A CARTA, SUAS MODALIDADES E SUAS SEQUÊNCIAS TIPOLÓGICAS: INVESTIGAÇÃO DO
NÍVEL DE CONHECIMENTO DOS ALUNOS NAS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA DA EJA.
Mônica Fernanda dos Santos Dias
Este artigo tem como objetivo apresentar o resultado da pesquisa a que
procedemos cujo intuito foi verificar o nível de conhecimento dos alunos da EJA
com relação às modalidades do gênero carta, bem como das sequências
linguísticas que a compõe, visando ao desenvolvimento linguístico-discursivo dos
alunos daquela modalidade de ensino. O impulso para a realização desta
pesquisa se deu a partir do momento em que surgiram questionamentos sobre o
tratamento dado ao gênero carta e as diferentes tipologias constituintes nesse
gênero, nas aulas de língua portuguesa da educação de jovens e adultos. A
comunicação se realiza através de gêneros, então, devem-se possibilitar
diversidades desses gêneros aos alunos de maneira, que cada um compreenda,
produza e utilize-os a cada situação de interação social adequada. O gênero carta
na modalidade de jovens e adultos é uma ferramenta importante para que os
alunos possam usar e diferenciar a linguagem escrita de uma linguagem oral,
desenvolvendo assim a organização na estrutura do gênero, além de usar os
elementos característicos do gênero carta. Observamos, através do resultado
desta pesquisa que os alunos da EJA, participantes desta pesquisa,
apresentaram
dificuldades
de
reconhecer
as
modalidades
do
gênero,
principalmente com relação à indicação da tipologia textual, apresentando
dificuldades no momento de identificar as sequências linguísticas no gênero.
Serviram de base a esta pesquisa obras de autores como: Bakhtin, Marcuschi,
Dionísio, Antunes, Silva, Travaglia, entre outros.
Palavras-Chave: gênero carta, educação de jovens e adultos; sequências
linguísticas.
INTRODUÇÃO
No contexto da discussão sobre a eficácia do ensino de língua portuguesa,
centrado no gênero textual carta e suas modalidades, e nos tipos textuais que as
compõem, percebe-se que esse gênero não vem sendo devidamente explorado nas
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aulas de língua materna, interferindo no desenvolvimento do conhecimento global dos
alunos.
Essa interferência se dá em virtude do professor não enfatizar em suas aulas
de língua portuguesa os gêneros, dando mais ênfase à gramática propriamente dita,
centrada em regras, dificultando a aprendizagem dos alunos da EJA, isso por que os
alunos necessitam de um ensino voltado para uma efetiva prática social.
O gênero carta é sem dúvida um instrumento de trabalho de diversidades,
onde o professor poderá enfatizar a interdisciplinaridade, além dos temas transversais,
dando oportunidade do aluno se expressar visando a um conhecimento e a um
desenvolvimento linguístico-discursivo.
Diante disso, buscamos proceder a um resultado de conhecimentos do gênero carta e
suas modalidades, dos alunos da Educação de jovens e adultos (EJA), observando as
tipologias textuais constituintes nesse gênero.
A pesquisa foi realizada por meio de questionários, aplicados aos alunos da EJA,
que iniciaram seus estudos no inicio do ano letivo de 2009, cuja participação na pesquisa,
muito contribuiu para realização deste artigo. O lócus deste trabalho foi o EREM Escola
de Referência em Ensino Médio Santos Dumont, localizada no bairro de Boa Viagem no
município de Recife-PE.
O questionário aplicado aos alunos procurou perceber se os mesmos conseguiam
distinguir as modalidades de carta apresentadas a eles, bem como se eram capazes de
identificar as sequências linguísticas que as compunham. Para comprovar seu
conhecimento, os alunos deveriam justificar suas respostas e dizer em que contexto as
referidas cartas poderiam ser utilizadas. Deveriam, ainda, indicar a tipologia textual
predominante nessas cartas, identificando em cada carta as partes em que os tipos
textuais: descrição, narração e argumentação se realizavam.
Desse modo, esperávamos mensurar o conhecimento do aluno da EJA com
relação ao objeto da pesquisa, para, com o resultado, interferir no processo ensinoaprendizagem desses alunos, no que concerne ao ensino de Língua Portuguesa.
1. A importância do gênero textual e de sua tipologia no processo ensinoaprendizagem de língua materna da EJA.
3
De acordo Marcuschi (2002), Gênero textual é um nome que se dá as diferentes
formas de linguagens que circulam socialmente. Gêneros são língua viva, instrumento de
comunicação indispensáveis nas aulas de português, pois todas as pessoas usam
gêneros para se comunicar.
Um debate ou uma palestra na televisão é um gênero, uma bula de remédio
também, um romance, uma carta todos são gêneros. Gênero é diferente de tipologia
textual, geralmente alguns profissionais confundem, porém gênero é mais abrangente,
uma vez que tipo textual é mais específico. É importante para o professor de português
direcionar o trabalho de língua na leitura, compreensão e produção de textos de forma
produtiva que tenha função social e de uso significativo para o aluno, de uso significativo
em suas práticas do cotidiano.
Essa concepção vem ao encontro do objetivo da Eja. Isso porque a clientela
dessa modalidade de ensino necessita de contato com um ensinamento voltado para
uma efetiva prática social. Certamente a teoria dos gêneros oferece diversidades que dá
oportunidade desses indivíduos utilizarem em sua prática.
Conforme expõe Lopes-Rossi (in KARWOSKI et al. 2006, p.74),
Cabe ao professor criar condições para que os alunos possam apropriarse de características discursivas e lingüísticas de gêneros diversos, em
situações de comunicação real, com projetos pedagógicos que visem ao
conhecimento, à leitura, à discussão sobre o uso e as funções sociais
dos gêneros escolhidos e,quando pertinente, à sua produção escrita e
circulação social.
O professor deverá criar as condições para que os alunos aprimorem as competências
discursivas lingüísticas necessárias, voltadas ao uso da prática social dos alunos,
explorando as habilidades da leitura, escrita, função social dos gêneros escolhidos.
Para Marcuschi (2002), tipologia textual é um termo que deve ser usado para
designar uma espécie de sequência teoricamente defendida pela natureza linguística de
sua composição. Em geral, os tipos textuais abrangem as categorias narração,
argumentação exposição, descrição e injunção. Segundo ele, “quando se nomeia um
certo texto como “narrativo”, “descritivo” ou “argumentativo”, não está nomeando o
gênero e sim o predomínio de um tipo de sequência de base. (2002:27).
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Além disso, destaca que, “em todos os gêneros também se está realizando tipos
textuais, podendo ocorrer que o mesmo gênero realize dois ou mais tipos. Assim, um
texto é em geral tipologicamente variado (heterogêneo)”. (2002:25)
Marcuschi afirma que os livros didáticos trazem, de maneira equivocada, o termo tipo de
texto. Na verdade, para ele, não se trata de tipo de texto, mas de gênero textual. O autor
diz que em todos os gêneros, os tipos se realizam. Aspecto interessante a se observar é
que Marcuschi afirma que os gêneros não são entidades naturais, mas artefatos culturais
construídos historicamente pelo ser humano. Um gênero, para ele, pode não ter uma
determinada propriedade e ainda continuar sendo aquele gênero. Para exemplificar, o
autor fala da carta pessoal. Mesmo que o autor da carta não tenha assinado o nome no
final, ela continuará sendo carta, pelas suas propriedades necessárias e suficientes.
Travaglia (2002) diz que o gênero textual se caracteriza por exercer uma função
social especifica. Estas funções sociais são pressentidas e vivenciadas pelos usuários.
Isso equivale dizer que, intuitivamente, sabemos que gênero usar em momentos
específicos de interação, de acordo com a função social dele. Travaglia dá ao gênero
uma função social. O autor diferencia Tipologia Textual de Gênero Textual a partir
dessa “qualidade” que o gênero possui. Marcuschi (2002) apresenta alguns exemplos de
gêneros, mas não ressalta sua função social.
Segundo Marcuschi (2002) (2002, p.19) “os gêneros textuais são fenômenos históricos,
profundamente vinculados à vida cultural e social”.
De acordo com essa percepção de gêneros que Marcuschi enfatiza, este artigo está em
consonância, uma vez que enfatiza a função social. Além disso, o autor afirma que os
tipos textuais se realizam nos gêneros, assim um professor quando for apresentar os
tipos textuais aos alunos, consequentemente apresentará num gênero textual.
Percebe-se que as aulas de língua portuguesa, especificamente nas aulas de
leitura e escrita, é focada apenas na resolução de exercícios e nas aulas de redação,
sendo explorados apenas os tipos textuais, deixando de lado os gêneros. É
extremamente importante para a leitura dos textos ter um interlocutor, pois a função
social do interlocutor é dialogar junto com o leitor, não tendo um interlocutor, para quem o
alunado escreve? Como que ele vai interagir?
Daí surge à importância do gênero carta em sala, pois na própria estrutura se tem um
destinatário diferentemente de uma narração, descrição ou argumentação. É papel
fundamental do professor de língua portuguesa trabalhar com os alunos os tipos e os
gêneros textuais, principalmente, aqueles que fazem parte do cotidiano, fazendo com que
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os alunos compreendam que o texto é produzido a todo o momento seja na forma oral ou
escrita. Para alguns professores a diferença entre tipo textual e gênero textual ainda não
está clara, uma vez que os livros didáticos em sua maioria também invertem os termos,
dificultando ainda mais a definição entre essas duas noções, como o próprio livro de
língua portuguesa da EJA, adotado pelas escolas da rede estadual do Recife.
Segundo Antunes, “O professor não pode, sob nenhum pretexto, insistir na prática de
uma escrita escolar sem leitor, sem destinatário; sem referência, portanto para se decidir
sobre o que vai ser escrito”. (Antunes, 2004, p. 47).
Alguns professores não direcionam o ensino de língua portuguesa a tomarem o
texto como objeto de estudo, no entanto o texto, na sala de aula, é usado mais como
“pretexto” e para outras funções, deixando de focar na dimensão social-discursiva, ou
seja, “numa concepção sócio-interacionista de linguagem centrada na problemática da
interlocução” (Brandão 2001, p. 17). Isso ocorre por que alguns professores insistem no
ensino tradicional de língua materna, levando o aluno a análises: sintáticas e
morfológicas, deixando de aprofundar a parte da semântica, além de não explorar as
competências lingüísticas e discursivas dos alunos.
Como lembra Bakthin (1995, p. 113).
“Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada
tanto pelo fato de que procede de alguém como pelo fato de que se
dirige para alguém. (...) A palavra é uma espécie de ponte lançada entre
mim e os outros. Se ela apóia sobre mim numa extremidade, na outra
apóia-se sobre o meu interlocutor. A palavra é o território comum do
locutor e do interlocutor.”
Cada gênero tem suas estruturas, no caso da carta tem um destinatário, e então o aluno
sabe que poderá interagir com um interlocutor sobre suas ideias, e sabe também para
quem ele está escrevendo a própria estrutura do gênero textual facilita a interação, com
isso desenvolve suas habilidades de leitura, compreensão e produção da carta. O ensino
com o gênero carta é extremamente importante na turma de educação de jovens e
adultos (EJA), pois será o momento em que todos produzirão textos (cartas) de diferentes
modalidades de uso social, não mais visto como especialistas em textos literários. Os
Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN’s destacam:
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[...] são os textos que favorecem a reflexão crítica e imaginativa, o
exercício de formas de pensamento mais elaboradas e abstratas, os
mais vitais para a plena apresentação numa sociedade letrada. Cabe,
portanto a escola viabilizar o acesso do aluno ao universo dos textos que
circulam socialmente, ensinar a produzi-los e interpreta-los. (BRASIL,
1997, p. 30)
A prática de produção de texto, como enfatizada pelos PCN’s são atividades de extrema
importância nas aulas de língua materna, pois os textos produzidos pelos alunos podem
ser utilizados como instrumentos para enfatizar a língua, e ainda proporciona ao aluno
uma visão interpretação critica do seu próprio texto produzido.
Dessa forma, os alunos teriam a oportunidade de se apropriar devidamente do
gênero textual, sabendo movimentar-se no dia a dia da interação humana, e na
participação social dentro de uma sociedade letrada.
2. Definindo o gênero carta
De acordo com Silva (1997, p.121, in: KOCH).
(...) a carta é uma unidade funcional da língua, empregada em situações
características-ausência de contato imediato entre o emissor e
destinatário. No entanto, a categoria carta, “tout court”, é muito ampla,
não dando conta da diversidade de textos e de propósitos nela
encontrados.
Definindo os gêneros, Bakhtin (2000, p. 281) inclui a carta entre os gêneros primários,
entre aqueles que se constituem em circunstâncias de uma comunicação espontânea.
Situada em espaço e tempo determinados, ela é empregada em situações comunicativas
que se caracterizam pela ausência de contato imediato entre emissor e receptor.
O gênero textual carta segundo Silva (1997), é bastante abrangente, existem
diversos tipos de cartas: cartas de reclamação, carta argumentativa, carta pessoal, carta
do leitor, carta de agradecimento, entre outras. A carta não comporta especificamente um
tipo, ela é dividida em tipos, possuindo a mesma estrutura, na qual identificará o gênero
pela sua propriedade.
7
Silva (1997), ao analisar cartas, ela específica a amplitude de uso desse gênero, que se
concretiza em variados tipos de comunicação: notícias de familiares ou de amigos
distantes, informações, pedido, agradecimento, correspondência dirigida a jornais e
revistas, reclamação, cobrança, intimação, prestação de contas, entre outros, apresenta
funções diversas que circula em diferentes esferas de atividades. A mesma autora ainda
afirma que uma categorização desse gênero ou de uma tipologia textual deve-se priorizar
as atividades comunicativas, mas também considerando sua estrutura formal.
O gênero estudado é um dos mais usados como meio de comunicação entre as
pessoas há bastante tempo, podemos exemplificar tais como: a carta de Pero Vaz de
Caminha, a carta Régia de D.João III, a carta dedicatória de Erasmo a D. João III, entre
outras conhecidas. Mediante a citação de Silva, podemos afirmar que a carta é uma
unidade funcional da língua, tendo em vista uma interação entre o locutor e o interlocutor,
na qual terão tempo e espaço diferentes.
2.1 O gênero carta na sala de aula da EJA
A educação de jovens e adultos é uma modalidade de ensino com metodologias
diferenciadas voltada para um público que não teve acesso a escolaridade na idade
apropriada. Essa concepção de metodologia diferenciada tem atraído jovens e adultos a
voltar à escola e concluir seus estudos.
De acordo com a Proposta Curricular Nacional para Educação de Jovens e
Adultos (2001), é desejável que, já na alfabetização, seja oferecida ao aprendiz uma
amostra representativa dos diversos gêneros e tipos de textos, que circulam em
diferentes esferas ou contextos sociais. Assim o professor poderá mostrar a diversidade
de gêneros aos alunos, além de enriquecer os conhecimentos através das competências
da leitura e da escrita, desenvolvendo habilidades de interpretar e produzir textos na qual
o aluno se insira socialmente. É importante que a seleção dos gêneros contemple o
contexto e as necessidades desses jovens e adultos.
Para alguns alunos desta modalidade de ensino, a escola é o único ambiente que
eles têm contato com a leitura e escrita. Diante disso, o trabalho elaborado pelo professor
de língua materna deverá ser proporcionar uma grande variedade dos gêneros textuais e
das seqüências para que todos consigam obter a compreensão de suas funcionalidades.
O gênero carta na modalidade de jovens e adultos é uma ferramenta importante
para que os alunos possam usar e diferenciar a linguagem escrita de uma linguagem
oral, desenvolvendo assim a organização na estrutura do gênero, além de usar os
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elementos característicos do gênero carta, como por exemplo: saudação, despedida,
data, e os elementos constituintes no envelope do remetente e destinatário (nome,
endereço, CEP, cidade, bairro).
3. Discussão dos resultados
O corpus desta pesquisa foi composto por questionários aplicados na turma do
segundo módulo da Educação de Jovens e Adultos (EJA), que teve início no ano letivo de
2009, com o quantitativo de 10 alunos, na qual 07 são do sexo feminino e 03 do sexo
masculino, e todos cursaram o ensino fundamental I na modalidade EJA na mesma
escola no turno da noite.
O questionário foi dividido em 2 etapas: a primeira voltou-se para a modalidade, a
justificativa e a empregabilidade da carta; e a segunda, focou-se na identificação da
tipologia constituinte da modalidade da carta apresentada. Com o objetivo de verificar o
nível de conhecimento dos alunos da EJA, em relação ao estudo do gênero carta e as
tipologias que a compõe, apresentamos as cartas a seguir e solicitamos que as mesmas
fossem classificadas como comercial, de reclamação, de solicitação, do leitor e pessoal.
Texto 1: Carta do leitor
VETERANO DE GUERRA
Avô de leitora lutou na Espanha na década de 30.
Vocês me emocionaram muito com a reportagem “Heróis de uma batalha perdida”
(pág.8), pois meu avô era espanhol e lutou na Guerra Civil daquele país, e minha mãe
falava muito como ele sofreu. Esse sofrimento o motivou a vir para o Brasil, pois se dizia
que aqui era melhor, e para o meu avô qualquer lugar do mundo que não tivesse guerras
era o paraíso. Por isso, vai aí o alerta: não devemos promover guerras, pois as
conseqüências são aterrorizantes, não só financeiras, mas principalmente humanas. As
pessoas ficam com traumas difíceis de curar, mesmo migrando para outros países.
Lourdes Vazques Paulino
São Paulo, SP.
Fonte: História Viva. Maio, 2009, ed. Duetto. p.07
Texto 2: Carta comercial
São Paulo, 21 de janeiro de 200x.
9
Senhores:
Atendendo ao anuncio de sua empresa publicado em 12-12-200x, em
classificados da Folha de S. Paulo, escrevo-lhes com o objetivo de me
candidatar à vaga oferecida. No momento, encontro-me com a possibilidade de
iniciar imediatamente o trabalho.
Por essa razão, além de manifestar meu interesse pela oferta do emprego, bem
como por sua empresa, estou anexando à presente meu “Curriculum Vitae”.
Apreciarei bastante a atenção de V.S.as
Atenciosamente,
Carlos Alberto
Fonte: Medeiros, João Bosco. Português Instrumental. São Paulo: Atlas, 2007.p.67.
Texto 3: Carta Pessoal
São Paulo, 12 de maio de 1995.
Lê,
Como a gente já estuda na mesma classe há sete anos e você
durante esse tempo todo não teve a capacidade de perceber, eu estou
escrevendo esta carta para dizer que eu amo você. Acho que sempre amei,
desde que você era um menininho idiota da 5ª série. Não me pergunte por
quê. Eu mesma já me fiz esta pergunta mil vezes e nunca deu pra entender.
Eu sei que a primeira coisa que você vai pensar é que isso é uma
brincadeira. Não é não. Comece a lembrar de todas as vezes em que eu me
calei pra não discutir com você, quando vinha com ideias cretinas para o
trabalho de Geografia. Ou quando eu ia embora de repente no meio da
conversa. Era pra ninguém desconfiar que eu te adoro (...).
Eu não te disse nada até agora porque fique com medo de que
você contasse pro pessoal e todos rissem da minha cara. Só que agora eu
não me importo. Eu não ligo pra mais ninguém: eu amo e isso é coisa que só
quem ama entende. Se precisar publico num jornal, confirmo na diretoria,
faço uma declaração pública, registro em cartório, assino um comunicado.
Se alguém achar que eu estou dando muita bandeira, é porque não sabe que
isso é amor: uma coisa que enlouquece e deixa inquieta e meio tonta. Mas
que faz todas as músicas mais bonitas as cores mais vivas e todos os
momentos da minha vida mais interessantes. Agora você sabe. Faça o que
quiser. Eu sempre vou amar você.
Mari.
Fonte: GRANATIC, Branca. Redação: humor e criatividade. São Paulo: Scipione, 1997, p. 81
A carta do leitor foi a primeira a ser apresentada aos alunos. Esta carta destacase por ser exposta em meios de comunicação, onde as pessoas possuem um espaço
determinado para expressar suas opiniões, sugestões, argumentos, criticas, reflexões,
10
incentivos. A carta escolhida como objeto de análise foi retirado da revista História Viva
do ano de 2009, com uma linguagem predominantemente argumentativa.
A carta 2 foi retirada do livro Português Instrumental de João Bosco Medeiros, na
qual refere-se a uma carta comercial, essa modalidade de carta tem a finalidade de uma
comunicação direta com comércio,indústrias,empresas podendo ser endereçada a uma
ou a várias pessoas.
Já na carta 3 foi retirada do livro Redação: Humor e Criatividade, de Branca
Granatic, que se trata de uma carta pessoal, esse gênero é utilizado na comunicação
com amigos, parentes, namorados, conhecidos.
Podemos observar o resultado das respostas dos alunos dessa primeira etapa, através
da representação do gráfico.
Gráfico 1 - Percentual de identificação das modalidades, justificativa e
empregabilidade cartas apresentadas aos alunos.
70%
60%
50%
Carta do leitor
40%
Carta
comercial
Carta pessoal
30%
20%
10%
0%
Mod. Just. Func.
Com o resultado obtido, observamos que referente à carta do leitor apenas 40% dos
alunos participantes foram capazes de identificar as modalidades do gênero, 20% a
justificativa e 20% a empregabilidade.
11
Com relação à carta comercial 50% dos alunos acertaram a modalidade do gênero e
justificativa, e apenas 40% soube a empregabilidade.
Já a carta pessoal, houve um aumento no percentual, com 70% dos alunos que
acertaram referindo-se a modalidade, a justificativa e a empregabilidade.
De acordo com as respostas desta primeira etapa da pesquisa, percebemos que
alguns alunos ainda têm dificuldade de distinguir as modalidades do gênero carta, além
disso, percebemos a dificuldade do reconhecimento na estrutura, na linguagem, entre
outras características do gênero. Em concordância com as respostas dos alunos,
Marcuschi (2002) afirma que é possível a identificação de gêneros com dificuldades
progressivas, do nível menos formal ao mais formal, do mais privado ao mais público e
assim por diante. Alguns estudantes também tiveram dificuldades no momento de
registrar sua justificativa no questionário, problemas de pontuação, de ortografia,
concordância, no entanto todos deram justificativas coerentes. Como podemos ver a
seguir alguns dos problemas:
O trecho acima apresenta alguns erros como de pontuação, acentuação na palavra
comércio, repetição da palavra e ao iniciar a resposta o aluno não introduz letra
maiúscula e no decorrer da resposta mistura as letras maiúsculas e minúsculas.
Outro exemplo que apresenta erro ortográfico.
12
Esse aluno (a) cometeu um erro ortográfico na palavra “usada”, mas sua resposta foi
coerente.
Após os questionamentos sobre as modalidades das cartas apresentadas, foi
solicitado aos participantes, justificativas e situação em que cada carta é empregada,
onde eles tinham que identificar aspectos relativos à tipologia predominante nas cartas,
corpus desta pesquisa, bem como as demais sequências tipológicas eventualmente
presentes nas mesmas.
Quadro 1: Segunda parte do questionário aplicado aos entrevistados.
Assinale a tipologia predominante nas cartas apresentadas.
( ) Argumentação
( ) Descrição
( ) Narração
Assinale as tipologias encontradas nas cartas apresentadas.
Carta 1
( ) Argumentação
( ) Argumentação e narração
( ) Descrição
( ) Descrição e narração
( ) Narração
( ) Descrição, argumentação e narração
( ) Argumentação e descrição
Carta 2
( ) Argumentação
( ) Descrição
( ) Narração
( ) Argumentação e descrição
( ) Argumentação e narração
( ) Descrição e narração
( ) Descrição, argumentação e narração
Carta 3
( ) Argumentação
( ) Descrição
( ) Narração
( ) Argumentação e descrição
( ) Argumentação e narração
( ) Descrição e narração
( ) Descrição, argumentação e narração
Nas cartas apresentadas,
sublinhe com uma linha a parte descritiva;
sublinhe com duas linhas a parte narrativa;
circule o que for argumentativo.
O gráfico abaixo representa o resultado das respostas dos alunos que identificaram as
sequências tipológicas.
Gráfico 2 - Percentual de identificação das tipologias constituintes no gênero carta.
13
70%
60%
Argumentação
50%
Descrição
40%
Narração
30%
Argumentação e descrição
20%
Argumentação e narração
Descrição e narração
10%
Descrição, argumentação e
narração
0%
Carta do
leitor
Carta
comercial
Carta
pessoal
De acordo com as repostas, podemos afirmar que os alunos não foram capazes
de identificar nas cartas apresentadas as características relativas à tipologia
predominante inserida no gênero. Marcuschi (2002:25) destaca que “em todos os
gêneros também se está realizando tipos textuais, podendo ocorrer que o mesmo gênero
realize dois ou mais tipos. Assim, um texto é em geral tipologicamente variado
(heterogêneo)”. Ainda afirma que, (2002:27), “quando se nomeia um certo texto como
“narrativo”, “descritivo” ou “argumentativo”, não está nomeando o gênero e sim o
predomínio de um tipo de sequência de base”.
Em relação à última questão, que solicitou para o aluno destacar de cada carta às
partes descritivas, narrativas e argumentativas, podemos observar abaixo trecho da
resposta de uma aluna.
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De acordo com a resposta da aluna que destacou com uma linha a parte descritiva da
carta do leitor, podemos perceber que a mesma não compreende as características da
descrição. O trecho possui verbos no pretérito, além disso, narra fatos que aconteceu,
com isso podemos afirmar que o trecho se caracteriza como uma narração, e não como
descrição.
O fragmento em destaque caracteriza a dificuldade do aluno:
O aluno destaca nas 3 primeiras linhas da carta pessoal, uma descrição, na qual o trecho
se caracteriza por uma narração, uma vez que os verbos se encontram no pretérito.
Outro exemplo referente à dificuldade do aluno:
Esse fragmento da carta o aluno não respondeu e logo abaixo justificou que deixou em
branco por que não sabia. Com essas amostragens, percebermos a dificuldade dos
alunos no que se refere às sequências tipológicas nos gêneros.
4. Considerações Finais
Enfatizando o objetivo do trabalho que é apresentar o resultado da pesquisa, com
intuito de verificar o nível de conhecimento dos alunos da EJA, podemos afirmar que os
alunos têm dificuldades tanto na identificação, na justificação, na funcionalidade e
15
principalmente na indicação das tipologias que compõe o gênero. Alguns não são
capazes de distinguir características básicas dos tipos de textos. Essa dificuldade pode
ser decorrente do ensino tradicional de Língua Portuguesa que ainda é bastante
tradicional nas escolas, que centralizam o ensino de língua materna nas regras
estabelecidas como “corretas”, com o objetivo de escrever e falar corretamente. Na
maioria das vezes, os professores trabalham de forma tradicional por imposição da
instituição ou até mesmo pelos pais dos alunos. A partir do momento em que o professor
trabalha a gramática de forma isolada do texto, com frases soltas, os alunos enfrentam
dificuldades principalmente no momento da produção textual.
A importância dos gêneros textuais é fundamental para o ensino de língua materna, o
professor dá mais oportunidade e diversidade ao aluno dos gêneros textuais, que são
utilizados socialmente, favorecendo a interação humana.
A comunicação se realiza através de gêneros, então, devem-se possibilitar diversidades
desses gêneros aos alunos de maneira, que cada um compreenda, produza e utilize-os a
cada situação de interação social adequada. Essa diversidade de gêneros possibilita um
ensino da língua mais significativo para o aluno, porém sem deixar de enfatizar a
gramática, mas de forma contextualizada.
Constatamos que os alunos da EJA, participantes desta pesquisa, apresentaram
dificuldades de reconhecer as modalidades do gênero, principalmente com relação à
indicação da tipologia textual, no qual os alunos não foram capazes de identificar todas
as sequências linguísticas no gênero, nos deixando com a conclusão que muitos dos
nossos alunos terminam o ensino médio, sem saber reconhecer, relacionar as
sequências constituintes nos gêneros.
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