FICHAMENTO E INTERCÂMBIO DE EXPERIÊNCIAS COM SAFS NO BRASIL TÍTULO: Práticas agrícolas e a sustentabilidade de sistemas agroflorestais, Assentamento Fortaleza, Una, litoral sul da Bahia RESUMO: este estudo analisou a sustentabilidade dos sistemas agroflorestais, a partir das práticas agrícolas adotadas e de questionários que avaliaram o comportamento produtivo e a qualidade ambiental local. Observa-se que existe uma relação direta entre práticas produtivas e sustentabilidade dos sistemas agroflorestais. REDATORA DA FICHA: Nome: Paraguassu, Lídice Almeida Arlego. Organização: FTC = Faculdade de Ciências e Tecnologia Endereço: FTC – Avenida Luís Viana filho, 8812 – Pituaçu, cep 41820-000, Salvador, Bahia, Brasil, fax 55 71 2818019, tel. 55 71 2818106, www.ftc.br DATA DE REDAÇÃO: 2004/10/21 TEXTO: O contexto da ação A região sul do estado da Bahia apresenta um conjunto de áreas de preservação ambiental que protege parte dos remanescentes de Mata Atlântica, dentre elas a Reserva Biológica de Una, porém de tamanho insuficiente para garantir a conservação deste ecossistema. Estudos locais indicam que são necessárias áreas mais extensas para se obter processos ecológicos e evolutivos em longo prazo, destacando a importância das florestas que estão no seu entorno. Nestas áreas, concentram-se também populações assentadas que hoje estão numa situação particularmente difícil, reagindo a isso com abandono total da lavoura, abertura de espaço para o avanço da pecuária e o desmatamento para a plantação de pastagens e venda de madeira de lei para as serrarias. A discussão do conceito de sustentabilidade ao nível de sistemas agroflorestais se traduz na adoção de práticas, como a conservação dos recursos renováveis, adaptação da atividade ao meio ambiente e a manutenção de um nível alto, porém sustentável, de produtividade (monte, 2000). Conceitualização e objetivos A problemática sócio-ambiental do litoral sul da Bahia apresenta evidências comprovadas que a insustentabilidade do modelo de crescimento econômico e desenvolvimento agrícola, caracterizado pela apropriação indiscriminada do território e dilapidação do potencial ecológico, está comprometendo sobremaneira as condições de vida e a qualidade ambiental da região. A sustentabilidade é um conceito multifacetado, segundo o qual diferentes componentes do ecossistema devem ser valorados pela sociedade, ou pelo menos por parte dela, visto que o conceito de sustentabilidade é encarado sob diferentes perspectivas por diversos segmentos sociais. Para demonstrar a pluralidade de visões apresentadas pelo conceito, Gale & Cordray (1994) propuseram nove tipos de sustentabilidade e a que aspecto se referem: domínio de produção (eficiência econômica), sistemas de dependência social (valores culturais), benefícios humanos (certeza de abundância de recurso), preservação de nichos (interdependência entre população e ecossistema), produção global (produção essencial às necessidades humanas), identidade ecossistêmica (comprometimento com a diversidade biológica), auto-suficiência (compromisso com a autonomia do ecossistema), seguridade ecossistêmica (segurança contra perda da diversidade e degradação), benefícios ao ecossistema (respeitos às interações sistêmicas naturais). Apoio financeiro: Apoio técnico: www.almedio.fr FICHAMENTO E INTERCÂMBIO DE EXPERIÊNCIAS COM SAFS NO BRASIL A noção de desenvolvimento sustentável é derivada da noção de “agricultura sustentável”, veiculada a partir dos anos 80, e dentre seus distintos conceitos, dois grupos se destacam: um discute a sustentabilidade da agricultura no contexto da satisfação das necessidades e da segurança alimentar; outro, partindo de uma abordagem sistêmica, discute as características necessárias para que um ecossistema ou um agroecossistema seja sustentável (Müller, 1995). Para esta última definição, as tecnologias agroecológicas são as mais relatadas, em experiências de avaliação, destacando-se o uso de leguminosas, o controle biológico, a manutenção da diversidade e os sistemas agroflorestais (SAF). Os sistemas agroflorestais, especificamente, preenchem muitos requisitos da sustentabilidade, por utilizarem recursos existentes e práticas de manejo que otimizam a produção combinada e por gerarem numerosos serviços, associando a conservação de ecossistemas com uma agricultura ecologicamente eficiente. O objetivo geral deste estudo foi estabelecer uma relação direta entre as práticas agrícolas adotadas e a sustentabilidade dos sistemas agroflorestais e os objetivos específicos foram avaliar o comportamento produtivo e a qualidade ambiental de cada propriedade estudada e validar a utilização de sistemas agroflorestais como sistemas sustentáveis ambientalmente. Metodologia utilizada A jornada metodológica se iniciou através de reuniões com os técnicos da organização não governamental – ong Jupará, que indicou duas comunidades rurais para realização da pesquisa. Considerou-se que o assentamento fazenda fortaleza preenchia os requisitos necessários à elaboração da pesquisa, pois é uma comunidade estruturada, com práticas de agroecologia, que possibilitaram a certificação dos produtos pelo instituto biodinâmico de São Paulo (IBD), e a comunidade possuía um histórico de boa receptividade com pesquisadores. Durante três meses, os pesquisadores moraram com uma das famílias, possibilitando a construção de um arquivo de dados sobre os agricultores do assentamento, aqueles de tinham práticas convencionais e agroecológicas de cultivo e sistemas agroflorestais. Foram selecionados trinta agricultores para responder aos questionários e submeterem sua propriedade à avaliação. Foram aplicados três grupos de questionários: o primeiro pretendeu identificar características sociais de cada agricultor pesquisado, como tempo de experiência agrícola, grau de instrução e origem do aprendizado agrícola; o segundo questionário avalia o conhecimento sobre sustentabilidade de sistemas agroflorestais; e o terceiro questionário se compõe de um grupo de 07 questionários temáticos e analisa o percentual de qualidade ambiental obtida para cada propriedade estudada. Resultados obtidos Foram identificados três grupos de agricultores: o primeiro grupo (G1) se compõe de agricultores que possuem práticas agroecológicas de produção; no segundo grupo (G2) estão aqueles que possuem práticas de cultivo que tem algum componente agroecológico e a maioria das características do cultivo convencional; e o terceiro grupo (G3) englobam aqueles que adotam práticas de cultivo convencional. O grupo G1 apresenta práticas agrícolas e reprodução sócioeconômica compatíveis com os conceitos de sustentabilidade, o grupo 3 apresenta práticas agrícolas e reprodução sócio-econômica compatíveis a agricultura convencional e o grupo G2 apresentou resultados que evidenciam características comuns a ambos os grupos. De acordo com os indicadores observados para a qualidade ambiental, as propriedades privadas do grupo G2 se aproxima mais daquela obtida pelo grupo G3, indicando que estes grupos tem mais semelhanças do que os grupos G1 e G2. Pode-se afirmar, portanto, que a análise da qualidade ambiental das propriedades, quando comparada com os conceitos de sustentabilidade, define que só dois grupos são efetivamente diferentes, G1 e G3, e que existe uma relação direta entre suas crenças e o modo como eles realizam suas práticas agrícolas. Os agricultores convencionais (G3) e aqueles com práticas agrícolas de ambos os tipos (convencional e agroecológicas – G2) referem que utilizam alguns métodos “alternativos” de cultivo como forma de economizar no gasto com adubos inorgânicos e defensivos químicos, e não como uma maneira de encarar uma nova metodologia de produção agrícola. 2 FICHAMENTO E INTERCÂMBIO DE EXPERIÊNCIAS COM SAFS NO BRASIL Nas propriedades estudadas, os percentuais médios de qualidade ambiental obtidos para as propriedades que adotam o sistema convencional de produção foram de 34,08%, que significa baixa sustentabilidade ambiental, enquanto que as propriedades que adotam o sistema agroecológico de produção obtiveram 86,36%, configurando boa sustentabilidade ambiental. O desenvolvimento de sistemas agroflorestais na zona cacaueira da Bahia tem contribuído para a preservação dos recursos florestais já que os produtores utilizam um sistema tradicional de cultivo agrícola em consórcio com a floresta. Sobre este manejo, recomenda-se os sistemas agroflorestais em zonas-tampão, ao redor das unidades de conservação, para desencadear os processos de sucessão secundária e permitir a manutenção da biodiversidade no sistema florestal tropical. O manejo agroflorestal na região estudada é sustentável por propiciar o restabelecimento da fertilidade natural do solo ao longo do pousio; possibilitar a coexistência da atividade agrícola e da diversidade de espécies arbóreas nativas e a conservação in situ dos recursos genéticos de plantas cultivadas e manter a produção primária através do tempo, além de conservar as tradições culturais locais. Pesquisadores observam que a diversidade biológica e o aumento da complexidade estrutural, o que é alcançado através dos sistemas agroflorestais, propiciam a formação de um ecossistema semelhante ao original, de certa forma estável e com menos probabilidade de sofrerem pressões severas advindas do ambiente externo. Alguns sistemas agroflorestais foram encontrados para a área em estudo (G1), tais como: a pupunha, o coco, a graviola, a Rollinia mucosa e o guaraná; a seringueira, a bananeira, o cacau e a eritrina; o cacau, o guaraná, a seringueira e cítricos. COMENTÁRIOS: este trabalho permitiu conhecer como reagem os agricultores às dimensões da sustentabilidade e se suas práticas agrícolas são compatíveis com suas afirmativas. Dentro deste enfoque, esta avaliação pretendeu apresentar uma metodologia para avaliação de comunidades agrícolas residentes no entorno de unidades de conservação, de modo a conhecer se suas atitudes e práticas agrícolas são compatíveis com a conservação dos recursos ambientais. Destaca-se a necessidade de elaboração de um projeto específico que contemple a manutenção da diversidade da região, integrando comunidades agrícolas e unidades de conservação de uso restrito, como reservas biológicas e parques nacionais. Outra questão que pode ser mais bem discutida é sobre a definição mais precisa do conceito de desenvolvimento sustentável, inclusive porque os caminhos da sustentabilidade passam por uma série de modificações de cunho econômico, social, cultural, ecológico, territorial, político e ambiental que não são possíveis de serem realizadas em determinadas esferas. Para as comunidades de zonas rurais, por exemplo, a sustentabilidade deve incorporar questões como a melhoria da qualidade de vida, o acesso a recursos tecnológicos, a valorização da cultura popular e, posteriormente, assuntos como conservação dos recursos hídricos e da biodiversidade. Devemos destacar que para as comunidades que vivem no entorno de reservas biológicas, as questões sociais são muito mais importantes que as questões ambientais, visto que, em geral, eles reconhecem o valor da biodiversidade e da conservação dos recursos naturais, pois dependem unicamente deles. NOTAS: esta ficha foi realizada durante a execução da dissertação de mestrado da autora, realizada no Curso de Pós-graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade – CPDA/UFRRJ. PALAVRAS-CHAVE PROPOSTAS: SUSTENTABILIDADE COMUNIDADES RURAIS E SISTEMA AGROFLORESTAL. EM AGROECOSSISTEMAS, PALAVRAS-CHAVE GEOGRAFICAS: Brasil LOCALIZAÇÃO GEOGRAFICA: litoral sul da Bahia, município de Una 3 FICHAMENTO E INTERCÂMBIO DE EXPERIÊNCIAS COM SAFS NO BRASIL TIPO DE FICHA: análise ORIGEM DA INFORMAÇÃO: avaliação/pesquisa científica AUTORA DA FICHA: Pessoa contato/entrevista com: Paraguassú, Lídice Almeida Arlego. Órgão-Contato: FTC = Faculdade de Ciências e Tecnologia Endereço-Contato: FTC – Avenida Luís Viana Filho, 8812 – Pituaçu, Cep 41820-000, Salvador, Bahia, Brasil, Fax 55 71 2818019, Tel 55 71 2818106, www.ftc.br BIBLIOGRAFIA E REFERENCIAS NA INTERNET: GALE, R.P & CORDRAY, S.M. 1994. Making sense of sustainability: nine answers to ´what should be sustained’? In rural sociology, v. 59, n. 2, pp. 311-332. MONTE, V.G. 2000. Análise da sustentabilidade ecológica em assentamentos de reforma agrária: o caso de São Joaquim. Dissertação de mestrado, área de concentração: manejo racional dos recursos naturais. Fortaleza: UFC/Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente. 76 p. Il. MÜLLER, S. 1995. Evaluating the sustainability of agriculture at different hierarchical levels: a framework for the definition of indicators. Scientific Workshop on Indicators of Sustainable Development. Wuppertal, Germany, novembro. 4