Casos Concretos de Afretamento e
Transporte Marítimo para Discussão
Luiz Leonardo Goulart
UNISANTOS / OAB - SANTOS
Subseção
Santos
CASO 1
Tema:
Cobrança de sobrestadia (demurrage) de container
Container descarregado em Santos de navio de linha
regular, desovado nas dependências do consignatário em São
Paulo, e devolvido aos agentes do transportador um mês depois.
Container devolvido ao navio por ocasião de nova escala em
Santos, em viagem northbound, dez dias após entrega aos
agentes.
Os armadores cobraram sobrestadia ( demurrage ) pelo
período em que o container ficou retido em seu depósito.
O consignatário recusou-se a pagar a sobrestadia, sob o
argumento de que o container era acessório do navio e sua
responsabilidade se limitava ao frete já pago.
Os armadores alegaram que o conhecimento marítimo
previa essa cobrança.
Quem tem razão ?
CASO 2
Tema:
Cobrança de sobrestadia de navio em afretamento por
viagem (voyage charterparty): paralisações por chuva
Navio afretado por uma viagem carregou açúcar no porto de Santos, destinado
a Hamburgo, Alemanha, contendo a carta de fretamento ( ou carta-partida ) a
cláusula Weather working days of 24-consecutive hours.
A operação de carga foi paralisada por períodos que variaram de 15 minutos a
1h30m, devido a intermitente as chuvas em Santos, num total de 14 horas e 25
minutos.
O navio incorreu em sobrestadias ( demurrage ), mas o afretador impugnou a
fatura recebida, reivindicando a dedução das 14h25m, à razão de US$ 100.00 por
hora, uma vez que a cláusula weather working days ( dias úteis em condições de
tempo ) lhe permitia reduzir as paralisações por chuva.
O armador-fretador negou o pleito, alegando que a mesma cláusula previa
períodos de 24 horas consecutivas, e só a partir desse período de paralisação
poderia cogitar de conceder a redução nas sobrestadias.
Quem tem razão ?
Chaves para solução do Caso 2
- Aplicação da lei inglesa
- Jurisprudência ( leading cases ):
Branckelow SS.S. Co. v. Lamport @ Holt [ 1897 ] 1 K.B. 570
Bennets v. Brown [ 1908 ] 1 K.B. 490.
Alvion S.S. Corp. v. Galvan Lobo Trading Co. [ 1955 ] 1 Ll.L (decisão divergente)
Reardon Smith Line v. Ministry of Food [ 1963 ] 1 Ll.L.R. 12 )
Pyman v. 100 Tons of Kainit ( Ga. 1908 ) 164 F. 364
Hansa 1959, 2366, the Verband Deutscher Reeder
-
O dia útil putativo ( notional working day ):
Forest S.S. Co v. Iberian Ore Co..( 1899 ) 81 L.T. 563
Reardon Smith Line v. Ministry of Food [ 1963 ] 1 Ll.L.R. 12 )
Duas horas de um dia útil putativo de 12 horas = 1/6 de dia útil
Deduz-se 1/6 de 24 horas para efeito de pagamento de sobrestadia
Caso 3
Tema:
Desvio de rota e descarga em outro porto
Em dezembro de 2006, navio de bandeira de conveniência carregou carne em Rio
Grande e Santos, em containers, destinada ao porto russo de São Petersburgo, com data
estimada de chegada naquele porto em meados de janeiro de 2007.
Contudo, o navio rumou para Antuérpia, onde transbordou a carga para outra
embarcação, que a levou para Helsinque, onde descarregou.
Os embarcadores brasileiros só souberam que a carga não chegara em março,
quando os consignatários e importadores recusaram a compra das mercadorias e seu
pagamento, em razão de sua falta de entrega no destino, alegando que não poderiam esperar
em razão da queda do preço no mercado e porque parte da carga de carne já perdera a
validade.
Os transportadores responderam à reclamação dos embarcadores, alegando que a
alteração da rota fora legítima em face de cláusula do conhecimento marítimo, e porque o
porto de São Petersburgo estava congestionado, em razão do gelo. E ainda exigiram que os
embarcadores enviassem novos certificados sanitários e pagassem despesas portuárias e de
reembarque em Helsinque para outro navio.
Quem tem razão ?
Chaves para solução do Caso 3:
Código Comercial:
-
Art. 509 e 539
-
Cotejo dos arts. 575 e 567 nº 8
-
Art. 576
-
Art. 711 nº 1
-
Art. 741 nºs 1 a 3
-
Art. 1º do Decreto 19.473/30
-
Art. 16-I a V da Lei 9.611/98
Código Civil:
-
Art. 642
-
Art. 751
Caso 4
Tema:
Perda de mercadorias não pagas pelo consignatário
Carga vendida FOB a importador brasileiro e transportada em navio de
bandeira inglesa de Liverpool para Santos. Incêndio em porão do navio
durante a viagem destruiu o carregamento. O importador já segurara a carga
no Brasil antes do embarque, mas, em face da perda da carga, não pagou o
preço da mercadoria ao banco que processou o crédito documentário.
Não obstante, o importador e consignatário reclamou ressarcimento
pela perda total da carga tanto do transportador quanto do segurador. Nesse
ínterim, o exportador e embarcador apresentou a mesma reclamação ao
transportador e ao segurador brasileiro, sob o fundamento de não ter sido
pago.
O transportador negou o pleito do embarcador/exportador alegando
que a Paramount Clause contida no conhecimento o isentava de indenização
por incêndio, além do fato de não deter mais o exportador legitimidade ativa
numa venda FOB. Negou também o pleito do importador e consignatário,
invocando a mesma Paramount Clause e porque ele não seria o proprietário da
carga, por não haver pago o preço.
O segurador negou ambos os pleitos. Ao exportador por não ser o
segurado nem beneficiário do seguro e ao importador por não ser o
proprietário da carga.
Quem tem razão ?
Explicações para o Caso 4:
- Paramount Clause:
Regras de Haia: Convenção sobre certas regras relativas a
conhecimentos de embarque, Bruxelas, 1924
Regras de Haia-Visby: Protocolo de Bruxelas, 1968
- Regras 5 e 6 de Oxford Varsóvia 1932
- Art. 676 do Código Comercial
Caso 5
Tema:
Contribuição de avaria grossa em acidente por culpa do armador
O AMAZONIA trazia carregamento para o Brasil dos portos do Canadá e da Costa Leste
americana para Rio de Janeiro e Santos. Na altura do cabo Hatteras ( EUA ) enfrentou ventos de força 12
da Escala Beaufort ( furacão ) e, por arfar e balançar violentamente, não conseguiu a tripulação evitar a
entrada de água nos porões, que danificou parte considerável da carga. A pique de naufragar, firmou
contrato com empresa de salvamento, que o rebocou até Hamilton, Bermudas, onde arribou, não sem
antes alijar parte da carga remanescente, para que a embarcação fosse aliviada.
Ali, no curso de reparos de emergência uma solda elétrica provocou incêndio em um dos
porões, apagado pela brigada de bombeiros do porto, cuja água danificou outra parte da carga
remanescente. Por haver realizado sacrifícios ( alijamento e danos à carga pela água das mangueiras ) e
haver incorrido em despesas para salvamento da embarcação, o armador declarou avaria grossa, com o
objetivo de ratear aqueles prejuízos com os interessados na carga, na proporção de seus respectivos
valores sãos, nos termos das Regras de York e Antuérpia ( então de 1974 ), como previsto em cláusula dos
conhecimentos marítimos.
Com o prosseguimento da viagem e antes da chegada do navio ao Rio de Janeiro, os seguradores das
cargas apresentaram cartas de garantia ( Lloyd´s Average Guarantee ) com compromisso de contribuição
na avaria grossa, para liberá-las na chegada, e indenizaram a seus proprietários pelos danos sofridos.
No entanto, um dos seguradores recusou a apresentação da garantia em relação a seu
segurado consignatário, cuja carga chegou intacta, ao constatar que a cobertura fora averbada – no
âmbito de uma apólice aberta -, depois da ocorrência do sinistro, ao largo do Cabo Hatteras, reputando o
seguro nulo. O segurado alegou que desconhecia o acidente quando celebrou o seguro.
Foi-lhe exigido então pelos armadores um depósito de contribuição (Lloyd´s Average Deposit),
que o consignatário se negou a efetuar, alegando culpa do capitão e da tripulação pelo acidente.
Por sua vez, os seguradores reclamaram dos armadores o ressarcimento de todos os prejuízos
indenizados e em que se sub-rogaram, o que foi negado.
Quem razão ?
Chaves para solução do caso 5:
Código Comercial:
- Art. 677 nº 9
- Art. 762 em cotejo com o art. 575
- Art. 765
Código Civil:
- Art. 393 e parágrafo único, cotejo com antigo 112 e 113 do
Código Comercial
-
Regra De York e Antuérpia ( atual de 2004 ) e cotejo c/ art. 764
do Código Comercial
-
Escala Beaufort
Caso 6
Tema:
Ação contra transportador em navio de bandeira de
conveniência e execução contra o armador-proprietário
Navio de proprietários gregos, operadores alemães e afretadores
ingleses registrado no Panamá, com a bandeira daquele país. Os proprietários
possuíam outras 28 embarcações, cada uma delas registrada em países e
bandeiras diferentes, em nome de empresas de nomes fictícios.
Em mau estado de conservação, o navio trazia carga a granel para
Paranaguá, que se perdeu em virtude das más condições de aeração dos
porões. Após a descarga, o navio zarpou rapidamente para destino ignorado.
Os seguradores sub-rogados da carga moveram ação judicial de
ressarcimento, obtendo sentença condenatória à revelia. Contudo, como a
embarcação jamais tivesse retornado ao Brasil, pelo menos com o mesmo
nome, e inexistindo a empresa de navegação registrada na Capitania dos Portos
de Paranaguá como sua armadora, não lograram os seguradores o
cumprimento da sentença ( então execução judicial ).
Posteriormente, descobriram no Lloyd´s Maritime Directory o nome
dos proprietários e operadores do referido navio e das 28 embarcações irmãs
(sister ships). Iniciado o procedimento de arresto de uma delas, atracada em
Recife, após pedido de ofício à Diretoria de Portos e Costas para sua detenção,
foi ele impugnado pelos armadores, sob o fundamento de inexistência de prévio
processo de conhecimento contra eles, não se aplicando por isso o art. 466 do
Código de Processo Civil.
Quem tem razão ?
Chaves para solução do caso 6:
-
Art. 470 nº 9 do Código Comercial em cotejo com art. 466 do CPC
-
O princípio da actio in rem
-
A solução argentina em cotejo com o art. 494 do Código
Comercial e art. 282-II do CPC.
Caso 7
Tema:
Prescrição e prova da culpa do transportador: Tribunal Marítimo
Navio "gearbulk" ( com fechamento automático de escotilhas )
carregava celulose em Portocel, Espírito Santo. Em virtude de chuva
repentina, o fechamento automático foi acionado, mas não funcionou. Toda
a carga, ensopada de água, se perdeu, com vultoso prejuízo.
A Capitania dos Portos instaurou inquérito sobre as causas e a
extensão do fato da navegação e o enviou ao Tribunal Marítimo, onde
aguardou julgamento por três anos. Por fim, por unanimidade, aquela corte
administrativa concluiu pela ocorrência de caso fortuito, e a consequente
irresponsabilidade do transportador.
Imediatamente após a publicação do acórdão, os seguradores subrogados na carga apresentaram pedido de ressarcimento aos armadores,
juntando um laudo técnico conjunto, firmado por peritos navais
representando o navio e carga, atestando manutenção inadequada do
sistema elétrico de fechamento das escotilhas, com rompimento de fiação,
como causa da pane.
O transportador recusou o pedido de indenização alegando decurso
da prescrição ânua e invocando o acórdão do Tribunal Marítimo, que
declarou o incidente fortuito.
Quem tem razão ?
Caso 8
Tema:
Prescrição e Código de Defesa do Consumidor no Transporte Marítimo
Navio brasileiro emitiu conhecimento atestando o recebimento a
bordo de uma carga de castanhas, destinada ao Rio de Janeiro, para
consumo no período natalino. As mercadorias só chegaram ao porto de
destino dois meses depois, quando foram descarregadas sem avarias, mas já
na época do Carnaval.
Descobriu-se que na data da emissão do conhecimento o navio
estava no Rio de Janeiro para iniciar sua viagem à Europa, enquanto as
mercadorias só foram efetivamente embarcadas na viagem de retorno, quase
dois meses depois.
Dois anos após a descarga, o consignatário, com fundamento no
Código de Defesa do Consumidor, reclamou indenização por perda de
mercado por defeito na execução do contrato de transporte, com a não
entrega da carga no momento adequado.
O transportador recusou a reclamação, alegando não ser responsável
por atraso nos termos do conhecimento marítimo, além de arguir a
prescrição, sob o fundamento de o reclamante não estar acobertado pelo
CDC, por não ser o consumidor final, não se aplicando por isso a prescrição
quinquenal.
Quem tem razão ?
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