UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE José Luiz Bednarski DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO COMBATE À PUBLICIDADE ENGANOSA São Paulo 2006 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version JOSÉ LUIZ BEDNARSKI DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO COMBATE À PUBLICIDADE ENGANOSA Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito Político e Econômico Orientador: Prof. Dr. Nelson Mannrich São Paulo 2006 2 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version JOSÉ LUIZ BEDNARSKI DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO COMBATE À PUBLICIDADE ENGANOSA Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Político e Econômico BANCA EXAMINADORA ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Nelson Mannrich Universidade Presbiteriana Mackenzie ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 3 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version À minha família, pelo carinho e constante apoio. 4 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version AGRADECIMENTOS Ao Prof. Dr. Nelson Mannrich, minha eterna gratidão pela dedicada orientação, que lhe subtraiu muitas horas de trabalho, pelas lições transmitidas e, principalmente, por me incentivar e acreditar na realização deste trabalho. Ao Ministério Público do Estado de São Paulo, que alimenta a chama de meu idealismo e minha esperança no aprimoramento dos homens e das instituições. Aos Profs. Drs. Gilberto Bercovici e Antonio Martin, pelas críticas apontadas no exame de qualificação, que contribuíram para meu aprimoramento acadêmico e pessoal. Aos Profs. Drs. José Francisco Siqueira Neto e Gianpaolo Poggio Smanio, cuja colaboração foi indispensável para a realização desta dissertação. À Dra. Renata Pereira Martins, inspiração profissional e razão de meu inesgotável amor, que acompanhou este trabalho da concepção à encadernação. Às Profas. Pascale Dumazedier e minha irmã Silvia Silva Bednarski Guimarães, pelo valioso auxílio na correção idiomática. Aos funcionários da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da Universidade de São Paulo, pelo profissionalismo e cortesia. 5 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version "Entre todos os ofícios judiciários, o mais árduo parece-me o do acusador público, o qual, como sustentador da acusação, deveria ser tão parcial quanto um advogado e, como guardião da lei, tão imparcial quanto um juiz. Advogado sem paixão, juiz sem imparcialidade: este é o absurdo psicológico em que o representante do Ministério Público, se não tiver um senso de equilíbrio especial, correrá o risco de perder a serenidade, a defensor ou, cada instante, generosa por amor por amor combatividade à polêmica, à do a desapaixonada objetividade do magistrado". (Piero Calamandrei) 6 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version RESUMO A presente dissertação de mestrado baseou-se na experiência profissional do autor como promotor de justiça do consumidor. A publicidade enganosa afeta interesses difusos do consumidor que é atribuição do Ministério Público defender. A eficácia das normas de proteção integral do consumidor face à publicidade enganosa depende fundamentalmente da boa atuação dos representantes da instituição, procedendo com rapidez, privilegiando, enquanto possível, a prevenção e agindo simultaneamente nas áreas criminal e cível, seja na esfera judicial ou extrajudicial. O objetivo deste trabalho, à luz dos ensinamentos doutrinários nacionais e estrangeiros, é analisar a natureza jurídica da publicidade enganosa, sua ligação com o perfil institucional do Ministério Público, as formas como este deve exercer suas atribuições no combate àquela e apresentar fundamentadamente sugestões de aprimoramento para esta atividade. Palavras-chave: Publicidade Enganosa. Ministério Público. Mecanismos de Atuação. 7 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version RESUMÉ La dissertation suivante de maîtrise a été le fruit de l´expérience professionnelle de l´auteur en tant qu ´avocat général du consommateur. La défense du consommateur face à la publicité mensongère est une des attributions du Ministère Public. L´efficacité des normes de protection intégrale du consommateur face à la publicité mensongère dépend principalement du bon travail des réprésentants de cette institution. Ils doivent agir rapidemment,en privilégiant autant que faire se peut la prévention et doivent travailler à la fois au niveau criminel et civil c´est à dire judiciaire et extra-judiciaire. L´objectif de ce travail, à la lumière des travaux nationaux et étrangers, est d´analiser la nature juridique de la publicité mensongère, sa relation avec le profil du Ministère Public, et la façon dont dernier doit exercer ses attributions dans le combat à ce fléau. Ce travail présentera également des suggestions d´amélioration de cette activité. Mots-clés : Publicité mensongère. Ministère Public. Mécanismes de mise en place. 8 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version ÍNDICE INTRODUÇÃO........................................................................................13 1. Apresentação....................................................................................14 2. Justificativa.......................................................................................14 3. Formulação da Hipótese.................................................................17 4. Método Específico............................................................................18 PRIMEIRA PARTE DA PUBLICIDADE ENGANOSA ENQUANTO TEMA RELEVANTE ENTRE AS ATRIBUIÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO 1. Da Publicidade Enganosa................................................................21 1.1 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS.......................................................21 1.2 CONCEITO.......................................................................................25 1.3 DA PUBLICIDADE ENGANOSA POR OMISSÃO............................26 1.4 DA RESPONSABILIDADE CIVIL NA PUBLICIDADE ENGANOSA............................................................................................27 1.5 DO INTERESSE DIFUSO LESADO PELA PUBLICIDADE ENGANOSA............................................................................................33 2. Da Legitimidade do Ministério Público...........................................32 9 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version 2.1 DA FUNDAMENTAÇÃO...................................................................33 2.2 DA LEGITIMIDADE PENAL..............................................................35 2.3 DA LEGITIMIDADE CIVIL.................................................................35 2.4 DA COMPETÊNCIA..........................................................................39 SEGUNDA PARTE DOS MECANISMOS DE ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO COMBATE À PUBLICIDADE ENGANOSA 1. Da Persecução Penal........................................................................42 1.1 DA TIPIFICAÇÃO DO CRIME DE PUBLICIDADE ENGANOSA......42 1.2 DOS FUNDAMENTOS DA TIPIFICAÇÃO DA CONDUTA...............43 1.3 DO BEM JURÍDICO PROTEGIDO...................................................44 1.4 DISTINÇÃO COM OUTRAS FIGURAS PENAIS..............................45 1.5 DO TIPO SUBJETIVO......................................................................46 1.6 DO SUJEITO ATIVO.........................................................................47 1.7 DA MATERIALIDADE.......................................................................47 1.8 DAS PENAS ALTERNATIVAS..........................................................48 1.9 DA CONTRAPROPAGANDA............................................................49 1.10 DA AÇÃO CIVIL EX DELICTO........................................................51 2. Do Inquérito Civil..............................................................................53 10 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version 2.1 DOS FUNDAMENTOS......................................................................53 2.2 DA PREVENÇÃO..............................................................................55 2.3 DAS PROVIDÊNCIAS PRELIMINARES...........................................57 2.4 DA INSTRUÇÃO...............................................................................59 2.5 DA RECOMENDAÇÃO.....................................................................61 2.6 DO COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA.............63 2.7 DO ENCERRAMENTO.....................................................................68 2.8 DA PROCESSUALIZAÇÃO DO INQUÉRITO CIVIL.........................69 3. Da Ação Civil Pública.......................................................................70 3.1 DOS FUNDAMENTOS......................................................................70 3.2 DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE DA PESSOA JURÍDICA................................................................................................72 3.3 DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA............................................74 3.4 DOS DANOS MORAIS DIFUSOS....................................................75 3.5 DA TUTELA ESPECÍFICA................................................................76 3.6 DA EXECUÇÃO................................................................................79 3.7 DA TRANSAÇÃO JUDICIAL.............................................................86 CONCLUSÃO.........................................................................................89 11 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version AUTORES CONSULTADOS..................................................................92 12 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version INTRODUÇÃO 13 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version 1. Apresentação A presente dissertação tem por objeto analisar os mecanismos de atuação do Ministério Público no combate à publicidade enganosa. A divulgação ao público de informações falsas por meio de veículos de comunicação coloca em risco a segurança, a saúde e as finanças de grande massa de consumidores. Já que é de atribuição do Ministério Público a defesa dos interesses difusos dos consumidores almejados ou atingidos pela publicidade ardilosa, a relevância social do tema demanda um exame pormenorizado do papel da instituição à luz do Código de Defesa do Consumidor. Considerada a delimitação material do próprio tema, a investigação desenvolver-se-á no âmbito da ciência dogmática, de acordo com as normas e princípios nacionais em vigência, sendo sucintamente precedida de generalidades sobre a publicidade enganosa e a legitimidade do Parquet. 2. Justificativa A escolha do assunto decorre da relevância da publicidade na sociedade de consumo atual. O avanço tecnológico trazido séculos atrás pela Revolução Industrial acarretou um fenômeno inédito de produção em série de serviços e produtos. 14 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Para viabilizar o equilíbrio entre custos e lucros na nova economia de massa, fez-se necessária a adoção de técnicas agressivas de estímulo do consumo, por parte de fabricantes e comerciantes. O passo mais importante foi a divulgação das qualidades das mercadorias ou serviços nos veículos de comunicação para atrair grande contingente de clientela e otimizar os lucros. Entretanto, diante dos inúmeros defeitos humanos, evidenciados ainda mais num cenário de competição acirrada de mercado, não tardou para que surgissem atos de concorrência desleal na publicidade. Os artifícios ilícitos mais comuns foram a propagação de informações falsas e as omissões propositais a respeito da qualidade dos bens e serviços, para iludir e seduzir os consumidores de forma inidônea. Como o alcance geral da publicidade enganosa pode causar prejuízos graves e irreparáveis à comunidade, notadamente em gêneros de primeira necessidade ou diante da exploração dos parcos recursos econômicos e culturais das camadas sociais mais desfavorecidas, o Estado identificou ser necessário intervir na ordem econômica. Combater a publicidade mendaz vai além do objetivo de manter o mercado livre de atos de concorrência desleal, traduz a imperiosa conveniência de fortalecer a credibilidade do mercado e a proteção da coletividade dos consumidores que nutre a própria existência da economia moderna. A proteção difusa dos consumidores face à publicidade enganosa, para ser completa e eficaz, há de ser prevista e realizada na esfera extrajudicial e, se necessário, também na judicial. O sistema brasileiro é assim híbrido e apresenta atribuição concorrente nos dois 15 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version âmbitos, mesclando e moldando experiências positivas, exemplos e conclusões extraídas alhures (movimento consumeirista americano, ombudsman escandinavo, congressos da ONU). Sobressai, neste sentido, a figura do Ministério Público, devido a seu papel de relevo social e legitimado extraordinário na defesa da coletividade, de acordo com o conferido pela Constituição Federal de 1988. O parquet ostenta exclusividade na condução da ação penal pública, bem como na instauração e presidência de inquéritos civis. Além disso, as estatísticas demonstram que, malgrado haver legitimidade concorrente, se trata do mais freqüente autor de ações civis públicas, com números superiores à soma de todos os outros colegitimados. A propalação em mídia de informações que induzem a erro milhares de consumidores aparentemente traz a impressão de prejuízos que não podem ser cabalmente reparáveis em todas as relações de consumo impulsionadas. Contudo, o Código de Defesa do Consumidor coloca à disposição das Promotorias de Justiça um vasto arcabouço de regras de direito material e medidas processuais para efetiva proteção e reparação dos interesses da sociedade lesados pela publicidade enganosa. Na primeira hipótese, temos a extensão do conceito de relação de consumo para proteção da coletividade indeterminada de pessoas expostas às práticas publicitárias, a vinculação do fornecedor à oferta, a responsabilidade civil objetiva do fornecedor dos serviços de publicidade e a inclusão na cadeia de fornecimento de todos que profissionalmente colaboraram para sua existência, como a agência publicitária e a empresa de mídia que a veicula. 16 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Na segunda seara, é o caso da inversão do ônus da prova da veracidade e correção da informação publicitária, da desconsideração da personalidade jurídica, da imposição de multa diária de caráter cominatório ou inibitório, dos provimentos antecipatórios, das sentenças mandamentais, das medidas legais de tutela específica, dentre estas a contrapropaganda, medida temida pelos fornecedores. A aplicação adequada dos institutos acima mencionados nos processos criminais, nos inquéritos civis e ações civis públicas pode trazer a eficácia que se aspira na prevenção dos riscos e reparação dos danos causados pela publicidade enganosa, por maior e mais rápido que seja o potencial de divulgação da mídia escolhida pela estratégia publicitária. Como os efeitos sociais nocivos da publicidade enganosa e o perfil de defesa social do Ministério Público se contrapõem no tema dos interesses difusos, este trabalho pretende justamente tratar dos aspectos legais da atuação da instituição no combate às mensagens falsas, identificar e analisar os mecanismos normativos mais eficazes de que dispõe a instituição para fazer diante deste delicado mister. 3. Formulação da Hipótese O estudo dos instrumentos de atuação extrajudicial e judicial do Ministério Público no combate à publicidade enganosa expõe o papel da instituição na proteção dos consumidores lesados. O Parquet concretiza o princípio constitucional de intervenção pontual do Estado na economia para preservação da livre concorrência no mercado de consumo (art.170, IV e V), de acordo com 17 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version outros princípios que regem as relações de consumo na Lei n°8.078/90, como a boa-fé e a confiança. É fundamental refletir sobre o potencial da instituição do Ministério Público para reparar danos e coibir riscos causados pela publicidade enganosa, tendo como necessidade a reparação integral dos danos mediante uma resposta estatal suficientemente enérgica para coibir as fraudes praticadas contra o consumidor. 4. Método Específico A primeira parte da dissertação, partindo de uma perspectiva histórica, tratará sucintamente de conceituar a publicidade enganosa e de evidenciar a legitimidade do Ministério Público em combatê-la. A análise do perfil da instituição será finalizada na primeira seção do trabalho, com breve menção sobre os instrumentos extrajudiciais e judiciais de que dispõe o Ministério Público nesta tarefa. Estes serão pormenorizadamente tratados adiante, na segunda parte do trabalho, em perspectiva direcionada à publicidade enganosa. Cuidar-se-á primeiramente da persecução penal e sua instrumentalidade na proteção do consumidor. Na área cível, partir-se-á do ponto de vista extrajudicial, explorando-se a figura do inquérito civil, notadamente a respeito da expedição de recomendações aos fornecedores e do termo de ajustamento de conduta. Na seara judicial, a dissertação versará sobre a aplicação na ação civil pública movida pelo Ministério Público dos direitos materiais e processuais que dinamizam a defesa dos interesses difusos do consumidor. 18 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Por último, serão apresentadas as conclusões do trabalho e a relação dos autores consultados. 19 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version PRIMEIRA PARTE DA PUBLICIDADE ENGANOSA ENQUANTO TEMA RELEVANTE ENTRE AS ATRIBUIÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO 20 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version 1. Da Publicidade Enganosa 1.1 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS O advento da Revolução Industrial nas últimas décadas do século XVII e início do século XVIII trouxe profundas modificações sócioeconômicas. Avançou-se na tecnologia industrial até uma era inédita de especialização de tarefas e produção massificada, com grande afluxo populacional às cidades, criando numerosas áreas operárias nos subúrbios. O novo formato urbano e as mudanças da economia foram responsáveis pela formação da cultura de massas moderna, apoiada no desenvolvimento dos meios de comunicação1. A economia baseada no livre comércio desenvolvia-se vertiginosamente, no mesmo ritmo do crescimento do capital dos empreendedores. Foi nesse cenário que surgiu a publicidade como forma de estímulo da nova sociedade de consumo (AMARAL JÚNIOR, 1993, p.233-234)2. A publicidade pode ser conceituada como uma atividade econômica de marketing consistente em difundir aos consumidores informações promocionais sobre produto ou serviço. Não se confunde com a propaganda, que não tem efeito mercantil e objetiva a divulgação de idéias com outras finalidades, tais como ideológica, religiosa, filosófica, política, econômica ou social3. 1 Para aprofundamento sobre o assunto, conferir COMPARATO, 1978, p.480, e CAPPELLETTI, 1974, 568. 2 Ceneviva (1991, p. 34) também observa o caráter estimulante da publicidade e defende seu posicionamento mencionando o art. 7° do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária, para quem "a publicidade exerce forte influência de ordem cultural sobre grandes massas da população". 3 Sobre o conceito de publicidade e a diferenciação com propaganda consultar BENJAMIN, 1998, p.251-253, e COMPARATO, 1978, p.470. 21 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version A atividade de divulgação das qualidades dos bens e serviços ganhou vulto com o desenvolvimento dos veículos de comunicação no século XX4, especialmente a televisão em cores (CENEVIVA, 1991, p.20). A sedução publicitária das massas adquiriu contornos cada vez mais incisivos para garantir a qualquer custo os lucros almejados pelos fornecedores. Cunhou-se, inclusive, a palavra "consumismo" para expressar a necessidade artificial das pessoas em acelerar a aquisição de produtos ou serviços, muitas vezes sem real necessidade, graças ao estímulo da publicidade, que valoriza um estilo de vida e o associa a símbolos de prestígio social5. Não tardaram a surgir os abusos nas mensagens publicitárias, especialmente por intermédio da divulgação de dados falsos sobre os bens e serviços oferecidos ao consumidor, afinal de contas a finalidade precípua da publicidade não é informar, mas seduzir novos consumidores à sua aquisição (AMARAL JÚNIOR, 1993, p.232; CALAIS-AULOY, 1992, p.86; FRANCO, 1991, p.93). Newton De Lucca sublinha a gravidade do problema ao selecionar a publicidade enganosa como o mais importante dentre os quatro principais "inimigos" do consumidor, pois considera que deixa 4 A publicidade nos meios de comunicação de massa ganhou destaque com a utilização da imagem de pessoas famosas nas campanhas de marketing para persuadir os consumidores, ainda que não exista ligação direta entre o produto ou serviço e o ídolo (vide COMPARATO, 1978, p.480-481). 5 Comparato (1978, p.481) realça o caráter ilusório da publicidade face ao consumidor, "vítima de sua própria incapacidade crítica ou suscetibilidade emocional, dócil objeto de exploração de uma publicidade obsessora e obsidional, passa a responder ao reflexo condicionado da palavra mágica, sem resistência compra um objeto ou paga por um serviço, não porque a sua marca ateste a boa qualidade, mas simplesmente porque ela evoca todo um reino de fantasias ou devaneio de atração irresistível". No mesmo sentido, consultar CENEVIVA, 1991, p.28. 22 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version exposta com toda a intensidade a sua vulnerabilidade no mercado de consumo6. A lesão ao grande contingente de consumidores desviou o foco jurídico da mera desavença de concorrência desleal entre fornecedores, voltando a atenção dos juristas para a indispensável necessidade de proteção das verdadeiras vítimas atingidas pela publicidade enganosa, reconhecendo-se a vulnerabilidade dos consumidores no mercado e criando-se regras para sua defesa7. Foi pioneira a iniciativa americana de criar em 1966 o Packing and Labeling Act, Fair determinando que as embalagens e rótulos trouxessem informações minuciosas sobre quantidade, qualidade e componentes das mercadorias expostas à venda (COMPARATO, 1978, p.487-488). Nas duas décadas seguintes, a intervenção do Estado na economia para proteger da publicidade enganosa os potenciais consumidores, por regras especiais de direito do consumidor, tornou-se consenso mundial, mediante diretrizes fixadas por instituições ligadas à Organização das Nações Unidas (ONU)8 e tratados da Comunidade Européia9. 6 Os demais são a publicidade em geral, as cláusulas contratuais abusivas e os preços abusivos. Para saber mais sobre o assunto, consultar LUCCA, 2000, p.51. 7 Conferir COMPARATO, 1978, p.487 e PINEDO, 1998, p.36. 8 Sobre a evolução da defesa do consumidor na pauta temática da ONU consultar COMPARATO 1978, p.477, para quem "o problema, na verdade, não era desconhecido no antigo direito, mas ganhou extraordinária relevância a partir das transformações sócio-econômicas oriundas da revolução industrial, pela implantação do processo de produção em massa, engedrando o aumento e a padronização do consumo, no sistema de trocas do mercado. Em vários países, uma nova legislação, abundante e minuciosa, completa ou substitui as antigas regras esparsas dos Códigos privados ou criminais e das leis de caráter puramente administrativo, numa sistemática diferente, entendida como fazendo para do chamado direito econômico. O interesse sobre o assunto dá origem, aliás, a um verdadeiro consenso internacional. Em 1972, realizou-se em Estocolmo uma Conferência Mundial do Consumidor, realizada sob os auspícios da Organização Internacional das Associações de Consumidores (International Organization of Consumer Unions - IOCU). Em 1973, a Comissão das a Nações Unidas sobre Direitos do Homem, em sua 29 sessão, em Genebra, considerou que todo consumidor deve gozar de quatro direitos fundamentais: o direito à segurança; o de ser 23 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version No Brasil, o controle da publicidade enganosa iniciou-se com um sistema exclusivamente privado, sem intervenção do Poder Público. Uma associação de publicitários, o Conselho Nacional de Autoregulamentação Publicitária (CONAR), criou em 1978 um código de autodisciplina10 ainda vigente. Contudo, a louvável autodisciplina não afastou a necessidade de se legislar a respeito do combate aos anúncios enganosos, porque não era provida de coercibilidade (BENJAMIN, 1998, p.248-249)11. A Constituição Federal de 1988 arrolou como direito fundamental a promoção pelo Estado da defesa do consumidor12, determinando em suas disposições transitórias que fosse criado um Código de Defesa do Consumidor em 120 dias (art.48). Em 11 de setembro de 1.990, foi promulgado o Código de Defesa do Consumidor (Lei n°8.078/90), que dentre outros assuntos regulamenta a prática da publicidade nos arts.36 a 38, proibindo a publicidade enganosa. A fiscalização da publicidade no Brasil, portanto, dá-se num sistema misto, que mescla o controle privado decorrente da auto- adequadamente informado sobre os produtos e os serviços, bem como sobre as condições de venda; o direito de escolher entre bens alternativos de qualidade satisfatória a preços razoáveis; e o direito de ser ouvido no processo de decisão governamental". 9 O programa preliminar aprovado em 1975 trouxe dentre suas proposições a necessidade de se proteger o consumidor no mercado em massa das campanhas publicitárias de pressão por parte de grupos econômicos poderosos e, dez anos mais tarde, o programa preliminar de ação aprovado por resolução do Conselho das Comunidades Européias destacou dentre suas prioridades a garantia do consumidor contra a publicidade falsa ou enganadora, mediante mecanismos concretos nele elencados (FROTA, 2002, p.136-137 e 140). 10 O art.1° do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária estabelece o dever de todo anúncio ser honesto e verdadeiro, estabelecendo como sanções a possibilidade de impor advertência, recomendações a anunciantes e veículos de mídia, bem como divulgação de nota oficial de repúdio (art.50). 11 Um exemplo extremo, no direito comparado, da insuficiência da autodisciplina publicitária para coibir as mensagens abusivas e enganosas encontra-se na Dinamarca, onde esta nem sequer existe. O Estado impôs sua soberania e criou a lei sobre comercialização de 1974, instituindo o ombudsman dos consumidores para combate e punição administrativa ou judicial da publicidade enganosa (CAMPOS, 1974, p.322). 12 o Art.5 , XXXII. O Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor. 24 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version regulamentação, com o estatal, estabelecido no Código de Defesa do Consumidor13. 1.2 CONCEITO De acordo com o art.37, §1°, considera-se enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços14. O elemento configurador da publicidade enganosa é a sua capacidade de induzir o consumidor a erro. A simples falsidade de um dado publicitário, por si só, não configura ilícito, desde que evidente e irrelevante a circunstância para informar o consumidor do produto ou serviço15. É o caso das campanhas hiperbólicas, que trabalham com fantasia e exagero plenamente identificáveis, chamando a atenção às 13 Conferir LUCCA, 2000, p.60-61. O Código de Consumo da França também proíbe a publicidade enganosa e a conceitua de forma minuciosa como toda aquela que de qualquer forma contenha alegações, indicações ou apresentações falsas ou de natureza a induzir em erro, sobre a existência, natureza, composição, qualidades substanciais, princípio ativo, espécie, origem, quantidade, modo e data de fabricação, propriedades, preço e condições de venda dos produtos ou serviços objeto da publicidade, bem como quando contrariar as condições de uso, os resultados razoavelmente esperados, a motivação prévia natural do negócio ou as promessas e compromissos empenhados pelo anunciante no momento da oferta, assim como a veiculação de dados falsos sobre o fabricante, os revendedores, os representantes e ou prestadores de serviços (art.L.121-1). A Lei Geral de Publicidade da Espanha (n°2.279) de 15 de novembro de 1988, também é bastante detalhada no sancionamento à publicidade enganosa. Após conceituá-la no art.4°, inclusive na modalidade da publicidade enganosa por omissão, chega à minúcia de elencar longamente no artigo seguinte os elementos falsos que podem caracterizá-la nos casos concretos, dentro dos seguintes gêneros: características, preços, condições de aquisição, motivos da oferta e qualificação do anunciante. Conferir em BANDO CASADO, 1991, p.78-79. 15 Em apoio ao entendimento ora adotado, verifica-se que a Diretiva 84/450, de 10 de setembro de 1984, da Comunidade Econômica Européia deixa de lado a falsidade como característica fundamental e acentua a indução ao erro como principal elemento da publicidade enganosa, ao conceituá-la como "aquela que, de algum modo, incluindo a sua apresentação, induza ou possa induzir em erro as pessoas a quem ela se dirige ou possam por ela ser atingidas e, em virtude de seu caráter enganador, possa afetar o seu comportamento econômico ou que, por tais razões, prejudique ou possa prejudicar um concorrente". A Lei Geral de Publicidade Espanhola (art.4°) segue o mesmo parâmetro (conferir BANDO CASADO, 1991, p.78). 14 25 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version qualidades da mercadoria pelo recurso da sátira, como a bolsa que resiste intacta ao ser arremessada como uma bola, de um lado a outro, num jogo de futebol, mordida por cães ferozes e até a tiros de canhão. A avaliação da licitude ou enganosidade da mensagem satírica e exagerada, todavia, deve ser realizada no caso concreto de acordo com o potencial de persuasão sobre a pretensa faixa etária e cultural almejada pela publicidade, não pelo homem médio. Ostentando poder de convencimento sobre o consumidor in concreto, deixa de ser simples exagero e pode caracterizar a enganosidade16. 1.3 DA PUBLICIDADE ENGANOSA POR OMISSÃO Por vezes, a publicidade nem sequer possui dado falso, mas é enganosa justamente por deixar de informar o consumidor sobre dado relevante do produto ou serviço e ilude ao criar previsivelmente uma impressão ou expectativa equivocada no destinatário. Esta modalidade é conhecida como publicidade enganosa por omissão. De acordo com o art.37, §3°, do Código de Defesa do Consumidor, "a publicidade é enganosa por omissão quando deixa de informar sobre dado essencial do produto ou serviço"17. Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (1998, p.281) traz o exemplo verídico do primeiro televisor estéreo do mercado brasileiro, cujo fabricante omitiu da divulgação publicitária que o recurso só era alcançável mediante a aquisição à parte de uma peça opcional específica. 16 A respeito, consultar CAS; FERRIER, 1986. p.284; BENJAMIN, 1998, p.215; FRANCO, 1996, p.95. No mesmo sentido é o Código de Consumo da França, que estabelece: "todo profissional vendedor de bens ou prestador de serviços deve, antes da conclusão do contrato, colocar o consumidor em condição de conhecer as características essenciais dou bem ou do serviço" (art. L 111-1). 17 26 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Segundo Ceneviva (1991, p.119), "o §1° do art.37 deve ser analisado em conjunto com o §3°", pois só se caracterizará a enganosidade por omissão quando a mensagem deixar de transmitir "dado essencial do produto ou serviço, ou seja, aquele sem o qual é impossível para o consumidor conhecer o produto ou serviço divulgado. Nesse caso o fornecedor deixou de praticar a ação legal de narrar toda a verdade na mensagem publicitária". 1.4 DA RESPONSABILIDADE CIVIL NA PUBLICIDADE ENGANOSA A publicidade é considerada pelo Código de Defesa do Consumidor como prática empresarial equivalente à oferta18, com força vinculante em relação ao fornecedor que a patrocina19: Art.30 - Toda informação ou publicidade suficientemente precisa, veiculada por qualquer meio de comunicação com relação a produtos ou serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado. O consumidor prejudicado pode, à sua escolha, obrigar o patrocinador do anúncio a cumprir forçosamente a oferta, fornecer outro produto ou serviço equivalente ou arcar com os prejuízos decorrentes da 18 A oferta modernamente caracteriza-se por um conjunto de medidas de promoção conhecido como abrangendo não somente não apenas as técnicas de indução pessoal, mas também quaisquer outras coletivas e difusas, como é o caso das promoções de vendas e da própria publicidade. Vide mais em BENJAMIN, 1998, p.213. 19 Valéria Falcão Chaise (2001, p.93-97) relata vários casos judiciais em que o fornecedor foi obrigado a cumprir a oferta veiculada em publicidade, dentre eles o da operadora de turismo que anunciou em jornal de grande circulação um cruzeiro marítimo a bordo de aconchegante navio português, por extensa parte da costa brasileira, quando na verdade somente parte do percurso seria realizado pelo navio indicado. A ação foi julgada procedente e a ré foi condenada a cumprir ao consumidor e acompanhante a viagem conforme o anúncio. marketing, 27 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version quebra da confiança20 e frustração da expectativa despertada (art.35 do Código de Defesa do Consumidor)21. A norma beneficia a toda pessoa atingida pela mensagem enganosa, pois a responsabilidade do fornecedor pela publicidade enganosa independe da formação de vínculo contratual com o consumidor, já que o art.29 do Código estende o conceito deste a todas as pessoas determináveis ou não expostas ao marketing, prescindindo da compra do produto ou contratação do serviço22. É objetiva a responsabilidade do fornecedor, ou seja, independe da prova de seu dolo ou culpa. A intencionalidade e a infração reprovável a um dever de cuidado não fazem parte do conceito e nem são requisitos para caracterizar a publicidade enganosa. Como esclarece Cláudia Lima Marques (2005, p.806), "o art.37 do Código de Defesa do Consumidor não se preocupa com a vontade daquele que fez veicular a mensagem publicitária, não perquire da sua culpa ou dolo, mas proíbe apenas o resultado: que a publicidade induza o consumidor a formar esta falsa noção da realidade. Basta que a informação publicitária, por ser falsa, inteira ou parcialmente, ou por omitir dados importantes, leve o consumidor ao erro, para ser caracterizada com publicidade proibida, publicidade enganosa". A responsabilidade objetiva do fornecedor manifesta-se ainda na obrigação de manter em seu poder os dados fáticos, técnicos e científicos que dão sustentação à mensagem publicitária de seus 20 Sobre a teoria da confiança que deve permear as relações de consumo e que é defendida nas ofertas pelo Código do Consumidor, consultar MARQUES, BENJAMIN e MIRAGEM, 2003, p.496. 21 Nesse sentido, AMARAL JÚNIOR, 1993, p.240; FRANCO, 1996, p.93. Conferir também apelação a 142.976, julgada pela 4 Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, Relator Desembargador Alves Braga, julgada em 17-10-1991 (ementa em SILVA, 2002, p.133). 22 Confira a concepção peculiar da publicidade como integrante do contrato de consumo in COMPARATO, 1978, p.487. 28 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version produtos ou serviços (art.36, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor)23. Em decorrência, o fornecedor arca com o ônus legal da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação que patrocina (art.38), hipótese de inversão do ônus da prova quando a providência for solicitada por autoridades em inquéritos, procedimentos administrativos ou processos judiciais (STUYCK, 1982, p.231). Questão tormentosa que se coloca no direito consumerista diz respeito à possibilidade do meio de comunicação que transmite o anúncio enganoso ser também responsabilizado nos termos do Código de Defesa do Consumidor. Vozes isoladas entre os juristas, Fábio Ulhoa Coelho (1994, p.202) e João Luiz Coelho da Rocha (1991, p.112) entendem que a empresa de comunicação não tem responsabilidade pela publicidade enganosa que divulga, pois carece de prévio conhecimento acerca do produto ou serviço anunciado. Todavia, a maioria da doutrina entende o contrário: que, além do anunciante, o veículo de mídia também pode ter responsabilidade pela divulgação da publicidade enganosa. Calais-Auloy (1992, p.86) posiciona a responsabilidade do meio de comunicação como decorrência do seu papel no nexo de causalidade da existência no mercado do anúncio que seduz o consumidor, expondo que "a emissão de uma mensagem publicitária supõe geralmente a colaboração de três pessoas: o anunciante, que procura atrair os clientes; a agência, que, a mando do anunciante, 23 O descumprimento deste dever inclusive configura crime contra as relações de consumo (art.69 do Código de Defesa do Consumidor), sujeitando os infratores à pena de detenção de um a seis meses, ou multa, sem prejuízo das sanções civis e administrativas (ARRUDA ALVIM et al., 1995, p.204). 29 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version elabora uma mensagem; e a mídia, que transmite a mensagem ao público"24. Newton De Lucca também concorda com a tese (2000, p.183), desde que evidente a indução do consumidor a erro, também vislumbra a responsabilidade solidária da transmissora da mensagem publicitária enganosa, afinal o art.7°, parágrafo único, determina que "tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo". No entanto, a responsabilidade do meio de comunicação deve ser subjetiva, ao contrário da responsabilidade objetiva do anunciante e da agência. É preciso provar a culpa ou dolo do veículo de comunicação, pois na maioria das vezes este não teria conhecimento profundo do produto ou serviço e seria injusto imputar à rádio, ao site, canal de televisão ou periódico responsabilidade por erro que ignorava e não seria razoável lhe exigir prévia investigação a respeito, até mesmo porque os custos envolvidos nos dois casos poderiam superar os próprios valores obtidos com a venda do espaço publicitário. Cláudia responsabilidade Lima solidária, Marques porém (2005, subjetiva, p.807) do filia-se à transmissor da publicidade enganosa25, invocando julgado pioneiro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reconheceu a culpa grave do veículo de comunicação no caso, obrigando-o a reparar os danos causados aos consumidores (Recurso especial 92395/RS, rel. Min. Eduardo Ribeiro, j.05.02.1998). 24 Tradução livre de "l'émission d'un message publicitaire suppose généralement la collaboration de trois personnes: l'annonceur, qui cherche à attirer les clients; l'agence que, sur la demande de l'annonceur, élabore un message; le support, qui transmet le message au public". 25 O mesmo posicionamento é adotado por FERREIRA, 1994, p.111. 30 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Parece mais acertado este último posicionamento. Se de um lado a responsabilidade objetiva do meio de comunicação configuraria solução repudiável e draconiana, de outro parece oportuno e prático vislumbrar em tese a possibilidade de sancioná-lo em casos de ardil evidente, matando o mal logo no seu nascedouro, já que a grande capacidade de transmitir a informação e a credibilidade da mídia criam o terreno ideal para a ocorrência da publicidade enganosa. 1.5 DO INTERESSE DIFUSO LESADO PELA PUBLICIDADE ENGANOSA A publicidade tem natureza jurídica eminentemente metaindividual26, porque se trata de modalidade de oferta dirigida ao público de forma genérica, atingindo indistintamente uma vasta gama de consumidores em potencial27. Quando uma publicidade traz dados falsos ou omite informação relevante, leva ao erro todo e qualquer consumidor que tomou contato com a mensagem. Atinge também aqueles que ainda não adquiriram a mercadoria ou serviço oferecido com informações enganosas, mas que podem futuramente vir a contratar ou indicar a terceiros, por conta da 26 Os interesses metaindividuais estão elencados no art.81, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor e se dividem em interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos. Consideram-se difusos "os transindividuais de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato" (inciso I); coletivos "os transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base" (inciso II); e individuais homogêneos "os decorrentes de origem comum" (inciso III). 27 Maria Luiza Andrade Figueira de Sabóia Campos (1994, resumo) descreve o fenômeno do alastramento da publicidade enganosa na sociedade: "Na publicidade, o telespectador é consumidor, a criança, o adolescente, o adulto e o idoso são consumidores, vistos como coletividade determinável ou difusa no perfil de diversas crenças, raças, religiões e classes sociais. Assim, estão sob a proteção do Código de Defesa do Consumidor todos aqueles que integram uma relação de consumo ou são afetados pelos seus efeitos". 31 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version publicidade, assim como qualquer um atingido por seus efeitos, independentemente de relação contratual28. Considerando a grande extensão do dano, é possível afirmar que a publicidade que ilude e induz ao erro fere interesses difusos, pois o engodo produzido é um fato que atinge de forma indivisível um número incalculável e indeterminado de pessoas, conforme a previsão do art.81, parágrafo único, I, do Código de Defesa do Consumidor29. O Conselho Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo editou a Súmula n°2, que trata da publicidade enganosa, também a conceituando como concernente a interesses difusos: "Em caso de propaganda enganosa, o dano não é somente daqueles que, induzidos 28 Marques, Benjamin e Miragem (2003, p.481) especificam quais são os abrangidos no conceito de consumidor por extensão: "O consumo em matéria de publicidade é 'coletivo' e amplo. Há hoje uma pluralidade de consumidores, e, no sistema do Código de Defesa do Consumidor, os antigos o 'terceiros' incluem-se como 'consumidores', consumidores stricto sensu do art.2 (quem 'utiliza um serviço', compra algo em virtude da publicidade), consumidores equiparados do parágrafo único do art.2° (coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo na relação de consumo), do art.17 (todas as vítimas dos fatos do serviço ou produto, por exemplo, os passantes na rua ou um automóvel quando uma placa publicitária cai por defeito do serviço, que recebe o e-mail publicitário com vírus ou ganha um cookie quando visita um site publicitário) e do art.29 (todas as pessoas determináveis ou não expostas às práticas comerciais de oferta, publicidade, prêmios, jogos, gincanas promocionais, correntes de compras, quem recebe o e-mail publicitário e entra em banco de dados de hábitos de consumo, etc.)". Fábio K. Comparato (1978, p.492) igualmente não restringe o conceito de consumidor ao contrato de venda e compra: "Ademais, do lado ativo desta relação de garantia-responsabilidade, desde que seja superada a barreira contratual da compra e venda, não justifica que o titular da ação contra o produtor seja apenas o comprador da coisa causadora do dano, e não os chamados bystanders, ou seja, o utente da coisa ou mesmo o terceiro vítima, sem qualquer relação com o comprador". 29 Segundo Mancuso (1998, p.25-27 e 31), "o interesse a que a propaganda dos veículos seja fiel às reais características do produto (vedação de propaganda enganosa) apresenta-se como um interesse difuso, já que concernente a sujeitos indeterminados; [...]. Assim, v.g., é possível que um novo plano de venda de imóveis, fundado em publicidade enganosa, tenha no momento prejudicado poucas pessoas, mas nem por isso deixa de haver o interesse difuso na sua repressão, pela virtualidade do dano a um número indeterminado de pessoas. [...] Difusos [...] são os interesses de consumidores lesados por 'publicidade enganosa ou abusiva, veiculada através de imprensa falada, escrita ou televisionada, a afetar um número incalculável de pessoas, sem que entre elas exista uma relação-base. O bem jurídico tutelado pelo art.37 e parágrafo do Código é indivisível no sentido de que basta uma única ofensa para que todos os consumidores sejam atingidos e também no sentido de que a satisfação de um deles, pela cessação da publicidade ilegal, beneficia contemporaneamente a todos eles". 32 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version a erro, adquiriram o produto, mas também difuso, porque abrange todos os que tiveram acesso à publicidade"30. O potencial de produção de danos em série recomendou ao legislador a adoção de um sistema coletivo de combate à publicidade enganosa, para defesa da coletividade anônima e despersonalizada de consumidores atingidos, sem prejuízo da possibilidade de reparação individual, porque a utilização exclusiva deste último por certo deixaria sem plena reparação boa parte dos prejuízos semeados na sociedade31. Criou-se então um sistema de legitimação extraordinária, no qual o Ministério Público foi uma das instituições32 incumbidas da proteção da grande massa anônima de consumidores expostos às mensagens enganosas (CENEVIVA, 1991, p.94). 2. Da Legitimidade do Ministério Público 2.1 DA FUNDAMENTAÇÃO Desde os primórdios e mesmo no predomínio do liberalismo, foi admitida a atuação do Estado na economia como agente regulador, conforme ponderado por Clóvis Bevilaqua (1940, p.27-28): 30 Os fundamentos da Súmula n°2 do Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo são os mencionados anteriormente, podendo ser encontrados em MARQUES, BENJAMIN e MIRAGEM, 2003, p.786. 31 Para Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (1998, p.251), "a publicidade, embora ainda enxergada como mercadologicamente importante, passa a ser igualmente vista como manifestação social difusa, daí concluindo-se que os malefícios que ocasionalmente provoca no mercado são, pela mesma razão, difusos. É em razão dessa nova perspectiva que se torna admissível a postulação - e deferimento - de pleitos indenizatórios difusos para o atuar publicitário patológico (em particular a publicidade enganosa e abusiva), mesmo quando inexiste qualquer dano individual concretizado e identificado". 32 As demais são elencadas por Renata Mandelbaum (1996, p.187): “No Brasil, temos na defesa dos interesses dos consumidores o PROCON, os Conselhos de Defesa do Consumidor, [...] além das demais entidades legitimadas pelo art.82, III, do Código de Defesa do Consumidor”. 33 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version "Para o momento presente, julgo sufficiente dizer que a ingerencia indirecta do Estado em relação ás obrigações, protegendo-as, talhando-lhes as fórmas, prescrevendolhes o tempo, o modo e as varias condições de existencia, é absolutamente irrecusavel"33. O combate à publicidade enganosa é encarado pelo Código de Defesa do Consumidor como questão de Estado, matéria de ordem pública e interesse social, dada a larga extensão de seus efeitos nocivos34. Tanto que arrola a proteção contra a publicidade enganosa como direito básico do consumidor (art.6°, IV). A intervenção estatal objetiva proteger princípios fundamentais para o bom funcionamento do mercado, tais como a transparência, a confiança, a boa-fé e a vinculação nas relações de consumo (MARQUES, 2005, p.802). Para isso, o legislador previu um sistema coletivo de defesa do consumidor, a despeito das medidas individuais que as vítimas podem tomar para ressarcimento dos danos que sofreram. A vantagem principal do sistema de proteção coletiva do consumidor é permitir plena reparação dos danos difusos causados pela publicidade enganosa, pois apenas a litigância individual não seria suficiente para reagir à altura da extensão do problema, já que os danos não são apenas individuais (v.g., os danos morais difusos) e a hipossuficiência do consumidor acarretaria uma considerável porcentagem de litigiosidade contida por demandas não ajuizadas ou frustradas35. 33 Mantida a grafia original. Cláudia Lima Marques (2005, p.800) alerta para a "forte influência que a publicidade exerce sobre a população brasileira". 35 Sobre o tema da conveniência da proteção coletiva do consumidor diante da sua vulnerabilidade, consultar FILOMENO, 2005, p.308. 34 34 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version 2.2 DA LEGITIMIDADE PENAL Na jurisdição penal, a proteção coletiva do consumidor frente à publicidade enganosa estabeleceu-se mediante a criação de uma figura criminal específica, prevista no art.67, do Código de Defesa do Consumidor, adiante tratado36. Como se trata de um crime de ação penal pública, uma vez que a lei não o declara de ação privada (art.100, do Código Penal), compete com exclusividade ao Ministério Público processar seus autores, nos termos dos arts.129, I, da Constituição Federal e 24, do Código de Processo Penal e 100, §1o , do Código Penal37. A escolha de um órgão público, como o Ministério Público, para a persecução penal, decorre do princípio da impessoalidade que rege a Administração Pública (art.37, caput, da Constituição Federal) e a imparcialidade da instituição, que persegue o bem comum e a defesa da sociedade, acima das paixões e dos interesses pessoais, colabora para que o sistema tenha funcionamento refletido e isento38. 2.3 DA LEGITIMIDADE CIVIL A tutela coletiva do consumidor face à publicidade enganosa no âmbito civil é promovida por intermédio de uma legitimação extraordinária e pluralista, em que alguns entes foram escolhidos concorrentemente pela lei, dentre eles o Parquet (arts. 5°, da Lei da 36 Segunda parte, item 1.1. Art.129 da Constituição Federal: São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; [...]. Art.100, §1°, do Código Penal: A ação pública é promovida pelo Ministério Público, [...]. 38 Sobre o papel institucional do Ministério Público para o bom funcionamento da justiça criminal na sociedade moderna, verificar os argumentos de Joaquim Canuto Mendes de Almeida (1975, p.217). 37 35 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Ação Civil Pública - n°7.347/85 - e 82, do Código de Defesa do Consumidor)39. O Ministério Público, desde as suas raízes históricas, teve suas atividades ligadas à defesa do interesse social, aos afazeres do Estado e à fiscalização do correto cumprimento da lei40. Aliás, a concepção do Ministério Público em excepcional posição ativa na área cível, como autor de ações em defesa do interesse público, é aceita desde os primórdios da instituição (AYARRAGARAY, 1928, p.55)41. 39 A legitimidade prevista nos dispositivos citados é, além de concorrente, disjuntiva - qualquer um dos co-legitimados pode promover ação civil pública em razão da publicidade enganosa e a iniciativa de um não impede nem prejudica a dos demais. Embora as ações conexas devam ser reunidas para julgamento conjunto, a fim de evitar decisões contraditórias, cada um pode atuar independentemente do outro (MANCUSO, 1998, p.28; 2004, p.135-138). 40 Na Antigüidade, registra-se como o mais remoto precursor do Ministério Público a figura dos procuradores do rei no Egito, há mais de 4 mil anos. Estes funcionários estatais eram conhecidos como a língua e os olhos do monarca, incumbindo-lhes, além da persecução criminal, a defesa dos interesses de hipossuficientes, como a viúva e o órfão. Na Babilônia, em 2000 a. C., havia o redoudaiani, igualmente um representante do rei que zelava pelos interesses do Estado tanto na esfera administrativa como na judicial. Também merecem menção as figuras do tesmóteta, guardião da lei na Grécia, e do éforo espartano. A formação histórica do Ministério Público, entretanto, foi gradual, como acentua Tornaghi (1989, p.479-480): "o Ministério Público, tal como numerosos outros órgãos do Estado, não apareceu de jato, em determinado lugar, nem foi produto de ato legislativo. Foi-se formando paulatinamente, foi ajuntando em torno de si várias funções antes espalhadas em diferentes mãos, foi-se aperfeiçoando, até que numa lei o encontrou cristalizado e o consagrou". O primeiro registro de existência do Ministério Público, tal como modernamente é conhecido, encontra-se na França, na Ordonnance de Felipe, o Belo, de 1302, que faz menção aos procuradores do rei, que defendiam os interesses do Estado nas cortes judiciais (MACHADO, 1998, p.06-13; TORNAGHI, 1989, p.478). Ao longo da evolução histórica, o perfil do Ministério Público transformou-se: "começou como defensor do rei, passou a defensor do Estado, depois a defensor da sociedade, e hoje, nos termos do perfil que lhe traçou a Constituição de 1988, como vimos, passou a ser defensor de uma sociedade democrática" (MAZZILLI, 2001, p.75-76). No Brasil, as primeiras referências sobre o Ministério Público datam da legislação do período colonial. As Ordenações Manuelinas de 1521 mencionavam o promotor de justiça que funcionava "junto à Casa da Suplicação", exercendo a persecução criminal nos moldes modernos do Ministério Público francês. Em seguida, nas Ordenações Filipinas de 1603, estas atribuições foram sistematizadas e o primeiro registro da atuação de fato de um promotor de justiça ocorreu com a instalação do Tribunal da Relação da Bahia, em 1609. Mais tarde, em 1832, o Código de Processo Penal do Império previu que a função de promotor de justiça poderia ser desempenhada por todos aqueles que pudessem ser jurados, com preferência aos que dominassem o conhecimento das leis, mediante nomeação do Governo Imperial, pelo prazo de 3 anos. Entre as atribuições do Parquet constavam o oferecimento da denúncia pelos crimes de ação pública, a solicitação da prisão de criminosos, a execução das sentenças e mandados judiciais, bem como relatar às autoridades competentes as "negligências, omissões e prevaricações dos empregados na administração da Justiça" (art.37, §§1°, 2° e 3°). Sobre a origem histórica do Ministério Público no Brasil, consultar Carlos Alberto de Salles, 1999, p.20-32. 41 De acordo com o mencionado doutrinador argentino, "por vía de acción em material civil, los miembros del parquet obran de oficio en los casos determinados por la ley (artículo 46, ley de 20 de abril de 1810) y excepcionalmente como mandatarios obligados o como intermediarios de ciertas personas, constreñidas a requerir la intervención y defensa de los oficiales del ministerio público. De 36 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Como decorrência previsível deste perfil, naturalmente ligouse o Parquet à idéia de ser o principal protagonista no interesse público de combate dos danos difusos causados pela publicidade enganosa42. A legislação escandinava do brasileira ombudsman inspirou-se na experiência do consumidor, que desempenha papel bastante assemelhado ao do Ministério Público no Brasil, agindo de forma preventiva na esfera extrajudicial e repressiva na judicial43. Ganhou ainda mais relevo com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que instituiu ao Ministério Público um perfil ligado às questões sociais de toda ordem, ao estipular no art.127: "O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis". A Carta Magna conferiu à instituição instrumental poderoso para fazer diante de suas relevantes funções na área cível, com a oficio por ley, conoce en lo relativo al estado de las personas y en materias diversas (pérdida de la nacionalidad, patentes y marcas, rectificaciones de actos de estado civil, etc.). La regla en materia civil, en cuanto a la intervención del ministerio público, se ejercita por requerimiento;por excepción obra por vía de acción". 42 O Ministério Público sozinho promove mais ações civis públicas que a soma de todos os demais co-legitimados, como frisa Rodolfo de Camargo Mancuso (2004, p.139), citando dados coletados por Márcio Flávio Mafra Leal e José Carlos Barbosa Moreira. 43 Conferir a respeito COMPARATO, 1978, p.486 e 495-496. O dado é confirmado por Maria Luiza Andrade Figueira de Sabóia Campos (1994, p.383-384): "A idéia que se tem hoje da atuação e da representação do Ministério Público, especialmente no microssistema do Código de Defesa do Consumidor, foi em muito influenciada pela figura do ombudsman dos sistemas nórdicos, pois sua função é bastante semelhante no que concerne à proteção do consumidor - ouve reclamações, busca composições amigáveis, conduz negociações visando à assinatura de termo de compromisso de ajustamento aos ditames do Código de Defesa do Consumidor por empresas de determinados setores do mercado (§6° do art.113), realiza inquéritos civis, fiscaliza, impetra ações coletivas na defesa dos interesses sociais da coletividade ou de grupos ou categorias determináveis e ingressa com as denominadas class actions com o objetivo de proteger e reparar danos aos direitos individuais homogêneos dos consumidores, entre outras funções no âmbito penal e administrativo". Ainda no mesmo sentido de conferir ao Ministério Público brasileiro perfil assemelhado ao ombudsman escandinavo na tarefa de defesa do consumidor, conferir MARQUES, 2006, p.1108. 37 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version possibilidade de instauração de inquérito civil44 e promoção de ação civil pública45 para a proteção de interesses difusos (art.129, III), inclusive do consumidor46. O Parquet pode, genericamente, tomar, na área cível, as seguintes medidas em defesa dos consumidores lesados ou em risco pela publicidade enganosa: atender ao público na qualidade de ombudsman, encaminhando as reclamações aos órgãos administrativos e cobrando providências destes, instaurar inquérito civil para investigar os fatos e, se necessário, promover a ação civil pública para responsabilizar os autores (MAZZILLI, 2001, p.76). Ademais, na hipótese de outro co-legitimado dos arts.5o, da Lei da Ação Civil Pública e 82, do Código de Defesa do Consumidor promover ação civil pública para combate à publicidade enganosa, o Ministério Público intervém obrigatoriamente como fiscal da lei (custos 44 O inquérito civil foi estabelecido pela Lei da Ação Civil Pública (n°7.347/85), que no art.8°, §1° dispõe que "o Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis". Ele pode ser conceituado como uma "investigação administrativa, de caráter inquisitorial, unilateral e facultativo, instaurado e presidido pelo Ministério Público e destinado a apurar a ocorrência de danos efetivos ou potenciais a direitos ou interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos ou outros que lhe incumba defender, servindo como preparação para o exercício das atribuições inerentes às suas funções institucionais" o (art.2 do Ato Normativo 484, de 5 de outubro de 2.006, do Colégio de Procuradores de Justiça do Estado de São Paulo). A respeito do conceito de inquérito civil, vide MAZZILLI, 1999, p.46-48. 45 A ação civil pública é uma espécie de ação coletiva, a cargo do Ministério Público e de outros colegitimados expressos no art.5° da Lei n°7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), para a defesa de interesses transindividuais (MAZZILLI, 2006, p.67-68). Mais informações sobre o conceito de ação civil pública e sua abrangência, consultar MANCUSO, 2004, p.15-27. 46 Complementando a Constituição Federal a Lei n°7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública, devidamente recepcionada pela nova ordem constitucional) dispõe: Art.1°. Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: [...] II - ao consumidor; [...]. Mais pormenorizadamente, o Código de Defesa do Consumidor (Lei n°8.078/90) cuida da legitimidade ativa do Ministério Público e da disciplina da ação civil pública e do inquérito civil em defesa da coletividade dos consumidores nos art.81 a 104. A respeito, conferir SMANIO, 2004, p.31 e 36-39. 38 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version legis)47, assumindo a titularidade da ação em caso de desistência infundada ou abandono, nos termos do art.5°, §3°48. 2.4 DA COMPETÊNCIA Considerando a existência de diversos Ministérios Públicos no sistema federativo brasileiro (art.128, da Constituição Federal), é preciso estabelecer a atribuição de cada um para buscar a correção da publicidade enganosa. O critério utilizado pelo Código de Defesa do Consumidor é a extensão dos prejuízos causados: Art.93 - Ressalvada a competência da justiça federal, é competente para a causa a justiça local: I - no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito local; II - no foro da Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os danos de âmbito nacional ou regional, aplicando-se as regras do Código de Processo Civil aos casos de competência concorrente. De acordo com a regra acima, se a mensagem veiculada produzir danos locais ou regionais, a tarefa será do Ministério Público do respectivo Estado49. Se o prejuízo alastrar-se por mais de um Estado, a legitimação é concorrente entre os Ministérios Públicos Estaduais e o 47 De acordo com a Lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), em seu art..5°, §1°: "O Ministério Público, se não intervier no processo como parte, atuará obrigatoriamente como fiscal da lei". Em reforço, o art. 92 do Código de Defesa do Consumidor ratifica: "O Ministério Público, se não ajuizar a ação, atuará sempre como fiscal da lei". 48 De acordo com a literalidade do dispositivo citado, "em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa". Para GAMA (1997, p.64), a substituição pelo Ministério Público é obrigatória, enquanto que MANCUSO (2004, p.165-172) e MAZZILLI (2006, p.349-350) sustentam, em sentido contrário, que o Parquet não é obrigado a assumir a titularidade da ação civil pública abandonada e só o fará quando identificar a existência de interesse público na continuidade da lide. 49 Se o dano regional atingir várias comarcas, quaisquer das promotorias podem tomar providências no seu foro, o que prevenirá a atribuição em relação às demais. Caso o dano atinja todo o Estado, as 39 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Federal, nas respectivas capitais50. Se o dano produzido em mais de um Estado for de âmbito nacional, a atribuição é do Ministério Público Federal, aforando-se as providências na Capital do Distrito Federal. Para João Batista Almeida (1993, p.164), os diversos Ministérios Públicos devem atuar em regime de cooperação. Um tendo conhecimento de publicidade enganosa cujo combate é de atribuição alheia, deverá imediatamente comunicar o outro para a instauração das investigações51 e, se necessária, a tomada das medidas judiciais cabíveis, fornecendo as provas que tiver conhecimento e respeitando assim o segmento de atuação alheia. providências deverão ser tomadas na promotoria do consumidor da Capital da respectiva unidade federativa. 50 Na lição de Hugo Nigro Mazzilli (2006, p.257), se a tutela coletiva envolver lesões ocorridas em mais de um Estado da Federação, mas sem que o dano alcance todo o território nacional, a ação será de competência concorrente entre uma das varas estaduais ou federais da Capital de um dos Estados envolvidos, conforme o caso, à escolha dos co-legitimados ativos". 51 A divisão de atribuições entre os Ministérios Públicos para instauração do inquérito civil dá-se pelas mesmas regras da ação civil pública, dado que a investigação é instrumental a esta. 40 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version SEGUNDA PARTE DOS MECANISMOS DE ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO COMBATE À PUBLICIDADE ENGANOSA 41 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version 1. Da Persecução Penal 1.1 DA TIPIFICAÇÃO DO CRIME DE PUBLICIDADE ENGANOSA O crime de publicidade enganosa está previsto entre os delitos contrários às relações de consumo e é de ação penal pública porque a matéria é de interesse de toda a sociedade (FARIA, 1942, p.238). Estipula o Código de Defesa do Consumidor ao descrever a conduta e fixar a pena in abstrato do crime de publicidade enganosa52: Art.67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber enganosa ou abusiva: Pena - Detenção de três meses a um ano e multa. O tipo primário apresenta um elemento normativo do tipo na expressão "publicidade enganosa", pois é preciso recorrer a uma valoração jurídica para obter precisamente sua definição (ZAFFARONI, 1988, p.422). No caso o Código de Defesa do Consumidor define o que seja uma publicidade enganosa e o crime restará configurado quando a conduta do agente encaixar-se na seguinte descrição legal: 52 Antes do advento do Código de Defesa do Consumidor, a publicidade enganosa já era punida como crime em situações específicas, mas tais figuras penais foram revogadas pelo art.67 deste diploma, como esclarece José Geraldo Brito Filomeno (1998, p.526): "Apesar de algumas leis esparsas já preverem a punição de publicidade enganosa, como, por exemplo, no que diz respeito a lançamento de incorporação de imóveis (art.65 da Lei n°4.591/64), loteamentos (art.55, inc. III, da Lei n°6.766/79), ou ainda dentro das chamadas 'infrações contra a economia popular' (Constituição Federal. inc. VII do art.3° da Lei n°1.521/51), nosso ordenamento jurídico certamente carecia de dispositivos claros e sobretudo genéricos porquanto a má publicidade não se faz tão-somente, como se sabe, nas referidas classes de bens econômicos, mas também em todos os tipos de produtos e serviços, publicidade tal que, diante do espetacular progresso tecnológico atinge incontáveis números de potenciais consumidores mediante suas várias maneiras de veiculação. Daí porque se procurou, de uma maneira bastante realista e sobretudo mediante a utilização de tipos abertos e genéricos, abranger-se as várias hipóteses da publicidade/oferta enganosa, [...]". 42 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Art.37, §1°. É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços. [...] §3°. Para os efeitos deste Código, a publicidade é enganosa por omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do produto ou serviço. A pena privativa de liberdade pode sofrer diminuição caso o autor dos fatos providencie a reparação dos danos causados pela publicidade enganosa ou desminta posteriormente e de forma eficaz os dados falsos da mensagem (CALAIS-AULOY, 1992, p.94). 1.2 DOS FUNDAMENTOS DA TIPIFICAÇÃO DA CONDUTA A proteção penal das vítimas da publicidade enganosa decorre de uma série de motivos relevantes elencados por José Geraldo Brito Filomeno (1998, p.492, 493, 535 e 536): extensão, segurança, retribuição, prevenção e eficácia. Quanto à extensão, a publicidade enganosa atinge um grande número de consumidores e por isso merece rigorosa defesa estatal. Em relação à segurança, como a falsidade dos dados divulgados pode envolver risco à saúde e à segurança das pessoas expostas à mensagem, é conveniente estabelecer uma infração penal específica para a punição da publicidade enganosa. No que tange à retribuição, já que a publicidade enganosa pode gerar graves danos e de natureza não apenas patrimonial, é 43 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version oportuno acrescentar sanção criminal à responsabilidade civil decorrente do ato ilícito praticado. A prevenção, por seu turno, demanda a fixação de sanção penal como instrumento inibitório de novas mensagens que induzam os consumidores a erro. Por derradeiro, no tocante à eficácia, a ameaça de punição criminal pode persuadir mais facilmente o anunciante a cumprir as normas civis e administrativas de proteção do consumidor53. Promover a lisura nas ofertas publicitárias é tema relevante, de interesse difuso, que diz respeito a todo o mercado. Logo, a proteção da sociedade de consumo, inclusive na órbita penal pelo Ministério Público, é necessária e adequada ao bem comum54. 1.3 DO BEM JURÍDICO PROTEGIDO O bem jurídico protegido pelo tipo penal previsto no art.67 do Código de Defesa do Consumidor é o universo difuso das relações de consumo (SILVA, 2002, p.250; ZANELLATO, 1999, p.280). 53 A conveniência social identificada pelo legislador brasileiro foi seguida pela Espanha, onde a publicidade enganosa também configura crime contra as relações de consumo, de acordo com o art.282 do Código Penal de 1995, com pena de prisão de seis meses a um ano ou multa de seis a dezoito meses (FILOMENO, 1998, p.490). 54 Alberto do Amaral Júnior (1993, p.222) afirma a necessidade de combinar sanções civis e penais para proteção do consumidor nos seus direitos mais relevantes: "Na célebre mensagem enviada ao Congresso do EUA em 15 de março de 1962, o presidente Kennedy se referiu a quatro direitos básicos dos consumidores. Entre esses direitos figurava o direito dos consumidores de serem informados sobre os produtos e serviços colocados no mercado. [...] Este fato está intimamente associado ao rápido desenvolvimento tecnológico que ampliou o grau de complexidade técnica dos bens, fazendo com que, muitas vezes, o consumidor desconheça os riscos apresentados pelos produtos que venha a adquirir. Tal situação provocou a emergência de novas formas de proteção do consentimento, cujo resultado foi a disseminação de um novo tipo de formalismo, que teve na combinação entre sanções penais e sanções civis a sua característica mais importante. O formalismo que se desenvolveu nas últimas décadas visa a proteger certas categorias de sujeitos que se situam em posição de inferioridade no mercado, procurando tornar o consentimento mais livre, mais refletido e esclarecido". 44 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Os interesses individuais de consumidores lesados são defendidos apenas indiretamente pela tutela penal, de forma que prescindível a demonstração de perigo concreto. Então, não é preciso provar que a publicidade levou determinado consumidor a erro, basta a potencial capacidade de iludir os consumidores que compõem a faixa almejada pela mensagem enganosa55. Portanto, o crime fica configurado com a mera ocorrência de perigo abstrato (ou presumido) e a doutrina o classifica como delito de mera conduta (ZANELLATO, 1999, p.280-281) ou formal (SILVA, 2002, p.251). 1.4 DISTINÇÃO COM OUTRAS FIGURAS PENAIS Caso ocorra resultado naturalístico fica configurado outro crime de publicidade enganosa, previsto no art.7°, VII, da Lei n°8.137/90, que estabelece também como infração penal contra as relações de consumo "induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de indicação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade de bem ou serviço, utilizando-se de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação publicitária" (FILOMENO, 1998, p.534). Verifica-se pela pena deste outro delito complementar que, se a publicidade enganosa for eficaz, levando in concreto consumidores ao erro, a punição será naturalmente mais rigorosa, com detenção de 2 a 5 anos, ou multa. Por outro lado, o crime de publicidade enganosa não se confunde com o de concorrência desleal, previsto no art.195, Lei de 55 Neste sentido, jurisprudência do extinto Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo (Apelação a 926.759/1 da 14 Câmara, Relator Juiz Renê Ricupero, julgada em 22.08.1995). Conferir ementa in CASTELO; DA MATTA, 1999, p.393. 45 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Propriedade Industrial (Lei n°9.279/96). Neste, a divulgação de dados falsos objetiva somente sobrepor-se a ou prejudicar concorrentes e a ação penal é de iniciativa privada do ofendido (art.199), de acordo com a lição de José Geraldo Brito Filomeno (1998, p.533). 1.5 DO TIPO SUBJETIVO A análise do tipo subjetivo do crime de publicidade enganosa previsto no art.67, do Código de Defesa do Consumidor é polêmica na doutrina. Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva (2002, p.251) e José Geraldo Brito Filomeno (1998, p.555-556) classificam o crime como doloso e admitem apenas o dolo eventual pela expressão "deveria saber ser enganosa" contida no tipo. João Batista de Almeida, por seu turno, interpreta "deveria saber" como previsão de sanção penal também à conduta culposa (1993, p.135), "na modalidade 'sem previsão', em que o sujeito, mesmo não conhecendo previamente a fraude ou a irregularidade da peça publicitária, acaba por agir com imprudência, imperícia ou negligência, violando o dever de cuidado objetivo (deveria saber)". Sem a pretensão de colocar pá de cal sobre o assunto, merece preferência a primeira corrente, em decorrência do princípio do favor rei que rege a interpretação da norma penal56 e porque o simples 56 De acordo com Hungria e Fragoso (1976, p.94) "no caso de irredutível dúvida entre o espírito e as palavras da lei, é força acolher, em direito penal, irrestritivamente, o princípio in dubio pro reo (isto é, o mesmo critério de solução nos casos de prova dúbia no processo penal). Desde que não seja possível descobrir-se a voluntas legis, deve guiar-se o intérprete pela conhecida máxima: favorabilia sunt amplianda, odiosa restringenda". 46 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version ato culposo é menos grave e já é punido como ilícito civil (AMARAL JÚNIOR, 1993, p.225), tornando desnecessária a sanção penal57. 1.6 DO SUJEITO ATIVO O delito de publicidade enganosa é classificado ainda como crime próprio, pois exige especial qualidade do sujeito ativo. No caso, ser o fornecedor do produto ou serviço (na modalidade "promover") ou o publicitário que criou a mensagem (que incide no verbo "fazer")58. Como o crime é próprio e não de mão própria, nada impede também a co-autoria ou participação do responsável pelo veículo de mídia que transmitir a mensagem enganosa, sendo possível o concurso de pessoas nos moldes do art.29, do Código Penal (SILVA, 2002, p.252), desde que ciente da falsidade. 1.7 DA MATERIALIDADE Quanto à materialidade, é necessário mencionar que o promotor de justiça não poderá esquecer de anexar à denúncia o corpo de delito (cópia da mensagem publicitária), para conferir justa causa à instauração da ação penal, de acordo com Habeas Corpus (n°6215/SP) 57 Segundo Nelson Hungria (1955, p.27), "o legislador é um oportunista, cabendo-lhe apenas, inspirado pelas exigências do meio social, assegurar, numa dada época, a ordem jurídica mediante sanções adequadas. Se o fato antijurídico não é de molde a provocar um intenso ou difuso alarma coletivo, contenta-se ele com o aplicar a mera sanção civil (ressarcimento do dano, execução forçada, restitutio in pristinum, nulidade do ato). O Estado só deve recorrer à pena quando a conservação da ordem jurídica não se possa obter com outros meios de reação, isto é, com os meios próprios do direito civil (ou de outro ramo do direito que não o penal). A pena é um mal, não somente para o réu e sua família, senão também, sob o ponto de vista econômico, para o próprio Estado. Assim, dentro de um critério prático, é explicável que este se abstenha de aplicá-la fora dos casos em que tal abstenção represente um mal maior ". 58 Para João Batista de Almeida (1993, p.135), "o tipo comporta dois núcleos, fazer (criar, executar), comportamento humano positivo diretamente ligado ao profissional publicitário, e promover (ou seja, diligenciar para que se efetue a publicidade enganosa ou abusiva) conduta atribuída aos responsáveis pela veiculação". Conferir ainda no mesmo sentido, José Geraldo Brito Filomeno (1998, p. 554-555); Marco Antonio Zanellato (1999, p.280). 47 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version concedido pela 6a Turma do Superior Tribunal de Justiça (Relator Ministro Anselmo Santiago, julgado em 20 de maio de 1997)59. 1.8 DAS PENAS ALTERNATIVAS Pela quantidade máxima de pena prevista in abstrato, cuida- se de uma infração de menor potencial ofensivo, nos termos da Lei n°9.099/95: Art.61. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 1 (um) ano, excetuados os casos em que a lei preveja procedimento especial. O Código de Defesa do Consumidor não prevê rito especial para crimes contra relações de consumo. Somente descreve condutas incriminadas, especifica penas e disciplina a legitimidade ativa para a ação penal. Logo, o crime de publicidade enganosa é infração penal de menor potencial ofensivo e se submete aos dispositivos da Lei dos Juizados Especiais Criminais (n°9.099/95). Isso abre rico leque de opções ao representante do Ministério Público na defesa dos direitos do consumidor, que, em vez de oferecer denúncia, pode apresentar ao réu primário proposta de aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multa, de acordo com a previsão do art. 76 do rito penal sumaríssimo, previsto na Lei n°9.099/95 (transação penal). As penas restritivas de direitos estão elencadas no art.43, do Código Penal e algumas podem ser bastante eficazes na proteção coletiva dos consumidores. É o caso, por exemplo, da prestação 59 Conferir ementa em ZANELLATO, 1999, p.280. 48 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version pecuniária a órgãos estatais de defesa do consumidor (arts. 43, I, e 45, do Código Penal) ou diretamente às vítimas mediante constituição de um fundo temporário para ressarcimento dos consumidores interessados no desfazimento da compra ou devolução de valores, à vista da nota fiscal. Outras possibilidades que interessam especificamente ao direito do consumidor são a perda do patrimônio acrescido pelo lucro demonstrado após o início da divulgação publicitária enganosa (inciso II) e a prestação de serviços à comunidade junto ao PROCON (inciso IV). Caso o Ministério Público escolha a via da multa, deve atentar para seu caráter inibitório, fixando patamar bem superior ao proveito econômico obtido pelo infrator, colaborando assim para evitar a reiteração da conduta criminosa. A imposição imediata de pena alternativa ou multa em transação penal também é vantajosa para o autor da infração, que manterá sua primariedade se cumpri-la devidamente60. 1.9 DA CONTRAPROPAGANDA O Código de Defesa do Consumidor prevê ainda pena alternativa específica para os crimes contra as relações de consumo - a divulgação em mídia de notícia sobre os fatos e a condenação, às expensas do condenado (art.78, II). Consiste no dever de o causador do dano veicular mensagem publicitária nos mesmos moldes que a enganosa, porém em sentido antagônico ou esclarecedor61. 60 Conferir art.76, §6°, da Lei n° 9099/95 e ANDRIGHI e BENETI, 1996, p.140. Para mais detalhes, ver CAMPOS (1994, p.415), que explica que "a imposição da contrapropaganda consiste na formação de uma obrigação ao causador do dano material ou moral de fazer veicular mensagem antagônica àquela de caráter lesivo, executando o mesmo plano de mídia, respeitando o número de inserções, horários e veículos de comunicação pelos quais foi veiculada a peça publicitária que deu origem ao prejuízo". 61 49 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version A pena alternativa de imposição de contrapropaganda é a mais adequada para o caso de cometimento de crime de publicidade enganosa, pois responde especificamente ao mal cometido e à altura dele, sendo medida temida pelos anunciantes devido ao alto custo (CAMPOS, 1994, p.415)62. Além disso, pode contribuir de maneira eficaz para a prevenção de novas mensagens enganosas e possui caráter educativo para os fornecedores e informativo para os consumidores, coroando direitos básicos relativos à informação, transparência e veracidade das ofertas no mercado, previstos no art.6°, II a IV, do Código de Defesa do Consumidor63. O membro do Ministério Público, no entanto, deverá apresentar conduta funcional dinâmica, cobrando e fiscalizando o fiel cumprimento da reprimenda pessoalmente e com auxílio dos funcionários especializados dos órgãos de apoio da instituição. No caso de descumprimento integral ou parcial da reprimenda, tomará todas as providências para converter a pena alternativa em privativa de liberdade ou deflagrar a execução civil da obrigação (ANDRIGHI e BENETI, 1996, p.140), caso transacionada no início do procedimento do juizado especial criminal com imposição alternativa de multa para a hipótese de descumprimento. 62 A autora mencionada pondera que "o infrator arcará com os custos da contrapropaganda (art.60, e §1°), o que caracteriza uma intervenção no plano de marketing do anunciante, comprometendo toda sua estratégia de investimento de sua verba de comunicação; daí tal sanção ser uma das mais temidas pelos profissionais dos departamentos de marketing dos anunciantes e das agências de propaganda, já que tem reflexo direto em seus resultados financeiros". 63 Art.6°. São direitos básicos do consumidor: [...] II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações; III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos ou serviços; [...]. caput 50 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version 1.10 DA AÇÃO CIVIL EX DELICTO Os sistemas penal e civil de proteção do consumidor pelo Ministério Público diante da publicidade enganosa complementam-se, muitas vezes se comunicam e a coisa julgada no âmbito penal pode dar ensejo ao ressarcimento do consumidor no cível (MANCUSO, 1998, p.10). O art.475-N do Código de Processo Civil arrola como título executivo judicial a sentença penal condenatória transitada em julgado (inciso II)64 e o consumidor iludido pela publicidade enganosa pode promover a ação ex delicto para execução dos danos, tendo como título executivo aquela, de acordo com o Código de Processo Penal: Art.63. Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros65. A obrigação da pessoa física autora do crime reparar os danos causados encontra-se no art.91, I, do Código Penal, como efeito genérico da condenação, e não é extensiva à sociedade empresária responsável civilmente, pois esta não participou do processo penal e deve ter assegurado seu direito prévio de defesa66. Para aprimoramento da defesa do consumidor, fica a sugestão, de lege ferenda, para extensão da responsabilidade penal à pessoa jurídica nos crimes de 64 A execução da sentença civil não depende de trânsito em julgado, pode ser realizada na modalidade execução provisória, ao contrário da execução da sentença penal, que depende sempre da coisa julgada e não pode ser feita na forma provisória. Conferir a respeito WAMBIER, 2006, P.208209. 65 A mesma previsão vem repetida com outras palavras no art.103, §4° do Código de Defesa do Consumidor e não há necessidade de o interessado promover no cível prévia ação de conhecimento condenatória. A respeito, verificar considerações complementares in MANCUSO, 1998, p.10. 66 Vide WAMBIER, 2006, p.203-204. 51 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version consumo, nos mesmos moldes da legislação ambiental, com penas de multa, restritivas de direitos e prestação de serviços à comunidade (MILARÉ, 2000, p.364) e possibilidade de responder à ação civil delicto. ex O ofendido, por outro lado, não fica amarrado ao deslinde da ação penal e pode promover antes a ação de reparatória em face do autor do delito e/ou do responsável civil67, porém a vantagem de promover a ação civil ex delicto é não precisar passar pelo crivo judicial de conhecimento, indo de pronto à execução. A vítima deverá, no prólogo da execução civil ex delicto, promover a liquidação por artigos ou arbitramento (no caso de danos puramente morais ou quando não houver necessidade de prova de fato novo), para definição do quantum debeatur (FILOMENO, 1998, p.478). A execução da sentença penal condenatória no crime de publicidade enganosa é do juizado especial cível, desde que o valor não exceda 40 salários mínimos (art.3°, I, da Lei n°9.099/95). Caso contrário deverá ser realizada, na maioria das vezes, na justiça comum68. Não se aplica, normalmente, o disposto no art.3°, §1°, I, da Lei n°9.099/95 (o juizado especial cível promover a execução de seus julgados, 67 A ação de indenização pode ser promovida mesmo se a ação penal for julgada improcedente, desde que esta não reconheça categoricamente a inexistência do fato (art.66 do Código de Processo Penal). Segundo Luiz Rodrigues Wambier (2006, p.201), "somente o reconhecimento da inexistência do fato alegado como fundamento do pedido, na esfera penal, é que impede o aforamento da ação civil. O reconhecimento de que o fato não constitui ilícito penal não exonera o réu, todavia, de responder civilmente por ele, sempre que esse fato for encartável como ilícito civil". 68 Não se aplica, normalmente, o disposto no art.3°, §1°, I, da Lei n°9.099/95 (o juizado especial promover a execução de seus julgados, independentemente do valor) porque os juizados cíveis e criminais nem sempre se confundem. Como explica Luiz Rodrigues Wambier (2006, p.210), "se a sentença de homologação foi prolatada no Juízo Especial Penal, a execução do título no juízo cível deverá respeitar o valor de alçada, de vez que não se trata de execução de julgado do próprio Juízo Especial Cível, mas sim do Juízo Especial Penal que é, portanto, outro juízo". 52 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version independentemente do valor), porque o julgado executado é de outro juizado especial, o criminal69. No que pertine à atuação do Ministério Público no tema em comento, caso o ofendido seja pessoa pobre o promotor de justiça pode promover a execução em seu nome (art.68, do Código de Processo Penal). 2. Do Inquérito Civil 2.1 DOS FUNDAMENTOS A Lei n°8.078/90 estabelece simultaneamente regras de direito penal e de direito civil na defesa dos direitos do consumidor. Vêse que o legislador optou por um sistema complexo de proteção (AMARAL JÚNIOR, 1993, p.225), fundamental para proteção integral dos direitos do consumidor, porque somente as normas penais seriam insuficientes, considerando a morosidade dos processos criminais e a presunção de inocência de que desfruta o acusado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Se o consumidor fosse depender do trânsito em julgado penal condenatório para promover a ação civil ex delicto, certamente os interesses defendidos pelo Código ficariam em longo desabrigo e desamparo quanto à reparação dos danos causados pelo ilícito, notadamente quando impossibilitada por qualquer causa a transação penal (FILOMENO, 1998, p.478)70. 69 Como explica Luiz Rodrigues Wambier (2006, p.210), "se a sentença de homologação foi prolatada no Juízo Especial Penal, a execução do título no juízo cível deverá respeitar o valor de alçada, de vez que não se trata de execução de julgado do próprio Juízo Especial Cível, mas sim do Juízo Especial Penal que é, portanto, outro juízo". 70 O mencionado doutrinador ressalta no trecho apontado que, em virtude da costumeira demora dos processos criminais, ordinariamente ocorrerá a simultaneidade de feitos no âmbito penal e civil em favor do consumidor. 53 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version A Lei n°8.078/90 não se limitou a criar um sistema de responsabilidade civil paralelo à apuração criminal para defesa dos direitos do consumidor, sobretudo no que toca à publicidade enganosa. O legislador claramente optou pela adoção de medidas de prevenção no âmbito civil, preferindo antes evitar que os danos ocorram, dadas a gravidade e a extensão dos danos que uma mensagem falsa difundida por meios potentes de comunicação pode acarretar (FILOMENO, 1998, p.478). Por conta disso, o inquérito civil, enquanto procedimento preliminar de investigação de ofensas a interesses difusos, é mecanismo de suma importância no caráter preventivo do sistema de defesa do consumidor na área extrapenal, podendo solucionar o problema antes mesmo da venda do produto ou serviço anunciado e sem precisar tomar qualquer medida judicial71. A condução do inquérito civil é de exclusiva atribuição do Ministério Público, de acordo com o art.129, III, da Constituição Federal72 e ele é dotado de institutos extrajudiciais eficazes para cessar 71 Sobre a preferência ao caráter preventivo no combate à publicidade enganosa, Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (1998, p.211) assinala que o Ministério Público "não deve esperar o exaurimento da relação de consumo para, só então, atuar. Exatamente porque estamos diante de atividades que trazem um enorme potencial danoso, de caráter coletivo ou difuso, é mais econômico e justo evitar que o gravame venha a se materializar". 72 Dispõe o mandamento da Carta Magna que é função institucional do Ministério Público "promover o inquérito civil [...] para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos". A Lei da Ação Civil Pública (n°7.437/85) trata do inquérito civil no âmbito infraconstitucional no seu art.8°, §1°, devidamente recepcionado pela Constituição Federal, estabelecendo que "o Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis". O fato de se ter conferido a presidência do inquérito civil somente ao Ministério Público atende a uma conveniência de viabilidade econômica, sustenta Carlos Alberto de Salles (2003, p.133 e 135), uma vez que os custos transacionais e de apuração de uma infração a um interesse difuso seriam fardo financeiro significativo para um particular, o que desestimularia a defesa dos direitos difusos do consumidor perante a publicidade enganosa e a lei preferiu, portanto, incumbir a tarefa a uma instituição pública mais aparelhada. Todavia, é de se salientar que a instauração ou arquivamento do inquérito civil por parte do Ministério Público não prejudica nem obsta a celebração de compromisso de ajustamento ou concorrente propositura de ações judiciais por parte dos co-legitimados à defesa coletiva ou mesmo de ações individuais (ALMEIDA, 1993, p.158). 54 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version precocemente a publicidade enganosa, tais como a recomendação73 e o termo de compromisso de ajustamento74. Todavia, é possível que a instauração do inquérito civil e a tomada das medidas extrajudiciais mencionadas acima, durante o curso das investigações, não sejam suficientes para coibir a atividade dos responsáveis pela publicidade enganosa e será necessária a promoção da ação civil pública para coactar os efeitos da mensagem. Tais aspectos serão devidamente tratados nos tópicos seguintes. 2.2 DA PREVENÇÃO A atuação extrajudicial do Ministério Público na defesa dos interesses difusos dos consumidores lesados ou em risco pela publicidade enganosa dá-se mediante a égide do princípio da prevenção75. O objetivo do Parquet é evitar o quanto possível que a 73 Hugo Nigro Mazzilli (1999, p.334-336) restringe a emissão de recomendações a entidades públicas e prestação de serviços públicos, com fundamento no fato de os arts. 113, §1° e 103, VII, da Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo (Lei Complementar Estadual 734/93) preverem como destinatários das recomendações apenas as entidades e autoridades públicas ou os prestadores de serviço público. No entanto a matéria é controvertida, já que a mesma Lei menciona genericamente "nos serviços de relevância pública", o que não se confunde com serviços públicos e abrange o interesse difuso do consumidor no combate à publicidade enganosa, tanto que o Ato Normativo 484 do Colégio de Procuradores de Justiça de São Paulo conceitua a recomendação como o "instrumento destinado à orientação de órgãos públicos ou privados, para que sejam cumpridas normas relativas a direitos e deveres assegurados ou decorrentes das Constituições Federal e Estadual e serviços de relevância pública e social" [grifo nosso], indicando que o instituto pode ser aplicado também em relação aos responsáveis pela criação de uma publicidade e sua divulgação, já que o serviço prestado tem relevância pública e reflexos sociais. 74 O Ato Normativo 484 do Colégio de Procuradores de Justiça de São Paulo conceitua o compromisso de ajustamento de conduta como o instrumento formal celebrado em inquérito civil ou procedimento preparatório, para adequação de condutas às exigências legais, mediante cominações, com eficácia de título executivo extrajudicial (art.4°). Tratando do instituto para além da alçada do Ministério Público, observa-se que o compromisso de ajustamento pode ser também celebrado fora do inquérito civil e por iniciativa de qualquer outro órgão público co-legitimado para a propositura da ação civil pública (art.5°, §6° da Lei da Ação Civil Pública). Neste sentido, consultar MANCUSO, 2004, p.323. Sobre o compromisso de ajustamento como forma de transação no inquérito civil, vide VIGLIAR, 2001, p.137-141. 75 Thierry Bourgoine (1988, p.399) identifica, diante das necessidades e lacunas do direito consumeirista belga, a tendência do Poder Público em intervir cada vez mais rigorosamente na defesa da transparência e da informação no mercado de consumo. Na mesma esteira de 55 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version mensagem produza prejuízos. Preservam-se assim imaculáveis, desde a formação do convencimento do consumidor, a veracidade, a confiança, a transparência nas relações de consumo e o direito à informação correta na oferta76. Qualquer do povo, tendo conhecimento de publicidade enganosa, poderá se dirigir à Promotoria de Justiça do Consumidor de sua Comarca e apresentar uma representação escrita ou verbal, requerendo que sua suspeita seja investigada e providências sejam tomadas, nos termos dos arts.129, II, da Constituição Federal77 e 27, parágrafo único, I, da Lei n°8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público)78. Além disso, o promotor de justiça também colhe dados na atividade ao atendimento ao público e em audiências públicas79, praticando verdadeira função de ombudsman, ao zelar pelos direitos metaindividuais presentes na sociedade80. pensamento, Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin (1998, p.211) entende justificada a atividade preventiva estatal desempenhada pelo Ministério Público desde a simples exposição à publicidade enganosa, devido ao seu grande potencial danoso, que faz merecer a atenção do Poder Público para evitar que se materialize em grave prejuízo. 76 Para Cláudia Lima Marques (2005, p.804), "as relações de consumo, mesmo em sua fase précontratual ou, como preferem alguns, extracontratual, devem guiar-se pela lealdade e pelo respeito entre fornecedor e consumidor". 77 “Art.129. São funções institucionais do Ministério Público: [...] II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; [...]”. 78 “Art. 27, parágrafo único. No exercício das atribuições a que se refere este artigo, cabe ao Ministério Público, entre outras providências: [...] I - receber notícias de irregularidades, petições ou reclamações de qualquer natureza, promover as apurações cabíveis que lhes sejam próprias e darlhes as soluções adequadas; [...]”. 79 As audiências públicas estão reguladas, no âmbito do Ministério Público do Estado de São Paulo, pelos arts.60 a 65 do Ato Normativo 484, de 05 de outubro de 2.006, do Colégio de Procuradores de Justiça. São "reuniões organizadas e presididas pelo Ministério Público, abertas a qualquer do povo, para discussão de situações das quais decorra ou possa decorrer lesão a interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos" (art.60, caput). Têm por finalidade coletar, junto à sociedade e ao Poder Público, elementos que embasem, sem efeito vinculante contudo, decisão do órgão do Ministério Público quanto à matéria objeto de convocação (feita mediante prévio edital divulgado no Diário Oficial e fixado na sede da Promotoria). As audiências públicas podem ser realizadas antes ou no curso de um inquérito civil. Mais dados sobre audiências públicas in MAZZILLI, 1999, p.323-333. 80 Para se aprofundar sobre a tese do perfil da atividade de defensor do povo (ombudsman) desempenhada pelo Ministério Público, consultar Hugo Nigro Mazzilli, 2001, p.121-127. 56 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Pode ocorrer, ainda, que a notícia da publicidade enganosa surja de forma não provocada ao promotor de justiça, que toma conhecimento pessoal da mensagem, de qualquer forma. Neste caso, o Ministério Público poderá agir de ofício, não há necessidade de aguardar inerte provocação, privilegiando-se assim a atividade preventiva (MAZZILLI, 1999, p.100-101). Em todas as hipóteses vistas acima, o membro do Ministério Público, de posse das peças de informação que mereçam investigação mais aprofundada sobre a publicidade enganosa, deve o mais rápido possível instaurar o procedimento formal de apuração chamado inquérito civil81. 2.3 DAS PROVIDÊNCIAS PRELIMINARES Ao despachar a representação, ou mesmo de ofício ao tomar espontaneamente conhecimento da publicidade enganosa, o representante do Ministério Público instaura por portaria o inquérito civil ou procedimento preliminar assemelhado82 para apurar os fatos e a responsabilidade pela suposta publicidade enganosa. 81 Claudia Lima Marques (2005, p.1108) assinala que a morosidade dos trâmites judiciais é fator primordial para concluir que a atuação extrajudicial do Ministério Público é decisiva para cumprir o objetivo da prevenção, estabelecido como direito básico do consumidor no art.6°, VI, do Código de Defesa do Consumidor. 82 São referidas aqui as sindicâncias, peças de informação, autuações sem portaria e procedimentos preparatórios de inquérito civil, instaurados quando o Promotor do Consumidor tiver necessidade de coletar dados para formação de seu convencimento acerca da caracterização ou existência da publicidade enganosa, da qual não está seguro. Na verdade, trata-se de procedimentos idênticos ao inquérito civil quanto à sua natureza investigativa e, portanto, também sujeitos ao controle interno de seu arquivamento pelo Conselho Superior do Ministério Público, embora não disciplinados pela Lei da Ação Civil Pública (n°7.347/85). Normalmente, a única diferença relevante em relação ao inquérito civil é que o procedimento preparatório deve ser concluído em prazo mais célere. Ao final, pode ser convertido em inquérito civil ou ser proposta desde logo a ação civil pública, se as provas coletadas forem suficientes. Cada Ministério Público dispõe de uma disciplina normativa própria desses procedimentos prévios assemelhados ao inquérito civil. No Estado de São Paulo, o procedimento preparatório de inquérito civil é regulado pelos art.23 do Ato Normativo 484, de 05 de outubro de 2006, do Colégio de Procuradores de Justiça, com prazo de 60 dias para encerramento. Mais informações sobre os procedimentos análogos ao inquérito civil, consultar MAZZILLI, 1999, p.129139. 57 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version É importante que o promotor do consumidor delimite na portaria qual é a publicidade supostamente enganosa, identificando por quais meios de comunicação ou marketing é divulgada e deixando claro em que aspectos residem a falsidade ou ilusão a investigar83. Conferindo objetividade na instauração, conseqüentemente atribuem-se racionalidade e foco à investigação, que tende, portanto, a ser mais rápida e a atender com mais eficiência o alvo da prevenção84. O inquérito civil não possui uma série encadeada de atos a serem rigidamente praticados na ordem preestabelecida por lei, como se fosse um rito processual. Ao contrário, é dotado de maleabilidade na ordem de colheita da prova, de acordo com a conveniência da investigação85, e o Promotor do Consumidor deve vislumbrar em cada momento quais são as diligências mais adequadas à apuração da suspeita de publicidade enganosa. Como não deve perder de vista o objetivo primordial da prevenção, convém determinar, dentre as diligências preliminares, a comunicação do fornecedor, da agência e do veículo de mídia responsáveis pela mensagem publicitária sobre a instauração do inquérito civil, prevenindo-os desde já sobre as responsabilidades civis e criminais decorrentes da continuidade da publicidade enganosa, 83 Na hipótese de a representação estar incompleta ou genérica, o Promotor do Consumidor deve determinar ao representante que complete sua peça, devendo este indicar inclusive os meios de prova de que dispõe ou tem conhecimento para justificar sua conclusão da ocorrência da publicidade enganosa. Se a representação não for completada no prazo estipulado na Lei Orgânica de cada Ministério Público, deverá ser indeferida. 84 Hugo Nigro Mazzilli (1999, p.101) assinala que muitas vezes não é possível prever no momento da instauração do inquérito civil todos os aspectos do fato a ser investigado e que dados pertinentes inéditos podem surgir no curso das investigações. Todavia, ressalta que é a portaria deve "delimitar adequadamente adequado o escopo das investigações [...},o mais precisamente possível", individualizando assim o objeto do inquérito civil. 85 Por conta disso, José Marcelo Menezes Vigliar (2001, p.131) elenca a informalidade como uma das características do inquérito civil, o que não significa, todavia, que o procedimento é informal quanto ao modo de colheita da prova, que por certo se submete aos ditames legais. Por exemplo, É necessária prévia autorização judicial para busca e apreensão de objetos ou a redução a termo de depoimentos testemunhais (MAZZILLI, 1999, p.153-156). 58 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version requisitando os documentos que comprovam os dados fáticos, técnicos ou científicos que sustentam a publicidade (art.36, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor)86 e permitindo a apresentação de esclarecimentos, pessoalmente ou por escrito, em prazo célere (porém nunca inferior a 10 dias úteis - art.8°, §1°, da Lei da Ação Civil Pública n°7.437/85). A instauração do inquérito civil, tão logo surgido o problema da publicidade enganosa, acarreta ainda outro efeito preventivo favorável ao consumidor, previsto no art.26, §2°, III, do Código de Defesa do Consumidor - obsta a decadência do direito dos adquirentes de produto ou serviço viciado, até o seu encerramento87. 2.4 DA INSTRUÇÃO A segunda fase do inquérito civil é a instrução, em que será realizada a colheita das provas necessárias para a elucidação da suspeita de publicidade enganosa, admitindo-se a utilização de todos os meios não proibidos por lei88. A coleta da prova é realizada, em regra, sob a égide do princípio da publicidade, tendo o investigado e seu Advogado acesso aos autos, podendo a princípio acompanhar a produção dos meios de prova, solicitar a extração cópias mediante o pagamento de taxa e tomar anotações, salvo nos casos em que a lei ou a conveniência das 86 O art.38 do Código de Defesa do Consumidor estabelece ainda que "o ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina". Mais informações sobre a inversão do ônus da prova da veracidade da publicidade, consultar PRIMEIRA PARTE, item 1.4 e nota 26. 87 Entende-se como encerramento do inquérito civil a data da homologação pelo Conselho Superior do Ministério Público da decisão de arquivamento (MAZZILLI, 1999, p.141). 88 A fase crucial do inquérito civil é a instrutória, justamente porque a finalidade predominante da investigação é a reunião de provas para a propositura de "ações bem aparelhadas e instruídas" ou justamente para o contrário, para demonstrar fielmente a "desnecessidade ou o descabimento da própria provocação jurisdicional” (MAZZILLI, 2001, p.40-41). No mesmo sentido, ALMEIDA, 1993, p.158. 59 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version investigações exigirem a decretação do sigilo no inquérito civil (MAZZILLI, 1999, p.178-183)89. Os responsáveis pela mensagem publicitária podem ser interrogados em data e hora marcadas, mediante prévia notificação pessoal. Assim como podem ser tomados por termo os depoimentos de testemunhas. Caso não compareçam, podem ser conduzidos coercitivamente (art.26, I, a, da Lei n°8.625/93 - Lei Orgânica Nacional do Ministério Público)90. Se for necessária a realização de perícia, a Promotoria do Consumidor deve requisitá-la de seus próprios serviços internos e especializados de apoio ou gratuitamente de órgãos públicos da Administração direta e indireta (INMETRO, INPM, PROCON, Instituto Adolfo Lutz, Vigilância Sanitária, etc.), para garantia da idoneidade e impessoalidade dos trabalhos. O prazo de atendimento da requisição deverá ser o razoável para conclusão da perícia91. Contudo, o meio de prova mais comum no inquérito civil é indubitavelmente o documental e o Ministério Público pode requisitar "de qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis" (art.8°, §1°, da Lei da Ação Civil Pública n°7.347/85). 89 No mesmo sentido, Paulo de Bessa Antunes (2002, p.704-707) qualifica o inquérito civil de instrumento da ordem jurídica democrática e, considerando que a prova terá utilização relevante a interesses sociais, proclama a conveniência de se instaurar o contraditório e a ampla defesa o quanto possível na instrução, negando semelhanças com o inquérito policial. 90 É conveniente que o presidente do inquérito civil tenha sempre em mente o princípio da prevenção e que a recusa de comparecimento de envolvidos ou testemunhas não suspenda o andamento da instrução, salvo se imprescindível. 91 Se o laudo não for apresentado no prazo estipulado, o Promotor de Justiça reiterará por uma vez a ordem de realização da perícia. Persistindo a recusa ou omissão, o perito comete o crime previsto no art.10 da Lei da Ação Civil Pública (n°7.347/85), de recusa, retardamento ou omissão de "dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil", sujeitando-se à pena de reclusão de um a três anos, mais multa de 10 a 1000 (mil) OTNS. 60 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Tamanha a gama de documentos públicos e particulares que podem ser requisitados pelo Ministério Público durante o inquérito civil, só encontrando limites nos casos legais de proteção por prévia autorização judicial, que Paulo de Bessa Antunes (2002, p.706-707) qualifica de "extremamente vasto" o poder de requisição ministerial, reconhecido inclusive pela jurisprudência como "direito líquido e certo, tutelável pela via mandamental". Da mesma forma que na apresentação de laudo pericial, o decurso recusa ou omissão da in albis do prazo para a apresentação do documento pode acarretar conseqüência penal (de acordo com o crime previsto no art.10, da Lei da Ação Civil Pública n°7.347/85)92, só se admitindo a negativa nas hipóteses em que a lei impuser o sigilo, quando então a requisição só poderá ser feita por intermédio de autorização judicial (Art.8°, §2°). 2.5 DA RECOMENDAÇÃO Após a fase instrutória, o inquérito civil entra na sua última e derradeira etapa, a da conclusão93. Produzidas todas as provas que julgou necessárias, o promotor de justiça que preside o inquérito civil já pode avaliar se a publicidade é enganosa. Nesse momento, deve mais uma vez se lembrar que a finalidade principal de sua atuação é a prevenção face à publicidade enganosa. Logo, é preciso tomar providências eficazes para que seja retirada imediatamente a mensagem de veiculação, para evitar que novos consumidores sejam iludidos, providenciando também, o mais breve possível, a divulgação de mensagem em sentido contrário 92 Para informações complementares sobre requisição documental no inquérito civil, verificar MAZZILLI, 1999, p.170-175. 61 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version para orientação dos consumidores (recall94 e contrapropaganda) e a reparação dos danos já causados, sejam patrimoniais, morais, individuais e/ou coletivos95. Existem vários instrumentos para obter do fornecedor as medidas acima, sendo a recomendação a mais apropriada para o primeiro momento, porque a medida tem justamente caráter preventivo e educativo, sem precisar precipitadamente acionar a via judicial. Ademais, antes de tomar medidas extrajudiciais para obrigar o responsável, dá-se-lhe uma oportunidade de voluntariamente recompor os danos que causou. Investe-se na prevenção em detrimento da litigiosidade96. Assim, o promotor de justiça do consumidor emite uma recomendação formal e escrita ao responsável, devidamente fundamentada sobre a enganosidade da mensagem, para a solução voluntária e extrajudicial do problema97, trazendo em seu conteúdo todas 93 O inquérito civil divide-se em três fases: instauração, instrução e conclusão (VIGLIAR, 2001, p.131). Trata-se de uma campanha publicitária de convocação ou chamamento de consumidores para troca, devolução, reparo ou retirada do mercado de produto ou mercadoria defeituosa ou, no caso da publicidade enganosa, que não corresponde aos anseios legítimos dos adquirentes (SILVA, 2002, p.55-56). 95 A Súmula n°3 do Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo estabelece que "o Ministério Público tem legitimidade para ajuizar ação civil pública visando à contrapropaganda e a responsabilidade por danos morais difusos". As demais sanções são também elencadas por Renata Honório Ferreira (1994, p.65-66), que frisa também a conveniência de haver paralela apuração da responsabilidade penal pela publicidade enganosa, no âmbito criminal, bem como a possibilidade de se obter liminar judicial para cessação da mensagem, se recalcitrante o seu patrocinador, hipótese que será tratada adiante, no item 3.5 (da tutela específica). 96 A política nacional das relações de consumo tem por princípios a "harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo, [...] com base na boa-fé e equilíbrio" e o incentivo à criação de "mecanismos alternativos de solução de conflitos de consumo" (art.4°, III e V, do Código de Defesa do Consumidor), escopos plenamente atendidos pelo instituto da recomendação, que não tem caráter compulsório e a boa imagem gerada pelo controle ético interno do próprio fornecedor pode ser aproveitada como ferramenta de marketing, consolidando seu conceito junto ao mercado consumidor (FILOMENO, 1998, p.56). 97 Sobre conceito de recomendação e seu cabimento na hipótese de publicidade enganosa, vide nota 73. 94 62 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version as providências que deverão ser adotadas e prazo para resposta escrita e comprovação documental nos autos do inquérito civil98. A recomendação, entretanto, não tem caráter vinculativo ao fornecedor (ANTUNES, 2002, p.709), que pode aceitar ou não as sugestões do Ministério Público para coactar a publicidade enganosa99. Todavia, produz de qualquer forma efeitos de ordem prática, os mencionados no art.27, parágrafo único, IV, da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei n°8.625/93): “a obrigação de o notificado divulgar imediatamente e de forma adequada a recomendação e de em seguida responder por escrito ao Ministério Público, comprovando as providências tomadas ou justificando a recusa”. Se a recomendação for suficiente para cessar a publicidade enganosa, informar o consumidor e ressarcir cabalmente os danos patrimoniais e morais causados ao interesse difuso envolvido, o inquérito civil poderá ser arquivado (MAZZILLI, 1999, p.336). 2.6 DO COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA 98 Recomenda-se que o prazo estipulado, não inferior a dez dias úteis (art.8°, §1°, da Lei da Ação Civil Pública - n°7.347/85), seja breve, a fim de que as medidas do Ministério Público sejam efetivas para evitar o alastramento do dano. As providências tomadas com a recomendação estão previstas no art.27 da Lei n°8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), que estabelece que "cabe ao Ministério Público exercer a defesa dos direitos assegurados nas Constituições Federal e Estadual, sempre que se cuidar de garantir-lhes o respeito: [...] Parágrafo único. No exercício das atribuições a que se refere este artigo, cabe ao Ministério Público, entre outras providências: [...] IV promover audiências públicas e emitir relatórios, anual ou especiais, e recomendações dirigidas aos órgãos e entidades mencionadas no caput deste artigo, requisitando ao destinatário sua divulgação adequada e imediata, assim como resposta por escrito". Do mesmo ano, a Lei Complementar n°75/93 (Lei Orgânica do Ministério Público da União) também prevê em seu art.6° o instituto da recomendação, pois compete ao Ministério Público da União: [...] XX - expedir recomendações, visando à melhoria dos serviços públicos e de relevância pública, bem como ao respeito, aos interesses, direitos e bens cuja defesa lhe cabe promover, fixando prazo razoável para a adoção das providências cabíveis". 99 A recomendação não deve ser utilizada como instrumento de intimidação ou coação por parte do Promotor de Justiça, que não deve exorbitar de suas atribuições na "defesa das instituições democráticas" (ANTUNES, 2002, p.709), até mesmo porque o papel interventivo do Estado na economia é meramente indicativo para o setor privado, como ressalta CENEVIVA ao analisar os princípios constitucionais da ordem econômica sob a ótica consumerista (1991, p.147-148). 63 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Após a fase instrutória, se caracterizada no inquérito civil a publicidade enganosa e o fornecedor voluntariamente não atender a recomendação da promotoria do consumidor, será preciso adotar outra medida para oferecimento tentar solucionar do compromisso extrajudicialmente de ajustamento a de questão: conduta o ao fornecedor. Por seu intermédio, o Ministério Público100 e o responsável pela publicidade enganosa celebram uma transação, em que aquele encerra o inquérito civil em virtude da adequação da conduta deste aos ditames legais101. O promotor de justiça não deve abrir mão no acordo dos direitos difusos que defende, pois é mero legitimado extraordinário e não o próprio titular102. O conteúdo da avença, portanto, deve abarcar todos os aspectos já mencionados na recomendação, ou seja, a tomada de providências eficazes para proteção integral do consumidor, com retirada imediata da mensagem, bem como a realização de recall, quando necessário, contrapropaganda e a reparação dos danos em todas as esferas (patrimoniais e morais, individuais e coletivos)103. Mesmo que o Ministério Público proceda de conformidade com todos os aspectos sugeridos acima, sem abrir mão dos direitos do consumidor, o acordo ainda assim é conveniente ao fornecedor, porque 100 O termo de ajustamento de conduta não é exclusividade do Ministério Público. Pode ser celebrado fora de inquéritos civis por iniciativa de qualquer co-legitimado para a defesa do interesse difuso em questão e não depende do referendo ou participação do Parquet (MORAES, 1999, p.70). 101 Outra finalidade do inquérito civil arrolada por Hugo Nigro Mazzilli (2001, p.40-41) é "servir de base para ensejar eventual tomada de compromisso de ajustamento de conduta". 102 Valiosa a lição de José Marcelo Menezes Vigliar (2001, p.137) nesse sentido: "não pode o Ministério Público realizar uma transação efetiva no inquérito civil. A transação implicaria a possibilidade de renúncia de parcela do interesse envolvido, e isso é vedado ao Ministério Público, porque ele não dispõe do conteúdo material desse interesse". Por esta razão, a eficácia do compromisso de ajustamento não impede que qualquer dos co-legitimados proponha ação civil pública versando sobre os mesmos fatos objeto do termo de ajustamento de conduta nem ações individuais no mesmo sentido (MAZZILLI, 1999, 313-317). 103 Neste sentido, a Súmula 4 do Conselho Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo determina que serão homologadas as promoções de arquivamento que atenderem "integralmente à defesa dos interesses difusos objetivados no inquérito civil". 64 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version este é beneficiado com o encerramento imediato do inquérito civil. Ademais, evitam-se os custos de uma demanda (VIGLIAR, 2001, p.138) e é ainda possível manejar um cronograma de custos e providências de acordo com os seus interesses. Da mesma forma, é inquestionável e maior ainda a utilidade do compromisso de ajustamento ao Ministério Público, pois por intermédio dele "se pode, muitas vezes, preservar de imediato os valores objetivados na Lei da Ação Civil Pública, sem necessidade, no mais das vezes, de requerer ou insistir na obtenção de prestação jurisdicional" (MAZZILLI, 1999, p.316), cumprindo com sucesso o princípio da prevenção. A transação deve ser celebrada por instrumento escrito e assinado pelo representante do Ministério Público e o fornecedor, devidamente juntado aos autos do inquérito civil, levando este instrumento o nome de termo de compromisso de ajustamento de conduta ou termo de ajustamento de conduta. Uma vez que a Lei da Ação Civil Pública104 e o Código de Processo Civil105 garantem eficácia de título executivo extrajudicial ao termo, o Parquet deve atentar para a necessidade de que as obrigações nele impostas estejam revestidas dos requisitos de liquidez e certeza, possibilitando o exercício pleno da ação executiva, em caso de inadimplemento106. 104 Art.5°, §6°. Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial. 105 Art.585. São títulos executivos extrajudiciais: [...] II - [...] o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público [...]. 106 Sobre o termo de compromisso de ajustamento de conduta como título executivo extrajudicial, consultar MANCUSO, 2001, p.21. 65 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version A execução de título executivo extrajudicial permanece sob a égide das regras clássicas do Código de Processo Civil para a execução por quantia certa contra devedor solvente, estabelecidas nos arts. 646 e seguintes. Não são aplicáveis as novas disposições trazidas pela Lei n°11.232, de 22 de dezembro de 2005, como deixam claro o art.475-R, ao mencionar que normas distintas "regem o processo de execução de título extrajudicial", referindo-se ao procedimento do Livro II do Código de Processo Civil (THEODORO JÚNIOR, 2006, p.107). A posição do legislador, neste aspecto, necessita ser revista, possibilitando ao promotor de justiça utilizar-se dos benefícios trazidos pelas regras do novo processo de execução judicial por quantia certa, tais como a execução nos próprios autos do processo de conhecimento, mediante simples petição, o acréscimo de multa de 10% pelo inadimplemento do julgado, a expedição imediata de mandado de penhora e avaliação, e a retirada de efeito suspensivo, como regra geral na impugnação do devedor (arts.475 - J, L e M, do Código de Processo Civil). É óbvio que o acordo celebrado pelo Ministério Público não tem natureza de título judicial. Entretanto, também não se pode colocálo na mesma escala de dúvida dos atos negociais privados, que mesmo com força de título executivo demandam uma execução mais demorada, complexa e efeito suspensivo aos embargos do devedor, para evitar constrições injustas a seu patrimônio. Os termos firmados perante a instituição deveriam, por exceção, ser considerados título executivo com força equivalente aos judiciais, levando em consideração que o Parquet é composto de agentes públicos que detêm fé pública e agem em "defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses 66 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version sociais e individuais indisponíveis"107, sob a égide dos princípios da administração pública esculpidos no art.37 da Constituição Federal. Além do mais, a segurança do título é reforçada pelo fato de o representante do Ministério Público responder pessoalmente pelos prejuízos causados, em caso de dolo ou fraude (art.85, do Código de Processo Civil) e ainda poder ser-lhe impostas as “sanções disciplinares da legislação especial, mesmo que não tenha havido prejuízo à parte” (BARBI, 1981, p.385). De acordo com o disposto no art.5°, §6°, da Lei n°7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), deve constar do termo multa cominatória, para assegurar o ajustamento de conduta às exigências legais108. A multa deve ser diária (sistema de astreintes) e não ter caráter meramente compensatório, portanto deve ser fixada em patamar que torne mais conveniente ao fornecedor cumprir o ajuste do que arcar com a penalidade pelo atraso (MAZZILLI, 1999, p.308)109. É conveniente, ainda, a fixação da multa em UFIR ou outro índice legal “que preserve o valor atualizado da moeda” (MORAES, 1999, p.66). Após a celebração do compromisso de ajustamento, o inquérito civil é arquivado pelo Promotor do Consumidor e a promoção de arquivamento deve ser submetida à homologação do Conselho Superior do Ministério Público (art.9°, §3°, da Lei da Ação Civil Pública)110. Trecho extraído do art.127, caput, da Constituição Federal. Se a multa devida não for paga pelo infrator, o Ministério Público poderá cobrá-la, haja vista que sua destinação é o fundo de reparação dos interesses difusos lesados, matéria portanto de interesse de toda a coletividade (MAZZILLI, 2006, p.464). 109 A Súmula 23 do Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo dispõe em sua ementa que "a multa fixada em compromisso de ajustamento não deve ter caráter compensatório, e sim cominatório, pois nas obrigações de fazer ou não fazer normalmente mais interessa o cumprimento da obrigação pelo próprio devedor que o correspondente econômico". 110 Dispõe a Súmula 4 do Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo: "Tendo havido compromisso de ajustamento que atenda integralmente à defesa dos interesses difusos objetivados no inquérito civil, é caso de homologação do arquivamento do inquérito". 107 108 67 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version No entanto, como as medidas de combate à publicidade enganosa são complexas, variadas e de longa execução, convém ao Ministério Público efetuar posteriormente rigorosa fiscalização do cumprimento do termo de compromisso de ajustamento, nos próprios autos do inquérito arquivado ou em autos suplementares, que deverão ser posteriormente apensados aos do inquérito civil após certificação do fiel cumprimento111. 2.7 DO ENCERRAMENTO Encerrada a produção da prova, o inquérito civil atinge sua derradeira etapa, a da conclusão. No caso de cumprimento da recomendação, celebração de compromisso de ajustamento de conduta ou não restando caracterizada a enganosidade da mensagem, ou seja, quando inexistir fundamento para a propositura da ação civil pública, o procedimento será arquivado e a promoção de arquivamento realizada pelo promotor do consumidor deverá ser submetida à homologação do Conselho Superior do Ministério Público. Se discordar da promoção de arquivamento, o Conselho designará outro Promotor para prosseguir nas investigações, se as provas ainda forem insuficientes, ou para propor a ação civil pública (art.9°, §4°, da Lei da Ação Civil Pública). Por outro lado, se a publicidade for identificada como enganosa e o problema não for solucionado no inquérito civil, deve o Ministério Público, como última opção, ingressar judicialmente com ação 111 A medida é confirmada pela Súmula 21 do Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo: "Homologada pelo Conselho Superior a promoção de arquivamento de inquérito civil ou das peças de informação, em decorrência de compromisso de ajustamento, incumbirá ao órgão do Ministério Público que o celebrou, fiscalizar o efetivo cumprimento do compromisso, do que lançará certidão nos autos". Em caso de ajuste preliminar, sem prejuízo da continuidade das investigações, procede-se da 68 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version civil pública para obrigar o fornecedor a cumprir os deveres já sugeridos por ocasião da recomendação e das tratativas de celebração do termo de ajustamento. 2.8 DA PROCESSUALIZAÇÃO DO INQUÉRITO CIVIL É condenável a tendência de processualização da atuação do Ministério Público na área dos interesses difusos, porque o inquérito civil "não pode ser instaurado com o objetivo definido de propor a ação civil pública" (ANTUNES, 2002, p.703), mas sim com o foco de investigar os fatos de forma isenta e, se confirmada a suspeita, pôr fim à publicidade enganosa e neutralizar seus efeitos o mais precocemente possível. Assim, mostra-se mais prático tentar primeiramente solucionar a pendência com orientação jurídica adequada ao fornecedor, recomendando-lhe pormenorizadamente o cumprimento da lei no caso concreto, ou mediante a celebração de um acordo extrajudicial formalizado, o termo de compromisso de ajustamento de conduta, que permite a execução direta em caso de inadimplemento, dispensando a propositura prévia de ação de conhecimento. Restringir a atuação do Ministério Público aos limites das lides judiciais é reduzir sua valiosa atribuição de defensor dos direitos difusos do consumidor à dependência de estruturas judiciárias ineficientes, negligenciando as possibilidades políticas e administrativas de solução negociada que reafirmam os valores democráticos e os interesses sociais que a instituição representa (GOULART, 2001, p.13, 30-31). mesma forma, com homologação pelo Conselho e fiscalização pelo restante do inquérito civil (MAZZILLI, 1999, p.308). 69 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version 3. Da Ação Civil Pública 3.1 DOS FUNDAMENTOS Se as medidas extrajudiciais tomadas pelo Ministério Público não forem suficientes para cessar a publicidade enganosa e reparar os danos por ela causados, não restará alternativa ao promotor do consumidor senão a propositura da ação civil pública, que também dispõe de mecanismos eficazes para o combate à mensagem enganosa e seus efeitos112. Os institutos processuais e de direito material trabalhados pela via da ação civil pública são modernos e arrojados, diferindo dos conceitos tradicionais do ordenamento, constituindo um ramo de princípios próprios e medidas peculiares, reconhecendo a vulnerabilidade do consumidor e visando a atender suas necessidades no mercado113. O desenvolvimento da publicidade na sociedade de consumo pôs em relevo a necessidade de proteção do consumidor das mensagens enganosas, por regras de direito material e processual, que não constituam somente uma mera declaração formal de garantias, mas que sejam efetivas e, uma vez colocadas em prática, sejam capazes de evitar a dispersão dos efeitos da publicidade enganosa e de reparar integralmente os danos causados no mercado de consumo114. 112 A razão de ser da ação civil pública é justamente ser dotada de mecanismos eficientes para proteção dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos (MILARÉ, 2000, p.406). 113 O direito vai se especializando em novos ramos e paulatinamente moldando-se às necessidades sociais, de acordo com a realidade vivida pelas pessoas em sociedade, surgindo novos direitos materiais, assim como as estruturas processuais também se modernizam em busca de uma resposta mais eficaz aos problemas (CAPPELLETTI, 1974, p.568-569). 114 O pragmatismo legal baseia-se numa concepção tridimensional para solução dos problemas jurídicos, com base na tríade "problema, solução jurídica e eficácia". Não basta prever para o problema existente uma solução jurídica, é preciso que a resposta encontrada no ordenamento seja dotada de eficácia concreta em relação ao conflito (PINEDO, 1998, p.184-185). 70 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version O Código de Defesa do Consumidor dispõe de normas de direito material e processual para combate eficaz à publicidade enganosa, pela via judicial coletiva, incluindo como pretensões todos os aspectos já mencionados no teor da recomendação e da proposta de termo de compromisso de ajustamento de conduta já veiculados anteriormente. Na seara substantiva, por meio da ação civil pública é possível ao Ministério Público utilizar-se dos institutos da desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, da inversão do ônus da prova em defesa do consumidor atingido pela publicidade enganosa, assim como devem ser reparados inclusive os danos morais difusos. Já na órbita adjetiva, conta o Parquet com a possibilidade de obter tutela específica por liminar e a execução coletiva para imposição de contrapropaganda (MANCUSO, 1998, p.9; 2004, p.457). A principal qualidade da ação civil pública é permitir que todos os lesados sejam beneficiados com o ajuizamento de uma só pretensão judicial115, "em sensível economia de tempo e dinheiro" (ALMEIDA, 1993, p.156; KLONOFF; BILICH, 2000, p.421). Outro ponto positivo é que a propositura da ação civil pública em relação à publicidade enganosa não induz litispendência em relação a ações individuais movidas pelo consumidor para reaver seu prejuízo (art.104 do Código de Defesa do Consumidor)116 ou obter o cumprimento forçado 115 A "socialização" do processo civil de massa provocada pelo advento da ação civil pública faz com que ela seja considerada um instrumento de "democratização do processo" (MILARÉ, 2000, p.406). 116 De acordo com o dispositivo, "as ações coletivas, previstas nos incisos I e II do parágrafo único do art.81, não induzem litispendência para as ações individuais, [...]". 71 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version da oferta, em nada prejudicando as demandas individuais destes (art.103, §1°)117. Por outro lado, é bastante criticada a posição do legislador, que reformou a redação original do art.16, da Lei da Ação Civil Pública118, na tentativa de restringir os efeitos erga omnes da sentença condenatória aos limites "da competência territorial do órgão prolator". A doutrina nacional entende que o dispositivo é ineficaz (DINAMARCO, 2001, p.169), por confundir regra de competência com limites subjetivos da coisa julgada, não tendo aquela o condão de alterá-los119, o que se fosse possível geraria de forma absurda soluções distintas para uma única situação, beneficiando somente os consumidores domiciliados no foro da ação, quando mais de uma localidade fosse atingida pela divulgação da mesma publicidade enganosa, o que é inaceitável do ponto de vista do princípio constitucional da igualdade (MAZZILLI, 2006, p.497-498). 3.2 DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE DA PESSOA JURÍDICA Segundo o art.28, do Código de Defesa do Consumidor, o juiz pode "desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de 117 A norma mencionada dispõe que "os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe". 118 A lei que reformou a redação original do art.16 da Lei n°7.347/85 foi a Lei n°9.494, de 10 de setembro de 1.997. 119 Neste sentido, Rodolfo de Camargo Mancuso (2004, p.401) preleciona que "a questão de saber quais as pessoas atingidas pela imutabilidade do comando judicial deve ser tratada, naturalmente, sob a rubrica dos limites subjetivos desse instituto processual dito 'coisa julgada' e não sob a óptica de categorias outras, como a jurisdição, a competência, a organização judiciária" 72 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social", dentre outras hipóteses120. A publicidade enganosa permite a aplicação da teoria do disregard of legal entity na ação civil pública, pois configura infração da lei ou ato ilícito. Assim, é atingido não apenas o patrimônio da sociedade, mas também ficam pessoalmente responsáveis pela reparação dos danos os seus diretores responsáveis pela administração ou controle (FRANCO, 1991, p.60). A petição inicial deve incluir no pólo passivo, em litisconsórcio facultativo, a sociedade que patrocinou a publicidade enganosa, a agência publicitária que criou a mensagem, o veículo de mídia que a divulgou121 e diretores que as administram, criando um vínculo de solidariedade entre todos. A ação civil pública pode também ser movida somente em desfavor das sociedades e, posteriormente, caso o patrimônio destas não seja suficiente para arcar com a responsabilidade pela publicidade enganosa, ser movida outra em face das pessoas físicas dirigentes, porque o §5° do art.28 do Código de Defesa do Consumidor permite ainda a aplicação do disregard quando a personalidade da pessoa jurídica "for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores". 120 A desconsideração da personalidade da pessoa jurídica para alcance dos bens dos sócios não é inédita na legislação pátria, já havendo previsão específica desde a Lei de Sociedades Anônimas de 1940 (correspondente ao atual art.151 da Lei n°6.404/76), também presente no Código Tributário Nacional (art.135), do ano de 1966 (DENARI, 1998, p.192-193). 121 Por razões de conveniência e celeridade processual, como o litisconsórcio é facultativo o Ministério Público pode ainda preferir deixar de fora do pólo passivo da ação o veículo de mídia e seus diretores, para que a discussão da responsabilidade subjetiva não se misture à dos demais réus, que respondem objetivamente pela publicidade enganosa. Vide primeira parte, item 1.4. 73 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version A desconsideração da personalidade da pessoa jurídica pode servir também para trazer à responsabilidade outras sociedades ligadas de alguma forma àquela responsável pela publicidade enganosa. As sociedades controladas e as integrantes do mesmo grupo respondem subsidiariamente; as consorciadas, solidariamente; e as coligadas, em caso de culpa (§§2° a 4°). A extensão da responsabilidade civil aos sócios e outras pessoas jurídicas que fazem parte da mesma cadeia de fornecimento é medida adequada para a publicidade enganosa, pois normalmente é de grande dimensão o prejuízo por ela causado e insuficiente o patrimônio da sociedade que a patrocina (MARQUES, 2006, p.1245-1246). 3.3 DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA A distribuição equânime do ônus da prova no processo civil (art.333, do Código de Processo Civil) sofre uma exceção nas ações de consumo que tenham como tema a enganosidade de uma mensagem publicitária, cabendo exclusivamente ao fornecedor demonstrar a veracidade da informação, pois dispõe o art.38, do Código de Defesa do Consumidor que "o ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina"122. Cuida-se de uma inversão automática e obrigatória para o juiz, já que imposta ope legis e que não se confunde com as demais hipóteses de inversão do ônus da prova disciplinadas no art.6°, VIII, do Código de Defesa do Consumidor123, que devem ser aprovadas pelo 122 Cândido Rangel Dinamarco (2005, p.302) vislumbra na inversão do ônus da prova em favor do consumidor uma sensibilidade do legislador ao "clamor social pela realização daquilo que compete aos juízes", cumprindo com eficiência e segurança o objetivo da instrumentalidade do processo. 123 De acordo com o art.6°, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, é direito básico do consumidor "a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no 74 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version magistrado em cada caso concreto, se presentes os requisitos autorizadores (BENJAMIN, 1998, p.292-293). Logo, é dispensável que conste da petição inicial pedido expresso por parte do Ministério Público de inversão do ônus da prova na ação civil pública que aponta a enganosidade da publicidade, porque a medida é "independente da vontade do juiz de direito" (SILVA, 2002, p.137). 3.4 DOS DANOS MORAIS DIFUSOS A publicidade enganosa não somente produz danos patrimoniais em relação aos que adquirem produto ou serviço sob influência dos artifícios ilusórios da mensagem, assim como abala de maneira generalizada a eqüidade e a boa-fé no mercado de consumo, aspectos morais difusos que a atuação do Ministério Público também objetiva defender e que merecem plena reparação (MARQUES, 2006, p.1108). O art.6°, VI, do Código de Defesa do Consumidor arrola como direito básico do consumidor a efetiva reparação dos danos morais difusos, sendo "cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato", nos termos da Súmula 37, do Superior Tribunal de Justiça (MAZZILLI, 2006, p.140). É possível, portanto, ao Ministério Público cumular na ação civil pública pedido de indenização pelos danos morais difusos provocados pela publicidade enganosa124, podendo o pedido ser de quantia determinada ou genérico processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência". 124 Aliás, como bem anotado por Rodolfo de Camargo Mancuso (1998, p.22), citando um exemplo de o publicidade abusiva, o art.1 da Lei n°7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) permite que a ação civil pública responsabilize o autor do dano tanto na esfera patrimonial como na moral. No mesmo sentido é a Súmula n° 3 do Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo que esclarece que "o Ministério Público tem legitimidade para ajuizar ação civil pública visando à contrapropaganda e a responsabilidade por danos morais difusos". 75 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version (neste último caso, a execução deverá ser precedida de liquidação a ser proposta pelo Ministério Público). 3.5 DA TUTELA ESPECÍFICA Como a ação civil pública que combate a publicidade enganosa envolve, além de pretensão de quantia certa, pedidos de fazer (retirada imediata da mensagem de veiculação, divulgação de mensagem em sentido contrário para orientação dos consumidores - recall125 e contrapropaganda) e não fazer (cessação da mensagem), o juiz pode conceder a tutela específica da obrigação, determinando providências que assegurem o resultado prático objetivado pela ação promovida pelo Ministério Público. A tutela específica ajusta-se perfeitamente às necessidades da defesa coletiva do consumidor face à publicidade enganosa porque age preventivamente, retirando a publicidade de veiculação e determinando providências práticas para a recomposição de boa parte dos danos. Conforme sustenta Alberto do Amaral Júnior (1993, p.240), "a possibilidade de execução específica da obrigação nos termos da oferta, apresentação ou publicidade, anteriormente desconhecida no direito brasileiro, é algo que melhor se adapta à natureza das relações de consumo, evitando a realização de ofertas enganosas com o fim de ludibriar os consumidores". Kazuo Watanabe (1998, p.654) assinala que "o juiz deverá determinar todas as providências e medidas legais e adequadas a seu alcance, inclusive, se necessário, a modificação do mundo fático, por ato 125 Trata-se de uma campanha publicitária de convocação ou chamamento de consumidores para troca, devolução, reparo ou retirada do mercado de produto ou mercadoria defeituosa ou, no caso da publicidade enganosa, que não corresponde aos anseios legítimos dos adquirentes (SILVA, 2002, p.55-56). 76 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version próprio e de seus auxiliares, para conformá-lo ao comando emergente da sentença", até mesmo com o uso de força policial, se preciso for, para impedimento da publicidade enganosa. Para atingir o resultado prático equivalente aos deveres de fazer e não-fazer estabelecido na condenação relativa à publicidade enganosa, o juiz pode determinar as medidas que lhe parecerem mais práticas para cumprimento do objetivo, independentemente de requerimento específico do promotor do consumidor, porque a atividade está de acordo com os pedidos de obrigação de fazer e não-fazer formulados anteriormente na inicial, respeitando-se desta forma o disposto nos arts.128 e 460, do Código de Processo Civil (DINAMARCO, 2001, p.302). A ampla gama de medidas que o promotor de justiça pode sugerir e o juiz determinar encontra limites apenas na Constituição Federal e nas vedações legais. A título de exemplo, não é possível decretar a prisão civil do patrocinador da publicidade enganosa, porque o instituto só é permitido nos casos expressos previstos no art.5°, LVII, da Constituição Federal. Por outro lado, são permitidos a busca e apreensão, a remoção de coisas e pessoas, o desfazimento de obra, o impedimento da atividade, além de requisição de força policial, sendo o rol do art.84, §5° meramente exemplificativo (SILVA, 2002, p.198). Como aos interesses difusos do consumidor lesados pela mensagem ardilosa a tutela específica reveste-se de utilidade não alcançada pela conversão da obrigação em perdas e danos126, esta só 126 Neste sentido, preleciona Rodolfo de Camargo Mancuso (2003, p.128): "Por assim dizer, o processo veio vindo para o proscênio do palco jurídico, sob a diretriz da instrumentalidade, dentre nós tão bem versada por Cândido Rangel Dinamarco, que potencializou o ideal chiovendiano de que o processo deve dar, a quem tenha um direito, precisamente aquilo a que faz jus (e não um sucedâneo)". 77 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version ocorrerá quando se tornar "impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente" (art.84, §1°, do Código de Processo Civil)127. O instrumento de que se vale a Justiça para a obtenção da tutela específica, quando esta depender de ato ou abstenção do réu, é a multa diária cominatória (astreintes)128, que deve ser fixada em patamar "suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-se prazo razoável para o cumprimento do preceito" (art.84, §4°). A penalidade pecuniária fixada deve ser mais alta que a simples conversão em perdas e danos, justamente para forçar o adimplemento, mas não tão onerosa que inviabilize a sobrevivência do devedor, pois do contrário perderia seu caráter coercitivo (MANCUSO, 2004, p.359). Para tanto, a multa poderá ser modificada caso se apresente insuficiente ou excessiva (art.461, §6°, do Código de Processo Civil)129. Não descurando do caráter preventivo que fundamenta a defesa dos interesses metaindividuais também no âmbito judicial130, o Código de Defesa do Consumidor prevê ainda a possibilidade de concessão da tutela específica pela via liminar, "sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final" (art.84, §3°, do Código de Defesa do Consumidor). Neste caso, a tutela antecipada pode ser concedida de plano (inaudita altera parte) ou após justificação prévia, citado o réu, quando o magistrado julgar necessárias mais provas para caracterização do fumus 127 Conferir, no mesmo sentido, MANCUSO, 1998, p.15. Hugo Nigro Mazzilli (2006, p.463) conceitua astreinte como "palavra francesa que significa penalidade especial infligida ao devedor de uma obrigação, com o propósito de incitá-lo ao seu cumprimento espontâneo, e cujo montante se eleva proporcional ou progressivamente em razão do atraso no cumprimento da obrigação". 129 De acordo com o dispositivo, que se reporta a ações de qualquer natureza que tenham por objeto obrigação de fazer ou não fazer, "o juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva". No mesmo sentido, conferir MAZZILLI, 2006, p.463. 130 Neste sentido, posiciona-se Pedro da Silva Dinamarco (2001, p.303), para quem "a tutela específica das obrigações de fazer e não-fazer deve, preferencialmente, ser feita de forma preventiva (mediante concessão de medidas de urgência), por ser mais efetiva". 128 78 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version boni juris e do periculum in mora131. Contudo, a multa diária cominatória fixada liminarmente para o caso de descumprimento da tutela específica só poderá ser cobrada após o trânsito em julgado da futura sentença condenatória, nos termos do art.12, §2°, da Lei da Ação Civil Pública132. 3.6 DA EXECUÇÃO Se a ação civil pública for julgada procedente e o comando da sentença não for cumprido voluntariamente pelo sucumbente, o Ministério Público deverá promover a execução do julgado. A execução por quantia certa contra devedor solvente, no entanto, sofreu modificações com o advento da Lei 11.232, de 22 de dezembro de 2005, que entrou em vigor 6 meses após a sua publicação, modificando e revogando vários artigos do Livro II do Código de Processo Civil, transformando a sistemática da execução civil no Brasil, gerando reflexos também nas ações civis públicas. Não houve modificação em relação à execução da obrigação de fazer ou não-fazer determinada na sentença relativa à publicidade enganosa, que será feita nos moldes da tutela específica tratada no item anterior, nos termos dos arts. 11 da Lei n°7.347/85133, 84 do Código de Por conta dos efeitos erga omnes da demanda, Rodolfo de Camargo Mancuso (2004, p.126-127) recomenda cautela na concessão da antecipação dos efeitos da tutela, embora mencionando ser a tutela preventiva mais necessária nas ações que tenham por objeto obrigação de fazer e não fazer, como é a hipótese da que objetiva cessar os efeitos da publicidade enganosa. 132 A norma citada determina que "a multa cominada liminarmente só será exigível do réu após o trânsito em julgado da decisão favorável ao autor, mas será devida desde o dia em que se houver configurado o descumprimento". Se a liminar for descumprida pelo réu, mas a ação ao final for julgada improcedente, a multa não será devida, afinal "não haveria razão para a lei prever expressamente que ela seria exigível apenas após o trânsito em julgado. Se a multa continuasse sendo devida mesmo com a improcedência da demanda, o legislador logicamente teria permitido sua execução no curso do processo de conhecimento" (DINAMARCO, 2001, p.306-307). 133 O art.11 da Lei da Ação Civil Pública estabelece que "na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente de requerimento do autor". A efetivação da tutela específica pode ser feita em sede de liminar, para hipóteses urgentes (art.84, §3º do Código de Defesa do Consumidor), ou após o trânsito em julgado, mas dentro dos mesmos autos 131 79 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Defesa do Consumidor134 e 461 do Código de Processo Civil135. Em se tratando de execução da multa cominatória, no entanto, serão aplicados os novos dispositivos do cumprimento da sentença previstos nas letras do art.475 do referido diploma legal136. A execução por quantia certa contra devedor solvente não é mais realizada em processo autônomo posterior ao de conhecimento (actio iudicati). Passa a ser mais uma fase dentro do mesmo processo, um incidente processual que ocorre nos mesmos autos (executio per officium iudicis), se passados 15 dias o credor informar que o devedor não cumpriu a condenação, acrescentando-se ao montante total devido pena de dez por cento137 (art.475-J do Código de Processo Civil). Além de ficar mais prática a execução nos próprios autos, como decorrência natural de concretização da decisão138, outros dispositivos introduzidos pela Lei n°11.232/05 também colaboram para a efetividade da sentença, como é o caso da expedição imediata de mandado de penhora e avaliação, antecipando-se assim a fraudes à da ação civil pública, pois atualmente “os processos de conhecimento e de execução não podem ser considerados em compartimentos estanques” (WATANABE, 2005, p.55). 134 O caput do art.84 do Código de Defesa do Consumidor em linhas gerais repete o teor do art.11 da Lei da Ação Civil Pública, porém na parte final explicita o que é a tutela específica, ao mencionar que o juiz "determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento". Quanto aos parágrafos, vide comentários do item 3.5 - Da tutela específica. 135 A atual redação do art.461 do Código de Processo Civil foi introduzida pela Lei n°8.952, de 13 de dezembro de 1994, estendendo a qualquer tipo de ação civil que envolva obrigação de fazer e não fazer os dispositivos até então restritos às ações civis públicas regidas pelo Código de Defesa do Consumidor e pela Lei da Ação Civil Pública, sem alterações para o objeto deste trabalho. Sobre a precedência do Código de Defesa do Consumidor na matéria, conferir THEODORO JÚNIOR, 2006, p.119. 136 É o que estabelece o art.475 - I do Código de Processo Civil: "O cumprimento da sentença far-se-á conforme os arts.461 e 461-A desta Lei ou, tratando-se de obrigação por quantia certa, por execução, nos termos dos demais artigos deste capítulo". 137 Essa multa funciona como sanção e tem por objetivo evitar que o devedor procrastine a execução (THEODORO JÚNIOR, 2006, p.144). 138 Neste sentido é a lição de Humberto Theodoro Júnior (2006, p.119): "Não havia, mais, em nossos tempos, razão para manter a dualidade de ações concebida pelo direito romano, na quadra da ordo iudiciorum privatorum. Muito mais consentânea com os desígnios de efetividade e justiça do direito processual contemporâneo é, sem dúvida, a técnica medieval aplicável ao cumprimento das condenações e que consiste na apelidada executio per officium iudicis". 80 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version execução139. Também merece menção a substituição dos embargos do devedor, com efeito suspensivo, pela impugnação, normalmente sem efeito suspensivo140. Não é possível execução provisória da multa diária cominatória (astreintes), porque esta só é exigível após o trânsito em julgado da sentença condenatória, conforme o disposto no art.12, §2°, da Lei da Ação Civil Pública, tema mencionado ao final do item anterior. O valor da multa executada será revertido ao fundo de reparação dos interesses difusos lesados. O art.13 prevê a existência de um fundo federal e a possibilidade de serem criados também fundos estaduais, em decorrência do sistema federativo da República brasileira. No Estado de São Paulo, a Lei Estadual n°6.536/89 criou o fundo estadual de reparação de interesses difusos lesados (MAZZILLI, 2006, p.468-469). Os recursos arrecadados para o fundo em virtude de multas aplicadas em ações civis públicas poderão ser utilizados, a critério do conselho gestor, para custear a realização das obrigações de fazer estabelecidas na sentença (art.13)141, dentre elas a contrapropaganda. A contrapropaganda é realizada às expensas do fornecedor, quando incorrer em publicidade enganosa ou abusiva, impõe o art.60 do Código de Defesa do Consumidor, tratando-se de, no dizer de Márcio De acordo com a redação do art.475-J, caput, do Código de Processo Civil, "caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art.614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação". Para garantir o sucesso no cumprimento do mandado, o §3° do mesmo artigo permite ainda ao exeqüente "indicar desde logo os bens a serem penhorados". 140 O art.475-M fixa como regra geral que a impugnação "não terá efeito suspensivo" e seu §2° prevê, para desformalização e celeridade, que será instruída e decidida "nos próprios autos" em caso de excepcional efeito suspensivo. 141 O art.13 da Lei n°7.347/85 estabelece que "havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados". Rodolfo de Camargo Mancuso (2004, p.368) 139 81 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Mello Casado (1999, p.72), “a melhor forma de sanar os malefícios causados pela publicidade patológica, pois o seu caráter explicativo e a mensagem corretiva que encerrará atingirão de forma efetiva os consumidores que foram ludibriados ou ofendidos”. O parágrafo único da mesma norma estabelece que "a contrapropaganda será divulgada pelo responsável da mesma forma, freqüência e dimensão e, preferencialmente no mesmo veículo, local, espaço e horário, de forma capaz de desfazer o malefício da publicidade [...]". Walter Ceneviva (1991, p.132 e 135) defende que a contrapropaganda "na relação de consumo, corresponde ao oposto da divulgação publicitária, pois destinada a desfazer efeitos perniciosos detectados e apenados na forma do Código de Defesa do Consumidor. [...] Como regra, a exegese da contrapropaganda leva sempre em conta a superioridade do interesse público em que a publicidade não incida nos defeitos da enganosidade ou da abusividade". Em complemento, a Súmula 3, do Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo esclarece que "o Ministério Público tem legitimidade para ajuizar ação civil pública visando à contrapropaganda e a responsabilidade por danos morais difusos". A imposição de contrapropaganda é uma medida, embora complexa, inovadora na repressão da publicidade enganosa e deveria ser mais requerida pelos promotores de justiça e imposta com freqüência pelo Poder Judiciário, na defesa dos interesses difusos do consumidor, pois infelizmente na prática é raramente empregada, tanto no Brasil como em outros países (WIEVIORKA, 1976, p.91). esclarece que "sendo metaindividual o interesse em lide, o montante das sanções pecuniárias não reverterá ao autor, mas ao Fundo de que trata o art.13 desta Lei". 82 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Vale lembrar que a execução da multa não necessita ser precedida de incidente de liquidação, porque a definição do valor pode ser realizado mediante simples cálculo aritmético de soma e atualização monetária dos dias de atraso ou descumprimento da sentença, devendo o pedido de execução ser acompanhado de memória discriminada (MAZZILLI, 2006, p.478)142. A grande vantagem das novas regras de execução de sentença, todavia, não diz respeito à execução da multa diária, mas sim à tutela específica. É que atualmente não há necessidade de a decisão executada ter cunho condenatório. O título executivo judicial que baseia o pedido executório pode ser qualquer sentença "proferida no processo civil que reconheça a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia" (art.475-N, inciso I, do Código de Processo Civil), até mesmo uma sentença que meramente declaratória que reconheça a publicidade enganosa. A previsão será bastante útil quando os pedidos de conhecimento forem formulados de forma genérica ou estiverem incompletos para a plena reparação dos prejuízos causados pela mensagem, permitindo ainda assim ao Ministério Público executar a tutela específica da mesma forma, podendo o juiz determinar todas as medidas necessárias e já mencionadas no início do item anterior, inclusive a obrigação de ressarcir os consumidores individualmente lesados, mediante recall que garanta as opções de desfazimento do negócio com devolução das quantias, abatimento do preço, troca do produto ou refazimento do serviço às custas do fornecedor, mais O autor baseia-se no caput do art.475-B do Código de Processo Civil, que dispõe: "Quando a determinação do valor da condenação depender apenas de cálculo aritmético, o credor requererá o cumprimento da sentença, na forma do art.475-J desta Lei, instruindo o pedido com a memória discriminada e atualizada do cálculo". 142 83 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version indenização por eventuais perdas e danos (art.35 do Código de Defesa do Consumidor)143. A execução dos danos individuais pode ser realizada, por sua vez, individualmente pela vítima ou seus sucessores (art.97, do Código de Defesa do Consumidor) ou de forma coletiva, mediante iniciativa de um grupo de consumidores interessados, em legitimação ordinária, ou pela promotoria do consumidor (art.98), por substituição processual (legitimação extraordinária), quando for socialmente relevante a relação de consumo ou ocorrer excepcional dispersão de lesados, que configure o interesse público que legitima a atuação do Parquet144. Como o art. 98, do Código de Defesa do Consumidor estabelece ainda que a execução da sentença que reconhece a existência da publicidade enganosa e a obrigação de fazer ou não fazer pode ser movida por qualquer dos co-legitimados para a propositura da ação civil pública, nada impede que o Ministério Público promova referida execução em ação civil pública que não foi por ele proposta, em 143 O art.35 do Código de Defesa do Consumidor prevê que "se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha: I - exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade; II - aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente; III - rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos". Consultar mais comentários sobre a norma no item 1.4 da PRIMEIRA PARTE. 144 É o que dispõe a Súmula 7 do Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo, interpretando o art.98 do Código de Defesa do Consumidor à luz do perfil constitucional da instituição: "O Ministério Público está legitimado à defesa de interesses ou direitos individuais homogêneos que tenham expressão para a coletividade, tais como: a) os que digam respeito a direitos ou garantias constitucionais, bem como aqueles cujo bem jurídico a ser protegido seja relevante para a sociedade (v.g., dignidade da pessoa humana, saúde e segurança das pessoas, acesso das crianças e adolescentes à educação); b) nos casos de grande dispersão dos lesados (v.g., dano de massa); c) quando a sua defesa pelo Ministério Público convenha à coletividade, por assegurar a implementação efetiva e o pleno funcionamento da ordem jurídica, nas suas perspectivas econômica, social e tributária". A súmula é ainda apoiada pela doutrina, como atesta Rodolfo de Camargo Mancuso (2004, p.155-156), que traz a baila esteio constitucional à legitimidade do Ministério Público para a defesa extraordinária de interesses individuais homogêneos ou indisponíveis: "[...] sua tutela pelo Parquet é favorecida pelo art.129, IX, da Constituição Federal, que libera a instituição para o exercício de 'outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade' [grifo do autor]" (2004, p.165). 84 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version caso de inércia do titular. Para explicitar tal faculdade em todas as áreas de interesse difuso, o Código de Defesa do Consumidor ainda acrescentou à Lei da Ação Civil Pública o art.15, que estabelece: "Decorridos 60 (sessenta) dias do trânsito em julgado da sentença condenatória, sem que a associação autora lhe promova a execução, deverá fazê-lo o Ministério Público, facultada igual iniciativa aos demais legitimados". Quando o título executivo condenar o réu à concomitante reparação de danos individuais e interesses difusos, aqueles terão preferência sobre estes na execução. Primeiro busca-se o ressarcimento das vítimas da publicidade que forem identificadas e só depois se parte para a cobrança da multa devida ao fundo dos interesses difusos lesados, salvo se o responsável pela publicidade for empresa com patrimônio suficiente para suportar simultaneamente as duas espécies de execução. É o que determina o art. 99, do Código de Defesa do Consumidor145 e confirma a doutrina (MANCUSO, 1998, p.161 e MAZZILLI, 2006, p.490-491). Quanto à prescrição, a Súmula 150 do STF determina que "prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação". A ação é condenatória a obrigação de fazer, não fazer e também de ressarcimento de danos. Observa-se que o dever de ressarcimento estabelecido no art. 35, do Código de Defesa do Consumidor é derivado do princípio da vinculação da oferta, não se confundindo com as hipóteses de prescrição dos arts. 26 e 27 da mesma lei, que dizem 145 De acordo com o artigo, "em caso de concurso de créditos decorrentes de condenação prevista na Lei n°7.347, de 24 de julho de 1985, e de indenizações pelos prejuízos individuais resultantes do mesmo evento danoso, estas terão preferência no pagamento". Prossegue o parágrafo único: "Para efeito do disposto neste artigo, a destinação da importância recolhida ao Fundo criado pela Lei n°7.347, de 24 de julho de 1985, ficará sustada enquanto pendentes de decisão de segundo grau as 85 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version respeito à responsabilidade civil pelo fato ou pelo vício do produto ou serviço. Como a prescrição da reparação de danos e igualmente da obrigação de fazer e não fazer não são encontradas na lei especial, é preciso utilizar os prazos de prescrição do Código Civil, que prevê prazo de 3 anos para a reparação civil (art. 206, §3°, IV) e de 10 anos para os demais deveres de fazer e não fazer estabelecidos no título executivo, à falta de prazo específico (art. 205). Na execução por quantia certa, como agora não há prévia citação do executado, a interrupção da prescrição agora ocorrerá na data da intimação da penhora ao devedor, retroagindo até o dia da apresentação do pedido de execução nos autos (art. 219, §1°, do Código de Processo Civil). A questão, entretanto, deve ser encarada como mero dado teórico pelo Ministério Público, eis que se espera dele a propositura o quanto mais rápido possível da execução, em caso de inadimplemento do fornecedor responsável pela publicidade enganosa, para que se evite assim a propagação dos danos ao interesse difuso. 3.7 DA TRANSAÇÃO JUDICIAL É possível, durante a tramitação da ação civil pública, que o Ministério Público e o responsável pela publicidade enganosa realizem transação no processo, colocando fim à lide. O acordo deverá ser homologado pelo juiz de direito que preside a causa e acarretará a extinção do processo com resolução do mérito (art.269, III, do Código de Processo Civil). Ao contrário do termo de ajustamento de conduta, não é preciso obter homologação do Conselho Superior do Ministério Público ações de indenização pelos danos individuais, salvo na hipótese de o patrimônio do devedor ser manifestamente suficiente para responder pela integralidade das dívidas". 86 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version para a transação judicial ter validade, pois a fiscalização do interesse público no caso já é realizada pelo Poder Judiciário146. Entretanto, é recomendável ao promotor de justiça do consumidor, com a concordância da outra parte, requerer a suspensão do processo e consultar previamente o órgão da administração superior da instituição, para que lhe sejam conferidos mais subsídios no momento de firmar o acordo (MANCUSO, 2004, p.319-321; MAZZILLI, 2006, p.377). Assim como na formulação do termo de ajustamento de conduta (segunda parte, item 2.6), o promotor de justiça deve zelar para que não se deixe de exercer todos os direitos relativos ao interesse difuso dos consumidores diante da publicidade enganosa, abarcando o acordo todos os aspectos a serem reparados, mediante obrigações de fazer, não fazer e ressarcimento de perdas e danos em todos os âmbitos (individual e difuso). A transação judicial homologada constitui título executivo judicial, nos termos do art.475-N, inciso III, do Código de Processo Civil, devendo a execução das obrigações de fazer e não fazer ser feita nos termos da tutela específica, enquanto a de quantia certa contra devedor solvente tramita de acordo com as novas regras introduzidas no Código de Processo Civil pela Lei n°11.232, de 22 de dezembro de 2005 (art.475-I), que entrou em vigor 6 meses após a publicação, de acordo com seu art.8°. A celebração de acordo entre o Ministério Público e o réu e a coisa julgada material formada no processo não impedem que terceiros co-legitimados movam ação civil pública com o mesmo objeto e nem 146 Neste sentido, preleciona a Súmula n°25 do Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo: "Não há intervenção do Conselho Superior do Ministério Público quando a transação for promovida pelo Promotor de Justiça no curso de ação civil pública ou coletiva". 87 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version tampouco ações individuais conexas, já que a legitimação para aquela é extraordinária e o Parquet não é o detentor do interesse em discussão (MAZZILLI, 2006, p.375-376). 88 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version CONCLUSÃO 89 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version A publicidade enganosa pode lesar vasto contingente disperso e anônimo de consumidores, desinformando e gerando danos das mais variadas ordens por toda a sociedade. A matéria é de interesse difuso e concerne às atribuições do Ministério Público, conforme os mandamentos da Carta Magna e as normas do Código de Defesa do Consumidor. O Ministério Público deve zelar pela proteção integral dos interesses difusos do consumidor, lançando mão de todo o arsenal de mecanismos que a legislação lhe proporciona. A atuação do Parquet dá-se na qualidade de titular da persecução penal e, no cível, como custos legis (fiscal da lei) ou autor (mediante legitimação extraordinária). Apesar de o Ministério Público ser o principal defensor metaindividual do consumidor perante as mensagens enganosas, a sua atuação pode ser aprimorada. Nos processos penais, as multas podem ter escopo inibitório e as propostas de transação penal para aplicação imediata de sanções alternativas devem ser formuladas sempre em moldes específicos, que vislumbrem a reparação dos danos aos consumidores causados pela publicidade enganosa e a imposição de contrapropaganda. Ao mesmo tempo, a responsabilização penal da pessoa jurídica por publicidade enganosa, como sugestão de reforma da legislação, aprimoraria a proteção jurídica integral do consumidor que almeja a Lei n°8.078/90, com imposição de sanções adequadas à natureza do problema e possibilitando a propositura da execução delicto. ex 90 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version Ao lado das medidas penais, cabe ao Ministério Público agir rapidamente na esfera cível e buscar o sancionamento da publicidade enganosa desde a fase extrajudicial, com o fito de prevenir os efeitos maléficos da mensagem e evitar o quanto possível a propositura precipitada da ação civil pública. Para aperfeiçoamento relativos ao inquérito civil, dos mecanismos de lege ferenda, sugere-se extrajudiciais a transformação do termo de compromisso de ajustamento de conduta em título executivo com força análoga ao judicial. Entretanto, se necessária a ação civil pública, o Código de Defesa do Consumidor dispõe de regras próprias que proporcionam a solução integral dos problemas gerados pela publicidade enganosa, que foram ainda mais dinamizadas pela reforma da sistemática de execução do Código de Processo Civil (Lei 11.232/05). A efetivação dos direitos difusos e individuais do consumidor, porém, depende da concentração de esforços do Ministério Público na fase de execução da ação civil pública. Além disso, a instituição deve pugnar pela implantação habitual e adequada da contrapropaganda nas decisões judiciais. 91 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version AUTORES CONSULTADOS ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. São Paulo: Saraiva, 1993. ALMEIDA, Joaquim Canuto Mendes de. Processo penal, ação e jurisdição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1975. AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Proteção do consumidor no contrato de compra e venda. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. ANDRIGHI, Fátima Nancy; BENETI, Sidnei Agostinho. Juizados especiais cíveis e criminais: comentários à lei 9099/95. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. ANTUNES, Paulo de Bessa. O inquérito civil (considerações críticas). In: MILARÉ, Édis. 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If you want to remove this line, please purchase the full version UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE José Luiz Bednarski DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO COMBATE À PUBLICIDADE ENGANOSA São Paulo 2006 100 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version JOSÉ LUIZ BEDNARSKI DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO COMBATE À PUBLICIDADE ENGANOSA Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Político e Econômico BANCA EXAMINADORA ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Nelson Mannrich Universidade Presbiteriana Mackenzie ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Gilberto Bercovici Universidade Presbiteriana Mackenzie ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Antonio Martin Universidade de São Paulo 101 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version RESUMO A presente dissertação de mestrado baseou-se na experiência profissional do autor como promotor de justiça do consumidor. A publicidade enganosa afeta interesses difusos do consumidor que é atribuição do Ministério Público defender. A eficácia das normas de proteção integral do consumidor frente à publicidade enganosa depende fundamentalmente da boa atuação dos representantes da instituição, procedendo com rapidez, privilegiando, enquanto possível, a prevenção e agindo simultaneamente nas áreas criminal e cível, seja na esfera judicial ou extrajudicial. O objetivo deste trabalho, à luz dos ensinamentos doutrinários nacionais e estrangeiros, é analisar a natureza jurídica da publicidade enganosa, sua ligação com o perfil institucional do Ministério Público, as formas como este deve exercer suas atribuições no combate àquela e apresentar fundamentadamente sugestões de aprimoramento para esta atividade. Palavras-chave: Publicidade Enganosa. Ministério Público. Mecanismos de Atuação 102 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version RESUMÉ La dissertation suivante de maîtrise a été le fruit de l´expérience professionnelle de l´auteur en tant qu ´avocat général du consommateur. La défense du consommateur face à la publicité mensongère est une des attributions du Ministère Public. L´efficacité des normes de protection intégrale du consommateur face à la publicité mensongère dépend principalement du bon travail des réprésentants de cette institution. Ils doivent agir rapidemment,en privilégiant autant que faire se peut la prévention et doivent travailler à la fois au niveau criminel et civil c´est à dire judiciaire et extra-judiciaire. L´objectif de ce travail,à la lumière des travaux nationaux et étrangers, est d´analiser la nature juridique de la publicité mensongère, sa relation avec le profil du Ministère Public, et la façon dont dernier doit exercer ses attributions dans le combat à ce fléau. Ce travail présentera également des suggestions d´amélioration de cette activité. Mots-clés : Publicité mensongère. Ministère Public. Mécanismes de mise en place. 103 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version IDENTIFICAÇÃO DO ALUNO José Luiz Bednarski Código da Matrícula: 7045510-4 Curso : Mestrado em Direito Político e Econômico 104 PDF Creator: PDF4U Pro DEMO Version. If you want to remove this line, please purchase the full version