SUICÍDIO: UM PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA Ana Losso ETMOLOGIA • SUI : SI MESMO • CAEDES : AÇÃO DE MATAR “É o ato de matar a si mesmo” Thomas Browne-1642 A HISTÓRIA • Sempre houve: o homem enquanto ser pensante; • Todos os sexos; • Todas as faixas etárias; • Todas as classes sociais: perda do status; • Todas as civilizações e culturas. Exemplos • Rituais para lidar com os corpos; • Os Vikings enalteciam as mortes violentas. Aqueles que morriam em batalhas ou por suicídio, iriam para o Paraíso; • Os Esquimós, separavam-se do grupo para morrerem sós, possibilitando mais alimentos para os jovens; • Os Astecas ofereciam-se como oferendas aos deuses em rituais de morte; Exemplos • Em Uganda, a mãe deveria matar-se; • Na China antiga, alguns homens se matavam antes das batalhas, acreditando que suas almas dariam forças para os que iam lutar; • Os Aborígenes da Tasmânia, ao serem caçados como cangurus, recusaram-se a procriar, extinguindo-se em três décadas; • Os nativos da América iam em procissão atirar-se dos penhascos. A Igreja • Heresia; • Stº Agostinho (533 d.C) proíbe homenagem; • Dá à Igreja e ao Estado os bens do suicida; • Cria aversão e horror ao ato; • Séc. XI, São Bruno: “mártires de satã”. Consequências • Os corpos passam a ser tratados cruelmente nas diferentes sociedades: Inglaterra: enterrados de bruços com estacas no peito; França: arrastados por cavalos pelas ruas da cidade. Revolução Francesa • Séc. 17 e 18: diminui a repressão devido a nova legislação; • Igreja mais tolerante; • Família tem o direito de loucura para livrar-se das punições. Estudos • Séc. 19 : Émile Durkheim (1897), as questões foram remetidas às condições sociais e não mais à moralidade. O SUICÍDIO É UM DRAMA PESSOAL QUE TRANSCORRE NUM PALCO DE RELAÇÕES INTERPESSOAIS, EM UM AMBIENTE SOCIAL, POLÍTICO E CULTURAL O FENÔMENO COMPLEXO. NÃO EXISTE UMA ÚNICA EXPLICAÇÃO. VÁRIOS FATORES ASSOCIADOS. PROCESSO. • Fatores psicológicos; • Fatores sociais; • Fatores ambientais; • Fatores familiares; • Fatores culturais; • Fatores genéticos. Fatores Psicológicos • A maioria tem um transtorno mental diagnosticável; • O suicídio e o comportamento suicida são mais freqüentes em pacientes psiquiátricos; • A maioria não procura um profissional de saúde mental. Doenças • Depressão (todas as formas); • Transtorno de personalidade (anti-social, borderline com traços de impulsividade, agressividade e freqüentes alterações do humor); • Alcoolismo; • Esquizofrenia; • Transtorno mental orgânico. Fatores Sociodemográficos e Ambientais • • • • • • • Desemprego; Perda de status sócio-econômico; Profissão; Migração; Sexo; Idade; Estado civil. Fatores Familiares • Problemas interpessoais (discussão com esposa, namorado, filhos); • Rejeição (separação); • Perdas (luto, status); • Problemas com o trabalho (demissão, aposentadoria; dificuldades financeiras); • Mudanças na sociedade (políticas e econômicas); • Vergonha (falência, vícios). MITOS • • • • Quem fala não faz; Quem quer se matar, se mata; Suicídios ocorrem sem avisos; A melhora após a crise significa que o risco passou; • Nem todos os suicídios podem ser evitados; • Uma vez suicida, sempre suicida. COMPORTAMENTO SUICIDA GRITO DE DOR PEDIDO DE SOCORRO COMPORTAMENTO SUICIDA EPIDEMIOLOGIA • 1 milhão de pessoas cometeram suicídio no ano de 2000; • A cada 40 segundos uma pessoa pratica o ato; • A cada 3 segundos, uma atenta contra a própria vida; • Está entre as 10 causas de morte mais freqüente em todas as idades; • É a 3ª causa de morte entre 15 e 35 anos; • Existem 10 tentativas para cada ato consumado; • 4 tentativas NÃO conhecidas para cada 1 registrada. CONSEQUENCIAS • Vem ocorrendo um aumento na faixa etária de 15-35 anos; • Para cada suicídio, há em média, 5 ou 6 pessoas próximas que sofrem conseqüências emocionais, sociais e econômicas; • 1,4% do ônus global ocasionado por doenças em 2002 foi devido à tentativas de suicídio. PORCENTAGEM DE SUICÍDIOS Por idade, em países selecionados 44% 47% 53% 56% 5-44 anos 1950 45 + anos 1995 WHO, 2000 Distribuição dos Suicídios por Faixa Etária no Município de São Paulo 34% 5 a 44 anos 45 + anos 66% (PRO-AIM, 1996-2002) V el ho Br a nco Man a us Boa Vis t a Bel ém Mac apá Pal mas São Luís Ter esi n a For tale za Nat al J oã oP es s oa Rec ife Mac eió Ar a c aju Sal va d or Bel oH or iz onte Vi tó r ia Rio de J a ne ir o São Pau lo Cur iti ba Flor ia nó poli s Por to A legr Cam e po Gr a nde Cui abá G oi âni a Br a s íli a méd ia C api t ais Rio Por to Capitais Brasileiras: Suicídio . 16 14 12 10 8 6 4 2 0 Masculino Feminino Fonte: Coeficientes padronizados por idade calculados com base nos dados do SIM (cd-rom 1979-1996 e 1996-2000) e estimativas de população do IB Suicídio e Transtornos Mentais Análise de 15.629 casos de suicídio Sem diagnóstico 3.2% Transtornos do humor 35.8% Transtornos de personalidade 11.6% Esquizofrenia 10.6% Transtornos relacionados ao uso de substâncias 22.4% Bertolote e cols., 2003 97% DAS PESSOAS QUE COMETEM SUICÍDIO TÊM UM TRANSTORNO MENTAL Depressão Transtorno de personalidade impulsividade, agressividade variação súbitas do humor Dependência de álcool / drogas Esquizofrenia SUICÍDIO, TENTATIVAS E DEPRESSÃO Depressão Tentativas 15% de suicídio Suicídio 45-70% com transtorno do humor Botega e cols., 2006 10% 40-65% com tentativa de suicídio anterior ALCOOLISMO • O álcool diminui a crítica e aumenta a impulsividade • Cerca de um terço dos casos de suicídio estão ligados à dependência do álcool • • 5 a 10% das pessoas dependentes de álcool terminam sua vida pelo suicídio No momento do ato suicida muitos se encontravam alcoolizados ESQUIZOFRENIA PERÍODOS DE MAIOR RISCO • Entre as crises, quando paciente percebe e não elabora limitações acarretadas pela doença • Durante a crise, ao responder a vozes de comando (alucinações) que o levam a se matar • No período logo após a alta hospitalar SUPRE-MISS Inquérito Epidemiológico Informações sociodemográficas Problemas da comunidade História de tentativa de suicídio Dados sobre a família Saúde geral, utilização de serviços de saúde geral e mental Álcool e drogas SUPRE-MISS Principais questões PENSAMENTOS Você já pensou seriamente em por fim à sua vida? PLANOS Você chegou a planejar como faria isso? TENTATIVAS Alguma vez você tentou o suicídio? AO LONGO DA VIDA . . . ATENDIDOS EM PRONTO-SOCORRO 1 3 5 17 TENTATIVA DE SUICÍDIO PLANO PENSAMENTO De cada 100 habitantes NOS ÚLTIMOS 12 MESES... 0,4% TENTATIVA DE SUICÍDIO 2% 5% PLANO PENSAMENTO De cada 100 habitantes BRASIL • Encontra-se no grupo de países com taxas baixas de suicídio (3,9 a 4,5/100mil hab.); • Como se trata de um país populoso, está entre os 10 países com maiores nº absolutos de suicídio (7.987 em 2004); • Alguns estados já apresentam taxas comparáveis aos países apontados como de freqüência de média a elevada (OMS); • Rio G. do Sul: 16,6; • Sta. Catarina: 12,0. O QUE FAZER? FATORES DE RISCO PARA O SUICÍDIO Atenção! Os principais fatores de risco para o suicídio são: História de tentativa de suicídio Presença de transtorno mental FATORES DE PROTEÇÃO PARA O SUICÍDIO • • • • Religiosidade Proximidade com a família Percepção otimista da vida Gravidez e maternidade • Ter uma ocupação/emprego • Rede social (interdependência) • Capacidade de enfrentamento (coping) AVALIAÇÃO DE PACIENTES COM RISCO DE SUICÍDIO 1 2 3 Ouvir atentamente Conhecer fatores de risco Fazer algumas perguntas GERAIS ESPECÍFICAS Se eu perguntar sobre suicídio... Posso induzir um suicídio? Vou ter que carregar o problema da pessoa? Não ! Peça ajuda! AVALIAÇÃO DE PACIENTES COM RISCO DE SUICÍDIO FRASES DE ALERTA • “Eu preferia estar morto” • “Eu não posso fazer nada” • “Eu não agüento mais” • “Eu sou um perdedor e um peso para os outros” • “Os outros vão ser mais felizes sem mim” AVALIAÇÃO DE PACIENTES COM RISCO DE SUICÍDIO SENTIMENTOS 4D DESESPERANÇA DESAMPARO DESESPERO Como ajudar a pessoa com risco de suicídio? 1- lugar adequado 2- reserve tempo 3- ouça efetivamente Ouça com cordialidade. Trate com respeito. Empatia com as emoções. Cuidado com o sigilo. O que perguntar para avaliar o risco? • Tem obtido prazer nas coisas que tem realizado? • Sente-se útil na vida que está levando? • Sente que a vida perdeu o sentido? • Tem esperança de que as coisas vão melhorar? • Pensou que seria melhor morrer? • Tem pensamentos de por fim à própria vida? • São idéias passageiras ou persistentes? • Pensou em como se mataria? • Chegou a fazer algum preparativo? • Você tem com quem contar, pedir ajuda? • É capaz de se proteger até a próxima consulta? • Tem esperança de ser ajudado? TÓPICOS IMPORTANTES Descobrir se a pessoa tem um plano definido para cometer suicídio: • Você fez algum plano para acabar com sua vida? • Você tem uma idéia de como vai fazê-lo? Descobrir se a pessoa tem os meios para se matar: • Você tem pílulas, uma arma, veneno, ou outros meios? • Os meios são facilmente disponíveis para você? Descobrir se a pessoa fixou uma data: • Você decidiu quando você planeja acabar com sua vida? • Quando você está planejando fazê-lo? Todas estas questões precisam ser perguntadas com cuidado, preocupação e compaixão. AVALIAÇÃO DE PACIENTES COM RISCO DE SUICÍDIO BAIXO RISCO • A pessoa teve alguns pensamentos suicidas: “Eu não consigo continuar” “Eu gostaria de estar morto” mas não fez nenhum plano. Ação Necessária • Oferecer apoio emocional • Trabalhar sobre os sentimentos suicidas • Focalize nos aspectos positivos da pessoa • Se você não conseguir identificar uma condição tratável e/ou a pessoa não demonstra melhora, não consegue refletir sobre sua condição, encaminhe-a para um profissional de saúde mental. MÉDIO RISCO • A pessoa tem pensamentos e planos, mas não tem planos de cometer suicídio imediatamente. Ação Necessária • Oferecer apoio emocional. • Trabalhar sobre os sentimentos suicidas. • Focalize nos aspectos positivos da pessoa. • Focalize os sentimentos de ambivalência. • Explore alternativas ao suicídio. • Faça um contrato • Encaminhe a pessoa a um psiquiatra. • Peça autorização ao paciente, entre em contato com a família, amigos e/ou colegas e reforce seu apoio. • Oriente sobre medidas de prevenção. Negocie com sinceridade, explique e peça o aval do paciente para todas as medidas a serem tomadas. ALTO RISCO • A pessoa tem um plano definido, tem os meios para fazê-lo, e planeja fazê-lo prontamente. Muitas vezes já tomou algumas providências prévias (cartas, pagamento de contas, testamento) e parece estar se despedindo. Ação Necessária • Estar junto da pessoa. Nunca deixá-la sozinha. • Gentilmente falar com a pessoa e remover os comprimidos, faca, arma, venenos, etc. • Fazer um contrato, como descrito anteriormente, tente ganhar tempo. • Entrar em contato com um profissional da saúde mental ou do serviço de emergência mais próximo. Providenciar uma ambulância e encaminhá-la. • Informar a família e reafirmar seu apoio . Se você esgotou todas as tentativas de convencimento do paciente para uma internação voluntária e percebe um risco de suicídio iminente, peça ajuda da família, pois uma internação involuntária poderá ser necessária. RESUMINDO: O QUE FAZER • Ouvir, mostrar empatia, e ficar calmo; • Ser afetuoso e dar apoio; • Leve a situação a sério e verifique o grau de risco; • Pergunte sobre tentativas anteriores; • Explore as outras saídas, além do suicídio; • Pergunte sobre o plano de suicídio; • Ganhe tempo – faça um contrato; • Identifique outras formas de dar apoio emocional; • Remova os meios, pelos quais a pessoa possa se matar; • Tome atitudes, consiga ajuda; • Se o risco é grande, fique com a pessoa. O QUE NÃO FAZER • Ignorar a situação; • Ficar chocado ou envergonhado e em pânico; • Tentar se livrar do problema acionando outro serviço e considerar-se livre de qualquer ação; • Falar que tudo vai ficar bem, sem agir para que isso aconteça; • Desafiar a pessoa a continuar em frente; • Fazer o problema parecer trivial; • Dar falsas garantias; • Jurar segredo; • Deixar a pessoa sozinha. Um dos melhores indicadores para a avaliação do risco de suicídio será a consciência do avaliador de sua própria ansiedade diante do paciente. A incapacidade para experimentar ansiedade nessas ocasiões, em decorrência de um contato empático pobre, da falta de tempo, ou de defesas excessivamente fortes, impedirá a avaliação. PORTARIA 1.876 - 14/08/06 Institui as Diretrizes Nacionais para a Prevenção do Suicídio, a serem implantadas em todas as unidades federadas, respeitadas as competências das três esferas de gestão. ESTRATÉGIAS 1- Desenvolver estratégias de promoção de qualidade de vida, de educação, de proteção e de recuperação da saúde e prevenção de danos; 2- Desenvolver estratégias de informação, de comunicação e sensibilização da sociedade de que o suicídio é um problema de saúde pública que pode ser prevenido; 3- Organizar linha de cuidados integrais (promoção, prevenção, tratamento e recuperação) em todos os níveis de atenção, garantindo o acesso às diferentes modalidades terapêuticas; 4- Identificar a prevalência dos determinantes e condicionantes do suicídio e tentativas, assim como os fatores protetores e o desenvolvimento de ações intersetoriais de responsabilidade pública, sem excluir a responsabilidade de toda a sociedade; 5- Fomentar e executar projetos estratégicos fundamentados em estudos de custo-efetividade, eficácia e qualidade, bem como em processos de organização da rede de atenção e intervenções nos casos de tentativas de suicídio; 6- Contribuir para o desenvolvimento de métodos de coleta e análise de dados, permitindo a qualificação da gestão, a disseminação das informações e dos conhecimentos; 7- Promover intercâmbio entre os Sistema de Informações do SUS e outros sistemas de informações setoriais afins, implementando e aperfeiçoando permanentemente a produção de dados e garantindo a democratização das informações; 8- Promover a ed. Permanente dos profissionais de saúde das unidades de atenção básica, inclusive do PSF, dos serviços de S.M., das unidades de urgência e emergência, de acordo com os princípios da integralidade e humanização.