brasil de 26 de janeiro a 1º de fevereiro de 2012 9 BNDES dá asas à desnacionalização dos aeroportos brasileiros Valter Campanato/ABr PRIVATIZAÇÃO Banco anuncia que financiará 80% da privatização com dinheiro público Leonardo Wexell Severo de São Paulo (SP) COMO SE NÃO bastasse a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) exigir a presença de operadores estrangeiros nos consórcios que aspiram participar do leilão de “concessão” dos aeroportos internacionais de Brasília (DF), Campinas (SP) e Guarulhos (SP) – os maiores e mais lucrativos do país -, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) anunciou dia 19 de janeiro, que financiará até 80% do investimento total das empresas contempladas pelo martelo privatista. Marcado para o dia 6 de fevereiro, o leilão entregará ao capital privado – nacional e transnacional – o controle de três terminais que, juntos, respondem por 30% do fluxo de passageiros e 57% da carga movimentada no país. “Esta é uma decisão vergonhosa e inadmissível. Se já não bastasse a privatização de um patrimônio estratégico para o nosso desenvolvimento, agora anunciam o uso de um banco de fomento para estimular o capital estrangeiro”, condenou Celso Klafke, presidente da Federação Nacional dos Trabalhadores em Aviação Civil (Fentac). Com a experiência de quem congrega aeroviários (trabalhadores das companhias aéreas e de serviços auxiliares que atuam em terra), aeronautas (pilotos, comissários e mecânicos de vôo) e aeroportuários (funcionários da Infraero, que administram os aeroportos), Klafke denuncia a política de “privatizar o filé e estatizar o osso”. Mercado vitaminado O filé, aliás, é mais do que suculento, pois além do mercado interno vitaminado, temos ainda pela frente a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. De olho nesta maciez, a estadunidense ADC & HAS e a espanhola OHL são algumas das transnacionais que se associaram a empresas brasileiras para candidatar-se ao butim. Vale lembrar que os três terminais em voga realizaram juntos, apenas nos nove primeiros meses do ano passado, cerca de 40 milhões de embarques e desembarques de passageiros. Conforme projeções da Infraero (Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária), só o Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas, fechou 2011 com movimento de 7,6 milhões de passageiros de voos domésticos e internacionais, 28,5% maior que o do ano anterior, quando 5,43 milhões de pessoas passaram pelos terminais de embarque e desembarque. Em sete anos, o movimento no aeroporto de Campinas cresceu 1.025%. “Por estas e outras razões somos contra o governo abrir mão do controle dos aeroportos brasileiros e, portanto, da Infraero como empresa pública. Esse modelo de concessão e privatização já demonstrou ao longo da década de 1990 que traz imensos prejuízos à população, tanto em termos de tarifa como de qualidade dos serviços prestados”, declarou Artur Henrique, presidente nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Marcado para o dia 6 de fevereiro, o leilão entregará ao capital privado – nacional e transnacional – o controle de três terminais Condenando a decisão do BNDES, Artur questionou a irracionalidade do modelo. “Fica a pergunta: se o BNDES pode emprestar 80% para o setor privado, por que não para a Infraero? Eu não sei. Imagino, mas não sei”. O dirigente cutista também alertou que o edital não aponta para a necessidade do controle da torre de pousos e decolagens – do fluxo aéreo – permanecer nas mãos do Estado, o que atenta contra a segurança dos usuários, que ficarão à mercê da lógica e do interesse das empresas. “Mais do que um problema, é o fato de abrir mão da Infrae- Aeroporto Juscelino Kubitschek em Brasília, um dos alvos da desnacionalização ro”, sublinhou, já que a empresa é responsável por toda a infraestrutura aeroportuária, desde a terraplanagem para a construção de pistas de pouso até o próprio controle aéreo dos aeroportos. A estadunidense ADC & HAS e a espanhola OHL são algumas das transnacionais que se associaram a empresas brasileiras para candidatar-se ao butim Campanha midiática O presidente do Sindicato Nacional dos Aeroportuários, Francisco Lemos, condenou o estímulo do BNDES à desnacionalização como “uma aberração e uma imoralidade financeira que precisam ser barradas pela Justiça”. Lemos denunciou a “postura facciosa da grande mídia, que partindo do princípio que uma administração privada é mais eficiente do que a pública, manipu- la as informações”. Mas bem diferente da propaganda privatista, lembrou, a realidade se impõe com “as tampas de bueiros voando nas avenidas do Rio de Janeiro, as panes nos serviços da internet e nos apagões nos serviços de energia elétrica”. Em sua campanha desinformativa, frisou, os conglomerados de comunicação “escondem do grande público que 85% dos aeroportos em todo o mundo são públicos, inclusive nos Estados Unidos”. Contra o formato Lemos destaca que em nenhum momento os trabalhadores – representados pela CUT e pelo SINA – foram contra a parceria com o setor privado. “O que sempre questionamos é o formato da concessão/privatização, ainda mais agora que aponta para uma desnacionalização turbinada com recursos públicos. Entendemos que as atividades fim – operações, segurança aeroportuária, carga aérea, manutenção especializada e navegação aérea – dos três aeroportos em processo de concessão devem permanecer sob a responsabilidade da Infraero”. E sobram argumentos para essa defesa. “Na história da aviação, 98% dos acidentes aéreos ocorreram nos processos de pouso e decola- gem e apenas 2% em cruzeiro. Significa dizer que os aeroportos são a parte mais sensível e que a operação dos mesmos não pode ser entregue a quem não tem experiência, através de terceirização e até quarteirização da atividade”, acrescentou. Os conglomerados de comunicação “escondem do grande público que 85% dos aeroportos em todo o mundo são públicos, inclusive nos Estados Unidos” Além dos seus 38 anos de experiência, a Infraero é reconhecida internacionalmente pela sua competência na operação da infraestrutura aeroportuária. Lemos destaca que “a Infraero é a guardiã da soberania nacional”. Afinal, esclareceu, “pelos aeroportos – além de passageiros – trafegam cargas de alto valor agregado, infecto-contagiosas, vivas, explosivas, radiativas, numerário da Casa da Moeda, além de condenados pela Justiça do Brasil de outros países”. Acordo com a Infraero garante estabilidade Antonio Cruz-ABr Para o presidente do Sindicato Nacional dos Aeroportuários, trabalhadores vão lutar para evitar repetição da tragédia neoliberal de São Paulo (SP) Resultante de negociações com o governo e o Sindicato Nacional dos Aeroportuários (SINA), a assinatura do Acordo Coletivo de Trabalho com a Infraero e a Carta Compromisso da Secretaria de Aviação Civil da Presidência da República representam segurança aos trabalhadores para que não se repita a tragédia das demissões em massa, ocorridas durante os governos Collor e FHC, avalia Lemos. Reafirmando a contrariedade com as concessões de aeroportos e a determinação dos trabalhadores de barrar a negociata, o presidente do sindicato destaca que foram construídas barreiras para a repetição de dolorosas experiências neoliberais. Entre outros pontos, a Secretaria de Aviação Civil se comprometeu a incluir nos editais e contratos de concessão dos aeroportos a estabilidade no emprego para os empregados transferidos da Infraero por cinco anos; garantia de representação sindical no local de Saguão do Aeroporto de Brasília “Os acordos foram feitos para garantir minimamente a dignidade e as condições de trabalho da nossa categoria” trabalho e participação de representante dos empregados no comitê de transição de cada aeroporto concedido; condições de trabalho equivalentes às vigentes na Infraero e manutenção da mesma data-base; e indicação de representante dos trabalhadores no Conselho de Administração das concessionárias e, principalmente, a coibição da mão de obra terceirizada, como foi feito em setores como o elétrico e telecomunicações. “Os acordos foram feitos para garantir minimamente a dignidade e as condições de trabalho da nossa categoria, mas não pouparemos ações políticas e jurídicas para frear essa proposta neoliberal de privatização”, sublinhou Lemos. (LWS)