ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
SFVC
Nº 70060938065 (N° CNJ: 0286369-18.2014.8.21.7000)
2014/CÍVEL
AÇÃO DE NULIDADE DE DOAÇÃO DE IMÓVEL.
HERDEIROS NECESSÁRIOS. NULIDADE. CERCEAMENTO
DE DEFESA. INOCORRENTE. 1. Inocorre cerceamento de
defesa pela dispensa da prova testemunhal, quando esta
se mostra desnecessária à solução da lide, cabendo ao
julgador determinar a realização das provas necessárias à
instrução do feito e indeferir as diligências inúteis ou
meramente protelatórias. Inteligência do art. 130 do CPC. 2.
Deve ser reconhecida a nulidade da escritura pública de
doação de imóvel, quando o excede a disponibilidade da
autora da herança. 3. O reconhecimento da nulidade da
doação visa assegurar aos herdeiros necessários a
percepção do seu quinhão legitimário. Inteligência dos art.
166, inc. VII, art. 549 e art. 1.846 do Código Civil. 4. O fato
de os beneficiários da doação terem prestado assistência
aos falecidos não os torna credores dos irmãos, mas
podem buscar eventual ressarcimento de gastos com os
cuidados com a falecida no inventário, motivo pelo qual
correto o não recebimento da reconvenção. 5. Embora a
aceitação da herança possa ser tácita, a renúncia deve ser
sempre expressa. Inteligência do art. 1.805 do CCB.
Recurso desprovido.
APELAÇÃO CÍVEL
Nº 70 060 938 065
(N° CNJ: 0286369-18.2014.8.21.7000)
SÉTIMA CÂMARA CÍVEL
COMARCA DE
SANTO ANTÔNIO DA PATRULHA
NOEMI DOS SANTOS
DELCIO SILVEIRA DOS SANTOS
APELANTES
DARCI SILVEIRA DOS SANTOS
JOAO NETO DOS SANTOS
TEREZINHA DOS S. RODRIGUES
APELADOS
NEHY SANTOS DA SILVA
ANA PAULA DE SOUZA
SUCESSAO DE DINA C. DOS SANTOS
ZAIDA TERESINHA SOUZA PETRY
JAIRO REUS DE SOUZA
AIDA MARIA DE SOUZA MARQUES
SUCESSÔES DE ANTONIO SILVEIRA
DOS SANTOS E DE JOANITA DOS
SANTOS SOUZA
INTERESSADOS
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ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara
Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, negar provimento
ao recurso.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), as
eminentes Senhoras DES.ª LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO E
DES.ª SANDRA BRISOLARA MEDEIROS.
Porto Alegre, 27 de agosto de 2014.
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES,
Presidente e Relator.
RELATÓRIO
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES (PRESIDENTE
E RELATOR)
Trata-se da irresignação de NOEMI S. e DELCIO S. S. com a r.
sentença que julgou parcialmente procedente a ação declaratória de
nulidade de escritura publica de doação de direitos de meação com
encargos que lhes movem JOÃO N. S., TEREZINHA S. R. e DARCI S. S.,
para o fim de declarar a nulidade da doação de direitos e meação com
encargos realizada por DINA em favor de NOEMI, no que exceder o limite
estabelecido em lei para o patrimônio disponível.
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Sustentam
os
recorrentes,
preliminarmente,
que
foram
cerceados em seu direito de defesa, pois as testemunhas arroladas, cujos
depoimentos iriam complementar as suas alegações, não foram ouvidas.
Dizem que a doação foi concedida à NOEMI com o encargo de que cuidasse
da de cujus DINA, fornecendo-lhe o que faltasse até o final de sua vida.
Alegam que quando da lavratura da escritura pública de doação com
encargo, a de cujus estabeleceu que a posse do imóvel só seria transmitida
para NOEMI após a sua morte e se cumprido o encargo, de acordo com os
arts. 1.960 e 1.961 do Código Civil. Asseguram que apesar da de cujus
possuir outros filhos, preferiu residir com eles. Dizem que durante o período
em que NOEMI cuidou da doadora, os demais filhos jamais contribuíram
com os gastos hospitalares, assim como um deles sequer compareceu ao
velório. Referem que a reconvenção por eles proposta deveria ter sido
apreciada, com a coleta de prova e, ao final, procedência do pedido.
Pretendem seja reconhecida a doação com encargo, bem como seja julgada
procedente a reconvenção apresentada. Pedem o provimento do recurso.
Intimados,
os
recorridos
apresentaram
contra-razões
sustentando que a matéria dos autos é exclusivamente de direito, não sendo
necessária a oitiva de testemunhas. Dizem que a de cujus doou a totalidade
dos seus bens, ferindo os seus direitos na condição de herdeiros, motivo
pelo qual não há que se falar negocio jurídico perfeito, já que o ato está
viciado e, conseqüentemente, nulo. Asseguram que os valores cobrados na
reconvenção devem ser discutidos na ação de inventário, eis que essa tem
por objeto a partilha de bens da de cujus. Asseveram que os recorrentes
não podem cobrar valores referentes aos cuidados prestados, pois era dever
deles como família zelar pelos cuidados da de cujus, assim como a mesma
era aposentada e o valor que percebia era destinado às suas despesas.
Pedem o desprovimento do recurso.
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Com vista dos autos, a douta Procuradoria de justiça deixou de
lançar parecer por entender ausentes as hipóteses previstas no art. 82 do
CPC.
Foi observado o disposto no art. 551, §2° do CPC.
É o relatório.
VOTOS
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES (PRESIDENTE
E RELATOR)
Estou desacolhendo o pleito recursal.
Inicio focalizando a prefacial de nulidade, mas já adianto que
não se verifica o alegado cerceamento de defesa.
Embora os recorrentes efetivamente tenham postulado a
produção de provas, o não-deferimento não constitui, por si, cerceamento de
defesa, pois é preciso ter em mira que a prova se destina ao julgador e cabe
a ele direcionar a atividade cognitiva, respeitando obviamente os direitos e
garantias processuais das partes.
Nesse sentido, lembro que o art. 130 do Código de Processo
Civil prevê expressamente que “caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento
da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo,
indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias”.
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Portanto, diante da discussão travada pelas partes, era
totalmente descabida a produção de outras provas, sendo corretamente
indeferida a pretensão de NOEMI e DELCIO.
Nesse contexto, estou desacolhendo a argüição de nulidade.
Passo, então, ao exame de mérito.
Os recorrentes pretendem seja reconhecida a validade da
doação feita pela genitora de NOEMI, bem como a apreciação da
reconvenção por eles proposta.
Com efeito, deve ser reconhecida a nulidade da doação com
encargo realizada pela de cujus, através da escritura pública nº 812 (fl.31),
pois excedeu o que DINA poderia dispor no momento da liberalidade.
Quando o art. 549 do Código Civil trata da nulidade da doação
quanto à parte excedente à legítima, está a dizer que, relativamente ao
excesso, a doação feita é inoficiosa, devendo retornar aos herdeiros
necessários a liberalidade feita na parte que invadiu os quinhões
legitimários, pois esta parte lhes pertence de pleno direito (art. 1.846 do
CCB) e é transmitida aos herdeiros necessários no momento da abertura da
sucessão.
Ficou comprovado cabalmente que a doação extrapolou a
parte disponível do patrimônio da doadora, sendo forçoso reconhecer que
ela somente poderia dispor, em liberalidade, da metade dos seus bens.
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De outra banda, o fato de os recorridos terem prestado
assistência a falecida na velhice, não implica o afastamento da
inoficiosidade, devendo eventual ressarcimento de gastos ser postulado no
inventário, mediante a cabal comprovação das despesas, motivo pelo qual
se mostra correto o não recebimento da reconvenção.
Observo, ademais, para rechaçar a conclusão de que possa ter
havido implícita renúncia da herança, que o art. 1.806 do Código Civil tem
hialina clareza ao estabelecer que “a aceitação da herança pode ser
expressa ou tácita; a renúncia, porém, deverá constar, expressamente, de
escritura pública ou termo judicial”. Ou seja, a renúncia além de ser
expressa, deve constar também de documento público.
Assim sendo, é inequívoco que houve violação ao que dispõe o
art. 549 do Código Civil, não restando outro caminho senão reconhecer que
é nula a doação feita através da escritura pública nº 812. E o precitado
dispositivo legal estabelece, com clareza solar, que “nula é também a
doação quanto à parte, que exceder a de que o doador, no momento da
liberalidade, poderia dispor em testamento”, isto é, a metade de seus bens,
pois esta parte pertence, de pleno direito, aos descendentes (art. 1.846,
CCB).
Precisamente pela obrigatoriedade de ser reservada a metade
dos bens para os descendentes, que necessariamente devem herdar, é que
se diz serem estes herdeiros necessários. E, por se cuidar de herdeiro
necessário, o legislador cuidou de proteger o quinhão reservado,
estabelecendo, entre as medidas de proteção, a inoficiosidade da doação
que eventualmente desatender a exigência legal.
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ISTO POSTO, nego provimento ao recurso.
DES.ª LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO (REVISORA) - De acordo
com o(a) Relator(a).
DES.ª SANDRA BRISOLARA MEDEIROS - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES - Presidente Apelação Cível nº 70060938065, Comarca de Santo Antônio da Patrulha:
"NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME."
Julgador(a) de 1º Grau: ELISABETE MARIA KIRSCHKE
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