AÇORIANO ORIENTAL . QUINTA-FEIRA, 17 DE MARÇO DE 2011 14| RUMOS CRUZADOS RUMOS CRUZADOS|15 QUINTA-FEIRA, 17 DE MARÇO DE 2011 COORDENAÇÃO PAULO MENDES | TEXTOS JOSEFINA CRUZ E BORJA ASENSIO | www.aipa-azores.com NOTA DE ABERTURA Será que sou racista? C omemora-se no próximo dia 21 de Março o Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial e, infelizmente, a realidade diz-nos que o tema merece ainda estar na agenda colectiva. É certo que foram dados passos significativos para a eliminação da discriminação racial, mas estamos muito longe da sua exclusão, sendo que ela assume, hoje, novos contornos e conteúdos. A discriminação é hoje mais subtil. Alguns estudos feitos no contexto europeu e nacional convergem nesse sentido. Em Portugal, e com base num estudo da União Europeia de 2007, 61% das discriminações que por cá acontecem têm na sua base a questão étnica e é um dado que não pode ser desprezado. Nos dias hoje não estamos a falar daquele racismo grosseiro branco/negro, mas sim de formas menos perceptíveis de discriminação. Em tempo de crise como a que estamos a viver, o perigo de olhar o outro de lado é sempre real e devemos estar atentos à emergência de atitudes e comportamentos de carácter xenófobo e racista. Hoje não é politicamente correcto assumir uma atitude racista e por isso a sua forma de expressão pública é limitada. No entanto, todas as pessoas gostam de fazer esta pergunta: achas que eu sou racista? A pergunta é difícil de responder, até porque acabamos muito por entrar no campo nas generalizações. De qualquer modo, existem na sociedade portuguesa, e açoriana, comportamentos discriminatórios. É generalizado, pergunta o leitor? Não, mas acontece aqui e acolá. Não sendo um comportamento generalizado e salvaguardando a inexistência de indicadores científicos comparativos, temos tido algumas queixas por parte de pessoas que se sentiram discriminadas na Região. Temos, por isso, duas áreas de acção: uma primeira, de longo prazo, em que os resultados não são imediatos, que passa pelo trabalho junto dos mais novos no sentido de os despertar para a valorização da diferença e preparálos para um diálogo horizontal com pessoas que têm outras referências culturais; uma outra, mais de curto prazo, passa pela eliminação de todas as barreiras legais que potenciam a discriminação, bem como a promoção da visibilidade do tema da agenda pública. NOME: PEDRO ALVES IDADE: 1 ANOS NACIONALIDADE: PORTUGUESA “ Foi-nos barrada a entrada numa discoteca porque somos de cor NOME: RITA ANTUNES IDADE: ANOS NACIONALIDADE: PORTUGUESA ARONA DIAGNE “O racismo é ainda um problema actual. Há cada vez mais informação, existem mais movimentos de luta contra o racismo e, supostamente, este problema deveria diminuir. Mas com a globalização existem mais movimentos de diversas nacionalidades e, por isso, existem mais choques culturais que, por vezes, são bastante agressivos. As soluções que eu daria para este problema passam pela sensibilização das pessoas, mostrando que este movimento de pessoas é algo enriquecedor e não um prejuízo para a nossa sociedade.” “O racismo já não é tanto um problema actual mas ainda acontece. Por exemplo, no caso de imigrantes que são de outra cor, já presenciei algumas situações desagradáveis. E é desta maneira que advêm várias situações de racismo. As soluções partem muito de cada um: dos princípios, dos valores e da educação. Por isso, é uma coisa que pode ser batalhada de início em casa, desde pequenino, incutindo valores de que somos todos iguais. Acho que é muito importante.” que as nossas sociedades foram confrontadas com uma notável evolução nesta matéria, não obstante o fenómeno ter ainda e, infelizmente, alguma expressão. Tem expressão na Europa, em Portugal, e aqui nos Açores. Com o devido relativismo, a discriminação é ainda um problema. Segundo a definição que é assumida pela própria Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial, entende-se por discriminação racial qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência em função da “ NOME: LUÍS MEDEIROS IDADE: 1 ANOS NACIONALIDADE: PORTUGUÊS “Creio que ainda hoje existe um pouco de racismo mas não tanto como antigamente. Eu estive em África e lá aprendemos a estimar e a respeitar todos por igual. E hoje tenho grandes amigos africanos. Acho que aqui muitas pessoas deveriam aprender a ter esse respeito por pessoas de diferentes nacionalidades. A solução para o problema do racismo que ainda hoje existe é tentar mudar a mentalidade das pessoas”. raça, cor, ascendência, origem nacional ou étnica, que tenha por objectivo ou produza como resultado a anulação ou restrição do reconhecimento, fruição ou exercício, em condições de igualdade, de direitos, liberdades e garantias ou de direitos económicos, sociais e culturais. Consideram-se ainda práticas discriminatórias, nos termos da lei, as acções ou omissões que, em razão da pertença de qualquer pessoa a determinada raça, cor, nacionalidade ou origem étnica, violem o princípio de igualdade. “Acho que ainda há racismo na actualidade. Não está muito visível mas ainda é um elemento que está inserido na mente das pessoas. Existem indivíduos que não têm consciência do que estão a fazer, pois alguma coisa falhou no seu processo educativo. Estes estão a proceder da forma como foram criados e, por isso, não aceitam as diferenças dos outros. Na minha opinião a sensibilização social e a educação são pilares fundamentais para se acabar com as atitudes racistas que ainda existem”. NOME: CRISTINA LOPES IDADE: ANOS NACIONALIDADE: PORTUGUESA Através da intervenção das escolas e de manifestações que alertam as pessoas para o facto de que o racismo já não faz sentido CRISTINA LOPES “Eu acho que o racismo é ainda um problema actual, apesar de que hoje está menos à vista mas ainda é visível em certas atitudes das pessoas. Ninguém o mostra directamente, mas é possível sentir-se e eu sinto-o; mas o melhor que se pode fazer é ignorar. As soluções para este tipo de problema teriam de partir da mentalidade das pessoas. Mas como mudar a mentalidade de uma pessoa? Aí é complicado”. NOME: REINALDO SALOMÃO IDADE: ANOS NACIONALIDADE: CABO-VERDIANO O racismo é um problema actual? F omos à rua e questionámos as pessoas a respeito do que pensam sobre o racismo, se é um problema actual e que sugestões têm em relação à problemática. Falámos com os imigrantes e com autóctones; falámos com pessoas de várias idades e com diferentes profissões e escolaridade. No essencial, as pessoas acreditam que o racismo tem a ver com a educação e a mudança de mentalidades. Mas também, na generalidade das pessoas que partilharam as suas opiniões neste espaço, acreditam NOME: ANILTON MIGUEL IDADE: ANOS NACIONALIDADE: CABO-VERDIANO NOME: ALIDA VICENTE IDADE: ANOS NACIONALIDADE: ESPANHOLA “O racismo é um problema actual, sempre existiu o “racismo oculto” na nossa sociedade, porque seria condenado se fosse exposto abertamente. Como exemplo, temos as opiniões de jovens na manifestação “Geração à Rasca”, em que alguns diziam que a actual situação económica nos Açores é responsabilidade das pessoas que vêm do continente e dos estrangeiros que chegam para lhes tirar as suas riquezas. Acho que a educação, a sensibilização e outras modalidades de educação social e cívica são ferramentas fundamentais na luta contra o racismo.” NOME: SHIVANG CHAWCA IDADE: ANOS NACIONALIDADE: INDIANA “ “Acho que não há racismo a nível global mas sim em alguns países. Por exemplo nos Estados Unidos, em França e em Inglaterra, há altos níveis de racismo. As principais razões para este problema são o medo das pessoas em relação ao diferente, o desconhecimento de outras culturas e a crença de que os imigrantes vão roubar o trabalho. Este é um problema de difícil solução. Mas no final somos todos seres humanos e todos gostamos de fazer as mesmas coisas e, portanto, as divisões criadas não correspondem com a natureza humana”. As divisões criadas não correspondem com a natureza humana SHIVANG CHAWCA “Eu não acho que actualmente haja racismo, como nós o conhecemos a nível histórico; há sim actos xenófobos. Podem acontecer actos racistas mas de forma oculta, até porque a lei é bem clara e é punível qualquer acto desse tipo. É complicado alterar-se a conduta de uma pessoa que foi educada a marginalizar o outro. Por essa razão, a solução para este problema teria de passar pela educação, através da intervenção das escolas e de manifestações que alertem as pessoas para o facto de que o racismo já não faz sentido.” NOME: JOSÉ GONÇALVES IDADE: ANOS NACIONALIDADE: BRASILEIRO “Eu acho que hoje em dia ainda há muito racismo. Não sei os motivos, mas mesmo na Madeira, onde residi anteriormente e também aqui, tenho sentido isso. É um problema que afecta os imigrantes e especialmente nesta época de crise económica onde há mais desemprego. Não vejo soluções para este problema, é difícil lutar contra aspectos que estão muito enraizados na sociedade. Quando sou insultado baixo a minha cabeça e não perco o meu tempo em lutar contra ninguém.” NOME: HÉLDER LOPES IDADE: ANOS NACIONALIDADE: PORTUGUÊS “O racismo é ainda um problema actual. Vendo a realidade açoriana é possível encontrar-se vários casos de racismo e isso acontece por diversas razões: as pessoas menos instruídas estão mais aptas a ter essas atitudes racistas e as pessoas que não conhecem outras culturas facilmente as ignoram. As soluções passam pela educação. Por exemplo, ir às escolas primárias falar com as crianças sobre outros países e culturas, fazê-las perceber que essas pessoas, apesar de terem outra cor ou outra língua são como nós.” NOME: AMARO MATOS IDADE: ANOS NACIONALIDADE: PORTUGUÊS “Acho que o racismo ainda é um problema actual, histórico e, em parte, cultural. Já vivi em África, durante a guerra colonial, e apercebi-me de que há segregações entre as raças. Portanto, o racismo é um problema muito complexo que tem de ser abordado, estudado e conduzido de maneira a que estas situações possam ser esbatidas. Actualmente, por questões relacionadas com o próprio desemprego, aparecem a xenofobia e outras formas de racismo, apesar de que na nossa região as várias religiões e raças convivem bem.” NOME: STEVE COELHO IDADE: ANOS NACIONALIDADE: AMERICANO “Na minha opinião, actualmente ainda existe racismo, apesar das sociedades estarem mais diversificadas e de o casamento, por exemplo, entre pessoas de etnias diferentes, acontecer cada vez mais. Este problema ainda existe porque há pessoas que ainda se deixam afectar pelo racismo brutal que existiu no passado e que foi transmitido de geração em geração, mas que deixará de existir nas gerações futuras. As soluções para este problema seriam a mudança de mentalidade dessas pessoas através da sensibilização”. NOME: MERILDA FRIAS IDADE: ANOS NACIONALIDADE: PORTUGUESA “Eu acho que ainda hoje temos racismo. Os actos racistas existem nas escolas, quando as crianças implicam e gozam umas com as outras e, mesmo na rua, quando passa uma pessoa que tem um estilo muito diferente; podemos estar a falar de um imigrante ou não, esta pessoa é olhada de lado e mesmo discriminada. As soluções para este problema teriam de começar nos adultos, para que estes possam transmitir uma educação diferente daquela que os seus pais lhes deram.” NOME: SALGADO MARTINS IDADE: ANOS NACIONALIDADE: PORTUGUÊS “Eu julgo que ainda hoje temos racismo, até porque não podemos falar apenas num tipo racismo; há o racismo em termos de diferenças de raça, no que respeita à desigualdade de género; há também o racismo cultural, o económico, e as diferenças que se fazem entre um rico e um pobre é igualmente um tipo de racismo. Portanto, só deixará de haver racismo no mundo quando se atingir um estado utópico de total igualdade entre pessoas. Enquanto não se atingir esse estado haverá sempre racismo”. NOME: TERESA SOUSA IDADE: ANOS NACIONALIDADE: PORTUGUESA “Eu penso que o racismo ainda é visível na nossa vida actual, apesar das constantes inovações que têm ocorrido ao longo dos séculos. O racismo, por ter as suas bases nas crenças e ideologias, é difícil acabarse com ele. Não há uma solução que traga resultados fiáveis, mas penso que é importante forçarmos a ideia de que nós somos todos iguais enquanto seres humanos. Penso que a solução parte de cada um de nós e da persistência em mostrarmos a nossa compaixão para com todos”. NOME: ANTÓNIO SANHA IDADE: 1 ANOS NACIONALIDADE: GUINEENSE “Actualmente ainda há um pouco de racismo. A situação melhorou nos últimos anos, mas mesmo assim tenho assistido a alguns exemplos. Eu próprio já fui discriminado pela cor da minha pele e isso não é nada agradável. Acho que o governo tem de trabalhar neste problema e ajudar para que não haja tanta discriminação das pessoas que vêm de fora. Incentivar na integração é o factor chave para se acabar com esta tendência.” NOME: ARONA DIAGNE IDADE: ANOS NACIONALIDADE: SENEGALÊS “Ainda hoje há racismo, mas há mudanças verificadas nos últimos tempos. Por exemplo, aqui na ilha a mim e aos meus amigos foi-nos barrada a entrada numa discoteca porque somos de cor. É um tema tabu e que não é aceite socialmente. Acho que a escola tem um papel fundamental para solucionar este problema. A educação das pessoas é um elemento primordial para evitar que estas situações aconteçam e para mostrar os aspectos positivos de se fazer parte de uma sociedade onde haja diversidade.”