O MÉTODO APAC – ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO
E ASSISTÊNCIA AOS CONDENADOS: ANÁLISE SOB
A PERSPECTIVA DE ALTERNATIVA PENAL
ANA LUÍSA SILVA F ALCÃO
M ARCUS VINÍCIUS GONÇALVES DA CRUZ
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Painel 43/130
Contratualização e parcerias com OS e entidades do terceiro setor: em busca
da legitimidade
O MÉTODO APAC – ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA
AOS CONDENADOS: ANÁLISE SOB A PERSPECTIVA DE
ALTERNATIVA PENAL
Ana Luísa Silva Falcão
Marcus Vinícius Gonçalves da Cruz
RESUMO
Uma vertente da custódia mineira é realizada por meio da Associação de Proteção e
Assistência aos Condenados (APAC), uma entidade sem fins lucrativos, que vai
custodiar os presos de uma comarca com base no voluntariado. Este artigo visa
analisar o sistema APAC, conhecido como método APAC, que tem doze elementos
essenciais que priorizam a ressocialização do preso, de forma que sua aplicação
busca atender de forma proficiente a Lei de Execuções Penais (LEP) brasileira, no
que diz respeito às suas prescrições de atendimento à custódia e ressocialização.
Utilizou-se de pesquisa qualitativa, por meio de um estudo de caso, realizado na
APAC de Itaúna, Minas Gerais, em que a observação in loco do ambiente carcerário
foi utilizada para confirmar a proficiência da aplicação das diretrizes de
ressocialização e custódia da LEP. Os achados da pesquisa revelam que, apesar da
metodologia não ser aplicável a toda a população carcerária, sua aplicação
consolida a efetivação da sentença condenatória tal qual ela foi prescrita e
proporciona ao condenado condições para sua reintegração social, atendendo ao
objetivo precípuo da Lei de Execuções Penais.
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1 INTRODUÇÃO
A
criminalidade
como
fenômeno
social
permeia
a
sociedade
contemporânea, sendo que as formas de punição e de controle social encontram-se
inseridas em cada forma de Estado, vindo a condicionar suas peculiaridades. E o
ilícito, ao lesar os bens mais importantes da sociedade, passa a ser reprimido sob
um cunho penal, ou seja, é passível de pena (FOUCALT, 1996).
Quando se trata de pena há de, inicialmente, conceituar-se a sanção; a
pena é a punição imposta pelo Estado, mediante ação penal, ao autor de uma
infração, como retribuição de um ato ilícito (JESUS, 1991). Seu substrato está
incutido em dois parâmetros: a privação de direitos de quem infringiu a lei e a
vingança devida àquele que foi prejudicado pelo ato criminoso. Partindo desta díade,
a pena de prisão sofreu alterações paulatinas ao longo dos tempos, mas sempre
atendendo aos parâmetros de privação de direitos e de vingança pessoal. Já em
uma perspectiva atual, a pena visa não apenas satisfazer esta díade, mas também
proporcionar condições para a reintegração social do condenado, buscando atender
um princípio basilar do Estado Democrático de Direito, expresso na Constituição
Brasileira, a dignidade da pessoa humana (BRASIL, 1988).
A pena com o objetivo de ressocialização do delinquente suscita uma
mudança de escopo em relação à execução penal brasileira. As prisões, antes
apenas unidades de privação da liberdade, passaram a ser norteadas por novos
princípios, de cunho humanizadores, prescritos na legislação. Apesar das novas
balizas, as carceragens se mantêm como prisões da miséria (WACQUANT, 2001),
excludentes, que em pouco cumprem as diretrizes previstas. O Estado não está
cumprindo seu papel de ressocializar e custodiar com dignidade o preso sob sua
égide; o preso, por sua vez, demonstra por meio de rebeliões, fugas e motins que
também não concorda com o tratamento a ele dispensado (CRUZ et al., 2013).
Assim, um dos desafios da Administração Pública é o de atender aos
novos parâmetros de custódia junto à população carcerária. A pena não pode
alcançar outros direitos que não aqueles expressos na sentença condenatória;
portanto, um estabelecimento penitenciário deve retirar a liberdade do indivíduo
preso, mas nunca sua dignidade. Esta prerrogativa, expressa no artigo 3 o da Lei de
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Execuções Penais – LEP, enseja que os governos busquem alternativas
penitenciárias que sejam capazes de atender a tais parâmetros, respeitando não
apenas o Estado Democrático vigente, mas também a dignidade da pessoa humana.
Neste contexto, o presente trabalho traz à baila a análise de um modelo
de gestão prisional que foge dos parâmetros historicamente delineados, a
Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC). Trata-se de
metodologia de cogestão prisional, em que o Estado e particulares gerem,
conjuntamente, um modelo de Unidade Prisional que enfatiza a ressocialização em
detrimento a segurança, conta com a mobilização da sociedade civil e custos
minimizados, e será analisada tendo em vista as balizas de custódia e
ressocialização da LEP. Assim, essa alternativa penal, que já rege unidades
prisionais no Brasil e em países como Austrália, Inglaterra e Nova Zelândia, merece
destaque e estudo mais aprofundado no contexto da Administração Pública.
O pressuposto que esteia o artigo é que o sistema APAC prima por
aplicar a punição àqueles que infringiram as normas penais de maneira
concomitante à sua ressocialização. Neste contexto, busca-se averiguar se a
execução da pena nestes estabelecimentos prisionais aplica de maneira proficiente
e adequada as exigências da Lei de Execuções Penais brasileira.
No presente trabalho, os métodos de pesquisa e coleta de dados
utilizados perpassam inicialmente a pesquisa qualitativa, de cunho descritivo
(GODOY, 1995), além de levantamento de dados primários e secundários, com
análise realizada por meio de estudo de caso. Realizou-se levantamento
bibliográfico sobre o sistema prisional, além de obtenção de dados nacionais junto
ao Departamento Penitenciário Nacional, vinculado ao Ministério da Justiça –
DEPEN/MJ e informações compiladas a partir dos relatórios da Subsecretaria de
Administração Prisional de Minas Gerais – SUAPI. A descrição do método APAC
foi realizada a partir de revisão bibliográfica, verificação de documentos e
observação não participante, visitando a unidade APAC localizada em Itaúna,
Minas Gerais, escolhida pelos critérios de acessibilidade (VERGARA, 2000).
Optou-se pelo estudo de caso por possibilitar uma análise profunda de um objeto
(YIN, 2001). A escolha desta APAC foi feita por tratar-se da pioneira no Estado de
Minas Gerais e tornou-se referência metodológica nacional e internacional, gere
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atualmente os três regimes de privação de liberdade previstos no Código Penal, há
o acompanhamento dos egressos e a fiscalização do livramento condicional. Por
estes fatores, a APAC da cidade de Itaúna tem destaque na Lei Es tadual que
inseriu e legalizou a instituição das APAC's em Minas Gerais e seu estatuto é
utilizado como base para o funcionamento de uma nova Unidade, sendo este uso
inclusive condicional para o estabelecimento de convênio entre a APAC
responsável e o Estado de Minas Gerais.
2 ALTERNATIVAS À PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE
A pena, como privação ou restrição de bens jurídicos, com lastro na lei, é
uma importante consequência jurídica do delito, imposta pelos órgãos jurisdicionais
competentes. A função da punição foi sendo modificada ao longo da formação do
Estado, de modo que houve alterações paulatinas na tendência doutrinária, com
destaque para a passagem de uma concepção retributiva da pena para uma
formulação preventiva da mesma (BITENCOUT, 1993).
As penas alternativas em geral, constituindo variações à estrutura
clássica da privação de liberdade em estabelecimentos prisionais controlados pelo
Estado, perpassam modelos que buscam reduzir a incidência da pena detentiva,
como registram as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Elaboração de
Medidas Não Privativas de Liberdade, apelidada de Regras de Tóquio, que tem por
objetivo primordial “favorecer o recurso a medidas não privativas de liberdade, assim
como garantias mínimas para as pessoas submetidas a medidas substitutivas da
prisão” (ONU, 1990). A partir desta diretriz, o Código Penal brasileiro foi
paulatinamente alterado ao longo do tempo, de forma que as penas alternativas
passaram a abranger, conforme arrolado no artigo 43, a prestação pecuniária, a
perda de bens e valores, a prestação de serviços a comunidade, a interdição
temporária de direitos e a limitação de fim de semana.
Assim, o objetivo da prisão de punir de forma retributiva o delinquente
pelo mal causado e prevenir a prática de novas infrações passa a coexistir com a
função de ressocializar o preso. Apesar dos empenhos em primar-se pela
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regeneração do preso como escopo da pena privativa de liberdade, os fins de
punição e intimidação permanecem intocados, sendo que não há ordenamento que
permita seu abandono em benefício da reeducação (THOMPSON, 1980). A primazia
da segurança sobre a ressocilização constitui a principal crítica ao sistema, na
medida em que o ambiente carcerário é um meio artificial de sociedade, que não
permite um trabalho reabilitador social em um local de antissociais (BITENCOURT,
1993). Soma-se a este fato a impossibilidade de se estabelecerem condições
materiais e humanas, na maioria das unidades prisionais do mundo, para viabilizar a
ressocialização, de forma que este fator co mpõe a necessária análise da função da
pena tal e qual hoje se executa (GARLAND, 2001).
A imposição da pena privativa de liberdade tem sua validade questionada,
desde seu surgimento, nos mais vários aspectos: a teoria, os princípios, seus
objetos e objetivos (GOFFMAN, 2001; FOUCALT, 1996; GARLAND, 2001). Deve-se
considerar, também, a execução penal em si, e as condições proporcionadas pelo
sistema prisional sob uma análise in loco. Nesse ponto, as penas alternativas à
privação de liberdade strictu sensu inserem-se num contexto de busca por
estabelecer a punição do condenado sem que esta punição impossibilite o retorno
pleno da vida em sociedade quando do fim da pena. Além disso, todos estes
parâmetros devem ser ainda tratados tendo por base a realidade do si stema
penitenciário brasileiro, sem que as análises se atenham estritamente a prescrições
doutrinárias.
Apesar
de
adventos
legais
de
aceleração
dos
procedimentos
processuais penais e de substituição das penas por medidas alternativas, o
vertiginoso crescimento dos níveis de violência no Brasil desde o final do século
XX deu ensejo ao
endurecimento
criminalização, como
a
Lei dos
das penas, por intermédio de
Crimes
Hediondos
(Lei
nova
8.072/90) e
o
estabelecimento do Regime Disciplinar Diferenciado (Lei 10.792/2003). Agravada a
pena em casos específicos, outra problemática se interpõe: a exaustão da
disponibilidade de vagas no sistema prisional.
De acordo com o Departamento Penitenciário Nacional, em seu
levantamento de informações penitenciárias feito pelo sistema INFOPEN, em junho de
2002 haviam 239.245 indivíduos presos no Brasil, dentre homens e mulheres, sendo
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que estavam disponíveis no país 181.444 vagas, restando assim um déficit de 57.801
vagas. Em novo levantamento, após dez anos, a população carcerária do Brasil já
alcançava o montante de 549.577 presos, um aumento de 129,71%. No mesmo
período, entretanto, foram criadas 137.631 vagas, um crescimento de apenas 75,85%,
valor insuficiente para suprir a demanda surgida de 310.332 novos presos, o que
representou um déficit em junho de 2012 de 230.502 vagas (DEPEN, 2012).
Fica evidenciado, assim, o pungente problema da superpopulação
carcerária, em que o crescimento acelerado apresenta malefícios principalmente no
que diz respeito à garantia de condições básicas de detenção e de respeitos aos
direitos humanos. Assim, a necessidade de se buscar novas alternativas à execução
penal, visa também aliviar a situação carcerária brasileira e garantir aos presos o
tratamento humano que, frente à superlotação, o Estado tem se mostrado incapaz
de prover, reforça Cruz, Souza e Batitucci (2013).
As informações acerca do perfil carcerário apontam que, descontadas as
inconsistências de informações, 63,27% dos presos brasileiros, em 2012, tinham
escolaridade inferior ao Ensino Fundamental completo; dentre a população
carcerária como um todo, 5,51% são analfabetos. Por outro lado, apenas 1,27% dos
presos do país tinham prosseguido seus estudos após o encerramento do Ensino
Médio. No que diz respeito à faixa etária da população prisional, o quantitativo de
presos entre 18 e 29 anos representa um montante alarmante, 51,18% da população
carcerária brasileira. Ademais, dentre os 524.728 presos que tiveram suas
informações compiladas pelo DEPEN (2012), 256.352 detentos estão encarcerados
como consequência de crimes contra o patrimônio, um número muito superior ao
segundo grupo de crimes, os atinentes à entorpecentes, dentre tráfico de drogas,
que agrupa 133.946 presos.
Os dados expostos corroboram os estudos de Salla (2007) e Cruz et al.
(2013) de que o preso brasileiro é hoje primordialmente de baixa escolaridade,
jovem-adulto, e está encarcerado por causa de crimes contra o patrimônio,
majoritariamente furto e roubo. A partir deste ponto, quais seriam as consequências
que este perfil gera para os elaboradores de políticas públicas prisionais?
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Inicialmente, o preso de baixa escolaridade enseja à Administração
Pública uma atenção especial com o caráter educacional da ressocialização, ou
seja, o fornecimento de meios para que o preso apto e disposto a tal possa
frequentar a escola e aprimorar seus estudos. A educação, como direito social
previsto pela Constituição à integralidade da população (BRASIL, 1988), é um dos
esteios da política ressocializadora na medida em que o preso que estuda e se
profissionaliza dentro da prisão tem mais chances de encontrar um emprego e se
reintegrar à sociedade.
Já a idade da população carcerária leva a duas interpretações por parte
dos elaboradores de políticas públicas: primeiramente, que políticas preventivas
direcionadas à juventude são essenciais para promover a diminuição da violência e
a entrada desses jovens no crime. Ademais, para reprimir o problema já
enfrentado, as medidas penais devem dar especial atenção a esta faixa etária. O
preso jovem, após cumprir sua pena, retornará à sociedade ainda em idade
produtiva, ou seja, apto a trabalhar e continuar suas atividades. Assim, a
profissionalização deste quinhão populacional é essencial para quebrar o ciclo
vicioso que se interpõe ao jovem que, ao sair da prisão e não conseguir sobreviver
por meios lícitos, retorna ao crime.
Por fim, a composição dos crimes contra o patrimônio enseja uma análise
de cunho econômico, uma vez que sua principal motivação é a situação econômica
do indivíduo delinquente (WACQUANT, 2001). A partir desse ponto, deve ser
analisado pela Administração Pública se o provimento de meios para que o cidadão
obtenha seu sustento sem ter que migrar para o crime seria suficiente para evitar
sua reincidência em alguns casos, não restando necessária a privação da liberdade.
A partir desse contexto, a prisão se exaure. O crescente confinamento,
em muitas vezes alcançando taxas de crescimento mais altas do que a própria
criminalidade, abarrota as prisões sem que as unidades carcerárias recebam a
mesma proporção em investimentos. Nesse ponto, a justiça crimina l tem buscado
alternativas à execução da pena privativa de liberdade.
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3 O MÉTODO APAC – ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA AOS
CONDENADOS
A APAC – Associação de Proteção e Assistência aos Condenados –
constitui modalidade alternativa ao sistema prisional tradicional, sendo um modelo
de cogestão penitenciária. Surgida em 1974 como uma ação de voluntários cristãos
na cidade de São José dos Campos – São Paulo, a APAC é, segundo Mário
Ottoboni (2006), seu criador, uma entidade que dispõe de um método de valorização
humana e evangelização, para oferecer ao condenado condições de recuperar -se e
com o propósito de proteger a sociedade, socorrer as vítimas e promover a justiça.
Ainda, a obra do criador da metodologia, Ottoboni, vai balizar a descrição das
Associações e de suas peculiaridades.
Empiricamente, trata-se da composição de uma entidade civil de direito
privado, sem fins lucrativos e com personalidade jurídica própria, oriunda da
mobilização da sociedade, que, via de regra, faz um convênio com o Estado para
que a administração daquela unidade prisional seja feita pela comunidade. Os
convênios preveem que a construção da unidade, tal como o provimento das
despesas de custeio – alimentação, luz, água, telefonia, dentre outras – será feito
pelo Estado; a administração direta da APAC será feita pela comunidade, com
adoção plena do voluntariado.
Tendo por objetivo primordial promover a humanização das prisões, sem
perder de vista o aspecto punitivo da pena, o método busca ainda evitar a
reincidência no crime e prover ao condenado meios de recuperação. A APAC opera
como entidade auxiliar dos Poderes Judiciário e Executivo, atuando na execução
penal e na administração das penas privativas de liberdade dos três regimes
previstos no Código Penal. As APAC’s tem amparo na Constituição Federal, na LEP
e no caso de Minas Gerais, da Lei Estadual 15.299/2004, que dispõe sobre a
realização de convênio entre o Estado e as Associações de Proteção e Assistência
aos Condenados (SILVA, 2012). Aplica-se o preceito trazido pelo artigo 4o da LEP,
que trata da cooperação da comunidade nas atividades de execução da pena. Além
disso, as APAC’s permitem ainda uma maior municipalização da pena, já que dentre
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os presos que para lá são destinados, tem prioridade aqueles que residem ou tem
família na comarca, visando ao princípio legislativo de que o preso deve permanecer
próximo ao seu meio social.
As APAC’s distinguem-se do sistema prisional tradicional na medida em
que nas Associações o preso, aqui chamado de reeducando, é o protagonista de
sua recuperação, tornando-se corresponsável por ela, obedecendo a rígida
disciplina, em que se prima pelo respeito, pela ordem e pelo trabalho. Além disso, o
voluntariado é plenamente exercido, e não há concurso de qualquer agente do
Estado, como policiais ou agentes penitenciários, e a segurança interna é realizada
pelos próprios recuperandos. O voluntariado dá origem ainda à participação da
comunidade na assistência espiritual, médica, psicológica, educacional e jurídica.
Cada unidade APAC é autônoma em relação às outras e responde,
portanto, individualmente por seus trabalhos. Este fator não propicia afastamento da
aplicação da legislação vigente, já que o surgimento de tais entidades está
condicionado à participação dos Juízes locais ou do Tribunal de Justiça, e estas
autoridades devem fiscalizar o andamento das atividades. Cabe ressaltar ainda que
a movimentação prisional, ou seja, a seleção e encaminhamento dos presos que vão
para uma APAC, é feita pelo Poder Judiciário local. Outrossim, para que se tenha
uniformidade na metodologia, as unidades devem ser filiadas à Fraternidade
Brasileira de Assistência aos Condenados (FBAC), que orienta, administra cursos,
provê assistência jurídica e promove congressos entre as unidades apaqueanas.
O Método APAC tem por principal pilar a valorização humana, primando
por reformular a autoimagem do homem que errou. Para tal, foi constituída uma
diretriz
com
recuperando
doze
elementos
ajudando
fundamentais:
recuperando,
trabalho,
participação
da
comunidade,
religião, assistência
jurídica,
assistência à saúde, valorização humana, família, voluntariado, Centro de
Reintegração Social, mérito, e Jornada de Libertação com Cristo. Estes doze
elementos merecem destaque especial na análise das APAC’s na medida em que a
observância de todos eles é indispensável à adequação do método, sendo sua
coexistência essencial à formação de uma Associação.
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A participação da comunidade consiste na necessidade que tem a
sociedade de compreender que não há resultado apenas na lamentação das agruras
de violência que sofre um local; a comunidade deve buscar atuar nas unidades
prisionais, como uma força pacificadora em prol da valorização humana dos
condenados.
A ajuda mútua propiciada pela máxima de “Recuperando ajudando
Recuperando” prescinde os ensinamentos de se saber respeitar o espaço do
próximo, na medida em que o ato ilícito que levou o preso a ser condenado oriunda
de um desrespeito ao outro ou à sociedade como um todo. Assim, por meio do
estabelecimento de um líder por cela – a representação de cela – e da participação
no Conselho de Sinceridade e Solidariedade (CSS) busca -se a cooperação de todos
para a melhoria na segurança, nas relações e na disciplina local.
O trabalho é outro dos pilares do Método e faz parte do contexto e da
proposta, mas não deve ser o único elemento fundamental, já que ele sozinho não
recupera o homem. Nesse sentido, sua aplicação ao longo dos três regimes é
diferenciada; no regime fechado, a ênfase é dada à laborterapia, evitando a todo
custo o trabalho massificante. Já no contexto do regime semiaberto, há de se primar
por definir uma profissão aos recuperandos que ainda não a possuem, buscando
sempre a parceria com cursos profissionalizantes e formadores de mão de obra. Por
fim, no regime aberto, é o momento da inserção social por meio do trabalho, em que
o preso vai praticar a sua profissão definida por meio de um trabalho externo, tendo
mais contato com a família e com a comunidade.
A almejada transformação moral do condenado pretende-se por meio da
religião onde, sem que haja, em teoria, a imposição de credos, o preso tem que,
imperiosamente, possuir uma religião. Este pilar esteia-se no argumento de que a
experiência de Deus, de amar e ser amado, leva à reciclagem dos valores do
homem.
A assistência jurídica também carrega sua importância no Método, na
medida em que uma das maiores preocupações do condenado está em sua situação
processual. Reside ainda aqui uma proposta de, ao se manter o reeducando
atualizado em relação à seu status junto à Justiça e suas possibilidades de
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benefício, mantém também a esperança daquele homem. Entretanto, o Método
resalva alguns pontos: a assistência, prestada por voluntários, deve restringir-se aos
condenados engajados na proposta APAC; deve ser prestada apenas aos
confirmadamente pobres; o trabalho desenvolvido não deve ser encarado como o
mais importante, já que visa reintegrar o preso, não apenas por liberá-lo sem mérito;
os voluntários devem atuar em programas de trabalho sérios, sempre atentando ao
prescrito legalmente, sem agir com cunho protetivo.
Por meio do trabalho de voluntários dedicados à causa, deve ser
oferecida assistência à saúde, cabendo a participação de médicos, psicólogos,
dentistas e outras assistências dentro da própria unidade.
A valorização humana é o pilar considerado base do Método APAC,
objetivando sempre colocar o ser humano em primeiro lugar, ajudando o homem que
errou a reformular sua autoestima. Aqui, prima -se por dar tratamento mais solidário
ao preso: chamá-lo pelo nome, conhecer sua história, visitar sua família, permitir o
uso de objetos básicos – como talheres, artigos de higiene pessoal etc. -, dentre
outros pontos. Ademais, a educação e o estudo devem fazer parte desse contexto, e
os voluntários, quando de seu curso de formação no Método, são treinados para
prover este auxílio, auxiliando o recuperando a ver a realidade como ela é.
A família, como parte integrante do recuperando, também tem atenção
especial. Na estrutura administrativa é criado um departamento com o objetivo de
auxiliar as famílias que ficaram desamparadas sem o provedor, que foi preso. Assim,
na medida do possível, são realizadas visitas, encaminhando as pessoas que se
encontram necessitadas à escolas, postos médicos, providenciando cestas básicas
etc. Tenta-se recuperar não apenas o preso, mas a sua família de origem, para que
o relacionamento quando da soltura dê-se de maneira a facilitar a reinserção social
do apenado. O Método APAC propicia, com esta ênfase, que o rigor da condenação
não extrapole a pessoa do condenado; ademais, os presos apaqueanos devem
cumprir pena, dentro das possibilidades, na cidade onde residem suas famílias.
Os voluntários, participantes primordiais na efetivação do método, tem em
si e no seu curso de formação outro pilar. Dada a gratuidade do trabalho, a APAC
procura despertar e formar voluntários que atendam à seriedade da proposta e
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esteja confiante na recuperação que o Método promove. Em sua preparação, o
voluntário participa de um curso de Estudos e Formação de Voluntários, durante o
qual vai desenvolver suas aptidões e desenvolver o espírito comunitário, essencial à
metodologia.
Atendendo às prescrições dos artigos 87 a 95 da Lei de Execuções
Penais, que traz a descrição das unidades prisionais que devem abrigar cada regime
de condenação, a APAC tem por estrutura o Centro de Reintegração Social, que é o
prédio físico que sedia a Associação. Ele conta com três pavilhões, separados,
destinados a abrigar cada um dos regimes em sua peculiaridade, de forma que a
progressão não enseje a transferência do recuperando, mantendo -o assim próximo
da família.
A legislação brasileira adota o regime progressivo da pena a partir do
tempo de cumprimento da pena e da conduta do condenado. Assim, o mérito,
utilizado também do sistema comum, encontra terreno fértil na Associação. A partir
dos registros feitos na pasta -prontuário do reeducando, que compila toda sua
conduta desde que adentrou na unidade, o recuperando pode angariar benefícios de
progressão a partir do seu bom comportamento e de sua conduta de participante do
Método, sendo aferido ainda as atividades desenvolvidas como membro do
Conselho de Sinceridade e Solidariedade, da secretaria, dentre outras ações
intrínsecas à metodologia.
Por fim, o último pilar do Método reside na Jornada de Libertação com
Cristo. Trata-se de um encontro anual estruturado em palestras, meditações e
testemunhos, sempre atendo-se à valorização humana e à religião. O objetivo da
prática está em fazer o recuperando repensar o verdadeiro sentido da vida,
incentivando o recuperando a adotar uma nova filosofia de vida, com base na paz e
na fraternidade.
Segundo a Fraternidade Brasileira de Proteção aos Condenados, o Brasil
possui atualmente 91 APAC’s juridicamente constituídas, dentre três grupos. O
primeiro abarca aquelas associações com administração do Centro de Reintegração
Social (CRS) já constituída pela APAC, com prédio próprio, sem a presença de
agentes penitenciários e com aplicação dos doze elementos. Neste quesito,
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enquadram-se apenas as APAC’s de Itaúna – masculina e feminina. Como segundo
grupo, temos aquelas associações que apesar de administrarem o CRS, possuírem
prédio próprio e não possuírem concorrência de agentes penitenciários, não aplicam
o método em sua plenitude. São 41 desta modalidade no país, sendo 33 em Minas
Gerais. Por fim, insere-se o último grupo de APAC’s, que abarca o número mais
expressivo de Associações constituídas, sendo aquelas que estão em implantação
ou em construção do seu CRS próprio.
4 A CUSTÓDIA E RESSOCIALIZAÇÃO IN LOCO: A EXPERIÊNCIA DA APAC DE
ITAÚNA, MG
A cidade de Itaúna, conta, desde o ano de 1997, com uma APAC
constituída. A história de sua implantação é semelhante a de São José dos Campos,
que transformou a Cadeia de Humaitá na primeira Unidade do Método, pelas mãos
do fundador Mário Otobonni. Em 1983, um grupo de pessoas da Pastoral
Penitenciária de Itaúna passou a visitar os presos na cadeia pública, prestando
assistência religiosa e material. Apesar da resistência na sociedade local, o grupo se
debruçou nos estudos do Método preconizado por Ottoboni e estagiou em Humaitá,
para conhecer melhor a Associação. Entretanto, a implantação do Método na própria
Cadeia Pública era inviável.
Assim, a prefeitura doou um terreno para a construção do CRS. Com o
apoio do Poder Judiciário local e com a participação de voluntários, o Centro foi
erguido para receber, inicialmente, presos de regime aberto e fiscalização dos
constantes em livramento condicional. Entretanto, uma rebelião na Cadeia Pública em
1995 levou à quase completa destruição do prédio, de forma que os presos foram
transferidos para o Centro recém construído, até que a nova Cadeia ficasse pronta.
No ano de 1997, com ambas as unidades prontas, os presos foram
remanejados para a nova Cadeia Pública e a APAC de Itaúna passou a administrar os
três regimes de pena, sendo a segunda Associação do mundo a contar com a
administração de um presídio sem a concorrência de agentes de polícia (SILVA,
2012).
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Dadas estas características, a APAC de Itaúna consolidou-se no Brasil
como modelo a ser seguido, sendo que a FBAC indica que, para a abertura de uma
nova APAC, seja feito um intercâmbio entre os condenados que vão estar na nova
Unidade e alguns reeducandos de Itaúna, para auxiliar na implantação. Considerada
APAC modelo, a servir de exemplo para a execução das demais, a legislação
mineira consagrou este viés ao prescrever na Lei 15.299/04, em seu Art. 4 o, que
para firmar convênio com o Poder Executivo, a APAC deverá atender dentre outras
condições, “adotar como referência para seu funcionamento as normas do estatuto
da APAC de Itaúna”.
Atendendo ao intuito de verificar a aplicação da metodologia APAC e da
Lei de Execuções Penais in loco, foi realizada visita na APAC masculina de Itaúna,
que possui ampla construção e abriga, separadamente, os três regimes de
condenação. Há uma área administrativa, dois auditórios, refeitórios separados para
cada regime e espaço de lazer nos regimes semiaberto e aberto. A Associação
conta ainda com cantinas localizadas dentro da estrutura de cada regime, onde são
vendidos alguns produtos aos próprios presos. A gestão deste comércio é feita pelos
reeducandos do regime e o lucro obtido reverte para a APAC, indo para a tesouraria
da Unidade. Esta instalação atende ao disposto no artigo 13 da LEP, que permite no
estabelecimento penal instalações e serviços que atendam aos presos nas suas
necessidades pessoais, além de locais destinados à venda de produtos e objetos
permitidos e não fornecidos pela Administração (BRASIL, 1984). Via de regra, este
preceito não é cumprido dentro do sistema penitenciário comum, já que a população
carcerária não tem acesso lícito a dinheiro, sendo um dos procedimentos de
admissão do preso resguardar seus pertences na entrada da Unidade, só tendo
acesso aos mesmos novamente quando de sua na saída.
Ainda atendendo ao preceito legal de cooperação da comunidade nas
atividades de execução da pena, a Prefeitura da cidade de Itaúna é bastante atuante
junto à APAC local. O convênio firmado com o Estado abarca valores fixos de
custeio e valores de repasse que dependem do tamanho da população carcerária,
auferida trimestralmente, sendo que o município também colabora com o custeio de
algumas ações. A Secretaria Municipal de Saúde cede também um médico e um
profissional de enfermagem para atender a população tanto da Associação
masculina quanto da feminina.
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A assistência à saúde na APAC é embasada não apenas na parceria com
a Prefeitura, mas também no voluntariado, outro pilar determinante do Método. Há
um consultório odontológico em que um dentista voluntário faz os atendimentos. Há
o fornecimento também de medicamentos controlados aos presos que precisam,
que são entregues na posologia certa a cada um dos reeducandos por um preso
responsável pelo fornecimento. Ademais, a APAC conta, para completar seu quadro
de assistência à saúde, com um psicólogo, uma assistente social e um nutricionista.
A assistência jurídica é considerada pela administração da APAC a
espinha dorsal da Unidade, já que o ponto mais almejado pelo preso é sua
liberdade. Além disso, a administração prima por manter a população p risional
sempre inferior à capacidade máxima da Unidade, que é para 200 presos, para que
nenhum dos acompanhamentos, em especial o jurídico, seja maculado. Há espaço
exclusivo no prédio central destinado a estes atendimentos, que são realizados por
voluntários.
A estrutura educacional da Unidade tem sua administração dividida entre
o voluntariado e Prefeitura, assim como ocorre na assistência à saúde. O Ensino
Fundamental é provido pelo Município, em que os professores vêm a cumprir um
dos preceitos do Método, que é a obrigatoriedade do preso analfabeto em se
alfabetizar enquanto está no regime fechado. Já no que concerne ao supletivo de
Ensino Fundamental – aulas de reforço àqueles que já concluíram esta fase – e no
Ensino Médio as aulas são dirigidas por voluntários da APAC. O prédio conta com
salas de aula internas para os presos de regime fechado e semiaberto; além disso, a
Unidade conta ainda com uma biblioteca, para auxiliar o aprendizado dos apenados.
Conta-se na estrutura da unidade com uma assistente social voluntária
que, juntamente com a administração do presídio, vai ajudar na promoção desta
assistência. Neste quesito, cabe destaque à Itaúna quando do incentivo à
participação da família na recuperação. Inicialmente, a estrutura física do prédio
conta com suítes destinadas às visitas íntimas, em área a parte aos dormitórios,
para que o visitante não seja exposto. É feito um controle direto sobre estas visitas,
com pesquisa social direcionada a detectar se a visita é realmente a companheira do
reeducando, sendo acompanhado também os exames de saúde dos dois. Além
disso, a APAC enseja os encontros familiares dentro da própria Unidade quando de
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datas festivas e na Jornada de Libertação com Cristo. De responsabilidade da
FBAC, o evento é anual, dura aproximadamente quatro dias e no último dia a família
é convidada a participar, com um momento em que o recuperando pede perdão.
Este momento prima por mostrar ao recuperando os valores que ele perdeu, a culpa
individual pelos próprios erros e a expor a prisão que a família também foi colocada
quando da sentença do apenado.
Outro ponto distinto e que atende aos preceitos de assistência social é o
hábito de que os presos sejam tratados nominalmente, com uso inclusive de crachás
indicando seu nome, seu regime, e se ele é parte do CSS ou da administração. Este
ponto difere-se antiteticamente do sistema prisional tradicional, em que o preso
acaba por abandonar seu nome em prol do número de INFOPEN, que consiste no
registro de informações penitenciárias e gera, para cada preso, um número.
A religião é estear à Associação de Itaúna, seguindo os preceitos de
Ottoboni (2006) de ter-se na fé e no culto elementos disciplinadores essenciais e
obrigatórios. Assim, a estrutura do CRS conta com uma capela dentro do regime
fechado, junto com os dormitórios. Os cultos são realizados por voluntários ou
mesmo pelos próprios reeducandos nos auditórios da Unidade, sendo que faz parte
da rotina da APAC ainda as orações ao início do dia e antes das refeições. Em
Itaúna, detecta-se a presença mais veemente do catolicismo e de religiões
evangélicas.
Assim como preconiza o Método e a LEP, a APAC de Itaúna dá ênfase ao
trabalho como fator importante quando da necessidade de profissionalização do
recuperando. No regime fechado é enfatizada a laborterapia, com espaço próprio
destinado à criação de trabalhos artesanais em madeira, tear, velas e pintura em
cerâmica.
No regime semiaberto há ênfase à profissionalização no trabalho
intramuros, sendo que havendo carta de emprego e autorização judicial, o preso pode
também trabalhar extramuros. Neste ensejo, a APAC contava na época da visita com
parceria com empresas privadas como a Esfera e a Magneti Marelli, além de ter
também uma padaria, cujos equipamentos foram em parte doados pela Prefeitura de
Itaúna, com produção para consumo interno e comércio; também inserem-se aqui os
trabalhos de marcenaria, com maquinários doados pelo Rotary Clube. Cabe destaque
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ainda à horta, galinheiro e suinocultura conduzidas dentro da Unidade, também
destinados ao consumo interno e à comercialização do excedente, sendo que a
horta é mantida através de doações do Ministério Público local e também de rendas
provenientes de oficinas. Ressalta-se que o uso destes produtos para consumo
interno é destinado à cozinha, que é guiada por presos do regime semiaberto.
O CSS local é extremante atuante, mantendo não apenas a disciplina e
auxiliando os reeducandos no necessário, mas exercendo também funções
administrativas, sendo que os membros do Conselho são os guias de visita à APAC.
A Associação também realiza, em uma ação conjunta entre o Conselho e a
administração, o preenchimento do Quadro de Avaliação Disciplinar, que traz o
nome de cada recuperando, dividido por cela, e sua respectiva contabilização de
faltas. Há destaque para a cela mais organizada, a mais desorganizada, e os presos
destaque do mês.
Cabe ressaltar que um aspecto a se atentar na Unidade de Itaúna é o fato
de que nunca houve a entrada de Agentes de Segurança Penitenciária ou mesmo
de qualquer força policial em qualquer dos Centros de Reintegração Social, de forma
que mesmo em se tratando de um ambiente de prisão não houve ainda a ocorrência
de motins e rebeliões que ensejasse a entrada de armas de fogo.
Por fim, cabe destacar uma das ressalvas feitas quando da visita pelos
próprios reeducandos da Unidade: apesar das benesses oferecidas pelo Método,
existem casos de inadequação à metodologia, e m que o próprio preso demanda o
retorno ao sistema convencional. Tenta -se registrar tal inadequação pela assinatura
de um termo de adesão pelo preso tanto quando da entrada na APAC e na migração
para os regimes semiaberto e aberto, que prevê as obrigações e compromissos que
o preso deve ter para com o CRS. Entretanto, dada a disciplina de horários, o
repúdio ao ócio do preso, que é autorizado a ficar na cela por tempo limitado, a
expressa proibição de aparelhos de TV na cela, a obrigação de adotar -se preceitos
de limpeza e higiene extremos, a necessidade respeito aos horários de silêncio,
dentre outros pontos, acaba por levar alguns presos a pedirem o retorno para o
Presídio da cidade. Cabe ressaltar, por fim, que frente ao alcance de uma pontuação
de faltas leves, médias e graves, o preso também é remetido ao sistema comum
novamente, sendo que seu retorno à APAC é bastante dificultado. Ainda assim,
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atendendo aos preceitos cristãos de dar-se uma segunda chance, na Comarca de
Itaúna adota-se a prática de que a cada sete presos que são encaminhados à APAC
pela primeira vez, o Juiz de Execuções encaminha um que já tenha tido a
oportunidade, retornou ao sistema por causa de faltas, mas encontra-se novamente
na lista de espera por uma vaga na Associação.
5 METODOLOGIA APAC: PONTOS PARA REFLEXÃO
A filosofia da metodologia APAC é a de que todo homem é maior que o
seu erro. O surgimento do Método volta-se para a recuperação do condenado e sua
reinserção no convívio social, ressocialização esta a ser mensurada pela efetiva
readequação do apenado à sociedade, sem retorno ao sistema penitenciário.
Boa parte da argumentação da eficiência da metodologia reside na
chamada taxa de reincidência criminal, ou seja, reentrada verificada quando o
indivíduo comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que o tenha
condenado por crime anterior. Entretanto, segundo o Conselho Nacional de Justiça,
ainda não existiam dados confiáveis nesse sentido (CNJ, 2013). Nesse sentido,
sendo ainda indeterminados os dados que balizem a reincidência criminal, as
prescrições constantes na bibliografia acerca das APAC’s, que atribui a reincidência
a nível nacional a 86% e a reincidência nas Associações inferior a 5% (OTTOBONI,
2006) não podem ser utilizadas como argumentos que sustentem a eficácia do
Método.
Outro ponto a ser criticado
no Método aponta pela imperiosa
obrigatoriedade de que o preso seja crente em alguma religião. Esta prescrição vai
de encontro ao explicitamente disposto no artigo 24, §2 o da LEP, que proíbe que se
obrigue o preso a participar de atividade religiosa. Entretanto, a religião é
considerada fator primordial no Método, constituindo ponto de apoio incondicional
àquele que se ressocializa, mas, promovê-la como mandatória em um ambiente de
custódia configura-se ilegal. Até porque, como indica Coutinho (2009), tanto no
sistema prisional tradicional como na APAC da cidade de Viçosa o vínculo religioso
era tomado como válvula de escape para os problemas vividos no mundo do crime.
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Entretanto, dada a obrigatoriedade deste vínculo na APAC, não se pode concluir que
o incorporar de uma religião pelo reeducando configure -se como determinante para
a inclusão social. Tanto nas observações realizadas pela autora no Presídio como
na APAC, a participação religiosa muitas vezes era uma maneira de responder às
normas da instituição, para que o cumprimento da pena se desse de maneira mais
fácil, cabendo inclusive a incorporação de benefícios, como a saída pra cultos. Ainda
na perspectiva da autora, àqueles que incorporavam os valores e as práticas
religiosas em suas vidas, tanto no Presídio como na Associação, a lida com a pena
era mais harmoniosa; porém, este fator isolado não era suficiente para uma
mudança de perspectiva de vida.
Por se tratar de uma metodologia que, para ser implantada e funcionar,
precisa contar com o engajamento não apenas da comunidade, que vai promover
sua construção, como dos reeducandos, que devem se adequar à disciplina do
Método, alguns direitos garantidos ao longo do mesmo carregam um caráter de
garantia apenas àqueles presos que realmente são engajados. Cita-se aqui a
prescrição de que a assistência jurídica deve “restringir-se aos condenados
engajados na proposta APAC e que revelem firmes propósitos de emenda”
(OTTOBONI, 2006). Além desta, quando do regime semiaberto, é prescrito ao preso
a lealdade na comunicação com os voluntários, que consiste na participação do
recuperando em atos e campanhas promovidos pela entidade para difundir o Método
e arrecadar fundos. Neste ponto, o interesse do apenado pela consolidação da obra
deve ser inequívoco, cabendo inclusive aos voluntários, estrita atenção ao
comportamento daqueles que não forem leais à causa.
Este engajamento também é tomado como condição quando das
atividades religiosas e de comportamento. Logo, o Método cria um nexo causal de
que todo condenado que tem real intenção de dar nova perspectiva à sua vida o faz
a partir daquilo que o método assume como correto. Exclui-se aqui o apenado que,
por convicções próprias, quer ressocializar-se e não mais reincidir no crime; a este
preso não é atribuído o caráter de adesão ao método da APAC. Na convergência
desses dois fatores – obrigação da religiosidade e adesão cega aos preceitos do
Método – insere-se o fator Perseverança na fé, prescrito como essencial aos
constantes em regime semiaberto e determinante para se progredir para o regime
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aberto. Aqui, prescreve-se aos voluntários que não mais aceitem vacilações na fé
por parte do preso, sendo incutido a esta fé o termo “termômetro valios íssimo”
(OTTOBONI, 2006). Assim, não basta que o recuperando cumpra apenas as
obrigações materiais exigidas na metodologia, pois existiriam presos que apesar de
bom comportamento prisional, vão sucumbir caso não se apoiem na fé. Ottoboni
conclui ainda que o bom comportamento prisional não deve ser elemento
fundamental para a avaliação se o preso está apto a progredir de regime, mas
apenas acessório na decisão. Aqui caberia, aos olhos da Associação, a decisão de
progressão de regime com base na adesão ao Método APAC e na perseverança na
fé, que são aspectos absolutamente subjetivos.
Apesar de uma alternativa ao Sistema Prisional tradicional, deve-se
ressaltar que o Método não é aplicável a toda a população carcerária. Este preceito
embasa a Portaria Conjunta no 084/2006, que foi promulgada pelo TJMG e pela
Corregedoria Geral de Justiça no intuito de se evitarem abusos na transferência de
presos para as APAC’s e se prevenirem responsabilidades. Considerando que o
crime cometido não é uma condição determinante para que o preso migre para um
CRS, a classificação do mesmo no que se refere à sua periculosidade e
continuidade da ligação com o crime é essencial.
Nesse sentido, a ressalva que cabe é a aplicabilidade do Método a um
quinhão da população carcerária que não abarca sua totalidade. O encaminhamento
de um preso à APAC que não vá aderir ao método e impetrar em fuga coloca a
sociedade em um risco inequívoco. Assim, as afirmações feitas pela imprensa e pela
população leiga, de que o método é a solução para o sistema prisional, não se
aplica. Sempre caberá ao Estado, como detentor da prerrogativa legal de força,
guardar a fração dos presos que oferecem risco à sociedade e que não podem ser
submetidos a uma unidade de mínima segurança.
Por fim, cabe destacar que o sistema prisional como um todo, em seu viés
tradicional ou em suas modalidades alternativas, onde se encerra a APAC, deve
buscar expandir suas ações para que sejam atendidas as necessidades do egresso,
ultrapassando a atuação intramuros e apenas no lapso temporal da condenação. A
recuperação do detento deve ser impulsionada pelo Estado com o oferecimento das
medidas necessárias para garantir ao preso sua reintegração plena à sociedade.
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E sob este patamar, perfaz-se necessário o aperfeiçoamento e fortalecimento dos
procedimentos de integração após o cumprimento da pena, que vão dar
continuidade ao trabalho desenvolvido não apenas na APAC, mas nos sistemas de
privação de liberdade como um todo.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No contexto brasileiro, o Método APAC, como alternativa ao sistema
prisional tradicional, perfaz seu primeiro benefício ao conclamar a sociedade a
participar do problema e ajudar na sua solução, de forma que a partir do
voluntariado, e da consequente minimização dos custos com o preso, mais vagas
são criadas sem que os cofres públicos sejam onerados em um aporte que,
atualmente, eles não comportam. Ademais, a ênfase na educação, e o oferecimento
de trabalho à quase totalidade da população carcerária prima por ressocializar este
novo perfil de preso, jovem-adulto, de baixa escolaridade e que está em sua maioria,
encarcerado por crimes contra o patrimônio.
Em outra diretriz de análise, foi apresentado ao longo do presente
trabalho a adequação das prerrogativas básicas da metodologia à Lei de Execuções
Penais. A amplitude de assistência provida pelo Método não só ao preso, mas
também à sua família, faz que a sentença condenatória não ultrapasse, tanto quanto
possível, a pessoa do condenado, individualizando a pena. Este parâmetro
consolida a efetivação da sentença condenatória tal qual ela foi prescrita, atendendo
ao objetivo da LEP.
No Método APAC, a primazia do voluntariado e o convênio com o Estado
permite à administração prover aos presos sob sua égide o amparo material, à
saúde, jurídico, educacional, social e religioso, quando não custodiados pelo
convênio são providos pelos voluntários. Esta situação foi verificada in loco na APAC
de Itaúna. Na Unidade há plena colaboração do Município, e as funções de médico,
dentista, assistente social, psicólogo, nutricionista, assistente jurídico e professores,
essenciais à garantia dos direitos do preso, quando não providas pela Prefeitura,
são feitas por voluntários.
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Além disso, outros direitos previstos na LEP, que não são passíveis de
serem realizados pelo apenas voluntariado, mas pela estrutura da metodologia,
também são atendidos na APAC. Neste quesito destacam-se a proporcionalidade na
distribuição do tempo do preso, chamamento nominal, igualdade de tratamento
(promovida frente à não identificação, dentro da APAC, do delito cometido como
método de classificação) e acesso ao diretor da Unidade, foram verificados na
dinâmica da Associação de Itaúna.
Frente às observações interpostas, há de se concluir que a APAC prima
por aplicar a punição àqueles que infringiram as normas penais de maneira
concomitante à sua ressocialização, de acordo com o previsto na Lei de Execuções
Penais. Esta política pública, de caráter sui generis, não está prescrita como pena
alternativa já que mantém a restrição de liberdade; entretanto, há, nas APAC’s pleno
atendimento à diretriz da ONU, transcrita nas Regras de Tóquio (1990), de que além
de se reduzir o número de delinquentes, buscar soluções alternativas à prisão e a
reinserção social dos apenados.
Entretanto, apesar da conclusão positiva de que as Associações de
Proteção e Assistência aos Condenados, quando seguem a metodologia tal como foi
preconizada por Mário Ottoboni, aplicam de forma proficiente as disposições legais
da Execução Penal brasileira, as ressalvas em relação ao método não podem ser
desconsideradas. O engajamento dos reeducandos é essencial ao sucesso do
Método, tanto para que a adesão aos preceitos seja plena, como que para os baixos
parâmetros de segurança sejam respeitados. Assim, esta seleção do preso apto a
migrar para a APAC faz-se mister ao progresso do Método e denota uma conclusão
necessária: o Método não é aplicável a toda a população prisional, e deve ser
disseminado com cautela, dado que o encaminhamento de um preso que tenha
tendência a fugir ou incorrer em outras faltas graves à APAC coloca em risco a
sociedade como um todo.
Sob o lema de “matar o criminoso e salvar o homem”, o Método APAC
enfrenta a principal dificuldade da pena nos dias de hoje: conciliar, com equilíbrio, a
prevenção, a punição e a ressocialização da pena, tudo isso em um ambiente onde
tira-se a liberdade para que o homem reaprenda a viver em liberdade. A sociedade,
ciente das dificuldades do Sistema Penitenciário como um todo, deve sempre
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atentar às alternativas apresentadas para solucionar a crise da pena, cônscia de que
cada modalidade tem em seu bojo um público alvo diferenciado. Assim, a APAC, tal
como o monitoramento eletrônico, as penas restritivas de direitos e outras
modalidades alternativas atendem a um público específico e, em nenhuma destas
espécies reside, sozinha, a solução para o sistema carcerário. Não há um remédio
único para as dificuldades do sistema penitenciário, mas a conjugação de forças,
estudos, fatores e projetos que há de buscar, cotidianamente, a otimi zação da
custódia.
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AUTORI A
Ana Luísa Silva Falcão – Subsecretaria de Administração P risional/Secretaria de Estado de Defesa
Social – (SEDS/MG).
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Marcus Vinícius Gonçalve s da Cruz – Fundação João Pinheiro – (FJP/MG).
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