EMBALAGENS DE ÁGUA MINERAL: A IMPORTÂNCIA DA SELEÇÃO E IDENTIFICAÇÃO DE MATERIAIS NO PROJETO DA EMBALAGEM VISANDO A RECICLAGEM Luís A. R. Werlang 1 e Izabel C. Riegel 2 1 Programa de Pós-Graduação em Gestão Tecnológica: Qualidade Ambiental do Centro Universitário Feevale, Campus II - RS-239, 2755 – CEP 93352-000 – Novo Hamburgo, RS - [email protected]; 2 Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas do Centro Universitário Feevale – [email protected] Mineral water bottles: the importance of materials selection and identification on packaging design aiming at recycling In the context of growing volume of waste residues, food plastic packaging have greatly contributed to the exhaustion of natural resources on the extraction of raw materials as well as on the recycling and materials reusing steps. Considering that food packaging has a short life cycle, it is of utmost importance to correctly identify the materials to promote an adequate disposal and recycling. This work has evaluated the projectual characteristics of 14 mineral water bottles. It was found that the brazilian standard NBR 13230 has not been adequately applied as well as the selection of the materials for the fabricating of the bottles could be improved. Our results contribute to a better understanding on the criteria to be adopted in designing plastic packagings. Introdução Segundo dados da ONG Uniágua1 – Universidade da Água – de São Paulo, o consumo de água mineral envasada no Brasil tem crescido 20% ao ano desde 2000, fato positivo para a economia e o crescimento de novas plataformas de emprego. Em contrapartida, aumenta o volume de embalagens de água mineral dispostas como resíduo, nem sempre com um projeto adequado que facilite o processo de separação dos materiais e a posterior reciclagem. Embalagens de água mineral como garrafas de 500 mL com ou sem gás, possuem a característica de descarte imediato após o consumo. Este descarte decorre da particularidade do produto, cuja função para o consumidor é satisfazer uma necessidade de curto prazo, tornando a embalagem sem utilidade ou reaproveitamento. As embalagens podem ser classificadas na perspectiva da reciclagem em três grupos distintos2; as do tipo reaproveitáveis, que proporcionam a reciclagem do material para o mesmo ou diferentes fins; as embalagens reutilizáveis, que permitem o reaproveitamento para novos ou mesmo uso; e as embalagens descartáveis que, após o consumo do produto, são descartadas como resíduo. O PET (polietileno tereftalato) é o material mais utilizado nas embalagens de água mineral devido à transparência, leveza, resistência ao impacto e facilidade de produção. A reciclagem do PET pós-consumo cresce anualmente, segundo a ABIPET (Associação Brasileira do PET), em pesquisa3 realizada em 2006, com perspectivas de expansão nos próximos anos. Somente no ano de 2006, 174.000 toneladas de PET pós-consumo foram recicladas, chegando a um percentual de 47% do volume da resina produzida no Brasil. Na mesma pesquisa que aponta os índices da matériaprima reciclada, são verificados problemas que as indústrias recicladoras enfrentam nos procedimentos iniciais da reciclagem do PET, como restos de cola oriundos da rotulagem, mistura com outros materiais como o PVC e outros tipos de resíduos como restos de alimentos e outros detritos secos ou orgânicos. A concepção de um produto deve começar e terminar levando em consideração questões ambientais e de sustentabilidade4. O projeto de embalagens e demais produtos devem facilitar a reciclagem ou o reaproveitamento de materiais empregados, a partir de um projeto sistematizado onde fatores como a correta separação e identificação dos materiais plásticos seja premissa básica. Apenas as legislações e instrumentos de controle devem induzir a diminuição da geração de resíduos e a máxima reciclagem, mas o projeto também influenciar para tal4. O profissional que atua no desenvolvimento de produtos e processos pode influenciar para o bem ou para o mal, em se tratando de conseqüências ambientais5. Segundo VEZZOLI e MANZINI, um projetista “não tem a legitimidade e nem os instrumentos para obrigar (através de leis) ou para convencer (através de considerações morais) qualquer um a modificar de comportamento”. Desta maneira, o desenvolvedor de uma embalagem pode apenas oferecer condições e soluções, ou seja, “produtos e serviços que qualquer pessoa possa reconhecer como melhores que os oferecidos anteriormente”. A NBR 13230 intitulada “Simbologia indicativa de reciclabilidade e identificação de materiais plásticos” objetiva identificação de materiais plásticos empregados na fabricação de embalagens. Por não ser de aplicação obrigatória, na maioria dos casos ela não tem sido aplicada e, quando aplicada, é freqüente seu uso de forma equivocada ou incompleta6. Neste aspecto, a seleção e identificação de materiais em um projeto de embalagem são fundamentais para o sucesso do processo de reciclagem, reduzindo impactos ambientais e aumentando a reciclabilidade das resinas descartadas. Experimental Levando em consideração a importância da seleção de materiais para o melhor desenvolvimento de um projeto de embalagens, este trabalho buscou, através de análise qualitativa, a comparação entre 15 tipos de garrafa de água mineral de 500 mL, relativas a 11 marcas de produtos, comercializados na região metropolitana de Porto Alegre. Os critérios de análise levaram em conta o tipo de material empregado na embalagem (tampa, garrafa e rótulo) e sistema de fixação do rótulo à garrafa (uso ou não de cola). Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros As embalagens e rótulos foram analisados levando em consideração o fato de que outras variantes da mesma linha como, por exemplo, água com gás 500 mL e demais extensões de produtos (1,5 L, 2,5 L e 5 L) possuem a mesma sistemática de uso de materiais, processos de impressão e de identificação dos plásticos componentes. As marcas de água mineral selecionadas foram as seguintes: Fonte Ijuí, Água da Pedra, Aquarel, Aquarius, Charrua, Floresta, São Lourenço, Ouro Fino, Fontana Oro, Schincariol e Sarandi. Como a presença do PET (polietileno tereftalato) nas garrafas é uma constante para todos os produtos verificados, foi proposto o agrupamento das embalagens de acordo com o material utilizado para a rotulagem e o sistema de fixação do rótulo à garrafa, levando a 3 categorias de análise: rótulo em papel, rótulo em PP (polipropileno) e rótulo em PEBD (polietileno de baixa densidade). Resultados e Discussão Fazem parte do grupo de embalagens que possuem o rótulo em papel as seguintes marcas: Água da Pedra, Aquarel, Floresta, São Lourenço e Sarandi (com duas sub-marcas: convencional e Sarandi Fitting). Todas as embalagens apresentam o sistema de impressão em offset e o uso de cola para a fixação do rótulo na embalagem. A problemática que envolve as embalagens citadas é o uso de cola para a fixação do rótulo e a difícil separação do lacre da garrafa. A embalagem do produto Água da Pedra (Figura 1) possui um lacre em PP (Fig. 1A) que permanece preso à garrafa após seu rompimento, só sendo removido por ação mecânica externa. A identificação dos materiais plásticos no rótulo da embalagem mostra apenas uma informação genérica (Fig. 1B) apontando o material como reciclável. O uso de cola inadequada ou quantidade excessiva para a fixação do rótulo em papel deixa resíduos de difícil remoção (Fig. 1C), o que irá demandar mais energia e água para a limpeza e reciclagem do material. Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros Figura 1 – Produto Água da Pedra As marcas cujas embalagens utilizam PP para a confecção do rótulo são as seguintes: Aquarius, Charrua, Ouro Fino (com duas sub-marcas: convencional e Ouro Fino Fitness) e Schincariol. O rótulo é de BOPP (polipropileno bi-orientado) na forma de filme monocamada. Por não ser tão flexível quanto PEBD, necessita de cola para fixá-lo ao rótulo na garrafa. O sistema de impressão empregado nas cinco embalagens avaliadas é flexografia, encontrando-se o uso de pigmentos metálicos em 3 das embalagens: Aquarius, Charrua e Schincariol. Na embalagem da água mineral Charrua (Figura 2) não se observou identificação referente ao tipo de material empregado na garrafa ou na tampa (Fig. 2B). Todas as tampas são em PP apresentando o mesmo problema de remoção do corpo da garrafa, discutido no parágrafo anterior. O rótulo utiliza pigmentos metálicos o que poderia ser reavaliado pois o único critério para escolha de pigmentos metálicos neste tipo de rótulo é mercadológica visto que acredita-se que esta característica visual aumenta o potencial atrativo do produto no ponto de venda. A identificação acerca da reciclagem dos materiais aparece de maneira geral, não designando os materiais empregados no conjunto da embalagem (Figura 2B). A cola para a fixação do rótulo deixa pouco resíduo na garrafa, assim como permite sua fácil remoção (Fig 2C). Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros Figura 2 – Produto Charrua Fazem parte do grupo que possui rótulo em PEBD as seguintes marcas: Fonte Ijuí e Fontana Oro. Em relação à marca Fonte Ijuí, foram analisadas duas embalagens em uso atualmente e uma versão anterior de rótulo, devido à relevância deste exemplo para ilustrar os problemas de projeto de embalagens. O grande diferencial das embalagens rotuladas em PEBD está no sistema de fixação. O PEDB possui características mecânicas que fazem com que o mesmo fique aderido à garrafa sem a necessidade do uso de cola. O sistema de rotulagem é conhecido no setor gráfico e industrial como “rótulo do tipo manga”. Na impressão e acabamento do rótulo, o mesmo assume o formato de uma “mangueira”, sendo acondicionado em bobinas. O rótulo “manga” é produzido aproximadamente com o mesmo diâmetro da garrafa o que facilita sua fixação. A água Fonte Ijuí (Figura 3) teve o seu rótulo redesenhado em 2005, quando passou a predominar a cor azul. O processo em flexografia e os materiais selecionados mantiveram-se os mesmos em relação à versão anterior: garrafa em PET, tampa e lacre em PP e rótulo em PEBD. Neste novo rótulo a grande problemática encontrada é a não identificação dos materiais que compõem a embalagem. No projeto anterior, ainda que de forma equivocada (Figura 4), existia a identificação dos materiais, sendo que no redesenho do rótulo a informação deixou de existir, dando lugar à outra de cunho geral: “reciclável” (Fig. 3B). Este fato evidencia a interferência do projetista da embalagem no sentido de contribuir de maneira voluntária nas questões de reciclabilidade. Como Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros observado na Figura 4, aparentemente não há motivos técnicos que mostrem que era inviável manter o mesmo padrão de identificação dos ícones. Figura 3 – Produto Fonte Ijuí A Tabela 1 mostra as características das embalagens avaliadas. Analisando-se os parâmetros, pode-se apontar o último grupo da tabela como o que possui o conjunto de características que mais favorecem a reciclagem. A rotulagem em PEBD permite o mesmo tipo de impressão que dos rótulos em PP, por exemplo, mas com a grande vantagem de não necessitar de cola para a sua fixação na garrafa. Este fator é fundamental para se obter um produto descartado mais limpo, sem demandar tempo e energia para o processo de reciclagem e posterior destino como resina reciclada. Quanto à NBR 13230, nenhuma embalagem apresentou a correta aplicação da norma. Apenas um rótulo em desuso de apenas uma das marcar contemplou a norma (Fig.4). Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros Figura 4 – Produto Fonte Ijuí com rótulo antigo. Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros Tabela 1 - Embalagens de água mineral na região metropolitana de Porto Alegre Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros Conclusões A adequada seleção dos materiais no projeto de uma embalagem pode influenciar positivamente no processo de descarte. Para a obtenção de um projeto adequado, são necessários conhecimentos técnicos e conceituais, da perspectiva do mercado e da produção, assim como dos materiais utilizados para a fabricação das embalagens. Idealmente os estudos mínimos necessários a realização de projetos eficientes de embalagens de água mineral, devem contemplar: Análise do Ciclo de Vida de produtos; Estudos de impactos ambientais de todo o processo de produção gráfico-formal; Uso e identificação adequados de materiais poliméricos e Avaliação do destino final de uma embalagem após o seu descarte. Em decorrência do levantamento realizado no âmbito deste trabalho, foi proposta uma sistemática de concepção da embalagem (Figura 5), considerando critérios e parâmetros através do conhecimento preliminar do processo produtivo e dos tipos de materiais empregados em embalagens desta natureza. Com ações inteligentes e eficazes, sem representar custos adicionais no desenvolvimento, salvo novos processos ou produtos, é possível proporcionar para a sociedade embalagens plásticas que efetivamente possuam um alto grau de reciclabilidade, cabendo ao desenvolvedor, o produtor e distribuidor a incumbência de atuarem de forma conjunta para que esta realidade seja alcançada. Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros Figura 5 - Sistemática de seleção e identificação dos materiais em um projeto de embalagem de água mineral Referências Bibliográficas 1. UNIÁGUA [http://www.uniagua.org.br/website/default.asp?tp=3&pag=aguamineral.htm#MERCADO] acesso em 08 de maio de 2007. 2. BROD Jr, Marcos.Desenho-de-embalagem: o projeto mediado por parâmetros ecológicos. Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Santa Maria, Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção – Área de Concentração Projeto de Produto, Santa Maria, RS, 2004. 3. ABIPET – Censo da Reciclagem do PET 2006 [http://www.abipet.com.br/reciclagem.php] acesso em 8 de maio de 2007. 4. ZANIN, Maria; MANCINI, Sandro Donnin. Resíduos plásticos e reciclagem: aspectos gerais e tecnologia. São Carlos: EDUFScar, 2004. 5. MANZINI, Elio; VEZZOLI, Carlo. O desenvolvimento de produtos sustentáveis. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2005. 6. L.A.R. Werlang, Dissertação de Mestrado, Centro Universitário Feevale, 2007. Anais do 9o Congresso Brasileiro de Polímeros