A qualificação profissional do ACS no estado do RS: possibilidades e desafios Fernanda Carlise Mattioni Thaís Ferreira Cornely Andrea Milan Vasques Pautasso Naia Cloe Aenlhe Correa Andiara Cossetin Rua: Dr. Nelson Duarte Brochado, nº 09 Porto Alegre – RS Fone: 3901-1508 [email protected] INTRODUÇÃO Ampliação e investimentos na qualificação da Atenção Básica em Saúde – AB. Portaria 2.488/2011 – Política Nacional da Atenção Básica (PNAB): A AB “é desenvolvida com o mais alto grau de descentralização e capilaridade, próxima da vida das pessoas. Ela deve ser o contato preferencial dos usuários, a principal porta de entrada e centro de comunicação da Rede de Atenção à Saúde” (BRASIL, 2011). As Redes de Atenção à Saúde, por sua vez, caracterizam-se pela formação de relações horizontais entre os pontos de atenção com o centro de comunicação na Atenção Básica (BRASIL, 2010). A AB legitima-se como o serviço de saúde a ser acessado prioritariamente pelos usuários e o ponto da Rede de Atenção à Saúde responsável por promover a coordenação do cuidado de indivíduos e famílias, de acordo com suas necessidades de saúde. Frente ao rearranjo proposto a organização dos serviços: necessidade de qualificação da AB, para que possam responder aos desafios apresentados; a qualificação da AB perpassa principalmente a qualificação dos trabalhadores da AB; Com relação aos Agentes Comunitários de Saúde, identificou-se a necessidade de uma proposta sistematizada de qualificação, a fim de contemplar as necessidades e peculiaridades desta profissão que até então não possuía a possibilidade de formação prévia ao ingresso nos serviços de saúde. Lei 11.350/2006 regulamente a profissão do ACS e prevê a realização do Curso de Formação Inicial e Continuada como requisito para o ingresso ao exercício profissional. Não fica explícita a maneira como deverá ocorrer essa formação inicial e continuada; Portaria nº. 2.662/2008, propõe a qualificação profissional (400h) dos ACS que já estão em serviço com o intuito de aprimorar suas práticas no contexto das equipes de AB/ESF no país. O curso ainda não foi executado maciçamente no RS (8.802 ACS – DAB/2012). Em julho deste ano iniciaram quatro turmas com ACSs de Porto Alegre. OBJETIVOS Objetivo Geral: Analisar a proposta de qualificação profissional do ACS no estado do RS. Objetivos Específicos: •Descrever a proposta de qualificação profissional do ACS no estado do RS; •Conhecer os principais nós-críticos que impedem a execução da proposta no estado; •Identificar as potencialidades e as possibilidades para a execução da proposta no estado. METODOLOGIA Optou-se pelo método qualitativo de pesquisa. Foram utilizados dados secundários (livros, artigos científicos, legislação da área, registros escritos acerca do percurso para a construção da proposta de qualificação dos ACS). Os dados foram analisados por meio da análise de conteúdo (Minayo, 2009), que deu origem às categorias empíricas: •trajetória da formação do ACS no RS; •nós-críticos para a formação profissional do ACS no RS; •possibilidades para a formação profissional do ACS no RS. RESULTADOS Trajetória da formação do ACS no RS Constituição da profissão do ACS: transição entre uma função de liderança comunitária e uma profissão da saúde; O ACS aprendia em serviço, mas sem uma sistematização e uma orientação nacional e estadual acerca de como deveria ser esse aprendizado; O curso de formação inicial e continuada, previsto na Lei 11.350/2006 para ser realizado previamente ao início do exercício profissional é realizado no RS após o ingresso dos profissionais nas equipes de AB/ESF, ou em muitos casos, acaba não ocorrendo, por não haver uma orientação clara de quem é responsável por realizar a referida formação. Realização de uma parceria piloto entre a Coordenação Estadual da ESF, a Escola Técnica do SUS/Escola de Saúde Pública e um município da região metropolitana do estado para a realização da formação inicial e continuada. Essa parceria foi constituída na lógica do Apoio Institucional: -Formação de GT com integrantes das instâncias citadas; -Construção da proposta teórico-metodológica (definição de conteúdos mínimos); -Realização do curso pelo GT; - Avaliação positiva: conteúdos abordados pertinentes a AB/ESF/realidade local e metodologias ativas; - Indicativo de formalização, por meio de portaria estadual, da proposta realizada, possibilitando reproduzir em outros municípios. Qualificação Profissional do ACS (400h): Criação tardia da ETSUS/RS: março/2008, por meio do Decreto Estadual 45.560, vinculada a ESP/RS. Última ETSUS criada no território nacional, especificamente para responder a demanda de Qualificação profissional dos ACS e a realização dos cursos técnicos do PROFAPS. Nesse contexto iniciaram as discussões para a realização da qualificação profissional dos ACS: -No âmbito da ETSUS/ESP/SES; -Nos fóruns de discussão e decisão: FAMURS, ASSEDISA e CIB/RS; Tomada a decisão política de não implementar o Curso Técnico em ACS no contexto da SES/RS. Para Morosini et al (2007) a (não) escolarização do ACS, justificada pela necessidade de esse trabalhador ser representativo da comunidade em que atua, denota a desvalorização da dimensão conceitual de sua qualificação, o que fortalece a desvalorização social desse trabalhador, sustenta a sua baixa remuneração e se contrapõe à pauta política por uma melhor qualificação dos trabalhadores da saúde, de uma maneira geral. Formou-se um GT constituído por servidores técnicos da ETSUS/ESP que coordenava o trabalho, de demais setores da SES e de municípios, principalmente da região metropolitana. O GT tinha a incumbência de construir o plano de curso e o respectivo material didático. O GT conseguiu construir dois produtos: o plano de curso, ainda precisando de ajustes e parte do material didático, ainda bruto. Mudança de governo em 2011: outras estratégias foram adotadas para a implementação dos cursos. Início da Qualificação dos ACS para quatro turmas (aproximadamente 120 ACSs) de Porto Alegre, com os recursos disponíveis na própria ETSUS/ESP (ainda em andamento). Não há previsão de início de novas turmas em função dos motivos apresentados a seguir. Nós-críticos para a formação profissional do ACS no RS Constituição tardia da ETSUS/RS: muitos processos a serem construídos para fortalecê-la como uma escola de educação profissional capaz de oferecer cursos de qualificação e de formação técnica com qualidade e condizentes com a realidade dos serviços de saúde, considerando as especificidades regionais. Número reduzido de trabalhadores na ETSUS: duas pedagogas, uma enfermeira e uma psicóloga que assumem a coordenação cursos técnicos integrantes do PROFAPS, de um Curso de Redução de Danos e do Curso de Qualificação dos ACS. As quatro trabalhadoras se revezam para ministrar as aulas no Curso de Qualificação dos ACS, contando com a solidariedade de servidores de outros setores do estado para compor o restante das aulas. Dificuldade de efetivar a contratação de docentes decorrente de uma interpretação, por parte dos órgãos de fiscalização que compõe a estrutura administrativa do estado, de que as atividades docentes deveriam ser realizadas, em sua totalidade, pelos servidores do próprio estado. Tramitação morosa dos processos de licitação na estrutura administrativa do estado. Fragilidade no dialogo entre Escola e órgãos fiscalização do estado no sentido de expor especificidades e características deste tipo Qualificação e argumentar acerca da importância sua realização. de as de de Falta de empoderamento e autonomia da equipe de trabalhadores da ETSUS/RS para protagonizar os processos decisórios. Possibilidades para a formação profissional do ACS no RS Sistematização do Curso de Formação Inicial e Continuada (Lei 11350/2006), por meio da publicação de uma Portaria Estadual que defina os conteúdos mínimos e sugira metodologias ativas para a realização do Curso; Disponibilidade do estado para prestar Apoio Institucional aos municípios para a realização do Curso; Possibilidades para a formação profissional do ACS no RS Empoderamento da equipe de trabalho da ETSUS/RS: •aumento do número de trabalhadores na escola; •qualificação pedagógica destes trabalhadores, que, em sua maioria possuem formação na área da saúde; •reestruturação do arranjo institucional, por redefinição dos papéis e relações no trabalho. meio da •constituição de uma força instituinte por parte da equipe da ETSUS, capaz de provocar questionamentos, discussões e reestruturação acerca do que está instituído em termos hierarquia, fluxos, métodos de comunicação, com o intuito de prover maior autonomia a equipe . Protagonismo por parte dos gestores e trabalhadores da escola para estabelecer e reforçar o diálogo e a parceria com a Coordenação da Atenção Básica/ESF – DAS, com as 19 Coordenadorias Regionais de Saúde, com as CIES; Viabilizar a coordenação conjunta do Curso de Qualificação dos ACS em cada Coordenadoria Regional de Saúde, lançando mão do Apoio Institucional como mediador da relação entre os atores; Contratação regional de docentes; reforçar o diálogo e parceria com as demais instituições públicas formadoras do estado que atuam na educação profissional no que tange: •a infraestrutura •ao apoio técnico •ao aporte teórico-metodológico •e principalmente a certificação, se o debate avançar para a possibilidade de constituição de um Curso Técnico em ACS, realizado pela ETSUS/ESP-RS. Destaca-se a Escola do Grupo Hospitalar Conceição, como potencial para parcerias institucionais. A escola GHC formará a primeira turma de técnicos em ACS no início do próximo ano. a retomada da discussão da oferta do Curso Técnico em ACS nos fóruns de discussão e deliberação competentes; •esta retomada depende da capacidade de organização e articulação de trabalhadores e gestores que compreendem a importância desta formação para a qualificação de suas práticas na AB/ESF; •Dentre esses trabalhadores, destacam-se os próprios ACS, que com sua capacidade de mobilização podem trazer a tona novamente essa discussão. A educação profissional de nível técnico, ao ser proposta para os ACS, incide sobre um contexto de formação aligeirada e abreviada, realizada geralmente em serviço, sem requisitos prévios de escolaridade ou de carga horária. Essa nova proposta sinaliza com um cenário futuro mais positivo para a qualificação profissional desses trabalhadores (Morosini, et al 2007). Reitera-se a importância de que essa formação seja realizada por instituições de ensino preparadas e comprometidas com um ensino de qualidade, capaz de superar a educação bancária e a reprodução de práticas educativas desconectadas do contexto de trabalho, risco que se corre ao se delegar a iniciativa privada a responsabilidade de realização destes Cursos. Nada é impossível de mudar Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo. E examinai, sobretudo, o que parece habitual. Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural, nada deve parecer impossível de mudar. Bertold Brecht REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAREMBLITT, G.F. Compêndio de análise institucional e outras correntes: teoria e prática. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1992. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria 2.488 de 21 de outubro de 2011. 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