do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo
Cinemas, hoje, ontem.
Silvio Alves de Oliveira Filho usa esta página para escrever ao amigo Aurélio Prieto:
"Meu caro Leio
Havia muito tempo que não ia ao cinema.
Dia 12 passado fui ao Shopping e, por curiosidade, dei uma olhada nos filmes em cartaz. U m
deles me chamou atenção " A s Torres
Gêmeas".Usando dos benefícios de aposentado, paguei meia entrada e me dirigi à Sala 4,
onde estava sendo exibido o filme. Logo que
entrei, fiquei surpreso como o pessoal consome pipocas e refrigerantes; aliás, alguns sacos
tamanho família que, sem dúvida nenhuma,
davam para alimentar umas 15 pessoas.
Surpreso fiquei também com a quantidade
de crianças, no máximo com 7 anos de idade.
Quando as luzes se apagaram, pensei que o
cinema contava com vários "lanterninhas", mas
constatei que eram celulares que iluminavam
aqui, ali, acolá, fazendo que desviasse a atenção do principal que era assistir ao filme.
"Lanterninha" mesmo, não vi nenhum. Muitos
adolescentes conversando alto, rindo não sei
do que, pois o filme não era comédia, muito
pelo contrário. Aliás, fica a pergunta: seja o fume que for, pode entrar todo mundo independente da faixa de idade?
Foi nesse momento que percebi como parei
no tempo, ainda mais eu, que fui um cinéfilo
inveterado! Bateu uma saudade danada quando Mogi contava com cinco cinemas: Avenida,
Urupema, Odeon, Parque e Vera Cruz. Me lembro que, aos sábados à noite, ia ao Urupema,
onde à direita da entrada tinha uma bomboniére,
onde, no máximo, se comprava um Dulcora.
Evitando sempre balas Toffe, pois grudavam
nos dentes (pipoca só vendia fora do cinema) e
saquinho pequeno (aliás tinha mais piruá do que
pipoca. Quando entrava na sala de exibição
batia um forte cheiro de óleo queimado, que
era usado para limpeza do chão. O sinal
alertando para o começo do filme mais parecia
um gongo, as cortinas se abriam e o silêncio
tomava-se quase enlouquecedor, quebrado, às
vezes, por pequenos barulhos ao desembrulhar
os papéis dos drops e das balas, sendo motivo
de incômodo.
Me lembrei com saudades e, ao mesmo tempo, com bronca dos lajiterninhas que faziam marcação cerrada para flagrar a gente ao dar uma
encostadinha no rosto da namorada ou um simples selinho, motivos para ameaça de ser expulso do cinema. Era um sofrimento só, pois se tínhamos alguma liberdade para dar um beijo era
no escurinho do cinema. Fora isso, as chances
eram mínimas. A marcação de pai e mãe eram
implacáveis Quando não tinha namorada, a melhor coisa era pegar a matinê do Urupema. Antes de apagar as luzes, a gente ficava andando
pelos corredores vendo se alguma menina "(*)
dava bola" e, quando acontecia, dava um arrepio danado (não se tinha a ousadia de hoje).
Assim que as luzes se apagavam, sentava na
fileira de trás e dava um toque no ombro da menina e tascava a pergunta: "Posso sentar ao seu
lado?" Resposta afirmativa, ficava de mãos dadas até o final do filme, saía do cinema na maior
alegria e ia contar para os amigos. Só porque
havia assistido ao filme de mãos dadas.
documentos. E hoje, tá tudo liberado?
Domingo à noite era no Avenida, considerado cinema da elite, aliás um belo cinema. A o
ver no que se transformou, dá vontade de chutar o pau da barraca.
Saudades do Odeon que, aos domingos pela
manhã, exibia Sessão Pif-Paf, com seriados do
Tarzan, Flecha Ligeira e outros, que sempre no
melhor pedaço, terminavam, deixando todos em
suspense e comunicando que a seqüência seria na próxima semana, nos obrigando a ir todos os domingos ao cinema para matar a curiosidade de como o "mocinho " saiu-se da enrascada.
O Odeon terminou melancolicamente, exibindo exclusivamente filmes pomos. O Cine
Parque exibia quase que exclusivamente
faroestes. Talvez esteja aí uma das razões da
grande demanda de D V D s piratas, lançados
antes das salas de exibição, pois são baratos,
se assiste no conforto de casa, sem celulares
para atrapalhar, sem necessidade de sair (colocar uma roupa melhorzinha) e pagar estacionamento, sem crianças gritando e comendo pipoca à vontade, sem fila e sem pagar uma nota.
Além de que na hora de dar uma saidinha da
sala, é só apertar a tecla Pause.
Saudades do tempo em que, no encerramento dos filmes aparecia na tela....THE E N D .
Atualmente, acho que até isso caiu de moda.
Se fosse nos dias atuais, certamente seria
tachado como alguém de uma comunidade da
era pré-industrial. Lembro-me de um filme " A
Bela da Tarde", erótico, não pomo, que era proibido para menores de 16 anos. A fiscalização
do Juizado de Menores foi super rigorosa, pedindo documentos para a maioria. Naquele dia,
me diverti muito, pois vi muitas namoradas entrarem e o namorado ser barrado por falta de
(*) dava bola = acho que traduzindo para
os dias atuais deve ser - "fiquei", "vou ficar", mas não me arrisco, pois o vocabulário
tem mudado numa velocidade, que não dá para
acompanhar.
Abraços,
Silvio Alves de Oliveira Filho"
O Cine
Urupema,
em foto
tirada logo
após sua
inauguração,
nos meados
da década
de 1940
O MELHOR DE MOG
0 Rotary Club. A Cidade foi uma das primeiras a instalar esse Com esta Primavera quente e de pouca
clube de serviços no Interior do Estado e sempre teve
chuva, o cheiro dos bueiros da Cidade
participação de destaque na estrutura nacional da entidade.
anda insuportável. Culpa de muito
Ainda hoje mantém programas de atendimento á comunidade, tempo de incúria que faz da rede pluvial,
como o Projeto Rumo, de orientação vocacional, que realiza em vários pontos, escoadouro da rede
anualmente na Universidade Braz Cubas
de esgoto.
A história de
Cida
Prima de minha mãe e um ano mais velha
do que ela, Cida sempre foi uma mulher adiante do seu tempo. Convivemos muito. Apesar da diferença de idade, fomos amigos. Divertia-me com suas lembranças, quando ela
insistia em dizer que foi uma das primeiras
pessoas a me visitar, ainda no berçário da
Maternidade São Paulo, na Rua Frei Caneca. "Não me lembro de ter visto recém-nascido mais bonito, por certo para compensar a
feiúra da maioridade", repetia Cida em cada
encontro. Seja em minha casa de Mogi, no
apartamento de São Paulo ou no seu próprio
apartamento, na Praça Buenos Aires.
O estilo de Cida deve ter sido forjado pelas trilhas que a vida lhe aplicou. Ficou órfã
de mãe aos quatro anos de idade. Leonor,
sua mãe, tinha 28 anos quando morreu, em
25 de junho de 1919, vítima de pneumonia
dupla. O atestado de óbito, passado em Mogi
das Cruzes pelo médico Celestino Bourroul,
foi lançado às folhas 151 do livro do Cartório
de Registro Civil de Mogi e, pelo registro, seu
viúvo pagou dois mil réis. Leonor está sepultada no Cemitério da Ordem Terceira de
Mogi. O pai de Cida tinha, a esse tempo, 31
anos de idade. Médico de larga clientela em
Mogi das Cruzes, filho de pai austríaco e de
mãe brasileira, em pouco tempo casou-se de
novo.
Cida passou a morar, então, com a avó,
também Leonor. De apelido de família "Nono". Era
a única criança da casa,
embora partilhasse quintais
com os primos, todos vizinhos. Foi criada no casarão da Rua José Bonifácio,
que existe ainda hoje, atrás
da Catedral de Santana,
contíguo à Padaria Estrela,
da qual se separa por uma
viela. Ali, adolescente, Cida
Cida
passava todos os finais de
Wertheimer
semana, quando conseguia
Abbondanza
licença como interna do
era filha de
Colégio Sacre Coeur de
Leonor
Marie, em São Paulo.
Franco
Foi nessa mesma casa
Wertheimer
que Cida, aos 17 anos, coeodr.
meçou a namorar Almiro.
Deodato
Já havia deixado o internaWertheimer
to do Sacre Coeur e freqüentava o segundo ano da
Escola Normal Padre
Anchieta quando decidiram-se casar. Deixou
a escola. Nas vésperas do casamento, resolveu que iria se mudar para a casa do pai,
recém-construída na esquina da Avenida Pinheiro Franco com a Rua Campos Sales, mesmo terreno onde hoje está a agência do Banco Real. Era uma construção imponente, em
estilo mexicano, construída por Quirino
Simões, um engenheiro competente que atuava na construção da Adutora do Rio Claro,
aquela mesma que atravessa, hoje, um trecho da Estrada Mogi-Bertioga.
Cida resolvera que a festa de seu casamento seria na nova casa do pai. Numa manhã,
Almiro encostou o Ford coupe em frente à casa
da avó da noiva. Juntos, fizeram a mudança.
Não avisaram ninguém. Era 1933. Dois anos
depois, o pai de Cida morreu. Tinha 47 anos de
idade e fora vitimado por cirrose do fígado, segundo o atestado de óbito passado em 15 de
agosto de 1935 pelo médio Soares Hungria, que
o atendera em sua própria residência, já em São
Paulo, à Rua da Consolação, 42.
Nunca mais Cida morou em Mogi. Criou
os filhos, ela e o marido, em um casarão do
bairro paulistano do Pacaembu. Quando a
própria Cida morreu, em 1986, tinha 71 anos
de idade e vivia, divorciada, no apartamento
da Praça Buenos Aires, onde a visitei muitas
e muitas vezes. Para conversas descontraídas
em tomo de um copo de uísque. Falávamos
de tudo, mas, principalmente, dos velhos tempos de Mogi das Cruzes e das muitas lembranças que me legou a respeito de seu pai.
Tenho na biblioteca de casa, ainda hoje, um
livro que pertenceu a ele. Com sua própria
assinatura.
Download

10-29-2006 - Chico Ornellas