Pensando a Clínica
Nº 13
Setembro 2005
Editorial
Queridos alunos, quero iniciar dizendo do imenso prazer que tenho em
apadrinhar vocês. Em meio a festas e homenagens, experiencio uma gostosa
nostalgia ao me lembrar dos momentos que vivemos juntos há dois anos
atrás. A satisfação é uma marca que perdura, pois sentia e sinto em vocês
solo fértil para o surgimento do novo.
Hoje, o mundo das idéias sucumbe a uma forma de pensar que privilegia o
tecnicismo, as especialidades e a profissionalização. Esta visão empobrece a
problematização e potencializa verdades parcializadas, muitas vezes
desconectadas entre si. Desarticulados, os saberes são facilmente
mistificados, transformados em dogmas e reproduzidos. Penso ser necessário
reativarmos o pensamento interrogativo. A dúvida nos conduz a busca por
novos conhecimentos e a uma atitude investigativa. Sabemos que as grandes
descobertas contradisseram o saber de sua própria época e que até o próprio
Einsten nos alertou para não andarmos pelo caminho traçado, pois ele nos
conduz até onde os outros já foram. A arrogância do saber completo,
presumível e acabado, não combina com a postura de um pesquisador. E
penso, não combina com a postura de vocês. Criativos, inquietos e
espontâneos, vocês trazem em forma de potência a possibilidade de se
reposicionarem diante do que está posto. Abertos ao conhecimento, e sem
posturas preconceituosas, vocês demonstram disposição para ouvir, aprender
e porque não, reinventar o que está posto.
Não hesitem, ou se deixem paralisar diante da dúvida. Ao contrário
utililizem-na como mola propulsora na busca de novas formas de
compreender o mundo. Abusem da liberdade de se apropriarem do
conhecimento de um modo pessoal, subjetivo, sem perder o estilo próprio e
não se submetendo a idéia de que existe uma só verdade e um só estilo.
Não podemos mais abdicar de um pensamento que absorva as incertezas, as
insuficiências e as inseparabilidades. E a principal separação que temos que
rever é a que afasta sentimento da razão, afeto da inteligência. A emoção, a
poesia, a arte são elementos que freqüentemente são desconsiderados nas
construções teóricas clássicas. Mas, a meu ver são estas características
correlacionadas com a razão que nos permitem uma atuação mais
consistente. As estratégias terapêuticas e profissionais não precisam excluir
estes elementos para serem precisas. Podemos ser alegres e emotivos e
também competentes.
Corajosos, sem medo de serem acusados de piegas ou inconsistentes, vocês
retomam os sentidos: o tato, a fala, a audição, a visão e o olfato, formas de
entrarmos em contato com nossas sensações e sentimentos. E vão mais além,
quando nos lembram através das crianças, que é necessário acreditar,
investir e sonhar. Geramos filhos, idéias e conhecimentos, quando
acreditamos que podemos e devemos apostar no futuro. Ser esperançoso é
acreditar na essência do ser humano, outra característica fundamental para o
pesquisador e profissional psicólogo. Se não acreditamos que o ser humano
pode ser melhor, como trabalhar com ele e para ele? Não se trata de sermos
ingênuos, mas sim de sabermos que posicionamentos acirrados e fechados
tem feito muito mal a ciência da psicologia.
Acredito também que todo um corpo teórico não pode nos afastar do
sofrimento humano, das injustiças, e das reais condições de vida das pessoas
que nos propomos a ajudar. Vemos muitas vezes como que idéias abstratas
que são feitas para elucidar o mundo, nos afastam do que há de humano no
outro e principalmente em nós psicólogos. Neste ponto alio-me ao sociólogo
Edgar Morin: ele considera que a ética deve mobilizar a sabedoria para
enfrentar a complexidade da vida, do mundo e até da própria ética. Para ele
a ética só tem sentido quando utilizada para enfrentarmos e resistirmos à
crueldade do mundo. “É uma ética que encontra em seu seio sempre a
incerteza e a contradição. É uma ética do desafio. É uma ética que nos
reclama exigência conosco e indulgência com o outro, e não o inverso”.
Assim, o rigor deve estar a serviço do nosso aperfeiçoamento profissional, e
não de nos afastarmos dos sentimentos de compaixão e solidariedade. E por
estar certa de que vocês compartilham destas idéias, é que aposto no sucesso
de vocês!!!
Professora Ana Paula Carvalho Pereira Passos
Discurso proferido na formatura da turma de julho 2005/manhã
Reunião de abertura do semestre
com os estagiários
Nos dias 18 e 22 de agosto aconteceram as reuniões de
abertura com os estagiários. O tema foi “A escrita da
clínica”. A seguir um professor-supervisor e um aluno
trazem seus depoimentos sobre a reflexão feita
A escrita da clínica
N
o dia 18/08/05 professores supervisores, alunos e
funcionários reuniram-se em torno do tema : A
escrita da clínica, na atividade de acolhimento dos
estagiários do 2o semestre de 2005.
A importância de uma escrita da clínica foi o
denominador comum da discussão, ficando
evidenciadas a responsabilidade ética daqueles que
participam de uma clínica-escola no registro do
percurso do cliente, nas dimensões administrativa e
clínica e a inegável função da escrita na condução do
caso e para fins de pesquisa.
Conversamos também sobre a particularidade da
escrita da clínica e seus vários enfoques. Foram
também explicitados alguns impasses importantes
experimentados pelo terapeuta -estagiário no
preenchimento dos prontuários, na realização de
relatórios e na escrita de um caso clínico.
No final do encontro certificamo-nos, mais uma vez,
da importância de persistirmos na intenção de
inscrevermos a clínica no espaço do diálogo entre
todos que participam da sua construção diária.
Paula Bedran – professora supervisora
E
ste momento, para refletir sobre a escrita na
nossa clínica escola, foi de grande importância.
Discutimos sobre as dificuldades de se produzir um
registro, ou um documento, de forma ética e
responsável a partir da prática terapêutica. Foi
interessante perceber que nós alunos temos receio da
escrita, por ela abrir um canal para as críticas, pois
possibilita a exposição de nossa forma de atuar. E
ainda que este trabalho de escrita é uma forma
privilegiada de conseguir que nossa clínica promova
questionamentos e verdadeiramente faça ciência.
Paula Maia Nogueira 11˚ período manhã
MARCAS DA XIII JORNADA
Repercussões da XIII Jornada da Clínica
de Psicologia
DA CLÍNICA
E
m primeiro lugar, quero agradecer a todos que colaboraram para a
Lembranças de uma Jornada
Rogério Felipe
(Psicólogo recém formado 1º semestre de 2005 – [email protected]
O
filósofo francês Michel Serres afirmou certa vez que “ ser culto é
buscar outras culturas, é ir a um encontro com a diferença”
Na XIII Jornada de Psicologia, ao menos na mesa em que participei: “A
clínica sob diversos olhares”, pude experimentar um pouco da sensação
que a frase acima destacada inspira. De fato, diversos eram os olhares dos
que ali estiveram presentes, o que de certa maneira serve para clarificar o
que há muito já foi desvelado: A Psicologia é um território povoado por
multiplicidades.
Neste território é possível se atuar por zonas de vizinhança que não se
restringem tão somente às Ciências Humanas. Neste sentido a Psicologia
tem seu território ampliado por linhas políticas, e estéticas, e sociais, e de
educação etc, que se atravessam transversalmente.
Trouxe em meu relato a importância da Astronomia e do uso do telescópio
como dispositivos que possibilitaram agenciamento coletivos, tão
importantes nos processos de subjetivação, no trabalho com um jovem, em
atendimentos/encontros, ocorridos na Clínica de Psicologia da
PUCMinas.
Agradeço a oportunidade de ter podido compartilhar estas
experimentações que foram amplamente enriquecidas após a apreciação
coletiva.
Acontecimentos como a Jornada da Clínica precisam ocorrer em maior
freqüência e merecem a atenção, se não de todos, pelo menos daqueles que
estão implicados no processo de conhecimento e intervenção na sociedade.
O
s trabalhos da XIII Jornada da Clínica foram reunidos e
organizados e se encontram à disposição para consulta nos arquivos de
nossa clínica
Profª Paula Maria Bedran e Monitora Lina Maria Ruiz Paredes
Acontece na Clínica – Setembro
Secção Clínica:
Clínica Psicomotora – 02/09 – 18:00 – Local: Clínica de Psicologia –
Prédio 44
realização da XIII Jornada, em especial, aos professores e alunos que
compuseram a comissão de organização, a comissão científica e de registros e
publicação. Em segundo lugar, comunico a todos que os trabalhos apresentados
na XIII Jornada estão disponíveis para consulta numa encadernação que reúne a
produção sobre “as questões contemporâneas” e demais artigos sobre diversos
temas clínicos abordados por alunos, professores e ex-alunos do Curso de
Psicologia. Também o vídeo produzido sobre o tema encontra-se na Clínica. Foi
com prazer que já pudemos disponibilizá-lo para trabalho em sala de aula na
disciplina de Filosofia. Em terceiro lugar, faço algumas considerações sobre esta
jornada, destacando alguns pontos sobre o desenvolvimento do tema, a dinâmica
e os resultados do trabalho, que deixou-nos algumas conclusões, questões em
aberto e muitas perguntas.
Recebemos trabalhos de professores, de alunos do início e do final do Curso de
Psicologia e das suas três ênfases, a saber, clínica, educacional e
organizacional. O tema “Questões contemporâneas” foi tratado de diferentes
modos, porém, demonstrando a fidelidade do trabalho à articulação do ensino,
da pesquisa e da extensão.
Algumas questões contemporâneas, por exemplo, foram discutidas por meio de
relatos de pesquisas tais como: 1) Revisão do horizonte belo: o ponto de vista de
crianças e adolescentes de Belo Horizonte; 2) Análise das Representações
Sociais dos professores de ensino fundamental das escolas públicas sobre a
atuação do psicólogo no atendimento de crianças com problemas de
aprendizagem; 3) A queixa escolar dá o que falar.
A psicose foi abordada na mesa “Tratamento da psicose em parceria com o
Cersam”, por meio de artigos teóricos e casos clínicos, cujos debates indicaram
o caminho da pesquisa como essencial para que a Clínica de Psicologia viabilize
as condições necessárias de prestação de serviços em relação as demandas que
recebem destes casos.
A mesa “Corpo e Subjetividade”, apesar de pouco tempo para a discussão dos
trabalhos, se beneficiou da leitura de conclusões de uma dissertação de
mestrado, O transexualismo e suas soluçõe, e de uma tese de doutorado, Uma
leitura da história de vida dos jovens usuários de drogas na cidade
contemporânea: pensando as transformações da intimidade e a crise do sentido
ético da concepção moderna de subjetividade.
A violência, questão nossa de todo dia, foi discutida na mesa “Clínica da
violência”, na qual tivemos o relato da experiência de ex-alunos, formados
recentemente, e já engajados como profissionais em projetos de importante
função social, tais como o “Fica vivo” e o “Liberdade assistida” da PBH.
A hiperatividade, que constitui atualmente uma queixa crescente dos pais e das
escolas, possibilitou uma conversa em torno de fragmentos clínicos sobre a
figura da criança contemporânea e o que a traz até aqui à Clínica.
Uma questão contemporânea que implica o futuro do psicólogo, a questão da lei
do ato médico, foi tratada pelo presidente do CRP, Dr. Humberto Verona e uma
conselheira do CRM, Dra. Eliane de Souza, permitindo-nos concluir o quanto
precisamos evoluir no trabalho em torno deste assunto, na preparação para
futuros debates, visto que estão em jogo expectativas, polêmicas e ressonâncias
muito complexas.
Além disso, “A formação do psicólogo no campo clínico”, “A clínica sob
diversos olhares” foram temas de contribuições e trocas entre diferentes
referências teóricas que a Clínica abriga. Esperamos que os diversos olhares
possam se explicitar e fazer circular, cada vez mais, suas experiências e
propostas entre nós.
Terapia Familiar – 29/09 – 10:40 horas – Clínica de Psicologia –
Prédio 44
“Desafios e conquistas na saúde mental brasileira” foi o título de outra mesa,
que expôs uma visão particular dos movimentos sociais em torno da saúde
mental. Questões psicossociais foram também abordadas em outra mesa,
sobretudo, no campo do trabalho.
Não poderia deixar de falar na conferência de abertura da jornada. Desafios
atuais na construção da ética, proferida pelo prof. José de Anchieta Corrêa, que
de modo entusiasmado, nos transmitiu princípios filosóficos da ética, de enorme
valia no tempo de hoje e de amanhã.
•Estamos trabalhando no aprimoramento do nosso boletim.
Gostaríamos de contar com a colaboração de todos vocês nesse
trabalho. Envie sugestões para o e-mail [email protected]
Por fim, uma conclusão norteadora do planejamento da próxima jornada, no
primeiro semestre de 2006 (em data ainda a ser definida), é que a escolha do
tema deve ser antecipada, assegurando condições para seu desenvolvimento,
investigação e elaboração, de maneira que a jornada constitua um espaço
privilegiado para escoar a produção feita ao longo do semestre. Por outro lado,
a produção durante as discussões da jornada poderão ser registradas e
colocadas na roda, amplamente, favorecendo a interlocucão e a comunicação
das idéias.
Psicanálise – 26/09 – 20:40 horas – Local: Clínica de Psicologia Prédio
44
ou procure a profª Soraia Dojas.
Suzana Faleiro Barroso
Coordenadora da Clínica de Psicologia
Comissão Editorial: Profª Suzana Faleiro Barroso, Profª Ana Paula Carvalho Pereira Passos e Profª Soraia Dojas Melo Silva Carellos
É a troca de idéias que constrói nosso boletim
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