ESTUDO COMPARATIVO DO ENCRUAMENTO E DA RECRISTALIZAÇÃO DOS AÇOS RÁPIDOS AISI M2 E ABC III Fabio Stagetti Angelo Fernando Padilha Clara Herrera Pulgarín 1. INTRODUÇÃO 2. MATERIAIS E MÉTODOS 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 4. CONCLUSÕES INTRODUÇÃO Os aços rápidos mantém dureza elevada (1000 HV – 65 a 75 HRC) durante o corte de materiais em altas velocidades. São utilizados para fabricação de ferramentas de corte (fresas, brocas, serras etc.) que necessitam de elevada resistência ao desgaste e manter a dureza elevada em altas temperaturas (48 HRC em 593ºC). Quando temperados e revenidos apresentam microestrutura composta de carbonetos primários e uma matriz de martensita reforçada de carbonetos secundários. Classificação AISI (American Iron Steel Institute): • Grupo M – aços rápidos ao molibdênio ou molibdênio-tungstênio Principais elementos de liga: Mo, W, Cr, V, Co e C. • Grupo T – aços rápidos ao tungstênio Principais elementos de liga: W, Cr, V, Co e C. Atualmente, aços semi-rápidos, contendo menores quantidades de elementos de liga são bastante utilizados devido a sua favorável relação custo/benefício. A produção dos aços rápidos envolve fusão, fundição, deformação plástica a quente e a frio e tratamentos térmicos. A microestrutura bruta de fundição é constituída de dendritas de austenita e de uma rede de carbonetos primários interdendríticos. Para otimizar a microestrutura, as propriedades e o desempenho do material, os lingotes são trabalhados mecanicamente para quebrar a rede de carbonetos. Como resultado, o material trabalhado e recozido apresenta carbonetos dispersos numa matriz ferrítica. Principais tipos de carbonetos: • MC – Principalmente vanádio (pode ter Zr, Nb e Ti) São carbonetos primários. Estrutura CFC • M6C – Principalmente tungstênio e molibdênio (pode ter Cr e V) Também são carbonetos primários. Estrutura CFC • M23C6 - Geralmente é cromo, mas pode dissolver W e Mo São carbonetos secundários. Estrutura CFC • M2C - Principalmente tungstênio e molibdênio São carbonetos secundários. Estrutura HC Microestrutura do aço AISI M2 recozido Ataque eletrolítico com 1% ácido crômico Aumento: 2000 x Processo de laminação a frio: Produto – serra fita para metais Durante a laminação a frio dos aços, ocorre endurecimento por deformação (encruamento), a dureza aumenta e a ductilidade diminui, dificultando a deformação. Os aços rápidos apresentam um encruamento muito alto devido à alta quantidade de carbonetos, que dificultam a mobilidade das discordâncias. Após a deformação a frio, com o intuito de amolecer o material encruado, é realizado um recozimento sub-crítico, abaixo da temperatura Ac1, no qual ocorre a recristalização. As temperaturas de transformação Ac1 e Ac3, para o aço M2 são, respectivamente 810ºC e 850ºC. MATERIAIS E MÉTODOS Materiais utilizados: Aços rápidos denominados AISI M2 e ABC III de procedência alemã. AISI M2: espessura do material laminado a quente: 3,20 mm ABC III: espessura do material laminado a quente: 2,90 mm Especificação de composição química: DIN EN ISO 4957 (% em massa) C Mn P S Si Cr Mo V W M2 0,86 a 0,94 0,40 máx. 0,03 máx. 0,03 máx. 0,45 máx. 3,80 a 4,50 4,70 a 5,20 1,70 a 2,10 5,90 a 6,70 ABC III 0,95 a 1,03 0,40 máx. 0,03 máx. 0,03 máx. 0,45 máx. 3,80 a 4,50 2,50 a 2,90 2,20 a 2,50 2,70 a 3,00 Curvas de endurecimento por deformação: Os aços foram laminados em temperatura ambiente, com reduções de espessura variando entre 3% e 50%, em um laminador industrial. As amostras obtidas foram usadas para determinar as curvas de endurecimento por deformação. Ensaio de dilatometria: Objetivo foi determinar as temperaturas de transformações dos aços. A partir das tiras laminadas a quente, foram usinados corpos-deprova com formato cilíndrico. Cada amostra foi aquecida até 1050°C, permanecendo por 1 minuto e, em seguida resfriada ao ar. Foi utilizada taxa de aquecimento de 1°C/s para cada amostra. Curvas de recozimento isotérmico: Foram determinadas curvas de recozimento isotérmico, onde as amostras com 25% de redução foram recozidas a 750°C, com duração de 15, 30, 60, 120, 240 e 480 minutos. Curvas de amolecimento: Amostras com 25% de redução foram submetidas a recozimentos com duração de 1 hora, em temperaturas entre 100ºC e 750ºC. Foi utilizado forno mufla de laboratório com aquecimento resistivo e o resfriamento foi em água. Caracterização microestrutural: Foram realizadas com o auxílio de microscopia eletrônica de varredura, onde foram utilizados elétrons secundários (SE) e retroespalhados (BSE). Foram realizadas também análise por dispersão de energia (EDS) para caracterização dos carbonetos e (EBSD) para verificar detalhes microestruturais da evolução da recristalização. Ensaios mecânicos: Foi realizado ensaio de tração para caracterização das amostras no estado “como recebido”. O ensaio de dureza foi realizado na determinação das curvas de endurecimento por deformação e na avaliação das amostras após recozimento. A carga utilizada foi de 10 kg. RESULTADOS E DISCUSSÃO Caracterização das amostras no estado “laminado a quente”: Composição química: (% em massa) C Mn P S Si Cr Mo V W AISI M2 0,904 0,365 0,026 0,001 0,294 4,310 4,500 1,780 6,710 ABC III 0,950 0,473 0,022 0,002 0,319 4,090 2,720 2,280 2,810 O aço AISI M2 apresenta maiores teores de Mo e W, enquanto que o aço ABC III apresenta maior teores de C e V. Demais elementos apresentam teores similares. Caracterização das amostras no estado “laminado a quente”: Microscopia eletrônica de varredura: AISI M2 e ABC III AISI M2 - Nital 3% - Aumento: 3000x ABC III – Nital 3% - Aumento: 3000x Caracterização das amostras no estado “laminado a quente”: Microscopia eletrônica de varredura (SE e BSE) : AISI M2 SE – Nital 3% - Aumento: 3000x BSE – Nital 3% - Aumento: 3000x Caracterização das amostras no estado “laminado a quente”: Identificação dos carbonetos (EDS): AISI M2 Carbonetos constituídos principalmente por V (tipo MC) Caracterização das amostras no estado “laminado a quente”: Identificação dos carbonetos (EDS): AISI M2 Carbonetos constituídos principalmente por W (tipo M6C) Caracterização das amostras no estado “laminado a quente”: Microscopia eletrônica de varredura (SE e BSE) : ABC III SE – Nital 3% - Aumento: 3000x BSE – Nital 3% - Aumento: 3000x Caracterização das amostras no estado “laminado a quente”: Identificação dos carbonetos (EDS): ABC III Carbonetos constituídos principalmente por V (tipo MC) Caracterização das amostras no estado “laminado a quente”: Identificação dos carbonetos (EDS): ABC III Carbonetos constituídos principalmente por W (tipo M6C) Caracterização das amostras no estado “laminado a quente”: Propriedades mecânicas: Dureza Vickers (HV10) Limite Resistência (MPa) Limite Escoamento (Mpa) Alongamento % (A080) AISI M2 249,8 781 398 14,6 ABC III 242,6 795 421 14,9 Observa-se grande similaridade nos resultados encontrados. Caracterização das amostras no estado “laminado a quente”: Ensaio de dilatometria: AISI M2 e ABC III 160 120 815°C Dilatação (mm) 880°C 80 40 0 Material: Aço ABCIII l0=11,52mm Taxa de aquecimento: 1°C/s 200°C -40 0 200 400 600 T (°C) 800 1000 Caracterização das amostras no estado “laminado a quente”: Ensaio de dilatometria: Resumo Tx. Aq. (ºC/s) Ac1 (ºC) Ac3 (ºC) Ms (ºC) AISI M2 1 825 880 250 ABC III 1 815 880 200 Endurecimento por deformação: Laminação a frio Curvas de Endurecimento por Deformação Dureza (HV10) 355 345 335 325 315 305 ABC III 295 M2 285 275 265 255 245 235 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 Redução (%) Curvas de amolecimento: Curvas de Amolecimento - 1 hora Dureza (HV10) 340 330 320 310 300 ABC III 290 M2 280 270 260 250 0 100 200 300 400 500 600 700 800 Tem peratura (ºC) Nota-se na etapa final de amolecimento uma maior resistência do aço ABC III. Curvas de recozimento isotérmico após 25% de deformação: Recozimento Isotérmico - 750 ºC Dureza (HV10) 325 320 315 310 305 300 295 ABC III 290 M2 285 280 275 270 265 260 255 0 50 100 150 200 250 300 350 400 450 500 Tem po (m in.) Nota-se que o aço AISI M2 apresenta recuperação e recristalização levemente mais rápidas em comparação ao aço ABC III. Análise com difração de elétrons retroespalhados : Microtextura Aço ABC III – recozido a 750 ºC por 1 hora Nota-se a presença de precipitados (regiões escuras) de grãos recristalizados e de subgrãos. Evidências de recristalização incompleta. Análise com difração de elétrons retroespalhados : Mesotextura Aço ABC III – recozido a 750 ºC por 1 hora Presença de contornos de alto ângulo (linhas escuras) e contornos de baixo ângulo (linhas vermelhas). Evidências de recristalização incompleta. Efeito da presença de partículas na recristalização: O comportamento da recristalização de uma liga contendo precipitados indeformáveis plasticamente depende basicamente do diâmetro médio das partículas e do espaçamento interpartículas. Durante a deformação de uma liga com partículas grosseiras (maiores do que 1 µm) e indeformáveis, ocorre uma deformação acentuada nas vizinhanças dos precipitados, pois a deformação é acomodada somente na matriz. A nucleação da recristalização é favorecida nessas regiões devido à alta desorientação do reticulado. Partículas com diâmetro médio inferior a 1 µm e homogeneamente distribuídas, causam maior homogeneidade na distribuição de defeitos e ancoramento dos sub-contornos. Esses dois efeitos podem dificultar a nucleação da recristalização. Efeito da presença de partículas na recristalização: Outro parâmetro importante na análise do efeito de dispersões de partículas na recristalização é a distância média entre precipitados. Partículas maiores tem efeito retardador quando é pequeno o espaçamento entre elas, sendo que, a medida que o espaçamento aumenta, o efeito passa a ser acelerador. Pode-se concluir que o único caso em que a presença de soluto ou impurezas acelera a recristalização é quando eles estão presentes na forma de partículas grosseiras (suficientemente espaçadas) antes da deformação e do recozimento. Dispersões finas de precipitados presentes antes da deformação ou precipitação durante a recuperação ou a recristalização atrasam a recristalização. Efeito da presença de partículas na recristalização Pode-se supor que os carbonetos primários presentes nas microestruturas dos dois aços estudados neste trabalho podem, devido às suas dimensões, atuar como estimuladores da recristalização ao seu redor. Por outro lado, o pequeno espaçamento entre precipitados e a eventual precipitação durante o recozimento após a deformação a frio podem contribuir para atrasar a recristalização. A maior resistência ao amolecimento apresentada pelo aço ABC III, em comparação com o aço AISI M2, pode ser explicada pelo seu teor mais alto de carbono. Conforme foi mencionado anteriormente, o menor espaçamento entre partículas e a ocorrência de precipitação durante a recuperação podem atrasar a recristalização. CONCLUSÕES As análises microestruturais dos aços ABC III e AISI M2 no estado “como recebido” mostram que, tanto a morfologia quanto a distribuição dos carbonetos são diferentes entre os dois aços. Os dois aços apresentaram curvas muito similares de endurecimento por deformação. Durante o recozimento das amostras encruadas, verifica-se que o aço AISI M2 apresenta recuperação e recristalização levemente mais rápidas quando comparado com o ABC III. A análise das curvas de amolecimento mostrou que na etapa final do amolecimento, ou final de recristalização, os dois aços apresentam diferenças significativas. Utilizando-se análises por difração de elétrons (microtextura e mesotextura) observou-se que o aço ABC III apresenta recristalização incompleta, quando recozidas a 750 ºC por 1 hora. Muito obrigado pela atenção! www.brasmetal.com.br