ESPERANÇA CRISTÃ ESTUDO SOBRE A ESCATOLOGIA CRISTÃ Centro Franciscano de Formação e Cultura Prof. Carlos Cunha 31/5 e 1/6 de 2014 ESCATOLOGIA Etimologia Escaton Último, definitivo Logia Intelecção, discurso sobre algo. ESCATOLOGIA Conceito “É o estudo teológico que busca entender a direção ou o propósito final da história enquanto esta se move em direção ao futuro, tanto de uma perspectiva individual (que acontece quando alguém morre?) como de uma perspectiva coletiva (para onde a história está indo e como ela terminará?)” ESCATOLOGIA Conceito “Literalmente: ‘doutrina da coisa última’ (eschaton) [...] tinha antes o costume de intitular De novissimis, ‘Das coisas últimas’ [...] trata do fim e do cumprimento da criação, e da história (individual e universal) da salvação. O cumprimento aqui não significa apenas um acabamento (no tempo) e um termo (no espaço), mas tematiza a esperança cristã: tudo o que Deus criou para chamar a uma ‘plenitude de vida’ não só não volta para o nada, mas acede em sua totalidade e em cada uma de suas partes à plenitude interior e durável de sua essência, ao ser admitido a participar da vida eterna de Deus” ESCATOLOGIA Repensando o termo... Jürgen Moltmann Não pode existir doutrina acerca das coisas finais. A doutrina é conjunto de afirmações que surgem de experiências que se repetem e que qualquer indivíduo pode ter. ESCATOLOGIA Repensando o termo... Jürgen Moltmann Na realidade, escatologia é idêntica à doutrina da esperança cristã, que abrange tanto aquilo que se espera, como o ato de esperar, suscitado por esse objeto. ESCATOLOGIA Repensando o termo... Esperança Cristã 1. Modelos escatológicos insuficientes; 2. Escatologia em um lugar de primazia na teologia sistemática; 3. Inseri o tema na realidade histórica como práxis. PERGUNTAS INICIAIS TEOLÓGICA Que autoridade nós temos para falar sobre as coisas últimas? Quem foi para o além e voltou para contar como as coisas são lá? PERGUNTAS INICIAIS EXISTENCIAL De que modo a fé na “plenitude da vida” toca a nossa existência? Qual é a relevância do tema para a minha vida? PERGUNTAS INICIAIS PASTORAL Como a esperança na “plenitude da vida” coopera com a Missio Dei? Qual é a relação do tema com as culturas contemporâneas? PRESSUPOSTOS 1. Teologia histórico-crítica - Evolução teológica atrelada à evolução do sujeito - Reflexão crítica PRESSUPOSTOS 2. Diálogos inter e transdisciplinares - Abertura dialogal - Deixar ser interpelado por outras áreas do saber PRESSUPOSTOS 3. Hermenêutica bíblica - Método histórico-crítico - Diacronia e sincronia - Gêneros literários OBSERVAÇÃO Apocalipse e Escatologia - Indistinção conceitual - Apocalipse (“revelação”) como gênero literário - Floresceu durante perseguições (judaísmo e cristianismo) - Propósito: infundir esperança, afirmar a fé, dar ânimo - Não infunde medo e terror - Não existe para informar acontecimentos futuros - Linguagem metafórica (símbolos, mitos e imagens) PRESSUPOSTOS 4. Cristologia A ressurreição de Jesus como chave de interpretação sobre: 1. A morte, o sofrimento, mensagem e feitos, vocação, batismo e nascimento; 2. Nossa vida-morte-ressurreição 3. A criação ESCATOLOGIA DA PESSOA ESCATOLOGIA DA PESSOA Reflexão sobre a vida, morte e ressurreição diante da teodiceia Qual é o sentido da vida? 1. Pessimistas – “Não tem sentido” 2. Otimistas – “Tem sentido” Qual é o sentido da morte? 1. Fatalistas – “É um absurdo 2. Esperançosos – “Tem sentido” O QUE É A MORTE? • Certeza de que todos morrerão • A compreensão clínico-tanatológica Morte do coração | Morte do cérebro (clínica) | Morte vital SOBRE A MORTE “Ora, ele não é Deus de mortos, e sim de vivos” (Mc 12,27) A morte não é o último passo na vida do ser humano A ressurreição de Jesus Cristo nos garante isso (Fé) (1Co 15,12-14) EVOLUÇÃO DA COMPREENSÃO DA MORTE • • • • Judaísmo primitivo – morte como um processo trivial. Não há pós-morte Egito e Pérsia – “Mansão dos mortos”. Pode Iavé abandonar o seu povo na morte? (Os 13,14; 1Sm 2,6; Sl 73,21-26) Gregos – modelo dualista – alma (espiritual) e corpo (material) Com as guerras e cativeiros – Como Iavé fará justiça aos justos e castigará os injustos? JULGAMENTO, CÉU E INFERNO • Surge a ideia da ressurreição para os bons e condenação para os maus • Julgamento, céu e inferno como lugares destinados aos seres humanos depois da morte • Religião Órfica da Trácia, VII a.C., Grécia Antiga • Literatura apocalíptica – propagação popular • Marca profunda no imaginário popular do fiel – pedagogia do medo e do terror SALVAÇÃO E CONDENAÇÃO modelo de dupla fase Na morte, a alma se separa do corpo e entra numa nova dimensão, chamada “eternidade”. Nesta nova dimensão, a alma da pessoa está sendo julgada por Deus no assim chamado juízo particular. Conforme o resultado deste juízo, a alma ou entra diretamente no inferno, ou, depois de ter passado talvez certo tempo no purgatório (tradição católica), entra no céu. Ela aguarda, numa situação de felicidade ou de tormento, a chegada do juízo final. Quando o momento deste segundo juízo chegar, acontecerá também a ressurreição do corpo e, de novo conforme o resultado dos dois julgamentos, a alma humana, agora reunida com o seu corpo, passará para toda a eternidade numa situação de felicidade total, chamada céu, ou de tormento inimaginável, chamado inferno. VIRADA ESCATOLÓGICA No século XIX, questiona-se o modelo tradicional: 1. Conscientização sobre as raízes pagãs do modelo antropológico binário, 2. Oposição entre o modelo binário helênico-cartesiano e a antropologia bíblica, 3. Consequências do modelo antropológico de Tomás de Aquino (Homem = dualidade, uma única substância, não pode ser dividido), 4. Ligação entre modelo antropológico bíblico e modelo antropológico contemporâneo, 5. Elaboração de novo modelo da morte. SALVAÇÃO CRISTÃ modelo de fase única A morte não é o fim da existência humana, mas o momento de redimensionalização da existência humana. A ressurreição acontece na morte. Depois da morte o ser humano entra num modo de ser que extrapola a esfera espaço-temporal e passa para a realidade eterna de Deus. Assim não se pode dizer que esperamos a ressurreição no final dos tempos. Na eternidade não existe esse final dos tempos cronológico. Por isso a “espera” pela ressurreição final é uma representação equivocada ao modo de existir da eternidade. Não há no mundo dos mortos medida de tempo. Eles já se encontram no mundo da ressurreição. A ressurreição não se dá em “três dias” e nem no “último dia”, mas “hoje”. “Hoje estarás comigo no paraíso” diz Jesus àquele que foi crucificado ao seu lado e que também está morrendo (Lc 23,23). SALVAÇÃO CRISTÃ • • • • • Universalidade da salvação – Rm 5,18; 11,32; 1Tm 2,3-4; 4,10 “Ser salvo” é ter vida em plenitude – Jo 10,10 Salvação não é um conceito abstrato para o fim da vida Salvação é um processo dinâmico que marca a existência humana Deus abre para a pessoa novas dimensões da vida – plenificação e intensificação máxima da vida SALVAÇÃO CRISTÃ • O céu abarca: vida, plenitude da vida, plenificação e intensificação máxima da vida da pessoa, realização de todas as potencialidades da pessoa, ser pessoa plena, viver pleno. • Jesus utiliza imagens de banquetes e casamentos para descrever o céu – Mc 14,25; Mt 8,11; Lc 14,7-14; 16-17 SOBRE O INFERNO • O inferno é o oposto da imagem criada pelo céu • É o distanciamento eterno de Deus Deus não criou o inferno. O distanciamento não é uma ação divina condenatória, mas ação humana com base na sua liberdade. Inferno não é um lugar, mas é o distanciamento voluntário do ser humano do seu Criador. OBSERVAÇÃO Toda a Bíblia é escrita em uma linguagem apelativa e executiva. Isso significa linguagem que recorre a nós e que nos exorta à conversão. A Bíblia, infelizmente, ainda é consultada muitas vezes para buscar informações. Por exemplo: Muitos cristãos buscam informações sobre o inferno na parábola do Rico e Lázaro (Lc 16,19-31). Isso é inaceitável! A escritura não foi redigida em linguagem informativa para aumentar o sabor e satisfazer a curiosidade. Também em suas palavras, Jesus não dá informações sobre o inferno. Mas é verdade que ele diz várias vezes que existe para o homem a possibilidade de falhar no seu destino (Mt 5,22-29, 10,28; 13, 42-50. Mc 9,24ss; Lc 12,5; 13,28). A RESSURREIÇÃO • • • • • • A ressurreição é para o cristão a razão última da existência A ressurreição como redimensionalização e plenificação do humano A morte como acesso à vida nova na comunhão com Deus A ressurreição como ato de fé – seguimento de Jesus Cristo Deus não nos abandona no colapso da morte Deus ressuscitou a Jesus e, do mesmo modo, a nós ressuscitará também (Rm 8,11; 1Co 6,14) A RESSURREIÇÃO O teólogo Medard Kehl utiliza-se, inspirado em Hegel, do tríplice conceito do termo “suprassumir” (aufheben) para explicar o significado da expressão “ressurreição dos mortos”. Para Hegel, diz ele, “suprassumir” significa: (1) conservar; (2) revogar e (3) erguer. Tal conceito tríplice aplicado à ressurreição significa: “(1) O amor de Deus conserva tudo o que é importante na vida pessoal e na história humana para a comunhão com Deus e definitivamente reconciliada no Reino de Deus [...] (2) O amor de Deus revoga tudo o que não pode ser incorporado nessa reconciliação definitiva [...] (3) Todo o ‘fruto’ de nossa vida, digno de conservação, que levamos à consumação é aceito, acolhido pelo amor de Deus e conduzido, por ele, à completa ‘maturação’ (é ‘erguido’)” A RESSURREIÇÃO Compreender a ressurreição de Cristo como realização plena e modelo da nossa ressurreição oferece sentido profundo à existência temporal. O próprio Paulo atestou o fruto desta visão: “Mas se morremos com Cristo, temos fé que também viveremos com ele” (Rm 6,8). Inicia-se já aqui, no esforço da vida cristã em comunidade, o que seremos. E porque cremos já estar em curso o que seremos, os cristãos são chamados, cada vez mais, a testemunhar e concretizar o que seremos: “se vivemos pelo Espírito, procedamos também de acordo com o Espírito” (Gl 5,25; cf. Rm 6,1-7; 8,1-17). “Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim” (Gl 2,20) (cf. 2Co5,15; Fp 1,21). Permitir que “Cristo viva em mim” pressupõe comunhão plena com Deus no seio das relações humanas. ESCATOLOGIA DO MUNDO ESCATOLOGIA DO MUNDO Reflexão sobre a ação de Deus na história e salvação do planeta Será que a terra tem futuro, apesar dos desastres ecológicos e da destruição do meio ambiente? Será que a sociedade como um todo tem sentido, apesar das guerras, injustiças e retrocessos sociais? Será que seremos capazes de superar as inúmeras situações de morte social? ESCATOLOGIA DO MUNDO • Apesar dos pesares, Deus continua dirigindo os acontecimentos • História vista em toda a sua dialética – participação humana • A salvação inclui o universo em toda a sua totalidade (Cl 1,16) • Toda a criação está destinada à plenitude a ser alcançada em Cristo Se a criação de Deus é dádiva do seu amor (1Tm 4,4), nada deve ser tido como impuro em si (Rm 14,14). ESCATOLOGIA DO MUNDO Escatologia engajada e transformadora do mundo Compromisso entre escatologia e realidade histórica Manifestação do extraordinário no ordinário Engajamento em prol do Reino de Deus Vocação para transformação ESCATOLOGIA DO MUNDO Escatologia engajada e transformadora do mundo Esperança em um mundo que perdeu as esperanças “Morte das utopias” Jesus Cristo. Ele é a nossa esperança (Cl 1,27) ESCATOLOGIA DO MUNDO Escatologia engajada e transformadora do mundo Reino de Deus, noção chave de toda a escatologia O Reino do “já e ainda não” (Cullmann) “O Reino de Deus já está entre vós” (Lc 17,21) – não dentro, mas entre ESCATOLOGIA DO MUNDO Escatologia engajada e transformadora do mundo A esperança na realização futura do Reino de Deus transforma o presente “O futuro prometido faz nascer a crise do presente” – Rubem Alves A esperança como motor para transformação ESCATOLOGIA DO MUNDO Escatologia engajada e transformadora do mundo O cristão é chamado a converter o mundo A verdadeira fé desestabiliza estruturas e questiona instituições Os valores do Reino são os critérios de julgamento – a “lógica invertida” ESCATOLOGIA DO MUNDO Escatologia engajada e transformadora do mundo A construção do Reino implica compromisso social e político “Mística de olhos abertos” (Metz) Missio Dei – evangelização e ação social FIM DO MUNDO, PARUSIA E JUÍZO FINAL Devemos pensar nas verdades escatológicas em termos de processo, não de acontecimento. Nesse processo dinâmico, fazem parte não só Deus, mas também os homens e as mulheres da história. De modo que, “o fim do mundo” não é catástrofe cósmica, mas o desaparecimento progressivo e dialético de um mundo antigo, marcado pelo pecado. “Fim do mundo” é processo dinâmico, pelo qual Deus conduz a sua criação ao estado de plenificação (Jo 3,19; 12,31). Tal processo implica uma transformação do cosmo inteiro. FIM DO MUNDO, PARUSIA E JUÍZO FINAL “A parusia de Jesus, no entanto, não significa uma grande encenação mundial com cenário planetário, algum dia, em futuro muito longínquo. Não; é processo que se realiza ‘no meio de nós’ (Lc 17,20ss)” (M. Kehl). “Cristo, de fato, não volta mais como pessoa individual, mas no seu espírito e através dele, numa comunidade de pessoas. Sua vinda se realiza ali, onde o seu espírito pode efetuar a plenificação no homem, pois ele mesmo se tornou espírito (2Co 3,17)” (Ambroos R. van de Walle). FIM DO MUNDO, PARUSIA E JUÍZO FINAL O Juízo Final se revela como sendo a grande dimensão social, estrutural, histórica e cósmica do primeiro encontro da pessoa com Deus. Em nível individual, o Juízo Final é a avaliação da vida humana conforme os critérios de Deus (Mt 25), a partir de todas as consequências sociais, estruturais, históricas e cósmicas que esta vida produziu. Quando o cosmo chegar à sua plenificação, não só as consequências das vidas individualmente vividas serão avaliadas conforme os critérios de Deus. Serão avaliados também todas as estruturas do mundo e o cosmo na sua totalidade. Os critérios para essa avaliação serão os critérios do Ressuscitado. “Então virá o fim, quando ele entregar o Reino de Deus, o Pai, quando houver destruído todo domínio, toda autoridade e todo poder. Pois é necessário que ele reine até que haja posto todos os inimigos debaixo de seus pés. Ora, o último inimigo a ser destruído é a morte. E quando todas as coisas lhe estiverem sujeitas, então também o próprio Filho se sujeitará àquele que todas as coisas lhe sujeitou, para que Deus seja tudo em todos” (1Co 15, 24-26,28). VISITE O MEU BLOG www.teologiadefronteira.wordpress.com CONTATO [email protected]