a dinâmica das escolhas matrimoniais permite-nos verificar quais foram as possíveis demandas individuais e/ou coletivas, sociais, culturais, econômicas e sociais que determinaram as circunstâncias das escolhas matrimoniais. Para São Paulo Colonial, o trabalho clássico de SILVA (1984) mostrou que a sociedade de tipo hierárquica do Antigo Regime influenciou diretamente as uniões matrimoniais de casamento. O ―princípio da igualdade‖, segundo a autora foi determinante para definir as posições no mercado matrimonial segundo o ―cabedal‖ dos noivos e/ou o dote para as noivas, isto é, uma importante estratégias dos grupos abastados para preservar e/ou aumentar seu patrimônio material era garantir um ―bom casamento‖ para seus herdeiros o que significava a formação de uniões intra-grupo. Para MACHADO (2002) as escolhas matrimoniais e o próprio status dos nubentes pertencentes às camadas populares e/ou escravas serão distintas e múltiplas atendendo a diferentes períodos da vida dos sujeitos. De acordo com a autora: Em primeiro lugar destaque-se que, nesse meio social onde mesmo os indivíduos mais bem posicionados são senhores de poucos escravos, casar seus cativos com pessoas livres podia realmente ser uma das muitas estratégias possíveis para arregimentar mão-de-obra. Da mesma forma, unir-se a um escravo poderia ser uma das opções para o indivíduo livre sem eira nem beira garantir sua sobrevivência. (MACHADO, 2002, p. 19) Gráfico 4: Distribuição de Casamentos por denominação da Cor 13 Distribuição de Casamentos por denominação da Cor Indeterminados (as) & Não/Declarados (as); 24% Indeterminados Negros Pardos Não/Declarados Indeterminados (as) & Pardos(as); 5% Indeterminados (as) & Negros (as); 5% Indeterminados (as)& Indeterminados (as); 66% Fontes: Registros Paroquiais da Freguesia Nossa Senhora Madre de Deus de Porto Alegre (1772-1835) Observando o gráfico acima podemos perceber que 66% dos casamentos são entre nubentes de cor ―indeterminada‖, isto é, possivelmente sujeitos ―brancos‖, pelos quais, o pároco não determinou a cor. Podemos destacar que esse número elevado de casamentos entre indeterminados indica que a maior parcela das atas matrimoniais do livro pode vir a corresponder há uma população branca, na qual, o vigário supôs não ser necessária denominação, provavelmente devido ao status e aos condicionantes políticos, jurídicos, sociais, culturais e/ou econômico dos nubentes. Do total, temos 10% desta população livre nas quais os nubentes são identificados como pardos e/ou negros livres e/ou libertos e 24% não declarados a cor, tais indicativos nos permitem salientar que as identidades sociais e étnicas dos indivíduos eram fluidas, ou seja, alternavam-se conforme as suas capacidades de ascender e/ou declinar socialmente. Isto é, a cor define, muitas vezes, o status social dos nubentes e não, propriamente, o fenótipo dos mesmos. Por isso, MACHADO (2002) enfatiza a necessidade de perceber as estratégias matrimoniais para além da prática do ―princípio da igualdade‖ normalmente adotada pelas elites luso-brasileiras, pois: Nesse intento, reputo como especialmente estratégica a atenção ao casamento e ao concubinato entre "desiguais", pois que, no Brasil escravista e tridentino, são atos a partir dos quais se inscreve nos indivíduos algumas das principais marcas de distinção: de legítimo ou ilegítimo, de mestiço (em suas diversas e também hierarquizadas combinações) e de livre ou escravo. (MACHADO, 2002, p. 19) Tabela 3: Índice de Legitimidade por Arranjos Matrimoniais Noivo + Noiva N° 14 % ILEGÍTIMO + ILEGÍTIMA 49 2% ILEGÍTIMO + LEGÍTIMA 88 3% ILEGÍTIMO + NÃO DECLARADA 18 1% LEGÍTIMO + ILEGÍTIMA 193 7% LEGÍTIMO + LEGÍTIMA 1802 62% LEGÍTIMO + NÃO DECLARADA 241 8% NÃO DECLARADO + ILEGÍTIMA 24 1% NÃO DECLARADO + LEGÍTIMA 206 7% NÃO DECLARADO + NÃO DECLARADA 263 9% TOTAL 2884 100% Fontes: Registros Paroquiais da Freguesia Nossa Senhora Madre de Deus de Porto Alegre (1772-1835) De acordo com a tabela acima percebemos que mais da metade dos nubentes que casaram em Porto Alegre são filhos legítimos, ou seja, oriundos de relações lícitas, segundo as normativas da Igreja. Destes 62% dos arranjos matrimoniais dão-se entre nubentes legítimos o que nos fornecem indicadores de que há um estímulo a construção de novas uniões sacramentadas por parte de eixos familiares formadas por casais que sacramentaram perante a Igreja suas uniões conjugais. Entretanto o acesso ao matrimônio também se estendia àqueles cujos laços familiares não correspondiam a uma família nuclear. Segundo LOTT (2008) o Catecismo Tridentino previa como premissas para a concretização do matrimônio dever: ―ser contraído entre pessoas legítimas, ter o consentimento expresso pelos nubentes, ser consumado com a união física e formar um vínculo indissolúvel‖ (LOTT, 2008, p. 72); entretanto na prática a Igreja Católica procurou estimular o acesso ao matrimônio, muitas vezes fazendo concessões a muitos tipos de impedimentos. Isto se deve ao fato do objetivo central da Igreja ser o de regulamentar a vida cristã das populações, mas pra alcançar tal missão muitas questões elaboradas pelas Doutrinas Eclesiásticas, como as próprias denominações das Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia tiveram que ser flexibilizadas e/ou moldadas a partir da realidade encontradas nos mais distintos recantos dos domínios lusitanos. Não obstante, dentre as combinações de casamento encontramos 14% das uniões, pelas quais, pelo menos um dos contraentes é ilegítimo. Esse dado nos permite enfatizar que o acesso ao casamento apesar de expandido pela flexibilidade das normativas eclesiásticas por parte dos párocos não correspondiam a totalidade da população. Além disso, em meados do século XIX são identificados muitos casais que contraem matrimônio e legitimam seus filhos, isto é, são resultados de uniões pré-nupciais, ou seja, existentes antes do casamento, nas quais, o pároco enumera os filhos oriundos desta relação conjugal pré-sacramento e legitima os 15 nascidos desta relação. Como por exemplo, o caso de Jerônimo Francisco Vargas, viúvo de Vicência Maria Conceição que contraiu matrimônio com Maria Francisca Oliveira, viúva de Antero Jozé Pinto no dia 21 de dezembro de 1825 e ―os quais declararão os contrahentes que por este matrimônio subseqüente legitimarão; e queirão que legitimados ficasem os seis filhos de ambos havidos de nomes Tristão, Constança, Maria, Clara, Cândida e Ana‖ (3° Livro de Casamento, folha 131 v.). Além disso, não podemos ignorar que o concubinato foi por muito tempo um dos principais veículos de acesso a reprodução desde a vinda dos primeiros desbravadores das terras do Novo Mundo. A ausência de mulheres européias e a falta de estrutura eclesiástica dificultaram por muito tempo a regulamentação das uniões. Com isso, podemos perceber que o impacto da prática do casamento já desde os primórdios da colonização tornou-se um desafio, tanto para o Estado, quando para a Igreja, perante a realidade encontrada na América Portuguesa. 8 - CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir do levantamento inicial das fontes, organização das mesmas e, posterior análise esperamos ter apresentado ao leitor uma demonstração de que estamos aos poucos redesenhando algumas considerações a respeito da História de Porto Alegre. Diante da análise realizada até então podemos perceber que Porto Alegre é muito mais do que uma simples cidade construída a partir da colonização açoriana, mas sim é um local de importante fluxo populacional das mais diversas regiões da América e do exterior. Além disso, podemos perceber que é complicado obter uma conclusão a respeito das características rurais e urbanas da localidade durante a transição do século XVIII e XIX, devido principalmente, ao acentuado volume de transformações ocorridas em pouco tempo. Quanto ao casamento podemos perceber que se por um lado seu acesso não era exclusividade de toda população, o matrimônio significou uma importante via de acesso a construção e/ou afirmação de laços familiares e sociais. De acordo com os resultados encontrados nos livros de casamentos podemos constatar que a maioria dos nubentes eram filhos(as) legítimos(as) (70%), casavam-se com cônjuges solteiros(as) (82%) e eram noivos e noivas solteiros (90%) e optavam por realizar a cerimônia de casamento entre os interditos religiosos que coincidiam com o final da colheita de trigo ( Janeiro e fevereiro – aproximadamente há um aumento de 45% dos casamentos realizados neste período). De modo geral, salientamos ao leitor que pretendemos aprofundar nossa pesquisa a respeito do papel do casamento e da família no contexto de Porto Alegre e realizarmos a análise Autos de Justificações Matrimoniais, observando os tipos de impedimentos matrimoniais e, destes quais os principais encontrados na localidade. Sendo assim, até a defesa buscamos compreender melhor as possibilidades de análise qualitativa dos registros matrimoniais cruzando alguns exemplos de atas de casamentos com os respectivos Autos de Justificativas matrimoniais. A partir do levantamento inicial das fontes, organização das mesmas e, posterior análise esperamos ter apresentado ao leitor uma demonstração de que estamos aos poucos redesenhando algumas considerações a respeito da História de Porto Alegre.. Além disso, 16 podemos perceber que é complicado obter uma conclusão a respeito das características rurais e urbanas da localidade durante a transição do século XVIII e XIX, devido principalmente, ao acentuado volume de transformações ocorridas em pouco tempo. 9 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDREAZZA, Maria Luiza. Cultura e registros paroquiais. In: BASSANEZI, Maria Silvia C. Beozzo & BOTELHO, Tarcísio R. (org.). Linhas e entrelinhas: as diferentes leituras das atas paroquiais dos setecentos e oitocentos. Belo Horizonte: Veredas & Cenários, 2009. BACELLAR, Carlos de Almeida Prado. Viver e sobreviver em uma vila colonial. Sorocaba, séculos XVII e XIX. São Paulo: Annablume/ Fapesp, 2001. BASSANEZI, Maria Silvia C. Beozzo. Considerações sobre os estudos do celibato e da idade ao casar no passado brasileiro. Belo Horizonte: IX Encontro Nacional de Estudos Populacionais, 1994. Volume 1. BASSANEZI, Maria Silvia C. Beozzo. Os eventos vitais na reconstituição histórica. 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