ESCOLA PAULISTA DE DIREITO. PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES. Flávio Tartuce. Professor do programa de mestrado e doutorado da Faculdade Autônoma de Direito, São Paulo (FADISP). Professor dos cursos de graduação e pós-graduação lato sensu da Escola Paulista de Direito (EPD). Doutor em Direito Civil pela USP. Diretor do IBDFAM-Nacional e do IBDFAMSP. Advogado, consultor jurídico e parecerista. CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. • SERIA VIÁVEL UMA CONTRATUALIZAÇÃO DO DIREITO DE FAMÍLIA? O tema foi abordado em painel realizado na XV Conferência Mundial da ISFL, realizada em Recife, entre os dias 6 a 9 de agosto de 2014. Part I Contratualização do Direito de Família Frederik Swennen – Bélgica. Part II Des-contratualização do Direito da Família 2 Elisabeth Alofs – Bélgica. CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. Questões apresentadas no painel: • Maior peso sobre a autonomia privada nas relações de família (desenho do pêndulo). • Diferenças econômicas entre homens e mulheres. • Principiologia próxima? A boa-fé é aplicada nas relações familiares. • Possibilidade de aplicação da cláusula rebus sic stantibus para o regime de bens. • Divisão patrimonial diferenciada para tutelar a parte mais fraca, mitigando a autonomia privada: “a igualdade nem sempre é justiça” (Alofs). • Seria possível utilizar para o Direito de Família parâmetros de proteção que existem nos contratos de consumo ou de trabalho 3 (Alofs)? O QUE É CONTRATO? . • CONCEITO MODERNO OU “CLÁSSICO”. DE CONTRATO. O contrato é um negócio jurídico bilateral ou plurilateral que visa à criação, à modificação ou à extinção de direitos e deveres com conteúdo patrimonial. Noção retirada do art. 1.321 do Código Civil Italiano. • CONCEITO PÓS-MODERNO OU CONTEMPORÂNEO DE CONTRATO. O contrato é uma relação intersubjetiva, baseada no solidarismo constitucional, e que traz efeitos existenciais e patrimoniais não somente em relação à partes contratantes, mas também em relação a terceiros (Paulo Nalin. Contrato: conceito pós-moderno. Editora Juruá). 4 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. O contrato contemporâneo também está atrelado a valores existenciais? Sim. Seria esse um sentido da eficácia interna do princípio da função social do contrato (art. 421 do CC e Enunciado n. 360 da IV Jornada de Direito Civil – Conselho da Justiça Federal)? Enunciado n. 23 I Jornada: “A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio quando presentes interesses metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana”. 5 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. Eficácia externa da função social do contrato (tutela externa do crédito). Teoria do terceiro cúmplice. Aplicável para o casamento, para responsabilizar o amante? Ver Art. 608 do CC. No Brasil, o STJ entende que não. No mesmo sentido, na doutrina: Otávio Luiz Rodrigues. 6 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. “Descumprimento dos deveres conjugais de lealdade e sinceridade recíprocos. Omissão sobre a verdadeira paternidade biológica. Solidariedade. Valor indenizatório. Exige-se, para a configuração da responsabilidade civil extracontratual, a inobservância de um dever jurídico que, na hipótese, consubstancia-se na violação dos deveres conjugais de lealdade e sinceridade recíprocos, implícitos no art. 231 do CC/16 (correspondência: art. 1.566 do CC/02). Transgride o dever de sinceridade o cônjuge que, deliberadamente, omite a verdadeira paternidade biológica dos filhos gerados na constância do casamento, mantendo o consorte na ignorância. O desconhecimento do fato de não ser o pai biológico dos filhos gerados durante o casamento atinge a honra subjetiva do cônjuge, justificando a reparação pelos danos morais suportados. A procedência do pedido de indenização por danos materiais exige a demonstração efetiva de prejuízos suportados, o que não ficou evidenciado no acórdão recorrido, sendo certo que os fatos e provas apresentados no processo escapam da apreciação nesta via especial. Para a materialização da solidariedade prevista no art. 1.518 do CC/16 (correspondência: art. 942 do CC/02), exige-se que a conduta do ‘cúmplice’ seja ilícita, o que não se caracteriza no processo examinado”. (STJ, REsp 742.137/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/08/2007, DJ 29/10/2007, p. 218) 7 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. O CASAMENTO É UM CONTRATO? Teorias quanto ao casamento: 1ª) Teoria institucionalista (MHD). 2ª) Teoria contratualista (Sílvio Rodrigues). 3ª) Teoria mista ou eclética – negócio jurídico especial (Eduardo de Oliveira Leite). Qual a teoria que prevalece atualmente no Brasil? 8 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. CONTRATOS DE CASAMENTO. O PACTO ANTENUPCIAL. Para Paulo Luiz Netto Lôbo: “O pacto antenupcial é o negócio jurídico bilateral de direito de família mediante o qual os nubentes têm autonomia para estruturarem, antes do casamento, o regime de bens distinto da comunhão parcial” (Código Civil..., 2003, p. 270). O PACTO ANTENUPCIAL É UM CONTRATO? SE SIM, SERIA POSSÍVEL APLICAR OS PRINCÍPIOS DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO E DA BOA-FÉ OBJETIVA? 9 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. “Ação anulatória. Tutela antecipada que suspendeu os efeitos do pacto antenupcial firmado entre as partes. Manutenção. Como qualquer negócio jurídico, está sujeito a requisitos de validade e deve ser iluminado e controlado pelos princípios da boa-fé objetiva e da função social. Não se alega coação e nem vício de consentimento, mas nulidade por violação a princípios cogentes que regem os contratos. Pressupõe o regime da comunhão universal de bens a comunhão de vidas, a justificar a construção de patrimônio comum, afora as exceções legais” (...). 10 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. “O litígio entre o casal, que desbordou para os autos do inventário da genitora da autora, e a significativa mutação patrimonial fundada em casamento de curtíssima duração, autorizam a suspensão dos efeitos do pacto antenupcial. Não há como nesta sede acatar os argumentos do recorrente acerca de violação a direito adquirido, ou a exercício regular de direito, pois o que por ora se discute é a validade do negócio nupcial, e sua aptidão a gerar efeitos patrimoniais. Decisão mantida. Recurso não provido” (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Agravo de Instrumento 569.461.4/8, Acórdão 2706323, São Paulo, 4.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Francisco Eduardo Loureiro, j. 10.07.2008, DJESP 29.07.2008). 11 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. A QUESTÃO DA OUTORGA CONJUGAL. “Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; III - prestar fiança ou aval; IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação. Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada”. Art. 1.649. A falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária (art. 1.647), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois 12 anos depois de terminada a sociedade conjugal”. CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. CONTRATOS DE CASAMENTO. A QUESTÃO DA OUTORGA CONJUGAL. Mas qual seria esse regime da SEPARAÇÃO ABSOLUTA? A QUESTÃO DEVE SER RESPONDIDA SOB O PRISMA DA SÚMULA 377 DO STF. 1ª Corrente: A súmula está cancelada (Sílvio Rodrigues, José Fernando Simão e Francisco Cahali). Haverá separação absoluta tanto na separação legal quanto na convencional de bens. 2ª Corrente: A súmula não está cancelada (Giselda Hironaka, Rolf Madaleno, Maria Helena Diniz, Sílvio Venosa, Maria Berenice Dias, Paulo Lôbo, Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho). Haverá separação absoluta somente na separação convencional de bens. A questão divide a doutrina, prevalecendo a segunda corrente.13 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. E A JURISPRUDÊNCIA? QUAL O ENTENDIMENTO QUANTO À SÚMULA 377 DO STF? PREVALECE HOJE NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA BRASILEIRO O ENTENDIMENTO DE APLICAÇÃO DA SÚMULA, INDEPENDENTEMENTE DA PROVA DO ESFORÇO COMUM. O STJ transformou a separação obrigatória de bens em uma comunhão parcial? 14 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. AÇÃO DE INVENTÁRIO QUE VISA À PARTILHA DE BENS ADQUIRIDOS NA CONSTÂNCIA DE SOCIEDADE CONJUGAL FORMADA SOB O REGIME DE SEPARAÇÃO LEGAL DE BENS. ART. 258 DO CC/1916. ESFORÇO COMUM. SÚMULA N. 377/STF. PRECEDENTES DO STJ. 1. A partilha dos bens adquiridos na constância da sociedade conjugal, erigida sob a forma de separação legal de bens (art. 258, parágrafo único, I, do CC/1916), não exige a comprovação ou demonstração de comunhão de esforços na formação desse patrimônio, a qual é presumida, à luz do entendimento cristalizado na Súmula n. 377/STF. Precedentes do STJ”. (...). 15 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. “ 2. A necessidade de preservação da dignidade da pessoa humana e de outras garantias constitucionais de igual relevância vem mitigando a importância da análise estritamente financeira da contribuição de cada um dos cônjuges em ações desse jaez, a qual cede espaço à demonstração da existência de vida em comum e comunhão de esforços para o êxito pessoal e profissional dos consortes, o que evidentemente terá reflexos na formação do patrimônio do casal. 3. No caso concreto, a recorrente, ora agravada, foi casada com o agravante por aproximadamente 22 (vinte e dois) anos pelo regime da separação legal de bens, por imposição do art. 258, parágrafo único, I, do CC/1916, portanto, perfeitamente aplicável o entendimento sedimentado na Súmula n. 377 do STF, segundo o qual os aquestos adquiridos na constância do casamento, pelo regime da separação legal, são comunicáveis, independentemente da comprovação do esforço comum para a sua aquisição, que, nessa hipótese, é presumido. 4. Agravo regimental desprovido”. (STJ, AgRg no REsp 1008684/RJ, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 24/04/2012, DJe 02/05/2012) 16 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. CONTRATOS DE UNIÃO ESTÁVEL. CONTRATO DE CONVIVÊNCIA. Conceito e viabilidade diante do art. 1.725 do CC. Há diferenças entre o art. 1.725 do CC e o art. 5º da Lei n. 9.278/1996? Como conciliar o contrato de convivência com o art. 1.724 do CC? Formas de contratação. É possível converter um pacto antenupcial em contrato de convivência? O contrato de convivência pode criar um outro regime, além daqueles que constam do Código Civil de 2002? O art. 1.641 do Código Civil impõe o regime da separação obrigatória para o contrato de convivência? O art. 1.647 do CC tem aplicação à união estável? 17 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. CLÁUSULAS ESPECIAIS DO CONTRATO DE CONVIVÊNCIA (FRANCISCO CAHALI). 1. Participação em fração diferenciada sobre o patrimônio adquirido na constância da união. 2. Participação diferenciada em certos e determinados bens ou direitos. 3. Pacto de outorga de usufruto ao companheiro. 4. Pacto de outorga de direito real de habitação ao companheiro. 5. Pacto que estabelece critérios para a partilha de bens. 6. Cláusula de indenização por rompimento da relação. 7. Cláusula sob condição. Ex: Doação a filho nascido da união. 8. Convenção de arbitragem no contrato de convivência. 9. Cláusula que modifica a administração dos bens. 10.Cláusula de exclusão dos alimentos. 18 11.Cláusula de exclusão da herança. CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. CONTRATO DE CONVIVÊNCIA E CONTRATO DE NAMORO. PABLO STOLZE GALIANO: “Em nosso pensamento, temos a convicção de que tal contrato é completamente desprovido de validade jurídica. A união estável é um fato da vida, uma situação fática reconhecida pelo Direito de Família que se constitui durante todo o tempo em que as partes se portam como se casados fossem, e com indícios de definitividade. Salientando esta característica, SILVIO DE SALVO VENOSA, festejado civilista nacional, lembra que enquanto o casamento é um negócio, a união estável, diferentemente, é um “fato jurídico” (DIREITO CIVIL – Direito de Família, ATLAS, 2003) . Por isso, não se poderia reconhecer validade a um contrato que pretendesse afastar o reconhecimento da união, cuja regulação é feita por normas cogentes, de ordem pública, indisponíveis pela simples vontade das partes”. 19 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. REGINA BEATRIZ TAVARES DA SILVA: “O ato pelo qual duas pessoas afirmam que namoram e ainda não constituíram família é mera declaração, que pode ser realizada por meio de documento particular ou público, na presença de duas testemunhas que confirmam o fato declarado (Código Civil/2002, art. 107). Portanto, a princípio, não existe qualquer ilicitude numa declaração de namoro. No entanto, não se pode desvirtuar a finalidade daquela declaração. Ela somente é lícita e válida se retratar a realidade, de simples namoro, sem constituição de família. Se assim for, não se trata de ato ilícito, como tem sido afirmado, porque a declaração em tela não viola direito e não causa dano a outrem (Código Civil/2002, art. 186). Bem ao contrário, tal declaração tem em vista precisamente evitar que de um namoro possam advir danos caso um dos partícipes dessa 20 relação queira locupletar-se indevidamente em seu término”. CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. AFIRMAÇÃO DO DESEMBARGADOR DO TJ/RS LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS A RESPEITO DO CONTRATO DE NAMORO. Decisão da 7.ª Câmara do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Proc. 70006235287: “Esses abortos jurídicos que andam surgindo por aí, que são nada mais que o receio de que um namoro espontâneo, simples e singelo, resultante de um afeto puro, acabe se transformando em uma união com todos os efeitos patrimoniais indesejados ao início” 21 CONTRATOS DE DIREITO DE FAMÍLIA. O CONTRATO DE UNIÃO POLIAFETIVA. (ESCRITURA PÚBLICA DE TUPÃ- SP). “Os declarantes, diante da lacuna legal no reconhecimento desse modelo de união afetiva múltipla e simultânea, intentam estabelecer as regras para garantia de seus direitos e deveres, pretendendo vê-las reconhecidas e respeitadas social, econômica e juridicamente, em caso de questionamentos ou litígios surgidos entre si ou com terceiros, tendo por base os princípios constitucionais da liberdade, dignidade e igualdade.” VIÁVEL JURÍDICAMENTE? ARGUMENTOS CONTRÁRIOS. ARGUMENTOS FAVORÁVEIS. 22 FIM! MUITO OBRIGADO! Contatos: www.flaviotartuce.adv.br. [email protected]. 23