OS BRASILEIRISMOS DE MACEDO SOARES E OS SENTIDOS DE UM LÉXICO BRASILEIRO Anderson Braga do Carmo Mariângela Peccioli Galli Joanilho (Orientadora) RESUMO O presente estudo é um dos trabalhos de iniciação científica vinculados ao projeto “Nação, Ciência e Raça no Brasil 1890/1920”, coordenado pela Prof. Dra. Mariângela Peccioli Galli Joanilho. Em pesquisas anteriores, pudemos observar que instrumentos como o dicionário são de extrema importância para conhecermos o contexto de uma época e as situações de uso e de concepção de uma língua. Em uma primeira análise, percebemos que o Diccionario Brazileiro da Lingua Portugueza, de Macedo Soares, tinha como objetivo mostrar o “falar local” do fim do século XIX, no Brasil. Houve então, a necessidade deste novo estudo, que tem como objetivo principal analisar os brasileirismos neste dicionário, para compreender a sua estrutura e o seu funcionamento. A Semântica do Acontecimento e o programa História das Idéias Linguísticas foram as teorias norteadoras deste trabalho, para que pudéssemos investigar como são estabelecidos, entre estes elementos “novos” ou “ressignificados”, os sentidos de uma língua nacional, atestando desta forma a importância deste tipo de dicionário para com a afirmação de um léxico brasileiro. PALAVRAS-CHAVE: Brasileirismos; Língua nacional; História das Ideias Linguísticas. 161 Este artigo é mais um resultado que se tem obtido em um dos trabalhos de iniciação científica que vem sendo desenvolvido dentro do projeto “Nação, Ciência e Raça no Brasil de 1890/1920”. A investigação que tem sido feita possui como objetivo perceber os sentidos que se tem atribuído à língua no/do Brasil no final do século XIX. Para tanto, o instrumento que temos utilizado a fim de compreender este objeto (a língua nacional), foi o Diccionario Brazileiro da Lingua Portugueza de Antonio Joaquim de Macedo Soares (1888). Em uma primeira ancoragem deste estudo, pudemos fazer algumas considerações sobre as intenções deste autor na construção deste espaço de enunciação. A análise realizada nas primeiras páginas deste instrumento nos mostrou que o dicionário tem como objetivo mostrar, como o próprio autor expõe no prólogo, “como se falla no Brazil e não como se escreve em Portugal”, ou seja, o lexicógrafo deixa explícito neste enunciado que existem diferenças entre a língua portuguesa do Brasil e a de Portugal. Então, houve a necessidade de realizarmos o presente estudo, que tem como objetivo analisar e compreender os brasileirismos52 presentes neste dicionário, como são as suas estruturas e como funcionam neste instrumento, para que possamos entender melhor a concepção que Macedo Soares apresenta de língua, os sentidos que são propostos para com a existência de um léxico brasileiro e a importância deste na constituição de uma língua e de um sujeito nacional. Tentaremos compreender também as condições de produção destes brasileirismos, ou seja, os fatores extralinguísticos que tanto importam para efetivarmos nossa investigação. 52 O que se concebe como brasileirismo será explicitado e melhor detalhado no interior do artigo. 162 Antes de realizarmos nossa análise, iremos explicitar alguns conceitos que utilizaremos neste trabalho. O dicionário escolhido está inserido no processo de gramatização53 do português brasileiro, então, ao fazermos o estudo deste instrumento, entraríamos em contato direto com um dos “pilares” que sustenta a língua e que, portanto, apresenta indícios da constituição física e ideológica desta. Para Orlandi (2007, p.55) “a identidade lingüística, a identidade nacional, a identidade do cidadão na sociedade brasileira traz entre os componentes de sua formação a gramatização no século XIX”, então, ao observarmos e analisarmos instrumentos como este dicionário estaremos buscando interpretar o processo de formação e sustentação da língua e o quanto esta influenciou na formação da identidade do cidadão brasileiro. O termo estabelecido por Auroux para designar a língua que apresenta as mesmas condições que o nosso português nesta época é “hiperlíngua”. Para este autor: [...] o espaço tempo, em relação à intercomunicação humana, não é vazio, ele dispõe de uma certa estrutura, conferida pelos objetos e pelos sujeitos que o ocupam. Denominaremos „hiperlíngua‟ a este espaçotempo assim estruturado. (AUROUX, 1997, p.247) Portanto, o português, ao se estabelecer em um espaço de enunciação brasileiro neste fim de século, se constitui como hiperlíngua. No entanto, com o processo de gramatização do português brasileiro, percebemos algumas diferenças nesta: 53 Gramatização é o termo elaborado por Sylvain Auroux (1992, p.65), para designar “o processo que conduz a descrever e a instrumentar uma língua na base de duas tecnologias, que são ainda hoje os pilares de nosso saber metalinguístico: a gramática e o dicionário” 163 Introduzir um novo objeto (por exemplo: um sujeito dotado de capacidades lingüísticas desviantes, um dicionário, ou ainda o meio de comunicar à distância) muda a estrutura da hiperlíngua. Os acontecimentos na hiperlíngua (aquilo a que chamamos „discursos‟) mudam igualmente (mais ou menos) a estrutura” (AUROUX, 1997, p.247) Então, como Auroux explicita, e podemos observar por meio das condições de produção do dicionário de Macedo Soares, houve mudanças nesta língua após se estabelecer em terras brasileiras e entrar em contato com outros sujeitos, outras línguas, em outro tempo, e estes fatores fizeram surgir diferenças entre as línguas. Mostrar aos leitores da época tais diferenças é o objetivo do lexicógrafo, que apresenta neste dicionário elementos resultantes do contato do português europeu com outras línguas e processados por diversos sujeitos. Estes elementos foram recentemente denominados “brasileirismos”. O dicionário de Macedo Soares insere-se na classificação de dicionário de brasileirismos. Este tipo de dicionário teve seu apogeu no final do século XIX, e o Diccionario Brazileiro da Lingua Portugueza é junto de o Diccionario de Vocabulos Brazileiros, de Beaurepaire-Rohan os maiores expoentes desta classificação. No entanto, o que vem a ser brasileirismo? Para definirmos o que vem a ser brasileirismo, nos atentaremos para a definição apresentada por José Horta Nunes: Um dos argumentos que, durante o século XIX, fortaleceram a proposição de uma língua nacional no Brasil foi o de que a língua em uso apresentava elementos específicos, que atestariam uma diferença com relação à língua portuguesa. Em que consistiam esses elementos? Podemos resumi-los em dois tipos: a) elementos de língua portuguesa que 164 passaram a ter uma significação diferente no Brasil; b) elementos provenientes de outras línguas (principalmente indígenas e africanas), que foram „incorporados‟ ao português. Ambos os tipos foram considerados dentro da categoria de „brasileirismos‟. (NUNES, 2006, p.225) Então, o que se concebe como “brasileirismos”, são os elementos da língua que apresentam um caráter outro da língua portuguesa, aqui no Brasil, ou que foram incorporados a nossa, sendo provindas de outras línguas. O que realizaremos neste estudo é a análise dos brasileirismos presentes no Diccionario Brazileiro da Lingua Portugueza. Para realizarmos tal, precisamos estabelecer alguns conceitos. Estes verbetes, designados brasileirismos, serão concebidos em nossa análise como enunciados. Devido à diversidade de empregos que o termo enunciado vem sendo utilizado nos estudos linguísticos em geral, é necessário dizer que neste artigo tomaremos o enunciado (Charaudeau; Maingueneau, 2004, p.193) como produto da enunciação, ou seja, como resultado da relação “entre a língua e o mundo” em um espaço e tempo definido. Pois, o que tentaremos extrair destes enunciados é a significação destes para com o instrumento e a língua em questão, e a significação “é produzida enunciativamente no e pelo acontecimento da enunciação” (Guimarães, 2002, p.77). Para realizarmos nossa análise, a área do saber norteadora foi a Semântica do Acontecimento, pois como explicita Guimarães (2002, p.7), esta é “(...) uma semântica que considera que a análise do sentido da linguagem deve localizar-se no estudo da enunciação, do acontecimento do dizer”. Partindo do pressuposto guimarãesiano (2007, p.77) de que “tanto a significação quanto a sua relação com o „que acontece‟ são 165 construídos linguísticamente”, utilizaremos o conceito de Domínio Semântico de Determinação (DSD), para representar os sentidos e as relações que são estabelecidos entre estes brasileirismos na constituição de um léxico brasileiro. Por DSD podemos entender como o próprio Guimarães explicita: [...] uma análise de uma palavra. Ele representa uma interpretação do próprio processo de análise e deve ser capaz de explicitar o funcionamento do sentido da palavra no corpus especificado (um texto, um conjunto de texto, etc). Deste modo, não consideramos de antemão nenhuma realidade a que as palavras se reportam. Ao contrário, podemos dizer que o processo de referência através de uma palavra, que aparece como algo neutro, como um modo de indicar algo pela expressão lingüística, na verdade significa que o DSD desta palavra no seu texto (ou textos) significa. (GUIMARÃES, 2007, p. 81) Portanto, empregaremos este processo na análise dos elementos destes dicionários, pois compreender o funcionamento dos sentidos das palavras dentro deste instrumento é um dos fatores que nos permitirá entender a estrutura lexical do português brasileiro. Utilizaremos, também, estudos da História das Ideias Linguísticas, pois, este “programa de pesquisa”, além de compreender instrumentos como o que iremos analisar, alia, como explica Orlandi, (2001, p.7) “(...) a história do saber metalinguístico com a história da constituição da língua nacional, visando trazer contribuições específicas ao modo de pensar e trabalhar a questão da língua nos países de colonização”. Partiremos agora para a explicitação e análise do corpus deste trabalho. Primeiramente, gostaríamos de deixar registrado que faremos apenas um recorte sobre a análise que vem sendo realizada junto aos 166 elementos deste dicionário. Selecionamos, então, para este artigo, um conjunto de cinco verbetes, que consideramos apresentar certa significação para com o objetivo deste estudo. Começaremos por um verbete que se apresenta como “novo”, para o que se tem concebido como língua portuguesa: (1) Abolicionista s. 2, termos novos, creados modernamente, para exprimir ideias relativas a medidas tendentes á extincção da escravidão. “Partido dos Estados- Unidos” dizem Littré e DV.; podião accrescentar: - e do Brazil, e de todos os paizes onde se mantem como instituição social o abuso chamado escravatura, sustentado pelo homem ladrão, locupletando-se com o suor do homem roubado, á sombra da lei da força, tolerada por governos cobardes, em beneficio de sociedades que não têm clara a noção da justiça. // ETYM. do port. abolir; lat. abolere, comp. do pref. ab diminuição, supressão + r. ary. ol crescimento, augmento + suff. ere; prov. hisp. fr. abolir; ital. abolire. O vocábulo “abolicionista” é extremamente significativo para o conjunto da obra por vários motivos. Primeiramente, este dicionário foi publicado em 1888, ano marcado na história do Brasil pela ocorrência da Abolição da Escravatura. Outro, Macedo Soares, fazendo uso do seu papel de juiz e como cidadão brasileiro engajado com as causas políticas e sociais, foi um grande defensor das causas abolicionistas. Para Borba (2007, p. 307) “é pelo léxico que se pode avaliar a ideologia vigente num determinado grupo social em determinada época”, esta afirmação se confirma ao observarmos o vocábulo, pois conseguimos traçar por meio da descrição do termo, o que o lexicógrafo pensa sobre o regime escravista, “abuso chamado escravatura, sustentado pelo homem ladrão, locupletando-se com o suor do homem roubado, á sombra da lei da força, tolerada por governos cobardes, em beneficio de sociedades que não têm 167 clara a noção da justiça”, ou seja, fica nítido o quanto este sujeito é contra tal processo e o quanto apóia a abolição. Outro fator percebido, no que se refere à linguagem empregada, neste caso, do sujeito enunciador, é que a influência jurídica se faz muito presente ao utilizar vocábulos como “lei” e “justiça”, por exemplo. (2) Abajur sm., abaixa-luz, quadro ou reflector de metal ou de papel que se põe nos lampiões para abater a luz. Littré. Neologismo necessario, pois não temos em Braz., nem em port., correspondente; e o objecto existe com o seo nome popular de abajur e abajú (já com a queda do r final, tendencia pronunciada da lingua brazileira). // ETYM. fr. abat-jour. O exemplo (2) se mostra significativo, pois apresenta aspectos interessantes: primeiro, porque temos aqui um elemento advindo de uma língua que também veio do continente europeu, o que faz deste, como o próprio autor expõe, um neologismo. No entanto, observamos que o elemento se insere no léxico brasileiro, como decalque, pois, embora a grafia empregada apresente a estrutura do português, foi conservado a fonética da língua cultura de partida, no caso, o francês. Outro ponto interessante, é que apesar deste instrumento estar inserido em um período anterior à linguística como ciência, o lexicógrafo faz algumas considerações interessantes e de caráter cientificista, como por exemplo, ao observar que o “objecto existe com o seo nome popular de abajur e abajú (já com a queda do r final, tendencia pronunciada da lingua brazileira)”, o autor apresenta algumas considerações sobre a fonética desta língua, o que nos aponta, também, a importância que é dada ao falar do sujeito brasileiro. Percebemos também que o lexicógrafo utilizou o termo “lingua brazileira”, o que nos confirma a posição deste autor perante a língua em questão, ou seja, uma língua nacional, diferente da de Portugal, e isto reafirma o caráter de língua e não de dialeto, deste português. 168 (3) Abaré sm., guar., “sacerdote selvagem, diz D.V., é o nome dado pelos indígenas do Brazil aos missionários”; e cita este trecho de Simão de Vasconcellos: “E como esta gente se preza muito de que os Abarés (assim chamão aos Padres) lhes gabem seos bailes e vozes” Está no mesmo caso de abaeté, t. guar., que jamais se introduziu no uso vulgar. Note-se, porém que abaré não significa “sacerdote selvagem”; ao contrario este é abá pajé homem feiticeiro ou sacerdote; o padre christão é pai-abaré padre homem outro, que “conserva comsigo até morrer aquella innocencia com que fôra amamentado.” Conq. Espir. // ETYM. tp. guar., s. abá homem + adj. é diverso, differente, outro = ‘ré. (4) Bangulê sm. Dansa dos negros, ao som da puita, de cantigas obscenas, palmas e sapateados. // ETYM. bd. // GEOGR. Cabofrio. // SYNON. vj. em batuque. Cp. bamba e banguelê. Os vocábulos (3) e (4) nos apresentam uma característica marcante do português brasileiro, tal característica é um dos argumentos mais utilizados quando se objetiva mostrar as diferenças entre o português europeu e o do Brasil: o léxico brasileiro, possui em sua constituição uma grande contribuição das línguas e culturas indígenas e africanas, lembrando que aquelas já se encontravam em território nacional e estas foram transpostas para o Brasil devido ao regime escravocrata e o comércio de negros africanos. Nos atentemos ao exemplo (3), o vocábulo abaré, vem etimologicamente do tupi guarani, língua indígena brasileira, e o que se observa é que o lexicógrafo, ao inserir o indígena no dicionário, o coloca como sujeito atuante na formação de um léxico nacional e também como ator social, pois o indígena naquela época, embora não possua como 169 língua materna o português, é também um cidadão brasileiro, além de ser o primeiro sujeito desta terra que fora nomeada Brasil. O vocábulo (4), bangulê, vem do bundo ou língua angolense, e como explorado pelo lexicógrafo, nos mostra a riqueza que as línguas africanas, assim como a cultura deste continente possui e é importante na formação da língua portuguesa do Brasil e para a constituição da cultura e da nação brasileira. Nos dias de hoje, ao refletirmos sobre os exemplos (3) e (4) e toda a importância dos sujeitos indígenas e africanos na língua e cultura brasileiras, observamos uma memória social inscrita e desenvolvida por estes actantes desde o começo da História do Brasil. Para nós, estudiosos da linguagem, o que se mostra de forma significativa é o quão simbólico e significante estas línguas são na composição da língua nacional, além de mostrar que esta não é apenas um dialeto português e sim um constructo espaço-temporal resultante de diversas línguas e efetivado por muitos sujeitos. (5) Brazileiro adj. gent., 1º nascido no Brazil. // 2º naturalizado cidadão do Brazil. // LEX. PORT. portuguez que emigra para o Brazil; portuguez ou de outra nacionalidade que, tendo estado no Brazil, regressa para a Europa O verbete (5) fecha nossa sucinta análise. Este vocábulo se mostrou importante para este estudo, pois, além de ser extremamente referendado em todo o dicionário (no título, por exemplo), é imprescindível que conheçamos o conceito que o lexicógrafo aplica, ao fazer uso deste termo, até mesmo para concebermos o sentido desta língua no Brasil. A escolha lexical utilizada nas duas acepções do adjetivo parece-nos interessante. Pensando em sujeito brasileiro, podemos considerar desta terra, aquele que nasce aqui ou aquele que se naturaliza 170 “cidadão do Brasil”. Este termo nos parece interessante, pois: engloba os indígenas, que nasceram aqui, os portugueses, os africanos e qualquer outro sujeito que veio para o Brasil, e que aqui se mostra cidadão da pátria. Se levarmos este conceito para a língua nacional, e com base nos verbetes analisados neste dicionário, temos que: o léxico desta é constituído de palavras “originadas” aqui, ou que neste espaço foram ressignificadas, colaborando com a construção de uma língua de caráter nacionalista. Desta forma, nos baseando em nossa análise, o DSD que podemos estabelecer para a língua nacional é o que segue: Língua Portuguesa ressignificada + Línguas Indígenas (abaré) ┤ Brasileirismos ┤ Léxico ┤ Língua Nacional + Brasileiro Línguas Africanas (bangulê) + Outras Línguas (abajur) Língua Portuguesa Europeia (Onde se lê: a língua portuguesa com elementos ressignificados, mais os elementos das línguas indígenas, mais os das línguas africanas, mais os de outras línguas, como o francês, designam o que chamamos de Brasileirismos, estes designam a existência de um Léxico Brasileiro, que 171 por sua vez designa o que chamamos de Língua Nacional (o português brasileiro), que se mostra diferente da Língua Portuguesa Europeia) Após fazermos esta sucinta análise e construirmos este DSD, podemos apresentar algumas considerações e comprovar algumas afirmações efetuadas em outras análises. Primeiramente, podemos dizer que o dicionário de Macedo Soares, é um instrumento enunciativo muito significativo para a história do português brasileiro, pois é um espaço de enunciação que permitiu o registro destes elementos da língua que atestam a existência de um léxico brasileiro. A partir desta análise, podemos dizer que a língua que se enuncia neste espaço e tempo ressignificados, apresenta características diferentes da língua portuguesa de Portugal. Desta forma, ao olharmos para a história do Brasil, podemos observar o quanto que uma língua com tal caráter colaborou para com o crescimento de um sentimento nacionalista, em um período que o país passava por uma mudança política extremamente significativa. Os brasileirismos, como se observa, são elementos que marcam uma identidade nacional, e Macedo Soares na tentativa de reuni-los neste dicionário contribuiu para com o fortalecimento do sentimento nacionalista, presente tanto na língua, quanto no cidadão brasileiro. Outro ponto considerável, e que ainda está em processo de análise, é a o quão rico este dicionário se mostrou para que pudéssemos compreender a história da nação brasileira, pois, ao inserir estes brasileirismos personalidades, o lexicógrafo expressões e nos ideias, apresenta fatores acontecimentos, essenciais para 172 compreendermos qual o contorno político-social deste país neste fim de século. Podemos dizer ainda, que a análise destes enunciados foi extremamente significativa para atingirmos o objetivo deste estudo, e comprova o poder que a linguagem exerce em uma sociedade, pois é, com toda certeza, um grande veículo processador de ideologias e histórias de uma nação. 173 Referências AUROUX, S. A hiperlíngua e a externalidade da referência. Tradução de Dias, L. F. In: ORLANDI, E (Org.). Gestos de leitura da história no discurso: Homenagem a Denise Maldidier. Campinas: Editora da Unicamp, 1997. ______. A Revolução tecnológica da Gramatização. Trad. ORLANDI, Eni. 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