Grupo de Pesquisa INFORMAÇÃO E INCLUSÃO SOCIAL DESAFIOS NA/DA INCLUSÃO DIGITAL Isa Maria Freire Doutora em Ciência da Informação Niterói, novembro de 2006 “Conhecimento é como a luz. Sem peso e intangível, pode facilmente viajar o mundo, iluminando a vida das pessoas em todos os lugares.” Relatório do Banco Mundial 1998/1999 “O conhecimento voa nas asas da informação.” Isa Maria Freire Metáfora criada em sala de aula Quadro de referência A humanidade entrou em um período histórico que pode ser denominado Era do Conhecimento. Em decorrência, o fenômeno da informação torna-se elementochave para o processo de transformação econômica e cultural da sociedade. A Era do Conhecimento deve ser vista como um período de profundas transformações pessoais e sociais. Nela, a informação torna-se um recurso vital e, nesse contexto, cientistas e profissionais da informação têm uma responsabilidade social. Mas, para uma ação social responsável, “É fundamental que a ciência da informação se aproxime do fenômeno que pretende estudar: o encontro da mensagem com o receptor, ou seja, informação, seu uso, implicações e conseqüências.” Araújo, 1994 “Como definir a sociedade da informação? A sociedade da informação é a sociedade que está atualmente a constituir-se, na qual são amplamente utilizadas tecnologias de armazenamento e transmissão de dados e informação de baixo custo.” Assmann, 2000 “Esta generalização da utilização da informação e dos dados é acompanhada por inovações comerciais, organizacionais, sociais e jurídicas [estão alterando] o modo de vida tanto no mundo do trabalho como na sociedade em geral.” Assmann, 2000 VIVEMOS NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO SIM “Assistir à televisão em rede nacional, trocar mensagens no telefone celular, movimentar a conta no terminal bancário e, pela Internet, verificar multas de trânsito, comprar discos ... pesquisar e estudar são hoje (setembro de 2000) atividades cotidianas, no mundo inteiro e no Brasil.” LIVRO VERDE “Rapidamente nos adaptamos a essas novidades e passamos [sem questionamentos] a viver [numa sociedade onde] a informação flui a velocidades e em quantidades [inimagináveis] há apenas poucos anos, assumindo valores sociais e econômicos fundamentais.” LIVRO VERDE 20/10/2006 Folha de SP/Reuters Número de internautas do Brasil dobra em seis anos O número de pessoas com acesso à internet em suas casas no Brasil dobrou em seis anos, passando de 9,8 milhões em 2000 para 21 milhões até o mês passado [setembro], anunciou o Ibope/NetRatings, que mede o mercado brasileiro de internet. No mesmo período, o número de internautas que acessam a web ao menos uma vez por mês em suas residências aumentou em 168% (de 5,1 milhões de usuários em setembro de 2000 para 13,6 milhões em 2006). O mês de setembro apresentou alta de 14% em relação ao mesmo período do ano passado [2005], informou a empresa. O Brasil continua na liderança em termos de tempo de uso da internet ante os dez países pesquisados pela companhia. Em segundo lugar aparece o Japão (18 horas e 22 minutos em setembro), seguido pela França (17 horas e 43 minutos) e Estados Unidos (17 horas e 8 minutos), conforme o ranking da Ibope/NetRatings. Segundo o relatório, em seis anos, houve um crescimento do número de mulheres internautas no país. A fatia do público feminino avançou de 42% em setembro de 2000 para 49% em 2006. "A presença significativa de mulheres na internet brasileira segue um movimento já observado no mercado americano, onde são a maioria", afirmou o coordenador de análise do Ibope Inteligência, Alexandre Sanches Magalhães. 21/08/2006 Folha Online Número de internautas cresce 17% no país O número de internautas brasileiros cresceu 17% no mês de julho em relação ao mesmo período do ano passado. Um total de 13,4 milhões de pessoas navegaram pelo menos uma vez na internet em suas casas no último mês. A parcela de internautas que assistiram a vídeos e filmes na internet no Brasil cresceu 21% no mês de julho, passando de 3,4 milhões de usuários residenciais, em junho, para 4,2 milhões,no mês passado. A informação é da pesquisa Ibope/NetRatings realizada mensalmente. "Um dos principais fatores para isso é o crescimento da banda larga em residências, que chegou a 69,2% dos usuários em junho deste ano, em comparação a 57,4% em junho do ano passado", afirma José Calazans analista de internet da Ibope Inteligência. O especialista diz que é um salto bem grande em um período curto. 23/06/2006 Folha Online Líder mundial, Brasil supera 20 horas mensais na web residencial Na esteira de recordes registrados nos últimos meses, internautas brasileiros com acesso doméstico passaram, em média, 20 horas e 25 minutos conectados à internet no mês de maio. Para se ter uma idéia do crescimento apresentado no Brasil, em maio do ano passado [2005] o tempo de navegação ficou em 16 horas e 55 minutos - aumento de 3 horas e 30 minutos nos últimos 12 meses [Maio/2005 a maio/2006]. Grande parte deste crescimento está associada à popularização da banda larga entre os brasileiros; a queda de preços e aumento nas velocidades de conexão fez com que classes A e B passassem a optar por esta alternativa em vez do acesso discado. Dos 13,2 milhões de internautas residenciais ativos no país, 68,2% têm acesso rápido à internet. “A sociedade da informação [portanto] não é um modismo. Representa uma profunda mudança na organização da sociedade e da economia ... É um fenômeno global, com elevado potencial transformador das atividades ... econômicas, uma vez que a estrutura e a dinâmica dessas atividades ... serão em alguma medida afetadas pela infraestrutura de informações disponíveis.” LIVRO VERDE MAS, VIVEMOS NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO NÃO “Em um mundo de 5 bilhões e 600 milhões de habitantes, apenas 150 milhões são usuários de PCs. Menos de 10% dos usuários de computadores pessoais no mundo têm correio eletrônico. Menos de 7% têm acesso direto à Rede. Menos de 5% dos lares dispõem de PCs. Menos de 1% da população mundial tem acesso à Internet.” Amaral, 2003 “Uma pesquisa da Fundação Getúlio Vargas, divulgada no primeiro semestre de 2003, traçou o ‘mapa da exclusão digital’ no Brasil. Cerca de 87% da população não possuem PCs. Apenas 8,3% estão conectados à Internet. Nove em cada dez brasileiros não têm acesso a um computador. Entre os negros, apenas 4% têm um computador em casa.” Amaral, 2003 “Entre a população branca, a percentagem sobe para 15%. São poucos os avanços da tecnologia da informação nos setores de maior carência social e econômica. A capacitação brasileira é mais expressiva nos setores do Governo e dos bancos (imposto de renda pela Internet, votação eletrônica, automatização dos serviços bancários).” Amaral, 2003 09/10/2006 Folha Online Quase metade dos internautas navega com acesso público Cerca de 48% dos internautas brasileiros usam locais públicos pagos (35%) ou gratuitos (13%) para navegar. É o que revela a primeira pesquisa sobre internet pública, realizada pelo Ibope/NetRatings. O estudo foi feito com base em 16.051 entrevistas com pessoas a partir de dez anos, em nove regiões metropolitanas do País: São Paulo, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Recife, Fortaleza, Salvador e Distrito Federal. De acordo com a pesquisa, a classe A tem o maior percentual de usuários conectados (79% utilizam internet) mas apenas 13% navegam em locais públicos pagos e 5% os locais públicos gratuitos. Na classe B, os internautas somam 52%, entre os quais 29% utilizam locais públicos pagos e 9% gratuitos. O acesso à internet é bem menor no caso das classes C (22%) e D e E (10%). Entretanto, a navegação em locais públicos é mais freqüente entre os usuários dessas classes: 47% dos internautas de classe C navegam em locais públicos pagos e 19% em locais de acesso gratuito. Nas classes D e E, esse percentual sobe para 61% (pagos) e 28% (gratuitos). Segundo a pesquisa, entre os usuários de acessos públicos gratuitos, com freqüência de uma ou duas vezes por semana, 33% utilizam a web para fazer atividades escolares. Já os que navegam em locais públicos pagos, as atividades mais freqüente são de relacionamento interpessoal: 61% enviam ou recebem emails, 39% participam de sites de relacionamento como o Orkut, 29% enviam mensagens instantâneas e 24% participam de chats (salas de bate-papo). O governo mantém cerca de 3,2 mil pontos de acesso gratuito à internet, por meio do projeto Gesac (Governo Eletrônico Serviço de Atendimento ao Cidadão), além de outros programas. Nesse contexto, “As ações de inclusão digital buscam difundir o sucesso obtido pela tecnologia de ponta pelos mais desfavorecidos.” NERI et al., 2003 Pois “... ao afetar a capacidade de aprendizado, a conectividade e a disseminação de informações, [o analfabetismo digital] gera conseqüências virtualmente em todos os campos da vida do indivíduo. ... [Por isso] a inclusão digital é cada vez mais parceira da cidadania e da inclusão social.” NERI et al., 2003 “Inclusão digital é, dentre outras coisas, alfabetização digital. ... é a aprendizagem necessária ao indivíduo para circular e interagir no mundo das mídias digitais como consumidor e como produtor de seus conteúdos e processos. ... a oferta de computadores conectados em rede é o primeiro passo, mas não é o suficiente para se realizar a pretensa inclusão digital.” Rondelli, 2003 “O segundo passo: ... as pessoas que serão digitalmente incluídas precisam ter o que fazer com os seus computadores conectados ou com suas mídias digitais. Portanto, inclusão digital significa criar oportunidades para que os aprendizados feitos a partir dos suportes técnicos digitais possam ser empregados no cotidiano da vida e do trabalho.” Rondelli, 2003 “O terceiro passo ... corolário do anterior, é que precisa haver todo um entorno institucional para que esta se realize. ... Para isso é preciso muito investimento financeiro, pois essa tecnologia não é gratuita, mesmo que pública. E tal desenho institucional não se faz de modo aleatório.” Rondelli, 2003 “Um quarto passo [é] entender que inclusão digital pressupõe outras formas de produção e circulação da informação e do saber diferentes destas mais tradicionais que nos acostumamos a freqüentar. Portanto, há também um elemento importante de inovação no uso das tecnologias.” Rondelli, 2003 “As mídias digitais permitem que se estabeleçam relações descentralizadas e verticalizadas entre os produtores e consumidores de conhecimento. ... tais mídias possibilitam maior interação entre tais agentes. Assim, no interior delas, podemos ser ora produtores, ora consumidores dos conteúdos e dos processos possíveis de circularem na rede.” Rondelli, 2003 Mas “Processos de inclusão só ocorrem se a ampliação do acesso [às] mídias existentes for acompanhada da inserção dos indivíduos em um universo cultural e intelectual mais rico que os motivem a utilizá-las. Pois para estar e gostar da Rede é preciso ter e saber o que buscar. E só busca informação quem tem algo a fazer com ela.” Rondelli, 2003 Por isso “O governo, nos níveis federal, estadual e municipal, tem o papel de assegurar o acesso universal às tecnologias de informação e comunicação e a seus benefícios, independentemente da localização geográfica e da situação social do cidadão, garantindo níveis básicos de serviços, estimulando a interoperabilidade de tecnologias e de redes.” LIVRO VERDE “Além disso, cabe ao governo estimular e viabilizar a participação de minorias sociais e outros segmentos marginalizados, os pequenos negócios, bem como as organizações sem fins lucrativos, de modo a que ... possam ter acesso aos benefícios que a sociedade da informação possa proporcionar.” LIVRO VERDE Nesse contexto, “... as políticas públicas podem fazer a diferença [pois] a sociedade da informação deve assentar nos princípios da igualdade de oportunidades, participação e integração de todos, o que só será possível se todos tiverem acesso a uma quota parte mínima dos novos serviços e aplicações oferecidos.” Assmann, 2000 “[A inclusão digital] tem marcante dimensão social, em virtude do seu elevado potencial de promover a integração, ao reduzir as distâncias entre pessoas e aumentar o nível de informação [da população]”. LIVRO VERDE Além do acesso a computadores em rede, inclusão “significa capacitação para utilizar estes meios e ..., principalmente, a possibilidade de uma incorporação ativa no processo todo de produção, compartilhamento e criação cultural, os chamados ‘conteúdos’” Lazarte, 2000 “A forma de ... proporcionar este acesso deve estar integrada às condições locais existentes, em termos de suas organizações [e] referenciais culturais. Centros de produção, criação e compartilhamento cultural (e de acesso à rede) devem estar integrados a associações comunitárias, centros religiosos, igrejas etc.” Lazarte, 2000 Acrescentamos escolas. ESPÍRITO SANTO e FREIRE, 2004 Pois “As novas tecnologias da informação e da comunicação já não são meros instrumentos no sentido técnico tradicional, mas feixes de propriedades ativas. São algo tecnologicamente novo e diferente.” Assmann, 2000 “As tecnologias tradicionais serviam como instrumentos para aumentar o alcance dos sentidos (braço, visão, movimento etc.). As novas ... tecnologias ampliam o potencial cognitivo do ser humano (cérebro/mente) e possibilitam mixagens cognitivas complexas e cooperativas.” Assmann, 2000 É assim que “Termos como ‘usuário’ já não expressam bem essa relação cooperativa entre ser humano e as máquinas inteligentes. O papel delas já não se limita à simples configuração e formatação, ou, se quiserem, ao enquadramento de conjuntos complexos de informação.” Assmann, 2000 “Em resumo, as novas tecnologias têm um papel ativo e coestruturante nas formas do aprender e do conhecer. Há nisso ... uma incrível multiplicação de chances cognitivas, que convém não desperdiçar, mas aproveitar ao máximo.” Assmann, 2000 Desafios na/da inclusão digital “Existem poucos diagnósticos ... no contexto brasileiro sobre ... inclusão/exclusão digital. [E] a discussão raramente envereda pelo acesso às tecnologias pelo lado do ... usuário pobre ... É preciso desenvolver tecnologias para o uso da tecnologia da informação no combate à pobreza e à desigualdade.” NERI et al., 2003 “O verdadeiro desafio [é] criar tecnologias, construir ferramentas e sistemas mais eficazes, não só para gerenciar informação, mas, também para facilitar ao ser humano a transformação da informação em conhecimento e, conseqüentemente, em ação na sociedade.” ARAUJO, 2001 Pois “Se a informação é a mais poderosa força de transformação do homem [o] poder da informação, aliado aos modernos meios de comunicação de massa, tem capacidade ilimitada de transformar culturalmente [o indivíduo], a sociedade e a própria humanidade como um todo”. ARAUJO, 2001 No Brasil, o desafio é grande pois “Já partimos de cerca de 70% de pessoas analfabetas funcionais, isto é, sem condição de ler uma carta, entendê-la e respondê-la, necessitando sempre do personagem de Fernanda Montenegro em Central do Brasil.” Sader, 2004 “O acesso à informação torna-se um fator-chave na luta contra a pobreza, a ignorância e a exclusão social. Por essa razão não se pode deixar apenas nas mãos das forças do mercado o cuidado de regular o acesso aos conteúdos das ‘autovias da informação’”. QUÉAU, 2001 “Pois são esses conteúdos que vão tornar-se o desafio fundamental do desenvolvimento humano nos âmbitos da sociedade da informação. O ciberespaço deve permitir ... o acesso às informações e aos conhecimentos necessários para a educação e para o desenvolvimento de todos os homens. ...” Quéau, 2001 O que, certamente representa uma oportunidade histórica para cientistas e profissionais da informação trabalharem no sentido de criar e desenvolver modos e meios para inclusão digital de populações social e economicamente carentes, pari passu com ações pela cidadania e inclusão social. Esta seria, a nosso ver, a nossa parte na tarefa coletiva de construir uma ‘sociedade em rede’ democrática e justa: transportar, nas asas da [tecnologia da] informação, o conhecimento para todos aqueles que dele necessitem, no processo social (e vital) de transformar sonhos em realidade. Freire, 2004 Grata pela presença e atenção. Isa Maria Freire www.isafreire.pro.br [email protected]