A guerra pela água na Bolívia Por Jim Shultz Antes de abril de 2000 poucas pessoas de fora da Bolívia haviam ouvido falar sobre Cochabamba, uma cidade de 600 000 habitantes cravada em um vale andino a 8 000 pés de altura. Quatro meses após o início do novo século esse quadro mudou. Cochabamba se tornou a linha de frente da crescente batalha internacional contra as regras da globalização econômica. Enfrentando soldados, resistindo à declaração de uma lei marcial e se levantando contra a onda da teologia do mercado econômico, a população mais pobre da América do Sul expulsou uma das empresas mais ricas do mundo e reconquistou algo simples e básico – sua água. Precursores A experiência da Bolívia com as forças da globalização teve início séculos atrás, em uma outra cidade andina – Potosi. Lá, em 1545, descobriu-se que uma modesta montanha era, literalmente, uma montanha de prata. Por aproximadamente três séculos os colonizadores Espanhóis escavaram da montanha Cero Rico, ou Montanha Rica, prata suficiente para virtualmente sustentar o império espanhol. Eles também causaram, nas palavras de Eduardo Galeano, “8 milhões de corpos indígenas”. Escravos dos mineradores eram mandados em túneis escuros e profundos por seis meses consecutivos. Muitos dos que sobreviveram ficaram cegos ao serem re-expostos à luz do sol. A primeira lição da Bolívia sobre globalização foi essa – um povo abençoado pela Terra com uma das maiores fontes de riqueza mineral da história do planeta encontra-se hoje como sendo uma nas nações mais pobres da América do Sul. Essa memória de terrível abuso e roubo da riqueza para além mar não foi superada pela alma boliviana quando, em 1980s e 1990s, o Banco Mundial e o Fundo Internacional Monetário (FMI) decidiram tornar a Bolívia um laboratório de seus experimentos modernos em economia global. Fazendo uso das ferramentas contemporâneas de poder econômico –empréstimos, ajuda, e perdão da dívida – o Banco Mundial e o FMI influenciaram e basicamente obrigaram o governo boliviano a vender ou arrendar suas empresas estatais para mãos corporativas. Uma por uma, o governo boliviano vendeu ou arrendou a campanhia aérea nacional, a ferrovia e a companhia elétrica, sempre com mesmo resultado desastroso. A pressão mais agressiva do Banco Mundial por privatização focou-se no sistema público de água da terceira maior cidade da Bolívia, Cochabamba. Os oficiais do Banco Mundial que trabalham com questões relacionadas a água acreditam na privatização da mesma forma como outras pessoas acreditam em Jesus, Maomé, Moisés e Buda. Eles argumentam que essa é uma medida essencial para assegurar capitais para o desenvolvimento do sistema de água e para aprimorar seu o gerenciamento. Em público o Banco Mundial ameniza seu discurso, alegando que a privatização é apenas uma das opções e “não uma pílula mágica”. Às portas fechadas, no entanto, oficiais do Banco não são tão sutis. Em fevereiro de 1996 oficiais do Banco Mundial disseram ao prefeito de Cochabamba fariam um empréstimo de $ 14 milhões de dólares para expansão do serviço de água condicionado com a privatização do fornecimento água da cidade. Em junho de 1997 os oficiais do Banco disseram ao presidente boliviano que o perdão de uma dívida de $600 milhões de dólares também dependiam de Cochabamba passar para mãos privadas sua água. Oficiais do Banco Mundial depois alegaram que não gostaram dos detalhes do modo como a Bolívia negaciou a privatização da água, mas o papel do Banco como uma força motora é inquestionável. O governo boliviano seguiu as ordens do Banco Mundial. Em setembro de 1999, em um processo às portas fechas com apenas um concorrente, oficiais bolivianos arrendou a água de Cochabamba até 2039 para uma mistérios e nova empresa chamada Aguas del Tunari – que depois se mostrou ser uma subsidiária da gigante da Califórnia, Bechtel. O contrato da água foi, digamos, um doce negócio. O acordo garantia à empresa 16% de lucro por cada ano dos 40 cobertos pelo contrato. Uma lei sobre a água aprovada paralelamente pelo Congresso boliviano também concedia o controle sobre centenas de sistemas de irrigações rurais e poços comunitários, projetos financiados e construídos pela população local sem ajuda do governo. Apenas poucas semanas depois de assumir o controle da água, a empresa da Bechtel golpeou as famílias locais com um aumento de 200% na taxa de água ou mais. Trabalhadores que viviam com o salário mínimo local de $60 dólares deveriam pagar algo como $15 dólares para continuar tendo água correndo de suas torneiras. Tanya Paredes, mãe de quatro filhos que sustenta a família tricotando roupas de bebês, viu sua conta de água aumentar de $5 dólares por mês para algo próximo a $20 dólares, uma acréscimo equivalente ao seu gasto para alimentar a família por uma semana e meia. “O que pagamos para água sai do que teríamos para pagar comida, roupa e outras coisas que precisamos comprar para nossas crianças”, diz ela. A guerra pela água começa Um movimento cidadão começou a ser formado para desafiar a privatização mesmo antes da introdução da altíssima taxa. Formou-se um grupo que ficou conhecido como La Coordinadora. Sua liderança era composta por representantes de um sindicato dos trabalhadores de uma fábrica local, irrigadores e fazendeiros, grupos ambientais, economistas locais, membros progressistas do Congresso e uma vasto grupo de organizações e associações de base. La Coordinadora nasceu tanto do meio rural como urbano, da classe pobre e média. Em novembro de 1999 a Federação dos Irrigadores, furiosos por causa do entrega de seus sistemas de água, realizou um bloqueio de 24 horas das rodovias que dão acesso a Cochabamba. “Nosso objetivo era testar a capacidade que tínhamos para lutar”, disse Omar Fernandez, líder do sindicato dos irrigadores. “Nós percebemos que nossa base desejava mover ainda mais rápido do que nossa liderança. Na [pequena cidade de] Vinto eles bloquearam as rodovias por 48 horas”. Depois dos bloqueios os usuários rurais de água formaram uma aliança com os usuários urbanos preocupados com a tomada da Bechtel sobre o sistema de água da cidade e, em 12 de novembro de 1999, nasceu a La Coordinadora para a Defesa da Água e da Vida. Em janeiro de 2000, após a companhia de água anunciar o aumento gigantesco na taxa, a Coordinadora ressurgiu do nada com sua primeira ação pública, uma greve geral. Essa não foi uma tática nova em Cochabamba. Uma ou duas vezes ao ano os trabalhadores da empresa de transporte local e outros grupos organizam ações que tiram os ônibus de circulação, bloqueiam pontes e vias, fecham comércio e as escolas e a cidade vive um dia de feriado para jogar futebol ou andar de bicicleta enquanto negociadores tentam alcançar um acordo sobre a demanda do dia. No entanto, a ação de janeiro da Coordinadora contra a alta do preço da água foi diferente. Por três dias Cochabamba parou. Bloqueios fecharam as duas principais rodovias de acesso à cidade, eliminando o transporte via ônibus e o carregamento de alimentos. O aeroporto foi fechado. Ruas bloqueadas por pilhas de pedras e árvores interromperam todo o trânsito da cidade. Milhares de Cochabambinos ocuparam a praça central da cidade. Em uma esquina da praça a Coordinadora montou sua sede no escritório do sindicato dos trabalhadores de uma fábrica local. Uma imensa bandeira vermelha pendurada na varanda do terceiro andar anunciava em letras brancas o novo slogan da cidade, El Agua es Nuestra Carajo! Do outro lado da praça fica o gabinete do Governador regional de Cochabamba, um cargo nomeado pelo Presidente. Um dia depois de se recusar a reconhecer a Coordinadora como uma organização legítima, o Governador concordou em se encontrar com seus líderes. Durante a negociação o Governador pôde ouvir o canto enfurecido de milhares de manifestantes quase literalmente em sua porta. O governo finalmente assinou um acordo que iria rever o contrato da empresa de água e a nova lei sobre água se os protestos fossem suspensos. A Coordinadora deu ao Governadou três semanas. Como é de costume na política boliviana, o governo não cumpriu sua palavra. Com a passagem de janeiro para fevereiro e nenhuma mudança na taxa, o povo de Cochabamba recusou-se a pagar a conta para a Bechtel. A empresa, desesperada, ameaçou cortar o fornecimento de água da população. A Coordinadora anuncioou que iria organização uma manifestação a simbólica na praça central da cidade mais uma vez no dia 4 de fevereiro. Estava planejado um simples protesto no horário de almoço para lembrar o governo que o povo ainda o estava vigiando. Algumas centenas de manifestantes marchariam rumo à praça, ouviriam alguns discursos, cobrariam o governo para que mantivesse sua palavra e depois retornariam ao trabalho. “Nós dissemos ao ministro do governo,´Não vai acontecer nada”, disse Oscar Oliveira, líder do Sindicato das Fábricas de Cochabamba e uma das lideranças mais visíveis da Coordinadora. “Será um ato de bandeira branca, com flores e bandas, como uma festa”. O governo anunciou que o protesto não seria permitido e na manhã do dia 4 mais de 1000 policiais pesadamente armados assumiram o controle do centro da cidade, quase todos trazidos de outras cidades (uma vez que o governo não podia contar com a polícia de Cochabamba para bater fortemente de frente contra seus próprios parentes). Para as pessoas de Cochabamba, mesmo para aquelas que não eram simpáticas à revolta da água, a ocupação da polícia foi vista como uma declaração de guerra. O governo não estava mais apenas se recusando a acabar com o aumento abusivo da empresa, agora ele estava protegendo os lucros da Bechetel com gás lacrimogêneo e armas. Por dois dias a região central de Cochabamba se tornou uma zona de guerra. Cada quarteirão em direção à praça se converteu em um mini-campo de batalha. De um lado a polícia bloqueando as ruas com de gás lacrimogêneo. Do outro, manifestantes – jovens, velhos, pobres e de classe média – tinham com pedras e estilingues. Muitos estavam uniformizados com bandanas encharcadas em vinagre sobre sua boca e nariz e fermento sob seus olhos, uma proteção contra o gás. Eu perguntei a um jovem policial se ele atiraria e me mataria caso fosse ordenado por seu capitão. “Sim, se for uma ordem.” Com o conflito persistindo, as portas das casas de classe médias se abriram e comida e água apareceram, como forma de apoio àqueles que estavam lutando contra o governo nas ruas. Praticamente todas as rádios locais se converteram em discussões telefonicas sobre a batalha no centro da cidade, com ligações atrás de ligações condenando o governo e a empresa. Em dois dias mais de 175 pessoas foram feridas, a maioria vítima do gás ou por apanhar da polícia. Qualquer que fosse sua legitimidade pública na questão, o governo a tinha perdido. Ele anunciou um acordo com a empresa para invocar temporariamente um recuo na taxa de água por seis meses. A Coordinadora teve sua primeira vitória. “Isso deu às pessoas muita força, muita energia. Elas se sentiram vitoriosas”, disse Oliveira. Uma mudança de estratégia “Uma cópia do contrato [da Bechetel] era muito difícil de ser conseguida”, disse Omar Fernandez da Coordinadora. “Era como um segredo de Estado”. Por meio de membros do Congresso a Coordinadora finalmente conseguiu ter uma cópia. Depois dos confrontos de fevereiro os líderes da Coordinadora passaram a examinar o contrato mais atentamente, com a assistência de economistas e advogado simpáticos à causa. Eles descobriram a garantia de lucro de 16% para a Bechtel, descobriram também que a empresa ganhou a concessão praticamente sem compromissos de investimento inicial, bem como outras provisões que deixaram claro o quão péssimo foi o acordo que o governo fez. A Coordinadora se convenceu de que eles precisavam mudar seu foco da simples reversão da taxa para o cancelamento do contrato como um todo e colocar o controle da água de Cochabamba sob controle público direto. A demanda para o cancelamente do maior contrato internacional de água foi audaciosa, para dizer o mínimo. Em nenhum outro lugar um protesto popular teve sucesso em reverter um acordo de privatização como esse. Em março, os líderes da Coordinadora utilizaram uma estratégia pioneira organizada por ativistas no México, a consulta popular. Por três dias os ativistas da Coordinadora montaram mesas nas praças e em outros locais públicos pelo Vale de Cochabamba para fazer a seus residentes uma simples pergunta – o contrato sobre a água deveria ser cancelado? Mais de 60 000 pessoas participaram, aproximadamente dez porcento da população do vale. A resposta, pela votação de mais de 90% foi um ensurdecedor sim. “A consulta tornou nosso movimento muito mais participativo”, disse Oliveira. O cancelamento do contrato com a Bechetel se tornou a nova bandeira da Coordinadora. A batalha final Em abril a Coordinadora anunciou o que ela chamou de La Ultima Batalla, a Batalha Final. Os líderes da Coordinadora anunciaram que iriam iniciar uma greve geral e bloqueio das rodovidas sem previsão de término até que o governo atendesse a suas duas demandas – o cancelamento do contrato com a empresa de água e a revogação da lei nacional pela qual o governo entregou à Bechtel o controle sobre os poços e sistemas de irrigação rural. Na terça-feira, dia 4 de abril, a ameaçadora onda de protestos começou e Cochabamba parou novamente pela terceira vez em quatro meses. Na quinta-feira, depois da cidade estar parada por dois dias, oficiais do governo finalmente sentaram para discutir com os líderes da Coordinadora, em negociações moderadas pelo Arcebispo Católico de Cochabamba, Tito Solari. Tarde da noite os líderes da Coordinadora iniciaram suas conversas com o Governador, o Prefeito da cidade, o Arcebispo e outro oficiais. De uma hora para outra, a polícia sob ordem do governo nacional de La Paz surgiu e prendeu todos os líderes da Coordinadora. “Foi uma armadilha do governo nos colocar todos juntos negociando, porque assim poderia prender todos de uma só vez”, disse Oliveira, que foi um dos que foram levados em custódia. O Bispo Solari se trancou em seu escritório a noite toda, dizendo aos repórteres que se a Coordinadora estava presa, ele também estaria. Na sexta-feira, depois que os líderes da Coordinadora foram soltos, os habitantes de Cochabamba aguardavam a qualquer momento uma tomada militar da cidade. O presidente da Bolívia, Hugo Banzer, que havia governado o país durante os anos 1970s como um ditador, era conhecido pelo uso da repressão política. A atmosfera da cidade era incrivelmente tensa, especialmente na praça central onde as notícias das prisões da noite anterior reuniram de mais de 10 000 pessoas. Muitas vieram da cidade, mas milhares delas marcharam longas distâncias do interior e lá permanecerames por dias. Cada comunidade foi chegando carregando uma bandeira com o nome de seu povo. Um oficial de uma cidade rural, que marchou mais de 70 quilômetros para chegar a Cochabamba, disse-me, “Essa é uma batalha por justiça, e pela retirada dos negócios internacionais que, antes mesmo de nos oferecer mais água, começou a cobrar de nós preços absurdamente altos”. Uma reunião foi anunciada para às 16h entre o Governador e a Coordinadora, moderada pelo Arcebispo Solari. Quando se espalhou a notícia que o Governador não apareceu, as pessoas na praça temeram o pior. Meia dúzia de adolescentes escalaram a torre do sino da Catedral para que pudessem tocar o sino como aviso quando os soldados invadissem a cidade. De seu escritório o Governador Hugo Galindo podia ouvir a multidão furiosa. As janelas da fachada do prédio já haviam sido quebradas. Foi colocado fogo na gigante porta de entrada. No horário que ele deveria se encontrar com os líderes da Coordinadora, o Governador ao invés telefonou para seus superiores em La Paz. Ele explicou que ele não viu outra alternativa com exceção do cancelamento do contrato, caso contrário haveria uma guerra entre o povo e o governo. Ele recomendou que o contrato fosse cancelado. Galindo então telefonou para o Arcebispo Solari, e se encontrou no escritório do Arcebispo com os líderes da Coordinadora. Ele contou ao Bispo que urgiu ao Presidente que cancelasse o contrato. Quando o Bispo Solari repassou a mensagem para Oliveira e demais líderes da Coordinadora ela se transformou em algo mais dramático – que a companhia iria embora. Minutos depois, ainda vestindo a bandana com vinagre em volta do pescoço e com manchas de fermento embaixo de seus olhos, Oliveira surgiu na varanda do terceiro andar. “Chegamos a uma vitória econômica importante sobre o neoliberalismo”, ele gritou para a multidão, que vibrou. Ele agradeceu aos vizinhos, aos trabalhadores do transporte, às pessoas do interior, aos estudantes universitários e a todos os outros que batalharam e tornaram a vitória possível. Os Cochabambinos celebraram nas ruas. O Arcebispo Solari presidiu uma missa de celebração com a Catedral lotada. Mas em horas o evento teve uma inesperada virada macabra. O porta voz de Banzer se recusou a confirmar a partida da empresa. Os representantes locais da Bechtel enviaram por fax à imprensa notas declarando que não estavam indo embora. À meia-noite o Governador Galindo foi ao vivo à TV e disse aos habitantes da cidade que ele não queria ser responsável por um “banho de sangue” e renunciou. Policiais começaram a aparecer na porta dos líderes da Coordinadora e de suas famílias, prendendo todos que encontravam. “Por volta da meia-noite eu estava passando pelo prédio do Los Tiempos [o jornal] e um repórter me disse ´o Governador irá declarar Estado de Emergência”, disse Omar Fernandez. “Então eu parti com minha motocicleta e me escondi”. Dezessete pessoas foram colocadas em um avião e foram levadas para uma prisão infestada de mosquitos na remota floresta da Bolívia. Aqueles que conseguiram escapar da prisão, incluindo Fernandez e Oscar Oliveira, foram se esconder. No sábado de manhã habitantes da cidade em pânico correram para os mercados locais, que estava fechados há quatro dias, para estocar comida. Às 10 horas o Presidente Hugo Banzer, o ex-ditador, declarou o Estado de Emergência (lei marcial). Os soldados fecharam canais de TV e estações de rádios. Toda uma seção da cidade, o lado das colinas onde as antenas continuavam a transmitir notícias, tiveram corte de energia. Reuniões públicas com mais de duas pessoas foram banidas. Cochabamba estava sob uma ditadura. A resposta do povo foi rápida e furiosa. Mesmo com seus líderes presos ou escondidos, a Coordinadora convocou a reinstituição imediata dos bloqueios. No meu bairro uma senhora idosa deitou sobre as pedras em nossa rua para bloqueá-la. Os jovens, conhecidos por “guerreiros da água” voltaram ao centro da cidade para desafiar as tropas de Banzer. As mulheres bateram de porta em porta para coletar arroz e outros alimentos para cozinhar para os que permaneciam acampados na praça. Na tarde de sábado o conflito tinha se tornado violento. Manifestantes puseram fogo em um prédio desocupado do Estado, mandando grandes nuvens de fumaça negra pelo céu azul de Cochabamba. Os soldados substituíram o gás lacrimogêneo com tiros. Um canal de televisão local filmou um capitão do Exército, Robinson Iriarte de La Fuente, um graduado pela Escola das Américas dos EUA, disfarçado em roupas civis enquanto ele disparava nos manifestantes. Ao mesmo tempo um garoto desarmado de dezessete anos, Victor Hugo Daza, foi atingido e morto por uma bala em seu rosto. A batalha contra a globalização na terra dos Incas, tragicamente, teve seu primeiro mártir. Seus companheiros levaram seu corpo ensangüentado para a praça e houve uma vigília furiosa e emotiva. Cochabamba atingiu um estado sangrendo. O Presidente Banzer, que agora enfrentava diversos protestos em outros assuntos em cidades por toda a nação, deixou claro que ele não iria cancelar um contrato com uma grande corporação internacional. Sua equipe de relações públicas trabalhou para espalhar uma falsa história para jornalistas estrangeiros de que o aumento no preço tinha sido de apenas 20% e que os protestos em Cochabamba foram orquestrados por “narcotraficantes” tentando desestabilizar o governo. As pessoas de Cochabamba também não iriam recuar. As ruas estavam cada vez mais cheiras. Enquanto os bolivianos estavam arriscando seu sangue, os donos e gerentes estrangeiros da empresa de água estavam fugindo de sua responsabilidade. Os gerentes estrangeiros, hospedados em um hotel cinco estrelas, insistiam em sua demanda para controlar a água, assistindo o sofrimento pela televisão e não atendendo os repórteres que conseguiram seus celulalres. Foi quando decidimos que a vaga conexão entre a empresa e a Bechtel merecia mais uma vez atenção. No domingo de manhã, com o velório de Victor Hugo Daza no centro da cidade, eu comecei a pesquisar sobre a conexão Bechtel-Bolívia na Internet. Depois de examinar por duas horas as páginas na Internet da Bechtel, semelhantes e subsidiárias, nós descobrimos. A Bechtel não era apenas um agente na companhia boliviana de água, mas sim sua fundadora e controladora de 55% das ações. Utilizamo a vasta rede de emails da The Democracy Center para enviar alertas a milhares de ativistas ao redor do mundo, pedindo a eles que pressionassem a Bechtel a deixar o país. Nós também enviamos na mensagem o endereço de email pessoal do Presidente e CEO da Bechtel, Riley Bechtel. Na segunda-feira os confrontos continuaram, embora mais pacíficos se comparados com o final de semana sangrento. Não estava claro como o conflito chegaria a seu fim. Foi quando, no período da tarde, o governo fez um anúncio. Os oficiais da Bechtel haviam deixado o país e o governo declarou o cancelamento do contrato. O oficial nacional responsável pelo acordo com a Bechtel divulgou uma carta que ele havia enviado aos oficiais da Bechtel, “Dado que os diretores de sua empresa deixaram a cidade de Cochabamba e não podem ser encontrados...o dito contrato está cancelado.” A cidade celebrou como se o país tivesse conquistado a Copa do Mundo de futebol, com carros parados pelas avenidas de Cochabamba buzinando. Os líderes da Coordinadora saíram de seus esconderijos e voaram de volta de sua prisão na floresta, recebidos como heróis. Com a partida de Bechtel, a companhia de água de Cochabamba, SEMAPA, foi entregue à diretoria pública nomeada pela Coordinadora e pelo governo da cidade. A taxa sobre a água retornou para o valor anterior ao aumento da Bechtel e os usuários locais da água fizeram filas para pagar suas contas de água. Os líderes da Coordinadora saíram do drama dos protestos nas ruas para se dedicarem a pensar como tornar o trabalho da companhia de água mais eficiente. Os problemas de gerenciamento e de sistema continuaram, mas o fornecimento de água foi levado a novos bairros e a empresa alcançou algo extraordinário. Mesmo na época anterior às taxas da Bechtel, a empresa de água de Cochabamba operava no vermelho. Por isso a empresa começou a buscar empréstimos, seja com Banco de Desenvolvimento Interamericano como com outros, para que o sistema de água fosse ser ampliado. Mesmo as forças das finanças internacionais começaram a aceitar a idéia de que, em Cochabamba, a água era para ficar em mãos públicas. Porquê eles lutaram e porquê venceram A privatização da água é uma tendência e uma preocupação por todo o mundo, e mesmo em outras regiões da Bolívia (o sistema de água da capital, La Paz, foi arrendada para uma empresa francesa chamada Vivendi anos antes). Por que em Cochabamba foi diferente? Por que os Cochabambinos resistiram? Por que eles venceram? “A privatização da água foi a gota d’água”, disse Tom Kruse, um pesquisador norteamericano que vive em Cochabamba e foi um conselheiro ativo para a Coordinadora. Os Cochabambinos enfrentaram uma privatização atrás da outra, sempre com resistência daqueles diretamente afetados – os trabalhadores da companhia aérea, por exemplo – mas nunca forte o suficiente para fazer alguma diferença. A revolta pela água foi uma revolta geral por tudo, uma reação à corrupção oficial, ao declínio econômico, e ao fato do governo se preocupar com tudo menos com o povo. Em um bairro um garoto de dezesseis anos me explicou que ele despertou para a política por causa de um pedaço de pão. “Minha mãe me mandou comprar pão, mas me disse que ela não tinha dinheiro, nem mesmo um Boliviano [cerca de 15 centavos de dólar na época]. Ela me disse para pedir ao dono se poderíamos pagar depois. Eu pensei comigo mesmo, Como pode ser que minha mãe trabalha tanto e não temos nem um Boliviano para comprar pão? Foi quando me dei conta que algo estava realmente errado”. Quando a Coordinadora chegou em seu bairro para organizar a resistência à privatização da água o garoto viu a chance de fazer alguma coisa. “As pessoas mais velhas nos contam histórias sobre as ditaduras [Banzer e outros se espalharam pela Bolívia nos 1960s e 1970s], mas nunca estivemos diretamente envolvidos em conflitos como daquela época”, explica Leny Oliveira [que não tem relação com Oscar], universitária de 23 anos. Ela acrescenta, “Acredito que essa foi uma chance para que nossa geração pudesse mostrar coragem”. A água é algo essencial para a vida, diferente de um avião ou mesmo eletricidade em um país pobre. As pessoas sabiam que se perdessem o controle sobre sua água, perderiam o controle sobre suas vidas. A Coordinadora deu às pessoas uma esperança que era algo novo. Após anos de protestos que não davam em nada, a Coordinadora deu às pessoas a esperança de que o povo poderia de fato se organizar e vencer. Houve uma unificação da população rural com a urbana, que foi absolutamente chave para o sucesso. “Muitas pessoas dizem que é impossível lutar contra o modelo neoliberal”, diz a universitária Leni Oliveira, “Mas provamos que é possível, e não só na Bolívia como no mundo. As pessoas humildes são maioria e são mais poderosas do que corporações multinacionais”. Inadvertidamente, tanto a Bechtel como o governo Boliviano colaboraram enormemente para o sucesso das revoltas. Se a Bechtel tivesse aumentado a taxa de forma gradual ao longo do tempo, as revoltas não teriam tido tamanho apoio com que contaram. Se o governo da Bolívia tivesse deixado que os protestos de fevereiro ocorressem sem resistência, ele não teria provocado tamanha fúria pública que tornou, virtualmente, todos em apoiadores da Coordinadora. No fim, essa não foi uma revolta apenas contra a privatização da água, mas contra a arrogância e a atitude do Banco Mundial, da Bechtel e de Banzer que disse, “Vocês estão perdendo o controle sobre sua água e terão que pagar mais por ela, aceitem e fiquem quietos”. Foi por ser uma revolta contra a arrogância que a revolta boliviana pela água teve tamanha e profunda ressonância na batalha mais ampla contra a globalização imposta do alto. O nascimento de um símbolo internacional A revolta de Cochabamba pela água se tornou um símbolo internacional de uma versão moderna do conflito entre Davi e Golias. A revolta pela água teve ampla atenção da mídia internacional. Oscar Oliveira foi premiado com o internacionalmente prestigiado Premio Goldman de ativismo ambiental. Cochabamba se tornou sinônimo de luta por uma economia global justa, uma verdadeira fonte de inspiração e de esperança. A forma como a revolta pela água deixou de ser uma batalha local e se tornou um ícone internacional é uma grande estória em si, produto da Internet, e um golpe de sorte. Durante a revolta pela água, a cobertura oficial da Bolívia para o mundo era reportada pela Associated Press (AP), que circula no New York Times e em outros grandes jornais. No entanto, o correspondente da AP na Bolívia escrevia todas as suas matérias na distante La Paz e basicamente repetia a nota do dia do governo boliviano. Mais tarde veio à tona que o correspondente da AP que estava cobrindo a revolta pela água estava também fazendo lobby no Congresso boliviano para a aprovação de um projeto de exportação de água da Bolívia para o Chile, revelação essa que iria custar seu emprego. A única cobertura internacional diretamente da cena foi a minha. Eu estava em Cochabamba porque lá é onde moro. A cada manhã enquanto a revolta se aprofundava eu caminhava a longa colina até o centro da cidade, o núcleo dos protestos, para conseguir minhas histórias. Depois subia toda a colina à tarde para enviar despachos para os 2000 contatos de imprensa e organizações da lista de emails da Democracy Center. A rapidez com que as notícias se espalhavam e a distância que alcançavam eram incríveis. Meus escritos eram sindicados pelo Pacific News Service e repassadas para publicações por todo os EUA e Canadá. Essas histórias depois inspiraram outros escritores do New Yorker, San Francisco Chronicle e de outros lugares para escreverem suas próprias histórias. O mais importante foi que ativistas de diferentes partes do mundo assumiram a luta de Cochabamba e fizeram sua parte disseminando o alerta e atormentando a Bechtel com mensagems de “Vá embora!”. Ativistas da água na Nova Zelândia receberam meus alertas e perguntaram o que poderia fazer para ajudar. Com a revolta ainda repercutindo na Bolívia, ativistas em Auckland pegaram um caminhão pipa, cobriram-no com cartazes anti-Bechtel e anti-Banzer, e dirigiram até o consulado boliviano e diante dos olhares da mídia local, abriram as mangueiras com alta pressão. Eles enviaram fotos do evento para nós em Cochabamba, que foram entregues à imprensa local. Um jornal da cidade, Gente, dedicou sua primeira página a essa história, surpreendendo os Cochabambinos com o fato da rebelião local ter conquistado a atenção do mundo. A revolta de Cochabamba inspirou milhares de jovens no outro hemisfério a irem para Washington DC protestar contra uma reunião conjunta entre o Banco Mundial e o FMI, a maior ação de globalização deste Seattle realizada cinco meses antes. Meu colega Tom Kruse deve a idéia de comprarmos uma certa proteção política para Oscar Oliveira que estava tendo que se esconder para não ser preso pelo governo. Ao convencer grupos nos EUA a convidarem Oscar para participar de seus eventos em Washington, a idéia não era que Oscar de fato participasse, mas repassar esses convites à imprensa boliviana para que o governo boliviano hesitasse antes de prender alguém que tivesse tamanha visibilidade internacional. Na quarta-feira, quando a revolta pela água tinha acabado de se encerrar e o cheiro do gás ainda estava no centro da cidade, Oscar nos disse que ele achava que realmente deveria ir para Washington para compartilhar o que acabara de acontecer em Cochabamba. Os protestos em Washington ocorreriam em dois dias e Oscar não possuia nem um passaporte boliviano nem o visto para entrar nos EUA (o que geralmente leva meses para se tirar). Na quinta-feira de manhã Oscar foi ao escritório que emite passaportes que, por acaso, era dirigido por um ex-colega de escola dele. Seu passaporte ficou pronto em menos de uma hora e na mesma manhã Oscar e Tom voaram para La Paz na tentativa de conseguir a difícil tarefa de convencer a embaixada dos Estados Unidos a conceder um visto de entrada imediato para um homem usando um relógio de pulso do Che Guevara e que acabara de liderar uma campanha contra uma das maiores empresas dos Estados Unidos. Enquanto Oscar estava na sala de espera da Embaixada, em Cochabamba eu recebi a ligação de um jornalista de um dos maiores jornais dos EUA implorando para que eu o ajudasse a garantir uma entrevista com Oscar. Eu sugeri uma barganha: se ele concordasse em telefonar para a Embaixadora dos EUA e perguntasse se ela daria o visto para Oscar, eu agendaria a entrevista. O jornalista aceitou a proposta e poucas horas depois Oscar deixou a embaixada dos EUA com o visto estampado em seu novíssimo passaporte. Na sexta-feira Oscar, Tom e eu voamos para Washington. Na noite de sexta-feira, minutos depois de deixarmos o avião após um longo vôo do sul para o norte, Oscar encontrou uma sala repleta de ativistas. “Oscar chegou à igreja onde estávamos organizando nossa grande luta contra o Banco Mundial no fim da noite, disse Maude Barlow, presidente nacional do Conselho Canadense e líder de campanhas pelo direito à água. “Quando Oscar subiu ao palco, as pessoas se levantaram de suas cadeiras e o saudaram com mais de 10 minutos de aplauso. Não havia uma pessoa que não tivesse lágrima nos olhos, incluindo eu. Esse foi o evento mais marcante de minha vida”. No sábado Oscar esteve junto com um grupo de pessoas que foram até a casa do Presidente do Banco Mundial, James Wolfensohn, para levar uma mensagem sobre os impactos reais que as políticas do Banco causavam em países pobres. Ainda usando seu chapéu de trabalhador, Oscar discursou para um comício de 10 000 no Washington Mall, bem em frente à Casa Branca. Nesta tarde ele também conduziu uma procissão de milhares de pessoas pelas ruas da capital do país mais poderoso do mundo. E só de pensar que uma semana antes ele estava se escondendo, Victor Hugo Daza era assassinado e a Bolívia estava sob estado de lei marcial. Caminhando com Oscar, perguntei “O que achou dos Estados Unidos?”. Ele fez uma pausa e me respondeu em espanhol “Es como Cochabamba. Hay policias y jovenes en todo lado”. Epílogo – a Guerra da Água, fase dois Em novembro de 2001 a Empresa Bechtel iniciou a fase dois da guerra pela água em Cochabamba ao apresentar um demanda de $25 milhões de dólares contra a Bolívia em um tribunal de comércio secreto operado pelo Banco Mundial, a mesma instituição que forçou a privatização na cidade. O objetivo da Bechtel, eles diziam, era simplesmente recuperar aquilo que investiram. “Não estamos querendo nada extra da Bolívia, apenas queremos recuperar nossos custos”, explicou Michael Curtin, o chefe da empresa de água da Bechtel na Bolívia. Assim que a revolta pela água se tornou um símbolo internacional dos abusos das privatizações dos serviços básicos, a disputa Bechtel vs. Bolívia se tornou um símbolo internacional no direito comercial internacional. A Bechtel não investiu nem de perto $25 milhões na Bolívia nos poucos meses que operou em Cochabamba. Os oficiais da Bechtel pagaram os carros alugados e quartos de hotel cinco estrelas com os fundos da empresa pública de água e a Bechtel saiu do país sem pagar uma conta de eletricidade de $90 000 dólares. A Bechtel se mascarou de empresa holandesa ao trocar o registro boliviano por uma caixa postal em Amsterdã na esperança de ser coberta pelo tratado Bolívia-Holanda que torna o Banco Mundial o árbitro de suas disputas de investimento. Os valores no caso Bechtel vs. Bolívia eram altos. $25 milhões de dólares é o que a Bechtel ganha em meio dia. Mas na Bolívia esse é o custo anual de se contratar 3000 médicos rurais ou 12 000 professores de escola pública, ou de prover para 125 000 famílias que não tinham acesso ao sistema público de água esse serviço básico. Mas os interesses e efeitos deste caso ultrapassam a Bolivia. O tribunal de comércio secreto do Banco Mundial é um protótipo da posposta de Área de Livre Comércio das Américas (ALCA). O mesmo instrumento usado por Bechtel contra a Bolívia poderia então ser usado por outras empresas para revogar leis ambientais na Califórnia, regras de saúde em New Hampshire e proteções dos trabalhadores na Venezuela – em todos esses casos em nome da derrubada de barreiras ao comércio. Em agosto de 2002 mais de 300 grupos de cidadão de 41 diferentes países, ambientalistas, líderes trabalhistas, grupos feministas, líderes indígenas e outros – lançaram sua própria segunda fase da revolta boliviana pela água ao submeter uma Petição Internacional de Cidadãos ao Banco Mundial demandando que as portas do tribunal de comércio secreto fossem abertas para o escrutínio e participação pública. “As ações da Bechtel na Bolívia deixaram uma cidade de mais de 600 000 pessoas em tumulto por quatro meses”, escreveram os grupos. “Deixaram centenas de pessoas feridas e um jovem morto, além de terem ameaçado o acesso de milhões de pessoas ao elemento mais fundamental da vida”. “A revolta boliviana pela água teve um impacto enorme na luta mundial pelo direito à água”, disse Maude Barlow. “Muitas pessoas perceberam que se uma das populações mais pobres do mundo foi capaz de se levantar contra o Banco Mundial e a Bechtel, então todos poderíamos. As histórias pessoais de heroísmo e de luta do povo boliviano são fortes e têm sido recitadas mais e mais pelo mundo.” [1] Eduardo Galeano, Open Veins of Latin America, (New York: Monthly Review Press), 32. [2] Vincent Gouarne e John Briscoe, “Don’t shut the tap on private sector water”, Globe and Mail, 18 de maio, 2000 [3] "Banco Mundial es Claro: Sin privatizacion de SEMAPA no hay agua potable para Cochabamba [O Banco Mundial é claro: sem a privatização da SEMAPA não haverá água potável em Cochabamba]", Primera Plana (La Paz), 29 de fevereiro, 1996, 10. [4] "Organismos mulilaterales, presionan al Gobierno: Condonaran $US 600 milliones de deuda si privatizan SEMAPA de Cochabamba [Organismos multilaterais pressionam o governo: perdoraão uma dívida de $600 milhões dólares se houver a privatizão da SEMAPA de Cochabamba]...", El Diario (La Paz), 1 de julho, 1997, 5. [5] Iriarte depois foi colocado em um tribunal militar boliviana e foi inocentado e imediatamente depois o Exército o promoveu como Major. [6] Transcrição do “Leasing the Rain”, veiculado pela PBS, 5 de julho, 2002: http://www.pbs.org/now/transcript/transcript125_full.html Jim Shultz, diretor executivo do The Democracy Center (http://www.democracyctr.org), vive em Cochabamba, Bolívia, e é autor do "The Democracy Owners'Manual" (Rutgers University Press). Suas reportagens sobre a revolta pela água em Cochabamba foram honradas entra as melhores histórias do ano do Project Censored.