Imagem de Lisajen-stock http://lisajen-stock.deviantart.com/ Anos 80 do séc. XX: primeira notícia. Anos 90: consciência da necessidade de intervenção psicossocial. Deportados tinham/têm em comum: o nascimento nos Açores; uma vida construída na América do Norte; uma relação muito ténue com a terra natal; uma identificação cultural forte com o país de residência; um ou mais crimes cometidos. um grande desconhecimento da língua; um sotaque característico acentuado; um modo de vestir e calçar muito próprio dos países onde tinham crescido; tatuagens no corpo; modo de estar ou muito reservado ou bastante desabrido. Trabalho humanitário da Igreja. Intervenção do Governo. Medidas transversais, envolvendo a administração pública, o movimento associativo, as organizações privadas, as instituições particulares de solidariedade social. perdidos e incrédulos… cheios de interrogações… mãos vazias… malas onde cabiam todas as suas vidas. Memórias dolorosas. Famílias desestruturadas ou indiferentes. Desconhecimento da língua portuguesa. Afectivamente “não-portugueses” Culturalmente “não-portugueses” Por quê o regresso à ilha? Era o berço desconhecido mas recomendado por pais ou avós Era o aeroporto para onde eram mandados. O primeiro acolhimento foi o Centro Paroquial de S. José. Indicadores de pertença “estrangeira” e desenraizamento: estatuto socioeconómico destes cidadãos, comportamentos facilmente identificáveis, diferenças na comunicação e nas acessibilidades, níveis elevados de stress fragilidade versus agressividade dificuldades de socialização e auto-isolamento sugeriam identidades abandonadas (Butler, 2003), (re)construídas – ou não, por opção persistente através da sua interacção com o ambiente sociocultural (Lewin, 2001). despertar-lhes o gosto pela construção de uma nova vida; incentivá-los a tecer um projecto; dar-lhes reconhecimento social em dois planos diferentes: o reconhecimento do outro (diversidade); e o reconhecimento de si na categoria de ser humano (Gattino et alii, 2008: 31). Primeiras entidades oficiais a tomar as rédeas da problemática das deportações: Direcção Regional das Comunidades Instituto de Acção Social, CAR (Criação de uma equipa multidisciplinar) Necessidade de avançar para outro patamar, mais transversal, mais abrangente, mais exigente, mais profissional. governo, autarquias, empresas, instituições particulares de solidariedade social A Presidência do Governo chamou a si a concertação transdisciplinar com os diferentes departamentos: saúde, segurança social, educação, trabalho e qualificação profissional, acção social, habitação, transportes. Estratégia desenvolvida pelo Governo dos Açores articulou acção pública e de solidariedade social sob um desígnio: devolver a dignidade aos cidadãos. Protocolos diversos com entidades privadas detentoras de conhecimentos técnicos. Autarquias e empresas colaboraram abrindo portas a estágios. Acolhimento no aeroporto era feito pelo órgão operativo da Presidência (Direcção Regional das Comunidades). Informação imediata da existência de serviços para os ajudar em assuntos tão simples mas tão complexos como a obtenção do Bilhete de Identidade, do Número de Segurança Social. Contactos úteis. Instituto de Acção Social encontrava abrigo quando a inexistência ou fragilidade dos laços familiares não permitiam alojamento e facultava apoio para a alimentação. Saúde: rastreio médico e consulta de especialidade quando necessária – e era necessária muitas vezes. Ensino: curso de língua portuguesa. Trabalho: disponibilizava-se instrutor para ofícios quando as competências profissionais não indicavam a possibilidade de emprego. Todas estas facilidades eram apresentadas aos cidadãos e às cidadãs: A rejeição de ajuda levava à responsabilização individual. A aceitação conduzia a um processo de negociação em que o indivíduo colaborava com as instituições no seu projecto de vida e assumia deveres em contrapartida aos direitos adquiridos. As negociações revelavam-se complexas: carregavam o peso de todo um passado numa terra por vezes idolatrada – Estados Unidos ou Canadá – outras renegada (menos frequentemente) pela expulsão. O ressentimento dirigido a Portugal era mais ou menos constante, irracional e veemente: “Portugal não nos devia ter aceitado de volta. Se não nos aceitasse, ainda estaríamos lá.” As emoções sobrepunham-se até à aceitação encontrar lugar – o que nem sempre aconteceu. Suicídio. Crimes. Droga. Prisão. Doenças. Morte. Vida. Projectos. Amizades. Construção. Amor. Dignificação. Salvamento. Há quem continue em risco, por opção. Alguns são filhos pródigos. Muita da integração alcançada teria sido impossível se não tivesse encontrado o acolhimento destas equipas transdisciplinares . Uma certeza brilha, lá ao longe, no horizonte: com a queda da emigração, a geração dos deportáveis tem os seus dias contados. Entretanto, o lema é ainda o que sempre foi: enquanto alguém se inserir, terá valido a pena o esforço. Alzira Silva Imagem de Lisajen-stock http://lisajen-stock.deviantart.com/ 13/09/2011