Técnicas de Transportes – Primeira Parte CARACTERÍSTICAS DO TRÁFEGO Capacidade de uma via é a medida da sua possibilidade de acomodação do fluxo de tráfego. A capacidade sofre influência direta da geometria da via. As principais características do tráfego são: 1) FLUXO: número de veículos que passa por uma determinada secção de via na unidade de tempo. É também denominado volume de tráfego. Os fluxos mais comumente analisados são: a) Anual: utilizado para determinação do índice de acidentes, estimar receitas para pedágios e estudar tendências de tráfego. b) Diário médio, ou simplesmente VDM (Volume Diário Médio): avaliar distribuição de tráfego, medir demanda e programar melhorias. c) Horário: estudos de capacidade, projetos geométricos e controle de tráfego. Variações de Fluxo: a) Diária: fluxos horários ao longo das 24 horas do dia. De maneira geral, este é elevado na parte da manhã e da tarde, com um período vespertino de fluxo constante mais reduzido que o destes períodos. Da relação entre o fluxo de uma hora e o total tem-se o fator: k = ( fluxo de uma determinada hora ) / VDM b) Semanal: é o fluxo diário variando durante uma semana. Em vias urbanas, o fluxo mantém-se constante durante os dias úteis, sendo mais elevados os fluxos das segundas e sextas-feiras, respectivamente. Nas vias rurais e turísticas, o fluxo é maior nos fins-de-semana e menor no decorrer dos demais dias. c) Anual: é a variação dos fluxos no decorrer de um ano. A variação é mais sensível no período das férias escolares. d) Horária: importante para definir a intensidade do tráfego durante a hora de pico e sua uniformidade, definida pelo fator de pico horário (FPH) FPH = ( Fluxo Hora de Pico ) / 4 * (Fluxo dos 15 minutos de maior tráfego) Para o dimensionamento de uma via, leva-se em conta a variação anual dos fluxos horários. Se fosse adotado o maior fluxo como referência, os custos de construção também seriam máximos. Ao traçar a curva de (fluxo) x (ordem das horas) obtém-se claramente um ponto de inflexão, que é tomado como a demanda necessária. A ARTESP (Agência Reguladora dos Transportes do Estado de São Paulo) tolera 50 horas anuais de desempenho insatisfatório. 2) COMPOSIÇÃO: medida em porcentagem, corresponde aos diferentes veículos os quais formam o tráfego. Tem importância no dimensionamento das pistas de rolamento, no projeto geométrico das vias, no sistema de transportes entre outros. Os veículos são classificados em leves (automóveis, utilitários e camionetas) e pesados (caminhões e ônibus). Há ainda uma classificação básica para caminhões, que os coloca como médios (eixo traseiro simples), pesados (eixo traseiro duplo) e carretas (reboques e semi-reboques). São os veículos pesados que interferem na mobilidade dos veículos e devem ser convertidos em fluxo equivalente de carros de passageiros quando levados em conta no dimensionamento da via. 3) VELOCIDADE: Há sempre o interesse de se cruzar a maior distância possível no menor tempo, levando-se em conta fatores tais como conforto e segurança. A velocidade é dependente de alguns fatores: geometria da via, trânsito existente, de cada veículo e seu respectivo condutor, do clima e da sinalização. Conceitos de velocidade: a) Velocidade de projeto ou diretriz (Vp): velocidade selecionada de acordo com o projeto geométrico da via. É a máxima velocidade de segurança que pode ser mantida. De uma maneira geral, quanto maior a velocidade diretriz, maiores são os custos de construção. b) Velocidade média de projeto (Vmp): média ponderada das velocidades de projeto dos diversos trechos de uma via. c) Velocidade instantânea ou pontual (Vi): é a velocidade desenvolvida por um veículo num dado instante, medida por velocímetros e/ou “radares”. Usada para efeito de fiscalização. d) Velocidade de operação (V): aqui tem especial importância a distribuição de velocidades em uma via, já que a velocidade de operação é definida como a Velocidade do 85º Percentil (velocidade abaixo da qual 85% dos veículos trafegam). Tem interferência direta da velocidade diretriz, do atrito com os demais veículos, da presença de aclives/declives e do nível de fiscalização. e) Velocidade Comercial (ou média global): é a velocidade determinada pela extensão do trecho e o tempo de percurso, incluindo-se paradas. A ocorrência de variações de velocidade se deve a alguns fatores: - Volume de tráfego; - Hora do dia (mais elevada de manhã e à tarde); - Tipo de via e área (mais baixa em vias próximas ao centro das cidades e aumentando progressivamente à medida que se afasta das cidades) - Tipo de veículo; - Faixas da via (as velocidades são inferiores nas faixas externas, mais na direita que na esquerda, e aumentam nas faixas internas, da direita para a esquerda). 4) DENSIDADE: é a quantidade de veículos por unidade de distância. Percebe-se que tal quantidade depende diretamente do espaçamento entre os veículos. O espaçamento (e) é a distância entre as partes dianteiras de dois veículos sucessivos em uma mesma faixa. O intervalo (I) é o tempo transcorrido entre a passagem de dois veículos sucessivos por determinado ponto. Então: e = V * I O espaçamento médio quando se trata de mais veículos é melhor representado pela relação: D = 1000 [m/km] / (e médio) [m/veic.] Ou ainda, usando-se o fluxo como relação: F = 3600 [s/h] / I [s/veic.] Portanto: F [veic/h] = V [km/h] * D [veic./km] Observe que, se fosse possível aumentar indefinidamente a velocidade e a densidade fluxos cada vez maiores seriam obtidos, mas, na verdade: - Quando a densidade é mínima a velocidade é limitada pela geometria da via (velocidade diretriz). Com o aumento da densidade, o espaçamento diminui e a velocidade cai. Na densidade máxima (pára-choque à pára-choque), a velocidade é zero. O fluxo aumenta a partir da densidade zero e atinge um ponto crítico, e começa a cair à medida que a densidade continua aumentando (quando a densidade é máxima, a velocidade é zero e o fluxo, idem). 5) CAPACIDADE: número máximo de veículos que pode passar sobre uma dada seção de uma faixa ou via com uma direção durante a unidade de tempo em condições normais de tráfego/via. Sobre condições ideais entende-se por: - Fluxo contínuo, livre de interferências (pedestres, por exemplo); - Presença de apenas veículos leves de passageiros; - Faixas de 3,6m com acostamento, sem obstruções laterais a menos de 1,8m; - Alinhamentos verticais e horizontais satisfatórios, garantindo uma velocidade maior ou igual a 112 km/h e distâncias de visibilidade superiores a 450m. Nas “vias ideais” a capacidade é de 2000 veículos/h/faixa quando se dispõe de várias faixas, 2000 veículos/h total em ambos os sentidos (duas faixas com duas mãos de direção) e 4000 véiculos/h total em ambos os sentidos para vias de três faixas com duas mãos de direção. NÍVEIS DE SERVIÇO: São medidas das condições de operação de uma dada via. É qualitativa e leva em conta inúmeros fatores, incluindo dentre estes a velocidade, o tempo de viagem, interrupções no tráfego, liberdade e conforto, além de oferecimento de serviços de conveniência, segurança e custos. São definidos 6 níveis de serviço que devem obedecer condições básicas para enquadramento em cada um destes: velocidade padrão (alterada a cada nível de serviço, e sempre inferior à velocidade de projeto) e grau de saturação máximo (abaixo do qual deve estar o fluxo da subsecção estudada). Grau de saturação = Fluxo / Capacidade Nível A – Escoamento livre, fluxo baixo e alta velocidade. O único controle do escoamento deve-se ao motorista, à fiscalização, e condições geométricas da via. Nível B – Fluxo estável e velocidades de operação ligeiramente restritas às condições de tráfego. Ainda há liberdade de movimento. Nível C – Fluxo ainda estável, mas a liberdade e velocidade de movimentação já são controladas pelas condições de tráfego. A velocidade ainda é satisfatória, mas as ultrapassagens já não são irrestritas. Nível D – Próximo à instabilidade, o nível D apresenta velocidades toleráveis afetadas constantemente pelo tráfego. Os motoristas perdem liberdade de movimento e, portanto, são condições toleradas por períodos pequenos de tempo. Nível E – O fluxo é instável e as paradas já são momentâneas. A velocidade não passa os 50 km/h. Nível F – O escoamento é forçado, há formação de filas e congestionamento. As paradas se tornam constantes e podem demorar. A ARTESP recomenda que nas rodovias privatizadas do estado de São Paulo, o nível de serviço seja pior que D em no máximo 50h/ano. Fatores que afetam a capacidade e volume de serviço: 1) Fatores físicos: a) Largura da faixa: faixas estreitas tem capacidade reduzida; b) Obstrução lateral: muros de retenção, sinalização, semáforo, carros estacionados reduzem a largura efetiva da faixa (estreitamento psicológico da pista); c) Efeitos anteriores combinados: para efeitos de cálculo, é tomada a média aritmética dos fatores de correção f1 e f2 (de cada lado da pista); d) Acostamento: a presença de acostamento aumenta a largura efetiva da faixa, e portanto, a capacidade da via é menos afetada. e) Faixas auxiliares: são utilizadas para aceleração/desaceleração, conversões, trechos de entrelaçamento, caminhões e ultrapassagens. Também aumentam a largura efetiva da via. f) Superfície: uma pavimentação deteriorada afeta a segurança, o conforto e a velocidade na via, gerando uma redução na capacidade. g) Alinhamentos: os alinhamentos vertical e horizontal afetam a qualidade do escoamento de tráfego, alterando a velocidade de projeto, a visibilidade e segurança nas ultrapassagens. h) Rampas: as rampas afetam a capacidade da via, pois reduzem a visibilidade à distância, à ultrapassagem, e também afeta a distância de frenagem dos veículos bem como reduzem a velocidade de caminhões em aclives acentuados. Em vias de pista simples, este efeito é mais bem observado, uma vez que a ultrapassagem é proibida, e o caminhão afeta a velocidade dos demais veículos em sua frente e em sua traseira. i) Caminhões: devem ser considerados com fatores de equivalência, uma vez que sempre ocupam o espaço de mais de um veículo, especialmente em vias com aclives e declives numerosos. 2) Fatores de tráfego: a) Tipos de veículos presentes na via (caminhões devem ser calculados em função das inclinações de rampas, ônibus são considerados equivalentes a 1,6 veículo de passageiro); b) Distribuição de veículos por faixa – medido pelo fator direcional (um fator direcional de 0,65 indica que 65% dos veículos dirigem-se em direção ascendente); c) Variações do fluxo de tráfego – medido pelo FPH; d) Interrupções do tráfego: pedágios, intersecções, cruzamentos em nível etc. Cálculo dos níveis de serviço: a) Capacidade (uvp/h) Pistas com mais de uma faixa: C = 2000 * n * fL Onde: C = capacidade (uvp/h em um sentido) n = número de faixas em um sentido fL = fator de ajuste de largura e obstrução lateral Pistas simples: C = 2000 * fL Onde: C = capacidade (uvp/h em ambos os sentidos) fL = fator de largura e obstrução lateral b) Fluxo (uvp/h) Deve ser convertido em unidades equivalentes para ser comparável com capacidade, assim: F = Fa + Fb*fb + Fc*fc Onde: F = fluxo equivalente (uvp/h) Fa = fluxo de automóveis Fb = fluxo de Ônibus Fc = fluxo de Caminhões fb = fator de equivalência de ônibus – usualmente 1.6 fc = fator de equivalência de caminhões – dependente das dimensões da rampa e/ou visibilidade. c) Volume de serviço: O nível de serviço é determinado por duas características: - Índice de Saturação da via: relação entre fluxo equivalente e capacidade; - Velocidade de operação: função da velocidade diretriz e do índice de saturação; Observações: - O nível de serviço aumenta se a velocidade de projeto é a mesma (112 km/h), mas o número de faixas também se eleva; - Nos níveis D e E, a velocidade é baixa, e o número de faixas não faz diferença; - A influência do FPH deve-se nos níveis C e D. Em vias idênticas, um menor FPH (fluxos dispersos) gera pior nível de serviço; - Quando a velocidade de projeto é baixa, certos níveis de serviço tornam-se inadmissíveis. ESQUEMA PARA CÁLCULO DE NÍVEIS DE SERVIÇO 1º - Encontrar a capacidade da via C = 2000 * n * fL n é o número de faixas e fL é a média aritmética dos fatores de obstrução 2º - Encontrar o fluxo equivalente F = Fp * (% automóveis) + Fp * (% caminhões) * fc Onde Fp é o fluxo de projeto e fc o fator de correções para caminhões. Para fc, assuma o pior nível de serviço possível, e calcule F/C 3º - Encontrar o nível de serviço Com o valor de F/C e FPH, obtenha o nível de serviço 4º - Corrigir o valor de F/C Observe se o nível de serviço obtido corresponde com o utilizado na tabela para obtenção do fc. Caso seja, o valor de F/C está correto, caso contrário, obtenha o novo fluxo equivalente e o F/C correto.