CENTRO ESPÍRITA “CASA DO CAMINHO”
GRUPO DE ESTUDOS ESPÍRITAS “RODOLPHO DOS SANTOS FERREIRA”
Programa IV - Aspecto Filosófico
1. Deus
1.1 - A Existência de Deus
1.2 - O infinito e o Espaço Universal
1.3 - Materialismo e Panteísmo
2. Criação Divina
2.1 - Elementos Gerais do Universo
2.2 - Formação dos mundos e dos seres vivos
2.3 - Os Reinos da Natureza: Mineral, Vegetal, Animal e
Hominal
2.4 - Pluralidade dos mundos habitados
2.5 - O instinto e a inteligência
3. Os Espíritos
3.1 - Diferentes ordens de Espíritos (parte 1)
3.2 - Diferentes ordens de Espíritos (parte 2)
3.3 - Forma e Ubiqüidade dos Espíritos
4. Vida Espírita
4.1 - Espíritos Errantes. Sorte das Crianças após a morte.
4.2 - Ensaio teórico das sensações e percepções dos
espíritos
4.3 - Ocupações e missões dos Espíritos
4.4 - Relações do além-túmulo: (1ª parte)
4.5 - Relações do além-túmulo: (2ª parte)
4.6 - Escolha das provas
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Programa IV - Aspecto Filosófico
5. Retorno à vida espiritual
5.1 - A alma após a morte: separação da alma e do corpo
5.2 - Perturbação Espiritual
6. DOUTRINA DAS PENAS ETERNAS
6.1 - Origem da doutrina das penas eternas
6.2 – O Reino de Deus e o Paraíso Prometido
6.3 - Determinismo e Fatalidade
6.4 - Livre-arbítrio
7. PLURALIDADE DAS EXISTÊNCIAS
7.1 – Os fundamentos da justiça na Reencarnação
7.2 - As Provas Da Reencarnação
7.3 - Justificativas do Esquecimento do passado
7.4 – Prelúdio da Volta à Vida Corporal
7.5 - A infância
7.6 - Encarnação nos diferentes mundos
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Programa IV - Aspecto Filosófico
DEUS – A Existência de Deus
Qualquer doutrina tem seus princípios básicos, dos quais derivam outros, que são
decorrências naturais ou lógicas dos primeiros. Um dos princípios básicos da Doutrina Espírita é
o da existência de Deus, como Criador necessário de tudo o que existe. Outro, evidentemente
fundamental, é o da existência dos Espíritos, como criaturas suas; e outro ainda, o da natureza
espiritual da alma humana, considerada como Espírito encamado, que constitui a individualidade
consciente, permanente e imperecível do homem. Tudo o mais que os Espíritos revelaram, a
pluralidade dos mundos habitados, a encarnação e as reencarnações, com a conseqüente
pluralidade das existências corporais, a lei de causa e efeito, o princípio da necessidade das
provações, como meio de progresso, e das cruciantes, mas redentoras expiações; tudo isso, que
revela suprema sabedoria, harmonizando bondade e indefectível justiça, é decorrência natural
daqueles princípios básicos. À frente de todos, porém, fulge, luminoso, o princípio da existência
do Eterno Criador.
Já fizemos notar, anteriormente, o fato altamente significativo de ter Kardec começado O
Livro dos Espíritos com um capítulo inteiramente consagrado a Deus, às provas da sua
existência e aos atributos da Divindade.
Em A Gênese, Allan Kardec – após explicar no Capítulo I, o “Caráter da Revelação
Espírita” -, novamente trata, logo no Capítulo II, da existência de Deus, mostrando que ela
constitui o mais fundamental princípio da Doutrina Espírita, conforme veremos a seguir.
1. - Sendo Deus a causa primária de todas as coisas, a origem de tudo o que existe, a base
sobre que repousa o edifício da criação, é também o ponto que importa consideremos antes de
tudo.
2. - Constitui princípio elementar que pelos seus efeitos é que se julga de uma causa,
mesmo quando ela se conserve oculta.
Se, fendendo os ares, um pássaro é atingido por mortífero grão de chumbo, deduz-se que
hábil atirador o alvejou, ainda que este último não seja visto. Nem sempre, pois, se faz necessário
vejamos uma coisa, para sabermos que ela existe. Em tudo, observando os efeitos é que se chega
ao conhecimento das causas.
3. - Outro princípio igualmente elementar e que, de tão verdadeiro, passou a axioma é o
de que todo efeito inteligente tem que decorrer de uma causa inteligente.
Se perguntassem qual o construtor de certo mecanismo engenhoso, que pensaríamos de
quem respondesse que ele se fez a si mesmo? Quando se contempla uma obra-prima da arte ou
da indústria, diz-se que há de tê-la produzido um homem de gênio, porque só uma alta
inteligência poderia concebê-la. Reconhece-se, no entanto, que ela é obra de um homem, por se
verificar que não está acima da capacidade humana; mas, a ninguém acudirá a idéia de dizer que
saiu do cérebro de um idiota ou de um ignorante, nem, ainda menos, que é trabalho de um
animal, ou produto do acaso.
4. - Em toda parte se reconhece a presença do homem pelas suas obras. A existência dos
homens antediluvianos não se provaria unicamente por meio dos fósseis humanos: provou-a
também, e com muita certeza, a presença, nos terrenos daquela época, de objetos trabalhados
pelos homens. Um fragmento de vaso, uma pedra talhada, uma arma, um tijolo bastarão para lhe
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atestar a presença. Pela grosseria ou perfeição do trabalho, reconhecer-se-á o grau de inteligência
ou de adiantamento dos que o executaram. Se, pois, achando-vos numa região habitada
exclusivamente por selvagens, descobrirdes uma estátua digna de Fídias, não hesitareis em dizer
que, sendo incapazes de tê-la feito os selvagens, ela é obra de uma inteligência superior à destes.
5. - Pois bem! lançando o olhar em tomo de si, sobre as obras da Natureza, notando a
providência, a sabedoria, a harmonia que presidem a essas obras, reconhece o observador não
haver nenhuma que não ultrapasse os limites da mais portentosa inteligência humana. Ora, desde
que o homem não as pode produzir, é que elas são produto de uma inteligência superior à
Humanidade, a menos se sustente que há efeitos sem causa.
Considera em seguida Kardec a opinião dos que opõem a esse raciocínio tão lógico o de
que “As obras ditas da Natureza são produzidas por forças materiais que atuam mecanicamente,
em virtude das leis de atração e repulsão; sob cujo império tudo ocorre, quer no reino inorgânico,
quer nos reinos vegetal e animal, com uma regularidade mecânica que não acusa a ação de
nenhuma inteligência livre. O homem (dizem esses opositores) movimenta o braço quando quer
e como quer; aquele, porém, que o movimentasse no mesmo sentido, desde o nascimento até a
morte, seria um autômato, Ora, s forças orgânicas da Natureza são puramente automáticas.
Tudo isso é verdade; (redargüiu Kardec) mas, essas forças são efeitos que hão de ter uma
causa. Elas são materiais e mecânicas; não são de si mesmas inteligentes, também isso é verdade;
mas, são postas em ação, distribuídas, apropriadas às necessidades da cada coisa por uma
inteligência que não é a dos homens. A aplicação útil dessas forças é u efeito inteligente, que
denota uma causa inteligente. “Deus não se mostra, mas se revela pelas suas obras”.
O Espiritismo portanto, dá ao homem uma idéia de Deus que, com a sublimidade da
Revelação, está conforme a mais perfeita e justa racionalidade. Convence-nos da Divina
Existência sem necessitar recorrer a outras provas que não as que provem da simples
contemplação do Universo, onde Deus se revela através de obras admiráveis e de leis sábias,
constituindo um conjunto grandioso de tanta harmonia e onde há perfeita adequação dos meios
aos fins, que se toma impossível não ver por trás de tão portentoso mecanismo a ação de um
Suprema inteligência. Por isso, a pergunta do Codificador: Que é Deus?
Os Espíritos responderam:
“Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas”
Assim o compreendem, numa inata intuição de Sua existência e do Seu poder todos os
que não se deixaram empolgar totalmente pelo terrível entorpecer da inteligência e dos
sentimentos humanos, que é o orgulho, e assim, reconhecem no harmonioso mecanismo que
entretém os movimentos universais, a existência imprescindível de um primeiro motor
transcendente. “A mecânica celeste não se explica por si mesma (escreve Léon Denis), é a
existência de um motor inicial se impões. A nebulosa primitiva, mãe do Sol e dos planetas, era
animada de um movimento giratório. Mas quem lhe imprimira esse movimento? Respondemos
sem hesitar: Deus”
Assim como Leon Denis, já então iluminado pela radiosa luz do Espiritismo,o
reconheceu, fê-lo também Albert Einstein, com todo o rigor do seu raciocínio lógico, puramente
matemático. Por muito raciocinar em busca da verdade, Einstein adquiriu um alto grau de
intuição que o levou, do mesmo modo que a muitas outras coisas, também, ao reconhecimento da
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existência de Deus, como fonte necessária da energia que dá o primeiro impulso a tudo que se
move no Universo.
Muito antes de Einstein, também o não menos genial Isaac Newton teve de reconhecer a
existência necessária de uma causa transcendente e um primeiro motor para explicar o
movimento dos planetas. Apesar de descobrir a grande lei da gravitação universal, que viria
aparentemente resolver esse milenar problema, no fim se seu livro Princípios Matemáticos de
Filosofia Natural declara-se impotente para explicar aqueles movimentos somente pelas leis da
Mecânica.
“Em um transporte de entusiasmo, sua grande Alma se exalta Àquele que, por si só, pôde,
com sua poderosa mão, lançar os mundos sobre a tangente de sua órbita. Nunca a ciência
humana e o gênio do homem se elevaram mais alto do que nessa página célebre, digno
coroamento desse livro grandioso” (conforme o que escreveu na Revue du Bien o professor
Bulliot, citado por Leon Denis em seu livro O Grande Enigma).
Fontes de consulta:
1. Allan Kardec. A Gênese. Deus. A Existência de Deus. Capítulo II, itens 1 a 56
2. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Pergunta 1.
3. Leon Denis. O Grande Enigma. Págs. 7o, 238 e 21.
Deus: O infinito e o Espaço Universal
O espaço e o tempo1
1. - Já muitas definições de espaço foram dadas, sendo a principal esta: o espaço é a
extensão que separa dois corpos, na qual certos sofistas deduziram que onde não haja corpos não
haverá espaço. Nisto foi que se basearam alguns doutores em teologia para estabelecer que o
espaço é necessariamente finito, alegando que certo número de corpos finitos não poderiam
formar uma série infinita e que, onde acabassem os corpos, igualmente o espaço acabaria.
Também definiram o espaço como sendo o lugar onde se movem os mundos, o vazio
onde a matéria atua, etc. Deixemos todas essas definições, que nada definem, nos tratados onde
repousam.
Espaço é uma dessas palavras que exprimem uma idéia primitiva e axiomática, de si
mesma evidente, e a cujo respeito as diversas definições que se possam dar nada mais fazem do
que obscurecê-la. Todos sabemos o que é o espaço e eu apenas quero firmar que ele é infinito, a
fim de que os nossos estudos ulteriores não encontrem uma barreira opondo-se às investigações
do nosso olhar.
Ora, digo que o espaço é infinito, pela razão de ser impossível imaginar-se-lhe um limite
qualquer. e porque, apesar da dificuldade com que topamos para conceber o infinito, mais fácil
1
- Este capítulo é textualmente extraído de uma série de comunicações ditadas à
Sociedade Espírita de Paris, em 1862 e 1863, sob o título - Estudos uranográficos e assinadas
GALILEU. Médium: C. F. Nota do Tradutor: Estas são as iniciais do nome de Camilo
Flammarion.
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nos é avançar eternamente pelo espaço, em pensamento, do que parar num ponto qualquer,
depois do qual não mais encontrássemos extensão a percorrer.
Para figurarmos, quanto no-lo permitam as nossas limitadas faculdades, a infinidade do
espaço, suponhamos que, partindo da Terra, perdida no meio do infinito, para um ponto qualquer
do Universo, com a velocidade prodigiosa da centelha elétrica, que percorre milhares de léguas
por segundo, e que, havendo percorrido milhões de léguas mal tenhamos deixado este globo, nos
achamos num lugar donde apenas o divisamos sob o aspecto de pálida estrela. Passado um
instante, seguindo sempre a mesma direção, chegamos a essas estrelas longínquas que mal
percebeis da vossa estação terrestre. Daí, não só a Terra nos desaparece inteiramente do olhar nas
profundezas do céu, como também o próprio Sol, com todo o seu esplendor, se há eclipsado pela
extensão que dele nos separa. Animados sempre da mesma velocidade do relâmpago, a cada
passo que avançamos na extensão, transpomos sistemas de mundos, ilhas de luz etérea, estradas
estelíferas, paragens suntuosas onde Deus semeou mundos na mesma profusão com que semeou
as plantas nas pradarias terrenas.
Ora, há apenas poucos minutos que caminhamos e já centenas de milhões de milhões de
léguas nos separam da Terra, bilhões de mundos nos passaram sob as vistas e, entretanto,
escutai! em realidade, não avançamos um só passo que seja no Universo.
Se continuarmos durante anos, séculos, milhares de séculos, milhões de períodos cem
vezes seculares e sempre com a mesma velocidade do relâmpago, nem um passo igualmente
teremos avançado, qualquer que seja o lado para onde nos dirijamos e qualquer que seja o ponto
para onde nos encaminhemos, a partir desse grãozinho invisível donde saímos e a que chamamos
Terra.
Eis aí o que é o espaço!
2. - Como a palavra espaço, tempo é também um termo já por si mesmo definido. Dele se
faz idéia mais exata, relacionando-o com o todo infinito.
O tempo é a sucessão das coisas. Está ligado à eternidade, do mesmo modo que as coisas
estão ligadas ao infinito. Suponhamo-nos na origem do nosso mundo, na época primitiva em que
a Terra ainda não se movia sob a divina impulsão; numa palavra: no começo da Gênese. O tempo
então ainda não saíra do misterioso berço da Natureza e ninguém pode dizer em que época de
séculos nos achamos, porquanto o balancim dos séculos ainda não foi posto em movimento.
Mas, silêncio! soa na sineta eterna a primeira hora de uma Terra insulada, o planeta se
move no espaço e desde então há tarde e manhã. Para lá da Terra, a eternidade permanece
impassível e imóvel, embora o tempo marche com relação a muitos outros mundos. Para a Terra,
o tempo a substitui e durante uma determinada série de gerações contar-se-ão os anos e os
séculos.
Transportemo-nos agora ao último dia desse mundo, à hora em que, curvado sob o peso
da vetustez, ele se apagará do livro da vida para aí não mais reaparecer. Interrompe-se então a
sucessão dos eventos; cessam os movimentos terrestres que mediam o tempo e o tempo acaba
com eles.
Esta simples exposição das coisas que dão nascimento ao tempo, que o alimentam e
deixam que ele se extinga, basta para mostrar que, visto do ponto em que houvemos de
colocamos para os nossos estudos, o tempo é uma gota d’água que cai da nuvem no mar e cuja
queda é medida.
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Tantos mundos na vasta amplidão, quantos tempos diversos e incompatíveis. Fora dos
mundos, somente a eternidade substitui essas efêmeras sucessões e enche tranqüilamente da sua
luz imóvel a imensidade dos céus. Imensidade sem limites e eternidade sem limites, tais as duas
grandes propriedades da natureza universal.
O olhar do observador, que atravessa, sem jamais encontrar o que o detenha, as
incomensuráveis distâncias do espaço, e o do geólogo, que remonta além dos limites das idades,
ou que desce às profundezas da eternidade de fauces escancaradas, onde ambos um dia se
perderão, atuam em concordância, cada um na sua direção, para adquirir esta dupla noção do
infinito: extensão e duração.
Dentro desta ordem de idéias, fácil nos será conceber que, sendo o tempo apenas a
relação das coisas transitórias e dependendo unicamente das coisas que se medem, se
tomássemos os séculos terrestres por unidade e os empilhássemos aos milheiros, para formar um
número colossal, esse número nunca representaria mais que um ponto na eternidade, do mesmo
modo que milhares de léguas adicionadas a milhares de léguas não dão mais que um ponto na
extensão.
Assim, por exemplo, estando os séculos fora da vida etérea da alma, poderíamos escrever
um número tão longo quanto o equador terrestre e supomos envelhecidos desse número de
séculos, sem que na realidade nossa alma conte um dia a mais. E juntando, a esse número
indefinível de séculos, uma série de números semelhantes, longa como daqui ao Sol, ou ainda
mais consideráveis, se imaginássemos viver durante uma sucessão prodigiosa de períodos
seculares representados pela adição de tais números, quando chegássemos ao termo, o
inconcebível amontoado de séculos que nos passaria sobre a cabeça seria como se não existisse:
diante de nós estaria sempre toda a eternidade.
O tempo é apenas uma medida relativa da sucessão das coisas transitórias; a eternidade
não é suscetível de medida alguma, do ponto de vista da duração; para ela, não há começo, nem
fim: tudo lhe é presente.
Se séculos de séculos são menos que um segundo, relativamente à eternidade, que vem a
ser a duração da vida humana?
Fontes de consulta
1.
2.
3.
4.
Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Perguntas 3, 13 e 35.
Allan Kardec. A Gênese. Uranografia Geral. Capítulo 6, itens 1 e 2
Camille Flammarion. Sonhos Estelares. O Universo Ulterior. FEB, 1941, pág. 97
Hermínio Miranda. A Memória e o Tempo. As Estruturas, Tempo e Espaço.
EDICEL, 1981, 1ª parte, pág. 28.
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Deus: Materialismo e Panteísmo
Panteísmo
14. Deus é um ser distinto, ou será, como opinam alguns, a resultante de todas as forças
e de todas as inteligências do Universo reunidas?
“Se fosse assim, Deus não existiria, porquanto seria efeito e não causa. Ele não pode ser
ao mesmo tempo uma e outra coisa.
“Deus existe; disso não podeis duvidar e é o essencial. Crede-me, não vades além. Não
vos percais num labirinto donde não lograríeis sair. Isso não vos tomaria melhores, antes um
pouco mais orgulhosos, pois que acreditaríeis saber, quando na realidade nada saberíeis. Deixai,
conseqüentemente, de lado todos esses sistemas; tendes bastantes coisas que vos tocam mais de
perto, a começar por vós mesmos. Estudai as vossas próprias imperfeições, a fim de vos
libertardes delas, o que será mais útil do que pretenderdes penetrar no que é impenetrável.”
15. Que se deve pensar da opinião segundo a qual todos os corpos da Natureza, todos os
seres, todos os globos do Universo seriam partes da Divindade e constituiriam, em conjunto, a
própria Divindade, ou, por outra, que se deve pensar da doutrina panteísta?
“Não podendo fazer-se Deus, o homem quer ao menos ser uma parte de Deus.”
16. Pretendem os que professam esta doutrina achar nela a demonstração de alguns dos
atributos de Deus: Sendo infinitos os mundos, Deus é, por isso mesmo, infinito; não havendo o
vazio, ou o nada em parte alguma, Deus está por toda parte; estando Deus em toda parte, pois
que tudo é parte integrante de Deus, Ele dá a todos os fenômenos da Natureza uma razão de ser
inteligente. Que se pode opor a este raciocínio?
“A razão. Refleti maduramente e não vos será difícil reconhecer-lhe o absurdo.”
Esta doutrina faz de Deus um ser material que, embora dotado de suprema inteligência,
seria em ponto grande o que somos em ponto pequeno. Ora, transformando-se a matéria
incessantemente, Deus, se fosse assim, nenhuma estabilidade teria; achar-se-ia sujeito a todas as
vicissitudes, mesmo a todas as necessidades da Humanidade; faltar-lhe-ia um dos atributos
essenciais da Divindade: a imutabilidade. Não se podem aliar as propriedades da matéria à idéia
de Deus, sem que Ele fique rebaixado ante a nossa compreensão e não haverá sutilezas de
sofismas que cheguem a resolver o problema da Sua natureza íntima. Não sabemos tudo o que
Ele é, mas sabemos o que Ele não pode deixar de ser e o sistema de que tratamos está em
contradição com as suas mais essenciais propriedades. Ele confunde o Criador com a criatura,
exatamente como o faria quem pretendesse que engenhosa máquina fosse parte integrante do
mecânico que a imaginou.
A inteligência de Deus se revela em Suas obras como a de um pintor no seu quadro; mas,
as obras de Deus não são o próprio Deus, como o quadro não é o pintor que o concebeu e
executou.
Fontes de consulta
1 – Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Perg. 14 a 16.
2 – Camille Flammarion. Deus na Natureza. FEB, 1987. págs 4o2 a 4o4 e 4o6 a 4o7.
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Criação Divina: Elementos Gerais do Universo
Dotado por Deus com atributo superior da inteligência, tem buscado o homem conhecer o mundo
em que vive e o Universo de que é ínfima parte. Limitado, porém, é ainda o alcance de sua
inteligência, e o princípio das coisas lhe é vedado. Em encarnações sucessivas, entretanto, com a
própria aplicação na busca incessante de novos conhecimentos, ele a vai desenvolvendo e
adquirindo também dignificantes virtudes morais, que lhe granjeiam merecimento a outorgas
divinas cada vez mais altas. Assim progride o Espírito penetrando, pouco a pouco, os segredos
do Universo e aproximando-se dos mistérios que nos traz a consoladora Doutrina dos Espíritos.
Não é dado ao homem conhecer o princípio das coisas, ainda, porque “(...) Deus não permite que
ao homem tudo seja revelado neste mundo, “porém, é certo que o “o véu se levanta a seus olhos,
à medida que ele se depura; mas, para compreender certas coisas, são-lhe precisas faculdades que
ainda não possui,”.
Mesmo através dos grandes progressos da ciência, o homem ainda estará limitado. “A ciência lhe
foi dada para o seu adiantamento em todas as coisas; ele, porém não pode ultrapassar os limites
que Deus estabeleceu. (...)”
Além da Ciência, que é a fonte dos conhecimentos que ele deve adquirir com o próprio esforço
de pesquisa, aplicando a inteligência, a lógica dos raciocínios e os métodos experimentais, tem o
homem na Revelação outra fonte para acrescer aos seus conhecimentos. Deus permite que essa
revelação lhe seja feita por intermédio de Espíritos Superiores, no domínio exclusivo da Ciência
Pura, isto é, sem quaisquer objetivos utilitaristas, aplicações práticas ou tecnológicas.
“Dado é ao homem receber, sem ser por meio das investigações da Ciência, comunicações de
ordem mais elevada acerca do que lhe escapa ao testemunho dos sentidos?
-
Sim, se ao julgar conveniente, Deus pode revelar o que à Ciência não é dado apreender.”
O que pode, pois valendo-se dessas fontes de informação, o homem saber sobre a constituição do
Universo? A Ciência limitou-se a considerar como únicas realidades existentes a matéria e a
energia. Aprofundando-se, entretanto, no seu conhecimento chegou à conclusão de que estão de
tal modo e tão estreitamente relacionadas que representam, em verdade, duas expressões de uma
só e mesma realidade, não sendo a matéria mais do que energia condensada ou concentrada,
limitada em sua força e dinamismo próprios, verdadeiramente escravizada, encerrada em
âmbitos restritos para formar as massas densas dos corpos materiais. Inversamente, em
determinadas condições é a matéria atingida em sua massa, sofre desconcentração, descondensase, desintegra-se, libertando energia em radiações diversas de natureza corpuscular. Há sempre
lado a lado, no Universo, matéria densa e energia livre em interações recíprocas, que
condicionam os dois processos inversos e de libertação de energia. Enorme já é o acervo de
conhecimentos, que, sobre esse aspecto do Universo, a Ciência e a tecnologia permitiram ao
homem acumular, mas que escapa, evidentemente, aos objetivos deste resumo. Entretanto, e é
isto o que nos cabe assinalar aqui, não considerou a Ciência, na Constituição do Universo, senão
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o elemento material, quer em seu estado denso, que em suas manifestações energéticas. Não
procedeu assim a Revelação. Esta ensina que há fundamentalmente dois elementos gerais no
Universo: o elemento material (bruto) e o elemento espiritual (inteligente). Mas com uma
particularidade importantíssima, referente ao elemento material: este não abrange somente as
formas densas, visíveis e tangíveis, dotadas de massa e ponderabilidade, extensão e
impenetrabilidade, mas também estados sutis, não acessíveis aos sentidos, em que desaparecem a
massa tangível e a ponderabilidade, e surge a característica penetrabilidade, em relação à massa
densa. Vejamos o que responderam os Espíritos às indagações de Kardec:
“Define-se geralmente a matéria como sendo – o que tem extensão, o que é capaz de nos
impressionar os sentidos, o que é impenetrável. São exatas essas definições?
-
Do vosso ponto de vista, elas o são, porque não falais senão do que conheceis. Mas a
matéria existe em estados que ignorais. Podem ser, por exemplo, tão etérea e sutil que
nenhuma impressão vos cause aos sentidos. Contudo, é sempre matéria. Para vós, porém,
não o seria.
“Que definição podeis dar da matéria?
-
A matéria é o laço que prende o Espírito; é o instrumento de que este se serve e sobre o
qual, ao mesmo tempo, exerce sua ação. (...)”
“Há então dois elementos gerais do Universo: a matéria e o Espírito?
-
Sim e acima de tudo Deus, o criador, o pai de todas as coisas. Deus, espírito e matéria
constituem o princípio de tudo o que existe, a trindade universal. Mas, ao elemento
material se tem que juntar o fluido universal que desempenha o papel de intermediário
entre o Espírito e a matéria propriamente dita, por demais grosseira para que o Espírito
possa exercer ação sobre ela. Embora, de certo ponto de vista, seja lícito classifica-lo
como elemento material, ele se distingue deste por propriedades especiais. Se o fluido
universal fosse positivamente matéria, razão não haveria para que também o Espírito não
o fosse. Está colocado entre o Espírito e a matéria; é fluido, como a matéria é matéria e
suscetível, pelas inúmeras combinações com esta e sob a ação do Espírito, de produzir a
infinita variedade das coisas de que apenas conheceis uma parte mínima. Esse fluido
universal ou primitivo, ou elementar, sendo o agente de que o Espírito se utiliza, é o
princípio sem o qual a matéria estaria em perpétuo estado de divisão e nunca adquiriria as
qualidades que a gravidade lhe dá. (...)”
Estas passagens de O Livro dos Espíritos, especialmente a última, de nº 27, são bastante
elucidativas, quando não se tem o espírito escravizado aos preconceitos científicos materialistas.
Tudo no Universo procede de Deus, suprema potência criadora.
Deus criou o fluido universal ou matéria cósmica, que enche o espaço infinito e é,
verdadeiramente, o elemento primitivo, a partir do qual se forma tudo o que no Universo é
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material: os mundos e todos os seres. Estes são a concretização das idéias divinas, por força da
Sua onipotente vontade. Deus criou também o espírito, elemento inteligente, o qual é submetido
a longa elaboração através dos diversos reinos da Natureza.
No contato com minerais, vegetais e animais, o princípio inteligente recebe impressões que pela
repetição, vão-se fixando, dando origem a automatismos, reflexos, instintos, hábitos, memória e
acabam por integrar-se em individualistas conscientes, dotados de razão e vontade, livre arbítrio
e responsabilidade, destinadas a progredir até que adquiram pureza e perfeição que as
aproximam da Inteligência Suprema. Então, Espíritos puros e perfeitos, que adquiriram com a
perfeição um profundo conhecimento das leis universais, possuindo também os mais elevados
sentimentos excelsas virtudes, detentoras de sentidos e poderes espirituais superiores, as idéias
divinas tomam-se-lhes perceptíveis, são-lhes transmitidas e, executores que podem ser da
Suprema Vontade, concretizam-nas em formas materiais, elaborando mundos e presidindo neles
ao desabrochar da vida. Tomam-se assim, colaboradores de Deus na obra da Criação.
Portanto, a idéia criadora procede de Deus e pode surgir no Espírito. Só o Espírito pode conceber
idéias. A idéia toma forma pela ação da vontade divina ou do Espírito sobre o fluido e a matéria,
está apto a receber a influência daquele transmitindo-a a esta.
A importância desse fluido universal na constituição do Universo pode-se bem aquilatar nas
respostas dadas pelos Espíritos às indagações de Allan Kardec, constantes uma em O Livro dos
Médiuns, outras na obra básica já citada.
1º O fluido universal não é emanação da divindade
2º É uma criação divina, como tudo que há na Natureza.
3º Fluido universal é também o elemento universal; (...) é o princípio elementar de todas as
coisas.”
4º É o elemento do fluido elétrico.
5º Para se encontrar o fluido universal na sua simplicidade absoluta, é preciso ascender aos
Espíritos Puros. No nosso mundo, ele está mais ou menos modificado, para formar a matéria
compacta que nos cerca.
6º O estado de simplicidade absoluta que mais se lhe aproxima é o fluido a que chamamos fluido
magnético animal.
A Ciência considera as seguintes propriedades da matéria:
a) massa – “(...) quantidade de matéria de um corpo. (...)” ;
b) extensão – “(...) é a porção do espaço ocupada pela matéria. Toda matéria ocupa um
determinado lugar no espaço;
c) impenetrabilidade - “Duas porções de matéria não podem, ao mesmo tempo, ocupar o
mesmo lugar espaço. (...)”
d) inércia – “Quando um corpo, formado naturalmente por matéria, está em repouso, é
necessária uma força para coloca-lo em movimento. Se o corpo estiver em movimento, é
necessária uma força para alterá-lo ou fazer o corpo parar. (...)”
e) divisibilidade – “(...) Podemos dividir um corpo ou pulveriza-lo até certo limite. (...)” As
partículas são formadas de partículas menores, chamadas átomos”
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É interessante definir, também, que “Matéria é tudo o que possui massa e extensão. Corpo é uma
porção limitada da matéria e Substâncias são as diferentes espécies de matéria. (...)”
Com relação a outra propriedade da matéria, vejamos o que Kardec nos apresenta em O Livro
dos Espíritos:
A matéria é formada de um só ou de muitos elementos?
“De um só elemento primitivo. Os corpos que considerais simples não são
verdadeiros elementos, são transformações da matéria primitiva.”
Donde se originam as diversas propriedades da matéria?
“São modificações que as moléculas elementares sofrem, por efeito da sua união,
em certas circunstâncias.”
A mesma matéria elementar é suscetível de experimentar todas as modificações
e de adquirir todas as propriedades?
“Sim e é isso o que se deve entender, quando dizemos que tudo está em tudo!”
Não parece que esta teoria dá razão aos que não admitem na matéria senão
duas propriedades essenciais: a força e o movimento, entendendo que todas as demais
propriedades não passam de efeitos secundários, que variam conforme à intensidade da
força e à direção do movimento?
“É acertada essa opinião. Falta somente acrescentar: e conforme à disposição das
moléculas, como o mostra, por exemplo, um corpo opaco, que pode tomar-se transparente e
vice-versa.”
Finalmente, complementando o assunto sobre as propriedades da matéria, Allan Kardec
pergunta aos Espíritos Superiores:
As moléculas têm forma determinada?
“Certamente, as moléculas têm uma forma, porém não sois capazes de apreciá-la.”
a) - Essa forma é constante ou variável?
“Constante a das moléculas elementares primitivas; variável a das moléculas
secundárias, que mais não são do que aglomerações das primeiras. porque, o que chamais
molécula longe ainda está da molécula elementar.”
Estas últimas afirmações dos Espíritos, que Kardec registrou com absoluta fidelidade, constituem
admirável antecipação das verdades sobre a descontinuidade da matéria e a sua unicidade, a
primeira já totalmente provada experimentalmente pela Ciência e a segunda admitida por ela
como inteiramente provável.
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Allan Kardec não podia, portanto, empregar outro termo senão moléculas para designar as
menores partículas das substâncias, tanto as que representam a matéria densa, como aqueles
estados sutis da matéria que derivam diretamente do fluido universal, que é o próprio fluido
elementar primitivo. Entretanto, sem a nomenclatura que fornece os termos de hoje, na era da
Atomística e da quantificação da energia, da interação de partículas em campos de força gerados
por essas mesmas partículas, ele, Kardec, traduzindo o pensamento dos Espíritos, estabeleceu
categoricamente, em termos de generalização, as duas grandes verdades que a Ciência vem
confirmando dia-a-dia: o da descontinuidade da matéria, em todas as suas modalidades, mais e
menos densas, e a da sua unicidade de origem, isto é, de que a matéria é uma; apesar de sua
aparente diversidade, todas as modalidades de substâncias, não sendo mais que modificações da
matéria cósmica ou substância elementar primitiva, elemento único de que deriva tudo o que é
material no Universo. Todo louvor, pois, a Kardec, cuja obra em vez de consignar um erro ou um
engano, muito ao contrário, registra, em termos de generalidades, uma admirável antecipação da
verdade.
Fonte de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Médiuns. Capítulo IV. Da Teoria Das Manifestações Físicas,
item 74.
2. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Capítulo II, Dos Elementos Gerais Do Universo,
perg. 18 a 34.
Criação Divina: Formação dos mundos e dos seres vivos
Formação dos mundos
O Universo abrange a infinidade dos mundos que vemos e dos que não vemos, todos os seres
animados e inanimados, todos os astros que se movem no espaço, assim como os fluidos que o
enchem.
37. O Universo foi criado, ou existe de toda a eternidade, como Deus?
“É fora de dúvida que ele não pode ter-se feito a si mesmo. Se existisse, como Deus, de toda a
eternidade, não seria obra de Deus.” Diz-nos a razão não ser possível que o Universo se tenha
feito a si mesmo e que, não podendo também ser obra do acaso, há de ser obra de Deus.
38. Como criou Deus o Universo?
“Para me servir de uma expressão corrente, direi: pela sua Vontade. Nada caracteriza melhor
essa vontade onipotente do que estas belas palavras da Gênese - “Deus disse: Faça-se a luz e a
luz foi feita.”
39. Poderemos conhecer o modo de formação dos mundos?
“Tudo o que a esse respeito se pode dizer e podeis compreender é que os mundos se formam pela
condensação da matéria disseminada no Espaço.”
40. Serão os cometas, como agora se pensa, um começo de condensação da matéria, mundos em
via de formação?
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“Isso está certo; absurdo, porém, é acreditar-se na influência deles. Refiro-me à influência que
vulgarmente lhes atribuem, porquanto todos os corpos celestes influem de algum modo em certos
fenômenos físicos.”
41. Pode um mundo completamente formado desaparecer e disseminar-se de novo no Espaço a
matéria que o compõe?
“Sim, Deus renova os mundos, como renova os seres vivos.”
42. Poder-se-á conhecer o tempo que dura a formação dos mundos: da Terra, por exemplo?
“Nada te posso dizer a respeito, porque só o Criador o sabe e bem louco será quem pretenda
sabê-lo, ou conhecer que número de séculos dura essa formação.”
Formação dos seres vivos
43. Quando começou a Terra a ser povoada?
“No começo tudo era caos; os elementos estavam em confusão. Pouco a pouco cada coisa tomou
o seu lugar. Apareceram então os seres vivos apropriados ao estado do globo.”
44. Donde vieram para a Terra os seres vivos?
“A Terra lhes continha os germens, que aguardavam momento favorável para se desenvolverem.
Os princípios orgânicos se congregaram, desde que cessou a atuação da força que os mantinha
afastados, e formaram os germens de todos os seres vivos. Estes germens permaneceram em
estado latente de inércia, como a crisálida e as sementes das plantas, até o momento propício ao
surto de cada espécie. Os seres de cada uma destas se reuniram, então, e se multiplicaram.”
45. Onde estavam os elementos orgânicos, antes da formação da Terra?
“Achavam-se, por assim dizer, em estado de fluido no Espaço, no meio dos Espíritos, ou em
outros planetas, à espera da criação da Terra para começarem existência nova em novo globo.” A
Química nos mostra as moléculas dos corpos inorgânicos unindo-se para formarem cristais de
uma regularidade constante, conforme cada espécie, desde que se encontrem nas condições
precisas. A menor perturbação nestas condições basta para impedir a reunião dos elementos, ou,
pelo menos, para obstar à disposição regular que constitui o cristal. Por que não se daria o
mesmo com os elementos orgânicos? Durante anos se conservam germens de plantas e de
animais, que não se desenvolvem senão a uma certa temperatura e em meio apropriado. Têm-se
visto grãos de trigo germinarem depois de séculos. Há, pois, nesses germens um princípio
latente de vitalidade, que apenas espera uma circunstância favorável para se desenvolver. O que
diariamente ocorre debaixo das nossas vistas, por que não pode ter ocorrido desde a origem do
globo terráqueo? A formação dos seres vivos, saindo eles do caos pela força mesma da Natureza,
diminui de alguma coisa a grandeza de Deus? Longe disso: corresponde melhor à idéia que
fazemos do Seu poder a se exercer sobre a infinidade dos mundos por meio de leis eternas. Esta
teoria não resolve, é verdade, a questão da origem dos elementos vitais; mas, Deus tem Seus
mistérios e pôs limites às nossas investigações.
46. Ainda há seres que nasçam espontaneamente?
“Sim, mas o gérmen primitivo já existia em estado latente. Sois todos os dias testemunhas desse
fenômeno. Os tecidos do corpo humano e do dos animais não encerram os germens de uma
multidão de vermes que só esperam, para desabrochar, a fermentação pútrida que lhes é
necessária à existência? É um mundo minúsculo que dormita e se cria.”
47. A espécie humana se encontrava entre os elementos orgânicos contidos no globo terrestre?
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“Sim, e veio a seu tempo. Foi o que deu lugar a que se dissesse que o homem se formou do limo
da terra.”
48. Poderemos conhecer a época do aparecimento do homem e dos outros seres vivos na Terra?
“Não; todos os vossos cálculos são quiméricos.”
49. Se o gérmen da espécie humana se encontrava entre os elementos orgânicos do globo, por
que não se formam espontaneamente homens, como na origem dos tempos?
“O princípio das coisas está nos segredos de Deus. Entretanto, pode dizer-se que os homens, uma
vez espalhados pela Terra, absorvem em si mesmos os elementos necessários à sua própria
formação, para os transmitir segundo as leis da reprodução. O mesmo se deu com as diferentes
espécies de seres vivos.”
Fonte de consulta
1. Allan Kardec. A Gênese. Capítulo VI, itens 3, 6, 7, 10, 17, 20, 22..
2. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Capítulo 3, itens 37 a 49.
Criação Divina: Os Reinos da Natureza: Mineral, Vegetal, Animal e Hominal
Os minerais e as plantas
585. Que pensais da divisão da Natureza em três reinos, ou melhor, em duas classes: a dos seres
orgânicos e a dos inorgânicos? Segundo alguns, a espécie humana forma uma quarta classe.
Qual destas divisões é preferível?
“Todas são boas, conforme o ponto de vista. Do ponto de vista material, apenas há seres
orgânicos e inorgânicos. Do ponto de vista moral, há evidentemente quatro graus.” Esses quatro
graus apresentam, com efeito, caracteres determinados, muito embora pareçam confundir-se nos
seus limites extremos. A matéria inerte, que constitui o reino mineral, só tem em si uma força
mecânica. As plantas, ainda que compostas de matéria inerte, são dotadas de vitalidade. Os
animais, também compostos de matéria inerte e igualmente dotados de vitalidade, possuem, além
disso, uma espécie de inteligência instintiva, limitada, e a consciência de sua existência e de suas
individualidades. O homem, tendo tudo o que há nas plantas e nos animais, domina todas as
outras classes por uma inteligência especial, indefinida, que lhe dá a consciência do seu futuro, a
percepção das coisas extramateriais e o conhecimento de Deus.
586. Têm as plantas consciências de que existem?
“Não, pois que não pensam; só têm vida orgânica.”
587. Experimentam sensações? Sofrem quando as mutilam?
“Recebem impressões físicas que atuam sobre a matéria, mas não têm percepções.
Conseguintemente, não têm a sensação da dor.”
588. Independe da vontade delas a força que as atrai umas para as outras?
“Certo, porquanto não pensam. É uma força mecânica da matéria, que atua sobre a matéria, sem
que elas possam a isso opor-se.”
589. Algumas plantas, como a sensitiva e a dionéia, por exemplo, executam movimentos que
denotam grande sensibilidade e, em certos casos, uma espécie de vontade, conforme se observa
na segunda, cujos lóbulos apanham a mosca que sobre ela pousa para sugá-la, parecendo que
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urde uma armadilha com o fim de capturar e matar aquele inseto. São dotadas essas plantas da
faculdade de pensar? Têm vontade e formam uma classe intermediária entre a Natureza vegetal
e Natureza animal? Constituem a transição de uma para outra?
“Tudo em a Natureza é transição, por isso mesmo que uma coisa não se assemelha a outra e, no
entanto, todas se prendem umas às outras. As plantas não pensam; por conseguinte carecem de
vontade. Nem a ostra que se abre, nem os zoófilos pensam: têm apenas um instinto cego e
natural.”
O organismo humano nos proporciona exemplo de movimentos análogos, sem participação da
vontade, nas funções digestivas e circulatórias. O piloro se contrai, ao contacto de certos corpos,
para lhes negar passagem. O mesmo provavelmente se dá na sensitiva, cujos movimentos de
nenhum modo implicam a necessidade de percepção e, ainda menos, da vontade.
590. Não haverá nas plantas, como nos animais, um instinto de conservação, que as induza a
procurar o que lhes possa ser útil e a evitar o que lhes possa ser nocivo?
“Há, se quiserdes, uma espécie de instinto, dependendo isso da extensão que se dê ao significado
desta palavra. É, porém, um instinto puramente mecânico. Quando, nas operações químicas,
observais que dois corpos se reúnem, é que um ao outro convém; quer dizer: é que há entre eles
afinidade. Ora, a isto não dais o nome de instinto.”
591. Nos mundos superiores, as plantas são de natureza mais perfeita, como os outros seres?
“Tudo é mais perfeito. As plantas, porém, são sempre plantas, como os animais sempre animais e
os homens sempre homens.”
Os animais e o homem
592. Se, pelo que toca à inteligência, comparamos o homem e os animais, parece difícil
estabelecer-se uma linha de demarcação entre aquele e estes, porquanto alguns animais
mostram, sob esse aspecto, notória superioridade sobre certos homens. Pode essa linha de
demarcação ser estabelecida de modo preciso?
“A este respeito é completo o desacordo entre os vossos filósofos. Querem uns que o homem
seja um animal e outros que o animal seja um homem. Estão todos em erro. O homem é um ser à
parte, que desce muito baixo algumas vezes e que pode também elevar-se muito alto. Pelo físico,
é como os animais e menos bem dotado do que muitos destes. A Natureza lhes deu tudo o que o
homem é obrigado a inventar com a sua inteligência, para satisfação de suas necessidades e para
sua conservação. Seu corpo se destrói, como o dos animais, é certo, mas ao seu Espírito está
assinado um destino que só ele pode compreender, porque só ele é inteiramente livre. Pobres
homens, que vos rebaixais mais do que os brutos! Não sabeis distinguir-vos deles? Reconhecei o
homem pela faculdade de pensar em Deus.”
593. Poder-se-á dizer que os animais só obram por instinto?
“Ainda aí há um sistema. É verdade que na maioria dos animais domina o instinto. Mas, não vês
que muitos obram denotando acentuada vontade? É que têm inteligência, porém limitada.”
Não se poderia negar que, além de possuírem o instinto, alguns animais praticam atos
combinados, que denunciam vontade de operar em determinado sentido e de acordo com as
circunstâncias. Há, pois, neles, uma espécie de inteligência, mas cujo exercício quase que se
circunscreve à utilização dos meios de satisfazerem às suas necessidades físicas e de proverem à
conservação própria. Nada, porém, criam, nem melhora alguma realizam. Qualquer que seja a
arte com que executem seus trabalhos, fazem hoje o que faziam outrora e o fazem, nem melhor,
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nem pior, segundo formas e proporções constantes e invariáveis. A cria, separada dos de sua
espécie, não deixa por isso de construir o seu ninho de perfeita conformidade com os seus
maiores, sem que tenha recebido nenhum ensino. O desenvolvimento intelectual de alguns, que
se mostram suscetíveis de certa educação, desenvolvimento, aliás, que não pode ultrapassar
acanhados limites, é devido à ação do homem sobre uma natureza maleável, porquanto não há aí
progresso que lhe seja próprio. Mesmo o progresso que realizam pela ação do homem é efêmero
e puramente individual, visto que, entregue a si mesmo, não tarda que o animal volte a encerrarse nos limites que lhe traçou a Natureza.
594. Têm os animais alguma linguagem?
“Se vos referis a uma linguagem formada de sílabas e palavras, não. Meio, porém, de se
comunicarem entre si, têm. Dizem uns aos outros muito mais coisas do que imaginais, Mas, essa
mesma linguagem de que dispõem é restrita às necessidades, como restritas também são as idéias
que podem ter.”
a) - Há, entretanto, animais que carecem de voz. Esses parece que nenhuma linguagem usam,
não?
“Compreendem-se por outros meios. Para vos comunicardes reciprocamente, vós outros,
homens, só dispondes da palavra? E os mudos? Facultada lhes sendo a vida de relação, os
animais possuem meios de se prevenirem e de exprimirem as sensações que experimentam.
Pensais que os peixes não se entendem entre si? O homem não goza do privilégio exclusivo da
linguagem. Porém, a dos animais é instintiva e circunscrita pelas suas necessidades e idéias, ao
passo que a do homem é perfectível e se presta a todas as concepções da sua inteligência.”
Efetivamente, os peixes que, como as andorinhas, emigram em cardumes, obedientes ao guia que
os conduz, devem ter meios de se advertirem, de se entenderem e combinarem. É possível que
disponham de uma vista mais penetrante e esta lhes permita perceber os sinais que mutuamente
façam. Pode ser também que tenham na água um veículo próprio para a transmissão de certas
vibrações. Como quer que seja, o que é incontestável é que lhes não falecem meios de se
entenderem, do mesmo modo que a todos os animais carentes de voz e que, não obstante,
trabalham em comum. Diante disso, que admiração pode causar que os Espíritos entre si se
comuniquem sem o auxílio da palavra articulada?
595. Gozam de livre-arbítrio os animais, para a prática dos seus atos?
“Os animais não são simples máquinas, como supondes. Contudo, a liberdade de ação, de que
desfrutam, é limitada pelas suas necessidades e não se pode comparar à do homem. Sendo
muitíssimo inferiores a este, não têm os mesmos deveres que ele. A liberdade, possuem-na
restrita aos atos da vida material.”
596. Donde procede a aptidão que certos animais denotam para imitar a linguagem do homem e
por que essa aptidão se revela mais nas aves do que no macaco, por exemplo, cuja conformação
apresenta mais analogia com a humana?
“Origina-se de uma particular conformação dos órgãos vocais, reforçada pelo instinto de
imitação. O macaco imita os gestos; algumas aves imitam a voz.”
597. Pois que os animais possuem uma inteligência que lhes faculta certa liberdade de ação,
haverá neles algum princípio independente da matéria?
“Há e que sobrevive ao corpo.”
a) - Será esse princípio uma alma semelhante à do homem?
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“É também uma alma, se quiserdes, dependendo isto do sentido que se der a esta palavra. É,
porém, inferior à do homem. Há entre a alma dos animais e a do homem distância equivalente à
que medeia entre a alma do homem e Deus.”
598. Após a morte, conserva a alma dos animais a sua individualidade e a consciência de si
mesma?
“Conserva sua individualidade; quanto à consciência do seu eu, não. A vida inteligente lhe
permanece em estado latente.”
599. À alma dos animais é dado escolher a espécie de animal em que encarne?
“Não, pois que lhe falta livre-arbítrio.”
600. Sobrevivendo ao corpo em que habitou, a alma do animal vem a achar-se, depois da morte,
nem estado de erraticidade, como a do homem?
“Fica numa espécie de erraticidade, pois que não mais se acha unida ao corpo, mas não é um
Espírito errante. O Espírito errante é um ser que pensa e obra por sua livre vontade. De idêntica
faculdade não dispõe o dos animais. A consciência de si mesmo é o que constitui o principal
atributo do Espírito. O do animal, depois da morte, é classificado pelos Espíritos a quem
incumbe essa tarefa e utilizado quase imediatamente. Não lhe é dado tempo de entrar em relação
com outras criaturas.”
601. Os animais estão sujeitos, como o homem, a uma lei progressiva?
“Sim; e daí vem que nos mundos superiores, onde os homens são mais adiantados, os animais
também o são, dispondo de meios mais amplos de comunicação. São sempre, porém, inferiores
ao homem e se lhe acham submetidos, tendo neles o homem servidores inteligentes.”
Nada há nisso de extraordinário, tomemos os nossos mais inteligentes animais, o cão, o elefante,
o cavalo, e imaginemo-los dotados de uma conformação apropriada a trabalhos manuais. Que
não fariam sob a direção do homem?
602. Os animais progridem, como o homem, por ato da própria vontade, ou pela força das
coisas?
“Pela força das coisas, razão por que não estão sujeitos à expiação.”
603. Nos mundos superiores, os animais conhecem a Deus?
“Não. Para eles o homem é um deus, como outrora os Espíritos eram deuses para o homem.”
604. Pois que os animais, mesmo os aperfeiçoados, existentes nos mundos superiores, são
sempre inferiores ao homem, segue-se que Deus criou seres intelectuais perpetuamente
destinados à inferioridade, o que parece em desacordo com a unidade de vistas e de progresso
que todas as suas obras revelam. “Tudo em a Natureza se encadeia por elos que ainda não
podeis apreender. Assim, as coisas aparentemente mais díspares têm pontos de contacto que o
homem, no seu estado atual, nunca chegará a compreender. Por um esforço da inteligência
poderá entrevê-los; mas, somente quando essa inteligência estiver no máximo grau de
desenvolvimento e liberta dos preconceitos do orgulho e da ignorância, logrará ver claro na obra
de Deus. Até lá, suas muito restritas idéias lhe farão observar as coisas por um mesquinho e
acanhado prisma. Sabei não ser possível que Deus se contradiga e que, na Natureza, tudo se
harmoniza mediante leis gerais, que por nenhum de seus pontos deixam de corresponder à
sublime sabedoria do Criador.”
a) - A inteligência é então uma propriedade comum, um ponto de contacto entre a alma dos
animais e a do homem?
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“É, porém os animais só possuem a inteligência da vida material. No homem, a inteligência
proporciona a vida moral.”
605. Considerando-se todos os pontos de contacto que existem entre o homem e os animais, não
seria lícito pensar que o homem possui duas almas: a alma animal e a alma espírita e que, se
esta última não existisse, só como o bruto poderia ele viver? Por outra: que o animal é um ser
semelhante ao homem, tendo de menos a alma espírita? Dessa maneira de ver resultaria serem
os bons e os maus instintos do homem efeito da predominância de uma ou outra dessas almas?
“Não, o homem não tem duas almas. O corpo, porém, tem seus instintos, resultantes da sensação
peculiar aos órgãos. Dupla, no homem, só é a Natureza. Há nele a natureza animal e a natureza
espiritual. Participa, pelo seu corpo, da natureza dos animais e de seus instintos. Por sua alma,
participa da dos Espíritos.”
a) - De modo que, além de suas próprias imperfeições de que cumpre ao Espírito despojar-se,
tem ainda o homem que lutar contra a influência da matéria?
“Quanto mais inferior é o Espírito, tanto mais apertados são os laços que o ligam à matéria. Não
o vedes? O homem não tem duas almas; a alma é sempre única em cada ser. São distintas uma da
outra a alma do animal e a do homem, a tal ponto que a de um não pode animar o corpo criado
para o outro. Mas, conquanto não tenha alma animal, que, por suas paixões, o nivele aos animais,
o homem tem o corpo que, às vezes, o rebaixa até ao nível deles, por isso que o corpo é um ser
dotado de vitalidade e de instintos, porém ininteligentes estes e restritos ao cuidado que a sua
conservação requer.”
Encarnado no corpo do homem, o Espírito lhe traz o princípio intelectual e moral, que o torna
superior aos animais. As duas naturezas nele existentes dão às suas paixões duas origens
diferentes: umas provêm dos instintos da natureza animal, provindo as outras das impurezas do
Espírito, de cuja encarnação é ele a imagem e que mais ou menos simpatiza com a grosseria dos
apetites animais. Purificando-se, o Espírito se liberta pouco a pouco da influência da matéria.
Sob essa influência, aproxima-se do bruto. Isento dela, eleva-se à sua verdadeira destinação.
606. Donde tiram os animais o princípio inteligente que constitui a alma de natureza especial de
que são dotados?
“Do elemento inteligente universal.”
a) - Então, emanam de um único princípio a inteligência do homem e a dos animais?
“Sem dúvida alguma, porém, no homem, passou por uma elaboração que a coloca acima da que
existe no animal.”
607. Dissestes (190) que o estado da alma do homem, na sua origem, corresponde ao estado da
infância na vida corporal, que sua inteligência apenas desabrocha e se ensaia para a vida.
Onde passa o Espírito essa primeira fase do seu desenvolvimento?
“Numa série de existências que precedem o período a que chamais Humanidade.”
a) - Parece que, assim, se pode considerar a alma como tendo sido o princípio inteligente dos
seres inferiores da criação, não?
“Já não dissemos que todo em a Natureza se encadeia e tende para a unidade? Nesses seres, cuja
totalidade estais longe de conhecer, é que o princípio inteligente se elabora, se individualiza
pouco a pouco e se ensaia para a vida, conforme acabamos de dizer. É, de certo modo, um
trabalho preparatório, como o da germinação, por efeito do qual o princípio inteligente sofre uma
transformação e se torna Espírito. Entra então no período da humanização, começando a ter
consciência do seu futuro, capacidade de distinguir o bem do mal e a responsabilidade dos seus
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atos. Assim, à fase da infância se segue a da adolescência, vindo depois a da juventude e da
madureza. Nessa origem, coisa alguma há de humilhante para o homem. Sentir-se-ão humilhados
os grandes gênios por terem sido fetos informes nas entranhas que os geraram? Se alguma coisa
há que lhe seja humilhante, é a sua inferioridade perante Deus e sua impotência para lhe sondar a
profundeza dos desígnios e para apreciar a sabedoria das leis que regem a harmonia do Universo.
Reconhecei a grandeza de Deus nessa admirável harmonia, mediante a qual tudo é solidário na
Natureza. Acreditar que Deus haja feito, seja o que for, sem um fim, e criado seres inteligentes
sem futuro, fora blasfemar da Sua bondade, que se estende por sobre todas as suas criaturas.”
b) Esse período de humanização principia na Terra?
“A Terra não é o ponto de partida da primeira encarnação humana. O período da humanização
começa, geralmente, em mundos ainda inferiores à Terra. Isto, entretanto, não constitui regra
absoluta, pois pode suceder que um Espírito, desde o seu início humano, esteja apto a viver na
Terra. Não é freqüente o caso; constitui antes uma exceção.”
608. O Espírito do homem tem, após a morte, consciência de suas existências ao período de
humanidade?
“Não, pois não é desse período que começa a sua vida de Espírito. Difícil é mesmo que se lembre
de suas primeiras existências humanas, como difícil é que o homem se lembre dos primeiros
tempos de sua infância e ainda menos do tempo que passou no seio materno. Essa a razão por
que os Espíritos dizem que não sabem como começaram.”
609. Uma vez no período da humanidade, conserva o Espírito traços do que era
precedentemente, quer dizer: do estado em que se achava no período a que se poderia chamar
ante-humano?
“Conforme a distância que medeie entre os dois períodos e o progresso realizado. Durante
algumas gerações, pode ele conservar vestígios mais ou menos pronunciados do estado
primitivo, porquanto nada se opera na Natureza por brusca transição. Há sempre anéis que ligam
as extremidades da cadeia dos seres e dos acontecimentos. Aqueles vestígios, porém, se apagam
com o desenvolvimento do livre-arbítrio. os primeiros progressos só muito lentamente se
efetuam, porque ainda não têm a secundá-los a vontade. Vão em progressão mais rápida, à
medida que o Espírito adquire perfeita consciência de si mesmo.”
610. Ter-se-ão enganado os Espíritos que disseram constituir o homem um ser à parte na ordem
da criação?
“Não, mas a questão não fora desenvolvida. Demais, há coisas que só a seu tempo podem ser
esclarecidas. O homem é, com efeito, um ser à parte, visto possuir faculdades que o distinguem
de todos os outros e ter outro destino. A espécie humana é a que Deus escolheu para a
encarnação do seres que podem conhecê-Lo.”
GÊNESE MOISAICA
Os seis dias
1. No começo criou Deus o Céu e a Terra. - 2. A Terra era uniforme e inteiramente nua; as
trevas cobriam a face do abismo e o Espírito de Deus boiava sobre as águas. - 3. Ora,
Deus disse: Faça-se a luz e a luz foi feita. - 4. Deus viu que a luz era boa e separou a luz
das trevas. - 5. Deu à luz o nome de dia e às trevas o nome de noite e da tarde e da manhã
se fez o primeiro dia. 6. Disse Deus também: Faça-se o Firmamento no meio das águas e
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que ele separe das águas as águas. - 7. E Deus fez o Firmamento e separou as águas que
estavam debaixo do Firmamento das que estavam acima do Firmamento. E assim se fez. 8. E Deus deu ao Firmamento o nome de céu; da tarde e da manhã se fez o segundo dia.
9. Disse Deus ainda: Reunam-se num só lugar as águas que estão sob o céu e apareça o
elemento árido. E assim se fez. - 10. Deus deu ao elemento árido o nome de terra e
chamou mar a todas as águas reunidas. E viu que isso estava bem. - 11. Disse mais
Produza a terra a erva verde que traz a semente e árvores frutíferas que dêem frutos cada
um de uma espécie, e que contenham em si mesmas as suas sementes, para se
reproduzirem na terra. E assim se fez. - 12. A terra então produziu a erva verde que trazia
consigo a sua semente, conforme a espécie, e árvores frutíferas que continham em si
mesmas suas sementes, cada uma de acordo com a sua espécie. E Deus viu que estava
bom. - 13. E da tarde e da manhã se fez o terceiro dia. 14. - Deus disse também: Façamse corpos de luz no firmamento do céu, a fim de que separem o dia da noite e sirvam de
sinais para marcar o tempo e as estações, os dias e os anos. - 15. Brilhem eles no
firmamento do céu e iluminem a Terra. E assim se fez. - 16. Deus então fez dois grandes
corpos luminosos, um, maior, para presidir ao dia, o outro, menor, para presidir ã noite;
fez também as estrelas. - 17. E os pôs no firmamento do céu, para brilharem sobre a
Terra. - 18. Para presidirem ao dia e à noite e para separarem a luz das trevas. E Deus viu
que estava bom. - 19. E da tarde e da manhã se fez o quarto dia. 20. Disse Deus ainda:
Produzam as águas animais vi vos que nadem nas águas e pássaros que voem sobre a
Terra debaixo do firmamento do céu. - 21. Deus então criou os grandes peixes e todos os
animais que têm vida e movimento, que as águas produziram, cada um de uma espécie, e
criou também todos os pássaros, cada um de uma espécie. Viu que estava bom. - 22. E os
abençoou, dizendo: Crescei e multiplicai-vos e enchei as águas do mar; e que os pássaros
se multipliquem sobre a Terra. - 23. E da tarde e da manhã se fez o quinto dia. 24.
Também disse Deus: Produza a Terra animai5 vivos, cada um de sua espécie, os animais
domésticos e os armais selvagens, em suas diferentes espécies. E assim se fez. - 25. Deus
fez, pois, os animais selvagens da Terra em suas espécies, os animais domésticos e todos
os répteis, cada um de sua espécie. E Deus viu que estava bom. 26. Disse, em seguida:
Façamos o homem a nossa imagem e semelhança e que ele mande sobre os peixes do
mar, os pássaros do céu, os animais, sobre toda a Terra e sobre todos os répteis que se
movem na terra. - 27. Deus então criou o homem à sua imagem e o criou à imagem de
Deus e o criou macho e fêmea. - 28. Deus os abençoou e lhes disse: Crescei e multiplicaivos, enchei a Terra e sujeitai-a, dominai sobre os peixes do mar, sobre os pássaros do céu
e sobre todos os animais que se movem na terra. - 29. Disse Deus ainda: Dei-vos todas as
ervas que trazem sua semente à terra e todas as árvores que encerram em si mesmas suas
sementes, cada uma de uma espécie, a fim de que vos sirvam de alimento. - 30. E dei-as a
todos os animais da terra, a todos os pássaros do céu, a tudo o que se move na Terra e que
é vivo e animado, a fim de que tenham com que se alimentar. E assim se fez. - 31. Deus
viu todas as coisas que havia feito; eram todas muito boas. - 23. E da tarde e da manhã se
fez o sexto dia.
1. O Céu e a Terra ficaram, pois, acabados assim com todos os seus ornamentos. - 2. Deus
terminou no sétimo dia toda a obra que fizera e repousou nesse sétimo dia, após haver acabado
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todas as suas obras. - 3. Abençoou o sétimo dia e o santificou, porque cessara nesse dia de
produzir todas as obras que criara. - 4. Tal a origem do Céu e da Terra e é assim que eles foram
criados no dia que o Senhor fez um e outro. - 5. E que criou todas as plantas dos campos antes
que houvessem saído da terra e todas as ervas das planícies antes que houvessem germinado.
Porque, o Senhor Deus ainda não tinha feito que chovesse sobre a terra e não havia homem para
lavrá-la. - 6. Mas da terra se elevava uma fonte que lhe regava toda a superfície. 7. O Senhor
Deus formou, pois, o homem do limo da terra e lhe espalhou sobre o rosto um sopro de vida, e o
homem se tornou vivente e animado.
2. - Depois das explanações contidas nos capítulos precedentes sobre a origem e a constituição
do Universo, conformemente aos dados fornecidos pela Ciência, quanto à parte material, e pelo
Espiritismo, quanto à parte espiritual, convém ponhamos em confronto com tudo isso o próprio
texto da Gênese de Moisés, a fim de que cada um faça a comparação e julgue com conhecimento
de causa. Algumas explicações complementares bastarão para tornar compreensíveis as partes
que precisam de esclarecimentos especiais.
3. - Sobre alguns pontos, há, sem dúvida, notável concordância entre a Gênese moisaica e a
doutrina científica; mas, fora erro acreditar que basta se substituam os seis dias de 24 horas da
criação por seis períodos indeterminados, para se tornar completa a analogia. Não menor erro
seria o acreditar-se que, afora o sentido alegórico de algumas palavras, a Gênese e a Ciência
caminham lado a lado, sendo uma, como se vê, simples paráfrase da outra.
4. - Notemos, em primeiro lugar, que, como já se disse (cap. VII, nº 14), é inteiramente arbitrário
o número de seis períodos geológicos, pois que se eleva a mais de vinte e cinco o das formações
bem caracterizadas, número que, ao demais, apenas determina as grandes fases gerais. Ele só foi
adotado, em começo, para encaixar as coisas, o mais possível, no texto bíblico, numa época, aliás
pouco distante, em que se entendia que a Ciência devia ser controlada pela Bíblia Essa a razão
por que os autores da maior parte das teorias cosmogônicas, tendo em vista facilitar-lhe a
aceitação, se esforçaram por pôr-se de acordo com o texto sagrado. Logo que se apoiou no
método experimental, a Ciência sentiu-se mais forte e se emancipou. Hoje, é ela que controla a
Bíblia.
Doutro lado, a Geologia, tomando por ponto de partida unicamente a formação dos terrenos
graníticos, não abrange, no cômputo de seus períodos, o estado primitivo da Terra. Tampouco se
ocupa com o Sol, com a Lua e com as estrelas, nem com o conjunto do Universo, assuntos esses
que pertencem à Astronomia. Para enquadrar tudo na Gênese, cumpre se acrescente um primeiro
período, que abarque essa ordem de fenômenos e ao qual se poderia chamar - período
astronômico.
Além disso, nem todos os geólogos consideram o diluviano como formando um período distinto,
mas como um fato transitório e passageiro, que não mudou sensivelmente o estado climático do
globo, nem marcou uma fase nova para as espécies vegetais e animais, pois que, com poucas
exceções, as mesmas espécies se encontram, assim antes, como depois do dilúvio. Pode-se, pois,
abstrair desse período, sem menosprezo da verdade.
5. - O quadro comparativo aqui abaixo, em o qual se acham resumidos os fenômenos que
caracterizam cada um dos seis períodos, permite se considere o conjunto e se notem as relações e
as diferenças que existem entre os referidos períodos e a Gênese bíblica.
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CIÊNCIA
I. PERÍODO ASTRONÔMICO - Aglomeração da matéria
cósmica universal, num ponto do espaço, em nebulosa que deu
origem, pela condensação da matéria em diversos pontos, às
estrelas, ao Sol, à Terra, à Lua e a todos os planetas. Estado
primitivo, fluídico e incandescente da Terra. - Atmosfera imensa
carregada de toda a água em vapor e de todas as matérias
volatilizáveis.
II. PERÍODO PRIMÁRIO. - Endurecimento da superfície da
Terra, pelo resfriamento; formação das camadas graníticas. Atmosfera espessa e ardente, impenetrável aos raios solares. Precipitação gradual da água e das matérias sólidas volatilizadas
no ar. - Ausência completa de vida orgânica.
III. - PERÍODO DE TRANSIÇÃO. - As águas cobrem toda a
superfície do globo. - Primeiros depósitos de sedimentos
formados pelas águas. - Calor úmido. - O Sol começa a
atravessar a atmosfera brumosa. - Primeiros seres organizados
da mais rudimentar constituição. - Liquens, musgos, fetos,
licopódios, plantas herbáceas. Vegetação colossal. - Primeiros
animais marinhos: zoófítos, polipeiros, crustáceos. - Depósitos
de hulha.
IV. PERÍODO SECUNDÁRIO. - Superfície da Terra pouco
acidentada; águas pouco profundas e paludosas. Temperatura
menos ardente; atmosfera mais depurada. Consideráveis
depósitos de calcáreos pelas águas. - Vegetação menos colossal;
novas espécies; plantas lenhosas; primeiras árvores. - Peixes;
cetáceos; animais aquáticos e anfíbios.
V. PERÍODO TERCIÁRIO. - Grandes intumescimentos da
crosta sólida; formação dos continentes. Retirada das águas para
os lugares baixos; formação dos mares. - Atmosfera depurada;
temperatura atual produzida pelo calor solar. - Gigantescos
animais terrestres. Vegetais e animais da atualidade. Pássaros.
DILÚVIO UNIVERSAL VI. PERÍODO QUATERNÁRIO OU
PÓS-DILUVIANO. - Terrenos de aluvião. - Vegetais e animais
da atualidade. - O homem.
GÊNESE
1º DIA - O Céu e a Terra. - A
luz
2º DIA - O Firmamento Separação das águas que estão
acima do Firmamento das que
lhe estão debaixo.
3º DIA - As águas que estão
debaixo do Firmamento se
reúnem; aparece o elemento
árido. - A terra e os mares. As plantas.
4º DIA - O Sol, a Lua e as
estrelas.
5º DIA - Os peixes e os
pássaros.
6º DIA - Os animais
terrestres. - O homem.
6. - Desse quadro comparativo, o primeiro fato que ressalta é que a obra de cada um dos seis dias
não corresponde de maneira rigorosa, como o supõem muitos, a cada um dos seis períodos
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geológicos. A concordância mais notável se verifica na sucessão dos seres orgânicos, que é quase
a mesma, com pequena diferença, e no aparecimento do homem, por último. É esse um fato
importante.
Há também coincidência, não quanto à ordem numérica dos períodos, mas quanto ao fato em si,
na passagem em que se lê que, ao terceiro dia, «as águas que estão debaixo do céu se reuniram
num só lugar e apareceu o elemento árido». É a expressão do que ocorreu no período terciário,
quando as elevações da crosta sólida puseram a descoberto os continentes e repeliram as águas,
que foram formar os mares. Foi somente então que apareceram os animais terrestres, segundo a
Geologia e segundo Moisés.
7. - Dizendo que a criação foi feita em seis dias, terá Moisés querido falar de dias de 24 horas, ou
terá empregado essa palavra no sentido de período, de duração? É mais provável a primeira
hipótese, se nos ativermos ao texto acima, primeiramente, porque esse é o sentido próprio da
palavra hebraica iôm, traduzida por dia. Depois, a referência à tarde e à manhã, como limitações
de cada um dos seis dias, dá lugar a que se suponha haja ele querido falar de dias comuns. Não se
pode conceber qualquer dúvida a tal respeito, estando dito, no versículo 5: «Ele deu à luz o nome
de dia e às trevas o nome de noite; e da tarde e da manhã se fez o primeiro dia.» Isto,
evidentemente, só se pode aplicar ao dia de 24 horas, constituído de períodos de luz e de trevas.
Ainda mais preciso se torna o sentido, quando ele diz, no versículo 17, falando do Sol, da Lua e
das estrelas: «Colocou-as no firmamento do céu, para luzirem sobre a Terra; para presidirem ao
dia e à noite e para separarem a luz das trevas. E da tarde e da manhã se fez o quarto dia.» Aliás,
tudo, na criação, era miraculoso e, desde que se envereda pela senda dos milagres, pode-se
perfeitamente crer que a Terra foi feita em seis vezes 24 horas, sobretudo quando se ignoram as
primeiras leis naturais. Todos os povos civilizados partilharam dessa crença, até ao momento em
que a Geologia surgiu a lhe demonstrar a impossibilidade. 8. - Um dos pontos que mais
criticados têm sido na Gênese é o da criação do Sol depois da luz. Tentaram explicá-lo, com o
auxílio mesmo dos dados fornecidos pela Geologia, dizendo que, nos primeiros tempos de sua
formação, por se achar carregada de vapores densos e opacos, a atmosfera terrestre não permitia
se visse o Sol que, assim, efetivamente não existia para a Terra. Semelhante explicação seria,
porventura, admissível se, naquela época, já houvesse na Terra habitantes que verificassem a
presença ou a ausência do Sol. Ora, segundo o próprio Moisés, então, somente plantas havia, as
quais, contudo, não teriam podido crescer e multiplicar-se sem o calor solar.
Há, pois, evidentemente, um anacronismo na ordem que Moisés estabeleceu para a criação do
Sol; mas, involuntariamente ou não, ele não errou, dizendo que a luz precedeu o Sol.
O Sol não é o princípio da luz universal; é uma concentração do elemento luminoso em um
ponto, ou, por outra, do fluido que, em dadas circunstâncias, adquire as propriedades luminosas.
Esse fluido, que é a causa, havia necessariamente de preceder ao Sol, que é apenas um efeito. O
Sol é cassa, relativamente à luz que dele se irradia; é efeito, com relação à que recebeu.
Numa câmara escura, uma vela acesa é um pequeno sol. Que é que se fez para acender a vela?
Desenvolveu-se a propriedade iluminante do fluido luminoso e concentrou-se num ponto esse
fluído. A vela é a causa da luz que se difunde pela câmara; mas, se não existira o princípio
luminoso antes da vela, esta não pudera ter sido acesa.
O mesmo se dá com o Sol. O erro provém da idéia falsa, alimentada por longo tempo, de que o
Universo inteiro começou com a Terra. Dai o não compreenderem que o Sol pudesse ser criado
depois da luz. Em princípio, pois, a asserção de Moisés é perfeitamente exata: é falsa no fazer
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crer que a Terra tenha sido criada antes do Sol. Estando, pelo seu movimento de translação,
sujeita a esse último, a Terra houve de ser formada depois dele. É o que Moisés não podia saber,
pois que ignorava a lei de gravitação.
Com a mesma idéia se depara na Gênese dos antigos persas. No primeiro capítulo do Vendedad,
Ormuz, narrando a origem do mundo, diz: «Eu criei a luz que foi iluminar o Sol, a Lua e as
estrelas.» (Dicionário de Mitologia Universal.) A forma, aqui, é sem dúvida mais clara e mais
científica do que em Moisés e não reclama comentários.
9. - Moisés, evidentemente, partilhava das mais primitivas crenças sobre a cosmogonia. Como os
do seu tempo, ele acreditava na solidez da abóbada celeste e em reservatórios superiores para as
águas. Essa idéia se acha expressa sem alegoria, nem ambigüidade, neste passo (versículos 6 e
seguintes) : «Deus disse: Faça-se o Firmamento no meio das águas para separar das águas as
águas. Deus fez o Firmamento e separou as águas que estavam debaixo do Firmamento das que
estavam por cima do Firmamento.» (Veja-se: cap. V, Antigos e modernos sistemas do mundo,
nos. 3, 4 e 5)
Segundo uma crença antiga, a água era tida como o princípio primitivo, o elemento gerador, pelo
que Moisés não fala da criação das águas, parecendo que já elas existiam. «As trevas cobriam o
abismo», isto é, as profundezas do espaço, que a imaginação imprecisamente figurava ocupada
pelas águas e em trevas, antes da criação da luz. Eis aí por que Moisés diz: «O Espírito de Deus
era levado (ou boiava) sobre as águas.» Tida a Terra como formada no meio das águas, era
preciso insulá-la. Imaginou-se então que Deus fizera o Firmamento, uma abóbada sólida, para
separar as águas de cima das que estavam sobre a Terra.
A fim de compreendermos certas partes da Gênese, faz-se indispensável que nos coloquemos no
ponto de vista das idéias cosmogônicas da época que ela reflete.
10. - Em face dos progressos da Física e da Astronomia, é insustentável semelhante doutrina2.
Entretanto, Moisés atribui ao próprio Deus aquelas palavras. Ora, visto que elas exprimem um
fato notoriamente falso, uma de duas: ou Deus se enganou em a narrativa que fez da sua obra, ou
essa narrativa não é de origem divina. Não sendo admissível a primeira hipótese, forçoso é
concluir que Moisés apenas exprimiu suas próprias idéias. (Cap. I, nº 3.)
11. - Ele se houve com mais acerto, dizendo que Deus formou o homem do limo da Terra 3 (1). A
Ciência, com efeito, mostra (cap. X) que o corpo do homem se compõe de elementos tomados à
matéria inorgânica, ou, por outra, ao limo da terra.
A mulher formada de uma costela de Adão é uma alegoria, aparentemente pueril, se admitida ao
pé da letra, mas profunda, quanto ao sentido. Tem por fim mostrar que a mulher é da mesma
natureza que o homem, que é por conseguinte igual a este perante Deus e não uma criatura à
parte, feita para ser escravizada e tratada qual hilota Tendo-a como saída da própria carne do
homem, a imagem da igualdade é bem mais expressiva, do que se ela fora tida como formada,
separadamente, do mesmo limo. Equivale a dizer ao homem que ela é sua igual e não sua
escrava, que ele a deve amar como parte de si mesmo.
2
Embora muito grosseiro o erro de tal crença, com ela ainda se embalam
presentemente as crianças, como se se tratara de uma verdade sagrada. Só a tremer ousam os
educadores aventurar-se a uma tímida interpretação. Como quererem que isso não venha mais
tarde a fazer incrédulos?
3
O termo hebreu haadam, homem, do qual se compôs Adão e o termo haadama, terra, têm a mesma raiz.
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12. - Para espíritos incultos, sem nenhuma idéia das leis gerais, incapazes de apreender o
conjunto e de conceber o infinito, essa criação milagrosa e instantânea apresentava qualquer
coisa de fantástico que feria a imaginação. O quadro do Universo tirado do nada em alguns dias,
por um só ato da vontade criadora, era, para tais espíritos, o sinal mais evidente do poder de
Deus. Que configuração, com efeito, mais sublime e mais poética desse poder, do que a que estas
palavras traçam: «Deus disse: Faça-se a luz e a luz foi feita!» Deus, a criar o Universo pela ação
lenta e gradual das leis da Natureza, lhes houvera parecido menor e menos poderoso. Fazia-selhes indispensável qualquer coisa de maravilhoso, que saísse dos moldes comuns, do contrário
teriam dito que Deus não era mais hábil do que os homens. Uma teoria científica e racional da
criação os deixaria frios e indiferentes.
Não rejeitemos, pois, a Gênese bíblica; ao contrário, estudemo-la, como se estuda a história da
infância dos povos. Trata-se de uma época rica de alegorias, cujo sentido oculto se deve
pesquisar; que se devem comentar e explicar com o auxílio das luzes da razão e da Ciência.
Fazendo, porém, ressaltar as suas belezas poéticas e os seus ensinamentos velados pela forma
imaginosa, cumpre se lhe apontem expressamente os erros, no próprio interesse da religião. Esta
será muito mais respeitada, quando esses erros deixarem de ser impostos à fé, como verdade, e
Deus parecerá maior e mais poderoso, quando não lhe envolverem o nome em fatos de pura
invenção.
Fonte de consulta
1 - Allan Kardec. A Gênese. Capítulo X, itens 29; Capítulo XII, Gênese Mosaica.
2 - Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Capítulo XI, itens 585 a 610.
Criação Divina: Pluralidade dos mundos habitados
As raças adâmicas
O Sistema de Capela
Nos mapas zodiacais, que os astrônomos terrestres compulsam em seus estudos, observa-se
desenhada uma grande estrela na Constelação do Cocheiro, que recebeu, na Terra, o nome de
Cabra ou Capela. Magnífico sol entre os astros que nos são mais vizinhos, ela, na sua trajetória
pelo Infinito, faz-se acompanhar, igualmente, da sua família de mundos, cantando as glórias
divinas do Ilimitado. A sua luz gasta cerca de 42 anos para chegar à face da Terra, considerandose, desse modo, a regular distância existente entre a Capela e o nosso planeta, já que a luz
percorre o espaço com a velocidade aproximada de 300.000 quilômetros por segundo.
Quase todos os mundos que lhe são dependentes já se purificaram física e moralmente,
examinadas as condições de atraso moral da Terra, onde o homem se reconforta com as vísceras
dos seus irmãos inferiores, como nas eras pré-históricas de sua existência, marcham uns contra
os outros ao som de hinos guerreiros, desconhecendo os mais comezinhos princípios de
fraternidade e pouco realizando em favor da extinção do egoísmo, da vaidade, do seu infeliz
orgulho.
UM MUNDO EM TRANSIÇÕES
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Há muitos milênios, um dos orbes da Capela, que guarda muitas afinidades com o globo
terrestre, atingira a culminância de um dos seus extraordinários ciclos evolutivos.
As lutas finais de um longo aperfeiçoamento estavam delineadas, como ora acontece convosco,
relativamente às transições esperadas no século XX, neste crepúsculo de civilização.
Alguns milhões de Espíritos rebeldes lá existiam, no caminho da evolução geral, dificultando a
consolidação das penosas conquistas daqueles povos cheios de piedade e virtudes, mas uma ação
de saneamento geral os alijaria daquela humanidade, que fizera jus à concórdia perpétua, para a
edificação dos seus elevados trabalhos As grandes comunidades espirituais, diretoras do Cosmos,
deliberam, então, localizar aquelas entidades, que se tornaram pertinazes no crime, aqui na Terra
longínqua, onde aprenderiam a realizar, na dor e nos trabalhos penosos do seu ambiente, as
grandes conquistas do coração e impulsionando, simultaneamente, o progresso dos seus irmãos
inferiores.
ESPÍRITOS EXILADOS NA TERRA
Foi assim que Jesus recebeu, à luz do seu reino de amor e de justiça, aquela turba de seres
sofredores e infelizes. Com a sua palavra sábia e compassiva, exortou essas almas desventuradas
à edificação da consciência pelo cumprimento dos deveres de solidariedade e de amor, no
esforço regenerador de si mesmas.
Mostrou-lhes os campos imensos de luta que se desdobravam na Terra, envolvendo-as no halo
bendito da sua misericórdia e da sua caridade sem limites. Abençoou-lhes as lágrimas
santificadoras, fazendo-lhes sentir os sagrados triunfos do futuro e prometendo-lhes a sua
colaboração cotidiana e a sua vinda no porvir.
Aqueles seres angustiados e aflitos, que deixavam atrás de si todo um mundo de afetos, não
obstante os seus corações empedernidos na prática do mal, seriam degredados na face obscura do
planeta terrestre; andariam desprezados na noite dos milênios da saudade e da amargura;
reencarnariam no seio das raças ignorantes e primitivas, a lembrarem o paraíso perdido nos
firmamentos distantes. Por muitos séculos não veriam a suave luz da Capela, mas trabalhariam
na Terra acariciados por Jesus e confortados na sua imensa misericórdia.
FIXAÇÃO DOS CARACTERES RACIAIS
Com o auxílio desses Espíritos degredados, naquelas eras remotíssimas, as falanges do Cristo
operavam ainda as últimas experiências sobre os fluidos renovadores da vida, aperfeiçoando os
caracteres biológicos das raças humanas. A Natureza ainda era, para os trabalhadores da
espiritualidade, um campo vasto de experiências infinitas; tanto assim que, se as observações do
mendelismo fossem transferidas àqueles milênios distantes, não se encontraria nenhuma equação
definitiva nos seus estudos de biologia. A moderna genética não poderia fixar, como hoje, as
expressões dos "genes", porquanto, no laboratório das forças invisíveis, as células ainda sofriam
longos processos de acrisolamento, imprimindo-se-lhes elementos de astralidade, consolidandose-lhes as expressões definitivas, com vistas às organizações do porvir.
Se a gênese do planeta se processara com a cooperação dos milênios, a gênese das raças
humanas requeria a contribuição do tempo, até que se abandonasse a penosa e longa tarefa da sua
fixação.
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ORIGEM DAS RAÇAS BRANCAS Aquelas almas aflitas e atormentadas reencarnaram,
proporcionalmente, nas regiões mais importantes, onde se haviam localizado as tri- bos e
famílias primitivas, descendentes dos "primatas", a que nos referimos ainda há pouco. Com a sua
reencarnação no mundo terreno, estabeleciam-se fatores definitivos na história etnológica dos
seres.
Um grande acontecimento se verificara no planeta É que, com essas entidades, nasceram no orbe
os ascendentes das raças brancas. Em sua maioria, estabeleceram-se na Ásia, de onde
atravessaram o istmo de Suez para a África, na região do Egito, encaminhando-se igualmente
para a longínqua Atlântida, de que várias regiões da América guardam assinalados vestígios.
Não obstante as lições recebidas da palavra sábia e mansa do Cristo, os homens brancos
olvidaram os seus sagrados compromissos.
Grande percentagem daqueles Espíritos rebeldes, com muitas exceções, só puderam voltar ao
país da luz e da verdade depois de muitos séculos de sofrimentos expiatórios; outros, porém,
infelizes e retrógrados, permanecem ainda na Terra, nos dias que correm, contrariando a regra
geral, em virtude do seu elevado passivo de débitos clamorosos.
QUATRO GRANDES POVOS
As raças adâmicas guardavam vaga lembrança da sua situação pregressa, tecendo o hino sagrado
das reminiscências. As tradições do paraíso perdido passaram de gerações a gerações, até que
ficassem arquivadas nas páginas da Bíblia.
Aqueles seres decaídos e degradados, a maneira de suas vidas passadas no mundo distante da
Capela, com o transcurso dos anos reuniram-se em quatro grandes grupos que se fixaram depois
nos povos mais antigos, obedecendo às afinidades sentimentais e lingüísticas que os associavam
na constelação do Cocheiro. Unidos, novamente, na esteira do Tempo, formaram desse modo o
grupo dos árias, a civilização do Egito, o povo de Israel e as castas da Índia.
Dos árias descende a maioria dos povos brancos da família indoeuropéia nessa descendência,
porém, é necessário incluir os latinos, os celtas e os gregos, além dos germanos e dos eslavos. As
quatro grandes massas de degredados formaram os pródromos de toda a organização das
civilizações futuras, introduzindo os mais largos benefícios no seio da raça amarela e da raça
negra, que já existiam.
É de grande interesse o estudo de sua movimentação no curso da História. Através dessa análise,
é possível examinarem-se os defeitos e virtudes que trouxeram do seu paraíso longínquo, bem
como os antagonismos e idiossincrasias peculiares a cada qual.
Doutrina dos anjos decaídos e da perda do paraíso4
4
Quando, na Revue Spirite de janeiro de 1862, publicamos um artigo sobre a interpretação da doutrina
dos anjos decaídos, apresentamos essa teoria como simples hipótese, sem outra autoridade afora a de
uma opinião pessoal controversível, porque nos faltavam então elementos bastantes para uma afirmação
peremptória. Expusemo-la a título de ensaio, tendo em vista provocar o exame da questão, decidido,
porém, a abandoná-la ou modificá-la, se fosse preciso. Presentemente, essa teoria já passou pela prova
do controle universal. Não só foi bem aceita pela maioria dos espíritas, como a mais racional e a mais
concorde com a soberana justiça de Deus, mas também foi confirmada pela generalidade das instruções
que os Espíritos deram sobre o assunto. O mesmo se verificou com a que concerne à origem da raca
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43. - Os mundos progridem, fisicamente, pela elaboração da matéria e, moralmente, pela
purificação dos Espíritos que os habitam. A felicidade neles está na razão direta da
predominância do bem sobre o mal e a predominância do bem resulta do adiantamento moral dos
Espíritos. O progresso intelectual não basta, pois que com a inteligência podem eles fazer o mal.
Logo que um mundo tem chegado a um de seus períodos de transformação, a fim de ascender na
hierarquia dos mundos, operam-se mutações na sua população encarnada e desencarnada. É
quando se dão as grandes emigrações e imigrações. Os que, apesar da sua inteligência e do seu
saber, perseveraram no mal, sempre revoltados contra Deus e suas leis, se tornariam daí em
diante um embaraço ao ulterior progresso moral, uma causa permanente de perturbação para a
tranqüilidade e a felicidade dos bons, pelo que são excluídos da humanidade a que até então
pertenceram e tangidos para mundos menos adiantados, onde aplicarão a inteligência e a intuição
dos conhecimentos que adquiriram ao progresso daqueles entre os quais passam a viver, ao
mesmo tempo que expiarão, por uma série de existências penosas e por meio de árduo trabalho,
suas passadas faltas e seu voluntário endurecimento.
Que serão tais seres, entre essas outras populações, para eles novas, ainda na infância da
barbárie, senão anjos ou Espíritos decaídos, ali vindos em expiação? Não é, precisamente, para
eles, um paraíso perdido a terra donde foram expulsos? Essa terra não lhes era um lugar de
delícias, em comparação com o meio ingrato onde vão ficar relegados por milhares de séculos,
até que hajam merecido libertar-se dele? A vaga lembrança intuitiva que guardam da terra donde
vieram é uma como longínqua miragem a lhes recordar o que perderam por culpa própria.
44. - Mas, ao mesmo tempo que os maus se afastam do mundo em que habitavam, Espíritos
melhores aí os substituem, vindos quer da erraticidade, concernente a esse mundo, quer de um
mundo menos adiantado, que mereceram abandonar; Espíritos esses para os quais a nova
habitação é uma recompensa. Assim renovada e depurada a população espiritual dos seus piores
elementos, ao cabo de algum tempo o estado moral do mundo se encontra melhorado. São às
vezes parciais essas mutações, isto é, circunscritas a um povo, a uma raça; doutras vezes, são
gerais, quando chega para o globo o período de renovação.
45. - A raça adâmica apresenta todos os caracteres de uma raça proscrita. Os Espíritos que a
integram foram exilados para a Terra, já povoada, mas de homens primitivos, imersos na
ignorância, que aqueles tiveram por missão fazer progredir, levando-lhes as luzes de uma
inteligência desenvolvida. Não é esse, com efeito, o papel que essa raça há desempenhado até
hoje? Sua superioridade intelectual prova que o mundo donde vieram os Espíritos que a
compõem era mais adiantado do que a Terra. Havendo entrado esse mundo numa nova fase de
progresso e não tendo tais Espíritos querido, pela sua obstinação, colocar-se à altura desse
progresso, lá estariam deslocados e constituiriam um obstáculo à marcha providencial das coisas.
Foram, em conseqüência, desterrados de lá e substituídos por outros que isso mereceram.
Relegando aquela raça para esta terra de labor e de sofrimentos, teve Deus razão para lhe dizer:
«Dela tirarás o alimento com o suor da tua fronte.» Na sua mansuetude, prometeu-lhe que lhe
enviaria um Salvador, isto é, um que a esclareceria sobre o caminho que lhe cumpria tomar, para
sair desse lugar de miséria, desse inferno, e ganhar a felicidade dos eleitos. Esse Salvador ele,
com efeito, lho enviou, na pessoa do Cristo, que lhe ensinou a lei de amor e de caridade que ela
desconhecia e que seria a verdadeira âncora de salvação.
adâmica.
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É igualmente com o objetivo de fazer que a Humanidade se adiante em determinado sentido que
Espíritos superiores, embora sem as qualidades do Cristo, encarnam de tempos a tempos na Terra
para desempenhar missões especiais, proveitosas, simultaneamente, ao adiantamento pessoal
deles, se as cumprirem de acordo com os desígnios do Criador.
46. - Sem a reencarnação, a missão do Cristo seria um contra-senso, assim como a promessa feita
por Deus. Suponhamos, com efeito, que a alma de cada homem seja criada por ocasião do
nascimento do corpo e não faça mais do que aparecer e desaparecer da Terra: nenhuma relação
haveria entre as que vieram desde Adão até Jesus-Cristo, nem entre as que vieram depois; todas
são estranhas umas às outras. A promessa que Deus fez de um Salvador não poderia entender-se
com os descendentes de Adão, uma vez que suas almas ainda não estavam criadas. Para que a
missão do Cristo pudesse corresponder às palavras de Deus, fora mister se aplicassem às mesmas
almas.
Se estas são novas, não podem estar maculadas pela falta do primeiro pai, que é apenas pai
carnal e não pai espiritual. A não ser assim, Deus houvera criado almas com a mácula de uma
falta que não podia deixar nelas vestígio, pois que elas não existiam. A doutrina vulgar do
pecado original implica, conseguintemente, a necessidade de uma relação entre as almas do
tempo do Cristo e as do tempo de Adão; implica, portanto, a reencarnação. Dizei que todas essas
almas faziam parte da colônia de Espíritos exilados na Terra ao tempo de Adão e que se achavam
manchadas dos vícios que lhes acarretaram ser excluídas de um mundo melhor e tereis a única
interpretação racional do pecado original, pecado peculiar a cada indivíduo e não resultado da
responsabilidade da falta de outrem a quem ele jamais conheceu. Dizei que essas almas ou
Espíritos renascem diversas vezes na Terra para a vida corpórea, a fim de progredirem,
depurando-se; que o Cristo veio esclarecer essas mesmas almas, não só acerca de suas vidas
passadas, como também com relação às suas vidas ulteriores e então, mas só então, lhe dareis à
missão um sentido real e sério, que a razão pode aceitar.
47. - Um exemplo familiar, mas frisante pela analogia, ainda mais compreensíveis tornará os
princípios que acabam de ser expostos. A 24 de maio de 1861, a fragata Ifigênia transportou à
Nova Caledônia uma companhia disciplinar composta de 291 homens. À chegada, o comandante
lhes baixou uma ordem do dia concebida assim: «Pondo os pés nesta terra longínqua, já sem
dúvida compreendestes o papel que vos está reservado.
«A exemplo dos bravos soldados da nossa marinha, que servem sob as vossas vistas, ajudar-noseis a levar com brilho o facho da civilização ao seio das tribos selvagens da Nova Caledônia.
Não é uma bela e nobre missão, pergunto? Desempenhá-la-eis dignamente.
«Escutai a palavra e os conselhos dos vossos chefes. Estou à frente deles. Entendei bem as
minhas palavras.
«A escolha do vosso comandante, dos vossos oficiais, dos vossos suboficiais e cabos constitui
garantia certa de que todos os esforços serão tentados para fazer-vos excelentes soldados, digo
mais: para vos elevar à altura de bons cidadãos e vos transformar em colonos honrados, se o
quiserdes.
«A nossa disciplina é severa e assim tem que ser. Colocada em nossas mãos, ela será firme e
inflexível, ficai sabendo, do mesmo modo que, justa e paternal, saberá distinguir o erro do vício e
da degradação... »
Aí tendes um punhado de homens expulsos, pelo seu mau proceder, de um país civilizado e
mandados, por punição, para o meio de um povo bárbaro. Que lhes diz o chefe? - «Infringistes as
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leis do vosso país; nele vos tornastes causa de perturbação e escândalo e fostes expulsos;
mandam-vos para aqui, mas aqui podeis resgatar o vosso passado; podeis, pelo trabalho, criarvos aqui uma posição honrosa e tornar-vos cidadãos honestos. Tendes uma bela missão a
cumprir: levar a civilização a estas tribos selvagens. A disciplina será severa, mas justa, e
saberemos distinguir os que procederem bem. Tendes nas mãos a vossa sorte; podeis melhorá-la,
se o quiserdes, porque tendes o livre-arbítrio.»
Para aqueles homens, lançados ao seio da selvajaria, a mãe-pátria não é um paraíso que eles
perderam pelas suas próprias faltas e por se rebelarem contra a lei? Naquela terra distante, não
são eles anjos decaídos? A linguagem do chefe não é idêntica à de que usou Deus falando aos
Espíritos exilados na Terra: «Desobedecestes às minhas leis e, por isso, eu vos expulsei do
mundo onde podíeis viver ditosos e em paz. Aqui, estareis condenados ao trabalho; mas,
podereis, pelo vosso bom procedimento, merecer perdão e reganhar a pátria que perdestes por
vossa falta, isto é, o Céu»?
48. - À primeira vista, a idéia de decaimento parece em contradição com o princípio segundo o
qual os Espíritos não podem retrogradar. Deve-se, porém, considerar que não se trata de um
retrocesso ao estado primitivo. O Espírito, ainda que numa posição inferior, nada perde do que
adquiriu; seu desenvolvimento moral e intelectual é o mesmo, qualquer que seja o meio onde se
ache colocado. Ele está na situação do homem do mundo condenado à prisão por seus delitos.
Certamente, esse homem se encontra degradado, decaído, do ponto de vista social, mas não se
torna nem mais estúpido, nem mais ignorante.
49. - Será crível, perguntamos agora, que esses homens mandados para a Nova Caledônia vão
transformar-se de súbito em modelos de virtude? Que vão abjurar repentinamente seus erros do
passado? Para supor tal coisa, fora necessário desconhecer a Humanidade. Pela mesma razão, os
Espíritos da raça adâmica, uma vez transplantados para a terra do exílio, não se despojaram
instantaneamente do seu orgulho e de seus maus instintos; ainda por muito tempo conservaram
as tendências que traziam, um resto da velha levedura. Ora, não é esse o pecado original?
Fonte de consulta
1. Allan Kardec. A Gênese. Capítulo XI, itens 38 a 49.
2. Francisco Cândido Xavier. Ditado pelo espírito de Emmanuel. A Caminho da Luz. FEB
1993, págs 33 a 38.
Criação Divina: O instinto e a inteligência
11. - Qual a diferença entre o instinto e a inteligência? Onde acaba um e o outro começa? Será o
instinto uma inteligência rudimentar, ou será uma faculdade distinta, um atributo exclusivo da
matéria?
O instinto é a força oculta que solicita os seres orgânicos a atos espontâneos e involuntários,
tendo em vista a conservação deles. Nos atos instintivos não há reflexão, nem combinação, nem
premeditação. É assim que a planta procura o ar, se volta para a luz, dirige suas raízes para a
água e para a terra nutriente; que a flor se abre e fecha alternativamente, conforme se lhe faz
necessário; que as plantas trepadeiras se enroscam em torno daquilo que lhes serve de apoio, ou
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se lhe agarram com as gavinhas. É pelo instinto que os animais são avisados do que lhes convém
ou prejudica; que buscam, conforme a estação, os climas propícios; que constróem, sem ensino
prévio, com mais ou menos arte, segundo as espécies, leitos macios e abrigos para as suas
progênies, armadilhas para apanhar a presa de que se nutrem; que manejam destramente as armas
ofensivas e defensivas de que são providos; que os sexos se aproximam; que a mãe choca os
filhos e que estes procuram o seio materno. No homem, só em começo da vida o instinto domina
com exclusividade; é por instinto que a criança faz os primeiros movimentos, que toma o
alimento, que grita para exprimir as suas necessidades, que imita o som da voz, que tenta falar e
andar. No próprio adulto, certos atos são instintivos, tais como os movimentos espontâneos para
evitar um risco, para fugir a um perigo, para manter o equilíbrio do corpo; tais ainda o piscar das
pálpebras para moderar o brilho da luz, o abrir maquinal da boca para respirar, etc.
12. - A inteligência se revela por atos voluntários, refletidos, premeditados, combinados, de
acordo com a oportunidade das circunstâncias. É incontestavelmente um atributo exclusivo da
alma. Todo ato maquinal é instintivo; o ato que denota reflexão, combinação, deliberação é
inteligente. Um é livre, o outro não o é. O instinto é guia seguro, que nunca se engana; a
inteligência, pelo simples fato de ser livre, está, por vezes, sujeita a errar. Ao ato instintivo falta o
caráter do ato inteligente; revela, entretanto, uma causa inteligente, essencialmente apta a prever.
Se se admitir que o instinto procede da matéria, ter-se-á de admitir que a matéria é inteligente,
até mesmo bem mais inteligente e previdente do que a alma, pois que o instinto não se engana,
ao passo que a inteligência se equivoca.
Se se considerar o instinto uma inteligência rudimentar, como se há de explicar que, em certos
casos, seja superior à inteligência que raciocina? Como explicar que torne possível se executem
atos que esta não pode realizar?
Se ele é atributo de um principio espiritual de especial natureza, qual vem a ser esse principio?
Pois que o instinto se apaga, dar-se-á que esse princípio se destrua? Se os animais são dotados
apenas de instinto, não tem solução o destino deles e nenhuma compensação os seus sofrimentos,
o que não estaria de acordo nem com a justiça, nem com a bondade de Deus. (Cap. II, 19.)
13. - Segundo outros sistemas, o instinto e a inteligência procederiam de um único princípio.
Chegado a certo grau de desenvolvimento, esse principio, que primeiramente apenas tivera as
qualidades do instinto, passaria por uma transformação que lhe daria as da inteligência livre.
Se fosse assim, no homem inteligente que perde a razão e entra a ser guiado exclusivamente pelo
instinto, a inteligência voltaria ao seu estado primitivo e, quando o homem recobrasse a razão, o
instinto se tornaria inteligência e assim alternativamente, a cada acesso, o que não é admissível.
Aliás, é freqüente o instinto e a inteligência se revelarem simultaneamente no mesmo ato. No
caminhar, por exemplo, o movimento das pernas é instintivo; o homem põe maquinalmente um
pé à frente do outro, sem nisso pensar; quando, porém, ele quer acelerar ou demorar o passo,
levantar o pé ou desviar-se de um tropeço, há cálculo, combinação; ele age com deliberado
propósito. A impulsão involuntária do movimento é o ato instintivo; a calculada direção do
movimento é o ato inteligente. O animal carnívoro é impelido pelo instinto a se alimentar de
carne, mas as precauções que toma e que variam conforme as circunstâncias, para segurar a
presa, a sua previdência das eventualidades são atos da inteligência.
14. - Outra hipótese que, em suma, se conjuga perfeitamente à idéia da unidade de princípio,
ressalta do caráter essencialmente previdente do instinto e concorda com o que o Espiritismo
ensina, no tocante às relações do mundo espiritual com o mundo corpóreo. Sabe-se agora que
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muitos Espíritos desencarnados têm por missão velar pelos encarnados, dos quais se constituem
protetores e guias; que os envolvem nos seus eflúvios fluídicos; que o homem age muitas vezes
de modo inconsciente, sob a ação desses eflúvios. Sabe-se, ao demais, que o instinto, que por si
mesmo produz atos inconscientes, predomina nas crianças e, em geral, nos seres cuja razão é
fraca. Ora, segundo esta hipótese, o instinto não seria atributo nem da alma, nem da matéria; não
pertenceria propriamente ao ser vivo, seria efeito da ação direta dos protetores invisíveis que
supririam a imperfeição da inteligência, provocando os atos inconscientes necessários à
conservação do ser. Seria qual a andadeira com que se amparam as crianças que ainda não sabem
andar.
Então, do mesmo modo que se deixa gradualmente de usar a andadeira, à medida que a criança
se equilibra sozinha, os Espíritos protetores deixam entregues a si mesmos os seus protegidos, à
medida que estes se tornam aptos a guiar-se pela própria inteligência.
Assim, o instinto, longe de ser produto de uma inteligência rudimentar e incompleta, sê-lo-ia de
uma inteligência estranha, na plenitude da sua força, inteligência protetora, supletiva da
insuficiência, quer de uma inteligência mais jovem, que aquela compeliria a fazer,
inconscientemente, para seu bem, o que ainda fosse incapaz de fazer por si mesma, quer de uma
inteligência madura, porém, momentaneamente tolhida no uso de suas faculdades, como se dá
com o homem na infância e nos casos de idiotia e de afecções mentais.
Diz-se proverbialmente que há um deus para as crianças, para os loucos e para os ébrios. É mais
veraz do que se supõe esse ditado. Aquele deus, outro não é senão o Espírito protetor, que vela
pelo ser incapaz de se proteger, utilizando-se da sua própria razão.
15. - Nesta ordem de idéias, ainda mais longe se pode ir. Por muito racional que seja, essa teoria
não resolve todas as dificuldades da questão.
Se observarmos os efeitos do instinto, notaremos, em primeiro lugar, uma unidade de vistas e de
conjunto, uma segurança de resultados, que cessam logo que a inteligência o substitui. Demais,
reconheceremos profunda sabedoria na apropriação tão perfeita e tão constante das faculdades
instintivas às necessidades de cada espécie. Semelhante unidade de vistas não poderia existir sem
a unidade de pensamento e esta é incompatível com a diversidade das aptidões individuais; só ela
poderia produzir esse conjunto tão harmonioso que se realiza desde a origem dos tempos e em
todos os climas, com uma regularidade, uma precisão matemáticas, cuja ausência jamais se nota.
A uniformidade no que resulta das faculdades instintivas é um fato característico, que
forçosamente implica a unidade da causa. Se a causa fosse inerente a cada individualidade,
haveria tantas variedades de instintos quantos fossem os indivíduos, desde a planta até o homem.
Um efeito geral, uniforme e constante, há de ter uma causa geral, uniforme e constante; um
efeito que atesta sabedoria e previdência há de ter uma causa sábia e previdente. Ora, uma causa
dessa natureza, sendo por força inteligente, não pode ser exclusivamente material. Não se nos
deparando nas criaturas, encarnadas ou desencarnadas, as qualidades necessárias à produção de
tal resultado, temos que subir mais alto, isto é, ao próprio Criador. Se nos reportamos à
explicação dada sobre a maneira por que se pode conceber a ação providencial (cap. II, nº 24); se
figurarmos todos os seres penetrados do fluido divino, soberanamente inteligente,
compreenderemos a sabedoria previdente e a unidade de vistas que presidem a todos os
movimentos instintivos que se efetuam para o bem de cada indivíduo. Tanto mais ativa é essa
solicitude, quanto menos recursos tem o indivíduo em si mesmo e na sua inteligência. Por isso é
que ela se mostra maior e mais absoluta nos animais e nos seres inferiores, do que no homem.
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Segundo essa teoria, compreende-se que o instinto seja um guia seguro. O instinto materno, o
mais nobre de todos, que o materialismo rebaixa ao nível das forças atrativas da matéria, fica
realçado e enobrecido. Em razão das suas conseqüências, não devia ele ser entregue às
eventualidades caprichosas da inteligência e do livre-arbítrio. Por intermédio da mãe, o próprio
Deus vela pelas suas criaturas que nascem.
16. - Esta teoria de nenhum modo anula o papel dos Espíritos protetores, cujo concurso é fato
observado e comprovado pela experiência; mas, deve-se notar que a ação desses Espíritos é
essencialmente individual; que se modifica segundo as qualidades próprias do protetor e do
protegido e que em parte nenhuma apresenta a uniformidade e a generalidade do instinto. Deus,
em sua sabedoria, conduz ele próprio os cegos, porém confia a inteligências livres o cuidado de
guiar os clarividentes, para deixar a cada um a responsabilidade de seus atos. A missão dos
Espíritos protetores constitui um dever que eles aceitam voluntariamente e lhes é um meio de se
adiantarem, dependendo o adiantamento da forma por que o desempenhem.
17. - Todas essas maneiras de considerar o instinto são forçosamente hipotéticas e nenhuma
apresenta caráter seguro de autenticidade, para ser tida como solução definitiva. A questão, sem
dúvida, será resolvida um dia, quando se houverem reunido os elementos de observação que
ainda faltam. Até lá, temos que limitar-nos a submeter as diversas opiniões ao cadinho da razão e
da lógica e esperar que a luz se faça. A solução que mais se aproxima da verdade será decerto a
que melhor condiga com os atributos de Deus, isto é, com a bondade suprema e a suprema
justiça. (Cap. II, nº 19.)
18. - Sendo o instinto o guia e as paixões as molas da alma no período inicial do seu
desenvolvimento, por vezes aquele e estas se confundem nos efeitos. Há, contudo, entre esses
dois princípios, diferenças que muito importa se considerem.
O instinto é guia seguro, sempre bom. Pode, ao cabo de certo tempo, tornar-se inútil, porém
nunca prejudicial. Enfraquece-se pela predominância da inteligência.
As paixões, nas primeiras idades da alma, têm de comum com o instinto o serem as criaturas
solicitadas por uma força igualmente inconsciente. As paixões nascem principalmente das
necessidades do corpo e dependem, mais do que o instinto, do organismo. O que, acima de tudo,
as distingue do instinto é que são individuais e não produzem, como este último, efeitos gerais e
uniformes; variam, ao contrário, de intensidade e de natureza, conforme os indivíduos. São úteis,
como estimulante, até à eclosão do senso moral, que faz nasça de um ser passivo, um ser
racional. Nesse momento, tornam-se não só inúteis, como nocivas ao progresso do Espírito, cuja
desmaterialização retardam. Abrandam-se com o desenvolvimento da razão.
19. - O homem que só pelo instinto agisse constantemente poderia ser muito bom, mas
conservaria adormecida a sua inteligência. Seria qual criança que não deixasse as andadeiras e
não soubesse utilizar-se de seus membros.
Aquele que não domina as suas paixões pode ser muito inteligente, porém, ao mesmo tempo,
muito mau. O instinto se aniquila por si mesmo; as paixões somente pelo esforço da vontade
podem domar-se.
Fonte de consulta
1. Allan Kardec. A Gênese. Capítulo 03, itens 11 a 19.
16 de outubro de 2006
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Os Espíritos
Diferentes ordens de Espíritos
96. São iguais os Espíritos, ou há entre eles qualquer hierarquia?
“São de diferentes ordens, conforme o grau de perfeição que tenham alcançado.”
97. As ordens ou graus de perfeição dos Espíritos são em número determinado?
“São ilimitadas em número, porque entre elas não há linhas de demarcação traçadas como
barreiras, de sorte que as divisões podem ser multiplicadas ou restringidas livremente. Todavia,
considerando-se os caracteres gerais dos Espíritos, elas podem reduzir-se a três principais. “Na
primeira, colocar-se-ão os que atingiram a perfeição máxima: os puros Espíritos. Formam a
segunda os que chegaram ao meio da escala: o desejo do bem é o que neles predomina.
Pertencerão à terceira os que ainda se acham na parte inferior da escala: os Espíritos imperfeitos.
A ignorância, o desejo do mal e todas as paixões más que lhes retardam o progresso, eis o que os
caracteriza.”
98. Os Espíritos da segunda ordem, para os quais o bem constitui a preocupação dominante,
têm o poder de praticá-lo?
“Cada um deles dispõe desse poder, de acordo com o grau de perfeição a que chegou. Assim, uns
possuem a ciência, outros a sabedoria e a bondade. Todos, porém, ainda têm que sofrer provas.”
99. Os da terceira categoria são todos essencialmente maus?
“Não; uns há que não fazem nem o mal nem o bem; outros, ao contrário, se comprazem no mal e
ficam satisfeitos quando se lhes depara ocasião de praticá-lo. Há também os levianos ou
estouvados, mais perturbadores do que malignos, que se comprazem antes na malícia do que na
malvadez e cujo prazer consiste em mistificar e causar pequenas contrariedades, de que se riem.”
Escala espírita
100. OBSERVAÇÕES PRELIMINARES. - A classificação dos Espíritos se baseia no grau de
adiantamento deles, nas qualidades que já adquiriram e nas imperfeições de que ainda terão de
despojar-se. Esta classificação, aliás, nada tem de absoluta. Apenas no seu conjunto cada
categoria apresenta caráter definido. De um grau a outro a transição é insensível e, nos limites
extremos, os matizes se apagam, como nos reinos da Natureza, como nas cores do arco-íris, ou,
também, como nos diferentes períodos da vida do homem.
Podem, pois, formar-se maior ou menor número de classes, conforme o ponto de vista donde se
considere a questão. Dá-se aqui o que se dá com todos os sistemas de classificação científica, que
podem ser mais ou menos completos, mais ou menos racionais, mais ou menos cômodos para a
inteligência. Sejam, porém, quais forem, em nada alteram as bases da ciência. Assim, é natural
que inquiridos sobre este ponto, hajam os Espíritos divergido quanto ao número das categorias,
sem que isto tenha valor algum. Entretanto, não faltou quem se agarrasse a esta contradição
aparente, sem refletir que os Espíritos nenhuma importância ligam ao que é puramente
convencional. Para eles, o pensamento é tudo.
Deixam-nos a nós a forma, a escolha dos termos, as classificações, numa palavra, os sistemas.
Façamos ainda uma consideração que se não deve jamais perder de vista, a de que entre os
Espíritos, do mesmo modo que entre os homens, há os muito ignorantes, de maneira que nunca
serão demais as cautelas que se tomem contra a tendência a crer que, por serem Espíritos, todos
devam saber tudo.
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Qualquer classificação exige método, análise e conhecimento aprofundado do assunto. Ora no
mundo dos Espíritos, os que possuem limitados conhecimentos são, como neste mundo, os
ignorantes, os inaptos a apreender uma síntese, a formular um sistema. Só muito imperfeitamente
percebem ou compreendem uma classificação qualquer. Consideram da primeira categoria todos
os Espíritos que lhes são superiores, por não poderem apreciar as gradações de saber, de
capacidade e de moralidade que os distinguem, como sucede entre nós a um homem rude com
relação aos civilizados. Mesmo os que sejam capazes de tal apreciação podem mostra-se
divergentes, quanto às particularidades, conformemente aos pontos de vista em que se achem,
sobretudo se se trata de uma divisão, que nenhum cunho absoluto apresente. Lineu, Jussieu e
Tournefort tiveram cada um o seu método, sem que a Botânica houvesse em conseqüência
experimentado modificação alguma. É que nenhum deles inventou as plantas, nem seus
caracteres. Apenas observaram as analogias, segundo as quais formaram os grupos ou classes.
Foi assim que também nós procedemos. Não inventamos os Espíritos, nem seus caracteres.
Vimos e observamos, julgamo-los pelas suas palavras e atos, depois os classificamos pelas
semelhanças, baseando-nos em dados que eles próprios nos forneceram.
Os Espíritos, em geral, admitem três categorias principais, ou três grandes divisões. Na última, a
que fica na parte inferior da escala, estão os Espíritos imperfeitos, caracterizados pela
predominância da matéria sobre o Espírito e pela propensão para o mal.
Os da segunda se caracterizam pela predominância do Espírito sobre a matéria e pelo desejo do
bem: são os bons Espíritos. A primeira, finalmente, compreende os Espíritos puros, os que
atingiram o grau supremo da perfeição.
Esta divisão nos pareceu perfeitamente racional e com caracteres bem positivados.
Só nos restava pôr em relevo, mediante subdivisões em número suficiente, os principais matizes
do conjunto. Foi o que fizemos, com o concurso dos Espíritos, cujas benévolas instruções jamais
nos faltaram.
Com o auxílio desse quadro, fácil será determinar-se a ordem, assim como o grau de
superioridade ou de inferioridade dos que possam entrar em relações conosco e, por conseguinte,
o grau de confiança ou de estima que mereçam. É, de certo modo, a chave da ciência espírita,
porquanto só ele pode explicar as anomalias que as comunicações apresentam, esclarecendo-nos
acerca das desigualdades intelectuais e morais dos Espíritos.
Faremos, todavia, notar que estes não ficam pertencendo, exclusivamente, a tal ou tal classe.
Sendo sempre gradual o progresso deles e muitas vezes mais acentuado num sentido do que em
outro, pode acontecer que muitos reúnam em si os caracteres de várias categorias, o que seus atos
e linguagem tornam possível apreciar-se.
Terceira ordem. - Espíritos imperfeitos
101. CARACTERES GERAIS. - Predominância da matéria sobre o Espírito.
Propensão para o mal. Ignorância, orgulho, egoísmo e todas as paixões que lhes são
conseqüentes.
Têm a intuição de Deus, mas não O compreendem. Nem todos são essencialmente maus. Em
alguns há mais leviandade, irreflexão e malícia do que verdadeira maldade. Uns não fazem o
bem nem o mal; mas, pelo simples fato de não fazerem o bem, já denotam a sua inferioridade.
Outros, ao contrário, se comprazem no mal e rejubilam quando uma ocasião se lhes depara de
praticá-lo.
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A inteligência pode achar-se neles aliada à maldade ou à malícia; seja, porém, qual for o grau
que tenham alcançado de desenvolvimento intelectual, suas idéias são pouco elevadas e mais ou
menos abjetos seus sentimentos.
Restritos conhecimentos têm das coisas do mundo espírita e o pouco que sabem se confunde com
as idéias e preconceitos da vida corporal. Não nos podem dar mais do que noções errôneas e
incompletas; entretanto, nas suas comunicações, mesmo imperfeitas, o observador atento
encontra a confirmação das grandes verdades ensinadas pelos Espíritos superiores.
Na linguagem de que usam se lhes revela o caráter. Todo Espírito que, em suas comunicações,
trai um mau pensamento pode ser classificado na terceira ordem.
Conseguintemente, todo mau pensamento que nos é sugerido vem de um Espírito desta ordem.
Eles vêem a felicidade dos bons e esse espetáculo lhes constitui incessante tormento, porque os
faz experimentar todas as angústias que a inveja e o ciúme podem causar.
Conservam a lembrança e a percepção dos sofrimentos da vida corpórea e essa impressão é
muitas vezes mais penosa do que a realidade. Sofrem, pois, verdadeiramente, pelos males de que
padeceram em vida e pelos que ocasionam aos outros. E, como sofrem por longo tempo, julgam
que sofrerão para sempre. Deus, para puni-los, quer que assim julguem.
Podem compor cinco classes principais.
102. Décima classe. ESPÍRITOS IMPUROS. - São inclinados ao mal, de que fazem o objeto de
suas preocupações. Como Espíritos, dão conselhos pérfidos, sopram a discórdia e a desconfiança
e se mascaram de todas as maneiras para melhor enganar. Ligam-se aos homens de caráter
bastante fraco para cederem às suas sugestões, a fim de induzi-los à perdição, satisfeitos com o
conseguirem retardar-lhes o adiantamento, fazendo-os sucumbir nas provas por que passam.
Nas manifestações dão-se a conhecer pela linguagem. A trivialidade e a grosseria das expressões,
nos Espíritos, como nos homens, é sempre indício de inferioridade moral, senão também
intelectual. Suas comunicações exprimem a baixeza de seus pendores e, se tentam iludir, falando
com sensatez, não conseguem sustentar por muito tempo o papel e acabam sempre por se
traírem.
Alguns povos os arvoraram em divindades maléficas; outros os designam pelos nomes de
demônios, maus gênios, Espíritos do mal.
Quando encarnados, os seres vivos que eles constituem se mostram propensos a todos os vícios
geradores das paixões vis e degradantes: a sensualidade, a crueldade, a felonia, a hipocrisia, a
cupidez, a avareza sórdida. Fazem o mal por prazer, as mais das vezes sem motivo, e, por ódio
ao bem, quase sempre escolhem suas vítimas entre as pessoas honestas. São flagelos para a
humanidade, pouco importando a categoria social a que pertençam, e o verniz da civilização não
os forra ao opróbrio e à ignomínia.
103. Nona classe. ESPÍRITOS LEVIANOS. - São ignorantes, maliciosos, irrefletidos e
zombeteiros. Metem-se em tudo, a tudo respondem, sem se incomodarem com a verdade.
Gostam de causar pequenos desgostos e ligeiras alegrias, de intrigar, de induzir maldosamente
em erro, por meio de mistificações e de espertezas. A esta classe pertencem os Espíritos
vulgarmente tratados de duendes, trasgos, gnomos, diabretes. Acham-se sob a dependência dos
Espíritos superiores, que muitas vezes os empregam, como fazemos com os nossos servidores.
Em suas comunicações com os homens, a linguagem de que se servem é, amiúde, espirituosa e
faceta, mas quase sempre sem profundeza de idéias. Aproveitam-se das esquisitices e dos
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ridículos humanos e os apreciam, mordazes e satíricos. Se tomam nomes supostos, é mais por
malícia do que por maldade.
104. Oitava classe. ESPÍRITOS PSEUDO-SÁBIOS. - Dispõem de conhecimentos bastante
amplos, porém, crêem saber mais do que realmente sabem. Tendo realizado alguns progressos
sob diversos pontos de vista, a linguagem deles aparenta um cunho de seriedade, de natureza a
iludir com respeito às suas capacidades e luzes. Mas, em geral, isso não passa de reflexo dos
preconceitos e idéias sistemáticas que nutriam na vida terrena. É uma mistura de algumas
verdades com os erros mais polpudos, através dos quais penetram a presunção, o orgulho, o
ciúme e a obstinação, de que ainda não puderam despir-se.
105. Sétima classe. ESPÍRITOS NEUTROS. - Nem bastante bons para fazerem o bem, nem
bastante maus para fazerem o mal. Pendem tanto para um como para o outro e não ultrapassam a
condição comum da Humanidade, quer no que concerne ao moral, quer no que toca à
inteligência. Apegam-se às coisas deste mundo, de cujas grosseiras alegrias sentem saudades.
106. Sexta classe. ESPÍRITOS BATEDORES E PERTURBADORES. - Estes Espíritos,
propriamente falando, não formam uma classe distinta pelas suas qualidades pessoais. Podem
caber em todas as classes da terceira ordem. Manifestam geralmente sua presença por efeitos
sensíveis e físicos, como pancadas, movimento e deslocamento anormal de corpos sólidos,
agitação do ar, etc. Afiguram-se, mais do que outros, presos à matéria. Parecem ser os agentes
principais das vicissitudes dos elementos do globo, quer atuem sobre o ar, a água, o fogo, os
corpos duros, quer nas entranhas da terra. Reconhece-se que esses fenômenos não derivam de
uma causa fortuita ou física, quando denotam caráter intencional e inteligente. Todos os Espíritos
podem produzir tais fenômenos, mas os de ordem elevada os deixam, de ordinário, como
atribuições dos subalternos, mais aptos para as coisas materiais do que para as coisas da
inteligência; quando julgam úteis as manifestações desse gênero, lançam mão destes últimos
como seus auxiliares.
Segunda ordem. - Bons Espíritos
107. CARACTERES GERAIS - Predominância do Espírito sobre a matéria; desejo do bem. Suas
qualidades e poderes para o bem estão em relação com o grau de adiantamento que hajam
alcançado; uns têm a ciência, outros a sabedoria e a bondade. Os mais reúnem o saber às
qualidades morais. Não estando ainda completamente desmaterializados, conservam mais ou
menos, conforme a categoria que ocupem, os traços da existência corporal, assim na forma da
linguagem, como nos hábitos, entre os quais se descobrem mesmo algumas de suas manias. De
outro modo, seriam Espíritos perfeitos.
Compreendem Deus e o infinito e já gozam da felicidade dos bons. São felizes pelo bem que
fazem e pelo mal que impedem. O amor que os une lhes é fonte de inefável ventura, que não tem
a perturbá-la nem a inveja, nem os remorsos, nem nenhuma das más paixões que constituem o
tormento dos Espíritos imperfeitos. Todos, entretanto, ainda têm que passar por provas, até que
atinjam a perfeição.
Como Espíritos, suscitam bons pensamentos, desviam os homens da senda do mal, protegem na
vida os que se lhes mostram dignos de proteção e neutralizam a influência dos Espíritos
imperfeitos sobre aqueles a quem não é grato sofrê-la.
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Quando encarnados, são bondosos e benevolentes com os seus semelhantes. Não os movem o
orgulho, nem o egoísmo, ou a ambição. Não experimentam ódio, rancor, inveja ou ciúme e
fazem o bem pelo bem.
A esta ordem pertencem os Espíritos designados, nas crenças vulgares, pelos nomes de bons
gênios, gênios protetores, Espíritos do bem. Em épocas de superstições e de ignorância, eles hão
sido elevados à categoria de divindades benfazejas.
Podem ser divididos em quatro grupos principais:
108. Quinta classe. ESPÍRITOS BENÉVOLOS. - A bondade é neles a qualidade dominante.
Apraz-lhes prestar serviço aos homens e protegê-los. Limitados, porém, são os seus
conhecimentos. Hão progredido mais no sentido moral do que no sentido intelectual.
109. Quarta classe. ESPÍRITOS SÁBIOS. - Distinguem-se pela amplitude de seus
conhecimentos. Preocupam-se menos com as questões morais, do que com as de natureza
científica, para as quais têm maior aptidão. Entretanto, só encaram a ciência do ponto de vista da
sua utilidade e jamais dominados por quaisquer paixões próprias dos Espíritos imperfeitos.
110. Terceira classe. ESPÍRITOS DE SABEDORIA. - As qualidades morais da ordem mais
elevada são o que os caracteriza. Sem possuírem ilimitados conhecimentos, são dotados de uma
capacidade intelectual que lhes faculta juízo reto sobre os homens e as coisas.
111. Segunda classe. ESPÍRITOS SUPERIORES. - Esses em si reúnem a ciência, a sabedoria e a
bondade. Da linguagem que empregam se exala sempre a benevolência; é uma linguagem
invariavelmente digna, elevada e, muitas vezes, sublime. Sua superioridade os torna mais aptos
do que os outros a nos darem noções exatas sobre as coisas do mundo incorpóreo, dentro dos
limites do que é permitido ao homem saber. Comunicam-se complacentemente com os que
procuram de boa-fé a verdade e cuja alma já está bastante desprendida das ligações terrenas para
compreendê-la. Afastam-se, porém, daqueles a quem só a curiosidade impele, ou que, por
influência da matéria, fogem à prática do bem.
Quando, por exceção, encarnam na Terra, é para cumprir missão de progresso e então nos
oferecem o tipo da perfeição a que a Humanidade pode aspirar neste mundo.
Primeira ordem. - Espíritos puros
112. CARACTERES GERAIS. - Nenhuma influência da matéria. Superioridade intelectual e
moral absoluta, com relação aos Espíritos das outras ordens.
113. Primeira classe. Classe única. - Os Espíritos que a compõem percorreram todos os graus da
escala se despojaram de todas as impurezas da matéria. Tendo alcançado a soma de perfeição de
que é suscetível a criatura, não têm mais que sofrer provas, nem expiações. Não estando mais
sujeitos à reencarnação em corpos perecíveis, realizam a vida eterna no seio de Deus.
Gozam de inalterável felicidade, porque não se acham submetidos às necessidades, nem às
vicissitudes da vida material. Essa felicidade, porém, não é a ociosidade monótona, a
transcorrer em perpétua contemplação. Eles são os mensageiros e os ministros de Deus, cujas
ordens executam para manutenção da harmonia universal. Comandam a todos os Espíritos que
lhes são inferiores, auxiliam-nos na obra de seu aperfeiçoamento e lhes designam as suas
missões. Assistir os homens nas suas aflições, concitá-los ao bem ou à expiação das faltas que os
conservem distanciados da suprema felicidade, constitui para eles ocupação gratíssima. São
designados às vezes pelos nomes de anjos, arcanjos ou serafins.
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Podem os homens pôr-se em comunicação com eles, mas extremamente presunçoso seria aquele
que pretendesse tê-los constantemente às suas ordens.
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Perguntas 101 a 113.
23 de outubro de 2006
Progressão dos Espíritos
114. Os Espíritos são bons ou maus por natureza, ou são eles mesmos que se melhoram?
“São os próprios Espíritos que se melhoram e, melhorando-se, passam de uma ordem inferior
para outra mais elevada.”
115. Dos Espíritos, uns terão sido criados bons e outros maus?
“Deus criou todos os Espíritos simples e ignorantes, isto é, sem saber. A cada um deu
determinada missão, com o fim de esclarecê-los e de os fazer chegar progressivamente à
perfeição, pelo conhecimento da verdade, para aproximá-los de si. Nesta perfeição é que eles
encontram a pura e eterna felicidade. Passando pelas provas que Deus lhes impõe é que os
Espíritos adquirem aquele conhecimento. Uns aceitam submissos essas provas e chegam mais
depressa à meta que lhes foi assinada. Outros só a suportam murmurando e, pela falta em que
desse modo incorrem, permanecem afastados da perfeição e da prometida felicidade.”
a) - Segundo o que acabais de dizer, os Espíritos, em sua origem, seriam como as crianças,
ignorantes e inexperientes, só adquirindo pouco a pouco os conhecimentos de que carecem com
o percorrerem as diferentes fases da vida?
“Sim, a comparação é boa. A criança rebelde se conserva ignorante e imperfeita. Seu
aproveitamento depende da sua maior ou menor docilidade. Mas, a vida do homem tem termo,
ao passo que a dos Espíritos se prolonga ao infinito.”
116. Haverá Espíritos que se conservem eternamente nas ordens inferiores?
“Não; todos se tornarão perfeitos. Mudam de ordem, mas demoradamente, porquanto, como já
doutra vez dissemos, um pai justo e misericordioso não pode banir seus filhos para sempre.
Pretenderias que Deus, tão grande, tão bom, tão justo, fosse pior do que vós mesmos?”
117. Depende dos Espíritos o progredirem mais ou menos rapidamente para a perfeição?
“Certamente. Eles a alcançam mais ou menos rápido, conforme o desejo que têm de alcançá-la e
a submissão que testemunham à vontade de Deus. Uma criança dócil não se instrui mais depressa
do que outra recalcitrante?”
118. Podem os Espíritos degenerar?
“Não; à medida que avançam, compreendem o que os distanciava da perfeição. Concluindo uma
prova, o Espírito fica com a ciência que daí lhe veio e não a esquece. Pode permanecer
estacionário, mas não retrograda.”
119. Não podia Deus isentar os Espíritos das provas que lhes cumpre sofrer para chegarem à
primeira ordem?
“Se Deus os houvesse criado perfeitos, nenhum mérito teriam para gozar dos benefícios dessa
perfeição. Onde estaria o merecimento sem a luta? Demais, a desigualdade entre eles existente é
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necessária às suas personalidades. Acresce ainda que as missões que desempenham nos
diferentes graus da escala estão nos desígnios da Providência, para a harmonia do Universo.”
Pois que, na vida social, todos os homens podem chegar às mais altas funções, seria o caso de
perguntar-se por que o soberano de um país não faz de cada um de seus soldados um general; por
que todos os empregados subalternos não são funcionários superiores; por que todos os colegiais
não são mestres. Ora, entre a vida social e a espiritual há esta diferença: enquanto que a primeira
é limitada e nem sempre permite que o homem suba todos os seus degraus, a segunda é
indefinida e a todos oferece a possibilidade de se elevarem ao grau supremo.
120. Todos os Espíritos passam pela fieira do mal para chegar ao bem?
“Pela fieira do mal, não; pela fieira da ignorância.”
121. Por que é que alguns Espíritos seguiram o caminho do bem e outros o do mal?
“Não têm eles o livre-arbítrio? Deus não os criou maus; criou-os simples e ignorantes, isto é,
tendo tanta aptidão para o bem quanta para o mal. Os que são maus, assim se tornaram por
vontade própria.”
122. Como podem os Espíritos, em sua origem, quando ainda não têm consciência de si
mesmos, gozar da liberdade de escolha entre o bem e o mal? Há neles algum princípio,
qualquer tendência que os encaminhe para uma senda de preferência a outra?
“O livre-arbítrio se desenvolve à medida que o Espírito adquire a consciência de si mesmo. Já
não haveria liberdade, desde que a escolha fosse determinada por uma causa independente da
vontade do Espírito. A causa não está nele, está fora dele, nas influências a que cede em virtude
da sua livre vontade. É o que se contém na grande figura emblemática da queda do homem e do
pecado original: uns cederam à tentação, outros resistiram.”
a) Donde vêm as influências que sobre ele se exercem?
“Dos Espíritos imperfeitos, que procuram apoderar-se dele, dominá-lo, e que rejubilam com o
fazê-lo sucumbir. Foi isso o que se intentou simbolizar na figura de Satanás.”
b) Tal influência só se exerce sobre o Espírito em sua origem?
“Acompanha-o na sua vida de Espírito, até que haja conseguido tanto império sobre si mesmo,
que os maus desistem de obsidiá-lo.”
123. Por que há Deus permitido que os Espíritos possam tomar o caminho do mal?
“Como ousais pedir a Deus contas de Seus atos? Supondes poder penetrar-lhe os desígnios?
Podeis, todavia, dizer o seguinte: A sabedoria de Deus está na liberdade de escolher que Ele
deixa a cada um, porquanto, assim, cada um tem o mérito de suas obras.”
124. Pois que há Espíritos que desde o princípio seguem o caminho do bem absoluto e outros o
do mal absoluto, deve haver, sem dúvida, gradações entre esses dois extremos. não?
“Sim, certamente, e os que se acham nos graus intermediários constituem a maioria.”
125. Os Espíritos que enveredaram pela senda do mal poderão chegar ao mesmo grau de
superioridade que os outros?
“Sim; mas as eternidades lhes serão mais longas.”
Por estas palavras - as eternidades - se deve entender a idéia que os Espíritos inferiores fazem da
perpetuidade de seus sofrimentos, cujo termo não lhes é dado ver, idéia que revive todas as vezes
que sucumbem numa prova.
126. Chegados ao grau supremo da perfeição, os Espíritos que andaram pelo caminho do mal
têm, aos olhos de Deus, menos mérito do que os outros?
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“Deus olha de igual maneira para os que se transviaram e para os outros e a todos ama com o
mesmo coração. Aqueles são chamados maus, porque sucumbiram. Antes, não eram mais que
simples Espíritos.”
127. Os Espíritos são criados iguais quanto às faculdades intelectuais?
“São criados iguais, porém, não sabendo donde vêm, preciso é que o livre-arbítrio siga seu curso.
Eles progridem mais ou menos rapidamente em inteligência como em moralidade.”
Os espíritos que desde o princípio seguem o caminho do bem nem por isso são Espíritos
perfeitos. Não têm, é certo, maus pendores, mas precisam adquirir a experiência e os
conhecimentos indispensáveis para alcançar a perfeição. Podemos compará-los a crianças que,
seja qual for a bondade de seus instintos naturais, necessitam de se desenvolver e esclarecer e
que não passam, sem transição, da infância à madureza.
Simplesmente, assim como há homens que são bons e outros que são maus desde a infância,
também há Espíritos que são bons ou maus desde a origem, com a diferença capital de que a
criança tem instintos já inteiramente formados, enquanto que o Espírito, ao formar-se, não é nem
bom, nem mau; tem todas as tendências e toma uma ou outra direção, por efeito do seu livrearbítrio.
Os anjos segundo o Espiritismo
12. - Que haja seres dotados de todas as qualidades atribuídas aos anjos, não restam dúvidas. A
revelação espírita neste ponto confirma a crença de todos os povos, fazendo-nos conhecer ao
mesmo tempo a origem e natureza de tais seres.
As almas ou Espíritos são criados simples e ignorantes, isto é, sem conhecimentos nem
consciência do bem e do mal, porém, aptos para adquirir o que lhes falta. O trabalho é o meio de
aquisição, e o fim - que é a perfeição - é para todos o mesmo. Conseguem-no mais ou menos
prontamente em virtude do livre-arbítrio e na razão direta dos seus esforços; todos têm os
mesmos degraus a franquear, o mesmo trabalho a concluir. Deus não aquinhoa melhor a uns do
que a outros, porquanto é justo, e, visto serem todos seus filhos, não tem predileções. Ele lhes
diz: Eis a lei que deve constituir a vossa norma de conduta; ela só pode levar-vos ao fim; tudo
que lhe for conforme é o bem; tudo que lhe for contrário é o mal. Tendes inteira liberdade de
observar ou infringir esta lei, e assim sereis os árbitros da vossa própria sorte. Conseguintemente,
Deus não criou o mal; todas as suas leis são para o bem, e foi o homem que criou esse mal,
divorciando-se dessas leis; se ele as observasse escrupulosamente, jamais se desviaria do bom
caminho.
13. - Entretanto, a alma, qual criança, é inexperiente nas primeiras fases da existência, e daí o ser
falível. Não lhe dá Deus essa experiência, mas dá-lhe meios de adquiri-la. Assim, um passo em
falso na senda do mal é um atraso para a alma, que, sofrendo-lhe as conseqüências, aprende à sua
custa o que importa evitar. Deste modo, pouco a pouco, se desenvolve, aperfeiçoa e adianta na
hierarquia espiritual até ao estado de puro Espírito ou anjo. Os anjos são, pois, as almas dos
homens chegados ao grau de perfeição que a criatura comporta, fruindo em sua plenitude a
prometida felicidade. Antes, porém, de atingir o grau supremo, gozam de felicidade relativa ao
seu adiantamento, felicidade que consiste, não na ociosidade, mas nas funções que a Deus apraz
confiar-lhes, e por cujo desempenho se sentem ditosas, tendo ainda nele um meio de progresso.
(Vede 1ª Parte, cap. III, "O céu".)
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14. A Humanidade não se limita à Terra; habita inúmeros mundos que no Espaço circulam; já
habitou os desaparecidos, e habitará os que se formarem. Tendo-a criado de toda a eternidade,
Deus jamais cessa de criá-la. Muito antes que a Terra existisse e por mais remota que a
suponhamos, outros mundos havia, nos quais Espíritos encarnados percorreram as mesmas fases
que ora percorrem os de mais recente formação, atingindo seu fim antes mesmo que houvéramos
saído das mãos do Criador.
De toda a eternidade tem havido, pois, puros Espíritos ou anjos; mas, como a sua existência
humana se passou num infinito passado, eis que os supomos como se tivessem sido sempre anjos
de todos os tempos.
15. Realiza-se assim a grande lei de unidade da Criação; Deus nunca esteve inativo e sempre
teve puros Espíritos, experimentados e esclarecidos, para transmissão de suas ordens e direção
do Universo, desde o governo dos mundos até os mais ínfimos detalhes. Tampouco teve Deus
necessidade de criar seres privilegiados, isentos de obrigações; todos, antigos e novos,
adquiriram suas posições na luta e por mérito próprio; todos, enfim, são filhos de suas obras.
E, desse modo, completa-se com igualdade a soberana justiça do Criador.
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Céu e o Inferno. Capítulo 8, 1ª parte, itens 12 a 15.
2. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Perguntas 114 a 127.
30 de outubro de 2006
Forma e Ubiqüidade dos Espíritos
88. Os Espíritos têm forma determinada, limitada e constante?
“Para vós, não; para nós, sim. O Espírito é, se quiserdes, uma chama, um clarão, ou uma centelha
etérea.”
a) - Essa chama ou centelha tem cor?
“Tem uma coloração que, para vós, vai do colorido escuro e opaco a uma cor brilhante, qual a do
rubi, conforme o Espírito é mais ou menos puro.”
Representam-se de ordinário os gênios com uma chama ou estrela na fronte. É uma alegoria, que
lembra a natureza essencial dos Espíritos. Colocam-na no alto da cabeça, porque aí está a sede da
inteligência.
92. Têm os Espíritos o dom da ubiqüidade? Por outras palavras: um Espírito pode dividir-se, ou
existir em muitos pontos ao mesmo tempo?
“Não pode haver divisão de um mesmo Espírito; mas, cada um é um centro que irradia para
diversos lados. Isso é que faz parecer estar um Espírito em muitos lugares ao mesmo tempo. Vês
o Sol? É um somente. No entanto, irradia em todos os sentidos e leva muito longe os seus raios.
Contudo, não se divide.”
a) - Todos os Espíritos irradiam com igual força?
“Longe disso. Essa força depende do grau de pureza de cada um.”
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Cada Espírito é uma unidade indivisível, mas cada um pode lançar seus pensamentos para
diversos lados, sem que se fracione para tal efeito. Nesse sentido unicamente é que se deve
entender o dom da ubiqüidade atribuído aos Espíritos. Dá-se com eles o que se dá com uma
centelha, que projeta longe a sua claridade e pode ser percebida de todos os pontos do horizonte;
ou, ainda, o que se dá com um homem que, sem mudar de lugar e sem se fracionar, transmite
ordens, sinais e movimento a diferentes pontos.
119. Voltemos ao nosso assunto. Isolado do corpo, o Espírito de um vivo pode, como o de um
morto, mostrar-se com todas as aparências da realidade. Demais, pelas mesmas causas que temos
exposto, pode adquirir momentânea tangibilidade. Este fenômeno, conhecido pelo nome de
bicorporeidade, foi que deu azo às histórias de homens duplos, isto é, de Indivíduos cuja
presença simultânea em dois lugares diferentes se chegou a comprovar. Aqui vão dois exemplos,
tirados, não das lendas populares, mas da história eclesiástica.
Santo Afonso de Liguori foi canonizado antes do tempo prescrito, por se haver mostrado
simultaneamente em dois sítios diversos, o que passou por milagre.
Santo Antônio de Pádua estava pregando na Itália (vide Nota Especial à página 162), quando seu
pai, em Lisboa, ia ser supliciado, sob a acusação de haver cometido um assassínio. No momento
da execução, Santo Antônio aparece e demonstra a Inocência do acusado. Comprovou-se que,
naquele Instante, Santo Antônio pregava na Itália, na cidade de Pádua.
Por nós evocado e interrogado, acerca do fato acima, Santo Afonso respondeu do seguinte modo:
lª Poderias explicar-nos esse fenômeno?
"Perfeitamente. Quando o homem, por suas virtudes, chegou a desmaterializarse completamente;
quando conseguiu elevar sua alma para Deus, pode aparecer em dois lugares ao mesmo tempo.
Eis como: o Espírito encarnado, ao sentir que lhe vem o sono, pode pedir a Deus lhe seja
permitido transportar-se a um lugar qualquer. Seu Espírito, ou sua alma, como quiseres,
abandona então o corpo, acompanhado de uma parte do seu perispírito, e deixa a matéria imunda
num estado próximo do da morte. Digo próximo do da morte, porque no corpo ficou um laço que
liga o perispírito e a alma à matéria, laço este que não pode ser definido. O corpo aparece, então,
no lugar desejado. Creio ser isto o que queres saber."
2ª Isso não nos dá a explicação da visibilidade e da tangibilidade do perispírito.
"Achando-se desprendido da matéria, conformemente ao grau de sua elevação, pode o Espírito
tornar-se tangível à matéria."
3ª Será indispensável o sono do corpo, para que o Espírito apareça noutros lugares?
"A alma pode dividir-se, quando se sinta atraída para lugar diferente daquele onde se acha seu
corpo. Pode acontecer que o corpo não se ache adormecido, se bem seja isto muito raro; mas, em
todo caso, não se encontrará num estado perfeitamente normal; será sempre um estado mais ou
menos extático."
NOTA. A alma não se divide, no sentido literal do termo: irradia-se para diversos lados e pode
assim manifestar-se em muitos pontos, sem se haver fracionado.
Dá-se o que se dá com a luz, que pode refletir-se simultaneamente em muitos espelhos.
4ª Que sucederia se, estando o homem a dormir, enquanto seu Espírito se mostra noutra parte,
alguém de súbito o despertasse?
"Isso não se verificaria, porque, se alguém tivesse a intenção de o despertar, o Espírito retornaria
ao corpo, prevendo a intenção, porquanto o Espírito lê os pensamentos."
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NOTA. Explicação inteiramente idêntica nos deram, muitas vezes, Espíritos de pessoas mortas,
ou vivas. Santo Afonso explica o fato da dupla presença, mas não a teoria da visibilidade e da
tangibilidade.
120. Tácito refere um fato análogo: Durante os meses que Vespasiano passou em Alexandria,
aguardando a volta dos ventos estivais e da estação em que o mar oferece segurança, muitos
prodígios ocorreram, pelos quais se manifestaram a proteção do céu e o interesse que os deuses
tomavam por aquele príncipe...
Esses prodígios redobraram o desejo, que Vespasiano alimentava, de visitar a sagrada morada do
deus, para consultá-lo sobre as coisas do império. Ordenou que o templo se conservasse fechado
para quem quer que fosse e, tendo nele entrado, estava todo atento ao que ia dizer o oráculo,
quando percebeu, por detrás de si, um dos mais eminentes Egípcios, chamado Basílide, que ele
sabia estar doente, em lugar distante muitos dias de Alexandria. Inquiriu dos sacerdotes se
Basílide viera naquele dia ao templo; inquiriu dos transeuntes se o tinham visto na cidade; por
fim, despachou alguns homens a cavalo, para saberem de Basílide e veio a certificar-se de que,
no momento em que este lhe aparecera, estava a oitenta milhas de distância. Desde então, não
mais duvidou de que tivesse sido sobrenatural a visão e o nome de Basílide lhe ficou valendo por
um oráculo. (Tácito: Histórias, liv. IV, caps. LXXXI e LXXXII. Tradução de Burnouf.)
121. Tem, pois, dois corpos o indivíduo que se mostra simultaneamente em dois lugares
diferentes. Mas, desses dois corpos, um somente é real, o outro é simples aparência. Pode-se
dizer que o primeiro tem a vida orgânica e que o segundo tem a vida da alma. Ao despertar o
indivíduo, os dois corpos se reúnem e a vida da alma volta ao corpo material. Não parece
possível, pelo menos não conhecemos disso exemplo algum, e a razão, ao nosso ver, o
demonstra, que, no estado de separação, possam os dois corpos gozar, simultaneamente e no
mesmo grau, da vida ativa e inteligente. Demais, do que acabamos de dizer ressalta que o corpo
real não poderia morrer, enquanto o corpo aparente se conservasse visível, porquanto a
aproximação da morte sempre atrai o Espírito para o corpo, ainda que apenas por um instante.
Daí resulta igualmente que o corpo aparente não poderia ser matado, porque não é orgânico, não
é formado de carne e osso. Desapareceria, no momento em que o quisessem matar (1).
Fontes de consulta
1.
2.
3.
4.
Allan Kardec. O Livro dos Médiuns. Capítulo 7, 2ª parte, itens 119 a 121.
Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Perguntas 88 e 92.
Gabriel Dellane. O fenômeno Espírita. Página 113, parte 4, A doutrina espírita.
Francisco Cândido Xavier. Evolução em dois mundos. Pág. 174. 2ª parte, Corpo
Espiritual e Volitação.
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06 de novembro de 2006
Espíritos Errantes
Espíritos errantes
223. A alma reencarna logo depois de se haver separado do corpo?
“Algumas vezes reencarna imediatamente, porém, de ordinário só o faz depois de intervalos mais
ou menos longos. Nos mundos superiores, a reencarnação é quase sempre imediata. Sendo aí
menos grosseira a matéria corporal, o Espírito, quando encarnado nesses mundos, goza quase
que de todas as suas faculdades de Espírito, sendo o seu estado normal o dos sonâmbulos lúcidos
entre vós.”
224. Que é a alma no intervalo das encarnações?
“Espírito errante, que aspira a novo destino, que espera.”
a) - Quanto podem durar esses intervalos?
“Desde algumas horas até alguns milhares de séculos. Propriamente falando, não há extremo
limite estabelecido para o estado de erraticidade, que pode prolongar-se muitíssimo, mas que
nunca é perpétuo. Cedo ou tarde, o Espírito terá que volver a uma existência apropriada a
purificá-lo das máculas de suas existências precedentes.”
b) - Essa duração depende da vontade do Espírito, ou lhe pode ser imposta como expiação?
“É uma conseqüência do livre-arbítrio. Os Espíritos sabem perfeitamente o que fazem. Mas,
também, para alguns, constitui uma punição que Deus lhes inflige. Outros pedem que ela se
prolongue, a fim de continuarem estudos que só na condição de Espírito livre podem efetuar-se
com proveito.”
225. A erraticidade é, por si só, um sinal de inferioridade dos Espíritos?
“Não, porquanto há Espíritos errantes de todos os graus. A encarnação é um estado transitório, já
o dissemos. O Espírito se acha no seu estado normal, quando liberto da matéria.”
226. Poder-se-á dizer que são errantes todos os Espíritos que não estão encarnados?
“Sim, com relação aos que tenham de reencarnar. Não são errantes, porém, os Espíritos puros, os
que chegaram à perfeição. Esses se encontram no seu estado definitivo.”
No tocante às qualidades íntimas, os Espíritos são de diferentes ordens, ou graus, pelos quais vão
passando sucessivamente, à medida que se purificam. Com relação ao estado em que se acham,
podem ser: encarnados, isto é, ligados a um corpo; errantes, isto é, sem corpo material e
aguardando nova encarnação para se melhorarem; Espíritos puros, isto é, perfeitos, não
precisando mais de encarnação.
227. De que modo se instruem os Espíritos errantes? Certo não o fazem do mesmo modo que
nós outros?
“Estudam e procuram meios de elevar-se. Vêem, observam o que ocorre nos lugares aonde vão;
ouvem os discursos dos homens doutos e os conselhos dos Espíritos mais elevados e tudo isso
lhes incute idéias que antes não tinham.”
228. Conservam os Espíritos algumas de suas paixões humanas? “Com o invólucro material os
Espíritos elevados deixam as paixões más e só guardam a do bem. Quanto aos Espíritos
inferiores, esses as conservam, pois do contrário pertenceriam à primeira ordem.”
229. Por que, deixando a Terra, não deixam aí os Espíritos todas as más paixões, uma vez que
lhes reconhecem os inconvenientes?
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“Vês nesse mundo pessoas excessivamente invejosas. Imaginas que, mal o deixam, perdem esse
defeito? Acompanha os que da Terra partem, sobretudo os que alimentaram paixões bem
acentuadas, uma espécie de atmosfera que os envolve, conservando-lhes o que têm de mau, por
não se achar o Espírito inteiramente desprendido da matéria. Só por momentos ele entrevê a
verdade, que assim lhe aparece como que para mostrar-lhe o bom caminho.”
230. Na erraticidade, o Espírito progride?
“Pode melhorar-se muito, tais sejam a vontade e o desejo que tenha de consegui-lo. Todavia, na
existência corporal é que põe em prática as idéias que adquiriu.”
231. São felizes ou desgraçados os Espíritos errantes?
“Mais ou menos, conforme seus méritos. Sofrem por efeito das paixões cuja essência
conservaram, ou são felizes, de conformidade com o grau de desmaterialização a que hajam
chegado. Na erraticidade, o Espírito percebe o que lhe falta para ser mais feliz e, desde então,
procura os meios de alcançá-lo. Nem sempre, porém, é permitido reencarnar como fora de seu
agrado, representando isso, para ele, uma punição.”
232. Podem os Espíritos errantes ir a todos os mundos?
“Conforme. Pelo simples fato de haver deixado o corpo, o Espírito não se acha completamente
desprendido da matéria e continua a pertencer ao mundo onde acabou de viver, ou a outro do
mesmo grau, a menos que, durante a vida, se tenha elevado, o que, aliás, constitui o objetivo para
que devem tender seus esforços, pois, do contrário, nunca se aperfeiçoaria. Pode, no entanto, ir a
alguns mundos superiores, mas na qualidade de estrangeiro. A bem dizer, consegue apenas
entrevê-los, donde lhe nasce o desejo de melhorar-se, para ser digno da felicidade de que gozam
os que os habitam, para ser digno também de habitá-los mais tarde.”
233. Os Espíritos já purificados descem aos mundos inferiores?
“Fazem-no freqüentemente, com o fim de auxiliar-lhes o progresso. A não ser assim, esses
mundos estariam entregues a si mesmos, sem guias para dirigi-los.”
Sorte das crianças depois da morte
197. Poderá ser tão adiantado quanto o de um adulto o Espírito de uma criança que morreu em
tenra idade?
“Algumas vezes o é muito mais, porquanto pode dar-se que muito mais já tenha vivido e
adquirido maior soma de experiência, sobretudo se progrediu.”
a) - Pode então o Espírito de uma criança ser mais adiantado que o de seu pai?
“Isso é muito freqüente. Não o vedes vós mesmos tão amiudadas vezes na Terra?”
198. Não tendo podido praticar o mal, o Espírito de uma criança que morreu em tenra idade
pertence a alguma das categorias superiores?
“Se não fez o mal, igualmente não fez o bem e Deus não o isenta das provas que tenha de
padecer. Se for um Espírito puro, não o é pelo fato de ter animado apenas uma criança, mas
porque já progredira até a pureza.”
199. Por que tão freqüentemente a vida se interrompe na infância? “A curta duração da vida da
criança pode representar, para o Espírito que a animava, o complemento de existência
precedentemente interrompida antes do momento em que devera terminar, e sua morte, também
não raro, constitui provação ou expiação para os pais.”
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a) - Que sucede ao Espírito de uma criança que morre pequenina?
“Recomeça outra existência.”
Se uma única existência tivesse o homem e se, extinguindo-se-lhe ela, sua sorte ficasse decidida
para a eternidade, qual seria o mérito de metade do gênero humano, da que morre na infância,
para gozar, sem esforços, da felicidade eterna e com que direito se acharia isenta das condições,
às vezes tão duras, a que se vê submetida a outra metade?
Semelhante ordem de coisas não corresponderia à justiça de Deus. Com a reencarnação, a
igualdade é real para todos. O futuro a todos toca sem exceção e sem favor para quem quer que
seja. Os retardatários só de si mesmos se podem queixar. Forçoso é que o homem tenha o
merecimento de seus atos, como tem deles a responsabilidade. Aliás, não é racional considerar-se
a infância como um estado normal de inocência.
Não se vêem crianças dotadas dos piores instintos, numa idade em que ainda nenhuma influência
pode ter tido a educação? Alguns não há que parecem trazer do berço a astúcia, a felonia, a
perfídia, até pendor para o roubo e para o assassínio, não obstante os bons exemplos que de todos
os lados se lhes dão? A lei civil as absorve de seus crimes, porque, diz ela, obraram sem
discernimento. Tem razão a lei, porque, de fato, elas obram mais por instinto do que
intencionalmente. Donde, porém, provirão instintos tão diversos em crianças da mesma idade,
educadas em condições idênticas e sujeitas às mesmas influências? Donde a precoce
perversidade, senão da inferioridade do Espírito, uma vez que a educação em nada contribuiu
para isso? As que se revelam viciosas, é porque seus Espíritos muito pouco hão progredido.
Sofrem então, por efeito dessa falta de progresso, as conseqüências , não dos atos que praticam
na infância, mas dos de suas existências anteriores. Assim é que a lei é uma só para todos e que
todos são atingidos pela justiça de Deus.
Os limbos
8. - É verdade que a Igreja admite uma posição especial em casos particulares.
As crianças falecidas em tenra idade, sem fazer mal algum, não podem ser condenadas ao fogo
eterno. Mas, também, não tendo feito bem, não lhes assiste direito à felicidade suprema. Ficam
nos limbos, diz-nos a Igreja, nessa situação jamais definida, na qual, se não sofrem, também não
gozam da bem-aventurança. Esta, sendo tal sorte irrevogavelmente fixada, fica-lhes defesa para
sempre. Tal privação importa, assim, um suplício eterno e tanto mais imerecido, quanto é certo
não ter dependido dessas almas que as coisas assim sucedessem. O mesmo se dá quanto ao
selvagem que, não tendo recebido a graça do batismo e as luzes da religião, peca por ignorância,
entregue aos instintos naturais. Certo, este não tem a responsabilidade e o mérito cabíveis ao que
procede com conhecimento de causa. A simples lógica repele uma tal doutrina em nome da
justiça de Deus, que se contém integralmente nestas palavras do Cristo: "A cada um, segundo as
suas obras." Obras, sim, boas ou más, porém praticadas voluntária e livremente, únicas que
comportam responsabilidade. Neste caso não podem estar a criança, o selvagem e tampouco
aquele que não foi esclarecido.
EXPIAÇÕES TERRESTRES: MARCEL, o menino do nº 4
Havia num hospital de província um menino de 8 a 10 anos, cujo estado era difícil precisar.
Designavam-no pelo nº 4. Totalmente contorcido, já pela sua deformidade inata, já pela doença,
as pernas se lhe torciam roçando pelo pescoço, num tal estado de magreza, que eram pele sobre
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ossos. O corpo, uma chaga; os sofrimentos, atrozes. Era oriundo de uma família israelita. A
moléstia dominava aquele organismo, já de oito longos anos, e no entanto demonstrava o
enfermo uma inteligência notável, além de candura, paciência e resignação edificantes. O médico
que o assistia, cheio de compaixão pelo pobre um tanto abandonado, visto que seus parentes
pouco o visitavam, tomou por ele certo interesse. E achava-lhe um quê de atraente na
precocidade intelectual. Assim, não só o tratava com bondade, como lia-lhe quando as ocupações
lho permitiam, admirando-se do seu critério na apreciação de coisas a seu ver superiores ao
discernimento da sua idade. Um dia, o menino disse-lhe:
- "Doutor, tenha a bondade de me dar ainda uma vez aquelas pílulas ultimamente receitadas."
Para quê? replicou-lhe o médico, se já te ministrei o suficiente, e maior quantidade pode fazer-te
mal...
- "É que eu sofro tanto, que dificilmente posso orar a Deus para que me dê forças, pois não quero
incomodar os outros enfermos que aí estão. Essas pílulas fazem-me dormir e, ao menos quando
durmo, a ninguém incomodo."
Aqui está quanto basta para demonstrar a grandeza dessa alma encerrada num corpo informe.
Onde teria ido essa criança haurir tais sentimentos? Certo, não foi no meio em que se educou;
além disso, na idade em que principiou a sofrer, não possuía sequer o raciocínio.
Tais sentimentos eram-lhe inatos: - mas então por que se via condenado ao sofrimento,
admitindo-se que Deus houvesse concomitantemente criado uma alma assim tão nobre e aquele
mísero corpo instrumento dos suplícios?
É preciso negar a bondade de Deus, ou admitir a anterioridade de causa; isto é, a preexistência da
alma e a pluralidade das existências.
Os últimos pensamentos desta criança, ao desencarnar, foram para Deus e para o caridoso
médico que dela se condoeu. Decorrido algum tempo, foi o seu Espírito evocado na Sociedade
de Paris, onde deu a seguinte comunicação (1863):
"A vosso chamado, vim fazer que a minha voz se estenda para além deste círculo, tocando todos
os corações. Oxalá seu eco se faça ouvir na solidão, lembrando-lhes que as agonias da Terra têm
por premissas as alegrias do céu; que o martírio não é mais do que a casca de um fruto deleitável,
dando coragem e resignação.
"Essa voz lhes dirá que, sobre o catre da miséria, estão os enviados do Senhor, cuja missão
consiste na exemplificação de que não há dor insuperável, desde que tenhamos o auxílio do
Onipotente e dos seus bons Espíritos. Essa voz lhes fará ouvir lamentações de mistura com
preces, para que lhes compreendam a harmonia piedosa, bem diferente da de coros de
lamentações mescladas com blasfêmias.
"Um dos vossos bons Espíritos, grande apóstolo do Espiritismo, cedeu-me o seu lugar por esta
noite. (1) 5Por minha vez, também me compete dizer algo sobre o progresso da vossa Doutrina,
que deve auxiliar em sua missão os que entre vós encarnam para aprender a sofrer. O Espiritismo
será a pedra de toque; os padecentes terão o exemplo e a palavra, e então as imprecações se
transformarão em gritos de alegria e lágrimas de contentamento."
- P. Pelo que afirmais, parece que os vossos sofrimentos não eram expiação de faltas anteriores...
R. - Não seriam uma expiação direta, mas asseguro-vos que todo sofrimento tem uma causa
justa. Aquele a quem conhecestes tão mísero foi belo, grande, rico e adulado. Eu tivera
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Santo Agostinho, pelo médium com o qual habitualmente se comunica na
Sociedade.
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turiferários e cortesãos, fora fútil e orgulhoso. Anteriormente fui bem culpado; reneguei Deus,
prejudiquei meu semelhante, mas expiei cruelmente, primeiro no mundo espiritual e depois na
Terra. Os meus sofrimentos de alguns anos apenas, nesta última encarnação, suportei-os eu
anteriormente por toda uma existência que ralou pela extrema velhice. Por meu arrependimento
reconquistei a graça do Senhor, o qual me confiou muitas missões, inclusive a última, que bem
conheceis. E fui eu quem as solicitou, para terminar a minha depuração.
Adeus, amigos; tornarei algumas vezes. A minha missão é de consolar, e não de instruir. Há,
porém, aqui muitas pessoas cujas feridas jazem ocultas, e essas terão prazer com a minha
presença.
Marcel..
Instruções do guia do médium
Pobrezinho sofredor, definhado, ulceroso e disforme! Nesse asilo de misérias e lágrimas, quantos
gemidos exalados! E como era resignado... e como a sua alma lobrigava já então o termo dos
sofrimentos, apesar da tenra idade! No além-túmulo, pressentia a recompensa de tantos gemidos
abafados, e esperava! E como orava também por aqueles que não tinham resignação no
sofrimento, pelos que trocavam preces por blasfêmias!
Foi-lhe lenta a agonia, mas terrível não lhe foi a hora do trespasse; certo, os membros convulsos
contorciam-se, oferecendo aos assistentes o espetáculo de um corpo disforme a revoltar-se contra
a sorte, nessa lei da carne que a todo o custo quer viver; mas, um anjo bom lhe pairava por sobre
o leito mortuário e cicatrizava-lhe o coração. Depois, esse anjo arrebatou nas asas brancas essa
alma tão bela a escapar-se de tão horripilante corpo, e foram estas as palavras pronunciadas:
"Glória a vós, Senhor, meu Deus!" E a alma subiu ao Todo-Poderoso, feliz, e exclamou: "Eis-me
aqui, Senhor; destes-me por missão exemplificar o sofrimento... terei suportado dignamente a
provação?"
Hoje, o Espírito da pobre criança avulta, paira no Espaço, vai do fraco ao humilde, e a todos diz:
- Esperança e coragem. Livre de todas as impurezas da matéria, ele aí está junto de vós a falarvos, a dizer-vos não mais com essa voz fraca e lastimosa, porém agora firme: "Todos que me
observaram, viram que a criança não murmurava; hauriram nesse exemplo a calma para os seus
males e seus corações se tonificaram na suave confiança em Deus, que outro não era o fim da
minha curta passagem pela Terra."
Santo Agostinho.
SZYMEL SLIZGOL
Este não passou de um pobre israelita de Vilna, falecido em maio de 1865. Durante 30 anos
mendigou com uma salva nas mãos. Por toda a cidade era bem conhecida aquela voz que dizia:
"Lembrai-vos dos pobres, das viúvas e dos órfãos!"
Por essa longa peregrinação Slizgol havia juntado 90.000 rublos, não guardando, porém, para si
um só copeque. Aliviava e curava os enfermos; pagava o ensino de crianças pobres; distribuía
aos necessitados a comida que lhe davam.
A noite, destinava-a ele ao preparo do rapé, que vendia a fim de prover às suas necessidades, e o
que lhe sobrava era dos pobres. Foi só no mundo, e no entanto o seu enterro teve o
acompanhamento de grande parte da população de Vilna, cujos armazéns cerraram as portas.
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Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Da Pluralidade das Existências, pergunta 199. Da
Vida Espírita, perguntas 223 a 233 e 197 a 199.
2. Gabriel Dellane. O Fenômeno Espírita. A Doutrina Espírita, Páginas 217-218.
3. Leon Denis. Depois da morte. A erraticidade. Página 217.
4. Allan Kardec. O Céu o Inferno. Item 8 do capítulo 04, 1ª parte; capítulo 8, 2ª parte,
Marcel, o menino do no. 4.
13 de novembro de 2006
Ensaio teórico das sensações e percepções dos espíritos
257. O corpo é o instrumento da dor. Se não é a causa primária desta é, pelo menos, a causa
imediata. A alma tem a percepção da dor: essa percepção é o efeito. A lembrança que da dor a
alma conserva pode ser muito penosa, mas não pode ter ação física. De fato, nem o frio, nem o
calor são capazes de desorganizar os tecidos da alma, que não é suscetível de congelar-se, nem
de queimar-se. Não vemos todos os dias a recordação ou a apreensão de um mal físico
produzirem o efeito desse mal, como se real fora? Não as vemos até causar a morte? Toda gente
sabe que aqueles a quem se amputou um membro costumam sentir dor no membro que lhes falta.
Certo que aí não está a sede, ou, sequer, o ponto de partida da dor. O que há, apenas, é que o
cérebro guardou desta a impressão.
Lícito, portanto, será admitir-se que coisa análoga ocorra nos sofrimentos do Espírito após a
morte. Um estudo aprofundado do perispírito, que tão importante papel desempenha em todos os
fenômenos espíritas; nas aparições vaporosas ou tangíveis; no estado em que o Espírito vem a
encontrar-se por ocasião da morte; na idéia, que tão freqüentemente manifesta, de que ainda está
vivo; nas situações tão comoventes que nos revelam os dos suicidas, dos supliciados, dos que se
deixaram absorver pelos gozos materiais; e inúmeros outros fatos, muita luz lançaram sobre esta
questão, dando lugar a explicações que passamos a resumir.
O perispírito é o laço que à matéria do corpo prende o Espírito, que o tira do meio ambiente, do
fluido universal. Participa ao mesmo tempo da eletricidade, do fluido magnético e, até certo
ponto, da matéria inerte. Poder-se-ia dizer que é a quintessência da matéria. É o princípio da vida
orgânica, porém, não o da vida intelectual, que reside no Espírito. É, além disso, o agente das
sensações exteriores. No corpo, os órgãos, servindo-lhes de condutos, localizam essas sensações.
Destruído o corpo, elas se tornam gerais. Daí o Espírito não dizer que sofre mais da cabeça do
que dos pés, ou vice-versa.
Não se confundam, porém, as sensações do perispírito, que se tornou independente, com as do
corpo. Estas últimas só por termo de comparação as podemos tomar e não por analogia.
Liberto do corpo, o Espírito pode sofrer, mas esse sofrimento não é corporal, embora não seja
exclusivamente moral, como o remorso, pois que ele se queixa de frio e calor. Também não sofre
mais no inverno do que no verão: temo-los visto atravessar chamas, sem experimentarem
qualquer dor. Nenhuma impressão lhes causa, conseguintemente, a temperatura. A dor que
sentem não é, pois, uma dor física propriamente dita: é um vago sentimento íntimo, que o
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próprio Espírito nem sempre compreende bem, precisamente porque a dor não se acha localizada
e porque não a produzem agentes exteriores; é mais uma reminiscência do que uma realidade,
reminiscência, porém, igualmente penosa.
Algumas vezes, entretanto, há mais do que isso, como vamos ver. Ensina-nos a experiência que,
por ocasião da morte, o perispírito se desprende mais ou menos lentamente do corpo; que,
durante os primeiros minutos depois da desencarnação, o Espírito não encontra explicação para a
situação em que se acha. Crê não estar morto, por isso que se sente vivo; vê a um lado o corpo,
sabe que lhe pertence, mas não compreende que esteja separado dele. Essa situação dura
enquanto haja qualquer ligação entre o corpo e o perispírito. Disse-nos, certa vez, um suicida:
“Não, não estou morto.” E acrescentava: No entanto, sinto os vermes a me roerem. Ora,
indubitavelmente, os vermes não lhe roíam o perispírito e ainda menos o Espírito; roíam-lhe
apenas o corpo. Como, porém, não era completa a separação do corpo e do perispírito, uma
espécie de repercussão moral se produzia, transmitindo ao Espírito o que estava ocorrendo no
corpo. Repercussão talvez não seja o termo próprio, porque pode induzir à suposição de um
efeito muito material. Era antes a visão do que se passava com o corpo, ao qual ainda o
conservava ligado o perispírito, o que lhe causava a ilusão, que ele tomava por realidade. Assim,
pois não haveria no caso uma reminiscência, porquanto ele não fora, em vida, ruído pelos
vermes: havia o sentimento de um fato da atualidade. Isto mostra que deduções se podem tirar
dos fatos, quando atentamente observados.
Durante a vida, o corpo recebe impressões exteriores e as transmite ao Espírito por intermédio do
perispírito, que constitui, provavelmente, o que se chama fluido nervoso.
Uma vez morto, o corpo nada mais sente, por já não haver nele Espírito, nem perispírito.
Este, desprendido do corpo, experimenta a sensação, porém, como já não lhe chega por um
conduto limitado, ela se lhe torna geral. Ora, não sendo o perispírito, realmente, mais do que
simples agente de transmissão, pois que no Espírito é que está a consciência, lógico será deduzirse que, se pudesse existir perispírito sem Espírito, aquele nada sentiria, exatamente como um
corpo que morreu. Do mesmo modo, se o Espírito não tivesse perispírito, seria inacessível a toda
e qualquer sensação dolorosa. É o que se dá com os Espíritos completamente purificados.
Sabemos que quanto mais eles se purificam, tanto mais etérea se torna a essência do perispírito,
donde se segue que a influência material diminui à medida que o Espírito progride, isto é, à
medida que o próprio perispírito se torna menos grosseiro.
Mas, dir-se-á, desde que pelo perispírito é que as sensações agradáveis, da mesma forma que as
desagradáveis, se transmitem ao Espírito, sendo o Espírito puro inacessível a umas, deve sê-lo
igualmente às outras. Assim é, de fato, com relação às que provêm unicamente da influência da
matéria que conhecemos. O som dos nossos instrumentos, o perfume das nossas flores nenhuma
impressão lhe causam. Entretanto, ele experimenta sensações íntimas, de um encanto indefinível,
das quais idéia alguma podemos formar, porque, a esse respeito, somos quais cegos de nascença
diante a luz. Sabemos que isso é real; mas, por que meio se produz? Até lá não vai a nossa
ciência. Sabemos que no Espírito há percepção, sensação, audição, visão; que essas faculdades
são atributos do ser todo e não, como no homem, de uma parte apenas do ser; mas, de que modo
ele as tem? Ignoramo-lo. Os próprios Espíritos nada nos podem informar sobre isso, por
inadequada a nossa linguagem a exprimir idéias que não possuímos, precisamente como o é, por
falta de termos próprios, a dos selvagens, para traduzir idéias referentes às nossas artes, ciências
e doutrinas filosóficas.
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Dizendo que os Espíritos são inacessíveis às impressões da matéria que conhecemos, referimonos aos Espíritos muito elevados, cujo envoltório etéreo não encontra analogia neste mundo.
Outro tanto não acontece com os de perispírito mais denso, os quais percebem os nossos sons e
odores, não, porém, apenas por uma parte limitada de suas individualidades, conforme lhes
sucedia quando vivos. Pode-se dizer que, neles, as vibrações moleculares se fazem sentir em
todo o ser e lhes chegam assim ao sensorium commune, que é o próprio Espírito, embora de
modo diverso e talvez, também, dando uma impressão diferente, o que modifica a percepção.
Eles ouvem o som da nossa voz, entretanto nos compreendem sem o auxílio da palavra, somente
pela transmissão do pensamento. Em apoio do que dizemos há o fato de que essa penetração é
tanto mais fácil, quanto mais desmaterializado está o Espírito. Pelo que concerne à vista, essa,
para o Espírito, independe da luz, qual a temos. A faculdade de ver é um atributo essencial da
alma, para quem a obscuridade não existe. É, contudo, mais extensa, mais penetrante nas mais
purificadas. A alma, ou o Espírito, tem, pois, em si mesma, a faculdade de todas as percepções.
Estas, na vida corpórea, se obliteram pela grosseria dos órgãos do corpo; na vida extracorpórea,
se vão desanuviando, à proporção que o invólucro semi-material se eteriza.
Haurido do meio ambiente, esse invólucro varia de acordo com a natureza dos mundos. Ao
passarem de um mundo a outro, os Espíritos mudam de envoltório, como nós mudamos de roupa,
quando passamos do inverno ao verão, ou do pólo ao equador. Quando vêm visitar-nos, os mais
elevados se revestem do perispírito terrestre e então suas percepções se produzem como no
comum dos Espíritos. Todos, porém, assim os inferiores como os superiores, não ouvem, nem
sentem, senão o que queiram ouvir ou sentir. Não possuindo órgãos sensitivos, eles podem,
livremente, tornar ativas ou nulas suas percepções. Uma só coisa são obrigados a ouvir - os
conselhos dos Espíritos bons. A vista, essa é sempre ativa; mas, eles podem fazer-se invisíveis
uns aos outros. Conforme a categoria que ocupem, podem ocultar-se dos que lhes são inferiores,
porém não dos que lhes são superiores. Nos primeiros instantes que se seguem à morte, a visão
do Espírito é sempre turbada e confusa. Aclara-se, à medida que ele se desprende, e pode
alcançar a nitidez que tinha durante a vida terrena, independentemente da possibilidade de
penetrar através dos corpos que nos são opacos.
Quanto à sua extensão através do espaço indefinido, do futuro e do passado, depende do grau de
pureza e de elevação do Espírito.
Objetarão, talvez: toda esta teoria nada tem de tranqüilizadora. Pensávamos que, uma vez livres
do nosso grosseiro envoltório, instrumento das nossas dores, não mais sofreríamos e eis nos
informais de que ainda sofreremos. Desta ou daquela forma, será sempre sofrimento. Ah! sim,
pode dar-se que continuemos a sofrer, e muito, e por longo tempo, mas também que deixemos de
sofrer, até mesmo desde o instante em que se nos acabe a vida corporal.
Os sofrimentos deste mundo independem, algumas vezes, de nós; muito mais vezes, contudo, são
devidos à nossa vontade. Remonte cada um à origem deles e verá que a maior parte de tais
sofrimentos são efeitos de causas que lhe teria sido possível evitar. Quantos males, quantas
enfermidades não deve o homem aos seus excessos, à sua ambição, numa palavra: às suas
paixões? Aquele que sempre vivesse com sobriedade, que de nada abusasse, que fosse sempre
simples nos gostos e modesto nos desejos, a muitas tribulações se forraria. O mesmo se dá com o
Espírito. Os sofrimentos por que passa são sempre a conseqüência da maneira por que viveu na
Terra. Certo já não sofrerá mais de gota, nem de reumatismo; no entanto, experimentará outros
sofrimentos que nada ficam a dever àqueles. Vimos que seu sofrer resulta dos laços que ainda o
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prendem à matéria; que quanto mais livre estiver da influência desta, ou, por outra, quanto mais
desmaterializado se achar, menos dolorosas sensações experimentará. Ora, está nas suas mãos
libertar-se de tal influência desde a vida atual. Ele tem o livre-arbítrio, tem, por conseguinte, a
faculdade de escolha entre o fazer e o não fazer. Dome suas paixões animais; não alimente ódio,
nem inveja, nem ciúme, nem orgulho; não se deixe dominar pelo egoísmo; purifique-se, nutrindo
bons sentimentos; pratique o bem; não ligue às coisas deste mundo importância que não
merecem; e, então, embora revestido do invólucro corporal, já estará depurado, já estará liberto
do jugo da matéria e, quando deixar esse invólucro, não mais lhe sofrerá a influência. Nenhuma
recordação dolorosa lhe advirá dos sofrimentos físicos que haja padecido; nenhuma impressão
desagradável eles deixarão, porque apenas terão atingido o corpo e não a alma. Sentir-se-á feliz
por se haver libertado deles e a paz da sua consciência o isentará de qualquer sofrimento moral.
Interrogamos, aos milhares, Espíritos que na Terra pertenceram a todas as classes da sociedade,
ocuparam todas as posições sociais; estudamo-los em todos os períodos da vida espírita, a partir
do momento em que abandonaram o corpo; acompanhamo-los passo a passo na vida de alémtúmulo, para observar as mudanças que se operavam neles, nas suas idéias, nos seus sentimentos
e, sob esse aspecto, não foram os que aqui se contaram entre os homens mais vulgares os que nos
proporcionaram menos preciosos elementos de estudo.
Ora, notamos sempre que os sofrimentos guardavam relação com o proceder que eles tiveram e
cujas conseqüências experimentavam; que a outra vida é fonte de inefável ventura para os que
seguiram o bom caminho. Deduz-se daí que, aos que sofrem, isso acontece porque o quiseram;
que, portanto, só de si mesmos se devem queixar, quer no outro mundo, quer neste.
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Médiuns. item 54.
2. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Perguntas 82 e 257.
3. Francisco Cândido Xavier. Roteiro. No plano Carnal, página 15. FEB 1980.
20 de novembro de 2006
Ocupações6 e missões7 dos Espíritos
558. Alguma outra coisa incumbe aos Espíritos fazer, que não seja melhorarem-se
pessoalmente?
“Concorrem para a harmonia do Universo, executando as vontades de Deus, cujos ministros eles
são. A vida espírita é uma ocupação contínua, mas que nada tem de penosa, como a vida na
Terra, porque não há a fadiga corporal, nem as angústias das necessidades.”
559. Também desempenham função útil no Universo os Espíritos inferiores e imperfeitos?
“Todos têm deveres a cumprir. Para a construção de um edifício, não concorre tanto o último dos
serventes de pedreiro, como o arquiteto?”
560. Tem atribuições especiais cada Espírito?
6
ocupação
Emprego, modo de vida, ofício, profissão, serviço, trabalho. 5 Afazeres, negócios.
missão
Compromisso, dever imposto ou contraído, obrigação.
7
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“Todos temos que habitar em toda parte e adquirir o conhecimento de todas as coisas, presidindo
sucessivamente ao que se efetua em todos os pontos do Universo. Mas, como diz o Eclesiastes,
há tempo para tudo. Assim, tal Espírito cumpre hoje neste mundo o seu destino, tal outro
cumprirá ou já cumpriu o seu, em época diversa, na terra, na água, no ar, etc.”
561. São permanentes para cada um e estão nas atribuições exclusivas de certas classes as
funções que os Espíritos desempenham na ordem das coisas?
“Todos têm que percorrer os diferentes graus da escala, para se aperfeiçoarem.
Deus, que é justo, não poderia ter dado a uns a ciência sem trabalho, destinando outros a só a
adquirirem com esforço.”
É o que sucede entre os homens, onde ninguém chega ao supremo grau de perfeição numa arte
qualquer, sem que tenha adquirido os conhecimentos necessários, praticando os rudimentos
dessa arte.
562. Já não tendo o que adquirir, os Espíritos da ordem mais elevada se acham em repouso
absoluto, ou também lhes tocam ocupações?
“Que quererias que fizessem na eternidade? A ociosidade eterna seria um eterno suplício.”
a) - De que natureza são as suas ocupações?
“Receber diretamente as ordens de Deus, transmiti-las ao universo inteiro e velar porque sejam
cumpridas.”
563. São incessantes as ocupações dos Espíritos?
“Incessantes, sim, atendendo-se a que sempre ativos são os seus pensamentos, porquanto vivem
pelo pensamento. Importa, porém, não identifiqueis as ocupações dos Espíritos com as
ocupações materiais dos homens. Essa mesma atividade lhes constitui um gozo, pela consciência
que têm de ser úteis.”
a) - Concebe-se isto com relação aos bons Espíritos. Dar-se-á, entretanto, o mesmo com os
Espíritos inferiores?
“A estes cabem ocupações apropriadas à sua natureza. Confiais, porventura, ao obreiro manual e
ao ignorante trabalhos que só o homem instruído pode executar?”
564. Haverá Espíritos que se conservem ociosos, que em coisa alguma útil se ocupem?
“Há, mas esse estado é temporário e dependendo do desenvolvimento de suas inteligências. Há,
certamente, como há homens que só para si mesmos vivem. Pesa-lhes, porém, essa ociosidade e,
cedo ou tarde, o desejo de progredir lhes faz necessária a atividade e felizes se sentirão por
poderem tornar-se úteis. Referimo-nos aos Espíritos que hão chegado ao ponto de terem
consciência de si mesmos e do seu livre-arbítrio; porquanto, em sua origem, todos são quais
crianças que acabam de nascer e que obram mais por instinto que por vontade expressa.”
565. Atentam os Espíritos em nossos trabalhos de arte e por eles se interessam?
“Atentam no que prove a elevação dos Espíritos e seus progressos.”
566. Um Espírito, que haja cultivado na Terra uma especialidade artística, que tenha sido, por
exemplo, pintor, ou arquiteto, se interessa de preferência pelos trabalhos que constituíram
objeto de sua predileção durante a vida?
“Tudo se confunde num objetivo geral. Se for um Espírito bom, esses trabalhos o interessarão na
medida do ensejo que lhe proporcionem de auxiliar as almas a se elevarem para Deus. Demais,
esqueceis que um Espírito que cultivou certa arte, na existência em que o conhecestes, pode ter
cultivado outra em anterior existência, pois que lhe cumpre saber tudo para ser perfeito. Assim,
conforme o grau do seu adiantamento, pode suceder que nada seja para ele uma especialidade.
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Foi o que eu quis significar, dizendo que tudo se confunde num objetivo geral. Notai ainda o
seguinte: o que, no vosso mundo atrasado, considerais sublime, não passa de infantilidade,
comparado ao que há em mundos mais adiantados”.
Como pretenderíeis que os Espíritos que habitam esses mundos, onde existem artes que
desconheceis, admirem o que, aos seus olhos, corresponde a trabalhos de colegiais? Por isso
disse eu: atentam no que demonstre progresso.”
a) - Concebemos que seja assim, em se tratando de Espíritos muito adiantados. Referimo-nos,
porém, a Espíritos mais vulgares, que ainda se não elevaram acima das idéias terrenas.
“Com relação a esses, o caso é diferente. Mais restrito é o ponto de vista donde observam as
coisas. Podem, portanto, admirar o que vos cause admiração.”
567. Costumam os Espíritos imiscuir-se em nossos prazeres e ocupações?
“Os Espíritos vulgares, como dizes, costumam. Esses vos rodeiam constantemente e com
freqüência tomam parte muito ativa no que fazeis, de conformidade com suas naturezas. Cumpre
assim aconteça, porque, para serem os homens impelidos pelas diversas veredas da vida,
necessário é que se lhes excitem ou moderem as paixões.”
Com as coisas deste mundo os Espíritos se ocupam conformemente ao grau de elevação ou de
inferioridade em que se achem. Os Espíritos superiores dispõem, sem dúvida, da faculdade de
examiná-las nas suas mínimas particularidades, mas só o fazem na medida em que isso seja útil
ao progresso. Unicamente os Espíritos inferiores ligam a essas coisas uma importância relativa às
reminiscências que ainda conservam e às idéias materiais que ainda se não extinguiram neles.
568. Os Espíritos, que têm missões a cumprir, as cumprem na erraticidade, ou encarnados?
“Podem tê-las num e noutro estado. Para certos Espíritos errantes, é uma grande ocupação.”
569. Em que consistem as missões de que podem ser encarregados os Espíritos errantes?
“São tão variadas que impossível fora descrevê-las. Muitas há mesmo que não podeis
compreender. Os Espíritos executam as vontades de Deus e não vos é dado penetrar-lhe todos os
desígnios.”
As missões dos Espíritos têm sempre por objeto o bem. Quer como Espíritos, quer como
homens, são incumbidos de auxiliar o progresso da Humanidade, dos povos ou dos indivíduos,
dentro de um círculo de idéias mais ou menos amplas, mais ou menos especiais e de velar pela
execução de determinadas coisas. Alguns desempenham missões mais restritas e, de certo modo,
pessoais ou inteiramente locais, como sejam assistir os enfermos, os agonizantes, os aflitos, velar
por aqueles de quem se constituíram guias e protetores, dirigi-los, dando-lhes conselhos ou
inspirando-lhes bons pensamentos. Pode dizer-se que há tantos gêneros de missões quantas as
espécies de interesses a resguardar, assim no mundo físico, como no moral. O Espírito se adianta
conforme à maneira por que desempenha a sua tarefa.
570. Os Espíritos percebem sempre os desígnios que lhes compete executar?
“Não. Muitos há que são instrumentos cegos. Outros, porém, sabem muito bem com que fim
atuam.”
571. Só os Espíritos elevados desempenham missões?
“A importância das missões corresponde às capacidades e à elevação do Espírito. O estafeta que
leva um telegrama ao seu destinatário também desempenha uma perfeita missão, se bem que
diversa da de um general.”
572. A missão de um Espírito lhe é imposta, ou depende da sua vontade?
“Ele a pede e ditoso se considera se a obtém.”
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a) - Pode uma igual missão ser pedida por muitos Espíritos?
“Sim, é freqüente apresentarem-se muitos candidatos, mas nem todos são aceitos.”
573. Em que consiste a missão dos Espíritos encarnados?
“Em instruir os homens, em lhes auxiliar o progresso; em lhes melhorar as instituições, por
meios diretos e materiais. As missões, porém, são mais ou menos gerais e importantes. O que
cultiva a terra desempenha tão nobre missão, como o que governa, ou o que instrui. Tudo em a
Natureza se encadeia. Ao mesmo tempo que o Espírito se depura pela encarnação, concorre,
dessa forma, para a execução dos desígnios da Providência.
Cada um tem neste mundo a sua missão, porque todos podem ter alguma utilidade.”
574. Qual pode ser, na Terra, a missão das criaturas voluntariamente inúteis?
“Há efetivamente pessoas que só para si mesmas vivem e que não sabem tornar-se úteis ao que
quer que seja. São pobres seres dignos de compaixão, porquanto expiarão duramente sua
voluntária inutilidade, começando-lhes muitas vezes, já nesse mundo, o castigo, pelo
aborrecimento e pelo desgosto que a vida lhes causa.”
a) - Pois que lhes era facultada a escolha, por que preferiram uma existência que nenhum
proveito lhes traria?
“Entre os Espíritos também há preguiçosos que recuam diante de uma vida de labor. Deus
consente que assim procedam. Mais tarde compreenderão, à própria custa, os inconvenientes da
inutilidade a que se votaram e serão os primeiros a pedir que se lhes conceda recuperar o tempo
perdido. Pode também acontecer que tenham escolhido uma vida útil e que hajam recuado diante
da execução da obra, deixando-se levar pelas sugestões dos Espíritos que os induzem a
permanecer na ociosidade.”
575. As ocupações comuns mais nos parecem deveres do que missões propriamente ditas. A
missão, de acordo com a idéia a que esta palavra está associada, tem um caráter menos
exclusivo, de importância sobretudo menos pessoal. Deste ponto de vista, como se pode
reconhecer que um homem tem realmente na Terra uma determinada missão?
“Pelas grandes coisas que opera, pelos progressos a cuja realização conduz seus semelhantes.”
576. Foram predestinados a isso, antes de nascerem, os homens que trazem uma importante
missão e dela têm conhecimento?
“Algumas vezes, assim é. Quase sempre, porém, o ignoram. Baixando à Terra, colimam um vago
objetivo. Depois do nascimento e de acordo com as circunstâncias é que suas missões se lhes
desenham às vistas. Deus os impele para a senda onde devam executar-lhe os desígnios.”
577. Quando um homem faz alguma coisa útil fá-la sempre em virtude da missão em que foi
anteriormente investido e a que vem predestinado, ou pode suceder que haja recebido missão
não prevista?
“Nem tudo o que o homem faz resulta de missão a que tenha sido predestinado.
Amiudadas vezes é o instrumento de que se serve um Espírito para fazer que se execute uma
coisa que julga útil. Por exemplo, entende um Espírito ser útil que se escreva um livro, que ele
próprio escreveria se estivesse encarnado. Procura então o escritor mais apto a lhe compreender e
executar o pensamento. Transmite-lhe a idéia do livro e o dirige na execução. Ora, esse escritor
não veio à Terra com a missão de publicar tal obra. O mesmo ocorre com diversos trabalhos
artísticos e muitas descobertas. Devemos acrescentar que, durante o sono corporal, o Espírito
encarnado se comunica diretamente com o Espírito errante, entendendo-se os dois acerca da
execução.”
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578. Poderá o Espírito, por própria culpa, falir na sua missão?
“Sim, se não for um Espírito superior.”
a) - Que conseqüências lhe advirão da sua falência?
“Terá que retomar a tarefa; essa a sua punição. Também sofrerá as conseqüências do mal que
haja causado.”
579. Pois se é de Deus que o Espírito recebe a sua missão, como se há de compreender que
Deus confie missão importante e de interesse geral a um Espírito capaz de falir?
“Não sabe Deus se o seu general obterá a vitória ou se será vencido? Sabe-o, crede, e seus
planos, quando importantes, não se apóiam nos que hajam de abandonar em meio a obra. Toda a
questão, para vós, está no conhecimento que Deus tem do futuro, mas que não vos é concedido.”
580. O Espírito, que encarna para desempenhar determinada missão, tem apreensões idênticas
às de outro que o faz por provação?
“Não, porque traz a experiência adquirida.”
581. Certamente desempenha missão os homens que servem de faróis ao gênero humano, que o
iluminam com a luz do gênio. Entre eles, porém, alguns há que se enganam, que, de par com
grandes verdades, propagam grandes erros. Como se deve considerar a missão desses homens?
“Como falseadas por eles próprios. Estão abaixo da tarefa que tomaram sobre os ombros.
Contudo, mister se faz levar em conta as circunstâncias. Os homens de gênio têm que falar de
acordo com as épocas em que vivem e assim, um ensinamento que pareceu errôneo ou pueril,
numa época adiantada, pode ter sido o que convinha no século em que foi divulgado.”
582. Pode-se considerar como missão a paternidade?
“É, sem contestação possível, uma verdadeira missão. É ao mesmo tempo grandíssimo dever e
que envolve, mais do que o pensa o homem, a sua responsabilidade quanto ao futuro. Deus
colocou o filho sob a tutela dos pais, a fim de que estes o dirijam pela senda do bem, e lhes
facilitou a tarefa dando àquele uma organização débil e delicada, que o torna propício a todas as
impressões. Muitos há, no entanto, que mais cuidam de aprumar as árvores do seu jardim e de
fazê-las dar bons frutos em abundância, do que de formar o caráter de seu filho. Se este vier a
sucumbir por culpa deles, suportarão os desgostos resultantes dessa queda e partilharão dos
sofrimentos do filho na vida futura, por não terem feito o que lhes estava ao alcance para que ele
avançasse na estrada do bem.”
583. São responsáveis os pais pelo transviamento de um filho que envereda pelo caminho do
mal, apesar dos cuidados que lhe dispensaram?
“Não; porém, quanto piores forem as propensões do filho, tanto mais pesada é a tarefa e tanto
maior o mérito dos pais, se conseguirem desviá-lo do mau caminho.”
a) Se um filho se torna homem de bem, não obstante a negligência ou os maus exemplos de seus
pais, tiram estes daí algum proveito?
“Deus é justo.”
584. De que natureza será a missão do conquistador que apenas visa satisfazer à sua ambição e
que, para alcançar esse objetivo, não vacila ante nenhuma das calamidades que vai
espalhando?
“As mais das vezes não passa de um instrumento de que se serve Deus para cumprimento de seus
desígnios, representando essas calamidades um meio de que ele se utiliza para fazer que um povo
progrida mais rapidamente.”
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a) - Nenhuma parte tendo na produção do bem que dessas calamidades passageiras possa
resultar, pois que visava um fim todo pessoal, aquele que delas se constitui instrumento tirará,
não obstante, proveito desse bem?
“Cada um é recompensado de acordo com as suas obras, com o bem que intentou fazer e com a
retidão de suas intenções.”
Os Espíritos encarnados têm ocupações inerentes às suas existências corpóreas. No estado de
erraticidade, ou de desmaterialização, tais ocupações são adequadas ao grau de adiantamento
deles.
Uns percorrem os mundos, se ocupam com o progresso, dirigindo os acontecimentos e sugerindo
idéias que lhe sejam propícias. Assistem os homens de gênio que concorrem para o adiantamento
da Humanidade. Outros encarnam com determinada missão de progresso. Outros tomam sob sua
tutela os indivíduos, as famílias, as reuniões, as cidades e os povos, dos quais se constituem os
anjos guardiães, os gênios protetores e os Espíritos familiares. Outros, finalmente, presidem aos
fenômenos da Natureza, de que se fazem os agentes diretos. Os Espíritos vulgares se imiscuem
em nossas ocupações e diversões. Os impuros ou imperfeitos aguardam, em sofrimentos e
angústias, o momento em que praza a Deus proporcionar-lhes meios de se adiantarem. Se
praticam o mal, é pelo despeito de ainda não poderem gozar do bem.
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Perguntas 558 a 584.
2. Allan Kardec. O Céu e o Inferno. 1ª parte, capítulo 3, item 12 a 15.
27 de novembro de 2006
Relações do além-túmulo: (1ª parte)
278. Os Espíritos das diferentes ordens se acham misturados uns com os outros?
“Sim e não. Quer dizer: eles se vêem, mas se distinguem uns dos outros. Evitam-se ou se
aproximam, conforme à simpatia ou à antipatia que reciprocamente uns inspiram aos outros, tal
qual sucede entre vós. Constituem um mundo do qual o vosso é pálido reflexo.
Os da mesma categoria se reúnem por uma espécie de afinidade e formam grupos ou famílias,
unidos pelos laços da simpatia e pelos fins a que visam: os bons, pelo desejo de fazerem o bem;
os maus, pelo de fazerem o mal, pela vergonha de suas faltas e pela necessidade de se acharem
entre os que se lhes assemelham.”
Tal uma grande cidade onde os homens de todas as classes e de todas as condições se vêem e
encontram, sem se confundirem; onde as sociedades se formam pela analogia dos gostos; onde a
virtude e o vício se acotovelam, sem trocarem palavra.
279. Todos os Espíritos têm reciprocamente acesso aos diferentes grupos ou sociedades que eles
formam?
“Os bons vão a toda parte e assim deve ser, para que possam influir sobre os maus.
As regiões, porém, que os bons habitam estão interditadas aos Espíritos imperfeitos, a fim de que
não as perturbem com suas paixões inferiores.”
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282. Como se comunicam entre si os Espíritos?
“Eles se vêem e se compreendem. A palavra é material: é o reflexo do Espírito. O fluido
universal estabelece entre eles constante comunicação; é o veículo da transmissão de seus
pensamentos, como, para vós, o ar o é do som. É uma espécie de telégrafo universal, que liga
todos os mundos e permite que os Espíritos se correspondam de um mundo a outro.”
283. Podem os Espíritos, reciprocamente, dissimular seus pensamentos? Podem ocultar-se uns
dos outros?
“Não; para os Espíritos, tudo é patente, sobretudo para os perfeitos. Podem afastar-se uns dos
outros, mas sempre se vêem. Isto, porém, não constitui regra absoluta, porquanto certos Espíritos
podem muito bem tornar-se invisíveis a outros Espíritos, se julgarem útil fazê-lo.”
Almas gêmeas
291. Além da simpatia geral, oriunda da semelhança, há entre os Espíritos afeições
particulares?
“Do mesmo modo que os homens, sendo, porém, que mais forte é o laço que prende os Espíritos
uns aos outros, quando carentes de corpo material, porque então esse laço não se acha exposto às
vicissitudes das paixões.”
292. Alimentam ódio entre si os Espíritos?
“Só entre os Espíritos impuros há ódio e são eles que insuflam nos homens as inimizades e as
dissensões.”
293. Conservarão ressentimento um do outro, no mundo dos Espíritos, dois seres que foram
inimigos na Terra?
“Não; compreenderão que era estúpido o ódio que se votavam e pueril o motivo que o inspirava.
Apenas os Espíritos imperfeitos conservam uma espécie de animosidade, enquanto se não
purificam. Se foi unicamente um interesse material o que os inimizou, nisso não pensarão mais,
por pouco desmaterializados que estejam. Não havendo entre eles antipatia e tendo deixado de
existir a causa de suas desavenças, aproximam-se uns dos outros com prazer.”
Sucede como entre dois colegiais que, chegando à idade da ponderação reconhecem a
puerilidade de suas dissensões infantis e deixam de se malquerer.
294. A lembrança dos atos maus que dois homens praticaram um contra o outro constitui
obstáculo a que entre eles reine simpatia?
“Essa lembrança os induz a se afastarem um do outro.”
295. Que sentimento anima, depois da morte, aqueles a quem fizemos mal neste mundo?
“Se são bons, eles vos perdoam, segundo o vosso arrependimento. Se maus, é possível que
guardem ressentimento do mal que lhes fizestes e vos persigam até, não raro, em outra
existência. Deus pode permitir que assim seja, por castigo.”
296. São suscetíveis de alterar-se as afeições individuais dos Espíritos?
“Não, por não estarem eles sujeitos a enganar-se. Falta-lhes a máscara sob que se escondem os
hipócritas. Daí vem que, sendo puros, suas afeições são inalteráveis. Suprema felicidade lhes
advém do amor que os une.”
297. Continua a existir sempre, no mundo dos Espíritos, a afeição mútua que dois seres se
consagraram na Terra?
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“Sem dúvida, desde que originada de verdadeira simpatia. Se, porém, nasceu principalmente de
causas de ordem física, desaparece com a causa. As afeições entre os Espíritos são mais sólidas e
duráveis do que na Terra, porque não se acham subordinadas aos caprichos dos interesses
materiais e do amor-próprio.”
298. As almas que devam unir-se estão, desde suas origens, predestinadas a essa união e cada
um de nós tem, nalguma parte do Universo, sua metade, a que fatalmente um dia reunirá?
“Não; não há união particular e fatal, de duas almas. A união que há é a de todos os Espíritos,
mas em graus diversos, segundo a categoria que ocupam, isto é, segundo a perfeição que tenham
adquirido. Quanto mais perfeitos, tanto mais unidos. Da discórdia nascem todos os males dos
humanos; da concórdia resulta a completa felicidade.”
299. Em que sentido se deve entender a palavra metade, de que alguns Espíritos se servem para
designar os Espíritos simpáticos?
“A expressão é inexata. Se um Espírito fosse a metade do outro, separados os dois, estariam
ambos incompletos.”
300. Se dois Espíritos perfeitamente simpáticos se reunirem, estarão unidos para todo o sempre,
ou poderão separar-se e unir-se a outros Espíritos?
“Todos os Espíritos estão reciprocamente unidos. Falo dos que atingiram a perfeição. Nas esferas
inferiores, desde que um Espírito se eleva, já não simpatiza, como dantes, com os que lhe
ficaram abaixo.”
301. Dois Espíritos simpáticos são complemento um do outro, ou a simpatia entre eles existente
é resultado de identidade perfeita?
“A simpatia que atrai um Espírito para outro resulta da perfeita concordância de seus pendores e
instintos. Se um tivesse que completar o outro, perderia a sua individualidade.”
302. A identidade necessária à existência da simpatia perfeita apenas consiste na analogia dos
pensamentos e sentimentos, ou também na uniformidade dos conhecimentos adquiridos?
“Na igualdade dos graus da elevação.”
303. Podem tornar-se de futuro simpáticos, Espíritos que presentemente não o são?
“Todos o serão. Um Espírito, que hoje está numa esfera inferior, ascenderá, aperfeiçoando-se, à
em que se acha tal outro Espírito. E ainda mais depressa se dará o encontro dos dois, se o mais
elevado, por suportar mal as provas a que esteja submetido, permanecer estacionário.”
a) - Podem deixar de ser simpáticos um ao outro dois Espíritos que já o sejam?
“Certamente, se um deles for preguiçoso.”
A teoria das metades eternas encerra uma simples figura, representativa da união de dois
Espíritos simpáticos. Trata-se de uma expressão usada até na linguagem vulgar e que se não deve
tomar ao pé da letra. Não pertencem decerto a uma ordem elevada os Espíritos que a
empregaram. Necessariamente, limitado sendo o campo de suas idéias, exprimiram seus
pensamentos com os termos de que se teriam utilizado na vida corporal. Não se deve, pois,
aceitar a idéia de que, criados um para o outro, dois Espíritos tenham, fatalmente, que se reunir
um dia na eternidade, depois de haverem estado separados por tempo mais ou menos longo.
Nem sempre, as “almas gêmeas” encontram-se no mesmo plano evolutivo. No livro Diário dos
Invisíveis, de Zilda Gama, o Espírito Victor Hugo afirma que almas criadas na mesma era,
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iniciando úteis peregrinações em mundos primitivos, e, depois separadas em pontos diverso do
globo terrestre, conservam, umas das outras, reminiscências indeléveis.
As vezes, não se encontram em algumas de suas jornadas terrenas – quando uma delas comete
delitos graves e retarda o seu cinzelamento psíquico; outras há, porém, que logo nos primórdios
de uma existência, se reúnem e se reconhecem, fitando-se longamente, agrilhoadas, as vezes,
pelo afeto de íntimo parentesco, nascidas sob o mesmo teto.
Então, na voz dos entes que vivificam, recordam um timbre familiar e muito amado. Quando
compreendem que se revêm enfim, que os seus Espíritos foram germinados no mesmo instante,
perlustraram o mesmo carreiro, tornaram-se gêmeos pelos laços da afinidade – um júbilo intenso
irradia-se nos seus íntimos qual uma alvorada espancando bruscamente as travas de uma noite
que parecia intérmina ...
Sim, as trevas em que jaziam antes de se reverem, pois as almas isoladas, incompreendidas,
enquanto lhes falta a consocia que as deixou mutiladas, o lúcido fragmento que as integra por um
consórcio celeste – o Amor, o vínculo estelífero que as torna inseparáveis por toda consumação
dos séculos – ficam imersas em penumbra, asfixiadas em desalento, envoltas em brumas polares.
Em Renúncia, obra psicografada por Francisco Cândido Xavier, o Espírito Emmanuel conta-nos
a história da luminosa entidade espiritual Alcione, que se afasta, temporariamente, da elevada
esfera onde residia para, entre outras coisas, auxiliar sua alma gêmea Pólux, em quem, na luta
consigo mesmo, as paixões subalternas sempre saíam vencedoras em sinistros triunfos. Alcione
renasce no planeta Terra, oriunda de portentosa esfera, inconfundível em magnificência e
grandeza, em verdadeiros sacrifícios de amor.
Fonte de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Perg 291 a 303.
2. Francisco Cândido Xavier. O Consolador. Pelo Espírito Emmanuel. Questão 323, 325.
3. Francisco Cândido Xavier. Renúncia. Pelo Espírito Emmanuel.página 15, FEB 1985.
4. Zilda Gama. Diário dos Invisíveis. Almas Gêmeas. Página 129. Editora O pensamento,
1943.
04 de dezembro de 2006
Relações do além-túmulo: (2ª parte)
Amai os vossos inimigos
Retribuir o mal com o bem
1. Aprendestes que foi dito: “Amareis o vosso próximo e odiareis os vossos inimigos.” Eu,
porém, vos digo: “Amai os vossos inimigos; fazei o bem aos que vos odeiam e orai pelos que vos
perseguem e caluniam, a fim de serdes filhos do vosso Pai que está nos céus e que faz se levante
o Sol para os bons e para os maus e que chova sobre os justos e os injustos. - Porque, se só
amardes os que vos amam, qual será a vossa recompensa? Não procedem assim também os
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publicanos8? Se apenas os vossos irmãos saudardes, que é o que com isso fazeis mais do que os
outros? Não fazem outro tanto os pagãos?” (S. MATEUS, cap. V, vv. 43 a 47.)
- “Digo-vos que, se a vossa justiça não for mais abundante que a dos escribas e dos fariseus, não
entrareis no reino dos céus.”(S. MATEUS, cap. V, v. 20.)
2. “Se somente amardes os que vos amam, que mérito se vos reconhecerá, uma vez que as
pessoas de má vida também amam os que as amam? - Se o bem somente o fizerdes aos que vo-lo
fazem, que mérito se vos reconhecerá, dado que o mesmo faz a gente de má vida? - Se só
emprestardes àqueles de quem possais esperar o mesmo favor, que mérito se vos reconhecerá,
quando as pessoas de má vida se entreajudam dessa maneira, para auferir a mesma vantagem?
Pelo que vos toca, amai os vossos inimigos, fazei bem a todos e auxiliai sem esperar coisa
alguma. Então, muito grande será a vossa recompensa e sereis filhos do Altíssimo, que é bom
para os ingratos e até para os maus. - Sede, pois, cheios de misericórdia, como cheio de
misericórdia é o vosso Deus.” (S. LUCAS, cap. VI, v. 32 a 36.)
3. Se o amor do próximo constitui o princípio da caridade, amar os inimigos é a mais sublime
aplicação desse princípio, porquanto a posse de tal virtude representa uma das maiores vitórias
alcançadas contra o egoísmo e o orgulho. Entretanto, há geralmente equívoco no tocante ao
sentido da palavra amar, neste passo. Não pretendeu Jesus, assim falando, que cada um de nós
tenha para com o seu inimigo a ternura que dispensa a um irmão ou amigo. A ternura pressupõe
confiança; ora, ninguém pode depositar confiança numa pessoa, sabendo que esta lhe quer mal;
ninguém pode ter para com ela expansões de amizade, sabendo-a capaz de abusar dessa atitude.
Entre pessoas que desconfiam umas das outras, não pode haver essas manifestações de simpatia
que existem entre as que comungam nas mesmas idéias. Enfim, ninguém pode sentir, em estar
com um inimigo, prazer igual ao que sente na companhia de um amigo. A diversidade na
maneira de sentir, nessas duas circunstâncias diferentes, resulta mesmo de uma lei física: a da
assimilação e da repulsão dos fluidos. O pensamento malévolo determina uma corrente fluídica
que impressiona penosamente. O pensamento benévolo nos envolve num agradável eflúvio. Daí
a diferença das sensações que se experimenta à aproximação de um amigo ou de um inimigo.
Amar os inimigos não pode, pois, significar que não se deva estabelecer diferença alguma entre
eles e os amigos. Se este preceito parece de difícil prática, impossível mesmo, é apenas por
entender-se falsamente que ele manda se dê no coração, assim ao amigo, como ao inimigo, o
mesmo lugar. Uma vez que a pobreza da linguagem humana obriga a que nos sirvamos do
mesmo termo para exprimir matizes diversos de um sentimento, à razão cabe estabelecer as
diferenças, conforme aos casos.
Amar os inimigos não é, portanto, ter-lhes uma afeição que não está na natureza, visto que o
contacto de um inimigo nos faz bater o coração de modo muito diverso do seu bater, ao contacto
de um amigo. Amar os Inimigos é não lhes guardar ódio, nem rancor, nem desejos de vingança; é
perdoar-lhes, sem pensamento oculto e sem condições, o mal que nos causem; é não opor
nenhum obstáculo a reconciliação com eles; é desejar-lhes o bem e não o mal; é experimentar
8
Publicano – eram assim chamados, na antiga Roma, os cavalheiros arrendatários das taxas públicas, incluindo da
cobrança dos impostos e das rendas de toda espécie, quer em Roma mesma, quer em outras partes do império. (...)
Os riscos a que estavam sujeitos faziam que os olhos se fechassem para as riquezas que muitas vezes adquiriam e
que, da parte de alguns, eram frutos de exações e de lucros escandalosos. O nome publicano se estendeu mais tarde a
todos os que superintendiam os dinheiros públicos e aos agentes subalternos. Hoje, esse termo se emprega em
sentido pejorativo, para designar os financistas e os agentes pouco escrupulosos de negócios. Diz-se por vezes:
“Ávido como um publicano, rico como um publicano”, com referencia a riquezas de mau quilate.
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júbilo, em vez de pesar, com o bem que lhes advenha; é socorrê-los, em se apresentando ocasião;
é abster-se, quer por palavras, quer por atos, de tudo o que os possa prejudicar; é, finalmente,
retribuir-lhes sempre o mal com o bem, sem a intenção de os humilhar. Quem assim procede
preenche as condições do mandamento: Amai os vossos inimigos.
4. Amar os inimigos é, para o incrédulo, um contra-senso. Aquele para quem a vida presente é
tudo, vê no seu inimigo um ser nocivo, que lhe perturba o repouso e do qual unicamente a morte,
pensa ele, o pode livrar. Daí, o desejo de vingar-se. Nenhum interesse tem em perdoar, senão
para satisfazer o seu orgulho perante o mundo. Em certos casos, perdoar-lhe parece mesmo uma
fraqueza indigna de si. Se não se vingar, nem por isso deixará de conservar rancor e secreto
desejo de mal para o outro.
Para o crente e, sobretudo, para o espírita, muito diversa é a maneira de ver, porque suas vistas se
lançam sobre o passado e sobre o futuro, entre os quais a vida atual não passa de um simples
ponto. Sabe ele que, pela mesma destinação da Terra, deve esperar topar aí com homens maus e
perversos; que as maldades com que se defronta fazem parte das provas que lhe cumpre suportar
e o elevado ponto de vista em que se coloca lhe torna menos amargas as vicissitudes, quer
advenham dos homens, quer das coisas. Se não se queixa das provas, tampouco deve queixar-se
dos que lhe servem de instrumento.
Se, em vez de se queixar, agradece a Deus o experimentá-lo, deve também agradecer a mão que
lhe dá ensejo de demonstrar a sua paciência e a sua resignação. Esta idéia o dispõe
naturalmente ao perdão. Sente, além disso, que quanto mais generoso for. tanto mais se
engrandece aos seus próprios olhos e se põe fora do alcance dos dardos do seu inimigo.
O homem que no mundo ocupa elevada posição não se julga ofendido com os insultos daquele a
quem considera seu inferior. O mesmo se dá com o que, no mundo moral, se eleva acima da
humanidade material. Este compreende que o ódio e o rancor o aviltariam e rebaixariam. Ora,
para ser superior ao seu adversário, preciso é que tenha a alma maior, mais nobre, mais generosa
do que a desse último.
Os inimigos desencarnados
5. Ainda outros motivos tem o espírita para ser indulgente com os seus inimigos. Sabe ele,
primeiramente, que a maldade não é um estado permanente dos homens; que ela decorre de uma
imperfeição temporária e que, assim como a criança se corrige dos seus defeitos, o homem mau
reconhecerá um dia os seus erros e se tornará bom, Sabe também que a morte apenas o livra da
presença material do seu inimigo, pois que este o pode perseguir com o seu ódio, mesmo depois
de haver deixado a Terra; que, assim, a vingança, que tome, falha ao seu objetivo, visto que, ao
contrário, tem por efeito produzir maior irritação, capaz de passar de uma existência a outra.
Cabia ao Espiritismo demonstrar, por meio da experiência e da lei que rege as relações entre o
mundo visível e o mundo invisível, que a expressão: extinguir o ódio com o sangue é
radicalmente falsa, que a verdade é que o sangue alimenta o ódio, mesmo no além-túmulo.
Cabia-lhe, portanto, apresentar uma razão de ser positiva e uma utilidade prática ao perdão e ao
preceito do Cristo: Amai os vossos inimigos. Não há coração tão perverso que, mesmo a seu mau
grado, não se mostre sensível ao bom proceder. Mediante o bom procedimento, tira-se, pelo
menos, todo pretexto às represálias, podendo-se até fazer de um inimigo um amigo, antes e
depois de sua morte. Com um mau proceder, o homem irrita o seu inimigo, que então se
constitui instrumento de que a justiça de Deus se serve para punir aquele que não perdoou.
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6. Pode-se, portanto, contar inimigos assim entre os encarnados, como entre os desencarnados.
Os inimigos do mundo invisível manifestam sua malevolência pelas obsessões e subjugações
com que tanta gente se vê a braços e que representam um gênero de provações, as quais, como as
outras, concorrem para o adiantamento do ser, que, por isso; as deve receber com resignação e
como conseqüência da natureza inferior do globo terrestre. Se não houvesse homens maus na
Terra, não haveria Espíritos maus ao seu derredor. Se, conseguintemente, se deve usar de
benevolência com os inimigos encarnados, do mesmo modo se deve proceder com relação aos
que se acham desencarnados.
Outrora, sacrificavam-se vítimas sangrentas para aplacar os deuses infernais, que não eram senão
os maus Espíritos. Aos deuses infernais sucederam os demônios, que são a mesma coisa. O
Espiritismo demonstra que esses demônios não são mais do que as almas dos homens perversos,
que ainda se não despojaram dos instintos materiais; que ninguém logra aplacá-los, senão
mediante o sacrifício do ódio existente, isto é, pela caridade; que esta não tem por efeito,
unicamente, impedi-los de praticar o mal e, sim, também o de os reconduzir ao caminho do bem
e de contribuir para a salvação deles. E assim que o mandamento: Amai os vossos inimigos não
se circunscreve ao âmbito acanhado da Terra e da vida presente; antes, faz parte da grande lei da
solidariedade e da fraternidade universais.
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Capítulo 12: Amai os vossos
inimigos.
11 de dezembro de 2006
Escolha das provas
258. Quando na erraticidade, antes de começar nova existência corporal, tem o Espírito
consciência e previsão do que lhe sucederá no curso da vida terrena?
“Ele próprio escolhe o gênero de provas por que há de passar e nisso consiste o seu livrearbítrio.”
a) - Não é Deus, então, quem lhe impõe as tribulações da vida, como castigo?
“Nada ocorre sem a permissão de Deus, porquanto foi Deus quem estabeleceu todas as leis que
regem o Universo. Ide agora perguntar por que decretou Ele esta lei e não aquela. Dando ao
Espírito a liberdade de escolher, Deus lhe deixa a inteira responsabilidade de seus atos e das
conseqüências que estes tiverem. Nada lhe estorva o futuro; abertos se lhe acham, assim, o
caminho do bem, como o do mal. Se vier a sucumbir, restar-lhe-á a consolação de que nem tudo
se lhe acabou e que a bondade divina lhe concede a liberdade de recomeçar o que foi mal feito.
Demais, cumpre se distinga o que é obra da vontade de Deus do que o é da do homem. Se um
perigo vos ameaça, não fostes vós quem o criou e sim Deus. Vosso, porém, foi o desejo de a ele
vos expordes, por haverdes visto nisso um meio de progredirdes, e Deus o permitiu.”
259. Do fato de pertencer ao Espírito a escolha do gênero de provas que deva sofrer, seguir-seá que todas as tribulações que experimentamos na vida nós as previmos e buscamos?
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“Todas, não, porque não escolhestes e previstes tudo o que vos sucede no mundo, até às mínimas
coisas. Escolhestes apenas o gênero das provações. As particularidades correm por conta da
posição em que vos achais; são, muitas vezes, conseqüências das vossas próprias ações.
Escolhendo, por exemplo, nascer entre malfeitores, sabia o Espírito a que arrastamentos se
expunha; ignorava, porém, quais os atos que viria a praticar. Esses atos resultam do exercício da
sua vontade, ou do seu livre-arbítrio. Sabe o Espírito que, escolhendo tal caminho, terá que
sustentar lutas de determinada espécie; sabe, portanto, de que natureza serão as vicissitudes que
se lhe depararão, mas ignora se se verificará este ou aquele êxito. Os acontecimentos secundários
se originam das circunstâncias e da força mesma das coisas. Previstos só são os fatos principais,
os que influem no destino. Se tomares uma estrada cheia de sulcos profundos, sabes que terás de
andar cautelosamente, porque há muitas probabilidades de caíres; ignoras, contudo, em que
ponto cairás e bem pode suceder que não caias, se fores bastante prudente. Se, ao percorreres
uma rua, uma telha te cair na cabeça, não creias que estava escrito, segundo vulgarmente se diz.”
260. Como pode o Espírito desejar nascer entre gente de má vida? “Forçoso é que seja posto
num meio onde possa sofrer a prova que pediu. Pois bem!
É necessário que haja analogia. Para lutar contra o instinto do roubo, preciso é que se ache em
contacto com gente dada à prática de roubar.”
a) - Assim, se não houvesse na Terra gente de maus costumes, o Espírito não encontraria aí
meio apropriado ao sofrimento de certas provas?
“E seria isso de lastimar-se? É o que ocorre nos mundos superiores, onde o mal não penetra. Eis
por que nesses mundos, só há Espíritos bons. Fazei que em breve o mesmo se dê na Terra.”
261. Nas provações por que lhe cumpre passar para atingir a perfeição, tem o Espírito que
sofrer tentações de todas as naturezas? Tem que se achar em todas as circunstâncias que
possam excitar-lhe o orgulho, a inveja, a avareza, a sensualidade, etc.?
“Certo que não, pois bem sabeis haver Espíritos que desde o começo tomam um caminho que os
exime de muitas provas. Aquele, porém, que se deixa arrastar para o mau caminho, corre todos
os perigos que o inçam. Pode um Espírito, por exemplo, pedir a riqueza e ser-lhe esta concedida.
Então, conforme o seu caráter, poderá tornar-se avaro ou pródigo, egoísta ou generoso, ou ainda
lançar-se a todos os gozos da sensualidade. Daí não se segue, entretanto, que haja de
forçosamente passar por todas estas tendências.”
262. Como pode o Espírito, que, em sua origem, é simples, ignorante e carecido de experiência,
escolher uma existência com conhecimento de causa e ser responsável por essa escolha?
“Deus lhe supre a inexperiência, traçando-lhe o caminho que deve seguir, como fazeis com a
criancinha. Deixa-o, porém, pouco a pouco, à medida que o seu livre-arbítrio se desenvolve,
senhor de proceder à escolha e só então é que muitas vezes lhe acontece extraviar-se, tomando o
mau caminho, por desatender os conselhos dos bons Espíritos. A isso é que se pode chamar a
queda do homem.”
a) - Quando o Espírito goza do livre-arbítrio, a escolha da existência corporal dependerá
sempre exclusivamente de sua vontade, ou essa existência lhe pode ser imposta, como expiação,
pela vontade de Deus?
“Deus sabe esperar, não apressa a expiação. Todavia, pode impor certa existência a um Espírito,
quando este, pela sua inferioridade ou má-vontade, não se mostra apto a compreender o que lhe
seria mais útil, e quando vê que tal existência servirá para a purificação e o progresso do
Espírito, ao mesmo tempo que lhe sirva de expiação.”
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263. O Espírito faz a sua escolha logo depois da morte?
“Não, muitos acreditam na eternidade das penas, o que, como já se vos disse, é um castigo.”
264. Que é o que dirige o Espírito na escolha das provas que queira sofrer?
“Ele escolhe, de acordo com a natureza de suas faltas, as que o levem à expiação destas e a
progredir mais depressa. Uns, portanto, impõem a si mesmos uma vida de misérias e privações,
objetivando suportá-las com coragem; outros preferem experimentar as tentações da riqueza e do
poder, muito mais perigosas, pelos abusos e má aplicação a que podem dar lugar, pelas paixões
inferiores que uma e outros desenvolvem; muitos, finalmente, se decidem a experimentar suas
forças nas lutas que terão de sustentar em contacto com o vício.”
265. Havendo Espíritos que, por provação, escolhem o contacto do vício, outros não haverá que
o busquem por simpatia e pelo desejo de viverem num meio conforme aos seus gostos, ou para
poderem entregar-se materialmente a seus pendores materiais?
“Há, sem dúvida, mas tão-somente entre aqueles cujo senso moral ainda está pouco
desenvolvido. A prova vem por si mesma e eles a sofrem mais demoradamente. Cedo ou tarde,
compreendem que a satisfação de suas paixões brutais lhes acarretou deploráveis conseqüências,
que eles sofrerão durante um tempo que lhes parecerá eterno. E Deus os deixará nessa persuasão,
até que se tornem conscientes da falta em que incorreram e peçam, por impulso próprio, lhes seja
concedido resgatá-la, mediante úteis provações.”
266. Não parece natural que se escolham as provas menos dolorosas?
“Pode parecer-vos a vós; ao Espírito, não. Logo que este se desliga da matéria, cessa toda ilusão
e outra passa a ser a sua maneira de pensar.” Sob a influência das idéias carnais, o homem, na
Terra, só vê das provas o lado penoso. Tal a razão de lhe parecer natural sejam escolhidas as que,
do seu ponto de vista, podem coexistir com os gozos materiais. Na vida espiritual, porém,
compara esses gozos fugazes e grosseiros com a inalterável felicidade que lhe é dado entrever e
desde logo nenhuma impressão mais lhe causam os passageiros sofrimentos terrenos. Assim,
pois, o Espírito pode escolher prova muito rude e, conseguintemente, uma angustiada existência,
na esperança de alcançar depressa um estado melhor, como o doente escolhe muitas vezes o
remédio mais desagradável para se curar de pronto. Aquele que intenta ligar seu nome à
descoberta de um país desconhecido não procura trilhar estrada florida. Conhece os perigos a que
se arrisca, mas também sabe que o espera a glória, se lograr bom êxito.
A doutrina da liberdade que temos de escolher as nossas existências e as provas que devamos
sofrer deixa de parecer singular, desde que se atenda a que os Espíritos, uma vez desprendidos da
matéria, apreciam as coisas de modo diverso da nossa maneira de apreciálos.
Divisam a meta, que bem diferente é para eles dos gozos fugitivos do mundo. Após cada
existência, vêem o passo que deram e compreendem o que ainda lhes falta em pureza para
atingirem aquela meta. Daí o se submeterem voluntariamente a todas as vicissitudes da vida
corpórea, solicitando as que possam fazer que a alcancem mais presto. Não há, pois, motivo de
espanto no fato de o Espírito não preferir a existência mais suave. Não lhe é possível, no estado
de imperfeição em que se encontra, gozar de uma vida isenta de amarguras. Ele o percebe e,
precisamente para chegar a fruí-la, é que trata de se melhorar.
Não vemos, aliás, todos os dias, exemplos de escolhas tais? Que faz o homem que passa uma
parte de sua vida a trabalhar sem trégua, nem descanso, para reunir haveres que lhe assegurem o
bem-estar, senão desempenhar uma tarefa que a si mesmo se impôs, tendo em vista melhor
futuro? O militar que se oferece para uma perigosa missão, o navegante que afronta não menores
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perigos, por amor da Ciência ou no seu próprio interesse, que fazem, também eles, senão
sujeitar-se a provas voluntárias, de que lhes advirão honras e proveito, se não sucumbirem? A
que se não submete ou expõe o homem pelo seu interesse ou pela sua glória? E os concursos não
são também todos provas voluntárias a que os concorrentes se sujeitam, com o fito de avançarem
na carreira que escolheram? Ninguém galga qualquer posição nas ciências, nas artes, na
indústria, senão passando pela série das posições inferiores, que são outras tantas provas. A vida
humana é, pois, cópia da vida espiritual; nela se nos deparam em ponto pequeno todas as
peripécias da outra. Ora, se na vida terrena muitas vezes escolhemos duras provas, visando
posição mais elevada, por que não haveria o Espírito, que enxerga mais longe que o corpo e para
quem a vida corporal é apenas incidente de curta duração, de escolher uma existência árdua e
laboriosa, desde que o conduza à felicidade eterna? Os que dizem que pedirão para ser príncipes
ou milionários, uma vez que ao homem é que caiba escolher a sua existência, se assemelham aos
míopes, que apenas vêem aquilo em que tocam, ou a meninos gulosos, que, a quem os interroga
sobre isso, respondem que desejam ser pasteleiros ou doceiros.
O viajante que atravessa profundo vale ensombrado por espesso nevoeiro não logra apanhar com
a vista a extensão da estrada por onde vai, nem os seus pontos extremos.
Chegando, porém, ao cume da montanha, abrange com o olhar quanto percorreu do caminho e
quanto lhe resta dele a percorrer. Divisa-lhe o termo, vê os obstáculos que ainda terá de transpor
e combina então os meios mais seguros de atingi-lo. O Espírito encarnado é qual viajante no
sopé da montanha. Desenleado dos liames terrenais, sua visão tudo domina, como a daquele que
subiu à crista da serrania. Para o viajor, no termo da sua jornada está o repouso após a fadiga;
para o Espírito, está a felicidade suprema, após as tribulações e as provas.
Dizem todos os Espíritos que, na erraticidade, eles se aplicam a pesquisar, estudar, observar, a
fim de fazerem a sua escolha. Na vida corporal não se nos oferece um exemplo deste fato? Não
levamos, freqüentemente, anos a procurar a carreira pela qual afinal nos decidimos, certos de ser
a mais apropriada a nos facilitar o caminho da vida? Se numa o nosso intento se malogra,
recorremos a outra. Cada uma das que abraçamos representa uma fase, um período da vida. Não
nos ocupamos cada dia em cogitar do que faremos no dia seguinte? Ora, que são, para o Espírito
as diversas existências corporais, senão fases, períodos, dias da sua vida espírita, que é, como
sabemos, a vida normal, visto que a outra é transitória, passageira?
267. Pode o Espírito proceder à escolha de suas provas, enquanto encarnado?
“O desejo que então alimenta pode influir na escolha que venha a fazer, dependendo isso da
intenção que o anime. Dá-se, porém, que, como Espírito livre, quase sempre vê as coisas de
modo diferente. O Espírito por si só é quem faz a escolha; entretanto, ainda uma vez o dizemos,
possível lhe é fazê-la, mesmo na vida material, por isso que há sempre momentos em que o
Espírito se torna independente da matéria que lhe serve de habitação.”
a) - Não é decerto como expiação, ou como prova, que muita gente deseja as grandezas e as
riquezas. Será?
“Indubitavelmente, não. A matéria deseja essa grandeza para gozá-la e o Espírito para conhecerlhe as vicissitudes.”
268. Até que chegue ao estado de pureza perfeita, tem o Espírito que passar constantemente por
provas?
“Sim, mas que não são como o entendeis, pois que só considerais provas as tribulações materiais.
Ora, havendo-se elevado a um certo grau, o Espírito, embora não seja ainda perfeito, já não tem
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que sofrer provas. Continua, porém, sujeito a deveres nada penosos, cuja satisfação lhe auxilia o
aperfeiçoamento, mesmo que consistam apenas em auxiliar os outros a se aperfeiçoarem.”
269. Pode o Espírito enganar-se quanto à eficiência da prova que escolheu?
“Pode escolher uma que esteja acima de suas forças e sucumbir. Pode também escolher alguma
que nada lhe aproveite, como sucederá se buscar vida ociosa e inútil. Mas, então, voltando ao
mundo dos Espíritos, verifica que nada ganhou e pede outra que lhe faculte recuperar o tempo
perdido.”
270. A que se devem atribuir as vocações de certas pessoas e a vontade que sentem de seguir
uma carreira de preferência a outra?
“Parece-me que vós mesmos podeis responder a esta pergunta. Pois não é isso a conseqüência de
tudo o que acabamos de dizer sobre a escolha das provas e sobre o progresso efetuado em
existência anterior?”
271. Estudando, na erraticidade, as diversas condições em que poderá progredir, como pensa o
Espírito conseguí-lo, nascendo, por exemplo, entre canibais?
“Entre canibais não nascem Espíritos já adiantados, mas Espíritos da natureza dos canibais, ou
ainda inferiores aos destes.”
Sabemos que os nossos antropólogos não se acham no último degrau da escala espiritual e que
mundos há onde a bruteza e a ferocidade não têm analogia na Terra. Os Espíritos que aí
encarnam são, portanto, inferiores aos mais ínfimos que no nosso mundo encarnam. Para eles,
pois, nascer entre os nossos selvagens representa um progresso, como progresso seria, para os
antropófagos terrenos, exercerem entre nós uma profissão que os obrigasse a fazer correr sangue.
Não podem pôr mais alto suas vistas, porque sua inferioridade moral não lhes permite
compreender maior progresso. O Espírito só gradativamente avança. Não lhe é dado transpor de
um salto a distância que da civilização separa a barbárie e é esta uma das razões que nos
mostram ser necessária a reencarnação, que verdadeiramente corresponde à justiça de Deus. De
outro modo, que seria desses milhões de criaturas que todos os dias morrem na maior
degradação, se não tivessem meios de alcançar a superioridade? Por que os privaria Deus dos
favores concedidos aos outros homens?
272. Poderá dar-se que Espíritos vindos de um mundo inferior à Terra, ou de um povo muito
atrasado, como os canibais, por exemplo, nasçam no seio de povos civilizados?
“Pode. Alguns há que se extraviam, por quererem subir muito alto. Mas, nesse caso, ficam
deslocados no meio em que nasceram, por estarem seus costumes e instintos em conflito com os
dos outros homens.”
Tais seres nos oferecem o triste espetáculo da ferocidade dentro da civilização. Voltando para o
meio dos canibais, não sofrem uma degradação; apenas volvem ao lugar que lhes é próprio e
com isso talvez até ganhem.
273. Será possível que um homem de raça civilizada reencarne, por exemplo, numa raça de
selvagens?
“É; mas depende do gênero da expiação. Um senhor, que tenha sido de grande crueldade para os
seus escravos, poderá, por sua vez, tornar-se escravo e sofrer os maus tratos que infligiu a seus
semelhantes. Um, que em certa época exerceu o mando, pode, em nova existência, ter que
obedecer aos que se curvaram ante a sua vontade. Ser-lhe-á isso uma expiação, que Deus lhe
imponha, se ele abusou do seu poder. Também um bom Espírito pode querer encarnar no seio
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daquelas raças, ocupando posição influente, para fazê-las progredir. Em tal caso, desempenha
uma missão.”
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Da vida Eterna. Perguntas 258 a 273.
2. Francisco Cândido Xavier. Os Mensageiros. Pelo Espírito de Emmanuel. A queda de
Otávio, págs 41-46; O desastre de Acelino, págs 47-51; A experiência de Joel, págs 5761; Belarmino, págs 62-66; A Palavra de Monteiro, págs 67-71.
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5. Retorno à vida espiritual
5.1 A alma após a morte: separação da alma e do corpo
O PASSAMENTO
1. - A certeza da vida futura não exclui as apreensões quanto à passagem desta para a outra vida.
Há muita gente que teme não a morte, em si, mas o momento da transição. Sofremos ou não
nessa passagem? Por isso se inquietam, e com razão, visto que ninguém foge à lei fatal dessa
transição. Podemos dispensar-nos de uma viagem neste mundo, menos essa. Ricos e pobres,
devem todos fazê-la, e, por dolorosa que seja a franquia, nem posição nem fortuna poderiam
suavizá-la
2. - Vendo-se a calma de alguns moribundos e as convulsões terríveis de outros, pode-se
previamente julgar que as sensações experimentadas nem sempre são as mesmas. Quem poderá
no entanto esclarecer-nos a tal respeito? Quem nos descreverá o fenômeno fisiológico da
separação entre a alma e o corpo? Quem nos contará as impressões desse instante supremo
quando a Ciência e a Religião se calam? E calam-se porque lhes falta o conhecimento das leis
que regem as relações do Espírito e da matéria, parando uma nos umbrais da vida espiritual e a
outra nos da vida material. O Espiritismo é o traço de união entre as duas, e só ele pode dizer-nos
como se opera a transição, quer pelas noções mais positivas da natureza da alma, quer pela
descrição dos que deixaram este mundo. O conhecimento do laço fluídico que une a alma ao
corpo é a chave desse e de muitos outros fenômenos.
3. - A insensibilidade da matéria inerte é um fato, e só a alma experimenta sensações de dor e de
prazer. Durante a vida, toda a desagregação material repercute na alma, que por este motivo
recebe uma impressão mais ou menos dolorosa. É a alma e não o corpo quem sofre, pois este não
é mais que instrumento da dor: - aquela é o paciente. Após a morte, separada a alma, o corpo
pode ser impunemente mutilado que nada sentirá; aquela, por insulada, nada experimenta da
destruição orgânica. A alma tem sensações próprias cuja fonte não reside na matéria tangível. O
perispírito é o envoltório da alma e não se separa dela nem antes nem depois da morte. Ele não
forma com ela mais que uma só entidade, e nem mesmo se pode conceber uma sem outro.
Durante a vida o fluido perispirítico penetra o corpo em todas as suas partes e serve de veículo às
sensações físicas da alma, do mesmo modo como esta, por seu intermédio, atua sobre o corpo e
dirige-lhe os movimentos.
4. - A extinção da vida orgânica acarreta a separação da alma em conseqüência do rompimento
do laço fluídico que a une ao corpo, mas essa separação nunca é brusca.
O fluido perispiritual só pouco a pouco se desprende de todos os órgãos, de sorte que a separação
só é completa e absoluta quando não mais reste um átomo do perispírito ligado a uma molécula
do corpo. "A sensação dolorosa da alma, por ocasião da morte, está na razão direta da soma dos
pontos de contacto existentes entre o corpo e o perispírito, e, por conseguinte, também da maior
ou menor dificuldade que apresenta o rompimento." Não é preciso portanto dizer que, conforme
as circunstâncias, a morte pode ser mais ou menos penosa. Estas circunstâncias é que nos cumpre
examinar.
5. - Estabeleçamos em primeiro lugar, e como princípio, os quatro seguintes casos, que podemos
reputar situações extremas dentro de cujos limites há uma infinidade de variantes:
1° - Se no momento em que se extingue a vida orgânica o desprendimento do perispírito fosse
completo, a alma nada sentiria absolutamente.
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2° - Se nesse momento a coesão dos dois elementos estiver no auge de sua força, produz-se uma
espécie de ruptura que reage dolorosamente sobre a alma.
3° - Se a coesão for fraca, a separação torna-se fácil e opera-se sem abalo.
4° - Se após a cessação completa da vida orgânica existirem ainda numerosos pontos de contacto
entre o corpo e o perispírito, a alma poderá ressentir-se dos efeitos da decomposição do corpo,
até que o laço inteiramente se desfaça.
Daí resulta que o sofrimento, que acompanha a morte, está subordinado à força adesiva que une
o corpo ao perispírito; que tudo o que puder atenuar essa força, e acelerar a rapidez do
desprendimento, torna a passagem menos penosa; e, finalmente, que, se o desprendimento se
operar sem dificuldade, a alma deixará de experimentar qualquer sentimento desagradável.
7. - O último alento quase nunca é doloroso, uma vez que ordinariamente ocorre em momento de
inconsciência, mas a alma sofre antes dele a desagregação da matéria, nos estertores da agonia, e,
depois, as angústias da perturbação. Demo-nos pressa em afirmar que esse estado não é geral,
porquanto a intensidade e duração do sofrimento estão na razão direta da afinidade existente
entre corpo e perispírito. Assim, quanto maior for essa afinidade, tanto mais penosos e
prolongados serão os esforços da alma para desprender-se. Há pessoas nas quais a coesão é tão
fraca que o desprendimento se opera por si mesmo, como que naturalmente; é como se um fruto
maduro se desprendesse do seu caule, e é o caso das mortes calmas, de pacífico despertar.
8. - A causa principal da maior ou menor facilidade de desprendimento é o estado moral da alma.
A afinidade entre o corpo e o perispírito é proporcional ao apego à matéria, que atinge o seu
máximo no homem cujas preocupações dizem respeito exclusiva e unicamente à vida e gozos
materiais. Ao contrário, nas almas puras, que antecipadamente se identificam com a vida
espiritual, o apego é quase nulo. E desde que a lentidão e a dificuldade do desprendimento estão
na razão do grau de pureza e desmaterialização da alma, de nós somente depende o tornar fácil
ou penoso, agradável ou doloroso, esse desprendimento.
Posto isto, quer como teoria, quer como resultado de observações, resta-nos examinar a
influência do gênero de morte sobre as sensações da alma nos últimos transes.
9. - Em se tratando de morte natural resultante da extinção das forças vitais por velhice ou
doença, o desprendimento opera-se gradualmente; para o homem cuja alma se desmaterializou e
cujos pensamentos se destacam das coisas terrenas, o desprendimento quase se completa antes da
morte real, isto é, ao passo que o corpo ainda tem vida orgânica, já o Espírito penetra a vida
espiritual, apenas ligado por elo tão frágil que se rompe com a última pancada do coração. Nesta
contingência o Espírito pode ter já recuperado a sua lucidez, de molde a tornar-se testemunha
consciente da extinção da vida do corpo, considerando-se feliz por tê-lo deixado. Para esse a
perturbação é quase nula, ou antes, não passa de ligeiro sono calmo, do qual desperta com
indizível impressão de esperança e ventura.
No homem materializado e sensual, que mais viveu do corpo que do Espírito, e para o qual a
vida espiritual nada significa, nem sequer lhe toca o pensamento, tudo contribui para estreitar os
laços materiais, e, quando a morte se aproxima, o desprendimento, conquanto se opere
gradualmente também, demanda contínuos esforços. As convulsões da agonia são indícios da
luta do Espírito, que às vezes procura romper os elos resistentes, e outras se agarra ao corpo do
qual uma força irresistível o arrebata com violência, molécula por molécula.
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10. - Quanto menos vê o Espírito além da vida corporal, tanto mais se lhe apega, e, assim, sente
que ela lhe foge e quer retê-la; em vez de se abandonar ao movimento que o empolga, resiste
com todas as forças e pode mesmo prolongar a luta por dias, semanas e meses inteiros.
Certo, nesse momento o Espírito não possui toda a lucidez, visto como a perturbação de muito se
antecipou à morte; mas nem por isso sofre menos, e o vácuo em que se acha, e a incerteza do que
lhe sucederá, agravam-lhe as angústias. Dá-se por fim a morte, e nem por isso está tudo
terminado; a perturbação continua, ele sente que vive, mas não define se material, se
espiritualmente, luta, e luta ainda, até que as últimas ligações do perispírito se tenham de todo
rompido. A morte pôs termo a moléstia efetiva, porém, não lhe sustou as conseqüências, e,
enquanto existirem pontos de contacto do perispírito com o corpo, o Espírito ressente-se e sofre
com as suas impressões.
11. - Quão diversa é a situação do Espírito desmaterializado, mesmo nas enfermidades mais
cruéis! Sendo frágeis os laços fluídicos que o prendem ao corpo, rompem-se suavemente; depois,
a confiança do futuro entrevisto em pensamento ou na realidade, como sucede algumas vezes, fálo encarar a morte qual redenção e as suas conseqüências como prova, advindo-lhe dai uma
calma resignada, que lhe ameniza o sofrimento.
Após a morte, rotos os laços, nem uma só reação dolorosa que o afete; o despertar é lépido,
desembaraçado; por sensações únicas: o alívio, a alegria!
12. - Na morte violenta as sensações não são precisamente as mesmas. Nenhuma desagregação
inicial há começado previamente a separação do perispírito; a vida orgânica em plena
exuberância de força é subitamente aniquilada. Nestas condições, o desprendimento só começa
depois da morte e não pode completar-se rapidamente. O Espírito, colhido de improviso, fica
como que aturdido e sente, e pensa, e acredita-se vivo, prolongando-se esta ilusão até que
compreenda o seu estado. Este estado intermediário entre a vida corporal e a espiritual é dos
mais interessantes para ser estudado, porque apresenta o espetáculo singular de um Espírito que
julga material o seu corpo fluídico, experimentando ao mesmo tempo todas as sensações da vida
orgânica. Há, além disso, dentro desse caso, uma série infinita de modalidades que variam
segundo os conhecimentos e progressos morais do Espírito. Para aqueles cuja alma está
purificada, a situação pouco dura, porque já possuem em si como que um desprendimento
antecipado, cujo termo a morte mais súbita não faz senão apressar. Outros há, para os quais a
situação se prolonga por anos inteiros. É uma situação essa muito freqüente até nos casos de
morte comum, que nada tendo de penosa para Espíritos adiantados, se torna horrível para os
atrasados. No suicida, principalmente, excede a toda expectativa. Preso ao corpo por todas as
suas fibras, o perispírito faz repercutir na alma todas as sensações daquele, com sofrimentos
cruciantes.
13. - O estado do Espírito por ocasião da morte pode ser assim resumido: Tanto maior é o
sofrimento, quanto mais lento for o desprendimento do perispírito; a presteza deste
desprendimento está na razão direta do adiantamento moral do Espírito; para o Espírito
desmaterializado, de consciência pura, a morte é qual um sono breve, isento de agonia, e cujo
despertar é suavíssimo.
14. - Para que cada qual trabalhe na sua purificação, reprima as más tendências e domine as
paixões, preciso se faz que abdique das vantagens imediatas em prol do futuro, visto como, para
identificar-se com a vida espiritual, encaminhando para ela todas as aspirações e preferindo-a à
vida terrena, não basta crer, mas compreender.
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Devemos considerar essa vida debaixo de um ponto de vista que satisfaça ao mesmo tempo à
razão, à lógica, ao bom senso e ao conceito em que temos a grandeza, a bondade e a justiça de
Deus. Considerado deste ponto de vista, o Espiritismo, pela fé inabalável que proporciona, é, de
quantas doutrinas filosóficas que conhecemos, a que exerce mais poderosa influência.
O espírita sério não se limita a crer, porque compreende, e compreende, porque raciocina; a vida
futura é uma realidade que se desenrola incessantemente a seus olhos; uma realidade que ele toca
e vê, por assim dizer, a cada passo e de modo que a dúvida não pode empolgá-lo, ou ter guarida
em sua alma. A vida corporal, tão limitada, amesquinha-se diante da vida espiritual, da
verdadeira vida. Que lhe importam os incidentes da jornada se ele compreende a causa e
utilidade das vicissitudes humanas, quando suportadas com resignação? A alma eleva-se-lhe nas
relações com o mundo visível; os laços fluídicos que o ligam à matéria enfraquecem-se,
operando-se por antecipação um desprendimento parcial que facilita a passagem para a outra
vida. A perturbação conseqüente à transição pouco perdura, porque, uma vez franqueado o
passo, para logo se reconhece, nada estranhando, antes compreendendo, a sua nova situação.
15. - Com certeza não é só o Espiritismo que nos assegura tão auspicioso resultado, nem ele tem
a pretensão de ser o meio exclusivo, a garantia única de salvação para as almas. Força é
confessar, porém, que pelos conhecimentos que fornece, pelos sentimentos que inspira, como
pelas disposições em que coloca o Espírito, fazendo-lhe compreender a necessidade de melhorarse, facilita enormemente a salvação. Ele dá a mais, e a cada um, os meios de auxiliar o
desprendimento doutros Espíritos ao deixarem o invólucro material, abreviando-lhes a
perturbação pela evocação e pela prece. Pela prece sincera, que é uma magnetização espiritual,
provoca-se a desagregação mais rápida do fluido perispiritual; pela evocação conduzida com
sabedoria e prudência, com palavras de benevolência e conforto, combate-se o entorpecimento
do Espírito, ajudando-o a reconhecer-se mais cedo, e, se é sofredor, incute-se-lhe o
arrependimento - único meio de abreviar seus sofrimentos9.
Separação da alma e do corpo
154. É dolorosa a separação da alma e do corpo?
9
Os exemplos que vamos transcrever mostram-nos os Espíritos nas diferentes fases de felicidade e infelicidade da
vida espiritual. Não fomos procurá-los nas personagens mais ou menos ilustres da antigüidade, cuja situação pudera
ter mudado consideravelmente depois da existência que lhes conhecemos, e que por isto não oferecessem provas
suficientes de autenticidade. Ao contrário, tomamos esses exemplos nas circunstâncias mais ordinárias da vida
contemporânea, uma vez que assim pode cada qual encontrar mais similitudes e tirar, pela comparação, as mais
proveitosas instruções. Quanto mais próxima de nós está a existência terrestre dos Espíritos - quer pela posição
social, quer por laços de parentesco ou de meras relações - tanto mais nos interessamos por eles, tornando-se fácil
averiguar-lhes a identidade. As posições vulgares são as mais comuns, as de maior número, podendo cada qual
aplicá-las em si, de modo a tornarem-se úteis, ao passo que as posições excepcionais comovem menos, porque saem
da esfera dos nossos hábitos. Não foram, pois, as sumidades que procuramos, e se nesses exemplos se encontram
quaisquer personagens conhecidas, de obscuras se compõe o maior número. Acresce que nomes retumbantes nada
adiantariam à instrução que visamos, podendo ainda ferir suscetibilidades. E nós não nos dirigimos nem aos
curiosos, nem aos amadores de escândalos, mas tão-somente aos que pretendem instruir-se.
Esses exemplos poderiam ser multiplicados infinitamente, porém, forçados a limitar-lhes o número, fizemos escolha
dos que pudessem melhor esclarecer o mundo espiritual e o seu estado, já pela situação dos Espíritos, já pelas
explicações que estavam no caso de fornecer. A maior parte destes exemplos está inédita, e apenas alguns, poucos,
foram já publicados na Revue Spirite. Destes, suprimimos supérfluas minúcias, conservando apenas o essencial ao
fim que nos propusemos, ajustando-lhes as instruções complementares a que poderão dar lugar ulteriormente.
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“Não; o corpo quase sempre sofre mais durante a vida do que no momento da morte; a alma
nenhuma parte toma nisso. Os sofrimentos que algumas vezes se experimentam no instante da
morte são um gozo para o Espírito, que vê chegar o termo do seu exílio.”
Na morte natural, a que sobrevém pelo esgotamento dos órgãos, em conseqüência da idade, o
homem deixa a vida sem o perceber: é uma lâmpada que se apaga por falta de óleo.
155. Como se opera a separação da alma e do corpo?
“Rotos os laços que a retinham, ela se desprende.”
a) - A separação se dá instantaneamente por brusca transição? Haverá alguma linha de
demarcação nitidamente traçada entre a vida e a morte?
“Não; a alma se desprende gradualmente, não se escapa como um pássaro cativo a que se restitua
subitamente a liberdade. Aqueles dois estados se tocam e confundem, de sorte que o Espírito se
solta pouco a pouco dos laços que o prendiam. Estes laços se desatam, não se quebram.”
Durante a vida, o Espírito se acha preso ao corpo pelo seu envoltório semimaterial ou perispírito.
A morte é a destruição do corpo somente, não a desse outro invólucro, que do corpo se separa
quando cessa neste a vida orgânica. A observação demonstra que, no instante da morte, o
desprendimento do perispírito não se completa subitamente; que, ao contrário, se opera
gradualmente e com uma lentidão muito variável conforme os indivíduos. Em uns é bastante
rápido, podendo dizer-se que o momento da morte é mais ou menos o da libertação. Em outros,
naqueles sobretudo cuja vida toda material e sensual, o desprendimento é muito menos rápido,
durando algumas vezes dias, semanas e até meses, o que não implica existir, no corpo, a menor
vitalidade, nem a possibilidade de volver à vida, mas uma simples afinidade com o Espírito,
afinidade que guarda sempre proporção com a preponderância que, durante a vida, o Espírito deu
à matéria. É, com efeito, racional conceber-se que, quanto mais o Espírito se haja identificado
com a matéria, tanto mais penoso lhe seja separar-se dela; ao passo que a atividade intelectual e
moral, a elevação dos pensamentos operam um começo de desprendimento, mesmo durante a
vida do corpo, de modo que, em chegando a morte, ele é quase instantâneo. Tal o resultado dos
estudos feitos em todos os indivíduos que se têm podido observar por ocasião da morte. Essas
observações ainda provam que a afinidade, persiste entre a alma e o corpo, em certos indivíduos,
é, às vezes, muito penosa, porquanto o Espírito pode experimentar o horror da decomposição.
Este caso, porém, é excepcional e peculiar a certos gêneros de vida e a certos gêneros de morte.
Verifica-se com alguns suicidas.
156. A separação definitiva da alma e do corpo pode ocorrer antes da cessação completa da
vida orgânica?
“Na agonia, a alma, algumas vezes, já tem deixado o corpo; nada mais há que a vida orgânica. O
homem já não tem consciência de si mesmo; entretanto, ainda lhe resta um sopro de vida
orgânica. O corpo é a máquina que o coração põe em movimento. Existe,
enquanto o coração faz circular nas veias o sangue, para o que não necessita da alma.”
157. No momento da morte, a alma sente, alguma vez, qualquer aspiração ou êxtase que lhe
faça entrever o mundo onde vai de novo entrar?
“Muitas vezes a alma sente que se desfazem os laços que a prendem ao corpo.
Entrega então todos os esforços para desfazê-los inteiramente. Já em parte desprendida da
matéria, vê o futuro desdobrar-se diante de si e goza, por antecipação, do estado de Espírito.”
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158. O exemplo da lagarta que, primeiro, anda de rastos pela terra, depois se encerra na sua
crisálida em estado de morte aparente, para enfim renascer com uma existência brilhante, pode
dar-nos idéia da vida terrestre, do túmulo e, finalmente, da nossa nova existência?
“Uma idéia acanhada. A imagem é boa; todavia, cumpre não seja tomada ao pé da letra, como
freqüentemente vos sucede.”
159. Que sensação experimenta a alma no momento em que reconhece estar no mundo dos
Espíritos?
“Depende. Se praticasse o mal, impelido pelo desejo de o praticar, no primeiro momento te
sentirás envergonhado de o haveres praticado. Com a alma do justo as coisas se passam de modo
bem diferente. Ela se sente como que aliviada de grande peso, pois que não teme nenhum olhar
perscrutador.”
160. O Espírito se encontra imediatamente com os que conheceu na Terra e que morreram antes
dele?
“Sim, conforme à afeição que lhes votava e a que eles lhe consagravam. Muitas vezes aqueles
seus conhecidos o vêm receber à entrada do mundo dos Espíritos e o ajudam a desligar-se das
faixas da matéria. Encontra-se também com muitos dos que conheceu e perdeu de vista durante a
sua vida terrena. Vê os que estão na erraticidade, como vê os encarnados e os vai visitar.”
161. Em caso de morte violenta e acidental, quando os órgãos ainda se não enfraqueceram em
conseqüência da idade ou das moléstias, a separação da alma e a cessação da vida ocorrem
simultaneamente?
“Geralmente assim é; mas, em todos os casos, muito breve é o instante que medeia entre uma e
outra.”
162. Após a decapitação, por exemplo, conserva o homem por alguns instantes a consciência de
si mesmo?
“Não raro a conserva durante alguns minutos, até que a vida orgânica se tenha extinguido
completamente. Mas, também, quase sempre a apreensão da morte lhe faz perder aquela
consciência antes do momento do suplício.”
Trata-se aqui da consciência que o supliciado pode ter de si mesmo, como homem e por
intermédio dos órgãos, e não como Espírito. Se não perdeu essa consciência antes do suplício,
pode conservá-la por alguns breves instantes. Ela, porém, cessa necessariamente com a vida
orgânica do cérebro, o que não quer dizer que o perispírito esteja inteiramente separado do
corpo. Ao contrário: em todos os casos de morte violenta, quando a morte não resulta da extinção
gradual das forças vitais, mais tenazes são os laços que prendem o corpo ao perispírito e,
portanto, mais lento o desprendimento completo.
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Céu e o Inferno. Capítulo 01, 2ª parte, itens 7 a 15.
2. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Questões 154 a 162.
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5.2 Perturbação Espiritual
163. A alma tem consciência de si mesma imediatamente depois de deixar o corpo?
“Imediatamente não é bem o termo. A alma passa algum tempo em estado de perturbação.”
164. A perturbação que se segue à separação da alma e do corpo é do mesmo grau e da mesma
duração para todos os Espíritos?
“Não; depende da elevação de cada um. Aquele que já está purificado, se reconhece quase
imediatamente, pois que se libertou da matéria antes que cessasse a vida do corpo, enquanto que
o homem carnal, aquele cuja consciência ainda não está pura, guarda por muito mais tempo a
impressão da matéria.”
165. O conhecimento do Espiritismo exerce alguma influência sobre a duração, mais ou menos
longa, da perturbação?
“Influência muito grande, por isso que o Espírito já antecipadamente compreendia a sua situação.
Mas, a prática do bem e a consciência pura são o que maior influência exercem.”
Por ocasião da morte, tudo, a princípio, é confuso. De algum tempo precisa a alma para entrar no
conhecimento de si mesma. Ela se acha como que aturdida, no estado de uma pessoa que
despertou de profundo sono e procura orientar-se sobre a sua situação. A lucidez das idéias e a
memória do passado lhe voltam, à medida que se apaga a influência da matéria que ela acaba de
abandonar, e à medida que se dissipa a espécie de névoa que lhe obscurece os pensamentos.
Muito variável é o tempo que dura a perturbação que se segue à morte. Pode ser de algumas
horas, como também de muitos meses e até de muitos anos. Aqueles que, desde quando ainda
viviam na Terra, se identificaram com o estado futuro que os aguardava, são os em quem menos
longa ela é, porque esses compreendem imediatamente a posição em que se encontram.
Aquela perturbação apresenta circunstâncias especiais, de acordo com os caracteres dos
indivíduos e, principalmente, com o gênero de morte. Nos casos de morte violenta, por suicídio,
suplício, acidente, apoplexia, ferimentos, etc., o Espírito fica surpreendido, espantado e não
acredita estar morto. Obstinadamente sustenta que não o está. No entanto, vê o seu próprio
corpo, reconhece que esse corpo é seu, mas não compreende que se ache separado dele. Acercase das pessoas a quem estima, fala-lhes e não percebe por que elas não o ouvem. Semelhante
ilusão se prolonga até ao completo desprendimento do perispírito. Só então o Espírito se
reconhece como tal e compreende que não pertence mais ao número dos vivos. Este fenômeno se
explica facilmente. Surpreendido de improviso pela morte, o Espírito fica atordoado com a
brusca mudança que nele se operou; considera ainda a morte como sinônimo de destruição, de
aniquilamento. Ora, porque pensa, vê, ouve, tem a sensação de não estar morto. Mais lhe
aumenta a ilusão o fato de se ver com um corpo semelhante, na forma, ao precedente, mas cuja
natureza etérea ainda não teve tempo de estudar. Julga-o sólido e compacto como o primeiro e,
quando se lhe chama a atenção para esse ponto, admira-se de não poder palpálo.
Esse fenômeno é análogo ao que ocorre com alguns sonâmbulos inexperientes, que não crêem
dormir. É que têm sono por sinônimo de suspensão das faculdades. Ora, como pensam
livremente e vêem, julgam naturalmente que não dormem. Certos Espíritos revelam essa
particularidade, se bem que a morte não lhes tenha sobrevindo inopinadamente. Todavia, sempre
mais generalizada se apresenta entre os que, embora doentes, não pensavam em morrer. Observase então o singular espetáculo de um Espírito assistir ao seu próprio enterramento como se fora o
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de um estranho, falando desse ato como de coisa que lhe não diz respeito, até ao momento em
que compreende a verdade.
A perturbação que se segue à morte nada tem de penosa para o homem de bem, que se conserva
calmo, semelhante em tudo a quem acompanha as fases de um tranqüilo despertar. Para aquele
cuja consciência ainda não está pura, a perturbação é cheia de ansiedade e de angústias, que
aumentam à proporção que ele da sua situação se compenetra.
Nos casos de morte coletiva, tem sido observado que todos os que perecem ao mesmo tempo
nem sempre tornam a ver-se logo. Presas da perturbação que se segue à morte, cada um vai para
seu lado, ou só se preocupa com os que lhe interessam.
6. - Na transição da vida corporal para a espiritual, produz-se ainda um outro fenômeno de
importância capital - a perturbação. Nesse instante a alma experimenta um torpor que paralisa
momentaneamente as suas faculdades, neutralizando, ao menos em parte, as sensações. É como
se disséssemos um estado de catalepsia, de modo que a alma quase nunca testemunha
conscientemente o derradeiro suspiro.
Dizemos quase nunca, porque há casos em que a alma pode contemplar conscientemente o
desprendimento, como em breve veremos.
A perturbação pode, pois, ser considerada o estado normal no instante da morte e perdurar por
tempo indeterminado, variando de algumas horas a alguns anos. A proporção que se liberta, a
alma encontra-se numa situação comparável à de um homem que desperta de profundo sono; as
idéias são confusas, vagas, incertas; a vista apenas distingue como que através de um nevoeiro,
mas pouco a pouco se aclara, desperta-se-lhe a memória e o conhecimento de si mesma. Bem
diverso é, contudo, esse despertar; calmo, para uns, acorda-lhes sensações deliciosas; tétrico,
aterrador e ansioso, para outros, é qual horrendo pesadelo.
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Questões 163 a 165.
2. Allan Kardec. O Céu e o Inferno. Capítulo 01, 2ª parte, item 6.
- Capítulo 2: comunicação I de Sanson; comunicação da Srta. Emma;
- Capítulo 3: comunicação da Sra. Helène Michel; comunicação da Ara. Anna Belleville;
- Capitulo 4: comunicação de Novel; comunicação de Pascal Lavic;
- Capitulo 5: comunicação de Antoine Bell; comunicação do suicida da Samaritana;
comunicação de François Simon Louvet;
- Capitulo 6: primeira comunicação de Jacques Latour;
- Capítulo 7: comunicação da rainha de Oude;
- Capítulo 8: primeira comunicaçãode Julienne Marie, a mendiga e a comunicação de
Antonio B...
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6. DOUTRINA DAS PENAS ETERNAS
6.1 - Origem da doutrina das penas eternas
1. - A crença na eternidade das penas perde terreno dia a dia, de modo que, sem ser profeta, pode
prever-se-lhe o fim próximo.
Tais e de tal ordem poderosos e peremptórios têm sido os argumentos a ela opostos, que nos
parece quase supérfluo ocuparmo-nos de tal doutrina de ora em diante, deixando que por si
mesma se extinga.
Mas não se pode contestar que, apesar de caduca, ainda constitui a tecla dos adversários das
idéias novas, o ponto que defendem com mais obstinação, convictos aliás da vulnerabilidade que
ela apresenta, e não menos convictos das conseqüências dessa queda. Por este lado, a questão
merece sério exame.
2. - A doutrina das penas eternas teve sua razão de ser, como a do inferno material, enquanto o
temor podia constituir um freio para os homens pouco adiantados intelectual e moralmente.
Na impossibilidade de apreenderem as nuanças tantas vezes delicadas do bem e do mal, bem
como o valor relativo das atenuantes e agravantes, os homens não se impressionariam, então, a
não ser pouco ou mesmo nada com a idéia das penas morais.
Tampouco compreenderiam a temporalidade dessas penas e a justiça decorrente das suas
gradações e proporções.
3. - Quanto mais próximo do estado primitivo, mais material é o homem. O senso moral é o que
de mais tardio nele se desenvolve, razão pela qual também não pode fazer de Deus, dos seus
atributos e da vida futura, senão uma idéia muito imperfeita e vaga.
Assimilando-o à sua própria natureza, Deus não passa para ele de um soberano absoluto, tanto
mais terrível quanto invisível, como um rei despótico que, fechado no seu palácio, jamais se
mostrasse aos súditos. Sem compreenderem o seu poder moral, só o aceitam pela força material.
Não o vêem senão armado com o raio, ou no meio de coriscos e tempestades, semeando de
passagem a destruição, a ruína, semelhantemente aos guerreiros invencíveis.
Um Deus de mansuetude e cordura não seria um Deus, porém um ser fraco e
sem meios de se fazer obedecer. A vingança implacável, os castigos terríveis, eternos, nada
tinham de incompatível com a idéia que se fazia de Deus, não lhes repugnavam à razão.
Implacável também ele, homem, nos seus ressentimentos, cruel para os inimigos e inexorável
para os vencidos, Deus, que lhe era superior, deveria ser ainda mais terrível.
Para tais homens eram precisas crenças religiosas assimiladas à sua natureza rústica. Uma
religião toda espiritual, toda amor e caridade não podia aliar-se à brutalidade dos costumes e das
paixões.
Não censuremos, pois, a Moisés sua legislação draconiana, apenas bastante para conter o povo
indócil, nem o haver feito de Deus um Deus vingativo. A época assim o exigia, essa época em
que a doutrina de Jesus não encontraria eco e até se anularia.
4. - À medida que o Espírito se desenvolvia, o véu material ia-se-lhe dissipando pouco a pouco, e
os homens habilitavam-se a compreender as coisas espirituais. Mas isso não aconteceu senão
lenta e gradualmente. Por ocasião de sua vinda, já Jesus pôde proclamar um Deus clemente,
falando do seu reino, não deste mundo, e acrescentando:
- Amai-vos uns aos outros e fazei bem aos que vos odeiam, ao passo que os antigos diziam: olho
por olho, dente por dente.
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Ora, quais eram os homens que viviam no tempo de Jesus?
Seriam almas novamente criadas e encarnadas? Mas se assim fosse, Deus teria criado para o
tempo de Jesus almas mais adiantadas que para o tempo de Moisés? E daí o que teria decorrido
para estas últimas? Consumir-se-iam por toda a eternidade no embrutecimento? O mais
comezinho bom-senso repele essa suposição. Não; essas almas eram as mesmas que viviam sob
o império das leis moisaicas e que tinham adquirido, em várias existências, o desenvolvimento
suficiente à compreensão de uma doutrina mais elevada, assim como hoje mais adiantadas se
encontram para receber um ensino ainda mais completo.
5. - O Cristo não pôde, no entanto, revelar aos seus contemporâneos todos os mistérios do futuro.
Ele próprio o disse: Muitas outras coisas vos diria se estivésseis em estado de as compreender, e
eis por que vos falo em parábolas. Sobretudo no que diz respeito à moral, isto é, aos deveres do
homem, foi o Cristo muito explícito porque, tocando na corda sensível da vida material, sabia
fazer-se compreender; quanto a outros pontos, limitou-se a semear sob a forma alegórica os
germens que deveriam ser desenvolvidos mais tarde.
A doutrina das penas e recompensas futuras pertence a esta última ordem de idéias. Sobretudo,
em relação às penas, ele não poderia romper bruscamente com as idéias preconcebidas. Vindo
traçar aos homens novos deveres, substituir o ódio e a vingança pelo amor do próximo e pela
caridade, o egoísmo pela abnegação, era já muito; além disso, não podia racionalmente
enfraquecer o temor do castigo reservado aos prevaricadores, sem enfraquecer ao mesmo tempo
a idéia do dever.
Se ele prometia o reino dos céus aos bons, esse reino estaria interdito aos maus, e para onde
iriam eles? Demais, seria necessária a inversão da Natureza para que inteligências ainda muito
rudimentares pudessem ser impressionadas de feição a identificarem-se com a vida espiritual,
levando-se em conta a circunstância de Jesus se dirigir ao povo, à parte menos esclarecida da
sociedade, que não podia prescindir de imagens de alguma sorte palpáveis, e não de idéias sutis.
Eis a razão por que Jesus não entrou em minúcias supérfluas a este respeito;
nessa época não era preciso mais do que opor uma punição à recompensa. 6. Se Jesus ameaçou
os culpados com o fogo eterno, também os ameaçou de serem lançados na Geena. Ora, que vem
a ser a Geena? Nada mais nada menos que um lugar nos arredores de Jerusalém, um monturo
onde se despejavam as imundícies da cidade.
Dever-se-ia interpretar isso também ao pé da letra? Entretanto era uma dessas figuras enérgicas
de que ele se servia para impressionar as massas. O mesmo se dá com o fogo eterno. E se tal não
fora o seu pensar, ele estaria em contradição, exaltando a demência e misericórdia de Deus, pois
demência e inexorabilidade são sentimentos antagônicos que se anulam. Desconhecer-se-ia, pois,
o sentido das palavras de Jesus, atribuindo-lhes a sanção do dogma das penas eternas, quando
todo o seu ensino proclamou a mansidão do Criador, a sua benignidade. No Pai Nosso Jesus nos
ensina a dizer: - Perdoai-nos, Senhor, as nossas faltas, assim como nós perdoamos aos nossos
devedores. Pois se o culpado não devesse esperar algum perdão, inútil seria pedi-lo.
Esse perdão é, porém, incondicional? É uma remissão pura e simples da pena em que se incorre?
Não; a medida desse perdão subordina-se ao modo pelo qual se haja perdoado, o que eqüivale
dizer que não seremos perdoados desde que não perdoemos. Deus, fazendo do esquecimento das
ofensas uma condição absoluta, não podia exigir do homem fraco o que Ele, onipotente, não
fizesse.
O Pai Nosso é um protesto cotidiano contra a eterna vingança de Deus.
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7. - Para homens que só possuíam da espiritualidade da alma uma idéia confusa, o fogo material
nada tinha de improcedente, mesmo porque já participava da crença pagã, quase universalmente
propagada. Igualmente a eternidade das penas nada tinha que pudesse repugnar a homens desde
muitos séculos submetidos à legislação do terrível Jeová. No pensamento de Jesus o fogo eterno
não podia passar, portanto, de simples figura, pouco lhe importando fosse essa figura
interpretada à letra, desde que ela servisse de freio às paixões humanas. Sabia ele ao demais que
o tempo e o progresso se incumbiriam de explicar o sentido alegórico, mesmo porque, segundo a
sua predição, o Espírito de Verdade viria esclarecer aos homens todas as coisas. O caráter
essencial das penas irrevogáveis é a ineficácia do arrependimento, e Jesus nunca disse que o
arrependimento não mereceria a graça do Pai.
Ao contrário, sempre que se lhe deparou ensejo, ele falou de um Deus
clemente, misericordioso, solícito em receber o filho pródigo que voltasse ao lar paterno;
inflexível, sim, para o pecador obstinado, porém, pronto sempre a trocar o castigo pelo perdão do
culpado sinceramente arrependido. Este não é, por certo, o traço de um Deus sem piedade.
Também convém assinalar que Jesus nunca pronunciou contra quem quer que fosse, mesmo
contra os maiores culpados, a condenação irremissível.
8. Todas as religiões primitivas, revestindo o caráter dos povos, tiveram deuses guerreiros que
combatiam à frente dos exércitos.
O Jeová dos hebreus facultava-lhes mil modos de exterminar os inimigos; recompensava-os com
a vitória ou punia-os com a derrota. Tal idéia a respeito de Deus levava a honrá-lo ou apaziguá-lo
com sangue de animais ou de homens, e daí os sacrifícios sangrentos que representavam papel
tão saliente em todas as religiões da antigüidade. Os judeus tinham abolido os sacrifícios
humanos; os cristãos, apesar dos ensinamentos do Cristo, por muito tempo julgaram honrar o
Criador votando, aos milhares, às chamas e às torturas, os que denominavam hereges, o que
constituía sob outra forma verdadeiros sacrifícios humanos, pois que os promoviam para maior
glória de Deus, e com acompanhamento de cerimônias religiosas. Hoje, ainda invocam o Deus
dos exércitos antes do combate, glorificam-no após a vitória, e quantas vezes por causas injustas
e anticristãs.
9. Quão tardo é o homem em desfazer-se dos seus hábitos, prejuízos e primitivas idéias!
Quarenta séculos nos separam de Moisés, e a nossa geração cristã ainda vê traços de antigos usos
bárbaros, senão consagrados, ao menos aprovados pela religião atual! Foi preciso a poderosa
opinião dos não-ortodoxos para acabar com as fogueiras e fazer compreender a verdadeira
grandeza de Deus. Mas, à falta de fogueiras, prevalecem ainda as perseguições materiais e
morais, tão radicada está no homem a idéia da crueldade divina. Nutrido por sentimentos
inculcados desde a infância, poderá o homem estranhar que o Deus que lhe apresentam,
lisonjeado por atos bárbaros, condene a eternas torturas e veja sem piedade o sofrimento dos
culpados? Sim, são filósofos, ímpios como querem alguns, que se hão escandalizado vendo o
nome de Deus profanado por atos indignos dele. São eles que o mostram aos homens na
plenitude da sua grandeza, despojando-o de paixões e baixezas atribuídas por uma crença menos
esclarecida.
Neste ponto a religião tem ganho em dignidade o que tem perdido em prestígio exterior, porque
se homens há devotados à forma, maior é o número dos sinceramente religiosos pelo sentimento,
pelo coração.
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Mas, ao lado destes, quantos não têm sido levados, sem mais reflexão, a negarem toda a
Providência! O modo por que a religião tem estacionado, em antagonismo com os progressos da
razão humana, sem saber conciliá-los com as crenças, degenerou em deísmo para uns, em
cepticismo absoluto para outros, sem esquecermos o panteísmo, isto é, o homem fazendo-se deus
ele próprio, à falta de um mais perfeito.
Argumentos a favor das penas eternas
10. - Voltemos ao dogma das penas eternas. Eis o principal argumento invocado em seu favor:
"É doutrina sancionada entre os homens que a gravidade da ofensa é proporcionada à qualidade
do ofendido. O crime de lesa-majestade, por exemplo, o atentado à pessoa de um soberano,
sendo considerado mais grave do que o fora em relação a qualquer súdito, é, por isso mesmo,
mais severamente punido. E sendo Deus muito mais que um soberano, pois é infinito, deve ser
infinita a ofensa a Ele, como infinito o respectivo castigo, isto é, eterno."
Refutação: Toda refutação é um raciocínio que deve ter seu ponto de partida, uma base sobre a
qual se apóie, premissas, enfim. Tomemos essas premissas aos próprios atributos de Deus; único, eterno, imutável, imaterial, onipotente, soberanamente justo e bom, infinito em todas as
perfeições. É impossível conceber Deus de outra maneira, visto como, sem a infinita perfeição,
poder-se-ia conceber outro ser que lhe fosse superior. Para que seja único acima de todos os
seres, faz-se mister que ninguém possa excedê-lo ou sequer igualálo em qualquer coisa, Logo, é
necessário que seja de todo infinito.
E porque são infinitos, os atributos divinos não sofrem aumento nem diminuição, sem o que não
seriam infinitos e Deus perfeito tampouco. Se se tirasse a menor parcela de um só dos seus
atributos, não haveria mais Deus, por isso que poderia coexistir um ser mais perfeito. O infinito
de uma qualidade exclui a possibilidade da existência de outra qualidade contrária que pudesse
diminuí-la ou anulá-la. Um ser infinitamente bom não pode ter a menor parcela de maldade, nem
o ser infinitamente mau pode ter a menor parcela de bondade. Assim também um objeto não
seria de um negro absoluto com a mais leve nuança de branco, e vice-versa.
Estabelecido este ponto de partida, oporemos aos argumentos supra os seguintes:
11. - Só um ser infinito pode fazer algo de infinito. O homem, finito nas virtudes, nos
conhecimentos, no poderio, nas aptidões e na existência terrestre, não pode produzir senão coisas
limitadas.
Se o homem pudesse ser infinito no mal que faz, sê-lo-ia igualmente no bem, igualando-se,
então, a Deus. Mas se o homem fosse infinito no bem não praticaria o mal, pois o bem absoluto é
a exclusão de todo o mal. Admitindo-se que uma ofensa temporária à Divindade pudesse ser
infinita, Deus, vingando-se por um castigo infinito, seria logo infinitamente vingativo; e sendo
Deus infinitamente vingativo não pode ser infinitamente bom e misericordioso, visto como um
destes atributos exclui o outro. Se não for infinitamente bom não é perfeito; e não sendo perfeito
deixa de ser Deus.
Se Deus é inexorável para o culpado que se arrepende, não é misericordioso; e se não é
misericordioso, deixa de ser infinitamente bom. E por que daria Deus aos homens uma lei de
perdão, se Ele próprio não perdoasse? Resultaria dai que o homem que perdoa aos seus inimigos
e lhes retribui o mal com o bem, seria melhor que Deus, surdo ao arrependimento dos que o
ofendem, negando-lhes por todo o sempre o mais ligeiro carinho.
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Achando-se em toda parte e tudo vendo, Deus deve ver também as torturas dos condenados; e se
Ele se conserva insensível aos gemidos por toda a eternidade, será eternamente impiedoso; ora,
sem piedade, não há bondade infinita.
12. - A isto se responde que o pecador arrependido, antes da morte, tem a misericórdia de Deus,
e que mesmo o maior culpado pode receber essa graça. Quanto a isto não há dúvida, e
compreende-se que Deus só perdoe ao arrependido, mantendo-se inflexível para com os
obstinados; mas se Ele é todo misericordioso para a alma arrependida antes da morte, por que
deixará de o ser para quem se arrepende depois dela? Por que a eficácia do arrependimento só
durante a vida, um breve instante, e não na eternidade que não tem fim? Circunscritas a um dado
tempo, a bondade e misericórdia divinas teriam limites, e Deus não seria infinitamente bom.
13. - Deus é soberanamente justo. A soberana justiça não é inexorável absolutamente, nem leva a
complacência ao ponto de deixar impunes todas as faltas; ao contrário, pondera rigorosamente o
bem e o mal, recompensando um e punindo outro eqüitativa e proporcionalmente, sem se
enganar jamais na aplicação.
Se por uma falta passageira, resultante sempre da natureza imperfeita do homem e muitas vezes
do meio em que vive, a alma pode ser castigada eternamente sem esperança de clemência ou de
perdão, não há proporção entre a falta e o castigo - não há justiça. Reconciliando-se com Deus,
arrependendo-se, e pedindo para reparar o mal praticado, o culpado deve subsistir para o bem,
para os bons sentimentos. Mas, se o castigo é irrevogável, esta subsistência para o bem não
frutifica, e um bem não considerado significa injustiça. Entre os homens, o condenado que se
corrige tem por comutada e às vezes mesmo perdoada a sua pena; e, assim, haveria mais
equidade na justiça humana que na divina.
Se a pena é irrevogável, inútil será o arrependimento, e o culpado, nada tendo a esperar de sua
correção, persiste no mal, de modo que Deus não só o condena a sofrer perpetuamente, mas
ainda a permanecer no mal por toda a eternidade. Nisso não há nem bondade nem Justiça.
14. Sendo em tudo infinito, Deus deve abranger o passado e o futuro; deve saber, ao criar uma
alma, se ela virá a falir, assaz gravemente, para ser eternamente condenada. Se o não souber, a
sua sabedoria deixará de ser infinita, e Ele deixará de ser Deus. Sabendo-o, cria voluntariamente
uma alma desde logo votada ao eterno suplício, e, nesse caso, deixa de ser bom.
Uma vez que Deus pode conferir a graça ao pecador arrependido, tirando-o do inferno, deixam
de existir penas eternas, e o juízo dos homens está revogado.
15. Conseguintemente, a doutrina das penas eternas absolutas conduz à negação, ou, pelo menos,
ao enfraquecimento de alguns atributos de Deus, sendo incompatível com a perfeição absoluta,
donde resulta este dilema: Ou Deus é perfeito, e não há penas eternas, ou há penas eternas, e
Deus não é perfeito.
16. - Também se invoca a favor do dogma da eternidade das penas o seguinte argumento:
"A recompensa conferida aos bons, sendo eterna, deve ter por corolário a eterna punição. Justo é
proporcionar a punição à recompensa."
Refutação: Deus criou as almas para fazê-las felizes ou desgraçadas?
Evidentemente a felicidade da criatura deve ser o fito do Criador, ou Ele não seria bom. Ela
atinge a felicidade pelo próprio mérito, que, adquirido, não mais o perde.
O contrário seria a sua degeneração. A felicidade eterna é, pois, a conseqüência da sua
imortalidade.
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Antes, porém, de chegar à perfeição, tem lutas a sustentar, combates a travar com as más
paixões. Não tendo sido criada perfeita, mas suscetível de o ser, a fim de que tenha o mérito de
suas obras, a alma pode cair em faltas, que são conseqüentes à sua natural fraqueza. E se por esta
fraqueza fora eternamente punida, era caso de perguntar por que não a criou Deus mais forte?
A punição é antes uma advertência do mal já praticado, devendo ter por fim reconduzi-la ao bom
caminho. Se a pena fosse irremissível, o desejo de melhorar seria supérfluo; nem o fim da
criação seria alcançado, porquanto haveria seres 'predestinados à felicidade ou à desgraça. Se
uma alma se arrepende, pode regenerar-se, e podendo regenerar-se pode aspirar à felicidade.
E Deus seria justo se lhe recusasse os respectivos meios?
Sendo o bem o fim supremo da Criação, a felicidade, que é o seu prêmio, deve ser eterna; e o
castigo, como meio de alcançá-la, temporário. A noção mais comezinha da justiça humana
prescreve que se não pode castigar perpetuamente quem se mostra desejoso de praticar o bem.
17. - Um último argumento a favor das penas eternas é este:
"O temor das penas eternas é um freio; anulado este, o homem, por nada temer, entregar-se-ia a
todos os excessos."
Refutação: Esse raciocínio procederia se a temporalidade das penas importasse, de fato, na
supressão de toda sanção penal.
A felicidade ou infelicidade futura é conseqüência rigorosa da justiça de Deus, pois a identidade
de condições para o bom e para o mau seria a negação dessa justiça.
Mas, em não ser eterno, nem por isso o castigo deixa de ser temeroso, e tanto maior será o temor
quanto maior a convicção.
Esta, por sua vez, tanto mais profunda será, quanto mais racional a procedência do castigo. Uma
penalidade, em que se não crê, não pode ser um freio, e a eternidade das penas está nesse caso. A
crença nessa penalidade, já o afirmamos, teve a sua utilidade, a sua razão de ser em dada época;
hoje, não somente deixa de impressionar os ânimos, mas até produz descrentes. Antes de a
preconizar como necessidade, fora mister demonstrar a sua realidade. Seria preciso, além disso,
observar a sua eficácia junto àqueles que a preconizam e se esforçam por demonstrá-la.
E, desgraçadamente, entre esses, muitos provam pelos atos que nada temem das penas eternas.
Assim, impotente para reprimir os próprios profitentes, que império poderá exercer sobre os
descrentes e refratários?
Impossibilidade material das penas eternas
18. - Até aqui, só temos combatido o dogma das penas eternas com o raciocínio. Demonstremolo agora em contradição com os fatos positivos que observamos, provando-lhe a impossibilidade.
Por este dogma a sorte das almas, irrevogavelmente fixada depois da morte, é, como tal, um
travão definitivo aplicado ao progresso.
Ora, a alma progride ou não? Eis a questão: - Se progride, a eternidade das penas é impossível.
E poder-se-á duvidar desse progresso, vendo a variedade enorme de aptidões morais e
intelectuais existentes sobre a Terra, desde o selvagem ao homem civilizado, aferindo a diferença
apresentada por um povo de um a outro século? Se se admite não ser das mesmas almas, é força
admitir que Deus criou almas em todos os graus de adiantamento, segundo os tempos e lugares,
favorecendo umas e destinando outras a perpétua inferioridade - o que seria incompatível com a
justiça, que, aliás, deve ser igual para todas as criaturas.
19. - É incontestável que a alma atrasada moral e intelectualmente, como a dos povos bárbaros,
não pode ter os mesmos elementos de felicidade, as mesmas aptidões para gozar dos esplendores
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do infinito, como a alma cujas faculdades estão largamente desenvolvidas. Se, portanto, estas
almas não progredirem, não podem em condições mais favoráveis gozar na eternidade senão de
uma felicidade, por assim dizer, negativa.
Para estar de acordo com a rigorosa justiça, chegaremos, pois, à conclusão de que as almas mais
adiantadas são as atrasadas de outro tempo, com progressos posteriormente realizados. Mas, aqui
atingimos a questão magna da pluralidade das existências como meio único e racional de
resolver a dificuldade. Façamos abstração, porém, dessa questão e consideremos a alma sob o
ponto de vista de uma única existência.
20. - Figuremos um rapaz de 20 anos, desses que comumente se encontram, ignorante, viciado
por índole, céptico, negando sua alma e a Deus, entregue à desordem e cometendo toda sorte de
malvadeza. Esse rapaz encontra-se, depois, num meio favorável, melhor; trabalha, instrui-se,
corrige-se gradualmente e acaba por tornar-se crente e piedoso. Eis aí um exemplo palpável do
progresso da alma durante a vida, exemplo que se reproduz todos os dias. Esse homem morre em
avançada idade, como um santo, e naturalmente certa se lhe torna a salvação. Mas qual seria a
sua sorte se um acidente lhe pusesse termo à existência, trinta ou quarenta anos mais cedo? Ele
estava nas condições exigidas para ser condenado, e, se o fosse, todo o progresso se lhe tornaria
impossível.
E assim, segundo a doutrina das penas eternas, teremos um homem salvo somente pela
circunstância de viver mais tempo, circunstância, aliás, fragilíssima, uma vez que um acidente
qualquer poderia tê-la anulado fortuitamente. Desde que sua alma pôde progredir em um tempo
dado, por que razão não mais poderia progredir depois da morte, se uma causa alheia à sua
vontade a tivesse impedido de fazê-lo durante a vida? Por que lhe recusaria Deus os meios de
regenerar-se na outra vida, concedendo-lhos nesta? Neste caso, o arrependimento veio, posto que
tardio; mas se desde o momento da morte se impusesse irrevogável condenação, esse
arrependimento seria infrutífero por todo o sempre, como destruídas seriam as aptidões dessa
alma para o progresso, para o bem.
21. - O dogma da eternidade absoluta das penas é, portanto, incompatível com o progresso das
almas, ao qual opõe uma barreira insuperável. Esses dois princípios destroem-se, e a condição
indeclinável da existência de um é o aniquilamento do outro. Qual dos dois existe de fato? A lei
do progresso é evidente: não é uma teoria, é um fato corroborado pela experiência: é uma lei da
Natureza, divina, imprescritível. E, pois, que esta lei existe inconciliável com a outra, é porque a
outra não existe. Se o dogma das penas eternas existisse verdadeiramente, Santo Agostinho, S.
Paulo e tantos outros jamais teriam visto o céu, caso morressem antes de realizar o progresso que
lhes trouxe a conversão.
A esta última asserção respondem que a conversão dessas santas personagens não é um resultado
do progresso da alma, porém, da graça que lhes foi concedida e de que foram tocadas.
Porém, isto é simples jogo de palavras. Se esses santos praticaram o mal e depois o bem, é que
melhoraram; logo, progrediram. E por que lhes teria Deus concedido como especial favor a graça
de se corrigirem? Sim, por que a eles e não a outros? Sempre, sempre a doutrina dos privilégios,
incompatível com a justiça de Deus e com seu igual amor por todas as criaturas.
Segundo a Doutrina Espírita, de acordo mesmo com as palavras do Evangelho, com a lógica e
com a mais rigorosa justiça, o homem é o filho de suas obras, durante esta vida e depois da
morte, nada devendo ao favoritismo: Deus o recompensa pelos esforços e pune pela negligência,
isto por tanto tempo quanto nela persistir.
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A doutrina das penas eternas fez sua época
22. - A crença na eternidade das penas prevaleceu salutarmente enquanto os homens não tiveram
ao seu alcance a compreensão do poder moral. É o que sucede com as crianças durante certo
tempo contidas pela ameaça de seres quiméricos com os quais são intimidadas: -chegadas ao
período do raciocínio, repelem por si mesmas essas quimeras da infância, tornando-se absurdo o
querer governá-las por tais meios.
Se os que as dirigem pretendessem incutir-lhes ainda a veracidade de tais fábulas, certo
decairiam da sua confiança. É isso que se dá hoje com a Humanidade, saindo da infância e
abandonando, por assim dizer, os cueiros. O homem não é mais passivo instrumento vergado à
força material, nem o ente crédulo de outrora que tudo aceitava de olhos fechados.
23. - A crença é um ato de entendimento que, por isso mesmo, não pode ser imposta. Se, durante
certo período da Humanidade, o dogma da eternidade das penas se manteve inofensivo e
benéfico mesmo, chegou o momento de tornar-se perigoso.
Imposto como verdade absoluta, quando a razão o repele, ou o homem quer acreditar e procura
uma crença mais racional, afastando-se dos que o professam, ou, então, descrê absolutamente de
tudo. Quem quer que estude o assunto, calmamente, verá que, em nossos dias, o dogma da
eternidade das penas tem feito mais ateus e materialistas do que todos os filósofos.
As idéias seguem um curso incessantemente progressivo, e absurdo é querer governar os homens
desviando-os desse curso; pretender contê-los, retroceder ou simplesmente parar enquanto ele
avança, é condenar-se, é perder-se. Seguir ou deixar de seguir essa evolução é uma questão de
vida ou de morte para as religiões como para os governos.
Este fatalismo é um bem ou um mal? Para os que vivem do passado, vendo-o aniquilar-se, será
um mal; mas para os que vivem pelo futuro é uma lei do progresso, de Deus em suma.
E contra uma lei de Deus é inútil toda revolta, impossível a luta. Para que, pois, sustentar a todo
o transe uma crença que se dissolve em desuso fazendo mais danos que benefícios à religião?
Ah! contrista dizê-lo, mas uma questão material domina aqui a questão religiosa.
Esta crença tem sido grandemente explorada pela idéia de que com dinheiro se abrem as portas
do céu, livrando das do inferno. As quantias por estes meios arrecadadas, outrora e ainda hoje,
são incalculáveis, e verdadeiramente fabuloso o imposto prévio pago ao temor da eternidade. E
sendo facultativo tal imposto, a renda é sempre proporcional à crença; extinta esta, improdutivo
será aquele.
De bom grado cede a criança o bolo a quem lhe promete afugentar o lobisomem, mas se a
criança já não acreditar em lobisomens, guardará o bolo.
24. - A Nova Revelação, dando noções mais sensatas da vida futura e provando que podemos,
cada um de nós, promover a felicidade pelas próprias obras, deve encontrar tremenda oposição,
tanto mais viva por estancar uma das mais rendosas fontes de receita. E assim tem sido, sempre
que uma nova descoberta ou invento abala costumes inveterados e preestabelecidos.
Quem vive de velhos e custosos processos jamais deixa de preconizar-lhes a superioridade e
excelência e de desacreditar os novos, mais econômicos.
Acreditar-se-á, por exemplo, que a imprensa, apesar dos benefícios prestados à sociedade, tenha
sido aclamada pela classe dos copistas?
Não, certamente eles deveriam profligá-la. O mesmo se tem dado em relação a maquinismos,
caminho de ferro e centenares de outras descobertas e aplicações.
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Aos olhos dos incrédulos o dogma da eternidade das penas afigura-se futilidade da qual se riem;
para o filósofo esse dogma tem uma gravidade social pelos abusos que acoroçoa, ao passo que o
homem verdadeiramente religioso tem a dignidade da religião interessada na destruição dos
abusos que tal dogma origina, e da sua causa, enfim.
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Céu e o Inferno. Capítulo 06, 1ª parte, itens 1 a 24.
6.2 – O Reino de Deus e o Paraíso Prometido
Raça adâmica
38. - De acordo com o ensino dos Espíritos, foi uma dessas grandes imigrações, ou, se quiserem,
uma dessas colônias de Espíritos, vinda de outra esfera, que deu origem à raça simbolizada na
pessoa de Adão e, por essa razão mesma, chamada raça adâmica. Quando ela aqui chegou, a
Terra já estava povoada desde tempos imemoriais, como a América, quando aí chegaram os
europeus.
Mais adiantada do que as que a tinham precedido neste planeta, a raça adâmica é, com efeito, a
mais inteligente, a que impele ao progresso todas as outras. A Gênese no-la mostra, desde os
seus primórdios, industriosa, apta às artes e às ciências, sem haver passado aqui pela infância
espiritual, o que não se dá com as raças primitivas, mas concorda com a opinião de que ela se
compunha de Espíritos que já tinham progredido bastante. Tudo prova que a raça adâmica não é
antiga na Terra e nada se opõe a que seja considerada como habitando este globo desde apenas
alguns milhares de anos, o que não estaria em contradição nem com os fatos geológicos, nem
com as observações antropológicas, antes tenderia a confirmá-las.
39. - No estado atual dos conhecimentos, não é admissível a doutrina segundo a qual todo o
gênero humano procede de uma individualidade única, de há seis mil anos somente a esta parte.
Tomadas à ordem física e à ordem moral, as considerações que a contradizem se resumem no
seguinte Do ponto de vista fisiológico, algumas raças apresentam característicos tipos
particulares, que não permitem se lhes assinale uma origem comum. Há diferenças que
evidentemente não são simples efeito do clima, pois que os brancos que se reproduzem nos
países dos negros não se tornam negros e reciprocamente. O ardor do Sol tosta e brune a
epiderme, porém nunca transformou um branco em negro, nem lhe achatou o nariz, ou mudou a
forma dos traços da fisionomia, nem lhe tornou lanzudo e encarapinhado o cabelo comprido e
sedoso. Sabe-se hoje que a cor do negro provém de um tecido especial subcutâneo, peculiar à
espécie.
Há-se, pois, de considerar as raças negras, mongólicas, caucásicas como tendo origem própria,
como tendo nascido simultânea ou sucessivamente em diversas partes do globo. O cruzamento
delas produziu as raças mistas secundárias. Os caracteres fisiológicos das raças primitivas
constituem indício evidente de que elas procedem de tipos especiais. As mesmas considerações
se aplicam, conseguintemente, assim aos homens, quanto aos animais, no que concerne à
pluralidade dos troncos. (Cap. X, nos 2 e seguintes.)
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40. - Adão e seus descendentes são apresentados na Gênese como homens sobremaneira
inteligentes, pois que, desde a segunda geração, constróem cidades, cultivam a terra, trabalham
os metais. São rápidos e duradouros seus progressos nas artes e nas ciências.
Não se conceberia, portanto, que esse tronco tenha tido, como ramos, numerosos povos tão
atrasados, de inteligência tão rudimentar, que ainda em nossos dias rastejam a animalidade, que
hajam perdido todos os traços e, até, a menor lembrança do que faziam seus pais. Tão radical
diferença nas aptidões intelectuais e no desenvolvimento morai atesta, com evidência não menor,
uma diferença de origem.
41. - Independentemente dos fatos geológicos, da população do globo se tira a prova da
existência do homem na Terra, antes da época fixada pela Gênese.
Sem falar da cronologia chinesa, que remonta, dizem, a trinta mil anos, documentos mais
autênticos provam que o Egito, a Índia e outros países já eram povoados e floresciam, pelo
menos, três mil anos antes da era cristã, mil anos, portanto, depois da criação do primeiro
homem, segundo a cronologia bíblica. Documentos e observações recentes não consentem hoje
dúvida alguma quanto às relações que existiram entre a América e os antigos egípcios, donde se
tem de concluir que essa região já era povoada naquela época.
Forçoso então seria admitir-se que, em mil anos, a posteridade de um único homem pôde povoar
a maior parte da Terra. Ora, semelhante fecundidade estaria em antagonismo com todas as leis
antropológicas10.
42. - Ainda mais evidente se torna a impossibilidade, desde que se admita, com a Gênese, que o
dilúvio destruiu todo o gênero humano, com exceção de Noé e de sua família, que não era
numerosa, no ano de 1656 do mundo, ou seja, 2.348 anos antes da era cristã. Em realidade, pois,
daquele patriarca é que dataria o povoamento da Terra. Ora, quando os hebreus se estabeleceram
no Egito, 612 anos após o dilúvio, já o Egito era um poderoso império, que teria sido povoado,
sem falar de outros países, em menos de seis séculos, só pelos descendentes de Noé, o que não é
admissível.
Notemos, de passagem, que os egípcios acolheram os hebreus como estrangeiros. Seria de
espantar que houvessem perdido a lembrança de uma tão próxima comunidade de origem,
quando conservaram religiosamente os monumentos de sua história.
Rigorosa lógica, com os fatos a corroborá-la da maneira mais peremptória, mostra, pois, que o
homem está na Terra desde tempo indeterminado, muito anterior à época que a Gênese assinala.
O mesmo ocorre com a diversidade dos troncos primitivos, porquanto demonstrar a
impossibilidade de uma proposição é demonstrar a proposição contrária. Se a Geologia descobre
traços autênticos da presença do homem antes do grande período diluviano, ainda mais completa
é a demonstração.
10
Na Exposição Universal de 1867, apresentaram-se antigüidades do México que nenhuma dúvida deixam sobre as
relações que os povos desse país tiveram com os antigos egípcios. O Sr. Léon Méchedin, numa nota afixada no
templo mexicano da Exposição, assim se exprimia:
"Não é conveniente se publiquem, prematuramente, as descobertas feitas, do ponto de vista da história do homem,
pela recente expedição científica do México. Entretanto, nada se opõe a que o público saiba, desde já, que a
exploração assinalou a existência de grande numero de cidades desaparecidas com o tempo, mas que a picareta e o
incêndio podem retirar de suas mortalhas.
As escavações puseram a descoberto, por toda parte, três camadas de civilizações, que dão ao mundo americano
uma antigüidade fabulosa." É assim que todos os dias a Ciência opõe o desmentido dos fatos à doutrina que limita a
6.000 anos a aparição do homem na Terra e pretende fazê-lo derivar de um tronco único.
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Doutrina dos anjos decaídos e da perda do paraíso11 (1)
43. - Os mundos progridem, fisicamente, pela elaboração da matéria e, moralmente, pela
purificação dos Espíritos que os habitam. A felicidade neles está na razão direta da
predominância do bem sobre o mal e a predominância do bem resulta do adiantamento moral dos
Espíritos. O progresso intelectual não basta, pois que com a inteligência podem eles fazer o mal.
Logo que um mundo tem chegado a um de seus períodos de transformação, a fim de ascender na
hierarquia dos mundos, operam-se mutações na sua população encarnada e desencarnada. É
quando se dão as grandes emigrações e imigrações (nos 34 e 35). Os que, apesar da sua
inteligência e do seu saber, perseveraram no mal, sempre revoltados contra Deus e suas leis, se
tornariam daí em diante um embaraço ao ulterior progresso moral, uma causa permanente de
perturbação para a tranqüilidade e a felicidade dos bons, pelo que são excluídos da humanidade a
que até então pertenceram e tangidos para mundos menos adiantados, onde aplicarão a
inteligência e a intuição dos conhecimentos que adquiriram ao progresso daqueles entre os quais
passam a viver, ao mesmo tempo que expiarão, por uma série de existências penosas e por meio
de árduo trabalho, suas passadas faltas e seu voluntário endurecimento.
Que serão tais seres, entre essas outras populações, para eles novas, ainda na infância da
barbárie, senão anjos ou Espíritos decaídos, ali vindos em expiação? Não é, precisamente, para
eles, um paraíso perdido a terra donde foram expulsos? Essa terra não lhes era um lugar de
delícias, em comparação com o meio ingrato onde vão ficar relegados por milhares de séculos,
até que hajam merecido libertar-se dele? A vaga lembrança intuitiva que guardam da terra donde
vieram é uma como longínqua miragem a lhes recordar o que perderam por culpa própria.
44. - Mas, ao mesmo tempo que os maus se afastam do mundo em que habitavam, Espíritos
melhores aí os substituem, vindos quer da erraticidade, concernente a esse mundo, quer de um
mundo menos adiantado, que mereceram abandonar; Espíritos esses para os quais a nova
habitação é uma recompensa. Assim renovada e depurada a população espiritual dos seus piores
elementos, ao cabo de algum tempo o estado moral do mundo se encontra melhorado.
São às vezes parciais essas mutações, isto é, circunscritas a um povo, a uma raça; doutras vezes,
são gerais, quando chega para o globo o período de renovação.
45. - A raça adâmica apresenta todos os caracteres de uma raça proscrita. Os Espíritos que a
integram foram exilados para a Terra, já povoada, mas de homens primitivos, imersos na
ignorância, que aqueles tiveram por missão fazer progredir, levando-lhes as luzes de uma
inteligência desenvolvida. Não é esse, com efeito, o papel que essa raça há desempenhado até
hoje? Sua superioridade intelectual prova que o mundo donde vieram os Espíritos que a
compõem era mais adiantado do que a Terra. Havendo entrado esse mundo numa nova fase de
progresso e não tendo tais Espíritos querido, pela sua obstinação, colocar-se à altura desse
11
Quando, na Revue Spirite de janeiro de 1862, publicamos um artigo sobre a interpretação da doutrina dos
anjos decaídos, apresentamos essa teoria como simples hipótese, sem outra autoridade afora a de uma opinião
pessoal controversível, porque nos faltavam então elementos bastantes para uma afirmação peremptória. Expusemola a título de ensaio, tendo em vista provocar o exame da questão, decidido, porém, a abandoná-la ou modificá-la, se
fosse preciso. Presentemente, essa teoria já passou pela prova do controle universal. Não só foi bem aceita pela
maioria dos espíritas, como a mais racional e a mais concorde com a soberana justiça de Deus, mas também foi
confirmada pela generalidade das instruções que os Espíritos deram sobre o assunto. O mesmo se verificou com a
que concerne à origem da raca adâmica.
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progresso, lá estariam deslocados e constituiriam um obstáculo à marcha providencial das coisas.
Foram, em conseqüência, desterrados de lá e substituídos por outros que isso mereceram.
Relegando aquela raça para esta terra de labor e de sofrimentos, teve Deus razão para lhe dizer:
«Dela tirarás o alimento com o suor da tua fronte.»
Na sua mansuetude, prometeu-lhe que lhe enviaria um Salvador, isto é, um que a esclareceria
sobre o caminho que lhe cumpria tomar, para sair desse lugar de miséria, desse inferno, e ganhar
a felicidade dos eleitos. Esse Salvador ele, com efeito, lho enviou, na pessoa do Cristo, que lhe
ensinou a lei de amor e de caridade que ela desconhecia e que seria a verdadeira âncora de
salvação.
É igualmente com o objetivo de fazer que a Humanidade se adiante em determinado sentido que
Espíritos superiores, embora sem as qualidades do Cristo, encarnam de tempos a tempos na Terra
para desempenhar missões especiais, proveitosas, simultaneamente, ao adiantamento pessoal
deles, se as cumprirem de acordo com os desígnios do Criador.
46. - Sem a reencarnação, a missão do Cristo seria um contra-senso, assim como a promessa feita
por Deus. Suponhamos, com efeito, que a alma de cada homem seja criada por ocasião do
nascimento do corpo e não faça mais do que aparecer e desaparecer da Terra: nenhuma relação
haveria entre as que vieram desde Adão até Jesus Cristo, nem entre as que vieram depois; todas
são estranhas umas às outras. A promessa que Deus fez de um Salvador não poderia entender-se
com os descendentes de Adão, uma vez que suas almas ainda não estavam criadas. Para que a
missão do Cristo pudesse corresponder às palavras de Deus, fora mister se aplicassem às mesmas
almas.
Se estas são novas, não podem estar maculadas pela falta do primeiro pai, que é apenas pai
carnal e não pai espiritual. A não ser assim, Deus houvera criado almas com a mácula de uma
falta que não podia deixar nelas vestígio, pois que elas não existiam. A doutrina vulgar do
pecado original implica, conseguintemente, a necessidade de uma relação entre as almas do
tempo do Cristo e as do tempo de Adão; implica, portanto, a reencarnação.
Dizei que todas essas almas faziam parte da colônia de Espíritos exilados na Terra ao tempo de
Adão e que se achavam manchadas dos vícios que lhes acarretaram ser excluídas de um mundo
melhor e tereis a única interpretação racional do pecado original, pecado peculiar a cada
indivíduo e não resultado da responsabilidade da falta de outrem a quem ele jamais conheceu.
Dizei que essas almas ou Espíritos renascem diversas vezes na Terra para a vida corpórea, a fim
de progredirem, depurando-se; que o Cristo veio esclarecer essas mesmas almas, não só acerca
de suas vidas passadas, como também com relação às suas vidas ulteriores e então, mas só então,
lhe dareis à missão um sentido real e sério, que a razão pode aceitar.
47. - Um exemplo familiar, mas frisante pela analogia, ainda mais compreensíveis tornará os
princípios que acabam de ser expostos.
A 24 de maio de 1861, a fragata Ifigênia transportou à Nova Caledônia uma companhia
disciplinar composta de 291 homens. À chegada, o comandante lhes baixou uma ordem do dia
concebida assim:
«Pondo os pés nesta terra longínqua, já sem dúvida compreendestes o papel que vos está
reservado.
«A exemplo dos bravos soldados da nossa marinha, que servem sob as vossas vistas, ajudar-noseis a levar com brilho o facho da civilização ao seio das tribos selvagens da Nova Caledônia.
Não é uma bela e nobre missão, pergunto? Desempenhá-la-eis dignamente.
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«Escutai a palavra e os conselhos dos vossos chefes. Estou à frente deles. Entendei bem as
minhas palavras.
«A escolha do vosso comandante, dos vossos oficiais, dos vossos suboficiais e cabos constitui
garantia certa de que todos os esforços serão tentados para fazer-vos excelentes soldados, digo
mais: para vos elevar à altura de bons cidadãos e vos transformar em colonos honrados, se o
quiserdes.
«A nossa disciplina é severa e assim tem que ser. Colocada em nossas mãos, ela será firme e
inflexível, ficai sabendo, do mesmo modo que, justa e paternal, saberá distinguir o erro do vício e
da degradação... »
Aí tendes um punhado de homens expulsos, pelo seu mau proceder, de um país civilizado e
mandados, por punição, para o meio de um povo bárbaro. Que lhes diz o chefe? - «Infringistes as
leis do vosso país; nele vos tornastes causa de perturbação e escândalo e fostes expulsos;
mandam-vos para aqui, mas aqui podeis resgatar o vosso passado; podeis, pelo trabalho, criarvos aqui uma posição honrosa e tornar-vos cidadãos honestos. Tendes uma bela missão a
cumprir: levar a civilização a estas tribos selvagens. A disciplina será severa, mas justa, e
saberemos distinguir os que procederem bem. Tendes nas mãos a vossa sorte; podeis melhorá-la,
se o quiserdes, porque tendes o livre-arbítrio.»
Para aqueles homens, lançados ao seio da selvajaria, a mãe-pátria não é um paraíso que eles
perderam pelas suas próprias faltas e por se rebelarem contra a lei? Naquela terra distante, não
são eles anjos decaídos? A linguagem do chefe não é idêntica à de que usou Deus falando aos
Espíritos exilados na Terra: «Desobedecestes às minhas leis e, por isso, eu vos expulsei do
mundo onde podíeis viver ditosos e em paz. Aqui, estareis condenados ao trabalho;
mas, podereis, pelo vosso bom procedimento, merecer perdão e reganhar a pátria que perdestes
por vossa falta, isto é, o Céu»?
48. - À primeira vista, a idéia de decaimento parece em contradição com o princípio segundo o
qual os Espíritos não podem retrogradar. Deve-se, porém, considerar que não se trata de um
retrocesso ao estado primitivo. O Espírito, ainda que numa posição inferior, nada perde do que
adquiriu; seu desenvolvimento moral e intelectual é o mesmo, qualquer que seja o meio onde se
ache colocado. Ele está na situação do homem do mundo condenado à prisão por seus delitos.
Certamente, esse homem se encontra degradado, decaído, do ponto de vista social, mas não se
torna nem mais estúpido, nem mais ignorante.
49. - Será crível, perguntamos agora, que esses homens mandados para a Nova Caledônia vão
transformar-se de súbito em modelos de virtude? Que vão abjurar repentinamente seus erros do
passado? Para supor tal coisa, fora necessário desconhecer a Humanidade. Pela mesma razão, os
Espíritos da raça adâmica, uma vez transplantados para a terra do exílio, não se despojaram
instantaneamente do seu orgulho e de seus maus instintos; ainda por muito tempo conservaram
as tendências que traziam, um resto da velha levedura. Ora, não é esse o pecado original?
Perda do paraíso12
13. - CAPÍTULO II. - 9. Ora, o Senhor Deus plantara desde o começo um jardim de delícias, no
qual pôs o homem que ele formara. - O Senhor Deus também fizera sair da terra toda espécie de
12
Em seguida a alguns versículos se acha a tradução literal do texto hebreu, exprimindo mais fielmente o
pensamento primitivo. O sentido alegórico ressalta assim mais claramente.
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árvores belas ao olhar e cujo fruto era agradável ao paladar e, no meio do paraíso 13, a árvore
da vida, com a árvore da ciência do bem e do mal. (Ele fez sair, Jeová Eloim, da terra (min
haadama) toda árvore bela de ver-se e boa para comer-se e a árvore da vida (vehetz hachayim)
no meio do jardim e a árvore da ciência do bem e do mal.)
15. - O Senhor tomou, pois, do homem e o colocou em o paraíso de delícias, a fim de que o
cultivasse e guardasse. - 16. Deu-lhe também esta ordem e lhe disse: Come de todas as árvores
do paraíso. (Ele ordenou, Jeová Eloim, ao homem (hal haadam) dizendo: De toda árvore do
jardim podes comer.) - 17. Mas, não comas absolutamente o fruto da árvore da ciência do bem e
do mal; porquanto, logo que o comeres, morrerás com toda a certeza. (E da árvore do bem e do
mal (oumehetz hadaat tob vara) não comerás, pois que no dia em que dela comeres morrerás.)
14. – CAPÍTULO III. - 1. Ora, a serpente era o mais fino de todos os animais que o Senhor Deus
formara na Terra. E ela disse à mulher: Por que vos ordenou Deus que não comêsseis os frutos
de todas as árvores do paraíso? (E a serpente (nâhâsch) era mais astuto do que todos os
animais terrestres que Jeová Eloim havia feito; ela disse à mulher (el haïscha): Terá dito Eloim:
Não comereis de nenhuma árvore do jardim?) - 2. A mulher respondeu: Comemos dos frutos de
todas as árvores que estão no paraíso.
(Disse ela, a mulher, à serpente, do fruto (miperi) das árvores do jardim podemos comer.) - 3.
Mas, quanto ao fruto da árvore que está no meio do paraíso, Deus nos ordenou que não
comêssemos dele e que não lhe tocássemos, para que não corramos o perigo de morrer. - 4. A
serpente replicou à mulher: Certamente não morrereis. - Mas, é que Deus sabe que, assim
houverdes comido desse fruto, vossos olhos se abrirão e sereis como deuses, conhecendo o bem
e o mal.
6. A mulher considerou então que o fruto daquela árvore era bom de comer; que era belo e
agradável à vista. E, tomando dele, o comeu e o deu a seu marido, que também comeu. (Ela viu,
a mulher, que ela era boa, a árvore como alimento, e que era desejável a árvore para
compreender (léaskil), e tomou de seu fruto, etc.)
8. E como ouvissem a voz do Senhor Deus, que passeava à tarde pelo jardim, quando sopra um
vento brando, eles se retiraram para o meio das árvores do paraíso, a fim de se ocultarem de
diante da sua face.
9. Então o Senhor Deus chamou Adão e lhe disse: Onde estás? - 10. Adão lhe respondeu: Ouvi a
tua vos no paraíso e tive medo, porque estava nu, essa a razão por que me escondi. - 11. O
Senhor lhe retrucou: E como soubeste que estavas nu, senão porque comeste o fruto da árvore
da qual eu vos proibi que comêsseis? - 12. Adão lhe respondeu: A mulher que me deste por
companheira me apresentou o fruto dessa árvore e eu dele comi. - 13. O Senhor Deus disse à
mulher: Por que fizeste isso? Ela respondeu: A serpente me enganou e eu comi desse fruto.
14. Então, o Senhor Deus disse à serpente: Por teres feito isso, serás maldita entre todos os
animais e todas as bestas da terra; rojar-te-ás sobre o ventre e comerás a terra por todos os
dias de tua vida. 15. Porei uma inimizade entre ti e a mulher, entre a sua raça e a tua. Ela te
esmagará a cabeça e tu tentarás morder-lhe o calcanhar.
13
"Paraíso", do latim paradisus, derivado do grego: paradeisos, jardim, vergel, lugar plantado de árvores. O termo
hebreu empregado na Gênese é hagan, que tem a mesma significação.
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16. Deus disse também à mulher: Afligir-te-ei com muitos males durante a tua gravidez; parirás
com dor; estarás sob a dominação de teu marido e ele te dominará.
17. Disse em seguida a Adão: Por haveres escutado a voz de tua mulher e haveres comido do
fruto da árvore de que te proibi que comesses, a terra te será maldita por causa do que fizeste e
só com muito trabalho tirarás dela com que te alimentes, durante toda a tua vida. - 18. Ela te
produzirá espinhos e sarças e te alimentarás com a erva da terra. - 19. E comerás o teu pão com
o suor do teu rosto, até que voltes à terra donde foste tirado, porque és pó e em pó te tornarás.
20. E Adão deu à sua mulher o nome de Eva, que significa a vida, porque ela era a mãe de todos
os viventes.
21. O Senhor Deus também fez para Adão e sua mulher vestiduras de peles com que os cobriu. 22. E disse: Eis aí Adão feito um de nós, sabendo o bem e o mal.
Impeçamos, pois, agora, que ele deite a mão à árvore da vida, que também tome do seu fruto e
que, comendo desse fruto, viva eternamente. (Ele disse, Jeová Eloim: Eis aí, o homem foi como
um de nós para o conhecimento do bem e do mal; agora ele pode estender a mão e tomar da
árvore da vida (veata pen ischlachyado velakach mehetz hachayim); comerá dela e viverá
eternamente.)
23. O Senhor Deus o fez sair do jardim de delicias, a fim de que fosse trabalhar no cultivo da
terra donde ele fora tirado.
24. E, tendo-o expulsado, colocou querubins14 diante do jardim de delícias, os quais faziam luzir
uma espada de fogo, para guardarem o caminho que levava à árvore da vida.
15. – Sob uma imagem pueril e às vezes ridícula, se nos ativermos à forma, a alegoria oculta
freqüentemente as maiores verdades. Haverá fábula mais absurda, à primeira vista, do que a de
Saturno, o deus que devorava pedras, tomando-as por seus filhos? Todavia, que de mais
profundamente filosófico e verdadeiro do que essa figura, se lhe procuramos o sentido moral!
Saturno é a personificação do tempo; sendo todas as coisas obra do tempo, ele é o pai de tudo o
que existe; mas, também, tudo se destrói com o tempo.
Saturno a devorar pedras é o símbolo da destruição, pelo tempo, dos mais duros corpos, seus
filhos, visto que se formaram com o tempo. E quem, segundo essa mesma alegoria, escapa a
semelhante destruição? Somente Júpiter, símbolo da inteligência superior, do princípio espiritual,
que é indestrutível. É mesmo tão natural essa imagem, que, na linguagem moderna, sem alusão à
Fábula antiga, se diz, de uma coisa que afinal se deteriorou, ter sido devorada pelo tempo,
carcomida, devastada pelo tempo.
Toda a mitologia pagã, aliás, nada mais é, em realidade, do que um vasto quadro alegórico das
diversas faces, boas e más, da Humanidade. Para quem lhe busca o espírito, é um curso completo
da mais alta filosofia, como acontece com as modernas fábulas. O absurdo estava em tomarem a
forma pelo fundo.
16. - Outro tanto se dá com a Gênese, onde se tem que perceber grandes verdades morais
debaixo das figuras materiais que, tomadas ao pé da letra, seriam tão absurdas como se, em
nossas fábulas, tomássemos em sentido literal as cenas e os diálogos atribuídos aos animais.
14
Do hebreu cherub, keroub, boi, charab, lavrar; anjos do segundo coro da primeira hierarquia, que eram
representados com quatro asas, quatro faces e pés de boi.
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Adão personifica a Humanidade; sua falta individualiza a fraqueza do homem, em quem
predominam os instintos materiais a que ele não sabe resistir15.
A árvore, como árvore de vida, é o emblema da vida espiritual; como árvore da Ciência, é o da
consciência, que o homem adquire, do bem e do mal, pelo desenvolvimento da sua inteligência e
do livre-arbítrio, em virtude do qual ele escolhe entre um e outro. Assinala o ponto em que a
alma do homem, deixando de ser guiada unicamente pelos instintos, toma posse da sua liberdade
e incorre na responsabilidade dos seus atos.
O fruto da árvore simboliza o objeto dos desejos materiais do homem; é a alegoria da cobiça e da
concupiscência; concretiza, numa figura única, os motivos de arrastamento ao mal. O comer é
sucumbir à tentação. A árvore se ergue no meio do jardim de delícias, para mostrar que a
sedução está no seio mesmo dos prazeres e para lembrar que, se dá preponderância aos gozos
materiais, o homem se prende à Terra e se afasta do seu destino espiritual16. (2)
A morte de que ele é ameaçado, caso infrinja a proibição que se lhe faz, é um aviso das
conseqüências inevitáveis, físicas e morais, decorrentes da violação das leis divinas que Deus lhe
gravou na consciência. É por demais evidente que aqui não se trata da morte corporal, pois que,
depois de cometida a falta, Adão ainda viveu longo tempo, mas, sim, da morte espiritual, ou, por
outras palavras, da perda dos bens que resultam do adiantamento moral, perda figurada pela sua
expulsão do jardim de delícias.
17. - A serpente está longe hoje de ser tida como tipo da astúcia. Ela, pois, entra aqui mais pela
sua forma do que pelo seu caráter, como alusão à perfídia dos maus conselhos, que se insinuam
como a serpente e da qual, por essa razão, o homem, muitas vezes, não desconfia. Ao demais, se
a serpente, por haver enganado a mulher, é que foi condenada a andar de rojo sobre o ventre,
dever-se-á deduzir que antes esse animal tinha pernas; mas, neste caso, não era serpente. Por que,
então, se há de impor à fé ingênua e crédula das crianças, como verdades, tão evidentes
alegorias, com o que, falseando-se-lhes o juízo, se faz que mais tarde venham a considerar a
Bíblia um tecido de fábulas absurdas?
Deve-se, além disso, notar que o termo hebreu nâhâsch, traduzido por serpente, vem da raiz
nâhâsch, que significa: fazer encantamentos, adivinhar as coisas ocultas, podendo, pois,
significar: encantador, adivinho. Com esta acepção, ele é encontrado na própria Gênese, cap.
XLIV, vv. 5 e 15, a propósito da taça que José mandou esconder no saco de Benjamim: «A taça
que roubaste é a em que meu Senhor bebe e de que se serve para adivinhar (nâhâsch) 17. - Ignoras
que não há quem me iguale na ciência de adivinhar (nâhâsch)?» - No livro Números, cap. XXIII,
v. 23: «Não há encantamentos (nâhâsch) em Jacob, nem adivinhos em Israel.» Daí o haver a
15
Está hoje perfeitamente reconhecido que a palavra hebréia haadam não é um nome próprio, mas significa: o
homem em geral, a Humanidade, o que destrói toda a estrutura levantada sobre a personalidade de Adão.
16
Em nenhum texto o fruto é especializado na maçã, palavra que só se encontra nas versões infantis. O termo do
texto hebreu é peri, que tem as mesmas acepções que em francês, sem determinação de espécie e pode ser tomado
em sentido material, moral, alegórico, em sentido próprio e figurado. Para os Israelitas, não há interpretação
obrigatória; quando uma palavra tem muitas acepções, cada um a entende como quer, contanto que a interpretação
não seja contraria à gramática. O termo peri foi traduzido em latim por malum, que se aplica tanto à maçã, como a
qualquer espécie de frutos. Deriva do grego melon, particípio do verbo melo, interessar, cuidar, atrair.
17
Deste fato se poderá inferir que os egípcios conheciam a mediunidade pelo copo dágua? (Revue Spirite, de
junho do 1868, pág. 161.)
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palavra nâhâsch tomado também a significação de serpente, réptil que os encantadores tinham a
pretensão de encantar, ou de que se serviam em seus encantamentos.
A palavra nâhâsch só foi traduzida por serpente na versão dos Setenta - os quais, segundo
Hutcheson, corromperam o texto hebreu em muitos lugares - versão essa escrita em grego no
segundo século da era cristã. As suas inexatidões resultaram, sem dúvida, das modificações que a
língua hebraica sofrera no intervalo transcorrido, porquanto o hebreu do tempo de Moisés era
uma língua morta, que diferia do hebreu vulgar, tanto quanto o grego antigo e o árabe literário
diferem do grego e do árabe modernos18.
É, pois, provável que Moisés tenha apresentado como sedutor da mulher o desejo de conhecer as
coisas ocultas, suscitado pelo Espírito de adivinhação, o que concorda com o sentido primitivo
da palavra nâhâsch, adivinhar, e, por outro lado, com estas palavras: «Deus sabe que, logo que
houverdes comido desse fruto, vossos olhos se abrirão e sereis como deuses. - Ela, a mulher, viu
que era cobiçável a árvore para compreender (léaskil) e tomou do seu fruto.»
Não se deve esquecer que Moisés queria proscrever de entre os hebreus a arte da adivinhação
praticada pelos egípcios, como o prova o haver proibido que aqueles interrogassem os mortos e o
Espírito Píton. (O Céu e o Inferno segundo o Espiritismo, cap. XII.)
18. - A passagem que diz: «O Senhor passeava pelo jardim à tarde, quando se levanta vento
brando», é uma imagem ingênua e um tanto pueril, que a crítica não deixou de assinalar; mas,
nada tem que surpreenda, se nos reportamos à idéia que os hebreus dos tempos primitivos faziam
de Deus. Para aquelas inteligências frustas, incapazes de conceber abstrações, Deus havia de ter
uma forma concreta e eles tudo referiam à Humanidade, como único ponto que conheciam.
Moisés, por isso, lhes falava como a crianças, por meio de imagens sensíveis.
No caso de que se trata, tem-se personificada a Potência soberana, como os pagãos
personificavam, em figuras alegóricas, as virtudes, os vícios e as idéias abstratas. Mais tarde, os
homens despojaram da forma a idéia, do mesmo modo que a criança, tornada adulta, procura o
sentido moral dos contos com que a acalentaram. Deve-se, portanto, considerar essa passagem
como uma alegoria, figurando a Divindade a vigiar em pessoa os objetos da sua criação. O
grande rabino Wogue a traduziu assim: «Eles ouviram a voz do Eterno Deus, percorrendo o
jardim, do lado donde vem o dia.»
19. - Se a falta de Adão consistiu literalmente em ter comido um fruto, ela não poderia,
incontestavelmente, pela sua natureza quase pueril, justificar o rigor com que foi punida. Não se
poderia tampouco admitir, racionalmente, que o fato seja qual geralmente o supõem; se o fosse.
teríamos Deus, considerando-o irremissível crime, a condenar a sua própria obra, pois que ele
criara o homem para a propagação. Se Adão houvesse entendido assim a proibição de tocar no
fruto da árvore e com ela se houvesse conformado escrupulosamente, onde estaria a Humanidade
e que teria sido feito dos desígnios do Criador?
Deus não criara Adão e Eva para ficarem sós na Terra; a prova disso está nas próprias palavras
que lhes dirige logo depois de os ter formado, quando eles ainda estavam no paraíso terrestre:
«Deus os abençoou e lhes disse: Crescei e multiplicai-vos, enchei a Terra e submetei-a ao vosso
domínio.»
18
O termo nâhâsch existia na língua egípcia, com a significação de negro, provavelmente porque os negros tinham
o dom dos encantamentos e da adivinhação. Talvez também por isso é que as esfinges, de origem assíria, eram
representadas por uma figura de negro.
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(Gênese, cap. 1, v. 28.) Uma vez que a multiplicação era lei já no paraíso terrenal, a expulsão
deles dali não pode ter tido como causa o fato suposto.
O que deu crédito a essa suposição foi o sentimento de vergonha que Adão e Eva manifestaram
ante o olhar de Deus e que os levou a se ocultarem.
Mas, essa própria vergonha é uma figura por comparação: simboliza a confusão que. todo
culpado experimenta em presença de quem foi por ele ofendido.
20. - Qual, então, em definitiva, a falta tão grande que mereceu acarretar a reprovação perpétua
de todos os descendentes daquele que a cometeu?
Caim, o fratricida, não foi tratado tão severamente. Nenhum teólogo a pode definir logicamente,
porque todos, apegados à letra, giraram dentro de um circulo vicioso.
Sabemos hoje que essa falta não é um ato isolado, pessoal, de um indivíduo, mas que
compreende, sob um único fato alegórico, o conjunto das prevaricações de que a Humanidade da
Terra, ainda imperfeita, pode tornar-se culpada e que se resumem nisto: infração da lei de Deus.
Eis por que a falta do primeiro homem, simbolizando este a Humanidade, tem por símbolo um
ato de desobediência.
21. - Dizendo a Adão que ele tiraria da terra a alimentação com o suor de seu rosto, Deus
simboliza a obrigação do trabalho; mas, por que fez do trabalho uma punição? Que seria da
inteligência do homem, se ele não a desenvolvesse pelo trabalho? Que seria da Terra, se não
fosse fecundada, transformada, saneada pelo trabalho inteligente do homem?
Lá está dito (Gênese, cap. II, vv. 5 e 7): «O Senhor Deus ainda não havia feito chover sobre a
Terra e não havia nela homens que a cultivassem. O Senhor formou então, do limo da terra, o
homem.» Essas palavras, aproximadas destas outras: Enchei a Terra, provam que o homem,
desde a sua origem, estava destinado a ocupar toda a Terra e a cultivá-la, assim como, ao demais,
que o paraíso não era um lugar circunscrito, a um canto do globo. Se a cultura da terra houvesse
de ser uma conseqüência da falta de Adão, seguir-se-ia que, se Adão não tivesse pecado, a Terra
permaneceria inculta e os desígnios de Deus não se teriam cumprido.
Por que disse ele à mulher que, em conseqüência de haver cometido a falta, pariria com dor?
Como pode a dor do parto ser um castigo, quando é um efeito do organismo e quando está
provado, fisiologicamente que é uma necessidade? Como pode ser punição uma coisa que se
produz segundo as leis da Natureza? É o que os teólogos absolutamente ainda não explicaram e
que não poderão explicar, enquanto não abandonarem o ponto de vista em que se colocaram.
Entretanto, podem justificar-se aquelas palavras que parecem tão contraditórias.
22. - Notemos, antes de tudo, que se, no momento de serem criados os dois, as almas de Adão e
Eva tivessem vindo do nada, como ainda se ensina, eles haviam de ser bisonhos em todas as
coisas; haviam, pois, de ignorar o que é morrer. Estando sós na Terra, como estavam, enquanto
viveram no paraíso, não tinham assistido à morte de ninguém. Como, então, teriam podido
compreender em que consistia a ameaça de morte que Deus lhes fazia? Como teria Eva podido
compreender que parir com dor seria uma punição, visto que, tendo acabado de nascer para a
vida, ela jamais tivera filhos e era a única mulher existente no mundo?
Nenhum sentido, portanto, deviam ter, para Adão e Eva, as palavras de Deus. Mal surgidos do
nada, eles não podiam saber como nem por que haviam surgido dali; não podiam compreender
nem o Criador nem o motivo da proibição que lhes era feita. Sem nenhuma experiência das
condições da vida, pecaram como crianças que agem sem discernimento, o que ainda mais
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incompreensível torna a terrível responsabilidade que Deus fez pesar sobre eles e sobre a
Humanidade inteira.
23. - Entretanto, o que constitui para a Teologia um beco sem saída, o Espiritismo o explica sem
dificuldade e de maneira racional, pela anterioridade da alma e pela pluralidade das existências,
lei sem a qual tudo é mistério e anomalia na vida do homem. Com efeito, admitamos que Adão e
Eva já tivessem vivido e tudo logo se justifica: Deus não lhes fala como a crianças, mas como a
seres em estado de o compreenderem e que o compreendem, prova evidente de que ambos
trazem aquisições anteriormente realizadas. Admitamos, ao demais, que hajam vivido em um
mundo mais adiantado e menos material do que o nosso, onde o trabalho do Espírito substituía o
do corpo; que, por se haverem rebelado contra a lei de Deus, figurada na desobediência, tenham
sido afastados de lá e exilados, por punição, para a Terra, onde o homem, pela natureza do globo,
é constrangido a um trabalho corporal e reconheceremos que a Deus assistia razão para lhes
dizer: «No mundo onde, daqui em diante, ides viver, cultivareis a terra e dela tirareis o alimento,
com o suor da vossa fronte»; e, à mulher: «Parirás com dor», porque tal é a condição desse
mundo. (Cap. XI, nos 31 e seguintes.)
O paraíso terrestre, cujos vestígios têm sido inutilmente procurados na Terra, era, por
conseguinte, a figura do mundo ditoso, onde vivera Adão, ou, antes, a raça dos Espíritos que ele
personifica. A expulsa o do paraíso marca o momento em que esses Espíritos vieram encarnar
entre os habitantes do mundo terráqueo e a mudança de situação foi a conseqüência da expulsão.
O anjo que, empunhando uma espada flamejante, veda a entrada do paraíso simboliza a
impossibilidade em que se acham os Espíritos dos mundos inferiores, de penetrar nos mundos
superiores, antes que o mereçam pela sua depuração. (Veja-se, adiante, o cap. XIV, nos 8 e
seguintes.)
24. - Caim, depois do assassínio de Abel, responde ao Senhor: A minha iniqüidade é
extremamente grande, para que me possa ser perdoada. - Vós me expulsais hoje de cima da Terra
e eu me irei ocultar da vossa face. Irei fugitivo e vagabundo pela Terra e qualquer um então que
me encontre matar-me-á. - O Senhor lhe respondeu: "Não, isto não se dará, porquanto
severamente punido será quem matar Caim." E o Senhor pôs um sinal sobre Caim, a fim de que
não o matassem os que viessem a encontrá-lo.
Tendo-se retirado de diante do Senhor, Caim ficou vagabundo pela Terra e habitou a região
oriental do Éden. - Havendo conhecido sua mulher, ela concebeu e pariu Henoch. Ele construiu
(vaïehi bôné; literalmente: estava construindo) uma cidade a que chamou Henoch (Enoquia) do
nome de seu filho. (Gênese, cap. IV, vv. 13 a 16.) 25. - Se nos apegarmos à letra da Gênese, eis
as conseqüências a que chegaremos: Adão e Eva estavam sós no mundo, depois de expulsos do
paraíso terrestre; só posteriormente tiveram os dois filhos Caim e Abel. Ora, tendo-se Caim
retirado para outra região depois de haver assassinado o irmão, não tornou a ver seus pais, que de
novo ficaram isolados. Só muito mais tarde, na idade de cento e trinta anos, foi que Adão teve
um terceiro filho, que se chamou Seth, depois de cujo nascimento, ele ainda viveu, segundo a
genealogia bíblica, oitocentos anos, e teve mais filhos e filhas.
Quando, pois, Caim foi estabelecer-se a leste do Éden, somente havia na Terra três pessoas: seu
pai e sua mãe, e ele, sozinho, de seu lado. Entretanto, Caim teve mulher e um filho. Que mulher
podia ser essa e onde pudera ele desposá-la? O texto hebreu diz: Ele estava construindo cidade e
não: ele construiu, o que indica ação presente e não ulterior. Mas, uma cidade pressupõe a
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existência de habitantes, visto não ser de presumir que Caim a fizesse para si, sua mulher e seu
filho, nem que a pudesse edificar sozinho.
Dessa própria narrativa, portanto, se tem de inferir que a região era povoada. Ora, não podia sêlo pelos descendentes de Adão, que então se reduziam a um só: Caim.
Aliás, a presença de outros habitantes ressalta igualmente destas palavras de Caim: «Serei
fugitivo e vagabundo e quem quer que me encontre matar-me-á», e da resposta que Deus lhe deu.
Quem poderia ele temer que o matasse e que utilidade teria o sinal que Deus lhe pôs para
preservá-lo de ser morto, uma vez que ele a ninguém iria encontrar? Ora, se havia na Terra
outros homens afora a família de Adão, é que esses homens aí estavam antes dele, donde se
deduz esta conseqüência, tirada do texto mesmo da Gênese: Adão não é nem o primeiro, nem o
único pai do gênero humano. (Cap. XI, nº 34.)19
26. - Eram necessários os conhecimentos que o Espiritismo ministrou acerca das relações do
princípio espiritual com o princípio material, acerca da natureza da alma, da sua criação em
estado de simplicidade e de ignorância, da sua união com o corpo, da sua indefinida marcha
progressiva através de sucessivas existências e através dos mundos, que São outros tantos
degraus da senda do aperfeiçoamento, acerca da sua gradual libertação da influência da matéria,
mediante o uso do livre-arbítrio, da causa dos seus pendores bons ou maus e de suas aptidões, do
fenômeno do nascimento e da morte, da situação do Espírito na erraticidade e, finalmente, do
futuro como prêmio de seus esforços por se melhorar e da sua perseverança no bem, para que se
fizesse luz sobre todas as partes da Gênese espiritual.
Graças a essa luz, o homem sabe doravante donde vem, para onde vai, por que está na Terra e
por que sofre. Sabe que tem nas mãos o seu futuro e que a duração do seu cativeiro neste mundo
unicamente dele depende. Despida da alegoria acanhada e mesquinha, a Gênese se lhe apresenta
grande e digna da majestade, da bondade e da justiça do Criador. Considerada desse ponto de
vista, ela confundirá a incredulidade e triunfará.
Fontes de consulta
1. Bíblia sagrada. Gênisis, do antigo testamento, 2:9 a 17 e 3:1 a 21.
2. Allan Kardec. A Gênese. Capítulo 11, itens 38 a 49; capítulo 12, itens 2 a 12 e 15 a 26.
19
Não é nova esta idéia. La Peyrère, sábio teólogo do século dezessete, em seu livro Preadamitas, escrito em latim
e publicado em 1655, extraiu do texto original da Bíblia, adulterado pelas traduções, a prova evidente de que a Terra
era habitada antes da vinda de Adão e essa opinião é hoje a de muitos eclesiásticos esclarecidos.
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6.3 - Determinismo e Fatalidade
Fatalidade
851. Haverá fatalidade nos acontecimentos da vida, conforme ao sentido que se dá a este
vocábulo? Quer dizer: todos os acontecimentos são predeterminados? E, neste caso, que vem a
ser do livre-arbítrio?
“A fatalidade existe unicamente pela escolha que o Espírito fez, ao encarnar, desta ou daquela
prova para sofrer. Escolhendo-a, institui para si uma espécie de destino, que é a conseqüência
mesma da posição em que vem a achar-se colocado. Falo das provas físicas, pois, pelo que toca
às provas morais e às tentações, o Espírito, conservando o livre-arbítrio quanto ao bem e ao mal,
é sempre senhor de ceder ou de resistir. Ao vê-lo fraquejar, um bom Espírito pode vir-lhe em
auxílio, mas não pode influir sobre ele de maneira a dominar-lhe a vontade. Um Espírito mau,
isto é, inferior, mostrando-lhe, exagerando aos seus olhos um perigo físico, o poderá abalar e
amedrontar. Nem por isso, entretanto, a vontade do Espírito encarnado deixa de se conservar
livre de quaisquer peias.”
852. Há pessoas que parecem perseguidas por uma fatalidade, independente da maneira por
que procedem. Não lhes estará no destino o infortúnio?
“São, talvez, provas que lhe caiba sofrer e que elas escolheram. Porém, ainda aqui lançais à conta
do destino o que as mais das vezes é apenas conseqüência de vossas próprias faltas. Trata de ter
pura a consciência em meio dos males que te afligem e já bastante consolado te sentirás.”
As idéias exatas ou falsas que fazemos das coisas nos levam a ser bem ou mal sucedidos, de
acordo com o nosso caráter e a nossa posição social. Achamos mais simples e menos humilhante
para o nosso amor-próprio atribuir antes à sorte ou ao destino os insucessos que experimentamos,
do que à nossa própria falta. É certo que para isso contribui algumas vezes a influência dos
Espíritos, mas também o é que podemos sempre forrar-nos a essa influência, repelindo as idéias
que eles nos sugerem, quando más.
853. Algumas pessoas só escapam de um perigo mortal para cair em outro. Parece que não
podem escapar da morte. Não há nisso fatalidade?
“Fatal, no verdadeiro sentido da palavra, só o instante da morte o é. Chegado esse momento, de
uma forma ou doutra, a ele não podeis furtar-vos.”
a) - Assim, qualquer que seja o perigo que nos ameace, se a hora da morte ainda não chegou,
não morreremos?
“Não; não perecerás e tens disso milhares de exemplos. Quando, porém, soe a hora da tua
partida, nada poderá impedir que partas. Deus sabe de antemão de que gênero será a morte do
homem e muitas vezes seu Espírito também o sabe, por lhe ter sido isso revelado, quando
escolheu tal ou qual existência.”
854. Do fato de ser infalível a hora da morte, poder-se-á deduzir que sejam inúteis as
precauções para evitá-la?
“Não, visto que as precauções que tomais vos são sugeridas com o fito de evitardes a morte que
vos ameaça. São um dos meios empregados para que ela não se dê.”
855. Com que fim nos faz a Providência correr perigos que nenhuma conseqüência devem ter?
“O fato de ser a tua vida posta em perigo constitui um aviso que tu mesmo desejaste, a fim de te
desviares do mal e te tornares melhor. Se escapas desse perigo, quando ainda sob a impressão do
risco que correste, de te melhorares, conforme seja mais ou menos forte sobre ti a influência dos
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Espíritos bons. Sobrevindo o mau Espírito (digo mau, subentendendo o mal que ainda existe
nele), entras a pensar que do mesmo modo escaparás a outros perigos e deixas que de novo tuas
paixões se desencadeiem. Por meio dos perigos que correis, Deus vos lembra a vossa fraqueza e
a fragilidade da vossa existência. Se examinardes a causa e a natureza do perigo, verificareis que,
quase sempre, suas conseqüências teriam sido a punição de uma falta cometida ou da
negligência no cumprimento de um dever. Deus, por essa forma, exorta o Espírito a cair em si e a
se emendar.” (526-532)
856. Sabe o Espírito antecipadamente de que gênero será sua morte?
“Sabe que o gênero de vida que escolheu o expõe mais a morrer desta do que daquela maneira.
Sabe igualmente quais a lutas que terá de sustentar para evitá-lo e que, se Deus o permitir, não
sucumbirá.”
857. Há homens que afrontam os perigos dos combates, persuadidos, de certo modo, de que a
hora não lhes chegou. Haverá algum fundamento para essa confiança?
“Muito amiúde tem o homem o pressentimento do seu fim, como pode ter o de que ainda não
morrerá. Esse pressentimento lhe vem dos Espíritos seus protetores, que assim o advertem para
que esteja pronto a partir, ou lhe fortalecem a coragem nos momentos em que mais dela
necessita. Pode vir-lhe também da intuição que tem da existência que escolheu, ou da missão que
aceitou e que sabe ter que cumprir.” (411-522)
858. Por que razão os que pressentem a morte a temem geralmente menos do que os outros?
“Quem teme a morte é o homem, não o Espírito. Aquele que a pressente pensa mais como
Espírito do que como homem. Compreende ser ela a sua libertação e espera-a.”
859. Com todos os acidentes, que nos sobrevêm no curso da vida, se dá o mesmo que com a
morte, que não pode ser evitada, quando tem que ocorrer?
“São de ordinário coisas muito insignificantes, de sorte que vos podeis prevenir deles e fazer
que os eviteis algumas vezes, dirigindo o vosso pensamento, pois nos desagradam os sofrimentos
materiais. Isso, porém, nenhuma importância tem na vida que escolhestes. A fatalidade,
verdadeiramente, só existe quanto ao momento em que deveis aparecer e desaparecer deste
mundo.”
a) - Haverá fatos que forçosamente devam dar-se e que os Espíritos não possam conjurar,
embora o queiram?
“Há, mas que tu viste e pressentiste quando, no estado de Espírito, fizeste a tua escolha. Não
creias, entretanto, que tudo o que sucede esteja escrito, como costumam dizer. Um
acontecimento qualquer pode ser a conseqüência de um ato que praticaste por tua livre vontade,
de tal sorte que, se não o houvesses praticado, o acontecimento não seria dado.
Imagina que queimas o dedo. Isso nada mais é senão resultado da tua imprudência e efeito da
matéria. Só as grandes dores, os fatos importantes e capazes de influir no moral, Deus os prevê,
porque são úteis à tua depuração e à tua instrução.”
860. Pode o homem, pela sua vontade e por seus atos, fazer que se não dêem acontecimentos
que deveriam verificar-se e reciprocamente?
“Pode-o, se essa aparente mudança na ordem dos fatos tiver cabimento na seqüência da vida que
ele escolheu. Acresce que, para fazer o bem, como lhe cumpre, pois que isso constitui o objetivo
único da vida, facultado lhe é impedir o mal, sobretudo aquele que possa concorrer para a
produção de um mal maior.”
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861. Ao escolher a sua existência, o Espírito daquele que comete um assassínio sabia que viria a
ser assassino?
“Não. Escolhendo uma vida de lutas, sabe que terá ensejo de matar um de seus semelhantes, mas
não sabe se o fará, visto que ao crime precederá quase sempre, de sua parte, a deliberação de
praticá-lo. Ora, aquele que delibera sobre uma coisa é sempre livre de fazê-la, ou não. Se
soubesse previamente que, como homem, teria que cometer um crime, o Espírito estaria a isso
predestinado. Ficai, porém, sabendo que a ninguém há predestinado ao crime e que todo crime,
como qualquer outro ato, resulta sempre da vontade e do livre-arbítrio.
“Demais, sempre confundis duas coisas muito distintas: os sucessos materiais e os atos da vida
moral. A fatalidade, que por algumas vezes há, só existe com relação àqueles sucessos materiais,
cuja causa reside fora de vós e que independem da vossa vontade. Quanto aos da vida moral
esses emanam sempre do próprio homem que, por conseguinte, tem sempre a liberdade de
escolher. No tocante, pois, a esses atos, nunca há fatalidade.”
862. Pessoas existem que nunca logram bom êxito em coisa alguma, que parecem perseguidas
por um mau gênio em todos os seus empreendimentos. Não se pode chamar a isso fatalidade?
“Será uma fatalidade, se lhe quiseres dar esse nome, mas que decorre do gênero da existência
escolhida. É que essas pessoas quiseram ser provadas por uma vida de decepções, a fim de
exercitarem a paciência e a resignação. Entretanto, não creias seja absoluta essa fatalidade.
Resulta muitas vezes do caminho falso que tais pessoas tomam, em discordância com suas
inteligências e aptidões. Grandes probabilidades tem de se afogar quem pretender atravessar a
nada um rio, sem saber nadar. O mesmo se dá relativamente à maioria dos acontecimentos da
vida. Quase sempre obteria o homem bom êxito, se só tentasse o que estivesse em relação com as
suas faculdades. O que o perde são o seu amor-próprio e a sua ambição, que o desviam da senda
que lhe é própria e o fazem considerar vocação o que não passa de desejo de satisfazer a certas
paixões. Fracassa por sua culpa.
Mas, em vez de culpar-se a si mesmo, prefere queixar-se da sua estrela. Um, por exemplo, que
seria bom operário e ganharia honestamente a vida, mete-se a ser mau poeta e morre de fome.
Para todos haveria lugar no mundo, desde que cada um soubesse colocar-se no lugar que lhe
compete.”
863. Os costumes sociais não obrigam muitas vezes o homem a enveredar por um caminho de
preferência a outro e não se acha ele submetido à direção da opinião geral, quanto à escolha de
suas ocupações? O que se chama respeito humano não constitui óbice ao exercício do livrearbítrio?
“São os homens e não Deus quem faz os costumes sociais. Se eles a estes se submetem, é porque
lhes convêm. Tal submissão, portanto, representa um ato de livre-arbítrio, pois que, se o
quisessem, poderiam libertar-se de semelhante jugo. Por que, então, se queixam? Falece-lhes
razão para acusarem os costumes sociais. A culpa de tudo devem lançá-la ao tolo amor-próprio
de que vivem cheios e que os faz preferirem morrer de fome a infringi-los. Ninguém lhes leva
em conta esse sacrifício feito à opinião pública, ao passo que Deus lhes levará em conta o
sacrifício que fizerem de suas vaidades. Não quer isto dizer que o homem deva afrontar sem
necessidade aquela opinião, como fazem alguns em que há mais originalidade do que verdadeira
filosofia. Tanto desatino há em procurar alguém ser apontado a dedo, ou considerado animal
curioso, quanto acerto em descer voluntariamente e sem murmurar, desde que não possa manterse no alto da escala.”
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864. Assim como há pessoas a quem a sorte em tudo é contrária, outras parecem favorecidas
por ela, pois que tudo lhes sai bem. A que atribuir isso?
“De ordinário, é que essas pessoas sabem conduzir-se melhor nas suas empresas. Mas, também
pode ser um gênero de prova. O bom êxito as embriaga; fiam-se no seu destino e muitas vezes
pagam mais tarde esse bom êxito, mediante revezes cruéis, que a prudência as teria feito evitar.”
865. Como se explica que a boa sorte favoreça a algumas pessoas em circunstâncias com as
quais nada têm que ver a vontade, nem a inteligência: no jogo, por exemplo?
“Alguns Espíritos hão escolhido previamente certas espécies de prazer. A fortuna que os
favorece é uma tentação. Aquele que, como homem, ganha; perde como Espírito. É uma prova
para o seu orgulho e para a sua cupidez.”
866. Então, a faculdade que favorece presidir aos destinos materiais de nossa vida também é
resultante do nosso livre-arbítrio?
“Tu mesmo escolheste a tua prova. Quanto mais rude ela for e melhor a suportares, tanto mais te
elevarás. Os que passam a vida na abundância e na ventura humana são Espíritos pusilânimes,
que permanecem estacionários. Assim, o número dos desafortunados é muito superior ao dos
felizes deste mundo, atento que os Espíritos, na sua maioria, procuram as provas que lhes sejam
mais proveitosas. Eles vêem perfeitamente bem a futilidade das vossas grandezas e gozos.
Acresce que a mais ditosa existência é sempre agitada, sempre perturbada, quando mais não seja,
pela ausência da dor.” (525 e seguintes)
867. Donde vem a expressão: Nascer sob uma boa estrela?
“Antiga superstição, que prendia às estrelas os destinos dos homens. Alegoria que algumas
pessoas fazem a tolice de tomar ao pé da letra.”
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Perguntas 851 a 867.
2. Leon Denis. O Problema do Ser, do Destino e da Dor. O livre-arbítrio, página. 345,
parte 3ª. FEGB 1983.
3. S. E. Frost Jr. Ensinamentos Básicos dos Grandes Filósofos. Destino versus livrearbítrio, páginas 137-138. Editora Cultrix.
4. Martins Peralva. O Pensamento de Emmanuel. Espiritismo e livre-arbítrio, página
202. FEB 1978.
6.4 - Livre-arbítrio
Liberdade natural
825. Haverá no mundo posições em que o homem possa jactar-se de gozar de absoluta
liberdade?
“Não, porque todos precisais uns dos outros, assim os pequenos como os grandes.”
826. Em que condições poderia o homem gozar de absoluta liberdade?
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“Nas do eremita no deserto. Desde que juntos estejam dois homens, há entre eles direitos
recíprocos que lhes cumpre respeitar; não mais, portanto, qualquer deles goza de liberdade
absoluta.”
827. A obrigação de respeitar os direitos alheios tira ao homem o de pertencer-se a si mesmo?
“De modo algum, porquanto este é um direito que lhe vem da Natureza.”
828. Como se podem conciliar as opiniões liberais de certos homens com o despotismo que
costumam exercer no seu lar e sobre os seus subordinados?
“Eles têm a compreensão da lei natural, mas contrabalançada pelo orgulho e pelo egoísmo.
Quando não representam calculadamente uma comédia, sustentando princípios liberais,
compreendem como as coisas devem ser, mas não as fazem assim.”
a) - Ser-lhes-ão, na outra vida, levados em conta os princípios que professaram neste mundo?
“Quanto mais inteligência tem o homem para compreender um princípio, tanto menos escusável
é de o não aplicar a si mesmo. Em verdade vos digo que o homem simples, porém sincero, está
mais adiantado no caminho de Deus, do que um que pretenda parecer o que não é.”
Escravidão
829. Haverá homens que estejam, por natureza, destinados a ser propriedades de outros
homens?
“É contrária à lei de Deus toda sujeição absoluta de um homem a outro homem. A escravidão é
um abuso da força. Desaparece com o progresso, como gradativamente desaparecerão todos os
abusos.”
É contrária à Natureza a lei humana que consagra a escravidão, pois que assemelha o homem ao
irracional e o degrada física e moralmente.
830. Quando a escravidão faz parte dos costumes de um povo, são censuráveis os que dela
aproveitam, embora só o façam conformando-se com um uso que lhes parece natural?
“O mal é sempre o mal e não há sofisma que faça se torne boa uma ação má. A responsabilidade,
porém, do mal é relativa aos meios de que o homem disponha para compreendê-lo. Aquele que
tira proveito da lei da escravidão é sempre culpado de violação da lei da Natureza. Mas, aí, como
em tudo, a culpabilidade é relativa. Tendo-se a escravidão introduzido nos costumes de certos
povos, possível se tornou que, de boa-fé, o homem se aproveitasse dela como de uma coisa que
lhe parecia natural. Entretanto, desde que, mais desenvolvida e, sobretudo, esclarecida pelas
luzes do Cristianismo, sua razão lhe mostrou que o escravo era um seu igual perante Deus,
nenhuma desculpa mais ele tem.”
831. A desigualdade natural das aptidões não coloca certas raças humanas sob a dependência
das raças mais inteligentes?
“Sim, mas para que estas as elevem, não para embrutecê-las ainda mais pela escravização.
Durante longo tempo, os homens consideram certas raças humanas como animais de trabalho,
munidos de braços e mãos, e se julgaram com o direito de vender os dessas raças como bestas de
carga. Consideram-se de sangue mais puro os que assim procedem. Insensatos! Nada vêem senão
a matéria. Mais ou menos puro não é o sangue, porém o Espírito.” (361-803)
832. Há, no entanto, homens que tratam seus escravos com humanidade; que não deixam lhes
falte nada e acreditam que a liberdade os exporia a maiores privações. Que dizeis disso?
“Digo que esses compreendem melhor os seus interesses. Igual cuidado dispensam aos seus bois
e cavalos, para que obtenham bom preço no mercado. Não são tão culpados como os que
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maltratam os escravos, mas, nem por isso deixam de dispor deles como de uma mercadoria,
privando-os do direito de se pertencerem a si mesmos.”
Liberdade de pensar
833. Haverá no homem alguma coisa que escape a todo constrangimento e pela qual goze ele de
absoluta liberdade?
“No pensamento goza o homem de ilimitada liberdade, pois que não há como pôr-lhe peias.
Pode-se-lhe deter o vôo, porém, não aniquilá-lo.”
834. É responsável o homem pelo seu pensamento?
“Perante Deus, é. Somente a Deus sendo possível conhecê-lo, Ele o condena ou absolve, segundo
a Sua justiça.”
Liberdade de consciência
835. Será a liberdade de consciência uma conseqüência da de pensar?
“A consciência é um pensamento íntimo, que pertence ao homem, como todos os outros
pensamentos.”
836. Tem o homem direito de pôr embaraços à liberdade de consciência?
“Falece-lhe tanto esse direito, quanto com referência à liberdade de pensar, por isso que só a
Deus cabe o de julgar a consciência. Assim como os homens, pelas suas leis,
regulam as relações de homem para homem, Deus, pelas leis da Natureza, regula as relações
entre Ele e o homem.”
837. Que é o que resulta dos embaraços que se oponham à liberdade de consciência?
“Constranger os homens a procederem em desacordo com o seu modo de pensar, fazê-los
hipócritas. A liberdade de consciência é um dos caracteres da verdadeira civilização e do
progresso.”
838. Será respeitável toda e qualquer crença, ainda quando notoriamente falsa?
“Toda crença é respeitável, quando sincera e conducente à prática do bem. Condenáveis são as
crenças que conduzam ao mal.”
839. Será repreensível aquele que escandalize com a sua crença um outro que não pensa como
ele?
“Isso é faltar com a caridade e atentar contra a liberdade de pensamento.”
840. Será atentar contra a liberdade de consciência pôr óbices a crenças capazes de causar
perturbações à sociedade?
“Podem reprimir-se os atos, mas a crença íntima é inacessível.”
Reprimir os atos exteriores de uma crença, quando acarretam qualquer prejuízo a terceiros, não é
atentar contra a liberdade de consciência, pois que essa repressão em nada tira à crença a
liberdade, que ela conserva integral.
841. Para respeitar a liberdade de consciência, dever-se-á deixar que se propaguem doutrinas
perniciosas, ou poder-se-á, sem atentar contra aquela liberdade, procurar trazer ao caminho da
verdade os que se transviaram obedecendo a falsos princípios?
“Certamente que podeis e até deveis; mas, ensinai, a exemplo de Jesus, servindo-vos da
brandura e da persuasão e não da força, o que seria pior do que a crença daquele a quem
desejaríeis convencer. Se alguma coisa se pode impor, é o bem e a fraternidade. Mas não cremos
que o melhor meio de fazê-los admitidos seja obrar com violência. A convicção não se impõe.”
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842. Por que indícios se poderá reconhecer, entre todas as doutrinas que alimentam a pretensão
de ser a expressão única da verdade, a que tem o direito de se apresentar como tal?
“Será aquela que mais homens de bem e menos hipócritas fizer, isto é, pela prática da lei de amor
na sua maior pureza e na sua mais ampla aplicação. Esse o sinal por que reconhecereis que uma
doutrina é boa, visto que toda doutrina que tiver por efeito semear a desunião e estabelecer uma
linha de separação entre os filhos de Deus não pode deixar de ser falsa e perniciosa.”
Livre-arbítrio
843. Tem o homem o livre-arbítrio de seus atos?
“Pois que tem a liberdade de pensar, tem igualmente a de obrar. Sem o livre-arbítrio, o homem
seria máquina.”
844. Do livre-arbítrio goza o homem desde o seu nascimento?
“Há liberdade de agir, desde que haja vontade de fazê-lo. Nas primeiras fases da vida, quase nula
é a liberdade, que se desenvolve e muda de objeto com o desenvolvimento das faculdades.
Estando seus pensamentos em concordância com o que a sua idade reclama, a criança aplica o
seu livre-arbítrio àquilo que lhe é necessário.”
845. Não constituem obstáculos ao exercício do livre-arbítrio as predisposições instintivas que o
homem já traz consigo ao nascer?
“As predisposições instintivas são as do Espírito antes de encarnar. Conforme seja este mais ou
menos adiantado, elas podem arrastá-las à prática de atos repreensíveis, no que será secundado
pelos Espíritos que simpatizam com essas disposições. Não há, porém, arrastamento irresistível,
uma vez que se tenha a vontade de resistir. Lembrai-vos de que querer é poder.” (361)
846. Sobre os atos da vida nenhuma influência exerce o organismo? E, se essa influência existe,
não será exercida com prejuízo do livre-arbítrio?
“É inegável que sobre o Espírito exerce influência a matéria, que pode embaraçar-lhe as
manifestações. Daí vem que, nos mundos onde os corpos são menos materiais do que na Terra,
as faculdades se desdobram mais livremente. Porém, o instrumento não dá a faculdade. Além
disso, cumpre se distingam as faculdades morais das intelectuais. Tendo um homem o instinto do
assassínio, seu próprio Espírito é, indubitavelmente, quem possui esse instinto e quem lho dá;
não são seus órgãos que lho dão. Semelhante ao bruto, e ainda pior do que este, se torna aquele
que nulifica o seu pensamento, para só se ocupar com a matéria, pois que não cuida mais de se
premunir contra o mal. Nisto é que incorre em falta, porquanto assim procede por vontade sua.”
(Vede n°s. 367 e seguintes - “Influência do organismo”.)
847. Da aberração das faculdades tira ao homem o livre-arbítrio?
“Já não é senhor do seu pensamento aquele cuja inteligência se ache turbada por uma causa
qualquer e, desde então, já não tem liberdade. Essa aberração constitui muitas vezes uma punição
para o Espírito que, porventura, tenha sido, noutra existência, fútil e orgulhoso, ou tenha feito
mau uso de suas faculdades. Pode esse Espírito, em tal caso, renascer no corpo de um idiota,
como o déspota no de um escravo e o mau rico no de um mendigo. O Espírito, porém, sofre por
efeito desse constrangimento, de que tem perfeita consciência. Está aí a ação da matéria.” (371 e
seguintes)
848. Servirá de escusa aos atos reprováveis o ser devida à embriaguez a aberração das
faculdades intelectuais?
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“Não, porque foi voluntariamente que o ébrio se privou da sua razão, para satisfazer a paixões
brutais. Em vez de uma falta, comete duas.”
849. Qual a faculdade predominante no homem em estado de selvageria: o instinto, ou o livrearbítrio?
“O instinto, o que não o impede de agir com inteira liberdade, no tocante a certas coisas. Mas,
aplica, como a criança, essa liberdade às suas necessidades e ela se amplia com a inteligência.
Conseguintemente, tu, que és mais esclarecido do que um selvagem, também és mais
responsável pelo que fazes do que um selvagem o é pelos seus atos.”
850. A posição social não constitui às vezes, para o homem, obstáculo à inteira liberdade de
seus atos?
“É fora de dúvida que o mundo tem suas exigências, Deus é justo e tudo leva em conta. Deixavos, entretanto, a responsabilidade de nenhum esforço empregardes para vencer os obstáculos.”
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Perguntas 825 a 850.
2. Leon Denis. O Problema do Ser, do Destino e da Dor. O livre-arbítrio, página. 342,
parte 3ª. FEGB 1983.
3. Martins Peralva. O Pensamento de Emmanuel. Espiritismo e livre-arbítrio, página
199 a 201. FEB 1978.
4. Francisco Cândido Xavier. Palavras do Infinito. Pelo espírito de Humberto de
Campos. O elemento dominante. Páginas 94 a 95. LAKE 1978.
5. Francisco Cândido Xavier. Encontro Marcado. Pelo espírito de Emmanuel. Livres,
mas responsáveis, páginas 160 a 163. FEB 1978.
6. Francisco Cândido Xavier. No Mundo Maior. Pelo espírito de André Luiz. Dolorosa
Perda, páginas 140 a 153. FEB 1995.
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7. PLURALIDADE DAS EXISTÊNCIAS
7.1 – Os fundamentos da justiça na Reencarnação
222. Não é novo, dizem alguns, o dogma da reencarnação; ressuscitaram-no da doutrina de
Pitágoras. Nunca dissemos ser de invenção moderna a Doutrina Espírita. Constituindo uma lei da
Natureza, o Espiritismo há de ter existido desde a origem dos tempos e sempre nos esforçamos
por demonstrar que dele se descobrem sinais na antigüidade mais remota. Pitágoras, como se
sabe, não foi o autor do sistema da metempsicose; ele o colheu dos filósofos indianos e dos
egípcios, que o tinham desde tempos imemoriais. A idéia da transmigração das almas formava,
pois, uma crença vulgar, aceita pelos homens mais eminentes. De que modo a adquiriram? Por
uma revelação, ou por intuição? Ignoramo-lo Seja, porém, como for, o que não padece dúvida é
que uma idéia não atravessa séculos e séculos, nem consegue impor-se a inteligências de escol,
se não contiver algo de sério. Assim, a ancianidade desta doutrina, em vez de ser uma objeção,
seria prova a seu favor. Contudo, entre a metempsicose dos antigos e a moderna doutrina da
reencarnação, há, como também se sabe, profunda diferença, assinalada pelo fato de os Espíritos
rejeitarem, de maneira absoluta, a transmigração da alma do homem para os animais e
reciprocamente.
Portanto, ensinando o dogma da pluralidade das existências corporais, os Espíritos renovam uma
doutrina que teve origem nas primeiras idades do mundo e que se conservou no íntimo de muitas
pessoas, até aos nossos dias. Simplesmente, eles a apresentam de um ponto de vista mais
racional, mais acorde com as leis progressivas da Natureza e mais de conformidade com a
sabedoria do Criador, despindo-a de todos os acessórios da superstição. Circunstância digna de
nota é que não só neste livro os Espíritos a ensinaram no decurso dos últimos tempos: já antes da
sua publicação, numerosas comunicações da mesma natureza se obtiveram em vários países,
multiplicando-se depois, consideravelmente. Talvez fosse aqui o caso de examinarmos por que
os Espíritos não parecem todos de acordo sobre esta questão. Mais tarde, porém, voltaremos a
este assunto.
Examinaremos de outro ponto de vista a matéria e, abstraindo de qualquer intervenção dos
Espíritos, deixemo-los de lado, por enquanto,. Suponhamos que esta teoria nada tenha que ver
com eles; suponhamos mesmo que jamais se haja cogitado de Espíritos.
Coloquemo-nos, momentaneamente, num terreno neutro, admitindo o mesmo grau de
probabilidade para ambas as hipóteses, isto é, a da pluralidade e a da unicidade das existências
corpóreas, e vejamos para que lado a razão e o nosso próprio interesse nos farão pender.
Muitos repelem a idéia da reencarnação pelo só motivo de ela não lhes convir. Dizem que uma
existência já lhes chega de sobra e que, portanto, não desejariam recomeçar outra semelhante. De
alguns sabemos que saltam em fúria só com o pensarem que tenham de voltar à Terra. Perguntarlhes-emos apenas se imaginam que Deus lhes pediu o parecer, ou consultou os gostos, para
regular o Universo. Uma de duas: ou a reencarnação existe, ou não existe; se existe, nada
importa que os contrarie; terão que a sofrer, sem que para isso lhes peça Deus permissão.
Afiguram-se-nos os que assim falam um doente a dizer: Sofri hoje bastante, não quero sofrer
mais amanhã. Qualquer que seja o seu mau-humor, não terá por isso que sofrer menos no dia
seguinte, nem nos que se sucederem, até que se ache curado. Conseguintemente, se os que de tal
maneira se externam tiverem que viver de novo, corporalmente, tornarão a viver, reencarnarão.
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Nada lhes adiantará rebelarem-se, quais crianças que não querem ir para o colégio, ou
condenados, para a prisão. Passarão pelo que têm de passar.
São demasiado pueris semelhantes objeções, para merecerem mais seriamente examinadas.
Diremos, todavia, aos que as formulam que se tranqüilizem, que a Doutrina Espírita, no tocante à
reencarnação, não é tão terrível como a julgam; que, se a houvessem estudado a fundo, não se
mostrariam tão aterrorizados; saberiam que deles dependem as condições da nova existência, que
será feliz ou desgraçada, conforme ao que tiverem feito neste mundo; que desde agora poderão
elevar-se tão alto que a recaída no lodaçal não lhes seja mais de temer.
Suponhamos dirigir-nos a pessoas que acreditam num futuro depois da morte e não aos que
criam para si a perspectiva do nada, ou pretendem que suas almas se vão afogar num todo
universal, onde perdem a individualidade, como os pingos da chuva no oceano, o que vem a dar
quase no mesmo. Ora, pois: se credes num futuro qualquer, certo não admitis que ele seja
idêntico para todos, porquanto de outro modo, qual a utilidade do bem? Por que haveria o
homem de constranger-se? Por que deixaria de satisfazer a todas as suas paixões, a todos os seus
desejos, embora a custa de outrem, uma vez que por isso não ficaria sendo melhor, nem pior?
Credes, ao contrário, que esse futuro será mais ou menos ditoso ou inditoso, conforme ao que
houverdes feito durante a vida e então desejais que seja tão afortunado quanto possível, visto que
há de durar pela eternidade, não? Mas, porventura, teríeis a pretensão de ser dos homens mais
perfeitos que hajam existido na Terra e, pois, com direito a alcançardes de um salto a suprema
felicidade dos eleitos? Não. Admitis então que há homens de valor maior do que o vosso e com
direito a um lugar melhor, sem daí resultar que vos conteis entre os réprobos. Pois bem! Colocaivos mentalmente, por um instante, nessa situação intermédia, que será a vossa, como acabastes
de reconhecer, e imaginai que alguém vos venha dizer: Sofreis; não sois tão felizes quanto
poderíeis ser, ao passo que diante de vós estão seres que gozam de completa ventura. Quereis
mudar na deles a vossa posição? - Certamente, respondereis; que devemos fazer? - Quase nada:
recomeçar o trabalho mal executado e executá-lo melhor. - Hesitaríeis em aceitar, ainda que a
poder de muitas existências de provações? Façamos outra comparação mais prosaica. Figuremos
que a um homem que, sem ter deixado a miséria extrema, sofre, no entanto, privações, por
escassez de recursos, viessem dizer: Aqui está uma riqueza imensa de que podes gozar; para isto
só é necessário que trabalhes arduamente durante um minuto.
Fosse ele o mais preguiçoso da Terra, que sem hesitar diria: Trabalhemos um minuto, dois
minutos, uma hora, um dia, se for preciso. Que importa isso, desde que me leve a acabar os meus
dias na fartura? Ora, que é a duração da vida corpórea, em confronto com a eternidade? Menos
que um minuto, menos que um segundo.
Temos visto algumas pessoas raciocinarem deste modo: Não é possível que Deus,
soberanamente bom como é, imponha ao homem a obrigação de recomeçar uma série de
misérias e tribulações. Acharão, porventura, essas pessoas que há mais bondade em condenar
Deus o homem a sofrer perpetuamente, por motivo de alguns momentos de erro, do que em lhe
facultar meios de reparar suas faltas? “Dois industriais contrataram dois operários, cada um dois
quais podia aspirar a se tornar sócio do respectivo patrão.
Aconteceu que esses dois operários certa vez empregaram muito mal o seu dia, merecendo
ambos ser despedidos. Um dos industriais, não obstante as súplicas do seu, o mandou embora e o
pobre operário, não tendo achado mais trabalho, acabou por morrer na miséria. O outro disse ao
seu: Perdeste um dia; deves-me por isso uma compensação. Executaste mal o teu trabalho;
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ficaste a me dever uma reparação. Consinto que o recomeces. Trata de executá-lo bem, que te
conservarei ao meu serviço e poderás continuar aspirando à posição superior que te prometi.”
Será preciso perguntemos qual dos industriais foi mais humano?
Dar-se-á que Deus, que é a clemência mesma, seja mais inexorável do que um homem?
Alguma coisa de pungente há na idéia de que a nossa sorte fique para sempre decidida, por efeito
de alguns anos de provações, ainda quando de nós não tenha dependido o atingirmos a perfeição,
ao passo que eminentemente consoladora é a idéia oposta, que nos permite a esperança. Assim,
sem nos pronunciarmos pró ou contra a pluralidade das existências, sem preferirmos uma
hipótese a outra, declaramos que, se aos homens fosse dado escolher, ninguém quereria o
julgamento sem apelação. Disse um filósofo que, se Deus não existisse, fora mister inventá-lo,
para felicidade do gênero humano. Outro tanto se poderia dizer sobre a pluralidade das
existências. Mas, conforme atrás ponderamos, Deus não nos pede permissão, nem consulta os
nossos gostos. Ou isto é, ou não é. Vejamos de que lado estão as probabilidades e encaremos de
outro ponto de vista o assunto, unicamente como estudo filosófico, sempre abstraindo do ensino
dos Espíritos.
Se não há reencarnação, só há, evidentemente, uma existência corporal. Se a nossa atual
existência corpórea é única, a alma de cada homem foi criada por ocasião do seu nascimento, a
menos que se admita a anterioridade da alma, caso em que se caberia perguntar o que era ela
antes do nascimento e se o estado em que se achava não constituía uma existência sob forma
qualquer. Não há meio termo: ou a alma existia, ou não existia antes do corpo. Se existia, qual a
sua situação? Tinha, ou não, consciência de si mesma? Se não tinha, é quase como se não
existisse. Se tinha individualidade, era progressiva, ou estacionária? Num e noutro caso, a que
grau chegara ao tomar o corpo? Admitindo, de acordo com a crença vulgar, que a alma nasce
com o corpo, ou, o que vem a ser o mesmo, que, antes de encarnar, só dispõe de faculdades
negativas, perguntamos: 1º Por que mostra a alma aptidões tão diversas e independentes das
idéias que a educação lhe fez adquirir?
2º Donde vem a aptidão extranormal que muitas crianças em tenra idade revelam, para esta ou
aquela arte, para esta ou aquela ciência, enquanto outras se conservam inferiores ou medíocres
durante a vida toda?
3º Donde, em uns, as idéias inatas ou intuitivas, que noutros não existem?
4º Donde, em certas crianças, o instituto precoce que revelam para os vícios ou para as virtudes,
os sentimentos inatos de dignidade ou de baixeza, contrastando com o meio em que elas
nasceram?
5º Por que, abstraindo-se da educação, uns homens são mais adiantados do que outros?
6º Por que há selvagens e homens civilizados? Se tomardes de um menino hotentote recémnascido e o educardes nos nossos melhores liceus, fareis dele algum dia um Laplace ou um
Newton?
Qual a filosofia ou a teosofia capaz de resolver estes problemas? É fora de dúvida que, ou as
almas são iguais ao nascerem, ou são desiguais. Se são iguais, por que, entre elas, tão grande
diversidade de aptidões? Dir-se-á que isso depende do organismo. Mas, então, achamo-nos em
presença da mais monstruosa e imoral das doutrinas. O homem seria simples máquina, joguete
da matéria; deixaria de ter a responsabilidade de seus atos, pois que poderia atribuir tudo às suas
imperfeições físicas. Se almas são desiguais, é que Deus as criou assim. Nesse caso, porém, por
que a inata superioridade concedida a algumas?
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Corresponderá essa parcialidade à justiça de Deus e ao amor que Ele consagra igualmente a
todas suas criaturas?
Admitamos, ao contrário, uma série de progressivas existências anteriores para cada alma e tudo
se explica. Ao nascerem, trazem os homens a intuição do que aprenderam antes: São mais ou
menos adiantados, conforme o número de existências que contem, conforme já estejam mais ou
menos afastados do ponto de partida. Dá-se aí exatamente o que se observa numa reunião de
indivíduos de todas as idades, onde cada um terá desenvolvimento proporcionado ao número de
anos que tenha vivido. As existências sucessivas serão, para a vida da alma, o que os anos são
para a do corpo. Reuni, em certo dia, um milheiro de indivíduos de um a oitenta anos; suponde
que um véu encubra todos os dias precedentes ao em que os reunistes e que, em conseqüência,
acreditais que todos nasceram na mesma ocasião. Perguntareis naturalmente como é que uns são
grandes e outros pequenos, uns velhos e jovens outros, instruídos uns, outros ainda ignorantes.
Se, porém, dissipando-se a nuvem que lhes oculta o passado, vierdes a saber que todos hão
vivido mais ou menos tempo, tudo se vos tornará explicado. Deus, em Sua justiça, não pode ter
criado almas desigualmente perfeitas. Com a pluralidade das existências, a desigualdade que
notamos nada mais apresenta em oposição à mais rigorosa eqüidade: é que apenas vemos o
presente e não o passado. A este raciocínio serve de base algum sistema, alguma suposição
gratuita? Não. Partimos de um fato patente, incontestável: a desigualdade das aptidões e do
desenvolvimento intelectual e moral e verificamos que nenhuma das teorias correntes o explica,
ao passo que uma outra teoria lhe dá explicação simples, natural e lógica. Será racional preferirse as que não explicam àquela que explica?
À vista da sexta interrogação acima, dirão naturalmente que o hotentote é de raça inferior.
Perguntaremos, então, se o hotentote é ou não um homem. Se é, por que a ele e à sua raça privou
Deus dos privilégios concedidos à raça caucásica? Se não é, por que tentar fazê-lo cristão? A
Doutrina Espírita tem mais amplitude do que tudo isto. Segundo ela, não há muitas espécies de
homens, há tão-somente cujos espíritos estão mais ou menos atrasados, porém, todos suscetíveis
de progredir. Não é este princípio mais conforme à justiça de Deus?
Vimos de apreciar a alma com relação ao seu passado e ao seu presente. Se a considerarmos,
tendo em vista o seu futuro, esbarraremos nas mesmas dificuldades. 1ª Se a nossa existência
atual é que, só ela, decidirá da nossa sorte vindoura, quais, na vida futura, as posições respectivas
do selvagem e do homem civilizado? Estarão no mesmo nível, ou se acharão distanciados um do
outro, no tocante à soma de felicidade eterna que lhes caiba?
2ª O homem que trabalhou toda a sua vida por melhorar-se, virá a ocupar a mesma categoria de
outro que se conservou em grau inferior de adiantamento, não por culpa sua, mas porque não
teve tempo, nem possibilidade de se tornar melhor? 3ª O que praticou o mal, por não ter podido
instruir-se, será culpado de um estado de coisas cuja existência em nada dependeu dele?
4ª Trabalha-se continuamente por esclarecer, moralizar, civilizar os homens. Mas, em
contraposição a um que fica esclarecido, milhões de outros morrem todos os dias antes que a luz
lhes tenha chegado. Qual a sorte destes últimos? Serão tratados como réprobos? No caso
contrário, que fizeram para ocupar categoria idêntica à dos outros?
5ª Que sorte aguarda os que morrem na infância, quando ainda não puderam fazer nem o bem,
nem o mal? Se vão para o meio dos eleitos, por que esse favor, sem que coisa alguma hajam feito
para merecê-lo? Em virtude de que privilégio eles se vêem isentos das tribulações da vida?
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Haverá alguma doutrina capaz de resolver esses problemas? Admitam-se as existências
consecutivas e tudo se explicará conformemente à justiça de Deus. O que se não pôde fazer
numa existência faz-se em outra. Assim é que ninguém escapa à lei do progresso, que cada um
será recompensado segundo o seu merecimento real e que ninguém fica excluído da felicidade
suprema, a que todos podem aspirar, quaisquer que sejam os obstáculos com que topem no
caminho.
Essas questões facilmente se multiplicariam ao infinito, porquanto inúmeros são os problemas
psicológicos e morais que só na pluralidade das existências encontram solução. Limitamo-nos a
formular as de ordem mais geral. Como quer que seja, alegar-se-á talvez que a Igreja não admite
a doutrina da reencarnação; que ela subverteria a religião. Não temos o intuito de tratar dessa
questão neste momento. Basta-nos o havermos demonstrado que aquela doutrina é
eminentemente moral e racional. Ora, o que é moral e racional não pode estar em oposição a uma
religião que proclama ser Deus a bondade e a razão por excelência. Que teria sido da religião, se,
contra a opinião universal e o testemunho da ciência, se houvesse obstinadamente recusado a
render-se à evidência e expulsado de seu seio todos os que não acreditassem no movimento do
Sol ou nos seis dias da criação? Que crédito houvera merecido e que autoridade teria tido, entre
povos cultos, uma religião fundada em erros manifestos e que os impusesse como artigos de fé?
Logo que a evidência se patenteou, a Igreja, criteriosamente, se colocou do lado da evidência.
Uma vez provado que certas coisas existentes seriam impossíveis sem a reencarnação, que, a não
ser por esse meio, não se consegue explicar alguns pontos do dogma, cumpre admiti-lo e
reconhecer meramente aparente o antagonismo entre esta doutrina e a dogmática. Mais adiante
mostraremos que talvez seja muito menor do que se pensa a distância que, da doutrina das vidas
sucessivas, separa a religião e que a esta não faria aquela doutrina maior mal do que lhe fizeram
as descobertas do movimento da Terra e dos períodos geológicos, as quais, à primeira vista,
pareceram desmentir os textos sagrados. Demais, o princípio da reencarnação ressalta de muitas
passagens das Escrituras, achando-se especialmente formulado, de modo explícito, no
Evangelho:
“Quando desciam da montanha (depois da transfiguração), Jesus lhes fez esta recomendação:
Não faleis a ninguém do que acabastes de ver, até que o Filho do homem tenha ressuscitado,
dentre os mortos. Perguntaram-lhe então seus discípulos: Por que dizem os escribas ser preciso
que primeiro venha Elias? Respondeu-lhes Jesus: É certo que Elias há de vir e que restabelecerá
todas as coisas. Mas, eu vos declaro que Elias já veio, e eles não o conheceram e o fizeram sofrer
como entenderam. Do mesmo modo darão a morte ao Filho do homem. Compreenderam então
seus discípulos que era de João Batista que ele lhes falava.” (São Mateus, cap. XVII.)
Pois que João Batista fora Elias, houve reencarnação do Espírito ou da alma de Elias no corpo de
João Batista. Em suma, como quer que opinemos acerca da reencarnação, quer a aceitemos, quer
não, isso não constituirá motivo para que deixemos de sofrê-la, desde que ela exista, mau grado a
todas as crenças em contrário. O essencial está em que o ensino dos Espíritos é eminentemente
cristão; apóia-se na imortalidade da alma, nas penas e recompensas futuras, na justiça de Deus,
no livre-arbítrio do homem, na moral do Cristo. Logo, não é antireligioso.
Temos raciocinado, abstraindo, como dissemos, de qualquer ensinamento espírita que, para
certas pessoas, carece de autoridade. Não é somente porque veio dos Espíritos que nós e tantos
outros nos fizemos adeptos da pluralidade das existências. É porque essa doutrina nos pareceu a
mais lógica e porque só ela resolve questões até então insolúveis.
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Ainda quando fosse da autoria de um simples mortal, tê-la-íamos igualmente adotado e não
houvéramos hesitado um segundo mais em renunciar às idéias que esposávamos. Em sendo
demonstrado o erro, muito mais que perder do que ganhar tem o amor-próprio, com o se obstinar
na sustentação de uma idéia falsa. Assim também, tê-laíamos repelido, mesmo que provindo dos
Espíritos, se nos parecera contrária à razão, como repelimos muitas outras, pois sabemos, por
experiência, que não se deve aceitar cegamente tudo o que venha deles, da mesma forma que se
não deve adotar às cegas tudo o que proceda dos homens. O melhor título que, ao nosso ver,
recomenda a idéia da reencarnação é o de ser, antes de tudo, lógica. Outro, no entanto, ela
apresenta: o de a confirmarem os fatos, fatos positivos e por bem dizer, materiais, que um estudo
atento e criterioso revela a quem se dê ao trabalho de observar com paciência e perseverança e
diante dos quais não há mais lugar para a dúvida. Quando esses fatos se houverem vulgarizado,
como os da formação e do movimento da Terra, forçoso será que todos se rendam à evidência e
os que se lhes colocaram em oposição ver-se-ão constrangidos a desdizer-se.
Reconheçamos, portanto, em resumo, que só a doutrina da pluralidade das existências explica o
que, sem ela, se mantém inexplicável; que é altamente consoladora e conforme à mais rigorosa
justiça; que constitui para o homem a âncora de salvação que Deus, por misericórdia, lhe
concedeu.
As próprias palavras de Jesus não permitem dúvida a tal respeito. Eis o que se lê no Evangelho
de São João, capítulo III:
3. Respondendo a Nicodemos, disse Jesus: Em verdade, em verdade, te digo que, se um homem
não nascer de novo, não poderá ver o reino de Deus.
4. Disse-lhe Nicodemos: Como pode um homem nascer já estando velho? Pode tornar ao ventre
de sua mãe para nascer segunda vez?
5. Respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo que, se um homem não renascer da água e
do Espírito, não poderá entrar no reino de Deus. O que é nascido da carne é carne e o que é
nascido do Espírito é Espírito. Não te admires de que eu te tenha dito: é necessário que torneis a
nascer. (Ver, adiante, o parágrafo “Ressurreição da carne”, n° 1010.)
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Perg. 222, comentário à pergunta 613.
2. Leon Denis. Depois da Morte. A pluralidade das existências. FEB 1978. pág 134,
135.
3. Leon Denis. O Problema do Ser, do Destino e da Dor. A reencarnação e suas Leis.
Pág. 164 e 165.
4. Francisco Cândido Xavier. Pelo espírito de André Luiz. Evolução em dois Mundos.
Evolução e corpo espiritual. FEB 1995. pág. 35-36, 52-53.
7.2 - AS PROVAS DA REENCARNAÇÃO
As provas da reencarnação baseiam-se, essencialmente, no seguinte:
• Na regressão da memória, que pode efetuar-se por força de sugestão hipnótica ou
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•
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recordação espontânea de existências anteriores. sem que se identifique, aparentemente
uma causa para justifica-la. Neste ultimo caso, a recordação tanto pode dar-se no sono
comum, como no estado de vigília.
Nos ditados mediúnicos, onde o médium é capaz de transmitir revelações sobre
existências anteriores, próprias ou de outras pessoas.
Nas idéias inatas e nas crianças-prodígio, que abalam as bases cientificas da
hereditariedade.
Secundariamente, não tanto como prova, mas como crença, a reencarnação é um
ensinamento de diversas escolas religiosas, notadamente as orientais, e filosóficas.
Tentaremos, no entanto, nos deter nos fatos e para isso citaremos, a seguir, provas
encontradas nos anais das experiências humanas.
Juliano, o Apóstata, lembrava-se de ter sido Alexandre da Macedônia.
O grande poeta Lamartine declara, em sua Viagem ao Oriente, ter tido remisniscências muito
claras. Eis o seu testemunho.
“Não tinha na Jedeia nem Bíblia, nem livro de viagens, nem ninguém que me pudesse dar o
nome dos lugares, a denominação antiga dos vales e das montanhas; reconheci, entretanto, desde
logo, o vale de Terebinto e o campo de batalha de Saul. Em Sephora, designei com o dedo e dei
o nome de uma colina, no alto da qual havia um castelo arruinado,, como o lugar provável do
nascimento da Virgem.
Exceto o vale do Líbano, nunca encontrei na Judéia um lugar ou qualquer coisa que não
fosse para mim como uma recordação.”
O escritor francês Méry recorda-se de “ter feito a guerra das Gálias e haver combatido na
Germânia com Germanicus. Chamava-se, então, Minius.
O americano Edgar Cayce, apesar de ser um devoto o ortodoxo protestante, “tinha a
faculdade de entrar em transe espontâneo, no qual revelava conhecimentos muito acima do seu
nível habitual em estado de vigília. Durante o transe ele não somente diagnosticava males físicos
e espirituais, como revelava fatos de existências anteriores das pessoas que o procuravam, e de si
mesmo.
“Na vida imediatamente anterior, era ele um certo John Bainbridge, nascido nas ilhas
Britânicas, em ,742.
Terminou sua existência quando tentava escapar pelo rio Ohio,, numa balsa cheia de gente,
perseguida de ambas as margens pelos índios implacáveis.
Mais de um século depois, em setembro de ,925, Cayce foi a uma barbearia, levar seu filho
Hugh Lynn para cortar o cabelo. Lá chegando, encontrou um garoto de cinco anos , filho do
barbeiro que segurava uma caixinha de biscoitos. Quando Cayce entrou, o garoto olhou-o
fixamente e caminhou para ele, oferecendo-lhe a caixa de biscoitos.
- Olha aqui - disse impulsivamente -, fique com o resto. Você ainda deve estar morrendo de
fome.
A seguir, o garoto recordou ter conhecido Cayce na balsa, quando fugiam dos índios,
acrescentando: " E você estava com uma fome terrível, não estava?
Ao que Cayce respondeu: - Você tem razão. Como eu estava faminto naquela balsa!
Pelo sono provocado através da hipnose, inclusive usado atualmente por psiquiatras e
psicólogos para fins terapêuticos tem-se obtido grandes e numerosas provas da reencarnação.
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O psiquiatra inglês, Dr. Denys Kelsey, relata no livro Muitas Existências, de Co-autoria
com sua esposa, o caso de um seu cliente, pessoa de meia-idade, um profissional liberal de
elevado grau de cultura afligido por persistente e invencível homossexualismo. Dentro da sua
tese de que o médico deve primeiro pesquisar a existência atual, o Dr. Kelsey empregou
inicialmente Os métodos clássicos de psicanálise, com hipnose, e sem ela, tudo sem resultado
prático. Finalmente, numa sessão de hipnose, já na oportunidade da décima quarta consulta, o
paciente começou a descrever episódios de uma existência vivida entre os hititas, quando, na
qualidade de esposa de um dos chefes da época, acostumada ao luxo, exercera grande poder
sobre o esposo. Quando a beleza física se foi e o marido deixou de interessar-se por ela, o choque
emocional foi demasiado forte para a sua natureza apaixonada. Tentou atrair terríveis malefícios
sobre seu marido, pedindo a um sacerdote de Baal que o amaldiçoasse. Acabou assassinada,
levando para o Além toda a frustração da sua humilhante posição de esposa orgulhosa e
desprezada.
Ao que parece, o episódio estava repercutindo na existência atual, na qual experimentava a
tragédia do homossexualismo."
Diante de tais fatos o Dr. Kelsey levou o paciente a cura, que, na opinião do paciente só
poderia ter acontecido através da ação de alguma espécie de exorcismo praticado pelo médico.
Com relação as provas de reencarnação por meio de ditados mediúnicos, Gabriel Delanne, no
livro Reencarnação, cita alguns exemplos. Escolheremos apenas um, que é relatado através de
uma carta:
“Meu caro Dr. Delanne.
Pede o amigo que lhe sejam comunicados os fatos tendentes a provar a reencarnação:
Em agosto de 1886, fizemos uma sessão de evocação, no curso da qual apresentou, a
princípio pela tiptologia, e depois, a nosso pedido, pela escrita medianímica uma entidade que
meus pais perderam, ainda de pouca idade.
Assegurava esperar, para reencarnar-se, o nascimento do meu primeiro filho especificando
que seria rapaz e viria dentro de 18 meses.
Não se esperava uma criança. Ora, em fevereiro de 1888, nascia o nosso filho mais velho,
que recebeu o nome de Allan, na data prevista, com o sexo predito.
E. B. de Reyle.
Allan Kardec perguntou aos Espíritos Superiores: “Qual a origem das faculdade
extraordinárias dos indivíduos que, sem estudo prévio, parecerem ter a intuição de certos
conhecimentos, o das línguas, do cálculo, etc.? "Responderam Os Espiritos.
Lembrança do passado; progresso anterior da alma, mas de que ela não tem consciência.
Donde queres que venham tais conhecimentos? O corpo muda, O Espírito, porém, não muda,
embora troque de roupagem."
Na citação acima, encontramos mais uma prova da reencarnação: a das idéias inatas. A
História nos revela inúmeros exemplos de gênios, de sábios, de homens valorosos cujo. pais, ou
mesmo seus filhos, não foram grandiosos como eles. Esses Espíritos, alguns deles, foram
crianças-prodígio, conseguiram pôr em dúvida as leis cientificas da hereditariedade, oferecendo,
porem, provas de que viveram outras existências no pretérito.
Não se nega a evidência da hereditariedade física ou genética. A herança moral e intelectual
e que não e jamais transmitida de pais para filhos.
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Vários sábios nasceram em meios obscuros, como e o caso de Comte, Espinosa, Kepler,
Kant, Bacon, Young, Cloude Bemard, etc.
Outros tiveram, nos descendentes, pessoas comuns ou mesmo medíocres. Pericles procriou
dois tolos.
Sócrates e Temístocles só tiveram filhos indignos. Entre os romanos vê-se o mesmo. Cícero
e seu filho; Germânico e Calígula; Vespasiano e Domiciano; o grande Marco Aurélio teve por
filho um furioso - Cômodo. Na História Modema o filho de Henrique IV, de Luis XIV, de
Cromwell, de Pedro, o Grande, como os de La Fontaine, de Crébillon, de Goethe e de Napoleão,
dispensam outros exemplos.(...)"
Ante tais provas, e muitas outras não relatadas aqui, a doutrina da reencarnação mostra ser
uma doutrina renovadora, que estimula o progresso individual e conseqüentemente, coletivo. A
comprovação reencarnatória revela o que fomos, o que somos e o que seremos. Revela alem da
existência e sobrevivência do Espírito, a Lei de Causa e Efeito, regida pelo livre-arbítrio, e a
destinação espiritual do homem: a perfeição.
“Em resumo, a teoria das vidas sucessivas satisfaz todas as aspirações de nossas almas , que
exigem uma explicação lógica do problema do destino. Ela concilia-se, perfeitamente, com a
idéia duma providência, ao mesmo tempo justa e boa, que não pune nossas faltas com suplícios
eternos, mas que nos deixa, a cada instante, o poder de reparar nossos erros, elevando-nos,
lentamente, por nossos próprios esforços."
NOTA: A titulo de informação, existe um livro de autor não espírita, o Dr. Ian Stevenson,
intitulado 20 Casos Sugestivos de Reencarnação, que recomendamos ao leitor, como uma obra
útil aos pesquisadores e estudiosos da Palingenesia.
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Perg. 219.
2. Gabriel Delanne. A Reencanação. FEB, 1979, pág 266, 310, 178, 234, 235, 236.
3. Hermínio C. Miranda. Reencarnação e Imortalidade. Psiquiatria e reencarnação.
FEB, 1976. pág 125, 126, 239 e 242..
7.3 - Justificativas do Esquecimento do passado
392. Por que perde o Espírito encarnado a lembrança do seu passado?
“Não pode o homem, nem deve, saber tudo. Deus assim o quer em Sua sabedoria. Sem o
véu que lhe oculta certas coisas, ficaria ofuscado, como quem, sem transição, saísse do escuro
para o claro. Esquecido de seu passado ele é mais senhor de si. ”
393. Como pode o homem ser responsável por atos e resgatar faltas de que se não
lembra? Como pode aproveitar da experiência de vidas de que se esqueceu? Concebe-se que as
tribulações da existência lhe servissem de lição, se se recordasse do que as tenha podido
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ocasionar. Desde que, porém, disso não se recorda, cada existência é, para ele, como se fosse a
primeira e eis que então está sempre a recomeçar. Como conciliar isto com justiça de Deus?
“Em cada nova existência, o homem dispõe de mais inteligência e melhor pode distinguir
o bem do mal. Onde o seu mérito se se lembrasse de todo o passado? Quando o Espírito volta à
vida anterior (a vida espírita), diante dos olhos se lhe estende toda a sua vida pretérita. Vê as
faltas que cometeu e que deram causa ao seu sofrer, assim como de que modo as teria evitado.
Reconhece justa a situação em que se acha e busca então uma existência capaz de reparar a que
vem de transcorrer. Escolhe provas análogas às de que não soube aproveitar, ou as lutas que
considere apropriadas ao seu adiantamento e pede a Espíritos que lhe são superiores que o
ajudem na nova empresa que sobre si toma, ciente de que o Espírito, que lhe for dado por guia
nessa outra existência, se esforçará pelo levar a reparar suas faltas, dando-lhe uma espécie de
intuição das em que incorreu. Tendes essa intuição no pensamento, no desejo criminoso que
freqüentemente vos assalta e a que instintivamente resistis, atribuindo, as mais das vezes, essa
resistência aos princípios que recebestes de vossos pais, quando é a voz da consciência que vos
fala. Essa voz, que é a lembrança do passado, vos adverte para não recairdes nas faltas de que já
vos fizestes culpados. Em a nova existência, se sofre com coragem aquelas provas e resiste, o
Espírito se eleva e ascende na hierarquia dos Espíritos, ao voltar para o meio deles.”
Não temos, é certo, durante a vida corpórea, lembrança exata do que fomos e do que
fizemos em anteriores existências; mas temos de tudo isso a intuição, sendo as nossas tendências
instintivas uma reminiscência do passado. E a nossa consciência, que é o desejo que
experimentamos de não reincidir nas faltas já cometidas, nos concita à resistência àqueles
pendores.
394. Nos mundos mais elevados do que a Terra, onde os que os habitam não se vêem
premidos pelas necessidades físicas, pelas enfermidades que nos afligem, os homens
compreendem que são mais felizes do que nós? Relativa é, em geral, a felicidade. Sentimola,
mediante comparação com um estado menos ditoso. Visto que, em suma alguns desses mundos,
se bem melhores do que o nosso, ainda não atingiram o estado de perfeição, seus habitantes
devem ter motivos de desgostos, embora de gênero diverso dos nossos. Entre nós, o rico,
conquanto não sofra as angústias das necessidades materiais, como o pobre, nem por isso se
acha isento de tribulações, que lhe tornam amarga a vida. Pergunto então:
Na situação em que se encontram, os habitantes desses mundos não se consideram tão
infelizes quanto nós, na em que nos vemos, e não se lastimam da sorte, olvidados de existências
inferiores que lhes sirvam de termos de comparação?
“Cabem aqui duas respostas distintas. Há mundos, entre os de que falas, cujos habitantes
guardam lembrança clara e exata de suas existências passadas. Esses, compreendes, pedem e
sabem apreciar a felicidade de que Deus lhes permite fruir. Outros há, porém, cujos habitantes,
achando-se, como dizes, em melhores condições do que vós na Terra, não deixam de
experimentar grandes desgostos, até desgraças. Esses não apreciam a felicidade de que gozam,
pela razão mesma de se não recordarem de um estado mais infeliz.
Entretanto, se não a apreciam como homens, apreciam-na como Espíritos.”
No esquecimento das existências anteriormente transcorridas, sobretudo quando foram
amarguradas, não há qualquer coisa de providencial e que revela a sabedoria divina?
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Nos mundos superiores, quando o recordá-las já não constitui pesadelo, é que as vidas
desgraçadas se apresentam à memória. Nos mundos inferiores, a lembrança de todas as que se
tenham sofrido não agravaria as infelicidades presentes?
Concluamos, pois, daí que tudo o que Deus fez é perfeito e que não nos toca criticar-Lhe
as obras, nem Lhe ensinar como deveria ter regulado o Universo.
Gravíssimos inconvenientes teria o nos lembrarmos das nossas individualidades
anteriores. Em certos casos, humilhar-nos-ia sobremaneira. Em outros nos exaltaria o orgulho,
peando-nos em conseqüência, o livre-arbítrio. Para nos melhorarmos, dá-nos Deus exatamente o
que nos é necessário e basta: a voz da consciência e os pendores instintivos.
Priva-nos do que nos prejudicaria. Acrescentemos que, se nos recordássemos dos nossos
precedentes atos pessoais, igualmente nos recordaríamos dos outros homens, do que resultariam
talvez os mais desastrosos efeitos para as relações sociais. Nem sempre podendo honrar-nos do
nosso passado, melhor é que sobre ele um véu seja lançado. Isto concorda perfeitamente com a
doutrina dos Espíritos acerca dos mundos superiores à Terra. Nesses mundos, onde só reina o
bem, a reminiscência do passado nada tem de dolorosa. Tal a razão por que neles as criaturas se
lembram da sua antecedente existência, como nos lembramos do que fizemos na véspera. Quanto
à estada em mundos inferiores, não passa então, como já dissemos, de mau sonho.
395. Podemos ter algumas revelações a respeito de nossas vidas anteriores?
“Nem sempre. Contudo, muitos sabem o que foram e o que faziam. Se se lhes permitisse
dizê-lo abertamente, extraordinárias revelações fariam sobre o passado.”
396. Algumas pessoas julgam ter vaga recordação de um passado desconhecido, que se
lhes apresenta como a imagem fugitiva de um sonho, que em vão se tenta reter. Não há nisso
simples ilusão?
“Algumas vezes, é uma impressão real; mas também, freqüentemente, não passa de mera
ilusão, contra a qual precisa o homem por-se em guarda, porquanto pode ser efeito de
superexcitada imaginação.”
397. Nas existências corpóreas de natureza mais elevada do que a nossa, é mais clara a
lembrança das anteriores?
“Sim, à medida que o corpo se torna menos material, com mais exatidão o homem se
lembra do seu passado. Esta lembrança, os que habitam os mundos de ordem superior a têm mais
nítida.”
398. Sendo os pendores instintivos uma reminiscência do seu passado, dar-se-á que, pelo
estudo desses pendores, seja possível ao homem conhecer as faltas que cometeu?
“Até certo ponto, assim é. Preciso se torna, porém, levar em conta a melhora que se possa
ter operado no Espírito e as resoluções que ele haja tomado na erraticidade. Pode suceder que a
existência atual seja muito melhor que a precedente.”
a) - Poderá também ser pior, isto é, poderá o Espírito cometer, numa existência, faltas
que não praticou em a precedente?
“Depende do seu adiantamento. Se não souber triunfar das provas, possivelmente será
arrastado a novas faltas, conseqüentes, então, da posição que escolheu. Mas, em geral, estas
faltas denotam mais um estacionamento que uma retrogradação, porquanto o Espírito é
suscetível de se adiantar ou de parar, nunca, porém, de retroceder.”
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399. Sendo as vicissitudes da vida corporal expiação das faltas do passado e, ao mesmo
tempo, provas com vistas ao futuro, seguir-se-á que da natureza de tais vicissitudes se possa
deduzir de que gênero foi a existência anterior?
“Muito amiúde é isso possível, pois que cada um é punido naquilo por onde pecou.
Entretanto, não há que tirar daí uma regra absoluta. As tendências instintivas constituem indício
mais seguro, visto que as provas por que passa o Espírito o são, tanto pelo que respeita ao
passado, quanto pelo que toca ao futuro.”
Chegando ao termo que a Providência lhe assinou à vida na erraticidade, o próprio
Espírito escolhe as provas a que deseja submeter-se para apressar o seu adiantamento, isto é,
escolhe meios de adiantar-se e tais provas estão sempre em relação com as faltas que lhe cumpre
expiar. Se delas triunfa, eleva-se; se sucumbe, tem que recomeçar.
O Espírito goza sempre do livre-arbítrio. Em virtude dessa liberdade é que escolhe,
quando desencarnado, as provas da vida corporal e que, quando encarnado, decide fazer ou não
uma coisa procede à escolha entre o bem e o mal. Negar ao homem o livre-arbítrio fora reduzi-lo
à condição de máquina.
Mergulhando na vida corpórea, perde o Espírito, momentaneamente, a lembrança de suas
existências anteriores, como se um véu as cobrisse. Todavia, conserva algumas vezes vaga
consciências, lhe podem ser reveladas. Esta revelação, porém, só os Espíritos superiores
espontaneamente lhe fazem, com um fim útil, nunca para satisfazer a vã curiosidade.
As existências futuras, essas em nenhum caso podem ser reveladas, pela razão de que
dependem do modo por que o Espírito se sairá da existência atual e da escolha que ulteriormente
faça.
O esquecimento das faltas praticadas não constitui obstáculo à melhoria do Espírito,
porquanto, se é certo que este não se lembra delas com precisão, não menos certo é que a
circunstância de as ter conhecido na erraticidade e de haver desejado repará-las o guia por
intuição e lhe dá a idéia de resistir ao mal, idéia que é a voz da consciência, tendo a secundá-la os
Espíritos superiores que o assistem, se atende às boas inspirações que lhe dão.
O homem não conhece os atos que praticou em suas existências pretéritas, mas pode
sempre saber qual o gênero das faltas de que se tornou culpado e qual o cunho predominante do
seu caráter. Bastará então julgar do que foi, não pelo que é, sim, pelas suas tendências.
As vicissitudes da vida corpórea constituem expiação das faltas do passado e,
simultaneamente, provas com relação ao futuro. Depuram-nos e elevam-nos, se as suportamos
resignados e sem murmurar.
A natureza dessas vicissitudes e das provas que sofremos também nos podem esclarecer
acerca do que fomos e do que fizemos, do mesmo modo que neste mundo julgamos dos atos de
um culpado pelo castigo que lhe inflige a lei.
Assim, o orgulhoso será castigado no seu orgulho, mediante a humilhação de uma
existência subalterna; o mau-rico, o avarento, pela miséria; o que foi cruel para os outros, pelas
crueldades que sofrerá; o tirano, pela escravidão; o mau filho, pela ingratidão de seus filhos; o
preguiçoso, por um trabalho forçado, etc.
Fontes de consulta
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Allan Kardec. O Evangelho Segundo O Espiritismo. Bem aventurados os
aflitos. FEB 1995. Item 11, pág. 104-105.
Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Da volta a vida corporal. Questão 392 a
399.
Allan Kardec. O que é Espiritismo? Pequena conferencia espírita. FEB 1977.
pág 114, 116 e 117.
Gabriel Delanne. A Reencarnação. FEB 1979. págs. 305, 306, 175.
Léon Denis. Depois da Morte. Objeções. FEB 1994. pág. 145-146.
Léon Denis. O Problema, do Ser do Destino e da Dor. Provas experimentais.
FEB 1983. pág 182.
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7.4 – Prelúdio da Volta à Vida Corporal
Encarnação dos Espíritos
17. - O Espiritismo ensina de que maneira se opera a união do Espírito com o corpo, na
encarnação. Pela sua essência espiritual, o Espírito é um ser indefinido, abstrato, que não pode
ter ação direta sobre a matéria, sendo-lhe indispensável um intermediário, que é o envoltório
fluídico, o qual, de certo modo, faz parte integrante dele. É semimaterial esse envoltório, isto é,
pertence à matéria pela sua origem e à espiritualidade pela sua natureza etérea. Como toda
matéria, ele é extraído do fluido cósmico universal que, nessa circunstância, sofre unia
modificação especial. Esse envoltório, denominado perispírito, faz de um ser abstrato, do
Espírito, um ser concreto, definido, apreensível pelo pensamento. Torna-o apto a atuar sobre a
matéria tangível, conforme se dá com todos os fluidos imponderáveis, que são, como se sabe, os
mais poderosos motores.
O fluido perispirítico constitui, pois, o traço de união entre o Espírito e a matéria. Enquanto
aquele se acha unido ao corpo, serve-lhe ele de veículo ao pensamento, para transmitir o
movimento às diversas partes do organismo, as quais atuam sob a impulsão da sua vontade e
para fazer que repercutam no Espírito as sensações que os agentes exteriores produzam. Servemlhe de fios condutores os nervos como, no telégrafo, ao fluido elétrico serve de condutor o fio
metálico.
18. - Quando o Espírito tem de encarnar num corpo humano em vias de formação, um laço
fluídico, que mais não é do que uma expansão do seu perispírito, o liga ao gérmen que o atraí por
uma força irresistível, desde o momento da concepção. A medida que o gérmen se desenvolve, o
laço se encurta. Sob a influência do princípio vito-material do gérmen, o perispírito, que possui
certas propriedades da matéria, se une, molécula a molécula, ao corpo em formação, donde o
poder dizer-se que o Espírito, por intermédio do seu perispírito, se enraíza, de certa maneira,
nesse gérmen, como uma planta na terra. Quando o gérmen chega ao seu pleno desenvolvimento,
completa é a união; nasce então o ser para a vida exterior.
Por um efeito contrário, a união do perispírito e da matéria carnal, que se efetuara sob a
influência do princípio vital do gérmen, cessa, desde que esse princípio deixa de atuar, em
conseqüência da desorganização do corpo. Mantida que era por uma força atuante, tal união se
desfaz, logo que essa força deixa de atuar. Então, o perispírito se desprende, molécula a
molécula, conforme se unira, e ao Espírito é restituída a liberdade. Assim, não é a partida do
Espírito que causa a morte do corpo; esta é que determina a partida do Espírito.
Dado que, um instante após a morte, completa é a integração do Espírito; que suas faculdades
adquirem até maior poder de penetração, ao passo que o princípio de vida se acha extinto no
corpo, provado evidentemente fica que são distintos o princípio vital e o princípio espiritual.
19. - O Espiritismo, pelos fatos cuja observação ele faculta, dá a conhecer os fenômenos que
acompanham essa separação, que, às vezes, é rápida, fácil, suave e insensível, ao passo que
doutras é lenta, laboriosa, horrivelmente penosa, conforme o estado moral do Espírito, e pode
durar meses inteiros.
20. - Um fenômeno particular, que a observação igualmente assinala, acompanha sempre a
encarnação do Espírito. Desde que este é apanhado no laço fluídico que o prende ao gérmen,
entra cm estado de perturbação, que aumenta, à medida que o laço se aperta, perdendo o Espírito,
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nos últimos momentos, toda a consciência de si próprio, de sorte que jamais presencia o seu
nascimento. Quando a criança respira, começa o Espírito a recobrar as faculdades, que se
desenvolvem à proporção que se formam e consolidam os órgãos que lhes hão de servir às
manifestações.
21. - Mas, ao mesmo tempo que o Espírito recobra a consciência de si mesmo, perde a lembrança
do seu passado, sem perder as faculdades, as qualidades e as aptidões anteriormente adquiridas,
que haviam ficado temporariamente em estado de latência e que, voltando à atividade, vão ajudálo a fazer mais e melhor do que antes. Ele renasce qual se fizera pelo seu trabalho anterior; o seu
renascimento lhe é um novo ponto de partida, um novo degrau a subir. Ainda aí a bondade do
Criador se manifesta, porquanto, adicionada aos amargores de uma nova existência, a lembrança,
muitas vezes aflitiva e humilhante, do passado, poderia turbá-lo e lhe criar embaraços. Ele
apenas se lembra do que aprendeu, por lhe ser isso útil. Se às vezes lhe é dado ter uma intuição
dos acontecimentos passados, essa intuição é como a lembrança de um sonho fugitivo. Ei-lo,
pois, novo homem por mais antigo que seja como Espírito. Adota novos processos, auxiliado
pelas suas aquisições precedentes.
Quando retorna à vida espiritual, seu passado se lhe desdobra diante dos olhos e ele julga de
como empregou o tempo, se bem ou mal.
22. - Não há, portanto, solução de continuidade na vida espiritual, sem embargo do esquecimento
do passado. Cada Espírito é sempre o mesmo eu, antes, durante e depois da encarnação, sendo
esta, apenas, uma fase da sua existência. O próprio esquecimento se dá tão-só no curso da vida
exterior de relação. Durante o sono, desprendido, em parte, dos liames carnais, restituído à
liberdade e à vida espiritual, o Espírito se lembra, pois que, então, já não tem a visão tão
obscurecida pela matéria.
23. - Tomando-se a Humanidade no grau mais ínfimo da escala espiritual, como se encontra
entre os mais atrasados selvagens, perguntar-se-á se é aí o ponto inicial da alma humana. Na
opinião de alguns filósofos espiritualistas, o princípio inteligente, distinto do princípio material,
se individualiza e elabora, passando pelos diversos graus da animalidade. É aí que a alma se
ensaia para a vida e desenvolve, pelo exercício, suas primeiras faculdades. Esse seria para ela,
por assim dizer, o período de incubação. Chegada ao grau de desenvolvimento que esse estado
comporta, ela recebe as faculdades especiais que constituem a alma humana. Haveria assim
filiação espiritual do animal para o homem, como há filiação corporal. Este sistema, fundado na
grande lei de unidade que preside à criação, corresponde, forçoso é convir, à justiça e à bondade
do Criador; dá uma saída, uma finalidade, um destino aos animais, que deixam então de formar
uma categoria de seres deserdados, para terem, no futuro que lhes está reservado, uma
compensação a seus sofrimentos. O que constitui o homem espiritual não é a sua origem: são os
atributos especiais de que ele se apresenta dotado ao entrar na humanidade, atributos que o
transformam, tornando-o um ser distinto, como o fruto saboroso é distinto da raiz amarga que lhe
deu origem. Por haver passado pela fieira da animalidade, o homem não deixaria de ser homem;
já não seria animal, como o fruto não é a raiz, como o sábio não é o feto informe que o pôs no
mundo.
Mas, este sistema levanta múltiplas questões, cujos prós e contras não é oportuno discutir aqui,
como não o é o exame das diferentes hipóteses que se têm formulado sobre este assunto. Sem,
pois, pesquisarmos a origem do Espírito, sem procurarmos conhecer as fieiras pelas quais haja
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ele, porventura, passado, tomamo-lo ao entrar na humanidade, no ponto em que, dotado de senso
moral e de livre-arbítrio, começa a pesar-lhe a responsabilidade dos seus atos.
24. - A obrigação que tem o Espírito encarnado de prover ao alimento do corpo, à sua segurança,
ao seu bem-estar, o força a empregar suas faculdades em investigações, a exercitá-las e
desenvolvê-las. Útil, portanto, ao seu adiantamento é a sua união com a matéria. Daí o constituir
uma necessidade a encarnação. Além disso, pelo trabalho inteligente que ele executa em seu
proveito, sobre a matéria, auxilia a transformação e o progresso material do globo que lhe serve
de habitação. É assim que, progredindo, colabora na obra do Criador, da qual se torna fator
inconsciente.
25. - Todavia, a encarnação do Espírito não é constante, nem perpétua: é transitória. Deixando
um corpo, ele não retoma imediatamente outro. Durante mais ou menos considerável lapso de
tempo, vive da vida espiritual, que é sua vida normal, de tal sorte que insignificante vem a ser o
tempo que lhe duram as encarnações, se comparado ao que passa no estado de Espírito livre.
No intervalo de suas encarnações, o Espírito progride igualmente, no sentido de que aplica ao
seu adiantamento os conhecimentos e a experiência que alcançou no decorrer da vida corporal;
examina o que fez enquanto habitou a Terra, passa em revista o que aprendeu, reconhece suas
faltas, traça planos e toma resoluções pelas quais conta guiar-se em nova existência, com a idéia
de melhor se conduzir. Desse jeito, cada existência representa um passo para a frente no caminho
do progresso, um a espécie de escola de aplicação.
26. - Normalmente, a encarnação não é uma punição para o Espírito, conforme pensam alguns,
mas uma condição inerente à inferioridade do Espírito e um meio de ele progredir. (O Céu e o
Inferno, cap. III, nos 8 e seguintes.)
À medida que progride moralmente, o Espírito se desmaterializa, isto é, depura-se, com o
subtrair-se à influência da matéria; sua vida se espiritualiza, suas faculdades e percepções se
ampliam; sua felicidade se torna proporcional ao progresso realizado. Entretanto, como atua em
virtude do seu livre-arbítrio, pode ele, por negligência ou má-vontade, retardar o seu avanço;
prolonga, conseguintemente, a duração de suas encarnações materiais, que, então, se lhe tornam
uma punição, pois que, por falta sua, ele permanece nas categorias inferiores, obrigado a
recomeçar a mesma tarefa. Depende, pois, do Espírito abreviar, pelo trabalho de depuração
executado sobre si mesmo, a extensão do período das encarnações.
27. - O progresso material de um planeta acompanha o progresso moral de seus habitantes. Ora,
sendo incessante, como é, a criação dos mundos e dos Espíritos e progredindo estes mais ou
menos rapidamente, conforme o uso que façam do livre-arbítrio, segue-se que há mundos mais
ou menos antigos, em graus diversos de adiantamento físico e moral, onde é mais ou menos
material a encarnação e onde, por conseguinte, o trabalho, para os Espíritos, é mais ou menos
rude. Deste ponto de vista, a Terra é um dos menos adiantados.
Povoada de Espíritos relativamente inferiores, a vida corpórea é aí mais penosa do que noutros
orbes, havendo-os também mais atrasados, onde a existência é ainda mais penosa do que na
Terra e em confronto com os quais esta seria, relativamente, um mundo ditoso.
28. - Quando, em um mundo, os Espíritos hão realizado a soma de progresso que o estado desse
mundo comporta, deixam-no para encarnar em outro mais adiantado, onde adquiram novos
conhecimentos e assim por diante, até que, não lhes sendo mais de proveito algum a encarnação
cm corpos materiais, passam a viver exclusivamente da vida espiritual, em a qual continuam a
progredir, mas noutro sentido e por outros meios. Chegados ao ponto culminante do progresso,
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gozam da suprema felicidade. Admitidos nos conselhos do Onipotente, conhecem-lhe o
pensamento e se tornam seus mensageiros, seus ministros diretos no governo dos mundos, tendo
sob suas ordens os Espíritos de todos os graus de adiantamento.
Assim, qualquer que seja o grau em que se achem na hierarquia espiritual, do mais ínfimo ao
mais elevado, têm eles suas atribuições no grande mecanismo do Universo; todos são úteis ao
conjunto, ao mesmo tempo que a si próprios. Aos menos adiantados, como a simples serviçais,
incumbe o desempenho, a princípio inconsciente, depois, cada vez mais inteligente, de tarefas
materiais. Por toda parte, no mundo espiritual, atividade, em nenhum ponto a ociosidade inútil.
A coletividade dos Espíritos constitui, de certo modo, a alma do Universo. Por toda parte, o
elemento espiritual é que atua em tudo, sob o influxo do pensamento divino. Sem esse elemento,
só há matéria inerte, carente de finalidade, de inteligência, tendo por único motor as forças
materiais, cuja exclusividade deixa insolúveis uma imensidade de problemas. Com a ação do
elemento espiritual individualizado, tudo tem uma finalidade, uma razão de ser, tudo se explica.
Prescindindo da espiritualidade, o homem esbarra em dificuldades insuperáveis.
29. - Quando a Terra se encontrou em condições climáticas apropriadas à existência da espécie
humana, encarnaram nela Espíritos humanos. Donde vinham? Quer eles tenham sido criados
naquele momento; quer tenham procedido, completamente formados, do espaço, de outros
mundos, ou da própria Terra, a presença deles nesta, a partir de certa época, ê um fato, pois que
antes deles só animais havia. Revestiram-se de corpos adequados às suas necessidades especiais,
às suas aptidões, e que, fisionomicamente, tinham as características da animalidade. Sob a
influência deles e por meio do exercício de suas faculdades, esses corpos se modificaram e
aperfeiçoaram é o que a observação comprova. Deixemos então de lado a questão da origem,
insolúvel por enquanto; consideremos o Espírito, não em seu ponto de partida, mas no momento
em que, manifestando-se nele os primeiros germens do livre-arbítrio e do senso moral o vemos a
desempenhar o seu papel humanitário, sem cogitarmos do meio onde haja transcorrido o período
de sua infância, ou, se o preferirem, de sua incubação. Mau grado a analogia do seu envoltório
com o dos animais, poderemos diferençá-lo destes últimos pelas faculdades intelectuais e morais
que o caracterizam. como, debaixo das mesmas vestes grosseiras, distinguimos o rústico do
homem civilizado.
30. - Conquanto devessem ser pouco adiantados os primeiros que vieram, pela razão mesma de
terem de encarnar em corpos muito imperfeitos, diferenças sensíveis haveria decerto entre seus
caracteres e aptidões. Os que se assemelhavam, naturalmente se agruparam por analogia e
simpatia. Achou-se a Terra, assim, povoada de Espíritos de diversas categorias, mais ou menos
aptos ou rebeldes ao progresso. Recebendo os corpos a impressão do caráter do Espírito e
procriando-se esses corpos na conformidade dos respectivos tipos, resultaram daí diferentes
raças, quer quanto ao físico, quer quanto ao moral (nº 11).
Continuando a encarnar entre os que se lhes assemelhavam, os Espíritos similares perpetuaram o
caráter distintivo, físico e moral, das raças e dos povos, caráter que só com o tempo desaparece,
mediante a fusão e o progresso deles. (Revue Spirite, julho de 1860, página 198: «Frenologia e
fisiognomia».)
31. - Podem comparar-se os Espíritos que vieram povoar a Terra a esses bandos de emigrantes de
origens diversas, que vão estabelecer-se numa terra virgem, onde encontram madeira e pedra
para erguerem habitações, cada um dando à sua um cunho especial, de acordo com o grau do seu
saber e com o seu gênio particular. Grupam-se então por analogia de origens e de gostos,
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acabando os grupos por formar tribos, em seguida povos, cada qual com costumes e caracteres
próprios.
32. - Não foi, portanto, uniforme o progresso em toda a espécie humana. Como era natural, as
raças mais inteligentes adiantaram-se às outras, mesmo sem se levar em conta que muitos
Espíritos recém-nascidos para a vida espiritual, vindo encarnar na Terra juntamente com os
primeiros aí chegados, tornaram ainda mais sensível a diferença em matéria de progresso. Fora,
com efeito, impossível atribuir-se a mesma ancianidade de criação aos selvagens, que mal se
distinguem do macaco, e aos chineses, nem, ainda menos, aos europeus civilizados. Entretanto,
os Espíritos dos selvagens também fazem parte da Humanidade e alcançarão um dia o nível em
que se acham seus irmãos mais velhos. Mas, sem dúvida, não será em corpos da mesma raça
física, impróprios a um certo desenvolvimento intelectual e moral. Quando o instrumento já não
estiver em correspondência com o progresso que hajam alcançado, eles emigrarão daquele meio,
para encarnar noutro mais elevado e assim por diante, até que tenham conquistado todas as
graduações terrestres, ponto em que deixarão a Terra, para passar a mundos mais avançados.
(Revue Spirite, abril de 1862, pág. 97: «Perfectibilidade da raça negra».)
Reencarnações
33. - O princípio da reencarnação é uma conseqüência necessária da lei de progresso. Sem a
reencarnação, como se explicaria a diferença que existe entre o presente estado social e o dos
tempos de barbárie? Se as almas são criadas ao mesmo tempo que os corpos, as que nascem hoje
são tão novas, tão primitivas, quanto as que viviam há mil anos; acrescentemos que nenhuma
conexão haveria entre elas, nenhuma relação necessária; seriam de todo estranhas umas às
outras. Por que, então, as de hoje haviam de ser melhor dotadas por Deus, do que as que as
precederam? Por que têm aquelas melhor compreensão? Por que possuem instintos mais
apurados, costumes mais brandos? Por que têm a intuição de certas coisas, sem as haverem
aprendido?
Duvidamos de que alguém saia desses dilemas, a menos admita que Deus cria almas de diversas
qualidades, de acordo com os tempos e lugares, proposição inconciliável com a idéia de uma
justiça soberana. (Cap. II, nº 10.)
Admiti, ao contrário, que as almas de agora já viveram em tempos distantes; que possivelmente
foram bárbaras como os séculos em que estiveram no mundo, mas que progrediram; que para
cada nova existência trazem o que adquiriram nas existências precedentes; que, por conseguinte,
as dos tempos civilizados não são almas criadas mais perfeitas, porém que se aperfeiçoaram por
si mesmas com o tempo, e tereis a única explicação plausível da causa do progresso social. (O
Livro dos Espíritos, Parte 2ª, caps. IV e V.)
34. - Pensam alguns que as diferentes existências da alma se efetuam, passando elas de mundo
em mundo e não num mesmo orbe, onde cada Espírito viria uma única vez. Seria admissível esta
doutrina, se todos os habitantes da Terra estivessem no mesmo nível intelectual e moral. Eles
então só poderiam progredir indo de um mundo a outro e nenhuma utilidade lhes adviria da
encarnação na Terra. Desde que aí se notam a inteligência e a moralidade em todos os graus,
desde a selvajaria que beira o animal até a mais adiantada civilização, é evidente que esse mundo
constituí um vasto campo de progresso Por que haveria o selvagem de ir procurar alhures o grau
de progresso logo acima do em que ele está, quando esse grau se lhe acha ao lado e assim
sucessivamente? Por que não teria podido o homem adiantado fazer os seus primeiros estágios
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senão em mundos inferiores, quando ao seu derredor estão seres análogos aos desses mundos?
quando, não só de povo a povo, mas no seio do mesmo povo e da mesma família, há diferentes
graus de adiantamento?
Se fosse assim, Deus houvera feito coisa inútil, colocando lado a lado a ignorância e o saber, a
barbaria e a civilização, o bem e o mal, quando precisamente esse contacto é que faz que os
retardatários avancem.
Não há, pois, necessidade de que os homens mudem de inundo a cada etapa de aperfeiçoamento,
como não há de que o estudante mude de colégio para passar de uma classe a outra. Longe de ser
isso vantagem para o progresso, ser-lhe-ia um entrave, porquanto o Espírito ficaria privado do
exemplo que lhe oferece a observação do que ocorre nos graus mais elevados e da possibilidade
de reparar seus erros no mesmo meio e em presença dos a quem ofendeu, possibilidade que é,
para ele, o mais poderoso modo de realizar o seu progresso moral. Após curta coabitação,
dispersando-se os Espíritos e tornando-se estranhos uns aos outros, romper-se-iam os laços de
família, à falta de tempo para se consolidarem.
Ao inconveniente moral se juntaria um inconveniente material. A natureza dos elementos, as leis
orgânicas, as condições de existência variam, de acordo com os mundos; sob esse aspecto, não
há dois perfeitamente idênticos. Os tratados de Física, de Química, de Anatomia, de Medicina,
de Botânica, etc., para nada serviriam nos outros mundos; entretanto, não fica perdido o que
neles se aprende; não só isso desenvolve a inteligência, como também as idéias que se colhem de
tais obras auxiliam a aquisição de outras. (Cap. VI, nos 61 e seguintes.) Se apenas uma única vez
fizesse o Espírito a sua aparição, freqüentemente brevíssima, num mesmo mundo, em cada
imigração ele se acharia em condições inteiramente diversas; operaria de cada vez sobre
elementos novos, com força e segundo leis que desconheceria, antes de ter tido tempo de
elaborar os elementos conhecidos, de os estudar, de os aplicar. Teria de fazer, de cada vez, um
novo aprendizado e essas mudanças contínuas representariam um obstáculo ao progresso. O
Espírito, portanto, tem que permanecer no mesmo mundo, até que haja adquirido a soma de
conhecimentos e o grau de perfeição que esse mundo comporta. (Nº 31.)
Que os Espíritos deixem, por um mundo mais adiantado, aquele do qual nada mais podem
auferir, é como deve ser e é. Tal o princípio. Se alguns há que antecipadamente deixam o mundo
em que vinham encarnando, é isso devido a causas individuais que Deus pesa em sua sabedoria.
Tudo na criação tem uma finalidade, sem o que Deus não seria nem prudente, nem sábio. Ora, se
a Terra se destinasse a ser uma única etapa do progresso para cada indivíduo, que utilidade
haveria, para os Espíritos das crianças que morrem em tenra idade, vir passar aí alguns anos,
alguns meses, algumas horas, durante os quais nada podem haurir dele? O mesmo ocorre se
pondere com referência aos idiotas e aos cretinos. Uma teoria somente é boa sob a condição de
resolver todas as questões a que diz respeito. A questão das mortes prematuras há sido uma pedra
de tropeço para todas as doutrinas, exceto para a Doutrina Espírita, que a resolveu de maneira
racional e completa. Para o progresso daqueles que cumprem na Terra uma missão normal, há
vantagem real em volverem ao mesmo meio para aí continuarem o que deixaram inacabado,
muitas vezes na mesma família ou em contacto com as mesmas pessoas, a fim de repararem o
mal que tenham feito, ou de sofrerem a pena de talião.
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Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Da volta do Espírito à vida corporal. Perguntas
330 a 360.
2. Allan Kardec. A Gênese. Encarnação dos Espíritos. Capítulo XI – Gênese espiritual.
3. Gabriel Delanne. A evolução anímica. O papel da alma do ponto de vista da encarnação,
da hereditariedade e da loucura. FEB 1976, pág. 192.
4. Gustavo Geley. Resumo da doutrina espírita. Lake 1975. pág. 37.
5. Francisco Cândido Xavier. Pelo espírito de André Luiz. Entre a Terra e o Céu. Ante a
reencarnação. FEB 1995. pág. 179 e 183.
6. Francisco Cândido Xavier. Pelo espírito de André Luiz. Missionários da Luz.
Reencarnação. FEB 1995. pág. 196, 210, 216 e 218.
7.5 - A infância
379. É tão desenvolvido, quanto o de um adulto, o Espírito que anima o corpo de uma criança?
“Pode até ser mais, se mais progrediu. Apenas a imperfeição dos órgãos infantis o impede de se
manifestar. Obra de conformidade com o instrumento de que dispõe.”
380. Abstraindo do obstáculo que a imperfeição dos órgãos opõe à sua livre manifestação, o
Espírito, numa criancinha, pensa como criança ou como adulto?
“Desde que se trate de uma criança, é claro que, não estando ainda nela desenvolvidos, não
podem os órgãos da inteligência dar toda a intuição própria de um adulto ao Espírito que a
anima. Este, pois, tem, efetivamente, limitada a inteligência, enquanto a idade lhe não amadurece
a razão. A perturbação que o ato da encarnação produz no Espírito não cessa de súbito, por
ocasião do nascimento. Só gradualmente se dissipa, com o desenvolvimento dos órgãos.”
Há um fato de observação, que apóia esta resposta. Os sonhos, numa criança, não apresentam o
caráter dos de um adulto. Quase sempre pueril é o objeto dos sonhos infantis, o que indica de que
natureza são as preocupações do respectivo Espírito.
381. Por morte da criança, readquire o Espírito, imediatamente, o seu precedente vigor?
“Assim tem que ser, pois que se vê desembaraçado de seu invólucro corporal. Entretanto, não
readquire a anterior lucidez, senão quando se tenha completamente separado daquele envoltório,
isto é, quando mais nenhum laço exista entre ele e o corpo.”
382. Durante a infância sofre o Espírito encarnado, em conseqüência do constrangimento que a
imperfeição dos órgãos lhe impõe?
“Não. Esse estado corresponde a uma necessidade, está na ordem da Natureza e de acordo com
as vistas da Providência. É um período de repouso do Espírito.”
383. Qual, para este, a utilidade de passar pelo estado de infância?
“Encarnado, com o objetivo de se aperfeiçoar, o Espírito, durante esse período, é mais acessível
às impressões que recebe, capazes de lhe auxiliarem o adiantamento, para o que devem
contribuir os incumbidos de educá-lo.”
384. Por que é o choro a primeira manifestação da criança ao nascer?
“ Para estimular o interesse da genitora e provocar os cuidados de que há mister.
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Não é evidente que se suas manifestações fossem todas de alegria, quando ainda não sabe falar,
pouco se inquietariam os que o cercam com os cuidados que lhe são indispensáveis?
Admirai, pois, em tudo a sabedoria da Providência.”
385. Que é o que motiva a mudança que se opera no caráter do indivíduo em certa idade,
especialmente ao sair da adolescência? É que o Espírito se modifica?
“É que o Espírito retoma a natureza que lhe é própria e se mostra qual era”. Não conheceis o que
a inocência das crianças oculta. Não sabeis o que elas são, nem o que foram, nem o que serão.
Contudo, afeição lhes tendes, as acaricias, como se fossem parcelas de vós mesmos, a tal ponto
que se considera o amor que uma mãe consagra a seus filhos como o maior amor que um ser
possa votar a outro. Donde nasce o meigo afeto, a terna benevolência que mesmo os estranhos
sentem por uma criança? Sabeis? Não. Pois bem! Vou explicá-lo.”
“As crianças são os seres que Deus manda a novas existências. Para que não lhe possam imputar
excessiva severidade, dá-lhes Ele todos os aspectos da inocência. Ainda quando se trata de uma
criança de maus pendores, cobrem-se-lhe as más ações com a capa da inconsciência. Essa
inocência não constitui superioridade real com relação ao que eram antes, não. É a imagem do
que deveriam ser e, se não o são, o conseqüente castigo exclusivamente sobre elas recai”.
“Não foi, todavia, por elas somente que Deus lhes deu esse aspecto de inocência; foi também e
sobretudo por seus pais, de cujo amor necessita a fraqueza que as caracteriza.
Ora, esse amor se enfraqueceria grandemente à vista de um caráter áspero e intratável, ao passo
que, julgando seus filhos bons e dóceis, os pais lhes dedicam toda a afeição e os cercam dos mais
minuciosos cuidados. Desde que, porém, os filhos não mais precisam da proteção e assistência
que lhes foram dispensadas durante quinze ou vinte anos, surge-lhes o caráter real e individual
em toda a nudez. Conservam-se bons, se eram fundamentalmente bons; mas, sempre irisados de
matizes que a primeira infância manteve ocultos. “Como vedes, os processos de Deus são sempre
os melhores e, quando se tem o coração puro, facilmente se lhes apreende a explicação”. Com
efeito, ponderai que nos vossos lares possivelmente nascem crianças cujos Espíritos vêm de
mundos onde contraíram hábitos diferentes dos vossos e dizei-me como poderiam estar no vosso
meio esses seres, trazendo paixões diversas das que nutris, inclinações, gostos, inteiramente
opostos aos vossos; como poderiam enfileirar-se entre vós, senão como Deus o determinou, isto
é, passando pelo tamis da infância? Nesta se vêm confundir todas as idéias, todos os caracteres,
todas as variedades de seres gerados pela infinidade dos mundos em que medram as criaturas. E
vós mesmos, ao morrerdes, vos achareis num estado que é uma espécie de infância, entre novos
irmãos. Ao volverdes à existência extraterrena, ignorareis os hábitos, os costumes, as relações
que se observam nesse mundo, para vós, novo. Manejareis com dificuldade uma linguagem que
não estais acostumado a falar, linguagem mais vivaz do que o é agora o vosso pensamento.
“A infância ainda tem outra utilidade. Os Espíritos só entram na vida corporal para se
aperfeiçoarem, para se melhorarem. A delicadeza da idade infantil os torna brandos, acessíveis
aos conselhos da experiência e dos que devam fazê-los progredir. Nessa fase é que se lhes pode
reformar os caracteres e reprimir os maus pendores. Tal o dever que Deus impôs aos pais, missão
sagrada de que terão de dar contas.
“Assim, portanto, a infância é não só útil, necessária, indispensável, mas também conseqüência
natural das leis que Deus estabeleceu e que regem o Universo.”
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Simplicidade e pureza de coração
1. Bem-aventurados os que têm puro o coração, porquanto verão a Deus. (S. Mateus, cap. V, v.
8.)
2. Apresentaram-lhe então algumas crianças, a fim de que ele as tocasse, e, como seus
discípulos afastassem com palavras ásperas os que lhas apresentavam, Jesus, vendo isso,
zangou-se e lhes disse: “Deixai que venham a mim as criancinhas e não as impeçais, porquanto
o reino dos céus é para os que se lhes assemelham. - Digo-vos, em verdade, que aquele que não
receber o reino de Deus como uma criança, nele não entrará”.- E, depois de as abraçar,
abençoou-as, impondo-lhes as mãos. (S. MARCOS, cap. X, vv. 13 a 16.)
3. A pureza do coração é inseparável da simplicidade e da humildade. Exclui toda idéia de
egoísmo e de orgulho. Por isso é que Jesus toma a infância como emblema dessa pureza, do
mesmo modo que a tomou como o da humildade.
Poderia parecer menos justa essa comparação, considerando-se que o Espírito da criança pode
ser muito antigo e que traz, renascendo para a vida corporal, as imperfeições de que se não tenha
despojado em suas precedentes existências. Só um Espírito que houvesse chegado à perfeição
nos poderia oferecer o tipo da verdadeira pureza. E exata a comparação, porém, do ponto de vista
da vida presente, porquanto a criancinha, não havendo podido ainda manifestar nenhuma
tendência perversa, nos apresenta a imagem da inocência e da candura.
Daí o não dizer Jesus, de modo absoluto, que o reino dos céus é para elas, mas para os que se
lhes assemelhem.
4. Pois que o Espírito da criança já viveu, por que não se mostra, desde o nascimento, tal qual é?
Tudo é sábio nas obras de Deus. A criança necessita de cuidados especiais, que somente a
ternura materna lhe pode dispensar, ternura que se acresce da fraqueza e da ingenuidade da
criança. Para uma mãe, seu filho é sempre um anjo e assim era preciso que fosse, para lhe cativar
a solicitude. Ela não houvera podido ter-lhe o mesmo devotamento, se, em vez da graça ingênua,
deparasse nele, sob os traços infantis, um caráter viril e as idéias de um adulto e, ainda menos, se
lhe viesse a conhecer o passado.
Aliás, faz-se necessário que a atividade do princípio inteligente seja proporcionada à fraqueza do
corpo, que não poderia resistir a uma atividade muito grande do Espírito, como se verifica nos
indivíduos grandemente precoces. Essa a razão por que, ao aproximar-se-lhe a encarnação, o
Espírito entra em perturbação e perde pouco a pouco a consciência de si mesmo, ficando, por
certo tempo, numa espécie de sono, durante o qual todas as suas faculdades permanecem em
estado latente. E necessário esse estado de transição para que o Espírito tenha um novo ponto de
partida e para que esqueça, em sua nova existência, tudo aquilo que a possa entravar. Sobre ele,
no entanto, reage o passado. Renasce para a vida maior, mais forte, moral e intelectualmente,
sustentado e secundado pela intuição que conserva da experiência adquirida.
A partir do nascimento, suas idéias tomam gradualmente impulso, à medida que os órgãos se
desenvolvem, pelo que se pode dizer que, no curso dos primeiros anos, o Espírito é
verdadeiramente criança, por se acharem ainda adormecidas as idéias que lhe formam o fundo do
caráter. Durante o tempo em que seus instintos se conservam amodorrados, ele é mais maleável
e, por isso mesmo, mais acessível às impressões capazes de lhe modificarem a natureza e de
fazê-lo progredir, o que toma mais fácil a tarefa que incumbe aos pais.
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O Espírito, pois, enverga temporariamente a túnica da inocência e, assim, Jesus está com a
verdade, quando, sem embargo da anterioridade da alma, toma a criança por símbolo da pureza e
da simplicidade.
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Da pluralidade das existências. FEB 1994. Parte
2ª, perg. 115-a, 183, 379 a 385.
2. Allan Kardec. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Bem-aventurados os que têm puro
o coração. FEB 1995. Item 3 e 4, pág. 147 a 149.
3. A Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida. Brasília: Sociedade Bíblica do
Brasil, 1969. Marcos, 10:14, Mateus, 18:2-3.
7.6 - Encarnação nos diferentes mundos
A encarnação nos diferentes mundos obedece a um critério de progresso moral.
“Quando, em um mundo, os Espíritos hão realizado a soma de progresso que o estado desse
mundo comporta, deixam-no para encarnar em outro mais adiantado, onde adquiram novos
conhecimentos.” (02)
“Os Espíritos que encarnam em um mundo não se acham a eles presos, indefinidamente.
O Espírito elevado é destinado a renascer em planetas mais bem dotados que o nosso. A escala
grandiosa dos mundos tem inúmeros graus, dispostos para a ascensão progressiva das almas, que
os devem transpor cada um por sua vez.
Sobre os mundos existentes para morada dos Espíritos, disse Jesus:
“Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fora, eu vo-lo teria dito. Pois vou
preparar-vos lugar.”
Nas esferas superiores à Terra o império da matéria é menor.
Lá se desconhecem as guerras, carecendo de objetos os ódios e as discórdias, porque ninguém
pensa em causar dano ao seu semelhante.
O ser humano, nesses mundos, não mais se arrasta penosamente sob a ação da pesada atmosfera;
desloca-se de um lugar para outro com muita facilidade. As necessidades corpóreas são quase
nulas e os trabalhos rudes, desconhecidos. Mais longa que a nossa, a existência aí se passa no
estudo, na participação da obras de uma civilização aperfeiçoada, tendo por base a mais pura
moral, o respeito aos direitos de todos, a amizade e a fraternidade.
A intuição que seus habitantes têm do futuro, a segurança que uma consciência isenta de remorso
lhes dá, fazem que a morte nenhuma apreensão lhes cause. Encaram-na de frente, sem temor,
como simples transformação.
Nenhum pensamento oculto, nenhum sentimento de inveja tem ingresso nessas almas delicadas.
O amor, a confiança e a sinceridade presidem a essas reuniões onde todos recolhem as instruções
dos mensageiros divinos, onde se aceitam as tarefas que contribuem para eleva-los ainda mais.
A encarnação em mundo inferior àquele em que os Espíritos viveram em sua última existência
pode ocorrer em dois casos:
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a) em missão, com o objetivo de auxiliarem o progresso, caso em que aceitam
alegres as tribulações de tal existência, por lhes proporcionar meio de se
adiantarem.
b) Como expiação, e a punição (dos Espíritos) consiste em não avançarem, em
recomeçarem, no meio conveniente à sua natureza, as existências mal
empregadas.
Nos mundos superiores, a forma corpórea aí é sempre a humana, porém muito mais embelezada,
aperfeiçoada e, sobretudo, purificada. O corpo nada tem da materialidade terrestre e não está,
conseguintemente, sujeito às necessidades, nem às doenças ou deteriorações que a
predominância da matéria provoca.
Fontes de consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Da pluralidade das existências. FEB 1994. Parte 2ª
2. Allan Kardec. A Gênese. Gênese Espiritual. FEB 1995. Item 28,, pág. 219.
3. Allan Kardec. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Há muitas moradas na casa de meu
Pai. FEB 1995. Item 5, 9 e 10, pág. 73 a 77.
4. A Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida. Brasília: Sociedade Bíblica do
Brasil, 1969. João 14:2, pág. 132.
5. Léon Denis. Depois da Morte. A vida superior. FEB 1994. Parte 4ª, pág. 221 e 224.
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