Centro de Convenções Ulysses Guimarães Brasília/DF – 4, 5 e 6 de junho de 2012 COOPERAÇÃO BRASIL-VENEZUELA: CAMINHOS INSTITUCIONAIS Corival Alves do Carmo Painel 13/050 Experiências de cooperação internacional COOPERAÇÃO BRASIL-VENEZUELA: CAMINHOS INSTITUCIONAIS Corival Alves do Carmo RESUMO O objetivo do artigo é apresentar duas características da cooperação entre o Brasil e a Venezuela a partir dos aspectos institucionais. Em primeiro lugar, procurar-se-á fazer uma apresentação do marco institucional do governo venezuelano e das adaptações, muitas vezes apresentadas pelos analistas como distorções, para acelerar a solução dos problemas econômicos e sociais através da transferência de responsabilidades para a empresa estatal petrolífera, PDVSA. A partir daí, buscarse-á demonstrar como a organização interinstitucional do governo brasileiro pode contribuir para o desenvolvimento institucional do Estado venezuelano, especialmente em relação ao esforço de coordenação de vários ministérios e diferentes níveis de governo para a implementação de políticas públicas. O segundo aspecto a ser abordado será a cooperação entre os governos dos estados de Bolívar na Venezuela e Roraima no Brasil, que firmam acordos entre si e dão seguimento aos projetos mesmo reconhecendo que os acordos firmados não têm valor jurídico perante o direito internacional. 2 1 INTRODUÇÃO Desde o final do governo FHC, as relações entre o Brasil e a Venezuela se aprofundaram significativamente. A ajuda brasileira à Venezuela durante a crise gerada pelo paro petrolero (dezembro/2002 a fevereiro/2003) serviu de base para uma construção de uma sólida aliança entre os dois países ao longo dos governos Lula e Chávez. O resultado mais notável dessa cooperação foi o crescimento dos fluxos de comércio, particularmente das exportações brasileiras para a Venezuela. Além disso, iniciou-se a integração dos estados do Norte do Brasil com a América do Sul, e com o ingresso da Venezuela no Mercosul abriu-se a oportunidade de que a região Norte do Brasil se aproprie de frutos do processo de integração regional. Especialmente favorecidos foram a Zona Franca de Manaus e o estado do Pará com a exportação de bovinos. Mas também Roraima, que já havia se beneficiado da integração elétrica entre o Brasil e Venezuela ainda no governo FHC, beneficiou-se da interconexão de banda larga com a Venezuela. Paralelamente a estes processos, houve uma intensificação da cooperação entre os dois países com vistas a transferir a experiência brasileira em políticas públicas para o país vizinho. Para tanto, alguns organismos do governo brasileiro se instalaram em Caracas a partir do segundo mandato do presidente Lula, a Embrapa, a Caixa Econômica Federal e o Ipea. Além do papel de transferir tecnologia, a Embrapa deveria servir e ponto de apoio para as políticas de aumento da produção agrícola venezuelana, inclusive, com a produção com vistas à exportação, como o caso da soja. À Caixa caberia transferir a experiência brasileira em programas habitacionais e de intervenções em locais de baixa renda para recuperar a economia local. O Ipea serviria de apoio à formulação de políticas para o desenvolvimento para a Faixa Petrolífera do Orinoco, usar o petróleo para promover a diversificação da estrutura produtiva do país. O objetivo do artigo é apresentar duas características da cooperação entre o Brasil e a Venezuela a partir dos aspectos institucionais. Em primeiro lugar, procurar-se-á fazer uma apresentação do marco institucional do governo venezuelano e das adaptações, muitas vezes apresentadas pelos analistas como distorções, para acelerar a solução dos problemas econômicos e sociais através da transferência de responsabilidades para a empresa estatal petrolífera, PDVSA. 3 A partir daí, buscar-se-á demonstrar como a organização interinstitucional do governo brasileiro pode contribuir para o desenvolvimento institucional do Estado venezuelano, especialmente em relação ao esforço de coordenação de vários ministérios e diferentes níveis de governo para a implementação de políticas públicas. O segundo aspecto a ser abordado será a cooperação entre os governos dos estados de Bolívar na Venezuela e Roraima no Brasil, que firmam acordos entre si e dão seguimento aos projetos mesmo reconhecendo que os acordos firmados não têm valor jurídico perante o direito internacional. 2 O ESTADO VENEZUELANO E A COOPERAÇÃO BRASIL-VENEZUELA A Venezuela desde a primeira eleição do presidente Hugo Chávez vive um processo de transformação social, que tem sido acelerado nos últimos anos na medida em que se consolidam os objetivos de construção de um novo socialismo que responda aos problemas históricos do país. Diante desta realidade em permanente mutação, uma revolução em processo, obviamente que as instituições vigentes são tensionadas e novas instituições são criadas para atender às novas demandas. Entretanto, dado o ritmo das transformações sociais e econômicas, as instituições, novas ou velhas, são incapazes de responder de forma eficiente e adequada a todas as exigências colocadas pelos planos de desenvolvimento da Nação. O próprio presidente Hugo Chávez reconhece que o Estado, e portanto, as instituições que o compõem, ainda está por ser construído, Es una gran verdad innegable la que anda por las calles y en la voz de nuestros compatriotas: ¡Aquí ahora sí hay Gobierno! Pero ello no basta si queremos tener República: el tiempo es propicio para que todos los poderes, liberados del lastre de su división -como consecuencia de una nefasta herencia que debemos superar más temprano que tarde- trabajen coordinadamente como lo exige el constitucionalismo popular que toma forma en Venezuela y en Nuestra América. Debe llegar el día en que la voz del pueblo pueda decir con plena certeza: ¡Ahora sí tenemos Estado!1 1 http://www.chavez.org.ve/chavez/lineas-chavez/lineas-chavez-mercorsur-al-alba/ 4 Desde 1999, vários passos foram dados rumo à estruturação de uma nova economia capaz de “sembrar el petroleo” e promover uma diversificação da estrutura produtiva, e de uma nova sociedade na Venezuela com menor grau de desigualdade e com protagonismo popular nos processos políticos, sociais e econômicos. Cada passo rumo a estas conquistas significa a criação de novas instituições, mudanças nas instituições já existentes, alteração nos padrões de relacionamento dos diferentes órgãos do governo. Por isso, é possível dizer que há um governo e um projeto de Nação para a Venezuela, mas ainda está em construção o Estado capaz de dar conta das demandas colocadas pela revolução bolivariana liderada pelo presidente Hugo Chávez. A importância das questões institucionais para viabilizar o desenvolvimento econômico e a diversificação da estrutura produtiva de um país não deve ser menosprezada. Suzigan e Furtado (2010, p.11) apontam que “o processo de mudança institucional constitui um desafio muito mais difícil de ser enfrentado do que o catching up em tecnologias físicas”. E acrescentam, “Tecnologias sociais já estabelecidas e as instituições que as sustentam tendem a resistir a mudanças, mesmo que não estejam cumprindo o papel que delas se espera”. No momento em que a Venezuela se engaja em um processo de transformação econômica, política, e social, é imperativo reconhecer que as antigas instituições ainda não foram transmutadas em agentes da nova etapa de desenvolvimento do país. Ao contrário, tendem a resistir à mudança pela tendência à inércia que vigora na burocracia estatal. Portanto, muitas das novas ações governamentais buscaram se concretizar por caminhos alternativos, e várias foram bem-sucedidas apesar da improvisação institucional. Entretanto, o risco que se corre é não construir um aparato institucional que consolide e formalize as mudanças impedindo que ocorram regressões no futuro com a mudança nos atores políticos. 5 Dentre as mudanças introduzidas pelo governo Hugo Chávez na Venezuela, algumas das mais significativas ocorrem no âmbito da PDVSA. As modificações nas normas do setor petroleiro e na atuação da PDVSA começaram logo no início do governo Chávez, mas se acentuaram após o “Paro Petrolero” (dezembro/2002-fevrreiro/2003). O “Paro Petrolero” mostrou o quanto era real a ideia da PDVSA como um Estado paralelo, e sua desconexão das políticas governamentais. O tamanho da PDVSA em relação ao Estado venezuelano aliado às práticas administrativas e gerenciais e às políticas neoliberais tornaram a PDVSA, um ente político com uma agenda própria e com grande resistência interna a se submeter às políticas definidas pelo Estado, pelo governo federal, que é o seu controlador. Neste quadro, ao visar modificar a estrutura econômica e social da Venezuela, torna-se evidente que era urgente modificar a forma de atuação da PDVSA e colocá-la a serviço do desenvolvimento da nação, e consequentemente, da revolução bolivariana. Para tanto o governo do presidente Hugo Chávez interrompe e redireciona a internacionalização da PDVSA que até a IV República ocorria para aumentar a autonomia da empresa em relação ao Estado venezuelano. Amplia o leque de atividades não petroleiras a serem desenvolvidas pela PDVSA almejando uma expansão de novos setores econômicos que efetivem a “siembra del petroleo” e uma ampliação da ação social da PDVSA. Segundo declaração do Ministro do Poder Popular para Energia e Petróleo, Rafael Ramírez (2008, p.51)2, o Estado só conseguiu tomar conhecimentos dos convênios, dos contratos operativos, dos documentos da PDVSA em 2004 após a crise do “Paro Petrolero” e vários dos documentos não foram conseguidos através da PDVSA, mas via pressão sobre as empresas estrangeiras. De acordo com o ministro Rafael Ramírez, este período inicial, 1999-2004, foi o período de luta para abrir a caixa preta que era a PDVSA, neste período, em suas palavras, “Denunciamos de manera reiterada la caja negra que era PDVSA, una caja gigantesca que estaba de espaldas a la nación, a lós mecanismos de control de los distintos poderes y al interés de la nación.” E “Una vez derrotado el sabotaje en la industria petrolera, restablecidos los niveles operativos y todas las condiciones para 2 http://www.minci.gob.ve/libros-folletos/6/455582/?desc=la_pdvsa_nacionalistaweb.pdf 6 seguir en el desarrollo de nuestra política petrolera, en las operaciones, en las actividades normales de exploración, producción, procesamiento, refinación y exportación, entonces el Estado venezolano tuvo la posibilidad de comenzar a trabajar Pdvsa, la nueva Pdvsa” (RAMÍREZ, 2008, p.52)3. A constituição da nova PDVSA culmina com o processo de nacionalização da indústria petroleira na Faixa do Orinoco e a constituição das empresas mistas. Neste percurso de construção da nova PDVSA pôs-se fim aos convênios operativos que tornaram os contratos e as concessões um assunto apenas da PDVSA e das prestadoras de serviço. Definiu-se que as controvérsias entre o Estado venezuelano e a indústria petroleira não devem ser resolvidas por arbitragem internacional ou em tribunais no exterior, mas pela própria justiça venezuelana. Introduziu-se modificações no regime fiscal ao qual estava submetida a indústria petroleira com o aumento das taxas pagas pelo setor ao Estado. Esta mudança fiscal teve impacto especialmente na Faixa do Orinoco, pois para estimular a exploração do petróleo extra-pesado os governos anteriores haviam feito várias concessões às empresas estrangeiras. Também se abandonou a estratégia de tratar o petróleo da Faixa do Orinoco como betume, e retomou o fortalecimento dos laços da Venezuela com a OPEP, e atuou com a OPEP para elevar o preço do petróleo no mercado mundial. Para contribuir com o desenvolvimento da Nação é preciso que a PDVSA se insira nos Planos Nacionais de Desenvolvimento. No período do Plano de Desarrollo Económico y Social de la Nación 2001 -2007, a PDVSA estava ainda iniciando o seu processo de adequação aos objetivos sociais e econômicos postulados pelo governo bolivariano, e, portanto, é compreensível que não tenha havido uma integração entre os objetivos estratégicos do Estado e a atuação da PDVSA. Agora com a definição dentro do Projeto Nacional Plano Simon Bolívar – “Lineas Generales del Plan de Desarrollo Económico y Social de la Nación 20072013”, seria fundamental que a atuação da PDVSA caminhe pari passu com a estratégia nacional de desenvolvimento. As diretrizes que orientam o Plano de Desenvolvimento 2007-2013 são: 1. construção de uma nova ética socialista; 3 http://www.minci.gob.ve/libros-folletos/6/455582/?desc=la_pdvsa_nacionalistaweb.pdf 7 2. buscar um aumento da igualdade social que permita a “suprema felicidade social”, expressão de Simón Bolívar; 3. consolidação de uma democracia protagônica e revolucionária; 4. construção de um modelo produtivo socialista; construção de uma nova geopolítica nacional através de um desenvolvimento territorial desconcentrado; 5. afirmação da Venezuela como uma potência energética mundial e usar os recursos petrolíferos para promover a integração regional e mundial; 6. Atuar para a construção de um mundo multipolar, de uma nova geopolítica internacional. Para atender às novas demandas do governo bolivariano, a PDVSA está diversificando suas atividades não petroleiras e ao mesmo tempo define novos planos de expansão petroleira e gasífera, o Proyecto Orinoco Magna Reserva, Proyecto Delta do Caribe Oriental para área gasífera do Golfo de Pária no Estado Sucre. Como projeto não petroleiro para a Faixa del Orinoco, a PDVSA desenvolve o Proyecto Socialista del Orinoco (PSO). Os três projetos se inserem dentro do Plan Siembra Petrolera, que projeta a visão da PDVSA sobre o desenvolvimento integral do país4. Identifica-se a criação de subsidiárias da PDVSA com diferentes finalidades após o governo ter conseguido reafirmar seu controle sobre a empresa e impor diretrizes para a atuação da empresa: a) As atividades não petroleiras ocorrem através das seguintes subsidiárias: PDVSA Agrícola (2007); PDVAL (2008, no momento não é subsidiária da PDVSA, mas opera com ela); PDVSA Industrial (2007); PDVSA Desarrollos Urbanos (2008); Grupo Lácteo los Andes (2008); b) Atividades de apoio ao negócio petroleiro: PDVSA Serviços (2007); PDVSA Ingeniería y Construcción (2008); PDVSA Naval (2008) c) Atividade petroleira com finalidade social: PDVSA Gas Comunal (2007) d) Atividade petroleira visando a cooperação internacional: PDVSA América (2006), a partir da qual se desenvolve outro conjunto de projetos, sendo o principal o projeto da Petrocaribe. 4 http://www.pdvsa.com/index.php?tpl=interface.sp/design/readmenu.tpl.html&newsid_obj_id=522&ne wsid_temas=32 8 Além da criação de subsidiárias, a PDVSA atuou para o desenvolvimento social através do apoio a Programas Sociais e Planos de Inversões Sociais e às Missões (Ribas, Alimentación, Barrio Adentro, Milagro, Sucre, Vivienda, Robinson, etc.). Em 2006, a junta diretiva da PDVSA aprovou que 10% do montante investido em obras e projetos petroleiros de todas as suas filiais sejam destinados ao desenvolvimento social visando a “siembra del petróleo”. Neste caso, investimento em desenvolvimento social pode significar tanto o gasto em educação, em saúde quanto o gasto na construção de estradas, da infraestrutura econômica e apoio à economia social. A PDVSA também destina recursos para o FONDEN (Fondo de Desarrollo Social), Fondo para el Desarrollo Económico y Social del País (FONDESPA), entre outros. Falando sobre a política industrial, Suzigan e Furtado (2010, p. 12) afirmam: A questão política desdobra-se em duas: em primeiro lugar, e acima de tudo, a adoção de uma política industrial como estratégia de desenvolvimento deve ser objeto de decisão política. Em segundo lugar, a estratégia deve ser comandada por uma liderança política incontestável. Rodrik (2004, p.19-20) sugere que seja um ministro de Estado, o vicepresidente ou mesmo o próprio presidente da República. Isto colocaria a política industrial no vértice da política econômica, asseguraria a articulação das instituições executoras e possibilitaria melhor coordenação das ações. É exatamente o caso em questão na Venezuela, projetos centrais para o desenvolvimento nacional não podem ficar restritos ao interior de uma empresa, ainda que seja uma empresa grande e forte como a PDVSA, é preciso levar os planos de desenvolvimento para o centro do Estado. E neste sentido, a viabilidade dos projetos não petroleiros seria maior se eles fossem alocados institucionalmente no âmbito da Vice-presidência de Desenvolvimento Territorial. É neste aspecto que a cooperação entre o Brasil e a Venezuela pode colaborar com o desenvolvimento do país vizinho, apontar caminhos institucionais que foram utilizados no Brasil e que podem ser adaptadas para a realidade venezuelana. Ademais de outras relações estabelecidas com outros organismos governamentais do país, Embrapa, Caixa e Ipea possuem um acordo com a PDVSA. A existência dos acordos com a PDVSA reflete não apenas a importância da empresa que controla o setor mais importante da economia nacional, mas particularmente o fato da PDVSA ter se tornado o principal instrumento das políticas públicas estatais venezuelanas. 9 A transferência de responsabilidades para PDVSA decorre de três elementos: primeiro, o aumento de recursos disponíveis para a empresa em função da elevação do preço internacional do petróleo desde que Chávez assumiu; segundo, a diretriz do governo de fortalecer o impacto das atividades da empresa sobre a sociedade, fazer com que a maioria da sociedade se beneficie dos lucros auferidos pela empresa; terceiro, a maior capilaridade da PDVSA em todo território nacional e melhor organização e eficiência para uma ação social que produza resultados rápidos. Então, ao lado da política de saúde levada a cabo pelo Ministério da Saúde, há as ações patrocinadas pela PDVSA, o mesmo para a área educacional e em relação às políticas sociais de um modo geral. Por exemplo, através da PDVSA, o governo implementou o programa PDVAL de alimentos vendidos a preços muito baixo para a população. A PDVSA também assumiu o controle de empresas produtoras de leite para garantir o abastecimento por preços acessíveis à população de baixa renda. Foi criada uma subsidiária, PDVSA Agrícola, para apoiar o aumento da produção agrícola nacional. Enquanto o Ministério de Agricultura e Terras segue uma política voltada para os pequenos produtores rurais, a PDVSA Agrícola aposta na produção em larga escala. Então tem-se dois organismos estatais atuando com diretrizes distintas. A articulação entre diferentes organismos governamentais e especialmente entre a PDVSA e o Estado venezuelano não é uma tradição do país. Antes de Chávez, a PDVSA era considerada uma caixa-preta e mantinha isolada mesmo do ministério responsável pelo controle da atividade petroleira. Ao contrário, as diretrizes do ministério e do Estado eram abertamente ignoradas, por exemplo, na questão da atuação no âmbito da OPEP para sustentar o preço internacional do petróleo e mesmo a internacionalização da empresa foi uma forma de transferir menos recursos para o Estado venezuelano. Outro exemplo recente durante o governo Hugo Chávez foi a criação da PDVSA Naval, subsidiária da PDVSA para o desenvolvimento da indústria naval do país para substituir a frota de navios arrendada pela empresa por navios próprios produzidos na Venezuela. É um objetivo estratégico e, por isso, a PDVSA Naval está construindo um grande estaleiro em Araya no estado de Sucre com financiamento 10 do BNDES e obras realizadas pela Andrade Gutierrez. Entretanto, o projeto de indústria naval não se articula com uma estratégia de desenvolvimento do Estado ou com as políticas desenvolvidas pelo Ministério de Indústria, ou de Comércio ou ainda de Ciência e Tecnologia. Nesse sentido, um importante aspecto da cooperação Brasil-Venezuela é transferir a experiência de operação de políticas públicas através de ações coordenadas por diferentes ministérios, estatais e outros organismos ligados ao governo. Dentro desse aspecto, a apresentação das políticas setoriais do Plano de Desenvolvimento Produtivo do governo Lula no qual se definia as metas gerais e os instrumentos a serem geridos pelas diferentes entidades governamentais foi muito bem recebido pelos venezuelanos tanto na PDVSA quanto nos ministérios. Todos reconhecem a importância dessa coordenação. E no caso particular do Ipea, ele colocou em contato diferentes entidades do governo venezuelano que pouco conversavam sobre as políticas que desenvolviam. O modelo de gestão e monitoramento do PAC também agrega novas possibilidades que podem ser aproveitadas na gestão das políticas públicas venezuelanas. As figuras abaixo ilustram o modelo de gestão e monitoramento do PAC e da Política de Desenvolvimento Produtivo durante o governo Lula: Fonte: http://www.governoeletronico.gov.br/anexos/monitoramento-do-programa-de-aceleracao-docrescimento-pac 11 Indústria Naval:instrumentos existentes Desafios Apoiar consolidação empresarial e modernização da estrutura industrial Fortalecer a Cadeia Produtiva Instrumentos FMM: implantação, expansão, modernização e aquisição de equipamentos Petrobras/Transpetro: programa de modernização e expansão da frota BNDES: FINEM FINAME MCT: centro de excelência em P,D&I em CN M. Transportes: Investimentos em hidrovias Petrobras: Programa de modernização da frota de apoio marítimo INMETRO ABNT: normalização e certificação Lei de Inovação e Lei do Bem Ampliar investimento em P,D&I e qualificação profissional BNDES: FINEM FINAME SEBRAE: capacitação de fornecedores BNDES: linhas de inovação Senai: treinamento INPI: capacitação em propriedade intelectual MDIC/ABDI/BNDES: Câmara de Desenvolvimento da Indústria Naval ANTAQ: regulação da marinha mercante MME/Prominp: Programa de Modernização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural FINEP: subvenção econômica e financiamento para P,D&I INPI: gestão da propriedade intelectual SEAP: Profrota Pesqueira FMM: formação de recursos humanos MDIC ABDI: GTP APL Petrobras Transpetro: programa de modernização e expansão da frota M. Transportes: Programa Nacional de Logística e Transportes FINEP CT-Aqua: fundo setorial MME/Prominp: Programa de Modernização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural INMETRO: TIB 151 3 COOPERAÇÃO BOLÍVAR-RORAIMA O Roraima tem sido fortemente beneficiada pelo processo de aproximação Brasil-Venezuela, e a partir disto, inovou inaugurando um padrão de relações diretas para cooperação com o estado de Bolívar na Venezuela. Um dos principais marcos das relações Brasil-Venezuela para Roraima foi o acordo firmado em 1998, nos governos Rafael Caldera e Fernando Henrique Cardoso, para a construção de uma linha de transmissão entre Guri e Boa Vista, que foi inaugurada em 2001 nos governos Hugo Chávez e Fernando Henrique Cardoso. A integração da infraestrutura elétrica resolveu um importante problema do estado Roraima, cuja solução no curto prazo era inviável para o Brasil sem este acordo com a Venezuela. 12 Outro ganho obtido por Roraima pela aproximação entre os dois países foi a interconexão através de cabos de fibra ótica, realizada já sob o governo Lula, e que se estende até Manaus. Para Roraima significou não apenas acesso mais rápido à informação disponível na internet como fortalecimento da infraestrutura necessária para receber investimentos de empresas de maior porte. Para Santos, em termos de infraestrutura econômica, a faixa de fronteira Roraima-Bolívar dispõe de oferta de energia elétrica com potencial para atender todas as suas comunidades; rodovias pavimentadas que garantem fluxo seguro e regular de cargas e passageiros, apesar de algumas restrições físicas na parte brasileira e de um sistema de comunicações que supre com razoável 5 eficiência toda a faixa de fronteira em foco . As iniciativas na região de fronteira e entre os estados de Roraima e Bolívar ocorrem num contexto no qual, no governo Lula, as relações entre os dois países foram elevadas a um novo patamar com o aumento das exportações brasileiras, com a crescente presença de empresas brasileiras na Venezuela especialmente na construção civil, com o aumento dos acordos de cooperação bilateral, com a realização dos encontros presidenciais bilaterais trimestrais, e o ingresso da Venezuela no Mercosul. A intensificação das relações entre Brasil e Venezuela, e a estruturação de uma ação estratégica para articular a integração dos dois países e uma atuação mais coordenada na América do Sul, e mais importante ainda, o ingresso (ainda em tramitação) da Venezuela no Mercosul, tornam a região fronteiriça Brasil-Venezuela um tema premente na agenda bilateral e de integração sul-americana. No Comunicado Conjunto sobre a Aliança Estratégica entre Brasil e Venezuela de 2005, os presidentes afirmam que “A Amazônia é uma região de extraordinária riqueza, compartilhada por países da América do Sul que têm o dever de desenvolvê-la economicamente, de forma soberana e sustentável, em estreita cooperação nos âmbitos bilateral e regional, incluindo a organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA)” 6 . Mas não se avança em nenhuma agenda concreta para a Amazônia brasileira e venezuelana. Entretanto, no caso da fronteira 5 http://www.ufrr.br/coordenadoria-de-imprensa/artigos/em-que-medida-a-integracao-no-contextoamazonico-e-uma-opcao-realmente-necessaria-e-factivel 6 http://www.itamaraty.gov.br/o-ministerio/conheca-o-ministerio/america-do-sul/departamento-daamerica-do-sul-ii-das-ii/venezuela/comunicados-conjuntos-820846550497/comunicado-conjuntoalianca-estrategica-brasil-venezuela-e-declaracao-dos-governos-do-brasil-e-da-venezuelaimplementacao-da-alianca-estrategica 13 Roraima-Bolívar, o programa de iniciativas visando implementar a aliança estratégica, menciona a elevação da aduana de Santa Elena de Uairén da categoria de secundária para principal pela Venezuela para incentivar o comércio binacional. Apesar dessa medida já ter sido adotada, persistem os problemas na aduana venezuelana na fronteira entre Pacaraima e Santa Elena de Uairén, pois a liberação de cargas continua dependendo das autoridades em Caracas o que provoca grandes atrasos na entrega das mercadorias. A corrupção também é um problema presente e que motiva a geração de atrasos na liberação dos caminhões. Desde o Comunicado Conjunto sobre a Aliança Estratégica em 2005, os projetos bilaterais já se adensaram e a região de fronteira é um foco permanente de atenção nos Comunicados Conjuntos dos encontros presidenciais trimestrais, mencionando especialmente a instalação de agência Caixa Econômica Federal em Pacaraima e do Banco da Venezuela em Santa Elena do Uairén dentro de uma estratégia não apenas para fortalecer os vínculos comerciais e econômicos na região de fronteira, mas especialmente atender a demanda da população por acesso facilitado ao sistema bancário e também incrementar a cooperação Brasil-Venezuela no processo de bancarização. A questão da bancarização é um elemento importante da cooperação bilateral e fronteiriça, porque na Venezuela ainda há muitas restrições para a população de baixa renda ter acesso ao sistema bancário, não apenas pelas exigências feitas de renda como de cartas de recomendação de outros clientes. Nesse sentido, a bancarização seria um passo para políticas de ação social como as implementadas no Brasil através da facilitação do crédito, disponibilização de recursos dos programas sociais através da rede bancária para as pessoas necessitadas etc. Os avanços conseguidos através da cooperação entre a Caixa e o Banco da Venezuela reforçam a necessidade de se estruturar políticas específicas para a região uma vez que a integração produtiva, comercial, de infraestrutura, cultural não ocorrerá ignorando a região de fronteira. Sem adensar as relações econômicas, comerciais na fronteira que possam sustentar e propagar a integração entre o Norte do Brasil e o Sul da Venezuela corre-se o risco da integração BrasilVenezuela ficar reduzida à aliança política e ao comércio exterior já estruturado entre os dois ao longo do governo Lula, sendo que a sustentação desse fluxo comercial está sujeito às mudanças no clima de negócios do comércio internacional e à política interna venezuelana. 14 Deve-se destacar ainda que ao fortalecer a integração no marco fronteiriço, Pacaraima-Santa Elena do Uairén também se visa uma integração mais profunda e estruturada entre Roraima e o Estado Bolívar. Em termos de política de desenvolvimento, esta articulação pode se dar através da convergência da política voltada para os Arranjos Produtivos Locais no Brasil e os Distritos Motores de Desenvolvimento na Venezuela. Identificar os setores econômicos que poderiam se desenvolver dos dois lados da fronteira e formar uma cadeia produtiva integrada seria o estudo básico do qual se partiria para definição de políticas de desenvolvimento regional comuns. No caso venezuelano, a Vice-Presidência de Desenvolvimento Territorial está realizando os estudos para decretar a criação do Distrito Motor de Desenvolvimento (DMD) Santa Elena de Uirén –Ikabarú. Dentro da política venezuelana, as atividades econômicas na região deverão ser impulsionadas através dos conselhos comunais através do fortalecimento da economia popular (CORAGIO, 2004), mas ainda não há uma definição dos setores econômicos específicos a serem desenvolvidos, inclusive porque haverá a criação de 32 DMD, e este não é prioridade. No caso de Roraima, tem-se os seguintes APLs implantados fruticultura, pecuária de corte e leite, apicultura, piscicultura, madeira e móveis, grãos, e mandiocultura 7 . Mas aparentemente apenas o plano de desenvolvimento do APL de madeira e móveis foi desenvolvido8. As relações sistemáticas estabelecidas entre o governo de Roraima e o governo do Estado Bolívar ressaltam a existência de uma demanda por políticas de integração voltadas especificamente para a região de fronteiras. A importância das relações paradiplomáticas estabelecidas entre o estado de Roraima e o Estado Bolívar é ressaltada inclusive em alguns dos Comunicados Conjuntos resultantes dos encontros presidenciais. Em 27 de junho de 2008, os presidentes fazem referência ao VII encontro dos governadores dos dois estados com “com o objetivo de estreitar os laços de cooperação existentes e impulsionar a integração entre ambos Estados”9. 7 http://pab.mdic.gov.br/arquivos/dwnl_1198691981.pdf http://www.desenvolvimento.gov.br/sitio/interna/interna.php?area=2&menu=3102&refr=3101 http://www.desenvolvimento.gov.br/arquivos/dwnl_1248265984.pdf 9 http://www.itamaraty.gov.br/o-ministerio/conheca-o-ministerio/america-do-sul/departamento-daamerica-do-sul-ii-das-ii/venezuela/comunicados-conjuntos-820846550497/visita-do-presidente-luizinacio-lula-da-silva-a-364512985719 8 15 Note-se que hoje a agenda de integração entre Brasil e Venezuela via articulação entre Roraima e o estado Bolívar transcende a questão partidária. A iniciativa encontra apoio no governo do Estado, do PSDB, no senador Romero Jucá, do PMDB, e em deputados de diferentes partidos. O governador de Roraima José Anchieta (PSDB) ressalta este aspecto, escrevendo sobre o tema no jornal Folha de Boa Vista de 04 de maio de 2010, O documento firmado pelos governos dos dois estados trata ainda da necessidade de celebração de acordo para regular o movimento de turistas (corredor turístico Amazonas-Caribe), da regionalização de voos comerciais entre Boa Vista e Puerto Ordaz, com escala em Santa Elena de Uairén, e da aplicação do sistema de pagamento em moeda local, a exemplo da relação que existe hoje entre Brasil e Argentina”10. E ainda acrescenta, O incremento das relações com a Venezuela não é assunto para os governos do momento. Trata-se de uma agenda positiva, entre os dois países, que deve perdurar, independentemente de quem venha governar as unidades federativas e os respectivos países, como bem acentuou o presidente Chávez, em entrevista à Rede TV (TV Boa Vista), na noite do último domingo 11. E conclui o artigo afirmando, Brasil e Venezuela estão lado a lado, fisicamente, não existe conveniência qualquer de que fiquem separados. Se a geografia nos uniu, não será a burocracia a nos separar. Acima de tudo, os interesses dos nossos povos. Na mesma linha de defesa da integração entre Roraima e Venezuela, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo no Senado, defende o estreitamento dos laços econômicos entre a região Norte do Brasil e a Venezuela afirmando, Se aliarmos o potencial de produção de alimentos de Roraima, a capacidade de industrialização da Zona Franca de Manaus, com o fornecimento de calcário, fertilizantes e outros insumos agrícolas existentes na Venezuela, poderemos produzir e comprar, num círculo virtuoso de economia positiva 12. 10 http://www.portal.rr.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1772&Itemid=165 http://www.portal.rr.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1772&Itemid=165 11 12 http://www.pmdb-rr.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=30:a-hora-e-avez-de-roraima&catid=6:artigos&Itemid=23 16 Mas também aponta um problema identificado não apenas na agenda política dos dois países, mas também pelos cidadãos da fronteira que transitam pela região. Entre Santa Elena de Uairen e Puerto La Cruz, existem hoje 11 alcabalas fazendo revistas e paradas desnecessárias aos turistas, uma atrás da outra, gerando um processo de desmotivação e de bloqueio de demanda no setor do turismo, exatamente uma área que precisa ser fortalecida em Roraima e na Venezuela13. Além de demandar uma facilitação no trânsito de pessoas com mercadorias tornando a fiscalização mais eficiente e menos burocrática, o senador propõe ainda a formação de um polo turístico integrando a Venezuela e o Norte do Brasil14. O turismo no Parque Nacional Canaima, na Venezuela, já é significativo, mas os pacotes das agências de turismo não incluem o lado brasileiro da fronteira. A questão é integrar o estado de Roraima nesse fluxo através da infraestrutura turística necessária e com programas de estímulos específicos. De fato, o setor de turismo, no curto prazo, é provavelmente o setor no qual se mostra mais viável a criação de um arranjo produtivo binacional. Inclusive, o Comunicado Conjunto do encontro presidencial de 06 de junho de 2011 entre os presidentes Dilma Rousseff e Hugo Chávez menciona um plano de desenvolvimento integrado entre o Norte do Brasil e a Venezuela. E saindo da agenda política binacional para a realidade concreta dos cidadãos, a realidade que pode ser modificada por um conjunto de ações integradas de desenvolvimento é a região de fronteira, entendida num sentido mais amplo, o eixo Santa Elena de Uairén-Boa Vista. 13 http://www.pmdb-rr.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=30:a-hora-e-a-vez-deroraima&catid=6:artigos&Itemid=23 14 “Com o turismo, nossas perspectivas se multiplicam. Imaginem as riquezas que temos nessa região toda, partindo da Venezuela, desde a Ilha Margarita, o Salto Angel, Monte Roraima, Gran Sabana, Tepequém, nossos igarapés e cachoeiras, Rio Branco, Manaus e a floresta amazônica. Pela Guiana, todo o Caribe, a partir de Georgetown. Temos uma biodiversidade rara, fauna e flora exclusivas e pouco exploradas, além das reservas indígenas e inúmeros lugares paradisíacos e preservados a serem visitados.” Disponível em: http://www.pmdb-rr.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=31:a-hora-e-a-vez-deroraima-parte-2&catid=6:artigos&Itemid=23 17 No âmbito estadual também ocorrem reuniões periódicas entre os governadores dos dois estados, Roraima e Bolívar, seja para marcar um posicionamento político de aproximação entre as partes (e eventualmente pressionar os governos nacionais em questões comuns), seja para firmar acordos de cooperação entre os dois governos estudais. Evidentemente, estes acordos não possuem valor jurídico perante o direito internacional, os dois governos estaduais têm conhecimento disso, entretanto, entendem que isso não é relevante, o importante é a disposição das partes em cumprir o acordado, portanto, nada além da velha crença no pacta sunt servanta. E evidentemente os acordos firmados não contrariam nem a legislação interna dos dois países nem geram um comprometimento para os Estados Nacionais. E para não gerar maiores problemas com os governos centrais nomeiam os acordos celebrados em geral como memorandos de entendimento. Dentro os acordos firmados há: Memorandum de Entendimento de Cooperação Técnica e Transferência Tecnológica na Área Agrícola (outubro/2007), Memorandum de Entendimento de Cooperação Técnica e Transferência Tecnológica na Área de Saúde (outubro/2007), Memorandum de Entendimento de Cooperação Técnica e Transferência Tecnológica na Área de Segurança Pública (outubro/2007), Termo de Cooperação Científica e Tecnológica em Matéria de Educação (maio/2006), sob o qual foi firmado o Convênio Marco de Cooperação Interinstitucional entre a Universidade Estadual de Roraima e a Universidad Nacional Experimental de Guayana. O Termo de Cooperação Científica e Tecnológica em Matéria de Educação estabelece a reserva de 20 vagas para os venezuelanos nos cursos da Universidade Estadual de Roraima, especialmente, turismo, comércio exterior e computação. Também cria um programa de professor visitante com 5 vagas para venezuelanos no Brasil e vice-versa, um programa de doutorado binacional em gestão ambiental e desenvolvimento sustentável. E reserva cinco vagas para estudantes venezuelanos no Programa de Doutorado em Desenvolvimento Sustentável e Relações Internacionais mantido pela FLACSO, UnB, UFRR e o governo do estado de Roraima. 18 O Memorandum de Entendimento de Cooperação Técnica e Transferência Tecnológica na Área de Segurança Pública visa o treinamento e capacitação do pessoal da área. E indica como cursos demandados pelo estado de Bolívar: promotor de polícia comunitária, técnicas de investigação criminosa, multiplicador de polícia comunitária, gerenciamento de crise, direitos humanos, defesa pessoal, negociação, inteligência policial, táticas especiais. Enquanto, o estado de Roraima aponta o interesse nos cursos: sala situacional e gestão de risco, atendimento de emergências com materiais perigosos, busca e resgate em selva, evacuações aero médicas em aviões pressurizados e não pressurizados, suporte de vida pré-hospitalar em pacientes traumatizados. O Memorandum de Entendimento de Cooperação Técnica e Transferência Tecnológica na Área de Saúde além do intercâmbio de experiências na prevenção, controle e erradicação de doenças endêmicas e epidemiológicas, prevê campanhas bilíngues realizadas de maneira conjunta para promover a saúde e prevenir as doenças endêmicas, e ainda o desenho e implementação de “um sistema de referência e contrarreferência único em ambos os idiomas, que contenha os dados dos pacientes atendidos por ambos estados”. Um alvo específico da cooperação na área de saúde é a comunidade indígena da área de fronteira que pode transitar pelos dois países. Nesse ponto reside a maior polêmica em relação ao processo de integração fronteiriça. Ambos os lados da fronteira são ocupados por comunidades indígenas. Do lado do Brasil, temos os ianomâmis, os Macuxis, os Wapichanas e os Ingaricós. Na fronteira venezuelana, temos os Ianomâmis e os Pemóns. Essas comunidades interagem nessa faixa de fronteira há séculos, independentemente das normas dos respectivos estados e apesar dos choques que tiveram com as frentes de expansão: militares e funcionários públicos civis (Forte São Joaquim), criadores de gado (Fazendas Reais e criatórios particulares), garimpeiros (diamante e ouro no rio Quinô, cassiterita e ouro no Santa Rosa e Surucucus), pequenos agricultores e ultimamente os arrozeiros15. 15 http://www.ufrr.br/coordenadoria-de-imprensa/artigos/em-que-medida-a-integracao-no-contextoamazonico-e-uma-opcao-realmente-necessaria-e-factivel 19 A questão indígena, portanto, deve ser considerada em qualquer programa de cooperação e desenvolvimento, inclusive pelas diferenças nas legislações dos dois países. No caso da Venezuela, há uma política definida de ocupação do território e presença militar para aumentar o controle do Estado na região, e aos indígenas não estão reservadas apenas as atividades econômicas tradicionais das comunidades, podem produzir para o mercado e inclusive explorar o negócio do turismo, por exemplo, pousadas no interior do Parque Nacional Canaima. No caso brasileiro, a presença militar e de outras instituições, exceto a Funai, é mais difícil por causa da legislação brasileira sobre as reservas indígenas. 4 À GUISA DE CONCLUSÃO O artigo mostrou as características institucionais do Estado venezuelano e algumas dificuldades enfrentadas no processo de transformação social que se tenta acelerar através da utilização da estatal petroleira, PDVSA. A busca de resultados rápidos na área social justifica e legitima esta utilização, entretanto, este processo gera gargalos institucionais que pode comprometer o processo de reconstrução do Estado venezuelano. E neste aspecto, a cooperação BrasilVenezuela pode agregar elementos significativos, especialmente, a experiência brasileira de coordenação dos diferentes organismos do governo federal e coordenação intergovernamental das diferentes instâncias de governo. Dentro desse marco de cooperação aprofundamos na análise do caso Roraima-Bolívar, mostrando como o estado de Roraima foi beneficiado pela cooperação entre os governos nacionais dos dois países. E ao mesmo tempo procurou estabelecer relações diretas com o estado de Bolívar para cooperar em políticas públicas e ações na fronteira tanto na área de educação quanto de segurança. 20 5 REFERÊNCIAS BANKO, Catalina. De la descentralización a la “nueva geometria del poder”. Revista Venezolana de Economía y Ciencias Sociales, Caracas, v.14, n.2, pp.167-184, 2008. BOTELHO, Antônio José. Redesenhando o Projeto ZFM: um estado de alerta (uma década depois). Manaus, Valer, 2006. CANO, Wilson; SILVA, Ana Lucia Gonçalves da. 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