42 PRÓXIMAPARAGEM
Passeio
de Domingo
o princípio da linha
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PRÓXIMAPARAGEM
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Há passeios que ficam a ganhar com um
Havia pedras, pinheiros que mal passavam
pouco de imaginação. E a imaginação, neste
de arbustos, uma ou outra piteira e um ar de
caso, pode bem alimentar-se de algum conhe-
abandono que metia dó. Por isso, as carrua-
cimento. Saber como foi esta zona pode pou-
gens metiam-se pelo interior, pelas estradas de
par-nos a algumas visões menos elogiosas do
poeira que passavam por entre verduras mais
presente.
amenas, virando as costas a um rio já meio sal-
Tal como o encanto das octogenárias vive ainda
gado e procurando os prazeres do campo nes-
na memória de quem as conheceu na força dos
sas colinas com vista para a água. Era o tempo
vinte anos e perscruta por entre as rugas sinais
em que a primeira linha de mar ainda não tinha
dessa beleza que se esfumou, passear de Algés
sido inventada como argumento de lucro. Por
a Oeiras sabendo como cálida e campestre foi
ali, viviam em casebres insalubres pescadores
aquela zona pode pouparmos a algum dissabor
pobres e curtidos pelo sol.
paisagístico e alegrar-nos perante a descoberta
de um sinal da beleza antiga.
Algés
Comecemos pelo mais impensável. Imaginemos
Algés era tão longe da capital que se procurava a
este passeio – que fazemos pela estrada margi-
sua paz para um merecido descanso e as águas
nal ou no comboio – a ser feito por uma estrada
mansas de um rio, para se tomar “banhos de
tada das quintas célebres – de que hoje restam
vada e aí, no recato e na escuridão do madei-
os nomes a enfeitar bairros residenciais ou cen-
rame, molhavam rapidamente o corpo vestido na
tros empresariais – como a Quinta do Marquês
água que tinha um vago sabor a sal.
tesouros meios escondidos
ou a Quinta da Fonte, em Oeiras.
Frente à praia, o Palácio Anjos, hoje centro de
pela empilhada e caótica
Tempos houve em que aquela zona da costa era
arte, foi construído por um capitalista que com-
um conjunto de colinas onde raquíticos pinhei-
prou uma nesga de terra da quinta dos Condes
ros cresciam com muito esforço e fraco resul-
de Cabral.
Ir a banhos ao Dafundo
já foi coisa fina. Aquela zona estreita e rural que serpenteava, ora se aproxi- mar”. Metiam-se as damas e cavalheiros num
mando do rio, ora procurando a frescura abas- barco cujo convés funcionava como uma tina priribeirinha que oscila com
a maré que entra por
S. Julião guarda ainda
construção vertical.
Texto: Isabel Gonçalves
tado, numa inclinação ditada pela bravura da
Fotos: Francisco Sá da Bandeira
brisa atlântica em dias de mau génio.
maio/junho2011
44 PRÓXIMAPARAGEM
Velhas quintas e
paraísos escondidos
estão ainda ao nosso
alcance em passeios
de Domingo. Talvez
um dia se pare de
construir... para se
começar a reconstruir
um fabuloso património.
para Cacilhas, um jardim, cópia do da cerca do
Paço de Arcos
Convento de Cristo em Tomar, e largos hectares
Deixando a marginal, entra-se em Paço de Arcos,
de verde. Hoje, escondido entre prédios, como
que vista dali pouco mais parece que um jardim
cortinas a tapar o rio, o Palácio exibe ainda uma
decadente. Logo à entrada, um edifício amarelado
beleza que nem as ruínas lhe diminuem.
e decrépito com uma fiada de arcos, passa des-
Sem a moldura de bastos hectares verdes que
percebido numa rua estreita. Esse edifício não é
os rodeavam, estes edifícios antigos são hoje difí-
apenas uma referência para o itinerário, é mesmo
ceis de perscrutar, imersos na crescente confu-
a razão do nome da povoação. Ali, por detrás de
são urbanística.
uns prédios na primeira linha da água está, podre
Almeida Garrett procurou o bucolismo da Cruz
e triste, o Paço dos Arcos de cuja varanda, D.
Quebrada para aí escrever. Morou numa casa
Manuel terá visto as naus partirem para a Índia.
da Quinta do Rodízio. Na Casa do Cedro, junto
Ao lado, debruçado sobre a foz do rio, tem um jar-
à Marginal, viveram os exploradores Roberto
dim frondoso com uma vista soberba.
Ivens e Hermenegildo Capelo. Aquilino Ribeiro
No emaranhado de ruas estreitas de Paço de
também escolheu o bucolismo da região para aí
Arcos há um cheiro a passado nos prédios anti-
Meio escondido na zona alta, o Palácio de S.
viver durante uns anos e escrever as suas memó-
gos e num quotidiano de aldeia, que logo adiante
José de Ribamar aguarda agora a reconversão
rias da terra do demo.
se afoga nos prédios altos e uniformes que tudo
em condomínio, mas a sua história começou do
tapam. Mais para o interior, da famosa Quinta da
Caxias
Fonte resta o nome, que agora baptiza um pólo
franciscanos da Arrábida com a condição de ser
Caxias mantém ainda hoje uma volumetria
empresarial já sem memória do sítio fresco para
consagrado a S. José.
urbana saudável. O relevo das suas colinas não
onde rumavam fidalgos fugindo à canícula.
O Aquário Vasco da Gama, construído no final do
foi tapado pela cortina de prédios altos e com-
séc. XIX, era uma novidade para a época e, ainda
pactos tão característicos da linha desde os
Oeiras
hoje, é um local a visitar. Diz-se que a planta ori-
finais dos anos 50. Caxias mantém os palácios
No final do trajecto surge Oeiras. A praia e o seu
ginal ditava um prédio térreo, mas a construção
e as casas senhoriais à vista, a par de constru-
passeio marítimo são coisa recente mas, reza a
da marginal encurtou-lhe o espaço e por isso foi
ções actuais, que não excedem os quatro anda-
história, desde os tempos dos romanos sempre
construído outro andar.
res. O Farol da Gibata, mesmo com o seu colo-
foi considerada local privilegiado. Talvez por isso
séc. XVI quando fidalgos piedosos o doaram aos
rido escarlate, passa despercebido a quem siga
o Marquês de Pombal a escolhesse para aí ins-
Cruz Quebrada
pela estrada. Caxias surge suavemente e o mais
talar os seus domínios compostos por um solar e
Seguindo junto à Ribeira chega-se à Cruz
distraído só se apercebe que chegou quando
três quintas que juntou numa só propriedade.
Quebrada, o nome tão literal que nos chegou
depara com o Forte de S. Bruno. Do outro lado
O Palácio do Marquês de Pombal é um solar
como a história de uma cruz que se quebrou ou,
da linha férrea fica a Quinta Real com o seu jar-
típico do séc. XVIII concebido por Carlos Mardel,
miraculosamente, uma cruz que bradava...
dim e, mais para o interior, a Igreja da Cartuxa
rodeado de jardins. No interior, destaca-se a
Logo à entrada, o Palacete de Santa Sofia dos
e o Paço de Massarelos, sede da Fundação da
beleza dos tectos decorados com pinturas e
Condes de Tomar tinha então uma vista soberba
Casa de Bragança.
estuques da autoria de João Grossi, no exterior é
a altura das araucárias que impressiona.
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