•8. O entreguerras
e a crise sistêmica
Gilberto Maringoni – UFABC - 2014
Programação
5 de maio: O entreguerras e a crise sistêmica–
Referências
HOBSBAWM, Eric J., A era dos extremos, Companhia das Letras,
São Paulo, 1996, pags. 90 a 112 (Capítulo 3 – ‘Rumo ao abismo
econômico’)
PARKER, Selwyn, O crash de 1929, Editora Globo, São Paulo, 2009,
pags. 400 a 418 (Pósfácio)
O mundo do pós Guerra
Hobsbawm
• A Primeira Guerra Mundial foi seguida por um tipo de
colapso verdadeiramente mundial, sentido pelo menos
em todos os lugares em que homens e mulheres se
envolviam ou faziam uso de transações impessoais de
mercado.
• Na verdade, mesmo os orgulhosos EUA, longe de
serem um porto seguro das convulsões de continentes
menos afortunados, se tornaram o epicentro deste que
foi o maior terremoto global medido na escala Richter
dos historiadores econômicos - a Grande Depressão do
entreguerras.Em suma: entre as guerras, a economia
mundial capitalista pareceu desmoronar. Ninguém sabia
exatamente como se poderia recuperá-la.
• A globalização da economia
dava sinais de que parara de
avançar nos anos
entreguerras.
• Por qualquer critério de
medição, a integração da
economia mundial estagnou
ou regrediu.
Por que essa estagnação?
• Sugeriram-se vários motivos, como
por exemplo que a maior das
economias do mundo, a dos EUA,
passara a ser praticamente autosuficiente,exceto pelo suprimento de
umas poucas matérias-primas; jamais
dependera particularmente do
comércio externo.
A crise deixou a Europa Central
pronta para o fascismo.
• Na Alemanha em 1923 a unidade
monetária foi reduzida a um milionésimo
de milhão de seu valor de 1913, ou seja,
na prática o valor da moeda foi reduzido a
zero.
• Mesmo nos casos menos extremos, as
conseqüências foram drásticas.
• O desemprego na maior
parte da Europa
Ocidental permaneceu
assombroso e, pelos
padrões pré-l914,
patologicamente alto.
Itália e Alemanha
• A passagem pelos momentos de crises interna e
externa da Itália e da Alemanha tornam-se
essenciais para o entendimento do contexto em
que os indivíduos carentes de
representatividade estavam inseridos, para
legitimar uma ideologia totalitária e
empregadora do terrorismo político, como
alternativa aos problemas e às crises que
assolavam seus respectivos países.
• Os modelos eram o fascismo italiano e o
nacional-socialismo, sendo estes desenvolvidos
em países que reuniram condições internas e
externas para o surgimento da ideologia sob
forma de movimento em condições de disputa
pelo poder.
• Haviam na Itália aspectos do
desenvolvimento do capitalismo de tipo
tardio, que irão influenciar no surgimento
de idéias como o nacionalismo, o
expansionismo e o imperialismo
colonialista, utilizadas na composição
fascista.
• O desequilíbrio na concentração de pólos
econômico, contribuindo para constantes
choques entre regiões mais pobres e mais
ricas são presentes na península itálica,
promovendo dificuldades para a
estabilidade do país.
•
•
A Marcha sobre
Roma foi uma vasta
manifestação
fascista, com
característica de
golpe de estado, de
direita, ocorrida em
28 de outubro de
1922
Milhares de
militantes fascistas
que reivindicavam o
trono da Itália. Este
evento representou
a ascensão ao poder
do Partido Nacional
Fascista (PNF) e o
fim da democracia
liberal, pela
nomeação de Benito
Mussolini como
chefe de governo
pelo Rei Vítor
Emanuel III
• Mesmo após a unificação territorial, a
Itália permanecia com fissuras sérias,
tanto culturais quanto econômicas,
traduzidas por concepções separatistas,
fomentadas pelas regiões de índice de
industrialização mais elevado, atacando
as regiões predominantemente agrárias.
• Os fatores de disparidade interna que
minavam o sistema liberal adotado como
forma de governo, eram ampliados pelos
acontecimentos externos.
• Junto ao “perigo vermelho” os movimentos
nacionalistas originados antes da Grande
Guerra permaneciam ativos e
ideologicamente organizados.
• Diante da expansão das ideologias de
esquerda, cujo símbolo mais forte na Itália
era o Partido Socialista Italiano (PSI), os
nacionalistas adotaram a postura de
oposição radical à esquerda.
Entre as motivações aos ataques estão:
• O internacionalismo adotado pelos
socialistas - interpretado como traição à
pátria, diante das ambições nacionais,
• O princípio mobilizador mantido pelo PSI,
regido pela revolução social, adquirindo
assim antipatia dos setores médios da
sociedade no pós-Guerra, em função do
medo da proletarização.
• Alguns destes movimentos de nacionalismo
exaltado, antiliberais e anti-socialistas se viram,
no pós-Guerra Mundial, aglutinados sob
liderança de Benito Mussolini, ex-integrante do
Partido Socialista Italiano, e ex-diretor do Avanti!
(jornal oficial do partido).
• Após ser expulso do PSI, por fazer apologia à
entrada da Itália na Primeira Guerra Mundial –
constrangendo o internacionalismo do partido -,
Mussolini torna pública sua interpretação da luta
de classes marxista, levando-a a escala
mundial.
Condições
• As condições ideais para o triunfo da ultradireita
eram um Estado velho, com seus mecanismos
dirigentes não mais funcionando, uma massa de
cidadãos desencantados, desorientados e
descontentes, não mais sabendo querer ser
leais, forte movimento socialista ameaçando ou
parecendo ameaçar com a revolução social,
mas não de fato em posição de realizá-la; e uma
inclinação do ressentimento nacionalista contra
o tratado de paz de 1918-1920.
• A Alemanha sentiu de maneira mais
violenta as punições impostas pelo
Tratado de Versalhes.
• A intervenção das nações vitoriosas,
sob o respaldo do tratado firmado
após a Primeira Guerra Mundial, em
assuntos políticos e econômicos
internos da Alemanha, suscitaram
sensação de debilidade interna e de
indignação coletiva.
• O Artigo 231 do Tratado de Versalhes
enfatizava a responsabilidade moral
exclusiva do Reich alemão, sendo
constantemente lembrado, como forma de
justificar as ações que pesavam contra a
Alemanha derrotada.
• O direito de autodeterminação dos povos,
defendido pelo presidente estadunidense
Wilson, era suspendido quando rogado
pelos alemães em defesa da soberania
nacional.
• As medidas previstas pelo tratado de
paz da Conferência de Versalhes
implicavam privações ao
desenvolvimento industrial alemão,
ora pela perda de territórios
estratégicos - ricos em minério de
ferro e carvão (matérias-primas para
o desenvolvimento da indústria de
base) -, ora pela imposição de
racionamentos à produção fabril.
• O putsch de
Munique
Inspirado no
movimento
fascista de
Mussolini na
Itália, Hitler,
em novembro
de 1923,
organizou um
golpe a partir
da cidade de
Munique,
tendo como
pano de fundo
a grave crise
econômica no
país.
• .Apesar do
fracasso do
movimento,
projetou o
partido e suas
idéias em nível
nacional.
Hitler preso após a tentativa de golpe
• Mussolini, em um discurso
proferido dia 28 de outubro de
1925 proferiu a frase que define
concisamente a filosofia do
fascismo: "Tutto nello Stato,
niente al di fuori dello Stato, nulla
contra lo Stato" ("Tudo no Estado,
nada fora do Estado, nada contra
o Estado").
• O Fascismo italiano assume que a natureza do estado é
superior à soma dos indivíduos que o compõem e que
eles existem para o estado, em vez de o estado existir
para os servir. Deste modo todas os assuntos dos
indivíduos são assuntos do Estado.
• No seu modelo corporativista da gestão totalitária mas
privada, as várias funções do Estado são
desempenhadas por entidades individuais que
compõem o Estado, sendo do interesse do Estado
inspeccionar essa acção, sem nacionalizar aquelas
entidades.
• A atividade privada é num certo modo empreguada pelo
Estado, o qual pode decidir suspender a infra-estructura
de alguma entidade de acordo com a sua utilidade e
direcção, ou interesse do estado.
• O fascismo foi de certa forma
o resultado de um sentimento
geral de ansiedade e medo
dentro da classe média na
Itália do pós-guerra, que
surgiu no seguimento da
convergência de pressões
interrelacionadas de ordem
económica, política e cultural.
• Sob o estandarte desta ideologia
autoritária e nacionalista, Mussolini foi
capaz de explorar os medos perante o
capitalismo numa era de depressão
pós-guerra, o ascendente de uma
esquerda mais militante, e um
sentimento de vergonha nacional e de
humilhação que resultaram da "vitória
mutilada" da Itália nos tratados de paz
pós Primeira Guerra Mundial.
• O fascismo, primeiro em sua forma original
italiana, depois na forma alemã do nacionalsocialismo, inspirou outras forças antiliberais,
apoiou-as e deu à direita internacional um senso
de confiança histórica: na década de 1930,
parecia a onda do futuro.
• Sem o triunfo de Hitler na Alemanha, a idéia do
fascismo como um movimento universal, uma
espécie de equivalente direitista do comunismo
internacional tendo Berlim como sua Moscou,
não teria se desenvolvido.
• A ascensão da direita radical após a Primeira
Guerra Mundial foi também uma resposta ao
avanço da revolução social e do poder operário
em geral, e à Revolução de Outubro e ao
leninismo em particular.
• Sem esses, não teria havido fascismo algum,
pois embora os demagógicos ultradireitistas
tivessem sido politicamente barulhentos e
agressivos em vários países europeus desde o
fim do século XIX, quase sempre haviam sido
mantidos sob controle antes de 1914.
Nazismo
Do programa do NSDAP - Partido Nacional Socialista Alemão dos Trabalhadores
• Pedimos igualdade de direitos para o Povo Alemão em relação às
outras nações e a revogação do Tratado de Versalhes e do Tratado
de Saint-Germain.
• É necessário impedir novas imigrações de não alemães. Pedimos
que todos os não alemães estabelecidos no Reich depois de 2 de
Agosto de 1914, sejam imediatamente obrigados a deixar o Reich.
• Todos os cidadãos têm os mesmos direitos e os mesmos deveres.
• Pedimos a nacionalização de todas as empresas que atualmente
pertencem a trusts.
• Pedimos uma participação nos lucros das grandes empresas.
• Pedimos a criação e proteção de uma classe média sã, a entrega
imediata das grandes lojas à administração comunal e o seu
aluguer aos pequenos comerciantes a baixo preço. Deve ser dado
prioridade aos pequenos comerciantes e industriais nos
fornecimentos ao Estado, aos Länder ou aos municípios.
• Pedimos uma reforma agrária adaptada às nossas necessidades
nacionais
• O Estado deve preocupar-se por melhorar a saúde pública
• Tais aspirações nacionalistas não
realizadas (ou frustradas)
manchavam a reputação do
liberalismo e do constitutionalismo
entre muitos sectores da população
italiana. Adicionalmente, tais
instituições democráticas nunca
cresceram ao ponto de se tornarem
firmemente enraizadas na nova
nação-estado.
Crise e mudança
• O mundo do início dos anos
1930 enfrentava os
sobressaltos da Grande
Depressão, cujo marco
definidor foi a quebra da bolsa
de Nova York, em 29 de
outubro de 1929. Nenhum
país capitalista passou
incólume pela crise.
• Vivendo uma expansão constante
desde a segunda metade do século
anterior, sem enfrentar nenhum
conflito significativo em seu território
desde a Guerra de Secessão (18611865), os Estados Unidos
despontaram, após a Guerra de
1914-1918, como a maior potência
mundial e a força dominante entre os
mercados latino-americanos.
• Apesar de uma enorme desigualdade social 90% da riqueza estava na mão de 13% dos
estadunidenses - nunca uma sociedade exibira
tamanha opulência e tamanha pujança
econômica.
• Mas a roda girou em falso através de uma brutal
crise de superprodução. Ela refletia a saturação
dos mercados, que não absorviam mais o
volume de mercadorias produzidas. Sem
mecanismos de regulação, o livre-mercado
mostrou seus limites.
• A quebra fez com que bilhões de
dólares evaporassem da noite
para o dia, centenas de empresas
fossem à bancarrota e as
demissões de trabalhadores
atingissem números nunca
imaginados. Somente em Nova
York, em fins de 1929, havia um
milhão de desempregados
vagando pelas ruas.
• Nos EUA, a queda dos preços
dos produtos primários (que
deixaram de cair ainda mais pelo
acúmulo feito de estoques cada
vez maiores) simplesmente
demonstrou que a demanda
deles não conseguia acompanhar
a capacidade de produção.
• Uma dramática recessão da
economia industrial norteamericana logo contaminou outro
núcleo industrial, Alemanha.
• A produção industrial americana
caiu cerca de um terço entre
1929 e 1931, e a alemã mais ou
menos o mesmo.
• A Westinghouse, grande empresa de
eletricidade,perdeu dois terços de suas vendas entre
1929 e 1933, enquanto sua renda líquida caiu75%em
dois anos.
A crise se difundiu internacionalmente.
• Isso deixou prostrados Argentina, Austrália, países
balcânicos, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Egito,
Equador, Finlândia, Hungria, Índia, Malásia britânica,
México, Índias holandesas (atual Indonésia), Nova
Zelândia, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela
• As economias da Áustria, Tchecoslováquia, Grécia,
Japão, Polônia e Grã-Bretanha, bastante sensíveis a
abalos sísmicos vindos do Ocidente (ou Oriente), foram
igualmente abaladas.
Em suma, a Depressão tornou-se
global no sentido literal.
• Quase simbolicamente, a Grã-Bretanha
em 1931 abandonou o Livre Comércio,
que fora tão fundamental para a
identidade econômica britânica desde a
década de 1840.
• O trauma da Grande Depressão foi
realçado pelo fato de que um país que
rompera clamorosamente com o
capitalismo pareceu imune a ela: a União
Soviética.
URSS
• Enquanto o resto do mundo, ou pelo menos o
capitalismo liberal ocidental, estagnava, a URSS
entrava numa industrialização ultra-rápida e
maciça sob seus novos Planos Qüinqüenais.
• De 1929 a 1940, a produção industrial soviética
triplicou, no mínimo dos mínimos. Subiu de 5%
dos produtos manual faturados do mundo em
1929 para 18% em 1938, enquanto no mesmo
período a fatia conjunta dos EUA, Grã-Bretanha
e França caía de 59% para 52%do total do
mundo.
• E mais, não havia desemprego.
• Essas conquistas impressionaram mais os
observadores estrangeiros de todas as
ideologias, incluindo um pequeno mas
influente fluxo de turistas sócioeconômicos em Moscou em 1930.
• O que eles tentavam compreender não
era o fenômeno da URSS em si, mas o
colapso de seu próprio sistema
econômico, a profundidade do fracasso do
capitalismo ocidental
• Qual era o segredo do sistema
soviético? Podia-se aprender alguma
coisa com ele? Ecoando os Planos
Qüinqüenais da URSS, "Plano" e
"Planejamento" tomaram-se palavras
da moda na política.
• Os partidos social-democratasa
adotaram "planos", como na Bélgica
e Noruega.
• Jovens políticos conservadores
como o futuro primeiro-ministro
Harold Macmillan (1894-1986)
tornaram-se porta-vozes do
"planejamento".
• Até os nazistas plagiaram a idéia,
quando Hitler introduziu um
"Plano Quadrienal" em1933.
Por que a economia capitalista não
funcionou entre as guerras?
• A situação nos EUA é parte essencial de
qualquer resposta a essa pergunta. Pois, se era
possível responsabilizar, ao menos
parcialmente, as perturbações da Europa na
guerra e no pós-guerra, ou pelo menos nos
países beligerantes da Europa, pelos problemas
econômicos ali ocorridos, os EUA tinham estado
muito distantes do conflito, embora por um curto
e decisivo período tivessem se envolvido nele.
• Assim, longe de perturbar sua economia, a
Primeira Guerra Mundial, como a Segunda,
beneficiou-os espetacularmente.
• Em 1913, os EUA já se
haviam tornado a maior
economia do mundo, arcando
com mais de um terço da
produção industrial mundial.
• Além disso, a guerra não apenas
reforçou sua posição como maior
produtor do mundo, como os
transformou no maior credor do
mundo.
• Em suma, não há explicação
para a crise econômica
mundial sem os EUA.
• Isso não pretende subestimar as
raízes exclusivamente européias
do problema, em grande parte, de
origem política
• Em 1929. respondiam por mais de 42% da
produção mundial total, comparados com
apenas pouco menos de 28% das três
potências industriais européias.
• É uma cifra espantosa. Concretamente,
enquanto a produção de aço americana
subiu cerca de um quarto entre 1913 e
1920, a produção de aço do resto do
mundo caiu cerca de um terço.
• Em suma, após o fim da Primeira
Guerra Mundial, os EUA eram em
muitos aspectos uma economia
tão internacionalmente dominante
quanto voltou a tornar-se após a
Segunda Guerra Mundial.
• Foi a Grande Depressão que
interrompeu temporariamente
essa ascensão.
• O mundo do início dos anos
1930 enfrentava os
sobressaltos da Grande
Depressão, cujo marco
definidor foi a quebra da bolsa
de Nova York, em 29 de
outubro de 1929. Nenhum
país capitalista passou
incólume pela crise.
• No início da década de 1930, a
mudança veio abrupta. Seus
marcos foram o abandono do
padrão-ouro pela Grã-Bretanha,
os Planos Qüinqüenais na
Rússia, o New Deal nos EUA e a
ascenção do nacional-socialismo
na Alemanha e o colapso da Liga
das nações em favor de impérios
autárquicos.
• .
• Em 1940 já não existiam vestígios do
sistema anterior.
• A causa da mudança foi o colapso do
sistema econômico internacional.
• Algumas moedas desapareceram,
como a alemã, a austríaca, a húngara
e a russa. Apareceu um fenômeno
inteiramente novo: a fuga de capital
• Vivendo uma expansão constante
desde a segunda metade do século
anterior, sem enfrentar nenhum
conflito significativo em seu território
desde a Guerra de Secessão (18611865), os Estados Unidos
despontaram, após a Guerra de
1914-1918, como a maior potência
mundial e a força dominante entre os
mercados latino-americanos.
• Nunca uma sociedade exibira
tamanha opulência e pujança
econômica.
• Mas a roda girou em falso através
de uma brutal crise de
superprodução.
• O livre-mercado mostrou
seus limites.
• A quebra fez com que bilhões
de dólares evaporassem da
noite para o dia, centenas de
empresas fossem à bancarrota
e as demissões de
trabalhadores atingissem
números nunca imaginados.
• Após a crise, a produção
industrial americana caiu
cerca de um terço entre
1929 e 1931, e a alemã
mais ou menos o
mesmo, mas essas são
médias suavizadas.
• A Depressão tornou-se global
no sentido literal.
• A interdependência do
comércio e, especialmente, a
interdependência financeira
agiram como poderosos
instrumentos de transmissão
internacional da crise.
• De imediato, foram atingidos Argentina,
Austrália, países balcânicos, Bolívia,
Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Egito,
Equador, Finlândia, Hungria, Índia,
Malásia britânica, México, Índias
holandesas (atual Indonésia), Nova
Zelândia, Paraguai, Peru, Uruguai e
Venezuela.
• As economias da Áustria,
Tchecoslováquia, Grécia, Japão, Polônia
e GrãBretanha, bastante sensíveis a
abalos sísmicos vindos do Ocidente (ou
Oriente), foram igualmente abaladas.
• O Brasil tornou-se um símbolo
do desperdício do capitalismo e
da seriedade da Depressão, pois
seus cafeicultores tentaram em
desespero impedir o colapso dos
preços queimando café em vez
de carvão em suas locomotivas a
vapor. (Entre dois terços e três
quartos do café vendido no
mundo vinham desse país.)
• Apesar disso, a Grande Depressão
foi muito mais tolerável para os
brasileiros ainda em sua grande
maioria rurais que os cataclismos
econômicos da década de 1980;
sobretudo porque as expectativas
das pessoas pobres quanto ao que
podiam receber de uma economia
ainda eram extremamente modestas.
• O Brasil de 1930 tinha 37,6 milhões de
habitantes e o café respondia por 70% de
sua receita de exportações. Sem
indústrias de monta e com uma economia
baseada em produtos agrícolas, o país
vive ao sabor das ondas da economia
mundial.
• A crise de 1929 bate de frente nessa
lógica da quase monocultura. Agoniza a
República Velha. Avizinha-se uma grave
crise social.
• De acordo com Celso Furtado, a política
de valorização do café, por seu efeito
multiplicador na economia, teve
características anticíclicas que impediram
o aprofundamento da crise no país.
• Os fortes subsídios estatais na compra da
produção, mesmo com a redução da
demanda externa, foram decisivos para
que, em 1933, a economia começasse a
se recuperar.
• A política de valorização do café resultava
de um acordo firmado entre cafeicultores
e o governo federal, em 1906, na cidade
de Taubaté.
• Através dele, o Estado compraria o
excedente da produção, evitando crises
de superprodução e a queda abrupta dos
preços no mercado mundial.
• Funcionava como se o país estabelecesse
uma política de cotas de produção.
• A defasagem cambial desestimulava as
importações.
Ao mesmo tempo, a recuperação do setor
cafeeiro conferia maior dinamismo ao
mercado interno, nesse momento mais
atraente para investimentos que a
economia de exportação, então
estagnada.
Foi o mercado interno o motor da
recuperação econômica brasileira, um
processo, segundo Furtado, inédito.
• A produção industrial e mesmo a
agrícola voltou-se, em sua maior
parte, para o consumo local, no
início dos anos 1930.
• O pólo dinâmico da economia
deslocava-se do setor exportador
para a demanda doméstica, que
gerava maiores lucros e atraía
mais investimentos.
• Assim, mesmo com as importações de insumos
e maquinário dificultadas pela depreciação da
moeda nacional, a indústria – especialmente a
de bens de capital - pode se desenvolver.
• O Brasil passou a importar máquinas e
equipamentos obsoletos nos países centrais,
mais baratos, o que compensava a defasagem
cambial. A produção industrial cresceu cerca de
50% entre 1929 e 1937. Assim, a taxa de
câmbio depreciada passou a ter enorme
importância no desenvolvimento da economia
brasileira.
No cenário mundial
• A conseqüência básica da Depressão foi o
desemprego em escala inimaginável e sem
precedentes, e por mais tempo do que qualquer
um já experimentara.
• No pior período da Depressão (1932), 22% a
23% da força de trabalho britânica e belga, 24%
da sueca, 27% da americana, 29% da austríaca,
31% da norueguesa, 32% da dinamarquesa e
nada menos que 44% da alemã não tinha
emprego.
• O único Estado ocidental que conseguiu
eliminar o desemprego foi a Alemanha nazista
entre 1933 e 1938.
• Não houvera nada semelhante a essa
catástrofe econômica na vida dos
trabalhadores até onde qualquer um
pudesse lembrar.
• O que tornava a situação mais dramática
era que a previdência pública na forma de
seguro social, inclusive auxíliodesemprego, ou não existia, como nos
EUA, ou, pelos padrões de fins do século
20, era parca, sobretudo para os
desempregados a longo prazo.
• A Grande Depressão destruiu o
liberalismo econômico por meio século.
• Em 1931, a Grã-Bretanha, Canadá, toda a
Escandinávia e os EUA abandonaram o
padrão-ouro, sempre encarado como a
base de trocas internacionais estáveis.
• Em 1936 haviam-se juntado a eles os
belgas, os holandeses e os franceses.
• A Grã-Bretanha em 1931
abandonou o Livre Comércio,
que fora tão fundamental para
a identidade econômica
britânica desde a década de
1840 quanto a Constituição
americana para a identidade
política dos EUA.
• Após a guerra, o "pleno emprego", ou
seja, a eliminação do desemprego
em massa, tornou-se a pedra
fundamental da política econômica
nos países de capitalismo
democrático reformado.
• Seu mais famoso profeta e pioneiro
foi o economista britânico John
Maynard Keynes (1883-1946).
• Os keynesianos afirmavam, corretamente, que a
demanda a ser gerada pela renda de
trabalhadores com pleno emprego teria o mais
estimulante efeito nas economias em recessão.
• Apesar disso, o motivo pelo qual esse meio de
aumentar a demanda recebeu tão urgente
prioridade - o governo britânico empenhou-se
nele mesmo antes do fim da Segunda Guerra
Mundial - foi que se acreditava que o
desemprego em massa era política e
socialmente explosivo, como de fato mostrara
ser durante a Depressão.
• O trauma da Grande Depressão foi realçado pelo fato de
que um país que rompera clamorosamente com o
capitalismo pareceu imune a ela: a União Soviética.
• Enquanto o resto do mundo, ou pelo menos o
capitalismo liberal ocidental, estagnava, a URSS entrava
numa industrialização ultra-rápida e maciça sob seus
novos Planos Qüinqüenais.
• De 1929 a 1940, a produção industrial soviética triplicou,
no mínimo dos mínimos.
• Subiu de 5% dos produtos manual faturados do mundo
em 1929 para 18% em 1938.
• No mesmo período a fatia conjunta dos EUA, GrãBretanha e França caía de 59% para 52% do total do
mundo.
• E mais, não havia desemprego na URSS.
• Ecoando os Planos Qüinqüenais da
URSS, "Plano" e "Planejamento"
tomaram-se palavras da moda na política.
• Os partidos social-democra tas adotaram
"planos", como na Bélgica e Noruega.
• Até os nazistas plagiaram a idéia, quando
Hitler introduziu um "Plano Quadrienal" em
1933.
• O sistema mundial, pode-se argumentar,
não funcionou porque, ao contrário da
Grã-Bretanha, que fora o centro antes de
1914, os EUA não precisavam muito do
resto do mundo, e portanto, outra vez ao
contrário da Grã-Bretanha, que sabia que
o sistema de pagamentos mundiais se
apoiava na libra esterlina e cuidava para
que ela permanecesse estável, os EUA
não se preocuparam em agir como
estabilizador global.
• O que tomava a economia tão mais
vulnerável durante um período em
que houve um boom de crédito era
que os consumidores não usavam
seus empréstimos para comprar os
bens de consumo tradicionais, que
mantêm corpo e alma juntos, e têm
portanto muito pouca variação:
alimentos, roupas e coisas
semelhantes.
• O mundo continuou em depressão ao
longo de toda a década de 1930.
• Isso foi mais visível na maior de todas as
economias, a dos EUA, porque as várias
experiências para estimular a economia
feitas pelo "New Deal" do presidente F. D.
Roosevelt - às vezes de maneira
inconsistente - não corresponderam
exatamente à sua promessa econômica.
• Economistas que aconselhavam que
se deixasse a economia em paz,
governos cujos primeiros instintos,
além de proteger o padrão ouro com
políticas deflacionárias, era apegarse à ortodoxia financeira, aos
equilíbrios de orçamento e à redução
de despesas, visivelmente não
tomavam melhor a situação.
• Na verdade, à medida que
continuava a Depressão,
argumentava-se com
considerável vigor, entre
outros por J. M. Keynes que
tais governos estavam
piorando a Depressão.
• Não surpreende que os
efeitos da Grande
Depressão tanto sobre a
política quanto sobre o
pensamento público
tivessem sido dramáticos
e imediatos.
• Infeliz o governo por acaso no poder
durante o cataclismo, fosse ele de direita,
como a presidência de Herbert Houver
nos EUA (1928-32), ou de esquerda,
como os governos trabalhistas na GrãBretanha e Austrália.
• A mudança nem sempre foi tão imediata
quanto na América Latina, onde doze
países mudaram de governo ou regime
em 1930-31, dez deles por golpe militar.
• Em meados da década de 1930 havia poucos
Estados cuja política não houvesse mudado
substancialmente em relação ao que era antes
do crash.
• Na Europa e Japão, deu-se uma impressionante
virada para a direita, com exceção da
Escandinávia, onde a Suécia entrou em seu
governo social-democrata de meio século em
1932, e na Espanha, onde a monarquia Bourbon
deu lugar a uma infeliz e, como se viu, breve
República em 1931
• Os portões para a Segunda
Guerra Mundial foram abertos em
1931.
• O fortalecimento da direita radical
foi reforçado, pelo menos durante
o pior período da Depressão,
pelos espetaculares reveses da
esquerda revolucionária.
• O Estado no centro da agenda
• No combate à crise, a maior parte dos governos
dos países mais importantes adotou políticas
intervencionistas e de fortalecimento do Estado,
além da URSS. São alguns exemplos:
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EUA - 1932-1944
Alemanha – 1933-1945
Espanha – 1938-73
Itália – 1922-1944
Portugal - 1932-1968
Brasil – 1930 -1945
Argentina – 1946 -1955
México – 1934-1940
• O teórico da retomada
• John Maynard Keynes (1883-1946), economista
britânico, defendia, contra as teses liberais, uma
política econômica de Estado intervencionista.
• Nela, os governos usariam medidas fiscais e
monetárias para mitigar os efeitos adversos dos
ciclos econômicos - recessão, depressão e
booms. Suas ideias serviram de base para a
escola de pensamento conhecida como
economia keynesiana.
• Na década de 1930, Keynes
iniciou uma revolução no
pensamento econômico,
opondo-se às ideias da
economia neoclássica que
defendiam que os mercados
livres ofereceriam
automaticamente empregos
aos trabalhadores contanto
que eles fossem flexíveis na
sua procura salarial.
• Após a eclosão da Segunda Guerra
Mundial, as ideias econômicas de Keynes
foram adotadas pelas principais potências
econômicas do Ocidente.
• Durante as décadas de 1950 e 1960, o
sucesso da economia keynesiana foi tão
retumbante que quase todos os governos
capitalistas adotaram suas
recomendações.
• O impacto da Teoria Geral do Emprego, do Juro
e da Moeda (1936) nos meios acadêmicos e na
formulação de políticas públicas excedeu o que
normalmente seria esperado, até mesmo de
pensadores tão destacados como John Maynard
Keynes.
• O objetivo de Keynes, ao defender a
intervenção do Estado na economia não é, de
modo algum, destruir o sistema capitalista de
produção. Muito pelo contrário, segundo o autor,
o capitalismo é o sistema mais eficiente que a
humanidade já conheceu (incluindo aí o
socialismo).
• O objetivo é o aperfeiçoamento do sistema, de
modo que se una o altruísmo social (através do
Estado) com os instintos do ganho individual
(através da livre iniciativa privada). Segundo o
autor, a intervenção estatal na economia é
necessária porque essa união não ocorre por
vias naturais, graças a problemas do livre
mercado.
• Suas ideias e as dos seus seguidores foram
adotadas por vários governos ocidentais e
também por muitos governos do terceiro
mundos.
O New Deal, a reação dos EUA
• Em 4 de março de 1933, Franklin Delano Roosevelt (1882 -1945)
torna-se presidente dos Estados Unidos.
• A crise econômica e social iniciada em outubro de 1929 arruína o
país. Desaparece a confiança na prosperidade. Os especuladores
arruinados não podem mais saldar suas dívidas. Os bancos
reclamam sua parte.
• Como não conseguem reaver o dinheiro que lhes é devido, 659
bancos fecham suas portas em 1929, 1.352 em 1930, e 2.294 no
ano seguinte. Obrigados a abrir falência, os industriais fecham as
fábricas.
• O desemprego atinge índices astronômicos: 1,5 milhão de
americanos em 1929, 13 milhões de homens e mulheres quatro
anos mais tarde, ou seja, um quarto da população ativa.
• Roosevelt promete agir imediatamente
nos primeiros 100 dias de seu mandato.
• De março a junho de 1933, inúmeros
projetos invadem o Congresso. A equipe
do presidente, principalmente o Brain
Trust, demonstra uma atividade febril.
• A 9 de março, uma lei reorganiza o
sistema bancário e permite a reabertura
dos bancos.
• Nascem vários órgãos federais.
• O Civilian Conservation Corps (CCC), conduzido
por militares, empregará 250 mil pessoas, que
passam a trabalhar nas estradas, florestas e
parques nacionais.
• A Federal Emergency Relief
Administration (Fera) destinará US$ 500 milhões
aos estados e municípios para que criem
empregos.
• O Agricultural Adjustment Act (AAA) tenta
remediar a crise agrícola limitando a
superprodução, elevando os preços, e ajudando
os fazendeiros que aceitarem reduzir a
superfície cultivada.
• A Tennessee Valley Authority (TVA)
valorizará o vale do Tennessee, construirá
barragens hidrelétricas, facilitará a
irrigação e assegurará o desenvolvimento
regional.
• A National Industrial Recovery Act (Nira)
visa dar novo vigor às atividades
industriais, e confia aos empresários a
iniciativa de concluir acordos com a ajuda
do federal. O artigo 7 dessa lei garante
aos trabalhadores o direito de formar
sindicatos. A Civil Works
Administration (CWA) dará assistência a 4
milhões de desempregados.
• O método não se limita aos cem dias do
programa.
• À medida que vários desses organismos vão
desaparecendo, conforme o prazo fixado pela
lei, são substituídos por outras administrações,
formadas segundo o mesmo modelo.
• A Works Progress Administration (WPA) data de
1935 e é sucessora da Fera. A Securities
Exchange Commission (SEC) cuida da
regulamentação das operações da Bolsa.
A Rural Electrification Administration (REA)
recebe a missão de eletrificar as zonas rurais.
• A National Youth Administration (NYA) trata do
desemprego dos jovens.
• O National Labor Relations Board (NLRB)
controla o processo de negociações
trabalhistas.
• Cada medida envolve a criação de secretarias,
comitês e serviços para assegurar a aplicação
da lei.
• É como se os Estados Unidos procurassem
compensar seu atraso em relação às pesadas
administrações européias.
• O governo federal torna-se o motor da vida
econômica e social, intervindo em todos os
domínios. Neste sentido, Roosevelt vai contra
os seus predecessores. Ele não acredita mais
na filosofia política do passado. É preciso que o
país entre na modernidade.
• Seis anos após a ascensão ao poder
de Roosevelt, a crise não fora
superada. Os índices econômicos
são reveladores.
• O PIB de 1939 atinge com dificuldade
o nível de 1929; e se o critério
escolhido for o PIB per capita, o
índice de 1939 é ligeiramente inferior.
• A produção industrial experimentou ligeira
melhora em 1937, antes de cair novamente no
ano seguinte e ganhar alguns pontos em 1939.
• O desemprego diminuiu. Todavia, há ainda 9,5
milhões de pessoas sem emprego, ou seja, 17%
da população ativa. O desempregado de 1939
está, é certo, mais bem protegido do que o de
1929. Mas o que colocará a economia
americana nos trilhos será a produção de
guerra. O New Deal teve êxito apenas relativo.
• Somente a guerra retiraria os EUA da crise.
• O fortalecimento do Estado no Brasil
Sonia Draibe:
• "De uma a outra fase da industrialização,
com autonomia, força e capacidade de
iniciativa, o Estado brasileiro planejou,
regulou e interveio nos mercados e
tomou-se, ele próprio, produtor e
empresário; através de seus gastos e
investimentos coordenou o ritmo e os
rumos da economia e, através de seus
aparelhos e instrumentos, controlou e se
imiscuiu até o âmago da acumulação
capitalista.
• Do ponto de vista social e
político, regulou as relações
sociais, absorveu no interior
de suas estruturas os
interesses e se transformou
numa arena de conflitos, todos
eles mediados e arbitrados
pelos seus agentes.
• Manifestou-se como Executivo forte,
como aparelho burocráticoadministrativo moderno e complexo e
passou a operar através de um corpo
cada vez maior e mais sofisticado de
funcionários, os novos burocratas,
metamorfoseados, nestas
circunstâncias, em aparente
'tecnocracia'. (Sonia Draibe)
• “Um tipo de Estado que se enraiza numa
estrutura social heterogênea, em
desequilíbrio tendência!; um tipo de
Estado que se erige sobre um conjunto de
forças sociais em transformação, não
articuladas objetivamente. Finalmente, um
tipo de Estado que (. ..) vai adquirindo, ao
longo do processo de transição, as
estruturas centralizadas, unificadas e
ramificadoras do Estado nacional
capitalista". (Sonia Draibe)
• No vasto setor colonial do mundo, a
Depressão trouxe um acentuado aumento
na atividade antiimperialista, em parte por
causa do colapso dos preços das
mercadorias das quais dependiam as
economias coloniais (ou pelo menos suas
finanças públicas e classes médias), e em
parte porque os próprios países
metropolitanos apressaram-se em
proteger sua agricultura e empregos, sem
avaliar os efeitos dessas políticas sobre
suas colônias.
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Aulas 13 e 14 - História das Relações Internacionais