PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ' TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA REGISTRADO(A) SOB N° ACÓRDÃO Vistos, relatados e lllllllllllllllllllllllllllllllllll discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL COM REVISÃO n° 729.626-5/0-00, da Comarca de SÃO PAULO, em que é recorrente o JUÍZO "EX OFFICIO", sendo apelantes MARCÍLIA DE ARAÚJO GUILGER e OUTROS E PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO sendo apelado MINISTÉRIO PÚBLICO: ACORDAM, Tribunal de em Justiça Câmara do Especial Estado de do Meio Ambiente São Paulo, proferir do a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DOS RÉUS E DERAM PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DP MUNICIPALIDADE, V.U.", de conformidade com o voto do Relator, teve a que integra este acórdão. O julgamento participação Desembargadores AGUILAR CORTEZ e J.G.JACOBINA RABELLO. São Paulo, 10 de abril de 2008. REGINA CAPISTRANO Presidente e Relatora dos PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente Voto n° 7546. Apelação com Revisão n° 729.626.5/0-00 - São Paulo - 2 a Vara da Fazenda Pública. Apelantes: Marcília de Araújo Guilger e outros. Apelado: Ministério Público do Estado de São Paulo. Ementa: AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO E LOTEAMENTO CLANDESTINO DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS - INÉPCIA DA PEÇA INICIAL AFASTADA. Contendo a peça inicial todos os requisitos legais hábeis a delinear a lide, indicando as partes, os atos e as omissões de cada qual, descrevendo o local, bem assim a forma dos danos urbanísticos e ambientais, não pode ser qualificada de inepta, até porque permitiu ampla defesa. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO E LOTEAMENTO CLANDESTINO DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO E INTERESSE DE AGIR. O pedido formulado é amparado pelo ordenamento jurídico e mostra-se possível. O interesse de agir, seguindo linha lógica de raciocínio, é evidente, porquanto outra alternativa não restava ao autor da ação para obter a regularização do loteamento e indenização r\ 1 RZCS (\^\J WJ Apel ti Rev \ 729 626 5'0-C0 PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente pelos danos urbanísticos e ambientais causados pelos co-réus. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO E LOTEAMENTO CLANDESTINO - DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS LEGITIMIDADE ATIVA "AD CAUSAM" DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Ao Parquet compete defender os interesses da população e da comunidade relativamente à preservação do meio ambiente, seja ele natural ou urbano. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO E LOTEAMENTO CLANDESTINO - DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS LEGITIMIDADE PASSIVA DOS CO-RÉUS LOTEADORES / PROPRIETÁRIOS DA GLEBA QUE AUFERIRAM LUCROS COM O FATO. Respondem objetivamente pelo loteamento clandestino os proprietários da gleba, que a receberam e continuam na prática ilegal, vendendo lotes e auferindo lucros. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO E LOTEAMENTO CLANDESTINO - DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS LEGITIMIDADE PASSIVA "AD CAUSAM" DA MUNICIPALIDADE. O Município pode ser responsabilizado objetivamente, na seara ambiental, tanto se for causador direto do dano, quanto na hipótese em que a Administração Pública tem o dever de fiscalizar as atividades desenvolvidas pelos particulares, não somente quanto às atividades existentes, mas como no caso dos autos, previamente à instalação e 2 Apel C Rev n° 729 6 PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente implantação de unidades e atividades cujo funcionamento e local em que situadas causarão degradação ambiental. "In casu", a omissão das autoridades públicas municipais contribuiu para o estabelecimento de fato do loteamento irregular, permitindo os danos ambientais, urbanísticos e ao consumidor, cujas proporções são objeto da vertente ação civil pública. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO E LOTEAMENTO CLANDESTINO - DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS COMPROVADOS. A implantação de parcelamento irregular, sem os aparelhamentos públicos necessários previamente à venda dos lotes (falta de pavimentação de ruas, inexistência de rede coletora de esgoto, lançamento de dejetos "in natura" diretamente em curso d'água) causa inquestionável dano ambiental e urbanístico, que deve ser reparado na forma possível, concretamente ou mediante indenização. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL - VERBA HONORÁRIA INCABÍVEL EM SENDO O AUTOR DA AÇÃO O MINISTÉRIO PÚBLICO. Descabe a condenação em verba honorária quando o autor da ação é o Ministério Público. RECURSO DOS CO-RÉUS AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO; RECURSO DA MUNICIPALIDADE AO QUAL SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO. 3 Apel d Rev n PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente Trata-se de recurso de apelação interposto contra a r. decisão de fls. 662/676, cujo relatório ora é adotado, pela qual foi afastada a preliminar de inépcia da inicial, havendo narração expressa dos fatos pelos quais o autor entende que a Municipalidade é responsável pelo parcelamento clandestino denominado Jardim Zilda II, formulando pedido certo de reparação de danos ambientais e urbanísticos, havendo interesse e possibilidade jurídica, reconhecendo também a responsabilidade dos co-réus Marcíha de Araújo Guilger e outros por serem proprietários da área e porque admitiram expressamente terem contribuído para o loteamento irregular, tendo se beneficiado da venda dos lotes. Reconhece como definitivo o dano urbanístico decorrente do loteamento irregular, considerando o local como fonte de poluição por não contar com sistema de drenagem de águas pluviais, estando o solo sujeito a erosões por não ser pavimentado e não contando com rede de coleta de esgoto, lançando clandestinamente os dejetos em um córrego existente no local Dizem os apelantes Marcília de Araújo Guilger e outros (fls. 680/692) que não são responsáveis pelos danos originados do loteamento, já que o parcelamento irregular decorreu de atos do Sr. Amaro Guilger, já falecido, em conjunto com alguma imobiliária desconhecida, sendo certo que os recorrentes são apenas herdeiros, sequer se podendo falar em dívidas superiores às forças da RZCS <v Apel c/Rev n° 729 626 SjbQO PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente herança. Alegam que a Municipalidade é a responsável em vista de sua omissão, bem assim os proprietários dos lotes, que edificaram no local sem atentar para o impacto ambiental, provocando degradação no local em que vivem. Recorre também a Municipalidade de São Paulo (fls. 695/709), insistindo que a petição inicial é inepta, está ausente o interesse de agir, impossibilidade jurídica do pedido em relação a ela, é parte passiva ilegítima "ad causam", alegando que exerceu regular Poder de Polícia administrativa, sendo da alçada exclusiva dos loteadores a obrigação de indenizar os danos ambientais e urbanísticos causados pelos parcelamentos irregulares. Alternativamente, alega que não cabe condenação em honorários advocatícios porque o autor da ação é o Ministério Público. Apelos recebidos no duplo efeito às fls. 710, vindo aos autos as contra-razões de fls. 713/722, deduzindo razões em defesa da r. decisão combatida, seguindo-se do parecer do doutor Procurador de Justiça às fls. 727/730, propugnando pelo desprovimento do recurso interposto, retirada da condenação, todavia, a verba honorária, vez que o Ministério Público não a recebe. É o sucinto relatório 5 RZCS Apel tí Rev n\729 626 5/0 00 PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente Rejeito as preliminares arguidas ao longo do processado e reiteradas em sede recursal pelos sucumbentes e, quanto ao mérito, nego provimento ao recurso dos co-réus e dou parcial provimento ao recurso interposto pela Municipalidade. Com efeito, a peça inicial não é inepta, contendo todos os requisitos legais hábeis ao válido e regular desenvolvimento da ação, indicando corretamente as partes, o pedido e seus limites, apresentando individualização da gleba em que ocorreu o parcelamento clandestino, bem assim descrevendo os fatos ocorridos, atos e omissões de cada qual. Permitiu o autor, com a peça inicial, o exercício do direito de defesa, consoante se mostra facilmente pela leitura destes quatro volumes que compõem a ação. Por outro lado, o pedido é juridicamente possível e formulado por instituição detentora de legitimidade ativa "ad causam" indiscutível, tal qual o é o Ministério Público do Estado de São Paulo, porquanto a este compete defender os interesses da população e da comunidade relativamente à preservação do meio ambiente, seja ele natural ou urbano O pedido formulado, por sua vez, é amparado pelo ordenamento jurídico, consoante entendimento torrencial e pacífico desta Colenda Câmara Especial do Meio Ambiente O interesse de agir, seguindo linha lógica de raciocínio, é evidente, porquanto outra alternativa não restava ao autor da ação 6 RZCS \ \ V ^ Apel c ; Rev n° ?2S''çka 5-'0 OC PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente para obter a regularização do loteamento e indenização pelos danos urbanísticos e ambientais causados pelos co-réus. Por seu turno, a legitimidade passiva "ad causam" dos apelantes Marcílía de Araújo Guilger e outros salta aos olhos, tanto porque confessaram a ação ao admitirem que encetaram alguns atos tendentes à implantação do parcelamento irregular, bem assim de venda de lotes, tanto porque auferiram lucros com a efetiva venda dos lotes irregulares, infringindo a lei aplicável à espécie Ademais, não colhe a pretensão de os apelantes eximirem-se da responsabilidade pelos danos ambientais causados, porquanto a responsabilidade ambiental é objetiva e "propter rem"t defluindo da coisa e seguindo-a, permitindo acionar tanto aquele que detém o domínio do bem, quanto aquele que implementou o dano concretamente. "In casu" tais figuras confundemse na pessoa dos apelantes, porquanto além de proprietários da gleba, contrataram empresa para fracionar e alienar os lotes, respondendo assim pelos atos de seus prepostos. Finalmente, inaceitável a tese de irresponsabilidade pelos danos ambientais sustentada pelos apelantes pessoas físicas em decorrência de serem herdeiros de Amaro Guilger, já falecido, porquanto estes mesmos herdeiros receberam 7 RZCS Apel c/ Rev n° 729 626 PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente propriedade e seguiram na venda dos lotes, implementando o loteamento irregular consoante eles próprios admitem, assumindo inteiramente o passivo ambiental decorrente da degradação que se iniciou e lá permaneceu No que toca à Municipalidade de São Paulo, é esta inquestionavelmente parte legítima a figurar no pólo passivo da vertente ação, respondendo igualmente pelos danos, porquanto permitiu a ocupação, deixando de fiscalizar suficientemente conforme lhe competia ou de impedir o parcelamento e desmembramento irregular Ainda que tal loteamento/parcelamento irregular tenha ocorrido em área particular, cumpria à Municipalidade a fiscalização necessária e eficiente, não somente impedindo o estabelecimento de fato do desmembramento de lotes, bem como sua comercialização, instando notar a gritante culpa "m vtgilando" pelos atos de seus funcionários Com efeito, ainda que a responsabilidade estatal em seara ambiental constitua tema de grande controvérsia, há que se admitir que, via de regra, a responsabilidade dos entes públicos - Município, neste caso concreto - independe da existência de ato ilícito, podendo ser sustentada em situações de atos lícitos que resultem em dano a particulares, instando notar que é adotada a tese, hodiernamente, do risco administrativo, em que a demonstração do RZCS Ape CRev n° 729 62^6íQ í 00 PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente elemento subjetivo não é mais exigida. Vale dizer que o Estado e o Município podem ser responsabilizados objetivamente na seara ambientai se forem os diretos causadores do dano (decorrente da implantação de obra sem os devidos estudos e cuidados tendentes a minimizar os impactos ambientais e a degradação correspondente), bem como na hipótese em que a Adminísiração Pública tem o dever de fiscalizar as atividades desenvolvidas pelos particulares, não somente quanto às atividades existentes, mas como no caso dos autos, previamente à instalação e implantação de unidades e atividades cujo funcionamento e local em que situadas causarão degradação ambiental. No caso vertente, cumpria aos entes públicos, em suas específicas esferas de competência, fiscalizar, regulamentar, equacionar e impedir a implantação do loteamento clandestino, que terminou por se formar em total desacordo com a Lei Federal n° 6.766/79, e sem qualquer espécie de infra-estrutura básica, fatos demonstrados pela falta de estudos estratégicos de ocupação, falta de pavimentação a permitir voçorocas de toda sorte, inexistência de rede coletora de esgotos e lançamento dos dejetos produzidos pela coletividade que ali se instalou em córrego d'água vizinho, sem qualquer tratamento, com evidentes danos ao meio ambiente e à saúde pública. 9 RZCS Apel c ; Rev n° 729 6Ç6 5;0 OG PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente Em termos bem claros, em certos setores da vida coletiva não pode o particular interferir a não ser através dos órgãos públicos para os quais elegeu seus representantes, a estes competindo em caráter de exclusividade o Poder de Polícia administrativa, preventiva e repressiva. Em questões ambientais, o caráter exclusivo e ingente da fiscalização pública mostra-se inafastável, decorrente até do problema crítico que emerge da falta de locais aptos à moradia de pessoas de baixa renda, da expansão de centros urbanos ou do mero descaso dos interessados Quanto mais delicado se mostra o problema, tanto mais eficiente deve ser a atuação fiscal dos agentes públicos, que não podem quedar em berço esplêndido agindo burocraticamente, de forma delicada e imperceptível, a ponto de permitir invasão, fixação e estabelecimento de moradias e conjuntos irregulares em locais inviáveis, protegidos ou completamente proibidos. A dificuldade no alcance de soluções adequadas não permite que simples omissão torne fato consumado algo que sequer poderia ter sido iniciado. Salta aos olhos, portanto, de forma contundente, a responsabilidade do Município no tocante ao loteamento e parcelamento irregular e clandestino. RZCS 10 Apel c/ Rev h° 72S 626 5/0-00 PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente Consoante muito bem lembrado por Patrícia Faga Iglécias Lemos (apud in "Responsabilidade Civil por Dano ao Meio Ambiente", Ed Juarez de Oliveira, 1 a ed., 2003, pág. 98, citando Antônio Herman Benjamin, "Responsabilidade Civil pelo Dano Ambiental", Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n° 9, pág. 45, jan/mar 1998), " 'O Direito brasileiro, especialmente após a Constituição Federal de 1988 (. ) não admite qualquer distinção - a não ser no plano do regresso - entre causa principal, causa acessória e concausa' Assim, havendo participação de alguém na efetivação de um dano, responde pela totalidade deste dano". E prossegue a mesma doutrinadora: "Desta forma, 'o Direito Ambiental flexibiliza o rigor das teorias da causalidade adequada e da causalidade imediata (esta, segundo a doutrina nacional, adotada pelo Código Civil brasileiro), aproximandose do critério da equivalência das condições'. Ressalta Benjamin que, considerando-se complexidade do fenômeno degradador, há dificuldade na caracterização do fato como condição sine qua non do dano Em termos de causalidade alternativa, houve uma reformulação do sistema de responsabilidade civil pelo Direito Ambiental, objetivando seja a vítima indenizada e o meio ambiente reparado", {apudin Op. Cit, págs. 98/99). 11 RZCS Apel tí Rev n° 729 626 5/0-00 PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente A responsabilidade Municipal pelo correto e adequado parcelamento do solo urbano advém dos termos precisos inseridos no artigo 30, inciso VIII, da Constituição Federal, cumulado com o artigo 37, § 6o, da Carta Magna e artigo 181, §§ 2o e 3o, da Constituição Bandeirante, e finalmente artigo 3o, incisos IV e 14, § 1 o , da Lei n° 6.938/81, cumulados com os artigos 23, incisos II, V, VI e IX, e 225, da Constituição Federal, e ainda artigos 241, inciso XIX, e 243, da Lei Orgânica do Município. Assim já restou decidido quando do julgamento da Apel. c/ Revisão 730.666.5/5-00, da qual fui Relatora nesta Colenda Câmara Especial do Meio Ambiente - TJSP, j . 28/2/2008, v.u., cuja ementa é a seguinte: Ação Civil Pública Ambiental - Loteamento irregular - Área de proteção de mananciais no entorno da represa Bilhngs - Responsabilidade dos entes de direito público. A omissão das autoridades públicas municipais contribuiu para o estabelecimento de fato do loteamento irregular, permitindo provável dano ambiental e urbanístico cujas proporções serão auferidas no decorrer da ação civil, tudo determinando permaneça o Município de São Paulo no pólo passivo da ação. Agravo retido ao qual se dá provimento, prejudicados os recursos de apelação interpostos. 12 RZCS Abei ü Rev n° 729 626 5/0-00 PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente Este entendimento não é escoteiro, valendo conferir o resultado do julgamento da Apel. c/ Revisão 347.306.5/6-00, da qual também fui Relatora nesta Câmara Especial do Meio Ambiente-TJSP.j. 13/3/2008, v.u.: Ação Civil Pública Ambiental - Loteamentos irregulares em áreas protegidas e de mananciais - Danos urbanísticos e ambientais - Pretendida responsabilização do Estado e do Município pela falha e omissão na fiscalização, como fatores preponderantes a permitir os trinta e dois (32) assentamentos - Legitimidade passiva "ad causam" do Estado e do Município reconhecida. O Estado e o Município podem ser responsabilizados objetivamente, na seara ambiental, tanto se forem causadores diretos do dano, quanto na hipótese em que a Administração Pública tem o dever de fiscalizar as atividades desenvolvidas pelos particulares, não somente quanto às atividades existentes, mas como no caso dos autos, previamente à instalação e implantação de unidades e atividades cujo funcionamento e local em que situadas causarão degradação ambiental. Outros ensinamentos igualmente convincentes devem ser lembrados, consoante se pode auferir da tese exposta no voto 18.421, lançado na Apel. Cível 405.282.5/7-00, de lavra do eminente Desembargador J. G. de Jacobina Rabello, em caso bastante semelhante, "verbis": 13 RZCS Ape a Rev n° 72S 626 5<0-00 PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente "As comprovadas agressões ao meio ambiente não surgiram nem tiveram desenvolvimento apenas pela omissão e também ação do Município, mas também pela insuficiência de medidas de parte do Estado. Desde o início das violações ao meio ambiente, ocorridas em área em que o Estado tinha que ter ficado não apenas alerta, mas na ofensiva, em prol da proteção do meio ambiente e no combate à poluição, como de sua competência e de sua obrigação (Constituição Federal, artigo 23, n. VI), o que se viu de sua parte foi apenas uma autuação pela EMPLASA, em janeiro de 1989, e uma vistoria da CETESB, em 1994 E então a situação já se mostrava irreversível, com a distância de datas a autorizar, mais do que qualquer outra coisa, quadro de responsabilidade, descrito na inicial, nos pareceres do Ministério Público e no próprio voto do eminente Relator sorteado. Estavam à mão do Estado medidas de tutela de urgência em defesa do meio ambiente, que não se resumiam às de caráter processual, sempre mais demoradas e em geral não tão efetivas quanto o que se poderia desejar, porque o ideal, quando se cuida da proteção em causa, é a prevenção, não a reparação do mal. Nesse sentido, aliás, a lição da doutrina, como ressalta EDIS MILARÉ (cf. colaboração em "A Ação Civil Pública após 20 Anos, efetividade e desafios", Editora Revista dos Tribunais, 2005, pág. 149 e seguintes). A via extrajudicial, com a possibilidade de ir o Estado, no exercício de seu poder de polícia, além do embargo e da aplicação de multas, não foi por ele seguida em termos de se dizer que isenta de reparos, fortes o bastante, no caso, para não dever figurar, ao lado do Município, entre os entes públicos a terem que arcar com as conseqüências de omissiva conduta. r\ ç\ W) 14 Apel c; RevV J29 626 5f0-00 PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente Numa situação de invasão de área de proteção ambiental, fato que exige pronta e enérgica solução do Poder Público, é deste a tarefa de atuar com a eficiência esperada, de resultado tão imediato quanto possível, que não pôde ser detectada no processo Bem por isso, adverte José Roberto Marques que "O Poder Público deve agir prevenindo ocorrência de danos ambientais e reprimindo aqueles que estão sendo promovidos em desacordo com a lei " (v "Meio Ambiente Urbano", Forense Universitária, 1a edição, pâg.211). Prevenir ou reprimir como? Logicamente, de maneira apta a fazer cessar a infração, a desestimular o ilícito, a degradação, que, no caso - daí a responsabilidade do Estado - se fazia às margens da Estrada Velha do Mar, a afetar mais de um Município, com poluição da Represa Billings, reservatório de abastecimento de grandes comunidades A Lei 898, de 18 de dezembro de 1975, regulamentada pelo Dec 9 714/77, já estava a dispor, para efetiva atuação do Estado, caberIhe promover não apenas embargo, mas também a própria demolição de obra ou construção não autorizada e cuja permanência estivesse a contrariar as regras ou a ameaçar a qualidade do meio ambiente, como no caso (artigo 13. n. IV) A falta de providências em ocorrências de graves conseqüências, não é resposta adequada que possa ser dada à sociedade, tanto quanto não o são medidas mornas e não à altura das que exigidas por aquelas. Pelo exposto, e com a licença devida, insiro, por este voto, na condenação, o Esta 15 Apel d PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente Paulo, exceto no que se refere a regularização de loteamento, matéria esta de competência do Município, cf. Lei 6.766, de 19.12 1979, artigo 40. Nos termos acima, dou provimento ao recurso de ofício, repelidas as objeções da contestação de fls. 467/492". O Colendo Superior Tribunal de Justiça no REsp 604.725/PR, rei. Ministro Castro Meira, j . 21/6/2005, DJU 22/8/2005, pág. 202, já decidiu que: "O art. 23, VI, da Constituição da República fixa a competência comum para a União, Estados, Distrito Federal e Municípios no que se refere à proteção do meio ambiente e combate à poluição em qualquer de suas formas No mesmo texto, o art. 225, caput, prevê o direito de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. O Estado recorrente tem o dever de preservar e fiscalizar a preservação do meio ambiente Na hipótese, o Estado, no seu dever de fiscalização, deveria ter requerido o Estudo de Impacto Ambientai e seu respectivo relatório, bem como a realização de audiências públicas acerca do tema, ou até mesmo a paralisação da obra que causou o dano ambiental... Assim, independentemente da existência de culpa, o poluidor, ainda que indireto (Estado-recorrente) (art. 3o da Lei n° 6 938/81), é obrigado a indenizarp 16 Apei c/Rev PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente reparar o dano causado (responsabilidade objetiva). ao meio ambiente Fixada a legitimidade passiva do ente recorrente, eis que preenchidos os requisitos para a configuração da responsabilidade civil (ação ou omissão, nexo de causalidade e dano), ressalta-se, também, que tal responsabilidade (objetiva) é solidária, o que legitima a inclusão das três esferas de poder no pólo passivo na demanda, conforme realizado pelo Ministério Público (litisconsórcio facultativo)". 'Ad argumentandum tantum", confiram-se os seguintes julgados1 Ação Civil Pública Regularização de loteamento e reparação dos danos correlatos Legitimidade ativa do Ministério Público e adequação da via eleita - Legitimidade passiva dos loteadores e também do Município de São Bernardo do Campo e da Fazenda Pública do Estado de São Paulo - Dos primeiros réus, em virtude da própria realização do loteamento - Do Poder Público, em face das condulas omissivas pormenorizadas - Nexo causai reconhecido Responsabilidade solidária do Poder Público que deve ser aferida, no entanto, com certos temperamentos - Sentença de procedência parcial da ação - Provimento parcial de todos os recursos (do Ministério Público, adesivo da Municipalidade e autônomo da Fazenda do Estado de São Paulo), consoante especificado. (Apel. Cível 212.157-5/5-00, 2a Câmara 17 RZCS Apel zl Rev n° 729 626 5-'0 0C V PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente Direito Público, rei Des. Osvaldo Magalhães, j . 21/10/2003, vu.)Ação Civil Pública - São Paulo - Loteamento clandestino, de impossível regularização, em área de proteção de mananciais - Condenação dos proprietários e loteadores no desfazimento do parcelamento, devolução e indenização dos adquirentes e reposição da área no estado anterior - Pretendida condenação solidária do Município e do Estado por omissão no dever de fiscalizar e impedir tal parcelamento - 1. Não há dúvida quanto à clandestinidade, irregularidade e dano ao meio ambiente causado pelo parcelamento irregular em área de mananciais (área de preservação da Represa Billings) Impossível a regularização, deve ele ser desfeito com a reposição da área no estado anterior, eliminando-se construções e refazendo matas e cursos d'água - 2. Inegável a responsabilidade do Município que, tendo o dever legal de velar pela correta ocupação do solo, permitiu com sua omissão que tal parcelamento se efetivasse e que os danos, aos adquirentes e ao meio ambiente, fossem causados. Não o exculpa a lavratura de inócuas multas, após cientificado do inquérito judicial já em andamento, que sequer demonstrou ter sido paga pelos infratores, nem a sugestão de medidas judiciais que nunca propôs - 3. Inegável, do mesmo modo e pelo mesmo motivo, a responsabilidade do Estado que, responsável pelas áreas de proteção a mananciais na área metropolitana, igualmente permitiu a implantação do parcelamento - 4 Não cabe condenar o Poder Público a indenizar os adquirentes de lotes, ante a inexistência ete 18 . *V VV^ \ ÀJ Apel d R€v n° 729 626 5/Q-00 PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente nexo causai entre sua omissão e os contratos e pagamentos privados - 5 Provimento do recurso ministerial para condenar o Estado e o Município de São Paulo a, solidanamente com os demais réus, desfazer o loteamento e devolver a área ao estado anterior. (Apel. Cível 71.028-5/0, 8a Câmara de Direito Público, rei. Des. Torres de Carvalho, j . 11/8/1999, v.u.). Ação Civil Pública - Dano ambiental - Áreas de manancial - Loteamento clandestino - São Bernardo - Sentença de procedência Compreendem-se no pedido medidas diversas, mas destinadas a alcançar igual resultado Incontroverso o dano, se impõe a condenação solidária do município, que se omitiu e ainda colaborou com a permanência do loteamento clandestino em áreas de manancial, na sua imediata cessação e reparação, ainda que já esteja tomando providências administrativas, pois a proteção ambiental não pode ser preterida, em favor da morosidade burocrática O poder discricionário só existe enquanto a Administração exerce suas atividades nos limites da legalidade Verificada no processo jurisdicional a falha da Administração, no cumprimento de seu dever legal, a força coercitiva da sentença prevalece e sujeita o Executivo que não pode se esquivar de cumprila, evocando discricionariedade que não soube antes aproveitar, preferindo pactuar com a ilícitude - Negado provimento aos recursos, considerado interposto o oficial. (Apel. Cível 211 717-5/4-00, 8a Câmara de Direito Público, rei. Des. Teresa Ramos Marques, j . 24/9/2003, v u.) |\ 19 v \j ^r"^ \<JJ Apel cARev i ° 729 626 5/0-00 PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente Resta, destarte, confirmar também neste aspecto a muito bem lançada sentença recorrida. Quanto ao mérito, a questão posta "sub judice" é indiscutível e demonstra a procedência da vertente ação, tanto em vista das provas carreadas aos autos, quanto em face da confissão indireta de todos os envolvidos. Um único reparo merece a r decisão combatida. É que não cabe condenação em verba honorária quando o autor da ação for o Ministério Público, consoante ocorre "m casu", devendo tal verba ser suprimida da condenação Isto posto, nego provimento ao recurso interposto por Marcília de Araújo Guilger e outros, e dou parcial provimento ao recurso da Municipalidade apenas para retirar da condenação os honorários advocatícios, mantida quanto aos demais aspectos a muito bem lançada decisão recorrida de lavra do eminente Juiz Elias Júnior de Aguiar Bezerra. 20 RZCS Ape, tí Rev n° 729 626 5-'0 CO PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Câmara Especial do Meio Ambiente Para fins de acesso aos Egrégios Tribunais Superiores, ficam expressamente pré-questionados todos os artigos legais e constitucionais mencionados pelos litigantes. É o meu voto. Regina Zaquia Capistrano da Silva, Relatora. RZCS 21 Apel o' Rev n° 729 626 5/0-00