REDAÇÃO POESIA MARGINAL E CONTRACULTURA MARTA DUWE SOCIEDADE DE ESPECIALISTAS ROSZAK (1972[1969]): cujos valores definem as sociedades desenvolvidas, sejam elas capitalistas ou socialistas, e cujos métodos de dominação se aperfeiçoam a ponto da força física não ser necessária; nestas sociedades a dominação é feita principalmente na esfera da criação de subjetividade e do desejo. CONTRACULTURA Caracteriza-se, tanto na esfera comportamental quanto na artística, pela oposição ao Sistema e aos valores tecnocráticos e científicos que servem de base para a civilização ocidental, mas também pela apresentação de novas formas de sociedade. CONTRACULTURA O nascimento da contracultura se dá com a publicação do poema “Howl”, de GINSBERG, Allen (1956) - beat generation - precursores ideológicos dos hippies (que só surgiram nos anos 60); Ambas as tribos eram adeptas da filosofia do Drop Out, ou seja, ao invés de tentar lutar por mudanças no sistema, preferiam cair fora e “curtir a vida” como bem entendessem. CULTURA E CONTRACULTURA Analogia: Cultura de massa produzida pelo Sistema = correnteza de um rio, despejando bens simbólicos em toda massa consumidora, impondo seus valores. Este é o Mainstream, a corrente central. Paralelamente a esta corrente existe uma contra-corrente = a contracultura, criticando os valores da primeira, e localizada à margem da sociedade. Seus atores dificilmente têm voz nos meios de comunicação e, por isso, seus valores são marginalizados pela sociedade em geral. CONTRACULTURA Firmou-se em cima do tripé sexo, drogas e rock´n´roll. Importância do antagonismo entre gerações. Uma dualidade jovem / não-jovem foi muito importante para a definição do que era a contracultura, foi então que a juventude passou a se organizar como um poder político autônomo. CONTRACULTURA Janis Joplin, Jimmi Hendrix ou Jim Morrison; todos morreram jovens e devido ao uso excessivo de entorpecentes. Tais excessos são o lado negro da contracultura, o calcanhar de Aquiles responsável pela derrocada final. ADELMAN: (...) a contracultura é frequentemente acusada de abrir o espaço para sua própria cooptação: sua ética do prazer é vista não como resistência senão como "hedonismo", e portanto como expressão da lógica do capitalismo tardio e seu subsequente marketing de estilos de vida. CONTRACULTURA Na época os artistas não visavam o mercado e a arte era em geral autoral. Além disso, muitas vezes o mercado era evitado e substituído, em geral, por mercados alternativos. A cooptação e reprodução do hedonismo presente no movimento não coube aos seus participantes e foi feita justamente por quem eles combatiam. Atualmente é possível comprar “pastiches” da contracultura em bancas de jornal ou mesmo sem sair de casa, através da internet. CONTEXTO HISTÓRICO A destruição de Hiroshima por uma artefato atômico, além de acabar definitivamente com a II Guerra Mundial, colocou o fim do mundo, ou pelo menos sua possibilidade, à distância de um botão. O apocalipse nunca esteve tão perto das mentes e dos corações humanos. Os Estados Unidos se firmaram como a maior potência do mundo capitalista. Entretanto, a situação de crise econômica enfrentada pelos países europeus, poderia se tornar uma ameaça à prosperidade norte-americana, já que um grande mercado consumidor fora arrasado pela guerra. CONTEXTO HISTÓRICO Nesse contexto, a “Doutrina Truman” surgiu como uma solução viável, promovendo tanto a recuperação econômica dos aliados europeus quanto, no âmbito interno, a estimulação da capacidade aquisitiva da população norte-americana. No cenário da Guerra Fria, o consumismo norteamericano era considerado a melhor forma de afastar o “perigo comunista”. Sentimento generalizado de niilismo Abundância econômica do período pós-guerra CONTEXTO HISTÓRICO A consolidação de uma indústria cultural é indispensável para o poder tecnocrático; através dela, se difundem a idéia de uma sociedade de especialistas, junto com os valores de integração organizacional, modernização, eficiência, racionalidade e necessidade. O totalitarismo tecnocrático se baseia em técnicas subliminares, em grande parte, realizadas através da indústria cultural. O ‘novo autoritarismo’ da tecnocracia tem um poder absorvente: a capacidade de proporcionar satisfação de uma maneira que gera submissão e depaupera o protesto. A partir da década de 50, a emergente sociedade de consumo passou a abarcar um novo mercado com o surgimento da cultura jovem. A cultura da juventude, apesar de tender à insatisfação e revolta com os valores mais arcaicos da sociedade, ainda era um tanto ingênua no seu surgimento, ligada ao fenômeno do rock’n’roll que, apesar de chocante para os padrões morais da época, não era politicamente engajado, falando sobre carros e relacionamentos amorosos. Ainda assim, as mudanças introduzidas pela cultura jovem, passaram a ser assimiladas pela indústria cultural e, consequentemente divulgadas através dos meios de comunicação podendo atingir os diversos países do globo, inclusive o Brasil. A cultura jovem brasileira dos anos 50 sofreu uma influência direta dos Estados Unidos, O Brasil havia entrado na onda da industrialização, com a política desenvolvimentista de Juscelino Kubitschek, Incorporação da cultura estrangeira à cultura nacional, propiciando o surgimento de novos movimentos, como a bossa nova. O rock’n’roll também chegou ao Brasil através do cinema e seus sucessos foram regravados por cantores e cantoras brasileiras. Foi somente a partir dos anos 60 que a juventude se mostrou mais engajada e politizada. A guerra do Vietnã e os movimentos negros motivaram os jovens a lutar pela transformação da sociedade. Esse quadro político e social propiciou o aparecimento da canção de protesto, mas, ao mesmo tempo houve a ascensão do rock britânico através de bandas como os Beatles e os Rolling Stones. Houve dois momentos que influenciaram um milhão de jovens através do globo, por sua contestação de valores, rebeldia e uma nova forma de contestação: Woodstock e o Maio de 68 na França. CONTEXTO HISTÓRICO No Brasil: “DESBUNDE”: Gíria inventada no Brasil, durante os anos 60, para designar quem abandonava a luta armada. Ela foi evoluindo e passou a designar não só quem tivesse abandonado a resistência ao regime militar governante da Nação, mas toda figura interessada em contracultura a ponto de viver seus ideais. Portanto foi inventada pela esquerda, mas seu emprego foi muito além de círculos trotskistas ou marxistas. BRASIL 1968 - A.I.5: foi instaurada a CENSURA A repressão política fechou partidos políticos, empastelou jornais além de prender, torturar e até matar vários militantes. Ser produtor de cultura nesta época não era nada fácil e até mesmo arriscado. Muitos foram exilados, mas outros tiveram destinos mais cruéis, como foi o caso do cantor Geraldo Vandré, que ficou para sempre aleijado depois de passar por torturas. A indústria cultural abriu suas portas para alguns e destes era exigida a submissão à censura, praticando assim, uma autocensura. BRASIL Sistema repressivo X Resistência: A LUTA ARMADA foi uma forma violenta de resistir que conseguiu atrair jovens para a vida na clandestinidade. No campo da cultura: recusar a nova indústria cultural, símbolo do progresso conquistado pelo regime autoritário. Inspirados nos movimentos contraculturais, ocorridos principalmente nos Estados Unidos durante os anos 60, alguns produtores culturais encontraram a saída para produzir sem atrelar-se a indústria cultural nos MERCADOS ALTERNATIVOS. Escolhendo produzir de forma artesanal para segmentos específicos, mas limitados, da população. A luta armada era quem ganhava os louros por resistir heroicamente ao regime militar; seus participantes viviam na clandestinidade para buscar o utópico objetivo de depor o sistema vigente. Já a contracultura nunca pretendeu tomar o poder, ou procurar um modelo de sistema melhor; seus ideais eram mais simples, podendo ser sintetizados em um único pensamento: cair fora do sistema. O período dos anos 70 é marcado pela consolidação da Industria Cultural no Brasil e a lógica da procura de lucro tornou-se vigente com esta consolidação. A Rede Globo torna viável um projeto de integração nacional através da televisão. Novas tecnologias transformam o jornalismo impresso, o mercado editorial e o cinema. Os produtos finais dessas indústrias ganharam ótimos acabamentos, antes só encontrados nos exemplares importados. A classe média gozava com os vários produtos modernos e bens simbólicos tornados acessíveis pela prosperidade econômica, embarcando na onda do consumismo. Este é o período das conquistas do regime militar, que legitimou o autoritarismo com progresso. De um lado estava uma vida pacata e adaptada ao sistema, sem espaço para rebeldia. Do outro, estava a luta armada e um destino incerto na clandestinidade. Se um jovem não conseguisse adaptação ao sistema, mas também não quisesse saber de dar a vida por ideologias que já pareciam antiquadas, ele não teria muita escolha e sua única opção seria “cair fora”. No Brasil, uma indústria cultural consolidada pode ser observada a partir do final dos anos 60, durante o período da ditadura militar. Esta consolidação foi muito importante para assegurara e justificar um dos aspectos mais violentos da tecnocracia brasileira: a ditadura. Carro-chefe deste período, a televisão passou a ser parte da vida dos brasileiros que iam se integrando numa única identidade nacional. A produção de bens simbólicos era feita em escala industrial, resultando em produtos de massa muito bem acabados, mas também necessitando de grande quantidade capital para a produção. Aliada à censura legalizada pelo tenebroso A.I.5, estava a capitalização crescente do mercado editorial brasileiro; fatores responsáveis por marginalizar escritores. Alguns poetas passaram a “caminhar conscientemente à margem do mercado tradicional.” Esta nova opção, marcada por uma recusa ao Sistema e às novidades da indústria cultural, realizava-se de forma artesanal, com o artista envolvido em todas as etapas da produção do livro. Os “desbundados” também gostavam de ler os poetas da geração beat e os poetas que vendiam seus livrinhos mimeografados pela orla boêmia das cidades brasileiras. Nas rodas de bate-papo antenadas, as conversas giravam em torno de existencialismo e “sufoco”, aquele grande sentimento de opressão geral sentido não só pelos jovens, mas por boa parte da população. Misticismo, orientalismo, terapias alternativas, psicologia corporal e ecologia eram temas recorrentes No plano das idéias, a FILOSOFIA EXISTENCIALISTA DE JEAN-PAUL SARTRE foi uma antecipação daquilo que a contracultura veio propor na esfera comportamental. Sartre e sua mulher, Simone de Beavoir, tinham um comportamento libertino capaz de escandalizar a Europa bem antes das festas de amor livre realizadas pelos hippies nas décadas seguintes. Filosofia sartriana = simplesmente existir, livre e totalmente responsável por essa liberdade A sexualidade libertária, símbolo do movimento hippie, chocou profundamente a sociedade em geral. Apesar da sociedade brasileira ser sexualmente permissiva, principalmente em tempos de carnaval, o comportamento sexual da contracultura era capaz de escandalizar a nossa sociedade. O comportamento sexual era tão variado que, se não fosse o advento da AIDS, hoje a sociedade ocidental poderia estar muito modificada. Entretanto, com o perigo de doenças sexualmente transmissíveis fatais batendo nas portas das formas não convencionais de amor, experiências de amor livre acabaram abortadas e hoje não há uma apologia utópica e um tanto cor-de-rosa, como era feita pela juventude liberada dos anos 70. Herbert Marcuse: mentor da contracultura. Ao reinterpretar a teoria psicanalítica de Freud, conseguiu, a partir dos princípios freudianos de pulsão de vida e de morte combinados com um estudo da própria civilização, chegar na possibilidade da não-repressão, rapidamente adotada pela libertária juventude. Segundo ele, seria possível para a civilização se religar com Eros, o princípio do prazer, e acabar com a repressão sexual. Era a explicação teórica para o comportamento sexualmente livre adotado pelos jovens mais rebeldes. Para Marcuse, história do homem é, para Freud, a história de sua repressão. Isso por que o homem troca o prazer por segurança e cria civilização. Mas é a noção de que uma sociedade não-repressiva é impossível, presente em Freud, que Marcuse desconstrói, apontando a repressão como causa da violência e a não-repressão como única solução. POESIA MARGINAL Poesia produzida por artistas que se recusavam a entrar no esquema da indústria cultural, por uma geração que ficou conhecida por sua poesia marginal e seus livrinhos artesanais produzidos em mimeógrafos. As expressões artísticas e comportamentais tiveram em comum o fato de não necessitarem de muito capital, apenas de um circuito alternativo. POESIA MARGINAL Chico Alvim, Cacaso, Chacal, Paulo Leminski: os melhores exemplos de poetas que praticavam a “literatura do eu”, como definiu Süssekind (2004). O conteúdo era o “ego malandro” de cada poeta, a transformação de elementos cotidianos em poesia, revelando um mundo de intimidades que parece ser do autor, mas que também poderia ser de qualquer um, criando assim uma aproximação com o leitor. Não importando uma elaboração literária, a composição servia uma expressividade neoromântica. A forma era tosca, livrinhos mimeografados com qualidade muito inferior ao alcançado pelo mercado editorial de então. Somente em 1976 a produção destes poetas é reunida numa antologia 26 Poetas Hoje, editada por Heloísa Buarque de Hollanda com enorme sucesso. HOJE Depois de passados 60 anos do seu nascimento, em 1956, com o poema “Howl”, é possível observar a contracultura totalmente absorvida pela cultura de massa, transformada em mais um produto para se escolher, entre tantos outros. O motivo é simples: a rebeldia, como descobriram os empresários, pode ser um produto que vende muito bem. O mais provável, porém, é que os tecnocratas tenham descoberto como vender rebeldia em pequenas doses para impedir, em novas gerações de jovens, o aparecimento do desejo de revolucionar o mundo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADELMAN, Mirian (2001). O reencantamento do político: interpretações da contracultura. Curitiba: Revista de Sociologia e Política. ANDERSON, Perry (2002). Afinidades seletivas. São Paulo: Boitempo Editorial. GINSBERG, Allen (2005[1956]). Uivo e outros poemas. Porto Alegre: L&PM. JAMESON, Fredric (2001). A cultura do dinheiro: ensaios sobre a globalização. Petrópolis: Vozes. ROSZAK, Theodore (1972 [1969]). A Contracultura – Reflexões sobre a sociedade tecnocrática e a oposição juvenil. Petrópolis: Vozes.