A Menina Gotinha de Água de Papiniano Carlos «Nos anos 60, Papiniano Carlos publicou A Menina Gotinha de Água, uma obra de literatura infantil que constitui um dos seus maiores êxitos editoriais e é considerada um título responsável pela renovação deste género literário, nomeadamente no que respeita à sua função na educação das crianças. Livro repetidamente reeditado ao longo dos anos, contou com ilustrações de João Câmara Leme , João Nunes e Joana Quental .» in Página da UP dedicada a Papiniano Carlos livro digitalizado aqui e aqui http://www.slideboom.com/presentations/144702/A-menina-gotinha-de-%C3%83%C2%A1gua Era uma vez uma menina chamada Gotinha de Água. A menina Gotinha de Água vivia no mar sem fim. E era linda, tão linda, vestida de esmeralda e luar. Ora no fundo, ora nas vagas coberta de espuma, ela brincava com suas irmãs. Brincava com os peixinhos, dava-lhes beijinhos e beliscões, e fugia a rir por entre as algas, e jogava às escondidas com as anémonas, que são as flores de mil cores que há no mar. Às vezes, vinha até à praia e beijava as pernas e os cabelos dos meninos. Depois, a rir e a cantar ia de novo para o mar, lá para o largo ver as baleias e os navios. E a menina Gotinha de Água, vestida de esmeralda e luar, e tão pequenina, a força que ela tinha de mãos dadas às suas irmãzinhas! Todas juntas eram o Mar. Um dia, a menina Gotinha de Água, vestida de esmeralda e luar, estava a dormir, a sonhar à flor do mar. Então, o Sol beijou-a na face, e logo ela como se voasse subiu no ar. Como se sentia leve! Subiu, subiu, subiu até que se viu numa nuvem cor-de-rosa. Sorriu de contente, olhou em volta e viu milhões de gotinhas como ela boiarem no ar. — Cá estou eu nas nuvens! — disse a Gotinha de Água. Então o Sol de contente sorriu também e ao beijá-la nos cabelos acendeu no céu as sete cores do arco-íris: vermelho alaranjado amarelo verde azul anil e violeta. Era tão lindo! Tempos depois vieram os ventos e disseram à nuvem: — Vamos. E começaram a empurrar aquela nuvem e as outras nuvens que boiavam altas e rosadas sobre o mar. A princípio, a gotinha estremeceu de medo. Mas depois gostou da viagem. E as nuvens viajaram. Eram como grandes navios de algodão em rama. Andaram assim dias e dias sobre o Mar. Até que uma tarde, estava o Sol a espreitar, muito vermelho, lá tão longe que parecia quase atrás do Mar, a menina Gotinha de Água viu que voavam sobre a Terra. Olha as praias lá em baixo! E casas! E meninos a brincar! E estradas e pontes e automóveis e comboios a passar! Depois o vento parou. A gotinha estremeceu quando viu dum lado a outro do céu as nuvens escurecerem como breu. Olhava para baixo e via a terra seca, os campos secos, secas as fontes, as flores e as searas murchas, e os homens tristes, muito tristes sem pão para darem aos meninos. Então, a menina Gotinha de Água que tinha nascido no mar e usava um vestido de esmeralda e luar, pensou: E se eu fosse dar de beber às flores, aos campos, se eu fosse matar a sede e a fome aos homens e aos meninos? E disse muito alto às suas irmãzinhas — Vamos. E deixou-se cair. Ia à frente de milhões de gotinhas todas vestidas de esmeralda e luar A menina e sorriam, Gotinha de Água cantavam pousou e assobiavam enquanto caíam. mesmo na boca duma flor que sorrindo feliz lhe disse: — Bendita! Bendita sejas! E logo uma abelha, que andava por ali em busca de pólen para fazer mel, pousou numa pétala da linda flor e falou-lhe assim: Bom dia, meu amor. Queres tu dar-me um pouquinho do teu pólen para os meus favos? E a flor de pétalas de ouro abertas e cobertas de gotinhas de água, todas vestidas de esmeralda e luar, só lhe disse: — Leva o pólen que quiseres para o teu mel! gotinha azul do Mar que foi nuvem no ar, chuva abençoada, fonte a cantar, ribeiro a saltar, rio a correr, e que volta à sua casa no Mar onde vai descansar, dormir e sonhar antes que de novo torne a ser nuvem no ar, chuva abençoada, fonte a brotar, ribeiro a saltar, rio a correr e Mar uma vez mais. «Eu sou a menina Gotinha de Água»