APOSTILA “4”
DE
TÍTULOS DE
CRÉDITO
Tema : CHEQUE
Material de apoio para a disciplina “Direito de Empresa”
Elaborado por : Denis Domingues Hermida
OBSERVAÇÃO: A redação dessa apostila é feita com base nas obras de
Fabio Ulhoa Coelho (“Curso de Direito Comercial – volume 1”), de
Gladston Mamede (“Títulos de Crédito”), de Amador Paes de Almeida
(“Teoria e Prática dos Títulos de Crédito”), de Waldirio Bulgarelli
(“Títulos de Crédito”) e de Fran Martins (“Títulos de Crédito – Letra de
Câmbio e Nota Promissória”), além de apontamentos pessoais do seu
elaborador
CAPÍTULO I
INTRODUÇÃO
Na apostila “1” estudamos a “Teoria Geral dos Títulos de
Crédito”, objetivando absorver os grandes conceitos inerentes ao regime
cambiário, como os conceitos de título de crédito, de endosso, de aval e de
protesto, bem como as classificações dos títulos de créditos e os princípios
a eles inerentes.
Formamos, assim, com a abordagem feita na “Teoria Geral dos
Títulos de Crédito” a estrutura cognitiva necessária para passarmos a
analisar o regime jurídico específico de cada título de crédito.
Estudamos na apostila “2” a normatização específica da “letra
de câmbio”, sempre aproveitando para relembrar temas já estudados na
teoria geral e aplica-los com especialidade à letra de câmbio.
Na apostila “3”, apreciamos conhecimentos a respeito da “nota
promissória”.
Nesta apostila “4”, o “cheque” será a espécie de título de
crédito estudada.
CAPÍTULO II
CONCEITO DE “CHEQUE”
Sabemos de antemão que o “cheque” é uma espécie de título
de crédito, isto é, enquadra-se no conceito de título de crédito que, como já
estudamos, é “documento que possui como características a “cartularidade”, a
“literalidade”, a “autonomia” e a “legalidade”, tem natureza jurídica de título
executivo extrajudicial (na forma do artigo 585, I, do CPC) e possui
“negociabilidade””. Analisemos tais características mais a fundo:
- é um documento. Valendo esclarecer que “documento é todo objeto do qual se
extraem fatos em virtude da existência de símbolos, ou sinais gráficos,
mecânicos, eletromagnéticos etc. É documento, portanto uma pedra sobre a qual
estejam impressos caracteres, símbolos ou letras; é documento a fita magnética
para reprodução por meio do aparelho próprio, o filme fotográfico etc”1
- o direito subjetivo do credor de receber o seu crédito está diretamente
relacionado à apresentação do documento (cartularidade)
- é formal, isto é, precisa conter forma determinada pela lei, sendo que a afronta à
forma imposta por lei é capaz de levar à invalidade do título
- tem rol taxativo determinado por lei. Conforme o princípio da legalidade ou
tipicidade, aplicado aos títulos de crédito, o artigo 887 do Código Civil,
impossibilita a emissão de títulos de crédito que não estejam previamente
definidos e disciplinados por lei. Não há, assim, como se cogitar da invenção de
título de crédito não previsto legalmente.
- é literal, isto é, valem exatamente a medida neles declarada. Fran Martins,
citado por Amador Paes de Almeida2, afirma que “por literalidade entende-se o
fato de só valer no título o que nele está escrito. Nem mais nem menos do
mencionado no título constitui direito a ser exigido pelo portador”.
- tem natureza jurídica de título executivo extrajudicial, conforme artigo 585, I,
do CPC, dando ao credor o direito de promover a execução judicial do seu direito
- referem-se unicamente a relações creditícias. Não se documenta num título de
crédito nenhuma outra obrigação, de dar, fazer ou não fazer, à exceção dos títulos
executivos impróprios (warrant e conhecimento de transporte)
1
GRECCO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. Volume 2. São Paulo: Saraiva, 6a
edição, atualizada, 1993
2
Ob. Cit. p.4
- o título de crédito ostenta o atributo da negociabilidade, ou seja, está sujeito a
certa disciplina jurídica, que torna mais fácil a circulação do crédito, a negociação
do direito nele mencionado.
- possui autonomia em relação ao negócio jurídico que lhe deu origem. A
Autonomia é requisito fundamental para a circulação dos títulos de crédito. Por
ele, o seu adquirente passa a ser titular de direito autônomo, independente da
relação anterior entre os possuidores.
Verdadeiro é, entretanto, que a simples afirmação de que o cheque é
um título de crédito não realiza toda a sua conceituação, isto é, não nos possibilita
distingui-la dos demais títulos de crédito para que possamos individualizá-la.
Precisamos acrescentar ao conceito de “cheque” mais algumas características que
lhe são próprias a fim de gerar a sua individualização conceitual.
Fabio Ulhoa Coelho afirma que cheque é ordem de pagamento à
vista, emitida contra um banco, em razão de provisão que o emitente possui junto
ao sacado, proveniente essa de contrato de depósito bancário ou de abertura de
crédito3.
Gladston Mamede, a seu turno, entende que o cheque é uma ordem
de pagamento emanada de uma pessoa (emitente ou sacador) que mantém
contrato com uma instituição bancária (sacado) para que esta pague,
imediatamente (à vista), determinada importância ao beneficiário4.
Para Amador Paes de Almeida, o cheque é o título revestido de
determinadas formalidades legais contendo uma ordem de pagamento à vista,
passada em favor próprio ou de terceiro5.
Dos textos doutrinários acima transcritos, extraímos mais algumas
características relevantes para a conceituação da letra de câmbio, quais sejam:
- é uma “ordem de pagamento”: o cheque corporifica relação jurídica que envolve
3(três) sujeitos (ou, como é mais correto tecnicamente, três situações jurídicas): o
sacador (que mandar que determinada pessoa pague a outra determinado valor
constante do título), o sacado (a quem é dada a ordem de pagar determinado valor
a certa pessoa) e a do beneficiário (a quem é determinado pelo sacador o
pagamento pelo sacado de determinado valor constante do título). Não é, assim,
conforme classificação dos títulos de crédito quanto à estrutura, uma “promessa
de pagamento”;
3
COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito comercial. Volume 1. 8ª edição revista e atualizada. São
Paulo: Saraiva, 2004, p. 433
4
MAMEDE, Gladston. Títulos de crédito: de acordo com o novo código civil, Lei 10.406, de 10-012002. São Paulo: Atlas, 2003, p. 237
5
ALMEIDA, Amador Paes. Teoria e Prática dos Títulos de Crédito. São Paulo:Saraiva, 24a edição,
2005, p. 111
- envolve 3(três) situações jurídicas: a do emitente(ou sacador), do sacado e do
tomador (ou beneficiário).
- o sacado do cheque é sempre um banco ou uma instituição financeira, conforme
impõe o artigo 3º da Lei 7.357/85
- o cheque é um título vinculado a um padrão, sendo que o formulário é fornecido
pelo sacado (banco)
- é um título abstrato, vez que, na sua emissão, é dispensável a enunciação da
causa, isto é, a anotação/marcação da relação jurídica que lhe deu origem
Reunindo as informações acima apontadas chegamos ao seguinte
conceito de “cheque”, que entendemos satisfatório:
- Cheque é a espécie de título de crédito, classificado quanto à sua estrutura
como “ordem de pagamento” e quanto à relação fundamental como
“abstrato”, que se consubstancia numa declaração unilateral de vontade,
através de formulário padronizado e produzido pelo Banco-Sacado, do
Sacador (emitente) que manda que o Sacado (necessariamente banco ou
instituição financeira) pagar, pura e simplesmente, ao Tomador
determinado valor constante do documento que o corporifica.
III – CARACTERÍSTICAS DO CHEQUE
1) Normatização:
a) Histórico da normatização
No Brasil, a legislação era confusa até a promulgação do Decreto
no. 2.591, de 7 de agosto de 1912, que vigeu até ser substituída pela Lei 7.357, de
2 de setembro de 1985. Esta lei absorveu parte da legislação esparsa antes
vigente, como, por exemplo, o Decreto no. 22.924, de 12-7-1933, que alterou os
prazos de apresentação dos cheques para trinta das, para a mesma praça, e cento e
vinte dias para outras praças. Manteve, contudo, em vigor as disposições
especiais vigentes sobre os vales ou cheques postais, os cheques de poupança ou
assemelhados, e os cheques de viagem (art. 66 da Lei 7.357/85) e ainda a
legislação criminal referente a cheques sem fundo, falsidade, falsificação etc,
basicamente representada pelo art. 171 do Código Penal. Temos que
permaneceram em vigor, após a vigência da Lei 7.357/85: o Decreto no. 24.777,
de 14-7-1934, que permitiu a emissão de cheques contra a própria caixa; o
Decreto no. 22.393, de 25-1-1933, dispondo que somente o mês deve ser escrito
por extenso; a Lei no. 4.728, de 14-7-1965, sobre o mercado de capitais, a Lei no.
4.595, de 31-12-1964, sobre a reforma bancária, além do grande número de
circulares e portarias do Conselho Monetário Nacional.
Vale mencionar que a Lei 7.357, de 2-9-1985 foi resultado de um
Projeto oriundo do Executivo – mais precisamente do Banco Central do Brasil -,
dando tratamento unitário à disciplina do cheque, por meio da integração das
disposições da Lei Uniforme aceitas pelo Governo brasileiro, às normas que já
vigiam entre nós, como as do Decreto no. 2.591/1912, do Decreto no. 22.924, de
12-7-1933, além de outras inovações introduzidas.
Certamente a promulgação da Lei 7.357/85 representa um grande
avanço, evitando a duplicidade antes existente, o que não era de molde a oferecer
certeza e segurança em matéria jurídica tal relevante como a do cheque. A Lei
7.357/85 contém 71 artigos, sendo que foram vetados os artigos 5º e 436.
Ensina Amador Paes de Almeida que a adesão do Brasil à Lei
Uniforme sobre cheques (através do Decreto no. 57.595, de 07 de janeiro de
1966) estabeleceu controvérsia entre a aplicação dos dispositivos da Convenção
de Genebra (Lei Uniforme) e a aplicação da legislação interna à época vigente,
que era o Decreto 2.591, de 7-8-1912. De forma que a Lei 7.357, de 2 de
setembro de 1985, resolveu tal controvérsia, harmonizando-se com a Lei
Uniforme.
6
BULGARELLI, Waldirio. Títulos de crédito. São Paulo: Atlas, 1995, 11a edição atualizada, pp. 277/278
b) A normatização na atualidade
Em razão da Lei 7.357/85 ter absorvido as regras contidas na Lei
Uniforme sobre Cheques, hoje ela (Lei 7.357/85) é a principal fonte de normas
jurídicas aplicáveis aos cheques.
Junto com a Lei 7.357/85, também denominada “Lei do Cheque”,
temos as Resoluções do Banco Central do Brasil, tomadas por deliberação do
Conselho Monetário Nacional, e as Circulares do Banco Central do Brasil, como
permitido pelo artigo 69 da Lei do Cheque:
Lei 7.357/85. Artigo 69. “Fica ressalvada a competência do
Conselho Monetário Nacional, nos termos e nos limites da
legislação específica, para expedir normas relativas à matéria
bancária relacionada com o cheque.”
Ressalte-se que as deliberações(decisões) do Conselho Monetário
Nacional são veiculadas através de Resoluções do Banco Central do Brasil.
Dentre as normas deliberadas pelo Conselho Monetário Nacional
em relação ao regime jurídico do “cheque”, destacam-se: Resoluções 1.528/89,
1.631/89, 1.682/89, 2.025/93, 2.303/96, 2.537/98, 2.747/00 e Circulares 1.994/91,
2.655/96, 2.854/98 e 2.989/00 do BACEN.
Também, o Código Civil traça normas gerais sobre títulos de crédito
que, conforme artigo 903 do mesmo Código Civil, somente prevalecem na
hipótese de inexistência de conflito com normas que especificamente tratem da
letra de câmbio (Lei 7.357/85 e Normas do Conselho Monetário Nacional).
c) Requisitos do cheque
O artigo 1º da Lei do Cheque (Lei 7.357/85) impõe os seguintes
requisitos essenciais ao Cheque:
- a denominação “cheque” inscrita no contexto do título e expressa na língua em que este é
redigido
- a ordem incondicional de pagar quantia determinada;
- o nome do banco ou da instituição financeira que deve pagar (sacado)
- a indicação do lugar de pagamento;
- a indicação da data e do lugar de emissão
- a assinatura do emitente (sacador), ou de seu mandatário com poderes especiais
Acrescente-se que, para o atendimento completo das formalidades
exigidas em lei, deve o sacado da letra de câmbio estar identificado pelo número
da Cédula de Identidade, inscrição no Cadastro de Pessoa Física (CPF), do Título
de Eleitor ou da Carteira Profissional (Lei no. 6.268/75, art. 3º)
Quanto a tais requisitos, apresentemos alguns comentários:
- Requisito de inserção da palavra “cheque”: neste ponto não há muito o que
se acrescentar. Normalmente consta do cheque a expressão “Pague por este
cheque a quantia de..(estipulação da quantia)..... a ..(nome do beneficiário).... ou à sua
ordem”.
- Requisito de ser uma ordem incondicional de pagar quantia determinada: é
importante salientar que o cheque não se caracteriza na hipótese de ordem
condicional de pagamento. O cumprimento da obrigação materializada no cheque
não pode ficar sujeito, pelo saque, ao implemento de condição, suspensiva ou
mesmo resolutiva. Não é cheque, portanto, um documento redigido da seguinte
forma: “Pague por este cheque, desde que lhe sejam entregues as mercadorias
solicitadas, a quantia de ......”.
- Requisito de constar o nome da pessoa que deve pagar (sacado): a pessoa a
quem a ordem é endereçada deve ser identificada no texto do título. O sacado do
cheque é necessariamente um Banco ou uma Instituição Financeira, como
determina o artigo 3º da Lei 7.357/85, in verbis: “O cheque é emitido contra
banco, ou instituição financeira que lhe seja equiparada, sob pena de não
valer como cheque”.
- Requisito de assinatura do sacador: trata-se da exigência da
assinatura do sacador (emitente). Dessa assinatura decorre a
constituição do crédito cambiário, porque o sacador torna-se, com o
saque, co-devedor da letra.
- O requisito de “data” e “local” da emissão: ao final da cártula, tem-se espaço
a ser preenchido pelo sacador (emitente), indicando o lugar no qual emite a
cártula e a data que o faz, atendendo à exigência do art. 1º, V, da Lei 7.357/85.
Esclarece o artigo 2º, II, que não indicado o lugar de emissão, considera-se
emitido o cheque no lugar indicado junto ao nome do emitente. A data e o local
da emissão são informações importantes especialmente para a verificação do
prazo de apresentação.
- O requisito de “indicação do lugar de pagamento”: a folha de cheque deve
indicar o lugar do pagamento, ou seja, a sede da instituição financeira sacada, da
agência ou do posto de atendimento bancário no qual o legítimo portador poderá
apresentar o cheque e obter o pagamento ali ordenado. No plano legal, estabelece
o art. 2º, I, que, na falta de indicação especial, é considerado lugar de pagamento
o designado junto ao nome do sacado e, se designados vários lugares, o cheque é
pagável no primeiro deles e, não existindo qualquer indicação, o cheque é
pagável no local de sua emissão.
d) Conseqüência da falta de qualquer dos requisitos essenciais
O artigo 2º da Lei do Cheque (Lei 7.357/85) impõe que “o título a
que falte qualquer dos requisitos enumerados no artigo 1º não vale como
cheque...”, salvo alguns casos, constantes dos incisos I e II do próprio artigo 2º,
quais sejam:
- na falta de indicação específica, é considerado lugar do pagamento o lugar
designado junto ao nome do sacado (Banco); se designados vários lugares, o
cheque é pagável no primeiro deles; não existindo qualquer indicação, o cheque é
pagável no lugar de sua emissão;
- não indicando o cheque o lugar de emissão, considera-se emitido o cheque no
lugar indicado junto ao nome do emitente;
III – SITUAÇÕES JURÍDICAS ADVINDAS DA EMISSÃO DO
CHEQUE
A emissão de um cheque dá origem a 3(três) situações jurídicas,
quais sejam: a do emitente (sacador), a do sacado e a do beneficiário (tomador).
a) O emitente
- O emitente também é denominado sacador. É aquele que emite o cheque,
manifestando a declaração unilateral de ordem incondicional de pagamento pelo
Sacado(Banco) da quantia determinada no cheque ao seu Beneficiário.
b) O Sacado
- O sacado é aquele a quem é dirigida a ordem incondicional de pagamento
declarada pelo emitente. É o sacado quem deverá pagar o beneficiário.
- O artigo 3º da Lei 7.357/85 exige que o sacado seja sempre um “Banco” ou
“Instituição Financeira que lhe seja equiparada”
c) O beneficiário
- O beneficiário é aquele a favor de quem é dada a ordem de pagamento, e que
poderá ser o próprio emitente (sacador) ou terceiro. Note-se que o beneficiário
pode ou não ser designado, e nesse caso o cheque é:
• Nominativo com cláusula à ordem: o cheque é nominal quando
emitido(sacado) em favor de determinada pessoa, física ou jurídica.
Contendo a cláusula “à ordem”, permite ao beneficiário transferi-lo a
terceiro mediante endosso. O artigo 17 da Lei 7.357/85 consta de
presunção de que o cheque é à ordem, presumindo como tal o cheque a
que faltar a cláusula.
• Nominativo sem cláusula à ordem: trata-se do cheque emitido em favor de
determinada pessoa, constando expressamente o nome do beneficiário.
Mesmo que não contenha expressamente a cláusula à ordem, presume-se a
sua condição de ser à ordem, presunção essa afastada somente se houver
cláusula “não à ordem”.
• Nominativo com cláusula não à ordem: trata-se de cheque onde consta
expressamente o nome do beneficiário, no entanto consta de “cláusula não
à ordem”, o que afasta a possibilidade de transferência de titularidade do
cheque por via de endosso, sendo que a transferência somente poderá ser
realizada através de cessão civil de crédito;
• Ao portador: é aquele que não designa o nome do beneficiário e é pagável
a quem o apresentar ao banco sacado. Ademais, tal cheque é transmissível
pela simples tradição, e sua posse, salvo se ilícita, legitima a sua
propriedade7.
7
ALMEIDA, Amador Paes de. Op. cit. p. 124
III – PRESSUPOSTOS DE EMISSÃO DO CHEQUE
Consta da obra de Waldirio Bulgarelli8 que, entendido como
uma ordem de pagamento a vista, sacada em favor próprio ou de terceiro, sobre
que tenha fundos disponíveis, delineiam-se dois pressupostos do cheque, quais
sejam:
a) o saque contra o banco
b) a provisão de fundos
Quanto ao “saque contra o banco”, o artigo 3º da Lei
7.357/85 é taxativo ao impor que somente banco ou instituição financeira pode
sacado do cheque. É exatamente nesse “saque” que se origina a “ordem
incondicional de pagamento de determinada quantia”.
O segundo pressuposto é a necessidade de existência de
provisão de fundos. Deve, portanto, o emitente (sacador) ter fundos disponíveis
em poder do banqueiro, no momento da apresentação do cheque para pagamento,
como determina o artigo 4º, da Lei 7.357/85, abaixo transcrito:
Lei 7.357/85. Art. 4º. “O emitente deve ter fundos disponíveis
em poder do sacado e estar autorizado a sobre eles emitir
cheque, em virtude de contrato expresso ou tácito. A infração
desses preceitos não prejudica a validade do título como
cheque.
§1º. A existência de fundos disponíveis é verificada no
momento da apresentação do cheque para pagamento (...)”
Consideram-se, para esse fim, “fundos disponíveis” como:
- os créditos constantes de conta corrente bancária não subordinados a termo;
- o saldo exigível de conta corrente contratual
- a soma proveniente de abertura de crédito (conforme art. 4, §2º, Lei 7.357/85)
A conta corrente bancária de que trata o artigo 4º, §2º, da
Lei do Cheque trata-se de conta de depósito, mantida pelos clientes dos bancos e
que refletem a posição do saldo disponível, por meio de extratos do movimento
8
Op. cit. p. 281
levantados e remetidos periodicamente aos clientes. Nada impede, contudo, que a
conta corrente bancária seja também a chamada conta corrente contratual, às
quais alude a alínea b do §2º do artigo 4º da Lei 7.357/85, que é aquela que se
alimenta de partidas a débito e a crédito e que periodicamente acusa o saldo.
O contrato de abertura de crédito gera a obrigação ao banco
de fornecer recursos ao cliente.
Sobre a conta bancária e a condição do sacado, vale citar o
magistério de Gladston Mamede9 no sentido de que, para que haja regular
emissão do cheque, é requisito indispensável a existência de um contrato entre a
instituição financeira sacada e o emitente, uma vez que o saque se faz sobre os
depósitos havidos ou sobre o crédito disponível no âmbito do sacado. A
especificidade do cheque, assim, fica clara mesmo consideradas as circunstâncias
indispensáveis para sua criação. Observe-se, por exemplo, que nas letras de
câmbio não há que falar em condição pessoal para ser sacado, excetuada a
necessidade de capacidade civil (um dos requisitos de qualquer negócio jurídico).
Na letra, há uma posição jurídica de sacado, não mais. No cheque, pelo contrário,
o sacado não apenas ocupa a posição correspondente, como também manifesta
uma qualidade pessoal específica, o que inclui autorização para o funcionamento
(não negociável e instransferível), que deve permitir-lhe a participação em de
determinadas atividades, sendo vedado atuar naquelas que não estejam previstas
na autorização.
Como se não bastasse a estrita autorização, deve-se destacar
a necessária submissão da Instituição Financeira a um controle específico do
Conselho Monetário Nacional e do Banco Central do Brasil.
Especificamente sobre a “provisão de fundos”, o mesmo
Gladston Mamede afirma que não se emite um cheque para criar um crédito
com vencimento futuro, mas para determinar um pagamento imediato (a vista),
razão pela qual constitui pressuposto legal da emissão o fato de o
emitente(sacador) ter fundos disponíveis em poder do sacado e estar autorizado a
sobre eles emitir cheque, em virtude de contrato expresso ou tácito, como
estipulado pelo art. 4º da Lei 7.357/85. A existência de tais fundos disponíveis
que bastem ao pagamento é verificada no momento da apresentação do título para
pagamento, por força do artigo 4º, §1º, da Lei do Cheque, que deverá se
concretizar no prazo estipulado em lei.
10
9
Op. cit. pp. 238/239
Ibidem, pp. 241/242
10
IV – DAS ESPÉCIES DE CHEQUE
Da leitura da Lei do Cheque (Lei 7.357/85) extrai-se a
existência de várias espécies de cheque, das quais destacamos as seguintes:
cheque ao portador, cheque nominal, cheque à ordem, cheque não à ordem,
cheque por conta de terceiro, cheque administrativo, cheque visado e cheque
cruzado.
Analisemos cada uma dessas espécies:
a) Cheque ao portador
Se no ato de criação o sacador preenche o espaço destinado
ao beneficiário com a expressão ao portador, ou equivalente, ou simplesmente
deixa em branco o espaço, abrindo mão do direito de indicar que é o beneficiário
da emissão, tem-se um título ao portador, de acordo com a previsão anotada no
artigo 8º, III, e parágrafo único, da Lei 7.357/85, o que implica circulação por
mera tradição11.
Que se ressalte que, dentre os requisito do cheque constantes
do artigo 1º da Lei do Cheque, não há a exigência da indicação do nome do
beneficiário, de forma que esse não é um requisito imposto pela Lei 7.357/85.
Aliás, o artigo 8º, III, da Lei do Cheque prevê a possibilidade
do cheque ao portador:
Lei 7.357/85. Art. 8º. Pode-se estipular no cheque que seu
pagamento seja feito:
(...)
III- ao portador.
No entanto, essa possibilidade de emissão de cheque ao
portador sofre limitação em virtude da Lei 8.021/90, conforme consta de seus
artigos 1º e 2o, abaixo transcritos:
Art. 1° A partir da vigência desta lei, fica vedado o pagamento ou resgate de qualquer título ou
aplicação, bem como dos seus rendimentos ou ganhos, a beneficiário não identificado.
Parágrafo único. O descumprimento do disposto neste artigo sujeitará o responsável pelo
pagamento ou resgate a multa igual ao valor da operação, corrigido monetariamente a partir da
data da operação até o dia do seu efetivo pagamento.
11
MAMEDE, Gladston. Op. cit., p. 253
Art. 2° A partir da data de publicação desta lei fica vedada:
I - a emissão de quotas ao portador ou nominativas-endossáveis, pelos fundos em
condomínio;
II - a emissão de títulos e a captação de depósitos ou aplicações ao portador ou nominativosendossáveis;
Parágrafo único. Os cheques emitidos em desacordo com o estabelecido no inciso III deste
artigo não serão compensáveis por meio do Serviço de Compensação de Cheques e Outros
Papéis.
A Lei 9.069/95 alterou essa absoluta impossibilidade de
saque de cheque ao portador imposta pela Lei 8.021/90. Em realidade, a Lei
9.069/95 impõe a proibição, tanto da emissão, quanto do pagamento, quanto de
compensação, de cheque ao portador se superior a R$ 100,00 (cem reais),
conforme dispõe o seu artigo 69, in verbis:
Lei 9.069/95. Art. 69. “Art. 69. A partir de 1º de julho de 1994, fica vedada
a emissão, pagamento e compensação de cheque de valor superior a R$
100,00 (cem REAIS), sem identificação do beneficiário.
Parágrafo único. O Conselho Monetário Nacional regulamentará o
disposto neste artigo.”
b) Cheque nominal
Cheque nominal, também chamado de cheque nominativo, é aquele
que consigna expressamente o nome do beneficiário ou tomador, só a este
podendo ser pago12.
c) Cheque à ordem
Também é possível emitir-se um título à ordem, ou seja,
sacar o título explicitando seu beneficiário, com ou sem cláusula expressa à
ordem, de acordo com o artigo 8º, I, da Lei 7.357/85, e, assim, submetido ao
regime jurídico dos títulos à ordem13.
Lei 7.357/85. Art. 8º. “Pode-se estipular no cheque que seu
pagamento seja feito:
I – a pessoa nomeada, com ou sem cláusula expressa “à ordem” (...)”
Como se constata da própria leitura do artigo acima transcrito, não
é necessário que a cártula contenha a cláusula à ordem, pressupondo-a na
12
13
ALMEIDA, Amador Paes. Op. cit. p. 135
MAMEDE, Gladston. Op. cit. pp. 254-255
ausência de cláusula à ordem. Tem-se, portanto, a presunção relativa de que todo
cheque em que é explicitado o seu beneficiário é transmissível através de
endosso (isto é, o cheque é, via de regra, um título à ordem), sendo que tal
presunção somente é afastada caso conste do título cláusula “não à ordem”.
d) Cheque “não à ordem”
O cheque pode, em lugar da cláusula à ordem, conter a cláusula
não à ordem. Nessa hipótese, ao contrário do que sucede com o cheque à ordem,
não poderá o título ser transferido via endosso, só podendo ocorrer a cessão civil
prevista no artigo 286 do Código Civil14
f) Cheque por conta de terceiro
O artigo 9º, II, da Lei do Cheque, aceita a possibilidade do sacador
emitir a ordem de pagamento por conta de um terceiro, isto é, determinando que
o pagamento seja feito utilizando-se os fundos disponíveis na conta de um
terceiro; expressa-se pela fórmula pague por este cheque, por conta de Fulano de
Tal, a quantia de tantos reais, ou expressão equivalente15.
Lei 7.357/85. Art. 9º. “O cheque pode ser emitido:
(...)
II- por conta de terceiro; (...)”
No saque por conta de terceiro, não estando o sacado autorizado a
faze-lo, tem-se um ilícito civil, pelo qual responderá apenas aquele que, sem
poderes para tanto, ordenou o pagamento sobre conta alheia, havendo, também,
em tese, ilícito penal, na forma do artigo 171 do Código Penal (crime de
estelionato).
A autorização para saque por terceiro sobre a própria conta
bancária não caracteriza, juridicamente, aceite. Tem natureza jurídica mais
próxima à da representação, devendo a instituição bancária entregar ao terceiro
autorizado talonário da conta do autorizante, somando-se à ficha de assinaturas a
assinatura do terceiro autorizado à emissão.
14
15
ALMEIDA, Amador Paes de. Op. cit. p.136-136
MAMEDE, Gladston. Op. cit. pp. 255-256
g) Cheque administrativo
O cheque administrativo é o emitido pelo banco sacado, para
liquidação por uma de suas agências. Nele, emitente e sacado são a mesma
pessoa, conforme artigo 9º, III, da Lei do Cheque. Ou seja, a instituição
financeira ocupa, simultaneamente, a situação jurídica de quem dá ordem de
pagamento e a de seu destinatário16.
O cheque administrativo é também chamado de cheque bancário,
cheque comprado, cheque de caixa e cheque de direção.
É pressuposto do cheque administrativo a nominatividade, isto é, o
cheque administrativo deve necessariamente constar da explicitação do nome do
seu beneficiário. É o que consta do artigo 9º, III, da Lei do Cheque:
LEI 7.357/85. Artigo 9º. “O cheque pode ser emitido:
(...)
III- contra o próprio banco sacador, desde que não ao portador;”
h) Cheque visado
Conceito: O cheque visado é aquele em que o banco sacado,
a pedido do emitente ou do portador legítimo, lança e assinada, no verso,
declaração confirmando a existência de fundos suficientes para a liquidação do
título.
O cheque visado é tratado pelo artigo 7º da Lei do Cheque:
LEI 7.357/85. Artigo 7º. “Pode o sacado, a pedido do emitente ou do
portador legitimado, lançar e assinar, no verso do cheque não ao
portador, e ainda não endossado, visto, certificação ou outra
declaração equivalente, datada e por quantia igual à indicada no
título.
§1º. A aposição de visto, certificação ou outra declaração
equivalente obriga o sacado a debitar à conta do emitente a
quantia indicada no cheque e reservá-la em benefício do
portador legitimado, durante o prazo de apresentação, sem que
fiquem exonerados o emitente, endossantes e demais
coobrigados.
16
COELHO, Fabio Ulhoa. Op. cit. pp. 256-257
§2º. O sacado creditará à conta do emitente a quantia reservada, uma
vez vencido o prazo de apresentação; e, antes disso, se o cheque lhe
for entregue para inutilização.”
Características:
- deve sempre constar o nome do beneficiário, isto é, não pode ser ao portador;
- visar significa lançar e declarar no verso do cheque declaração confirmando a
existência de fundos suficientes para a liquidação do cheque’
- no momento de “visar”, o cheque não pode se encontrar endossado;
- o ato do Banco-Sacado de “visar” pode ser requerido tanto pelo emitente quanto
pelo legítimo portador do título;
- no momento em que “visa” o cheque, o Banco-Sacado deve debitar a quantia da
conta do emitente e reserva-la em benefício do legítimo portador do título;
- a garantia acima indicada somente ocorre durante o prazo para a apresentação
do cheque. Uma vez expirado tal prazo, o valor retorna para a conta do emitente,
podendo o cheque ser descontado como qualquer outro, mas sem a garantia de
um cheque visado.
f) Cheque cruzado
- Conceito: o cheque cruzado é aquele em que se cria uma situação específica
para o cumprimento da ordem de pagar a quantia certa, essa situação específica é
a obrigação do cheque apresentado somente poder ser pago pelo sacado a um
banco ou a um cliente do sacado, mediante crédito em conta. Isto é, o portador do
cheque cruzado não poderá apresenta-lo no caixa do banco e exigir a entrega de
papel-moeda em valor correspondente à quantia sacada17.
- Previsão legal: essa espécie de cheque é tratada pelos artigos 44 e 45 da Lei do
Cheque, que abaixo transcrevemos:
LEI 7.357/85. Artigo 44. O emitente ou o portador podem cruzar o
cheque, mediante a aposição de dois traços paralelos no anverso do
título.
- Forma material do cruzamento: através da aposição de dois traços paralelos no
anverso (frente) do cheque.
17
MAMEDE, Gladston. Op. cit. p. 258-259
- Espécies: A Lei do Cheque prevê 2(duas) espécies de “cruzamento”: o
cruzamento geral e o cruzamento especial:
• Cruzamento geral: O cheque com cruzamento geral somente pode ser
pago a um banco. Desse modo, se o tomador concordou em receber
cheque cruzado, ou ele próprio o cruzou, deverá encaminhá-lo ao banco
no qual mantém conta de depósito18. Está previsto no §1º do artigo 44 da
Lei do cheque;
• Cruzamento especial: O cruzamento especial é feito através da menção, no
interior das linhas paralelas de cruzamento, de um banco, de forma que o
beneficiário do cheque deverá procurar exatamente a instituição financeira
designada no cruzamento e contratar dela os serviços de recebimento do
valor. Está previsto na parte final do §1º do artigo 44 da Lei do Cheque
• Observação: Conforme artigo 44, §2º, da Lei do cheque, o cruzamento
geral pode ser convertido em especial, mas o cruzamento especial não
pode ser convertido em geral.
18
COELHO, Fabio Ulhoa. Op. cit. p. 439
V – A APRESENTAÇÃO DO CHEQUE
a) Conceito de “apresentação” do cheque
Temos que o cheque se consubstancia numa ordem incondicional e
à vista de pagamento de quantia determinada contra um Banco (ou instituição
financeira a ele equiparada). Assim, para que seja entregue ao beneficiário o
valor a que se refere o cheque deve ocorrer a sua apresentação ao Banco-Sacado
para a sua liquidação (pagamento pelo Sacado).
Impõe-se a citação do artigo 34 da Lei 7.357/85, onde consta: “ a
apresentação do cheque à câmara de compensação equivale à apresentação a
pagamento”.
b) Prazo para apresentação
Como assevera Amador Paes de Almeida, a apresentação do
cheque é sumamente importante, de forma que, se tardia (feita após o prazo
legal) faz com que o cheque perca sua eficácia executiva contra os endossantes e
seus avalistas19.
A Lei do Cheque (Lei 7.357/85) normatiza o prazo para
apresentação do cheque no seu artigo 33, in verbis:
Lei 7.357/85. “Art. 33. O cheque deve ser apresentado para
pagamento, a contar do dia da emissão, no prazo de 30(trinta) dias,
quando emitido no lugar onde houver de ser pago; e de
60(sessenta) dias, quando emitido em outro lugar do País ou no
exterior.”
O cheque deve ser apresentado, pelo credor, ao banco sacado, para
liquidação, dentro do prazo assinalado pela lei. Conforme a sistemática legal,
para os cheques “da mesma praça”, o prazo é de 30 dias; para os “de praças
diferentes”, o prazo é de 60 dias, sempre a contados da data do saque.
A definição de uma ou outra categoria de cheque (da mesma praça
e de praças diferentes) é feita pela comparação entre o município que consta
como local de emissão e o da agência pagadora. Se coincidentes, o cheque é
considerado “da mesma praça”, caso contrário, de “praças diferentes”20.
19
20
ALMEIDA, Amador Paes. Op. cit. pp. 167-168
COELHO, Fabio Ulhoa. Op. cit. pp. 440-441
Para fim de definição do prazo de apresentação do cheque, é
irrelevante se os municípios – do local do saque e do estabelecimento bancário
pagador – integram a mesma câmara de compensação, conforme artigo 11 da
Resolução 1.682/90 do Banco Central do Brasil.
c) Conseqüências da falta de apresentação tempestiva do cheque
Como explica Ulhoa Coelho21, a inobservância do prazo de
apresentação acarreta a perda do direito de executar os endossantes do cheque, e
seus avalistas, se o título é devolvido por insuficiência de fundos, conforme
inciso II do artigo 47 da Lei do Cheque:
Lei 7.357/85. “Art. 47. Pode o portador promover a execução do cheque:
I- contra o emitente e seu avalista;
II- contra os endossantes e seus avalistas, se o cheque apresentado em
tempo hábil e a recusa de pagamento é comprovada pelo protesto ou por
declaração do sacado, escrita e datada sobre o cheque, com a indicação
do dia de apresentação, ou, ainda, por declaração escrita e datada por
câmara de compensação (...)”
Isto é, a não apresentação do cheque fora do prazo legal:
-
não afasta a possibilidade de execução contra o emitente e seu avalista
(Art. 47, II, LC);
-
impossibilita a execução contra os endossantes e seus avalistas.
d) A comprovação de recusa de pagamento
A comprovação da recusa de pagamento pelo Banco-Sacado é feita pelo
protestou ou pela declaração do Banco-Sacado, escrita e datada sobre o cheque,
com indicação do dia de apresentação, ou, ainda, por declaração escrita e datada
por câmara de compensação, conforme artigo 47, II, da Lei do Cheque.
21
Op. cit. p. 440
VI- SUSTAÇÃO DO CHEQUE
a) Conceito de sustação
O significado denotativo de sustação é “ato de sustar” e sustar é
“fazer parar, suspender, interromper”22. Aplicando tal significado ao regime
jurídico do cheque, temos sustação como o ato do emitente ou do legítimo
portador do título de impedir a liquidação do cheque, através de suspensão da
ordem de pagar.
Importante que se destaque que alguns Autores conceituam
“sustação” como sinônimo de oposição que, segundo a nossa visão, é uma
espécie do gênero “sustação”.
b) Espécies de sustação
O pagamento do cheque pode ser “sustado” pelo emitente em duas
hipóteses(espécies): a) revogação, também chamada contra-ordem (artigo 35 da
Lei do Cheque) e b) oposição (LC, art. 36)23.
Em ambas as espécies, o objetivo é impedir a liquidação do cheque,
pelo banco sacado, pressupondo que a liquidação ainda não tenha ocorrido a
liquidação do cheque pelo banco sacado.
Transcrevamos os artigos 35 e 36 da Lei do Cheque para posterior
comparação entre essas duas espécies:
Lei do Cheque. “Art. 35. O emitente do cheque pagável no Brasil pode
revoga-lo, mercê de contra-ordem dada por aviso epistolar, ou por via
judicial ou extrajudicial, com as razões motivadoras do ato.
Parágrafo único. A revogação ou contra-ordem só produz efeito depois
de expirado o prazo de apresentação e, não sendo promovida, pode o
sacado pagar o cheque até que decorra o prazo de prescrição, nos termos
do art. 59 desta lei.”
22
Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Versão digitalizada obtida no site <www.uol.com.br>.
Acesso em 17.out.2005
23
COELHO, Fabio Ulhoa. Op. cit. pp. 444-445
Lei do Cheque. “Art. 36. Mesmo durante o prazo de apresentação, o
emitente e o portador legitimado podem fazer sustar o pagamento,
manifestando ao sacado, por escrito, oposição fundada em relevante
razão de direito(...)”
Apresentados os dispositivos legais, vamos ao apontamento das diferenças
entre esses dois institutos:
Espécie
Quesito
Quem pode praticar
Produção de efeitos
Revogação
(ou contra-ordem)
Só o emitente
Somente a partir do
término do prazo para
apresentação
Oposição24
Emitente ou o portador
legitimado
Imediatamente
Nesse sentido o magistério de Fabio Ulhoa Coelho: as duas formas de
sustação do cheque apresentam pequenas diferenças. De um lado, a revogação é
ato exclusivo do emitente, enquanto a oposição pode também ser efetivada pelo
portador legitimado. De outro lado, o ato revogatório (a revogação ou contraordem) somente produz efeitos a partir do término do prazo de apresentação do
cheque, caso essa não se verifique, enquanto os efeitos da oposição são
imediatos. Dessa última distinção decorre que a contra-ordem, a rigor, é apenas o
ato cambiário pelo qual o emitente pode limitar a eficácia como cheque do título
aos 30 ou 60 dias (dependendo se for da mesma praça ou de praças diferentes)
seguintes à emissão25
c) A sustação e o Banco Sacado
Conforme artigo 36, parágrafo 2o, da Lei do Cheque, não cabe ao sacado
julgar da relevância invocada pelo oponente. Assim, não cabe ao banco sacado
apreciar as razões do ato. Se pessoa legalmente autorizada à sua prática, revoga o
cheque ou se opõe ao seu pagamento, o sacado deve apenas adotar os
procedimentos administrativos internos, aptos a atender a vontade dela. Se a
sustação é, no caso em particular, medida justa ou abuso de direito, isso não é
coisa com que se deva preocupar o banco. Sua função resume-se a simplesmente
24
Gladston Mamede utilização “sustação” e “oposição” como sinônimos, referindo-se ao instituto tratado
no artigo 36 da Lei do Cheque. Cf. MAMEDE, Gladston. Op. Cit. pp. 282-283
25
COELHO, Fabio Ulhoa. Op. cit. p. 446
garantir a eficácia ao ato unilateral do emitente. A validade ou invalidade da
sustação somente pode ser determinada pelo juiz, cabendo ao prejudicado
demandar o emitente e provar o abuso no exercício do direito.
d) Efeitos penais da sustação infundada
Na forma do parágrafo 2o do artigo 171 do Código penal, a sustação
infundada do pagamento do cheque tem os mesmos efeitos penais da emissão de
cheque sem fundos, caracterizando crime de estelionato.
Estelionato
Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou
mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.
§ 1º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a
pena conforme o disposto no art. 155, § 2º.
§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:
Disposição de coisa alheia como própria
I - vende, permuta, dá em pagamento, em locação ou em garantia coisa alheia como
própria;
Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria
II - vende, permuta, dá em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável, gravada
de ônus ou litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em
prestações, silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias;
Defraudação de penhor
III - defrauda, mediante alienação não consentida pelo credor ou por outro modo, a
garantia pignoratícia, quando tem a posse do objeto empenhado;
Fraude na entrega de coisa
IV - defrauda substância, qualidade ou quantidade de coisa que deve entregar a alguém;
Fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro
V - destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria, ou lesa o próprio corpo ou a
saúde, ou agrava as conseqüências da lesão ou doença, com o intuito de haver indenização ou
valor de seguro;
Fraude no pagamento por meio de cheque
VI - emite cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra
o pagamento.
VI- O CHEQUE SEM FUNDOS E SUAS CONSEQÜÊNCIAS
a) Conceito de “cheque sem fundos”
Verificando o Banco Sacado, no procedimento de liquidação do
cheque, não possuir o emitente fundos suficientes em sua conta de depósito, deve
restituir o título a quem lhe apresentou, com a declaração correspondente (de não
pagamento por insuficiência de fundos)26
b) Efeitos penais do “cheque sem fundos”
A emissão de cheque sobre conta que não possui adequada provisão
de fundos para fazer frente à ordem de pagar e, assim como a indevida frustração
do pagamento de um cheque (oposição indevida), considerada crime de
estelionato, de acordo com o artigo 171, §2º, do Código Penal.
A norma pressupõe dolo específico: a intenção de obter, para si ou
para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, utilizando-se do cheque,
ardilosamente, fraudando sua função creditícia e, assim, induzindo a erro aquele
que, ao recebe-lo, supõe estar recebendo uma representação do pagamento (se a
entrega se faz pro solvendo) ou o pagamento em si (se a entrega é feita pro
soluto). A caracterização do crime exige a aferição dessa intenção específica. Ao
examinar o Recurso em Habeas Corpus 2.285/SP, a 5ª Turma do STJ, sob a
relatoria do Min. Edson Vidigal, deixou claro que “o cheque pré-datado, emitido
como garantia de dívida, não constitui ordem de pagamento à vista”. O emitente,
por isso, não é obrigado a resgatá-lo antes da data aprazada27.
c) Efeitos cambiários do “cheque sem fundo”
O artigo 15 da Lei do Cheque determina que o “emitente” garante o
pagamento considerando-se não escrita a declaração pela qual se exima dessa
garantia.
E mais, o artigo 47 da Lei do Cheque permite ao portador promover
a execução do cheque:
- contra o emitente e seu avalista;
- contra os endossantes e seus avalistas
26
27
COELHO, Fabio Ulhoa. Op. cit. p. 446
MAMEDE, Gladston. Op. cit. p.243
É disposto pelo §3º do artigo 47 da Lei do Cheque que o portador
que não apresentar o cheque em tempo hábil, ou não comprovar a recusa de
pagamento, se este tinha fundos disponíveis durante o prazo de apresentação e os
deixou de ter, em razão de fato que não lhe seja imputável.
Assim, frente a um cheque sem fundos, temos que:
- se o cheque é apresentado no prazo legal (30 ou 60 dias): há o direito do
portador do cheque de execução contra o emitente e seu avalista e contra os
endossantes e seus avalistas (art. 47, I, LC);
- se o cheque é apresentado fora do prazo legal: o portador perde o direito de
execução contra os endossantes e seus avalistas (art. 47, II, LC). E, caso o
emitente tinha, no prazo de apresentação fundos disponíveis, e os deixou de ter,
em razão de fato que não lhe seja imputável, então o portador perde o direito de
execução contra o emitente (art. 47, §3º, LC).
Também, no âmbito administrativo, cabe ao Banco Central
disciplinar a repressão ao uso do cheque sem fundos. A sistemática vigente prevê
2(duas) sanções: a inscrição no CCF (Cadastro de Emitentes de Cheques sem
Fundos) e o pagamento de taxa do Serviço de Compensação de Cheques e
Outros. A inscrição no CCF é aplicável na segunda devolução do mesmo cheque,
e dela decorre a rescisão do contrato de depósito bancário e a proibição para
novos contratos desse gênero, com qualquer banco (exceto se a conta se destina
ao recebimento de salário, a ser movimentada unicamente por cheques avulsos).
O pagamento de taxa é aplicada a cada devolução do cheque sem fundos28.
28
COELHO, Fabio Ulhoa. Op. cit. pp. 450-451
VII – O PROTESTO DO CHEQUE
O protesto, no cheque, para fins de execução não é
obrigatório, vez que o artigo 47, §1º, da Lei do Cheque impõe que a “declaração
do sacado, escrita e datada sobre o cheque, com a indicação do dia de
apresentação”, ou, ainda, “a declaração escrita e datada por câmara de
compensação” produz os mesmos efeitos do protesto (para fins de execução).
Art . 47 Pode o portador promover a execução do cheque:
I - contra o emitente e seu avalista;
II - contra os endossantes e seus avalistas, se o cheque apresentado em tempo hábil e a
recusa de pagamento é comprovada pelo protesto ou por declaração do sacado, escrita e
datada sobre o cheque, com indicação do dia de apresentação, ou, ainda, por declaração
escrita e datada por câmara de compensação.
§ 1º Qualquer das declarações previstas neste artigo dispensa o protesto e produz os
efeitos deste.
§ 2º Os signatários respondem pelos danos causados por declarações inexatas.
§ 3º O portador que não apresentar o cheque em tempo hábil, ou não comprovar a recusa
de pagamento pela forma indicada neste artigo, perde o direito de execução contra o
emitente, se este tinha fundos disponíveis durante o prazo de apresentação e os deixou de
ter, em razão de fato que não lhe seja imputável.
§ 4º A execução independe do protesto e das declarações previstas neste artigo, se a
apresentação ou o pagamento do cheque são obstados pelo fato de o sacado ter sido
submetido a intervenção, liquidação extrajudicial ou falência.
Chamamos a atenção para o fato de que a dispensa de protesto, na
forma do §1º do artigo 47 da LC, é aplicável somente para fins de execução, não
gerando efeitos, por exemplo, para fins de instrução do pedido de falência com
base na impontualidade injustificada do devedor empresário (conforme artigo 94,
I, da Lei 11.101/05).
O emitente de cheque sem fundos é devedor do valor do cheque,
acrescido de juros, desde a data da apresentação ao banco sacado (e não do
protesto), correção monetária e reembolso de despesas em que incorreu o credor
(LC, art. 52). Desse modo, as taxas que o portador do cheque eventualmente
pagou para o seu banco, pelo frustrado serviço de compensação, as custas
desembolsadas no cartório de protesto, além das judiciais, são cobráveis do
emitente29.
29
COELHO, Fabio Ulhoa. Op. cit. pp. 449
VIII – A ORDEM DE PREFERÊNCIA
O artigo 40 a Lei do Cheque impõe que o pagamento dos
cheques se fará à medida em que forem apresentados os cheques e se dois ou
mais forem apresentados simultaneamente, sem que os fundos disponíveis
bastem para o pagamento de todos, terão preferência os de emissão mais antiga e,
se da mesma data, os de número inferior.
IX- AS AÇÕES CAMBIAIS
A ação cambial é aquela em que o demandado não pode
argüir, em sua defesa, matérias estranhas à sua relação com o demandante, em
razão do princípio da inoponibilidade das exceções pessoais aos terceiros de boafé. A generalidade dos títulos de crédito comporta uma única ação cambial, que é
a cobrança por meio de execução. Em relação ao cheque, o legislador prevê duas:
a execução e a ação de enriquecimento ilícito conforme artigos 59 a 61 da Lei do
Cheque30, in verbis:
Art . 59 Prescrevem em 6 (seis) meses, contados da expiração do prazo de apresentação, a
ação que o art. 47 desta Lei assegura ao portador.
Parágrafo único - A ação de regresso de um obrigado ao pagamento do cheque contra outro
prescreve em 6 (seis) meses, contados do dia em que o obrigado pagou o cheque ou do dia
em que foi demandado.
Art . 60 A interrupção da prescrição produz efeito somente contra o obrigado em relação ao
qual foi promovido o ato interruptivo.
Art . 61 A ação de enriquecimento contra o emitente ou outros obrigados, que se
locupletaram injustamente com o não-pagamento do cheque, prescreve em 2 (dois) anos,
contados do dia em que se consumar a prescrição prevista no art. 59 e seu parágrafo desta
Lei.
Art . 62 Salvo prova de novação, a emissão ou a transferência do cheque não exclui a ação
fundada na relação causal, feita a prova do não-pagamento.
A execução do cheque prescreve em 6(seis) meses, a contar do
término do prazo de apresentação. É, em princípio, irrelevante a data em que o
cheque foi apresentado ao banco sacado, e a de sua devolução. O termo inicial do
prazo de prescrição será considerado o fim do prazo de apresentação, inclusive se
a apresentação e devolução ocorrem fora desse prazo. Por exemplo, cheque de
mesma praça emitido em 2 de março prescreve em 1º de outubro do mesmo ano.
30
COELHO, Fabio Ulhoa. Op. cit. pp. 447-449
Assim é, se o cheque foi apresentado ao sacado em 5 de março (dentro do prazo
de apresentação, portanto) ou em 5 de abril (além do prazo) e independentemente
das datas em que o banco restituiu o documento ao credor31.
Lembre-se, a propósito, que, para fins cambiais, os dias se contam
pelos dias (Lei Uniforme, art. 36). Não é correto, portanto, considerar prescrito o
cheque de mesma praça em 7 meses e o de praças diferentes em 8 meses. A exata
aplicação da lei impõe a contagem dos 30 ou 60 dias correspondentes ao prazo de
apresentação, dia a dia, e, em seguida, a soma de 6 meses ao mês do término do
prazo. Em outros termos não se podem contar meses por dias, nem esses por
aqueles32.
A regra de contagem do prazo prescricional a partir do término do de
apresentação comporta exceção unicamente no caso de cheque pós-datado, se
apresentado à liquidação antes da data de emissão nele escrita. A aplicação da
regra geral nesse caso, de fato importaria benefício ao credor que descumpriu a
obrigação de não-fazer assumida perante o emitente – isto é, a de não liquidar o
cheque antes da data acertada de comum acordo entre eles. Os 6 meses
prescricionais, na hipótese de apresentação precipitada de cheque pós-datado,
contam-se como se o saque tivesse sido realizado na data da primeira
apresentação ao sacado. Desse modo, se cheque de mesma praça, que ostenta o
dia 2 de abril como data de emissão, é apresentado ao sacado em 15 de março,
deve-se reputar prescrita a execução em 14 de outubro do mesmo ano, último dia
em que o credor ainda pode ajuizar a execução.
Prescrita a execução, o portador do cheque sem fundos poderá, nos 2 anos
seguintes, promover a ação de enriquecimento indevido contra o emitente,
endossantes e avalistas (artigo 61 da LC). O portador do cheque, através e
processo de conhecimento, pede a condenação judicial de qualquer devedor
cambiário no pagamento do valor do título, sob o fundamento e que se operou o
enriquecimento indevido. De fato, se o cheque está sem fundos, o demandado
locupletou-se sem causa lícita, em prejuízo do demandante, e é essa, em
princípio, a matéria de discussão na ação33.
Como a ação de enriquecimento indevido é cambial, se o demandante é o
endossatário do cheque e o demandado é o emitente, não poderá esse último, na
contestação, suscitar matérias pertinentes ao negócio originário do título,
matérias que, perante terceiros de boa-fé, não são oponíveis, no regime de direito
cambiário. Frise-se, entretanto, que se a demanda é promovida pelo tomador
contra o emitente, será lícito ao réu contestar o pleito discutindo a relação
jurídica originária do título. Exemplo: se Antonio tomou dinheiro emprestado de
Benedito – agiota que cobra juros usurários -, e procedeu ao pagamento do
devido por cheques, que foram regularmente endossados a Carlos, terceiro de
31
Idem
Ibidem, pp. 447-448
33
Ibidem, pp. 448-449
32
boa-fé, na ação de enriquecimento indevido que o último promover contra aquele
não será cabível contestar a pretensão, discutindo a limitação legal dos juros.
Mas se o cheque não circulou, na ação de enriquecimento indevido que Benedito
aforar contra Antonio, será perfeitamente discutível o excesso de juros34.
Após a prescrição das ações cambiais, será ainda possível ao
portador do cheque sem fundos promover a ação causal (LC, art. 62, a seguir
transcrito), para fins de discutir as obrigações decorrentes da relação originária:
Art . 63 Os conflitos de leis em matéria de cheques serão resolvidos de
acordo com as normas constantes das Convenções aprovadas, promulgadas e
mandadas aplicar no Brasil, na forma prevista pela Constituição Federal.
Claro que a admissão é condicionada à existência de relação
extracambial entre os litigantes, que é o objeto da lide. No exemplo acima, entre
Carlos e Antonio não existe nenhuma outra relação jurídica, a não ser o próprio
cheque; por essa razão, o primeiro, depois de prescritas as ações cambiais, não é
mais titular de qualquer direito contra o segundo. Poderá apenas intentar algum
processo contra Benedito, para discutir a relação jurídica que havia justificado a
transferência do título de crédito (mútuo, responsabilidade civil etc)35.
34
35
Idem
Idem
X – AUTONOMIA E INDEPENDÊNCIA NO CHEQUE
Também no que diz respeito ao cheque, as obrigações assumidas
pelos diversos partícipes da relação, entre sacador, avalista, sacado, endossatário,
são autônomas e independentes, conforme artigo 13 da Lei do Cheque36, in
verbis:
Art . 13 As obrigações contraídas no cheque são autônomas e
independentes.
Parágrafo único - A assinatura de pessoa capaz cria obrigações para o
signatário, mesmo que o cheque contenha assinatura de pessoas
incapazes de se obrigar por cheque, ou assinaturas falsas, ou assinaturas
de pessoas fictícias, ou assinaturas que, por qualquer outra razão, não
poderiam obrigar as pessoas que assinaram o cheque, ou em nome das
quais ele foi assinado.
Repete-se, assim, por expressa disposição normativa, os princípios
já estudados na parte geral e que caracterizam o Direito Cambiário. A esses,
como já visto, soma-se o princípio da abstração, permitindo-se afirmar que o
cheque é declaração unilateral de um crédito que independe do negócio de base,
isto é, que não comporta investigação sobre a causa debendi37.
A aplicação dos princípios da autonomia e da independência leva à
afirmação de uma regra que se encontra escrita no artigo 13, parágrafo único, da
Lei do cheque, prevendo que a assinatura de pessoa capaz cria obrigações para o
signatário, mesmo que o cheque contenha assinatura de pessoas incapazes de se
obrigar por cheque, ou assinaturas falsas, ou assinaturas de pessoas fictícias, ou
assinaturas que, por qualquer outra razão, não poderiam obrigar as pessoas que
assinaram o cheque, ou em nome das quais ele foi assinado38.
36
MAMEDE, Gladston. Op. cit. pp. 261-263
Idem
38
Idem
37
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