TESTE DE COOMBS NA ROTINA LABORATORIAL HEMOTERÁPICA Coombs test in routine laboratory of blood banks Renata Schneider1, Marilei Uecker Pletsch2 1 2 Aluna do Curso de Pós Graduação Lato sensu em Hematologia Laboratorial. Professora Orientadora, Coordenadora do Curso de Pós Graduação Lato sensu em Hematologia Laboratorial da Unijuí Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. Trabalho realizado para obtenção do Título de Especialista em Hematologia Laboratorial. Contato: [email protected]. Resumo Após ser descrito em 1945 por Coombs e colaboradores, o soro de Coombs pode ser considerado como a mais importante descoberta da medicina transfusional depois do sistema de grupo sanguíneo ABO, permitindo que outros anticorpos fossem detectados com seus respectivos antígenos. O Teste de Coombs Direto (TAD) permite detectar in vivo a sensibilização das hemácias com anticorpos e o Teste de Coombs Indireto ou Pesquisa de Anticorpos Irregulares (PAI) detecta a presença de anticorpos irregulares no soro, com finalidade de detectar anticorpos além dos esperados. Este trabalho tem o objetivo de investigar e revisar acerca da positividade dos Testes de Coombs Direto e Indireto em doadores de sangue através de pesquisa bibliográfica. Os resultados desta revisão demonstraram que os anticorpos irregulares não são tão freqüentes em doadores de sangue e que, na sua grande maioria, quando presente, consegue-se realizar sua identificação para maior proteção do doador e do receptor. Quanto ao teste da antiglobulina humana direto, também não é freqüente em doadores de sangue, e considerando que os resultados de testes sorológicos não são diagnósticos, o significado do TAD positivo só pode ser avaliado em relação ao estado clínico do doador, podendo ser positivo em indivíduos hematologicamente normais. Consideramos de extrema importância apoiar a prática de notificação aos doadores de sangue tanto em relação ao PAI positivo, tanto quando ao TAD positivo, levando em conta os problemas que poderão surgir com a passividade em não prosseguir uma investigação. Palavras chave: doadores de sangue, teste de Coombs direto e indireto. Abstract After be described in 1945 by Coombs et al, Coombs serum can be considered as the most important discovery of transfusion medicine after the ABO blood group system, allowing other antibodies were detected with their respective antigens. The Coombs Test (DAT) to detect in vivo sensitization of red blood cells with antibodies and Indirect Coombs Test or Survey of Irregular Antibodies (PAI) detects the presence of irregular antibodies in serum, with the purpose of detecting antibodies beyond the expected. This paper aims to investigate and review about the positivity of tests Direct and Indirect Coombs blood donors through a literature review. The results of this review showed that irregular antibodies are not as frequent blood donors and, mostly, when present, can be made to better protect their identification of the donor and patient. As for the human antiglobulin test direct, is also not frequent in blood donors, and considering the results of serological tests are not diagnostic, the significance of positive DAT can only be assessed in relation to the clinical status of the donor, and may be positive in hematologic normal individuals. We consider extremely important to support the practice of notifying blood donors both in relation to PAI positive when both the positive DAT, taking into account the problems that may arise with the passivity in not pursuing an investigation. Key words: blood donors, Coombs test direct and indirect. Introdução As migrações externas e também internas ocorridas nos últimos séculos contribuíram para o Brasil tornar-se um dos países mais heterogêneos do mundo, fazendo da população brasileira única do ponto de vista antropológico(1,2). As mudanças no perfil epidemiológico da população brasileira e os avanços técnico-científicos na área médica, que possibilitam procedimentos terapêuticos de alta complexidade, trouxeram um aumento na demanda por transfusões, nem sempre acompanhado por um incremento no número de doadores de sangue(3,4). Mudanças na percepção do público sobre os riscos e benefícios da transfusão de sangue têm afetado a prática de doação de sangue no Brasil(5). De acordo com a Portaria nº 1353, de 14 junho de 2011(6), os Serviços de Hemoterapia devem realizar exames imuno-hematológicos para qualificação do sangue do doador, a fim de garantir a eficácia terapêutica e a segurança da futura doação. São estes: tipagem ABO e Rh (D), pesquisa do antígeno D fraco e a pesquisa de anticorpos irregulares (Coombs Indireto), sendo a realização do teste de Coombs direto não obrigatória na rotina laboratorial de doadores de sangue. O teste de antiglobulina humana (AGH) foi descrito em 1945 por Coombs e colaboradores. Assim, o uso de antiglobulina humana foi utilizado para detectar in vivo a sensibilização de hemácias por anticorpos, ajudando no diagnóstico da doença hemolítica perinatal (DHPN)(7) e anemia hemolítica auto-imune. Desta forma, o soro de Coombs pode ser considerado como a mais importante descoberta da medicina transfusional depois do sistema de grupo sanguíneo ABO(8) permitindo que outros anticorpos fossem detectados com seus respectivos antígenos, levando a descoberta e à caracterização de outros sistemas de grupos sangüíneos(7). O Teste de Coombs Direto (TAD) permite detectar in vivo a sensibilização das hemácias com anticorpos e o Teste de Coombs Indireto ou Pesquisa de Anticorpos Irregulares (PAI) detecta a presença de anticorpos irregulares no soro, com finalidade de detectar anticorpos além dos esperados (anti-A e anti-B)(9). Contudo, verifica-se a necessidade de promover, de forma sistematizada, reflexão sobre estes testes realizados rotineiramente em serviços de hemoterapia, a cerca de informação destes resultados, quando positivos, aos doadores de sangue. A reflexão recai, de maneira indissociável, primeiramente sobre uma pesquisa para revisar os aspectos que geram estes resultados positivos em doadores de sangue aparentemente saudáveis, pois sabe-se que a triagem laboratorial adequada é imprescindível para obtermos segurança transfusional. 2 Este trabalho tem, portanto, o objetivo de investigar e revisar acerca da positividade dos Testes de Coombs Direto e Indireto em doadores de sangue. Material e Método Foi realizada pesquisa bibliográfica em livros, jornais, revistas e bancos de dados disponíveis on line, através da relação entre os seguintes unitermos: irregular antibodies blood donors, PAI positive blood donors, indirect Coombs positive blood donors, TAD positive blood donors, Direct Coombs positive blood donors, para artigos publicados em língua inglesa e portuguesa, de ensaios conduzidos em seres humanos e artigos de revisão, sem restrições quanto ao ano de publicação, sendo selecionados 34 referências, entre artigos e livros, incluídos na revisão. Teste da Antiglobulina Direto O teste de Coombs Direto ou Antiglobulina Direta (TAD) constitui método simples para demonstração da presença de IgG e/ou complemento revestindo a superfície dos eritrócitos in vivo(10). A aglutinação no teste ocorre quando há uma diminuição das forças de repulsão das hemácias – potencial zeta – até determinado valor (potencial zeta crítico), e para visualizarmos esta reação, devemos utilizar o soro antiglobulina humana para diminuir ainda mais o potencial zeta até o ponto crítico, promovendo a aglutinação(11). O número de sítios antigênicos nas hemácias também pode ser um ponto decisivo para que as hemácias aglutinem. Considerando que os eritrócitos normais são revestidos por pequenas quantidades de IgG e C3d e que a ligação de 200 ou mais moléculas de IgG por eritrócito e de 400 de complemento resulta no TAD positivo(9), discordando de Bencomo et al(12) que realizou um ensaio com 200 doadores de sangue saudáveis e 62 pacientes com anemia hemolítica auto-imune e observou-se que para os doadores de sangue saudáveis com TAD positivo, os valores médios foram de 58 IgG, 16 IgA e três moléculas de IgM por hemácia. Apesar do TAD não ser prática comum na rotina imunohematológica em doadores de sangue, a prevalência da positividade do TAD em doadores de sangue é baixa, ficando entre 1:9.000 a 1:14.000(13,14,15) quando realizado um análise criteriosa das reações positivas e 1:1.000 a 1:36.000, segundo Rottenberg et al(16). Usualmente, o TAD é realizado nas seguintes situações: - em estudos imunohematológicos, quando os exames realizados rotineiramente 3 são positivos ou discordantes; - quando há discrepância na tipagem Rh(D) - pesquisa do antígeno e o controle Rh(D) positivos; - na pesquisa de anticorpos irregulares positiva, onde se realiza a identificação de anticorpos irregulares (IAI) e TAD; e ainda, - durante as provas pré-transfusionais, onde o concentrado de hemácias do doador é cruzado com soro/plasma do paciente, sendo todos os exames do paciente negativos (PAI e TAD), e suspeita-se de auto-anticorpo do doador, deve-se realizar o TAD. A freqüência de doadores com TAD positivo foi de aproximadamente 1 em 3.000 no estudo de Bellia et al(17) que também demonstrou que os homens tinham duas vezes mais probabilidade de ter um TAD positivo (8 mulheres contra 17 homens). Considerando que a incidência de anemia hemolítica auto-imune quente é de cerca de 1 por 50.000 a 80.000 pessoas, Domen(14) relata que a grande maioria dos TAD positivos parecem ser clinicamente insignificantes. As condições clínicas que podem resultar na cobertura in vitro das hemácias com anticorpo e/ou complemento são: anemias hemolíticas autoimunes; anemias hemolíticas induzidas por transfusionais drogas; doença hemolítica perinatal; reações hemolíticas (9,18) , transfusão de sangue ou componentes contendo plasma ABO- incompatível e em outras situações específicas que são detectadas após criteriosa avaliação clínica para identificar a causa do TAD positivo. Anticorpos contra diversas drogas e aditivos também podem causar resultados positivos nos testes de anticorpos. As drogas podem resultar em ampla variedade de anormalidades hematológicas, incluindo teste de antiglobulina direto positivo(19,20). A causa mais comum destas reações positivas é a formação de auto-anticorpos. Segundo Garratty(20), as drogas causam teste de Coombs positivos por três mecanismos diferentes: - A droga se liga firmemente à membrana de glóbulos vermelhos, e anticorpo contra a droga vai combinar-se com o fármaco na membrana levando a hemácias IgG sensibilizadas (Exemplo: penicilina). - Há modificação química da membrana dos glóbulos vermelhos através da droga, de modo que ele ocupa muitas proteínas não especificamente (Exemplo: cefalosporinas). - Formação de um complexo imune com o medicamento e o seu anticorpo específico. Este complexo imune se liga a membranas celulares e há ativação do complemento no processo (Exemplos; fenacetina, quinina, quinidina) 4 Em casos nos quais os doadores apresentam TAD positivo, devido ao mecanismo de complexo imune, as reações podem ser positivas, desde que a droga ainda esteja na circulação sanguínea do doador. Quando diminui o nível da droga, a reatividade torna-se cada vez mais fraca e finalmente negativa(9). Win et al(13), em um estudo de acompanhamento de doadores de sangue saudáveis durante 3 anos, não revela nenhuma seqüela clínica importante e causa aparente para a positividade do TAD. Mas, em contraste, este estudo revela doadores de sangue saudáveis com TAD positivo, falso-positivos em testes VDRL (Venereal Disease Research Laboratory) e níveis de anticorpos antifosfolípedes elevados (em 42 doadores com TAD positivo estudados, três obtiveram resultados falso-positivos com o teste VDRL), demonstrando que em algumas populações o TAD positivo está relacionado a infecções e distúrbios imunológicos. Testes de Coombs direto positivo também já foram descritos na síndrome antifosfolípede com lúpus eritematoso e síndrome antifosfolípede primária, com incidência de 16% e 4,3% respectivamente(21). Rotemberg et al(16) também afirma que entre os fatores de risco associados com um TAD positivo, incluem anticorpos cardiolipina, síndrome da imunodeficiência adquirida e drogas. Ainda, neste estudo, Rotemberg et al(16) compararou o risco de desenvolvimento de câncer e o TAD positivo em doadores de sangue, confrontando com a população em geral. A incidência foi alta tanto para doenças malignas quanto para neoplasias. Os resultados apoiam um aumento da incidência de doenças hematológicas no seguimento de doadores TAD positivos. A descoberta oposta, isto é, uma elevada prevalência de TAD positivo em pacientes com neoplasias hematológicas, também tem sido relatada(22). O estudo de Rotemberg et al(16) também indica que a positividade de TAD pode estar associada a tumores sólidos. O câncer de mama foi o mais comum com a maioria apresentando-se em estágio inicial. No estudo de Bareford et al(23) houve um acompanhamento de 67 doadores com TAD inexplicavelmente positivo durante um período de 20 anos. Apenas um doador desenvolveu anemia hemolítica auto-imune. Ao contrário de pacientes com doenças auto-imunes estabelecidas, nos indivíduos saudáveis com TAD positivo foram encontrados subconjuntos de células T normais e as células B foram significativamente aumentadas. Já o estudo realizado por Gorst et al(24), 65 pessoas com TAD positivo foram identificadas em um período de 14 anos em uma população de doadores de sangue. Uma forte correlação entre TAD positivo e o aumento da idade foi observado, comparando com pacientes TAD positivos, não demonstrando nenhuma causa provável. 5 A prevalência de TAD em doadores de sangue com idade avançada também foi evidenciada no estudo de Rotemberg et al(16). A revisão realizada por Zantek et al(25) revela os perigos e limitações do teste direto de antiglobulina humana. As reações podem desencadear resultados falsos com a técnica inadequada, incluindo lavagem imprópria, centrifugação e agitação da amostra no momento da interpretação dos resultados. Para detectar resultados falso-negativos deve-se utilizar a adição de eritrócitos revestidos de IgG (células de controle). Interpretar o significado de um TAD positivo requer conhecimento da situação clínica do doador de sangue, de sua terapia medicamentosa, história transfusional, lembrando que um TAD positivo pode acontecer sem manifestações clínicas de hemólise(9). Os resultados de testes sorológicos não são diagnósticos e o significado só pode ser avaliado em relação ao estado clínico(26), pois a presença de TAD positivo não significa, necessariamente, que um indivíduo tenha anemia hemolítica, sendo, por vezes, positivo em indivíduos hematologicamente normais. Neste estudo, encontramos poucas informações abordando a gestão de doadores de sangue e de doações de sangue encontrados com TAD positivo. O estudo de Hannon(27) afirma que as práticas variam consideravelmente entre os países e não há uma abordagem padronizada para a gestão destes doadores de sangue ou os produtos preparados a partir de sangue de suas doações. Teste da Antiglobulina Indireto A pesquisa de anticorpos irregulares consiste na aplicação da técnica indireta da antiglobulina visando à triagem dos anticorpos direcionados aos antígenos de grupos sanguíneos, excluindo-se o ABO(18). A importância clínica destes anticorpos é determinada pela capacidade de destruição celular in vivo, pela possibilidade de atravessar a barreira placentária e pela relativa freqüência do antígeno(28). Sabendo que os anticorpos irregulares ocorrerem em aproximadamente 0,3 a 2% da população em geral(9,11), a triagem e identificação adequadas de anticorpos são indispensáveis para adequada seleção de sangue para transfusão e também na investigação da Doença Hemolítica do Recém Nascido. As informações relativas à idade, sexo, raça, história de transfusões e gestações, medicações em uso e soluções intravenosas podem oferecer pistas para os estudos de identificação destes anticorpos(9). 6 A especificidade do anticorpo; sua amplitude térmica; o número de sítios antigênicos na membrana eritrocitária; a mobilidade dos antígenos na membrana; a classe da imunoglobulina; a subclasse de IgG; a constante de equilíbrio do anticorpo e a capacidade de ativar complemento, são fatores que também podem influenciar o significado clínico dos anticorpos anti-eritrocitários(28). Ainda, devemos considerar que muitos anticorpos são lábeis (42% desaparecem ao longo de 5 anos), e podem reaparecer com o passar do tempo; e os aloanticorpos clinicamente significativos também podem, às vezes, serem mascarados por autoanticorpos(9). Em pacientes que recebem múltiplas unidades de sangue (politransfundidos), é previsível a imunização contra antígenos não investigados. Nestes casos, deve-se realizar a fenotipagem do doador e do receptor, quanto a antígenos raros do sistema Rh ou de outros sistemas não rotineiramente investigados. Segundo Pahuja et al(29), em pesquisa realizada recentemente, um total de 7.756 doadores foram selecionados, dos quais 98,6% do sexo masculino e 1,4% do sexo feminino, com número máximo de doadores pertencente a faixa etária dos 26-30 anos. 0,05% dos doadores mostraram a presença de aloanticorpos, sendo dois deles anti-C, um anti-Le(a) e um autoanticorpo. Zhu(30) em 2007, realizou um estudo onde 15.033 doadores foram triados. 42 amostras apresentaram pesquisa de anticorpos irregulares positiva, sendo mais frequente no sexo feminino e os anticorpos mais comuns foram: anti-D e anti-E. Em uma pesquisa com 200.000 indivíduos, 4.168 apresentaram pesquisa de anticorpos irregulares positiva, sendo cerca de 50% anti-D, 15% dos anticorpos pertencia ao sistema Lewis e 2,1% dos indivíduos descritos possuía um ou mais anticorpos irregulares(31). De acordo com Makarovska-Bojadzieva(32), em 75 das 81 amostras estudadas, foram identificados os anticorpos: anti-K (26),-E (25),-e (1),-C (4),-c (6),-C (w) (2),-k (1),Fy(a) (3),-Fy(b) (1),-Jk(a) (3),-Lu(b) (1),-Le(b) (2),-Le(a) (1), M-(4), P1-(1). O aloanticorpo mais freqüente foi anti-K, com 32%, e anti-E, com 30,8% de todos os anticorpos identificados. Myhre et al(33) identificaram 0,34% dos doadores com PAI positivo. Como 25% dos doadores de sangue eram de primeira vez, o percentual de anticorpos encontrados em doadores de primeira vez foi de 0,56%. A incidência encontrada de anti-D por si só foi de 0,35% da população D-negativo, e a incidência de todas as combinações de anti-D com outros anticorpos na população foi de 0,52%. Ainda, o estudo relata que muitas mulheres tiveram mais anti-D ou anti-D + anti-C (93,3% e 91,7%, respectivamente) do 7 que aquelas que apresentaram anti-K,anti-E ou anti-Le(a) (33%, 52% e 32% respectivamente). Já Trentin(34) observou que a prevalência de anticorpos irregulares em doadores de sangue foi de 0,32%, sendo mais freqüente no sexo feminino do que no masculino. No grupo pesquisado, o anticorpo irregular mais prevalente foi o anti-D. Depois do anti-D, dos anticorpos do sistema Rh, o anti-C e o anti-E foram os mais prevalentes. Para os outros grupos sanguíneos, os anticorpos mais freqüentes foram o anti-M, anti-Le(a) e anti-K. Os anticorpos menos prevalentes nesta pesquisa foram o anti-Lu(a), anti-Jk(b) e anti-Fy(b). Considerações finais Uma série de estudos tem sido relatados sobre a incidência de anticorpos em populações selecionadas, mas poucos relatos têm sido realizados sobre a incidência de anticorpos irregulares em doadores de sangue saudáveis. Através dos estudos apresentados, traçamos uma linha do tempo em relação à prevalência de anticorpos irregulares na população (Figura 1), desde 1965, onde podemos observar uma tendência de diminuição. Prevalência de Anticorpos Irregulares em diferentes estudos (1965 a 2012) 2,20% 2,00% 2% 1,80% 1,60% 1,40% 1,20% 1,00% 0,80% 0,60% 0,34% 0,40% 0,34% 0,27% 0,20% 0,00% 1960 0,05% 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015 Figura 1. Linha do tempo em relação à prevalência de anticorpos irregulares na população. Esta tendência nos leva a refletir sobre algumas causas prováveis desta diminuição, como as mudanças no perfil epidemiológico da população, realização de programas de profilaxia da alo-imunização, principalmente Rh(D); avanços técnicos (principalmente em relação aos reagentes utilizados) e científicos na área médica e aumento da segurança transfusional. 8 Os resultados desta revisão demonstraram que os anticorpos irregulares não são tão freqüentes em doadores de sangue e que, na sua grande maioria, quando presente, consegue-se fazer sua identificação para maior proteção do doador e do receptor, sendo estes desafios singulares e complexos para a equipe do serviço de hemoterapia. A realização da triagem e identificação de anticorpos irregulares, juntamente com a investigação de frequência e distribuição destes anticorpos contribui excepcionalmente para minimizar os riscos transfusionais, pois a exposição a antígenos eritrocitários por transfusão sanguínea pode resultar na produção de anticorpos em pacientes e levar a várias complicações, incluindo atraso na obtenção de sangue compatível e reações transfusionais hemolíticas. Não menos importante, é a comunicação ao doador sobre o alo-anticorpo identificado, pois este doador poderá vir a ser um paciente futuramente. Considerando que a aloimunização a antígenos eritrocitários ainda é um problema na prática transfusional, e havendo uma variação importante dos antígenos entre diferentes populações, é evidente que a realização de ensaios adicionais de doadores de sangue (principalmente para Rh e antígenos Kell) deveria ser implementado como uma rotina para evitar, tanto quanto possível, a incidência de aloimunização e aumentar a segurança nas transfusões sanguíneas. Analisando as recentes evidências encontradas no estudo de Rotemberg et al(16) sugerindo que o TAD positivo em doadores de sangue pode não ser benigno, pode ser prudente para os Serviços de Hemoterapia periodicamente reexaminar a sua abordagem à gestão de doadores de sangue com um TAD positivo e suas doações, pois devemos considerar os problemas que poderão surgir com a passividade em não prosseguir uma investigação da causa de um TAD positivo. Avaliando os resultados deste estudo, para o teste de antiglobulina humana direto, consideramos de extrema importância apoiar a prática de notificar os doadores de sangue saudáveis sobre o teste de Coombs direto positivo, informando-os a respeito da possível presença de doença auto-imune não diagnosticada, uma malignidade oculta ou apenas por precaução, para realização de exames médicos complementares e acompanhamento médico periódico. Contudo, acreditamos ser importante a realização de mais estudos para confirmar esta associação, determinar os fatores que influenciam o risco de câncer neste grupo e para avaliar o impacto de notificação para esta população aparentemente saudável. 9 Referências Bibliográficas 1. Guelsin GAS et al. Genetic polymorphisms of Rh, Kell, Duffy and Kidd systems in a population from the State of Paraná, southern Brazil. Rev Bras Hematol Hemoter. 2011; 33(1): 21-25. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbhh/v33n1/v33n1a09.pdf. 2. 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