Epistemologia da Física e
Física da Epistemologia
Osame Kinouchi
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Ribeirão Preto
USP
Preâmbulo
“Física da Epistemologia” = absurdo
Objetivos do colóquio
Descrever alguns temas controversos discutidos pelos
filósofos da ciência Popper, Kuhn e Feyrabend.
Argumentar que conceitos teóricos introduzidos
recentemente em Física e outras ciências podem ser
úteis no entendimento do que tais filósofos tentaram
expressar, evitando algumas críticas e mal-entendidos
muito comuns.
Sobre ciência e filosofia
Natural scientists believe that they free themselves from
philosophy by ignoring it or abusing it...[but] they cannot
make any headway without thought...[and] hence they are
no less in bondage to philosophy, but unfortunately in most
cases to the worst philosophy. — Friedrich Engels,
Dialectics of Nature (1883).
There is no such thing as philosophy-free science; there is
only science whose philosophical baggage is taken on
board without examination. — Daniel Dennett, Darwin's
Dangerous Idea (1995).
Valem as afirmações simétricas?
Philosophers believe that they free themselves from science
by ignoring it or abusing it...[but] they cannot make any
headway without thought...[and] hence they are no less in
bondage to science, but unfortunately in most cases to the
worst science.
There is no such thing as science-free philosophy; there is
only philosophy whose scientific baggage is taken on board
without examination.
Talvez, na medida em que idéias científicas se difundem e
permeiam nossa linguagem, cultura e repertório conceitual.
Ou seja, filosofia não é estanque em
relação à ciência e vice-versa
Tempo
Phs
PhDs
Breve “História” da Filosofia da Ciência
Empirismo
Racionalismo
Positivismo
Instrumentalismo
Pragmatismo
Neopositivismo
Coerentismo
Falseacionismo (Popper) e epistemologia evolucionária
Teoria crítica (escola de Frankfurt)
Paradigmas Kuhnianos, Anarquismo metodológico (Feyrabend) e o
debate com Popper
Estudos pós-Kuhnianos
Sociologia da Ciência e Construtivismo Social
Pós-positivismo
Roteiro
O debate Popper-Kuhn sobre racionalidade científica.
Insights a partir dos conceitos de:
Relevos rugosos
Machine learning
O debate sobre a natureza das revoluções científicas.
Modelos de dinâmica de avalanches
O debate sobre ciência normal-ciência revolucionária
(Kuhn) versus pluralismo teórico (Feyrabend).
Algoritmos genéticos
O debate Reducionismo versus Holismo.
Sistemas dinâmicos não lineares.
Grupo de Renormalização e classes de Universalidade.
O Falsificacionismo de Popper:
“Conjecturas e Refutações”
Dados empíricos não confirmam teorias mas
podem eliminá-las: “Um cisne negro elimina a
teoria de que todos os cisnes são brancos”.
Cientistas fazem (“livremente”) conjecturas T.
Deduz-se consequências lógicas (predições P) de
T.
Compara-se P com experimentos E.
Refuta-se conjecturas quando E não está de acordo
com P.
Fraquezas do falsificacionismo ingênuo
Dados podem estar errados (“O cisne negro não era um
cisne”)
Teorias eliminadas rapidamente sem ter tempo de
maturação. “Toda teoria nova nasce refutada”.
Relevância e natureza dos resultados de experimentos
dependem das teorias que estão sendo testadas.
Constitui uma lógica da justificação mas não descreve o
desenvolvimento real, histórico, da evolução das teorias
científicas, onde fatores psicológicos, sociológicos,
econômicos e culturais são importantes.
Corresponde a um algorítmo genético (epistemologia
evolucionária) que só conserva o indivíduo com maior
fitness = não funciona, fica preso em mínimos locais.
Epistemologia normativa versus
descritiva: Funções custo (“energia”)
Aspecto Normativo:
Teorias devem minimizar erro empírico E1
Teorias devem minimizar elementos ad-hoc E2
Teorias devem minimizar complexidade E3
Teorias devem minimizar incompatibilidade com outras teorias E4
Aspecto Descritivo:
Teorias minimizam falta de estética E5
Teorias minimizam falta de consenso científico E6
Teorias minimizam dissonância com ideologias dominantes E7
Teorias minimizam frustração de interesses de pesquisadores E8
Etc…….
Etotal = a1E1 + a2E2 + a3 E3 +…
Relevos Rugosos
E
“Contra o Método”: Relevos rugosos,
racionalidade de curto termo e de longo termo
Paradigmas = mínimos locais
Progresso dentro do paradigma =
descida pelo gradiente =
racionalidade de curto termo =
ciência normal
Transição entre paradigmas =
escape de mínimos locais =
racionalidade de longo termo
(“temperatura”, “não eliminação
de indivíduos com fitness
médio”) = ciência revolucionária
Mudanças de Paradigmas
Quanto maior o salto, maior a “irracionalidade” local.
Justificada pela presença de uma racionalidade de longo
prazo e global.
Existe progresso nas teorias científicas?
Espaço das teorias
Progresso vertical (dentro do paradigma) mas
exploração não convergente na horizontal?
Corre a ciência o perigo de uma transição vítrea?
Incomensurabilidade
O novo paradigma afeta os próprios critérios de avaliação
do que são boas teorias científicas. Isso pode tornar
problemático a comparação do mérito das teorias.
Possível analogia: Acoplamento do estado S do sistema
(variáveis rápidas) com variáveis lentas que definem os
termos Ei. Modulação do relevo pela presença do sistema
em um estado S(t).
Racionalidade tácita versus racionalidade
explícita
IA baseada em regras
(programação): Sistemas
especialistas = racionalidade
explícita.
IA baseada em exemplos
(aprendizagem): Redes Neurais
Artificais, Support Vector
Machines, etc = ajuste de curvas
(em geral, mapeamentos) =
racionalidade implícita.
O cientista aprende tacitamente o que é “boa
ciência”, sem usar um método de demarcação
Thomas Kuhn (in Criticism and the growth of knowledge, 1970)
“A espécie de processo [aprendizagem tácita] que tenho em mente pode
ser modelado num computador, e assim, comparado com o modo mais familiar
que recorre a critérios (…). Ambos os programas funcionarão, mas não darão
resultados idênticos. Diferem por muitas das mesmas razões que a
jurisprudência difere da lei codificada.
Nós ignoramos por muito tempo a maneira como o conhecimento da
natureza pode ser tacitamente incorporado em experiências totais sem que
intervenha a abstração de critérios ou de generalizações. Tais experiências nos
são apresentadas no correr da educação e da iniciação profissional.
Assimilando um número suficiente de exemplares, aprendemos a reconhecer e
trabalhar com o mundo com que nossos professores já estão familiarizados.
O reconhecimento da função cognitiva dos exemplares também pode
remover a eiva de irracionalidade de minhas observações anteriores (…). Em
face de exemplos do que faz uma teoria científica, não precisamos de critérios
para saber que alguma coisa saiu errada ou para fazer escolhas em caso de
conflito.”
Roteiro
O debate Popper-Kuhn sobre racionalidade científica.
Insights a partir dos conceitos de:
Relevos rugosos
Machine learning
O debate sobre a natureza e caracterização das
revoluções científicas.
Modelos de dinâmica de avalanches
O debate sobre ciência normal-ciência revolucionária
(Kuhn) versus pluralismo teórico (Feyrabend).
Algoritmos genéticos
O debate Reducionismo versus Holismo.
Sistemas dinâmicos não lineares.
Grupo de Renormalização e classes de Universalidade.
Revoluções Científicas como terremotos
conceituais
The Earth crackles. a, Time history of radiated
energy from earthquakes throughout all of 1995.
The Earth responds to the slow strains imposed
by continental drift through a series of
earthquakes (impulsive events well separated in
space and time). This time series, when sped up,
sounds remarkably like the crackling noise of
paper, magnets and Rice Krispies (listen to it in
ref. 110). b, Histogram of number of earthquakes
in 1995 as function of their magnitude (or,
alternatively, their energy release). Earthquakes
come in a wide range of sizes, from unnoticeable
trembles to catastrophic events. The smaller
earthquakes are much more common: the number
of events of a given size forms a power law
called the Gutenberg–Richter law.
Quão grande precisa ser uma revolução
científica para merecer o nome?
Evolução temporal
Invariância de escala
Modelo de avalanches
Fi = H(t) + Jsi + hi
(Sethna et al., Nature 410, 242 - 250 (08 March 2001)
Modelos de terremotos
Roteiro
O debate Popper-Kuhn sobre racionalidade científica.
Insights a partir dos conceitos de:
Relevos rugosos
Machine learning
O debate sobre a natureza das revoluções científicas.
Modelos de dinâmica de avalanches
O debate sobre ciência normal-ciência revolucionária
(Kuhn) versus pluralismo teórico (Feyrabend).
Algoritmos genéticos
O debate Reducionismo versus Holismo.
Sistemas dinâmicos não lineares.
Grupo de Renormalização e classes de Universalidade.
O debate normativo Kuhn-Feyrabend:
ciência normal ou pluralismo teórico?
Kuhn
Sugestões para Kuhnianos
Racionalidade implicita é defensável.
Eficiência dos algorítimos “ciência normal” versus
“pluralismo teórico” pode ser testada em algorítmos
genéticos.
Mudanças de paradigmas são avalanches de mudanças
conceituais.
Ocorrem em todas as escalas, não existe um tamanho
característico que defina uma mudança de paradigma.
Em todo caso, poderíamos associar as “grandes revolucões
científicas” à avalanches que afetam toda a ciência e
mesmo a cultura em geral = “avalanches ou clusters
percolantes”.
Existe progresso vertical mas “não-progresso” horizontal.
Reducionismo versus Holismo
“O Todo é maior que a soma de suas partes”
(Aristóteles)
Princípio da superposição linear = Todo igual à
soma das partes.
Gás ideal, teorias tipo um gene-um caracter,
individualismo metodológico na economia e sociologia.
Sistemas não lineares = comportamento do todo é
qualitativamente diferente do das partes.
Fato trivial?
f(x) = xa
f(x + y)  f(x) + f(y) para a  1
O Todo é qualitativamente diferente das partes
e (em grande parte) independe delas!
Often there will be fixed points that attract in all directions. These fixed points
describe phases rather than phase transitions. Most phases are rather simple,
with fluctuations that die away on long length scales. When fluctuations remain
important, they will exhibit self-similarity and power laws called generic scale
invariance.
Emergência = mudança qualitativa a
partir de incrementos quantitativos
Bifurcações
Caos determinista
Múltiplos atratores
Transições de fase e fenômenos críticos
Modelagem baseada em agentes
Etc.
Classes de Universalidade
Sistemas classificados em “classes de universalidade” que
dependem principalmente de simetrias e dimensão
espacial, mas não dependem de detalhes finos do sistema
(detalhes das interações, número de vizinhos etc).
Um modelo muito complexo e detalhista pode estar na
mesma classe de universalidade que um modelo simples.
Portanto, podemos estudar o modelo simples para ganhar
insight e conhecimento qualitativo (e mesmo alguns
resultados quantitativos como expoentes críticos) sobre o
sistema complexo.
Isso não significa que “reduzimos o sistema complexo à
um sistema hipersimplificado”. A natureza da relação é
outra: ambos pertencem à mesma classe de universalidade.
Uma última dúvida
Não é contraditório usar resultados científicos para estudar
a ciência?
Primeira resposta: são modelos formais (não empíricos),
valem mesmo que não se apliquem à natureza. Não se trata
de “naturalizar” a filosofia da ciência.
Segunda resposta: Podemos fazer sociologia da
Sociologia e história da História? Se sim, então talvez
possamos fazer ciência da Ciência (metaciência), com
instrumentos fornecidos pelas ciências humanas,
estatística, ciência da informação e idéias (como as
apresentadas aqui) sugeridas por outras disciplinas.
Talvez até seja possivel fazer uma filosofia da ciência
baseada em modelos computacionais, conforme sugeriu
Kuhn!
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