UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS INSTITUTO DE ARTES E DESIGN DEPARTAMENTO DE MÚSICA E ARTES CÊNICAS CURSO DE TEATRO – LICENCIATURA Disciplina: História do Teatro IV Antonin Artaud Profª: Marina de Oliveira Antonin Artaud (1896 – 1948) - Nasceu no dia 4 de setembro de 1896, em Marselha; - Sua mãe é de origem grega e, seu pai, descende de uma antiga família de fuzileiros navais; - Desde jovem Artaud sofre de severos transtornos nervosos, gagueira e dores de cabeça intensas; - Aos cinco anos, Artaud tem uma meningite que quase o leva à morte; sua mãe, preocupada, o obriga a tomar remédios contra a sua vontade. - Aos oito anos, morre sua irmã de apenas sete meses. (dos nove filhos, apenas três sobrevivem à infância). - Na adolescência, Artaud começa a desenvolver habilidades artísticas, fundando uma revista de literatura, em que publica seus primeiros poemas, aos quatorze anos. - É leitor de Baudelaire, Rimbaud e Nerval; - As discussões com a mãe, ainda na adolescência, resultam em crises nervosas; - Em 1915, Artaud tem um colapso nervoso e queima vários de seus poemas; - Nessa ano, a família decide interná-lo pela primeira vez, em uma clínica nos arredores de Marselha; os médicos não descobrem qual é a sua enfermidade. - Pouco tempo depois, Artaud é internado em uma clínica na Suíça, onde permanece por quase dois anos; - Para acalmar suas dores físicas, os médios decidem dar-lhe ópio, substância que o torna viciado no futuro. - Em 1920, em Paris, passa a tratar-se com o dr. Toulouse, que publica alguns de seus poemas na revista Demain. -No mesmo ano, Artaud entra em contato com importantes poetas surrealistas e também inicia seu trabalho como ator; - Trabalha sob a direção de Charles Dullin e, com ele, assiste a um espetáculo japonês, em 1922; ambos ficam encantados com a estética oriental. - De 1921 a 1927 mantém um relacionamento amoroso com a romena e atriz Génica Athanasiou. - O casal separa-se devido às dificuldades enfrentadas por Artaud em relação ao vício pelo ópio. - Em 1923, sai do “Atelier”, de Dullin, e une-se a Cia. de Georges Pitöef. - Aos vinte e sete anos, inicia sua correspondência com o editor Jacques Rivière. - Em 1924, sua participação no movimento surrealista torna-se intensa. André Breton concede a Artaud a redação da terceira edição da revista A revolução surrealista; seus textos são publicados na forma de cartas dirigidas às instituições burguesas. - Em 1925, lança dois livros de poesia: Pesa-nervos e Umbigo dos limbos; - Aos trinta anos, funda o “Teatro de Alfred Jarry”. Em 1926, lança o Primeiro Manifesto do “Teatro Alfred Jarry”. - Nesse ano, é expulso do movimento surrealista, a causa principal: a não adesão de Artaud ao Comunismo. - De 1927 a 1930 o “Teatro Alfred Jarry” monta apenas 4 peças, num total de 8 apresentações. A pouca atividade é reflexo da difícil situação econômica do grupo. - Em 1931, Artaud assiste a Cia. de Teatro Balinês, o que reaviva a sua paixão pela estética oriental e o inspira na concepção de sua nova teoria: o teatro da crueldade. - Em 1932, Artaud lança o 1° manifesto do teatro da crueldade; - Em 1933, publica o 2° manifesto do teatro da crueldade. Em carta a Jean Paulhan escreve: “Tem-se que assassinar o pai da ineficácia do teatro: o poder da palavra e do texto. O texto é o Deus todo poderoso que não permite ao verdadeiro teatro nascer.” O teatro, para Artaud, só poderá renascer através da subversão da palavra. O teatro da crueldade - Leva a ação a um máximo de risco, cada cena é única, não se repete ao longo das apresentações; - Apresenta realidade diferente da cotidiana, próxima à atmosfera dos sonhos; - Evoca o retorno de uma consciência primitiva, não contaminada pelos valores morais e culturais; - Vincula-se ao ritual e à magia; - Elimina os falsos limites entre o corpo e a alma; - Cria uma linguagem específica (hieróglifos), em que o espaço e o gesto predominam sobre a palavra; - Utiliza figurinos e temáticas milenares/mitológicos; - Refuta o cenário. Elimina distinção palco/plateia. Os atores do teatro da crueldade - Devem imprimir aos seus movimentos um ritmo físico preciso. (como se os corpos estivessem sob a regência de um maestro); - Não são escravos da palavra do dramaturgo ausente ou de um diretor autoritário. Tanto quem atua como quem organiza a atuação são criadores; - Agem de modo tão funcional e preciso quanto a circulação do sangue humano em suas artérias. - São atletas do coração, sendo a respiração um mecanismo para a representação de sentimentos alheios. Por essa razão, atores devem preparar-se fisicamente, assim como o atleta, para trazer à tona a emoção fisicalizada. Para Artaud, toda a respiração tem três tempos: - andrógino (neutro) - macho (positivo) expansivo - fêmea (negativo) atrativo O teatro e a peste - Dois meses após o segundo manifesto, Artaud, numa conferência na Universidade de Sorbonne, propõe uma analogia entre os efeitos provocados por uma suposta peste e os suscitados pelo teatro da crueldade. - Para o visionário, tanto o horror de uma epidemia quanto o teatro da crueldade teriam o poder de derrubar a ordem social, através da extinção das leis cotidianas. “Como a peste, o teatro é uma formidável convocação de forças que reconduzem o espírito à origem de seus conflitos”. A violência sensorial - Para Artaud, ator deve oferecer o seu corpo à ação da crueldade e propõe um modelo = o pestilento. - A epidemia, nesse sentido, provocaria uma explosão libertadora, pois quando a morte está iminente, o ser humano libera comportamentos que normalmente não tem na sua vida cotidiana. - “O pestilento é o duplo do ator”. O teatro e seu duplo - O duplo do teatro não é realidade cotidiana e observada, cada vez mais vazia e sem sentido, mas a realidade arquetípica e perigosa. - Artaud se dirige ao homem total e não ao homem social, corrompido pelas convenções. - Em 1932, Artaud submete-se a uma nova internação, em Paris, para desintoxicar-se do ópio. - O encenador fica momentaneamente bem, e escreve o roteiro de “A conquista do México”. - Em 1934, escreve e encena “Heliogábalo”. No mesmo ano, publica O teatro e seu duplo. - Em 1935, Artaud atua e dirige “Os Cenci”, adaptação de uma tragédia de Shelley e de uma crônica de Stendhal. - Depois do fracasso de “Os cenci”, Artaud pensa que Paris não é o melhor lugar para o seu teatro. - Interessado por culturas antigas, decide ir para o México, a fim de conhecer os índios daquele País, não contaminados pelos valores ocidentais. Parte em janeiro de 1936. - Artaud mantém-se no México dando conferências em Universidades. - A seguir, vai para o interior do País e conhece os índios Tarahumaras, com quem vivencia algumas experiências místicas. - De volta a Paris, Artaud casa-se com Cécile Schramme, mas os dois separam-se meses depois, em maio de 1937. - Em agosto de 1937, decide ir para a Irlanda, a fim de estudar os antigos ritos celtas. Artaud acredita que a viagem à Irlanda é “o duplo” de sua viagem ao México. - Em Dublín, passeia pelas ruas brandindo seu bastão pelo ar. Sente-se perseguido e a polícia o interpela algumas vezes. Depois de sucessivos escândalos, as autoridades o prendem e o deportam para Paris. - Em setembro de 1937, Artaud chega à capital francesa numa camisa de força. - Do porto, é enviado para um hospital psiquiátrico nos arredores de Rouen, lá permanecendo até abril de 1938, quando é transferido para o Sainte Anne Hospital, perto de Paris. - No início de 1939, é transferido para o Hospício Ville-Evrand, local em que fica confinado durante quatro anos, recebendo tratamento desumano. - Penalizados, os amigos de Artaud conseguem que ele seja transferido, em 1943, para o asilo de Rodez, a cargo do dr. Gaston Fedière, poeta e amigo dos surrealistas. - Fedière configura-se como um dos médicos pioneiros na técnica do eletrochoque. Durante os primeiros dezenove meses em Rodez, Artaud é submetido a cinquenta sessões de eletrochoque, ficando debilitado e sem dentes. - O dr. Fedière também estimula que Artaud volte a escrever. O poeta realiza a adaptação francesa de Alice no país dos espelhos, de Lewis Carroll, e traduz textos de Edgar Allan Poe, entre outros, além de retomar seus desenhos e a correspondência com vários de seus amigos. - Em 1946, Artaud conquista sua liberdade e tem alta de Rodez. Os amigos o instalam no quarto de uma clínica privada do bairro Ivry-sur-Seine, em Paris, local onde permanece até a sua morte, em 1948. • Entre 1946 e 1948, Artaud escreve textos importantes: Artaud, le momo, Van Gogh, o suicidado pela sociedade, Para acabar com o julgamento de Deus. (peça radiofônica) - Em 13 de janeiro de 1947, dá uma conferência no teatro Vieux Colombier. (na plateia estão Picasso, Sartre e Camus). - Na fase final de sua vida, Artaud revela mudança de pensamento, abandonando suas inclinações esotéricas e/ou religiosas. - Além disso, o corpo surge revalorizado em relação ao espírito: “O espírito é filho do corpo e não o contrário”. O trabalho e o cansaço do corpo alimentam o espírito; este, sem o corpo, não pode conceber valores ou registrar dados. Para Artaud, o espírito, sem o corpo, não pode nem mesmo existir. A morte em 1948 - Artaud é encontrado pelo jardineiro da clínica de Ivry-sur-Seine, que entra em seu quarto para levar o café da manhã. - Ele está sentado ao pé da cama, sozinho, apertando nas mãos um prosaico sapato. - A causa do óbito é um tumor maligno no intestino, detectado meses antes. Artaud e o cinema A paixão de Joana D’Arc (1928) Napoleão (1927 e 1935) - Para o cinema, Artaud escreve A concha e o clérigo, único de seus roteiros a ser filmado, em 1927, sob a direção de Germaine Dulac. Outros desenhos de Artaud Autorretrato de 1915 Autorretratos de 1947 • Carta a Hitler Alguns herdeiros de Artaud - Jerzy Grotowski, Eugenio Barba, Living-Theatre, Bread and Puppet Theatre, Peter Brook, Grupos de happening e performance, Oi nóis aqui traveiz, Outros... Quem sou eu? De onde venho? Sou Antonin Artaud e basta que eu o diga como só eu o sei dizer e imediatamente hão de ver meu corpo atual, voar em pedaços e se juntar sob dez mil aspectos diversos. Um novo corpo no qual nunca mais poderão esquecer. Eu, Antonin Artaud, sou meu filho, meu pai, minha mãe, e eu mesmo. Eu represento Antonin Artaud! Estou sempre vivo. Mas um vivo morto, um morto vivo. Sou um morto sempre vivo. A tragédia em cena já não me basta. Quero transportá-la para minha vida. Eu represento totalmente a minha vida. Onde as pessoas procuram criar obras de arte, eu pretendo mostrar o meu espírito. Não concebo uma obra de arte dissociada da vida. Eu, o senhor Antonin Artaud, nascido em Marseille no dia 4 de setembro de 1896, eu sou Satã e eu sou Deus, e pouco me importa a Virgem Maria. Fontes: STOPPELMAN, Gabriela; HARDMEIER, Jorge. Artaud para principiantes. Buenos Aires: Era Naciente SRL, 1998. ARTAUD, Antonin. O teatro e seu duplo. São Paulo: Martins Fontes, 2006. _______. Linguagem e vida. São Paulo: Perspectiva, 2006. - Imagens e poema retirados da internet.