AVALIAÇÃO ESPAÇO-TEMPORAL INTEGRADA DO NDVI COM O REGIME
PLUVIOMÉTRICO NA BACIA DO RIO SÃO FRANCISCO
Rosilene Mendonça Nicácio1, Otto Corrêa Rotunno Filho2, Luciana Mara Temponi de Oliveira3,
Gutemberg Borges França3
RESUMO
Muitas pesquisas têm sido dedicadas ao entendimento da complexidade da dinâmica do clima, visto que,
diversas questões no âmbito sócio-econômico são reflexos das variações do clima. A vegetação tem importante
contribuição no sistema climático, uma vez que, interage dinamicamente com a atmosfera e atua na
disponibilidade hídrica do solo. A avaliação da relação entre o NDVI em região de Savana e a chuva mostrou
bons coeficientes de correlação com máximos em torno de 0.70 a 0.80 para a chuva acumulada de 120 a 130
dias anteriores.
ABSTRACT
Many researches have been worried with understanding of the complexity of the climate dynamic. The main
reason for this is that the both economic and social development is associated with the climatic variations. The
vegetation has important contribution in the climatic system because it’s dynamic interactions with atmosphere
and capacity of modification of the soil moisture. The analysis of the relation among rainfall and NDVI in
regions of savanna showed good coefficients of correlation, with values maximum around 0.70 – 0.80 for
accumulated rainfall of last 120-130 days.
Palavras-chave: NDVI, regime pluviométrico, rio São Francisco.
INTRODUÇÃO
Variabilidade climática e gerenciamento dos recursos hídricos são questões cada vez mais abordadas e
despertam preocupações na comunidade científica. No entanto estas questões não são triviais, uma vez que, o
clima é resultado de diversas componentes que atuam concomitantemente (Los, 1998). A atuação antrópica é
um fator importante na avaliação da variabilidade climática. Relatórios do IPCC (2001) sugerem um aumento
da temperatura global e variações na pluviometria, em função da emissão de gases de efeito estufa e das
variações no uso do solo. Além disso, muitas pesquisas apontam para importância da interação biosferaatmosfera (Sellers et al, 1996; Los, 98; Stockli e Vidade, 2004).
A vegetação responde aos padrões espaço-temporais do clima e atua modificando a camada atmosférica
adjacente à superfície (Stockli, 2004), atuando sobre o ciclo de carbono, hidrológico e balanço de energia (Los
et al., 2001). A despeito da relevância da dinâmica da vegetação, medições de parâmetros que a caracterizem
não são comuns, por esta razão os índices de vegetação, tais como o índice de vegetação por diferença
_______________________________________________________________________________________________________________________________________________
1
IGDEMA/UFAL - Campus A. C. Simões, BR 104-Norte, km 97, CEP: 57072-970, Maceió-AL; 82-33577173,
[email protected]
2
PEC/COPPE-UFRJ - Centro de Tecnologia, Bl. B, CEP: 21945-970, Rio de Janeiro-RJ; 21-25627841;
[email protected]
3
IGEO/UFRJ - Ilha do Fundão, Depto. Meteorologia, CEP: 21949-900- UFRJ-RJ; 21-25989494; [email protected] ;
[email protected]
normalizado – NDVI (Tucker, 1979), tornaram-se uma importante fonte de dados, sendo utilizados em
classificação e monitoramento da vegetação (Liu et al., 1994; Kogan, 1995), estabelecimento de relação com a
precipitação (AL-Bakri e Suleiman, 2004, Nezlin et al., 2005) e com fenômenos climáticos de escala global
(Gurgel e Ferreira, 2003). Considerando-se ainda que o rio São Francisco exerce um papel fundamental no
desenvolvimento econômico e social tornam-se relevantes estudos que provejam conhecimentos vocacionados
a responder questões sobre sua disponibilidade hídrica e mecanismos climáticos que alterem essa
disponibilidade. Neste contexto, o objetivo deste trabalho é avaliar a dinâmica espaço-temporal do índice de
vegetação por diferença normalizado e suas conexões com a precipitação sobre a bacia do São Francisco.
MATERIAIS E MÉTODOS
A região estudada (fig. 1) é definida pela bacia do São Francisco, que tem uma extensão de 2700km,
deste sua nascente até sua foz. Com uma área de 640.000km2, abrange porções dos Estados de Minas Gerais,
Bahia, Goiás, Pernambuco, Sergipe, Alagoas e Distrito Federal.
Figura 1 – Ilustração da região de estudo e localização das estações pluviométricas.
Foram utilizados dados diários de precipitação de 105 estações (fig. 1), para o período de 1985-2004,
obtidos através da Agência Nacional de Águas. A elaboração de curvas dos totais diários de chuva permitiu a
identificação de valores aberrantes nas séries pluviométricas, que foram retirados da série. As falhas em
algumas estações selecionadas foram preenchidas utilizando o critério de correlação com as demais, ao nível de
significância de 95%.
A fim de identificar regiões com regimes pluviométricos distintos foram utilizados os algoritmos de
agrupamento k-média e o ligação de Ward, aplicados aos dados mensais de precipitação acumulada. Para
validação das partições pluviométricas foram utilizados os critérios de Calinski e Harabazs (1974) e Pakhira et
al. (2004).
A caracterização da vegetação sobre a bacia foi realizada com o índice de vegetação denominado EFAINDVI (European Fourier-Adjusted and Interpolated NDVI), desenvolvido por Stockli (2004), disponível para
todo o globo, no período de 1982-2000, em ftp://bach.ethz.ch/pub_read/stockli/efai_world. O EFAI-NDVI tem
uma resolução temporal de 10 dias e espacial de 0.1° x 0.1° e foi gerado a partir do Pathfinder NDVI,
calculado com as reflectância nos canais visível (V – canal 1) e infravermelho próximo (IV – canal 2) do
AVHRR a bordo dos satélites NOAA 7, 9, 11 e 14, dado por: NDVI = IV − V IV + V .
A despeito do vasto uso dos índices de vegetação, os ruídos, que comprometem a qualidade das
reflectâncias e originam oscilações de alta freqüência nos dados semanais, devem ser mitigados. Os ruídos
podem ser provocados por nuvens, constituintes atmosféricos e aerossóis, geometria de visada, desvio na órbita
dos satélites e degradação do sensor (Gutman, 1991; Tanré et al., 1992; Kogan, 1995). O pathfinder NDVI já
apresentava algumas correções, no entanto Stockli (2004) verificou que não havia uma variação suave no
tempo, e a existência de alguns valores anômalos e pixels com falhas, o que motivou a aplicação, com algumas
modificações, do ajuste de Fourier, preconizado por Sellers et al. (1996) e Los (1998), originando o EFAINDVI. A geração do EFAI-NDVI, doravante chamado de NDVI, foi constituída basicamente de duas etapas:
interpolação 1) espacial ponderada pelo inverso da distância para o preenchimento dos pixels com falhas; e 2)
temporal por meio de um ajuste de Fourier com e sem peso, o que permitiu a obtenção de uma serie temporal
do índice com variação sazonal. Maiores detalhes podem ser encontrados em Stockli e Vidale (2004) e Stockli
(2004).
Para avaliação da relação NDVI-precipitação foi utilizado um Sistema de Informação Geográfica (SIG),
no qual, a elaboração de macros permitiu: registro das imagens NDVI em Sistema de Coordenadas Geográficas
(lat/lon e datum WGS84); enquadramento da área da bacia; obtenção das séries temporais de NDVI nos pixels
com informações pluviométricas. O mapa de vegetação do IBGE, na escala de 1:5.000.000, foi usado para
identificação do tipo de vegetação. A Figura 2b mostra a localização e o tipo de vegetação nos pontos de
extração do NDVI. A bacia do São Francisco caracteriza-se por seus múltiplos usos e complexo
desenvolvimento sócio-econômico, dessa maneira as atividades antrópicas são fatores continuamente
presentes, por esta razão buscou-se por áreas onde esse fator fosse menos acentuado. Para isso foram utilizadas
as imagens Landsat dos mosaicos da EMBRAPA (2004). Após a extração dos valores digitais (ND – 8bits),
nos pontos selecionados, esses valores foram convertidos em valores de NDVI.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
A análise de agrupamento permitiu a identificação de cinco grupos pluviométricos sobre a bacia (fig. 2a).
Os totais pluviométricos decrescem dos grupos 03 e 04, situados na porção sul do São Francisco (Minas
Gerais), até o sub-grupo B, entre os reservatórios de Sobradinho e Itaparica, voltando a aumentar na região
mais próxima a foz. Os pontos de NDVI avaliados estão distribuídos sobre o oeste da Bahia, região do grupo
02, e no sul ocidental da bacia do São Francisco, abrangendo o grupo 03. A evolução temporal do NDVI nas
regiões de savana, de forma geral, comportou-se de maneira similar, com valores oscilando entre 0.20 e 0.70.
Entre 1993-94 ocorreram mínimos mais amenos e máximos de NDVI mais elevados. O período de 1990-94 foi
caracterizado como de El-Niño estendido, com anomalias de temperatura da superfície do mar mais intensas
em 1992.
Poder-se-ia dizer que as alterações no NDVI no período de 1993-94 são reflexos do El-Niño estendido,
uma vez que, este fenômeno proporcionou grandes alterações climáticas no Brasil. No entanto, ao se observar
os totais de chuva entre 1993-94, percebe-se anomalias negativas em 1993 para todos os grupos de chuva,
indicando chuvas abaixo da média, enquanto 1994 não apresentou uma tendência significativa de chuvas
abaixo ou acima da média, em todos os grupos, exceto o grupo 04 que mostrou uma predominância de chuvas
ligeiramente abaixo da média.
(a)
(b)
Figura 2 – (a) Grupos pluviométricos e (b) pontos de análise do NDVI.
Assim, mesmo diante das alterações climáticas advindas da ocorrência do El-Niño, parece ambíguo
mencionar um aumento na produtividade da vegetação quando, em geral, os totais pluviométricos estiveram
abaixo da média. Um outro aspecto é que o Pathfinder NDVI apresenta falhas nas imagens existentes de 1994 e
falta de dados entre setembro e dezembro deste ano. A existência de dados para este período no conjunto
EFAI-NDVI se deve aos processos de interpolação espacial e temporal aplicados aos dados originais, que pode
ter superestimado os valores do índice para este período. Note que, outros importantes eventos quentes do
ENSO aconteceram no século passado, tais como o de 1982-83 e 1997-98, mas não parece haver uma resposta
nítida do NDVI em regiões de savana a estas variações climáticas.
A série temporal média do NDVI mostrou um pico entre abril e maio de 1994 (fig. 3a). O
comportamento médio do índice de vegetação em regiões de savana no alto e médio São Francisco foram
similares, mesmo as estações de NDVI estando situada em regiões com distintos regimes pluviométricos,
conforme mostra os resultados da análise de agrupamento. Os valores do índice decrescem a partir de junho,
com mínimos sendo observados entre agosto e outubro. Na figura 3b observa-se que os totais pluviométricos
decendiais decrescem à medida que nos aproximamos de maio, sendo os mínimos observados entre junho e
agosto, meses secos desta região. As curvas de NDVI permanecem aproximadamente constantes entre janeiro e
maio, a partir de onde os valores do NDVI começam a decair, com mínimos observados em setembro.
Na tentativa de encontrar a defasagem entre a chuva e o NDVI foram calculadas as correlações sem e
com atrasos de até 12 dezenas, ou seja, 4 meses com a chuva a frente. As correlações foram elaboradas com
dois distintos critérios. No primeiro, as correlações foram calculadas considerando dezenas isoladas no tempo
sem levar em conta as interações inter-decendiais dos dados pluviométricos, esta foi chamada de correlação
decendial, mostrada na figura 4a. As correlações simultâneas apresentaram baixos valores, aumentando com a
inserção de atrasos. As correlações máximas foram encontradas com a chuva ocorrida entre 6 a 7 dezenas
anteriores, com valores em torno de 0.40 a 0.50, significantes ao nível de 95% de confiança. Algumas exceções
podem ser observadas, onde as correlações apresentaram um padrão diferente. Destacam-se as estações
1145004 e 2043042, que apresentaram baixas correlações, sendo ainda observadas, na segunda estação,
correlações negativas.
(a)
(b)
Figura 3 – (a) Variabilidade interanual e sazonal entre 1982 a 2000 (b) evolução temporal decendial da
chuva e NDVI, sobre região de Savana na bacia do São Francisco.
O segundo critério levou em consideração a chuva entre as dezenas. Dessa maneira, a análise de
correlação foi feita de forma integrada no tempo, acumulando a chuva entre as dezenas, esta correlação é aqui
chamada de multidecendial e mostrada na figura 4b. Neste caso os valores de correlação aumentaram
significativamente.
(a)
(b)
Figura 4 – Correlação decendiais (a) e multidecendiais (b) entre a chuva e o NDVI.
As máximas correlações ocorreram com a chuva acumulada de 13 a 14 dezenas anteriores, com valores
oscilando entre 0.70 e 0.80, significantes ao nível de 95% de confiança. Correlações mais elevadas neste
segundo caso já eram esperadas, uma vez que é mais natural que este tipo de vegetação responda efetivamente
a uma chuva integrada no tempo, ou seja, considerando-se as taxas pluviométricas ao longo de um período do
que a eventos isolados de chuva. Em suma, a vegetação apresenta sua melhor relação com o acumulado de
chuva de entre 130 a 140 dias anteriores. Dessa maneira, é razoável dizer que, em regiões de savana, o NDVI
reflete a qualidade pluviométrica de 4 a 5 meses anteriores.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Uma avaliação da relação entre o NDVI e a chuva, mostrou bons coeficientes de correlação, sendo para
correlação decendial os maiores valores encontrados para chuva ocorrida em torno de 2 meses de antecedência.
No entanto, resultados melhores foram encontrados para correlação multidecendial, o que é razoável uma vez
que a vegetação em estudo responde mais efetivamente a chuva integrada no tempo que a eventos isolados de
chuva. As correlações multidecendiais mais elevadas, em torno de 0.70 a 0.80 ao nível de 95% de confiança,
foram observadas com a chuva acumulada de 12 a 13 dezenas anteriores, ou seja, a savana na região estudada
responde fortemente a chuva acumulada de 120 a 130 dias anteriores.
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