ENQUALAB-2009 – Congresso da Qualidade em Metrologia Rede Metrológica do Estado de São Paulo - REMESP 01 a 04 de junho de 2009, São Paulo, Brasil MONTAGEM DO POLARÍMETRO AUTOMÁTICO DE ALTA RESOLUÇÃO PARA A CALIBRAÇÃO DE PADRÕES DE QUARTZO A.D. Alvarenga1, N.C.E. Pereira2, L.V.G. Tarelho3, R.S França4 Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, Duque de Caxias, Brazil, [email protected], [email protected], [email protected], [email protected] 1 Resumo: O Inmetro, num projeto de colaboração com o PTB está construindo um polarímetro primário de alta resolução que fará a calibração dos padrões de transferência de quartzo usados na calibração dos sacarímetros e polarímetros utilizados nas indústrias sucroalcooleira, de fármacos e de alimentos. Na etapa atual deste projeto, os componentes do instrumento estão sendo montados e suas funções integradas através da programação em LabView. Apresentaremos os primeiros resultados das calibrações de padrões de quartzo no novo equipamento automatizado, comparando estas medições às obtidas no protótipo de estudos de 2008. Palavras chave: rastreabilidade metrológica, polarímetro, automação. 1. INTRODUÇÃO Um dos fatores muito importantes para a competitividade da Indústria Nacional é a rastreabilidade metrológica de padrões. Sua aplicação nos processos industriais tem um efeito impactante na comercialização dos produtos, na medida em que o controle de qualidade, em obediência às regulamentação dos setores, implicará no processo de superação de barreiras técnicas às exportações. A modernização do setor sucroalcooleiro no Brasil contou com a adoção dos métodos de análise de açúcar internacionalmente reconhecidos e recomendados pela ICUMSA (International Commission for Uniform Methods of Sugar Analysis) [1] e pela OIML (Organization Internationale de Métrologie Légale) [2]. Esta ação objetivou a padronização dos procedimentos nos laboratórios das usinas, e a busca da certificação pelas normas ISO referentes ao setor. O Painel Setorial do Açúcar e Álcool realizado no Inmetro deixou claras as necessidades do setor, e foi formado o Grupo de Trabalho de Sacarimetria, com participantes da Divisão de Metrologia Óptica (Diopt) e da Divisão de Metrologia Legal Dimel). A Diopt está construindo um Polarímetro de Referência, que fará a calibração dos padrões de transferência de quartzo usados na calibração dos sacarímetros e polarímetros utilizados nas indústrias sucroalcooleira e também de fármacos e de alimentos [3]. A Dimel está fazendo a parte de Regulamentação técnica, com a edição das normas necessárias. O método polarimétrico para a calibração de padrões foi desenvolvido na Alemanha, e desde 1898 se constitui num serviço regular oferecido pelo PTB (Physikalisch Technisch Bundesanstalt, em Braunschweig), o instituto nacional de metrologia alemão. Este método tem sido desde então aperfeiçoado, e hoje o PTB tem o único polarímetro primário para calibração de padrões de quartzo. Em busca da excelência, o Inmetro firmou uma colaboração com o PTB para a construção de um polarímetro de alta resolução, baseado em seu novo equipamento [4]. Na etapa atual deste projeto na Diopt, os componentes do instrumento estão sendo montados e suas funções integradas através da programação em LabView. Apresentamos os primeiros resultados das medições de padrões de quartzo no novo equipamento, comparando-as às obtidas no Protótipo de Estudos, um equipamento onde o posicionamento angular era feito manualmente [5]. 2. O MÉTODO EM SACARIMETRIA O método polarimétrico baseia-se na propriedade de girar o plano de polarização da luz, que algumas substâncias apresentam, como a sacarose e o quartzo cristalino. Através da medição do ângulo de rotação produzido por essas substâncias, é possível calcular a concentração de sacarose em uma solução, e ainda fabricar um padrão de quartzo que substitua uma solução padrão de sacarose, fazendo-o de tal forma que ambos apresentem o mesmo valor de rotação [35]. Grande parte da indústria sucroalcooleira nacional já aderiu voluntariamente ao Sistema do Consecana-SP (Conselho dos Produtores de Cana-de-Açúcar, Açúcar e Álcool do Estado de S. Paulo) [6] para o pagamento da cana-de-açúcar pelo teor de sacarose. Neste sistema são levados em conta critérios técnicos para avaliar a cana-de-açúcar entregue às usinas pelos plantadores, e também para determinar o preço a ser pago. O valor a ser pago se baseia no chamado Açúcar Total Recuperável (ATR), uma formulação onde entram: a concentração de sacarose, a subtração do percentual de perdas durante o processamento, e índices de mercado com os preços do etanol e do açúcar vendidos pelas usinas nos mercados interno e externo. Um dos principais componentes da ATR é conhecido como POL, que é justamente a medição do ângulo de rotação da polarização da luz causada pelo caldo-de-cana purificado e clareado, feita em um sacarímetro. Este instrumento é um polarímetro específico para a indústria sucroalcooleira, pois o valor da POL é fornecido em graus Z (de açúcar em alemão). A exatidão dessa leitura sacarimétrica pedida pela indústria sucroalcooleira é de décimos de graus. Assim, o padrão que será usado para calibrar estes sacarímetros precisa ter uma incerteza na casa de centésimos de graus, de acordo com as normas [1, 2]. Um sacarímetro descalibrado representa prejuízo: dependendo se para mais ou para menos, é uma fonte de conflito entre os produtores e usineiros. No final do processo industrial, o açúcar produzido também é testado, e sua POL entrará no preço que os compradores internos e externos pagarão às usinas produtoras. Daí vem a grande importância econômica da calibração dos sacarímetros. O projeto de construção do novo polarímetro do Inmetro na Diopt começou com a montagem de um protótipo feito com os equipamentos já disponíveis, enquanto esperávamos pela chegada dos equipamentos importados, definitivos. Esta montagem, assim como detalhes de medições podem ser vistas na referência [5], onde relatamos detalhadamente a análise dos dados, e apresentamos as medições de quatro padrões previamente calibrados no PTB 3. O NOVO POLARÍMETRO Um estudo polarimétrico é realizado basicamente pela irradiação com laser de uma amostra de interesse posicionada entre dois polarizadores cruzados. A determinação da rotação óptica da amostra é obtida pela reconstrução do sinal de nulo dos polarizadores em um detector de radiação e um multímetro. O primeiro polarizador é chamado gerador e o segundo é o analisador cuja rotação permite recuperar o ângulo de desvio introduzido pela amostra. A medição deste ângulo através da determinação do ponto de mínimo de um ajuste parabólico é considerada uma boa técnica para detecção de extinção de um sinal (sinal nulo). No entanto um ajuste parabólico é mais complexo e sujeito a maiores incertezas. Uma evolução desta técnica é a adição de um modulador de birrefringência (Faraday) entre os polarizadores, permitindo não somente a otimização da razão sinal-ruído em tais experimentos, mas favorecendo a componente dispersiva em detrimento da absorptiva (parte real da susceptibilidade atômica aumentada em relação à parte imaginária). Outra melhoria desta técnica secular é a detecção sensível à fase do sinal do detector, reduzindo o ruído atribuído a um sinal DC devido à modulação criada pela Bobina de Faraday em substituição ao multímetro. A técnica lock-in é referenciada à freqüência de operação do modulador de Faraday e a condição de extinção do sinal do detector para polarizadores cruzados pode ser determinada com alta resolução através de um ajuste de reta. Nos dois métodos para encontrar o ângulo desejado no qual o sinal do multímetro (ou lock-in) seja zero, promove-se uma rotação do polarizador gerador e a informação do ângulo é gravada do encoder junto com a captura do sinal do multímetro (ou lock-in). O posicionamento é feito discretamente (passo a passo) e os valores são atribuídos à abscissa de um gráfico cuja ordenada é o sinal de saída do multímetro (ou lock-in). Na vizinhança de um desvio mínimo (condição de extinção ou nulo), uma parábola (ou reta) é ajustada aos pontos experimentais. Usando este ajuste, o ângulo correspondente à condição de nulo é determinado. Estes métodos foram utilizados nos protótipos montados, e uma primeira comparação entre os dois métodos foi realizada na nova montagem do polarímetro de referência. Na figura 1 mostramos a nova montagem do sistema. A maior diferença entre este e o protótipo de 2008 é o equipamento que gira o analisador, agora um instrumento de alta resolução, com uma mecânica robusta e dois encoders: um está acoplado ao sistema mecânico que movimenta o estágio. O outro, especialmente encomendado é um encoder óptico de 36000 linhas, com duas cabeças de leitura e um cartão interpolador, que faz a leitura da posição angular atingida. Todas as funções e os comandos dos diferentes instrumentos estão sendo integrados através de programação em LabView. Os componentes do polarímetro, numerados na Figura 1 são: (1) laser de He-Ne estabilizado em freqüência, com λ = 633 nm; (2) isolador óptico; (3) lâmina de quarto de onda; (4) encoder óptico acoplado a (5); (5) estágio rotatório; (6) polarizador Glan-Thompson; (7) caixa de alumínio revestida de grossa camada de isopor de alta densidade; (8) placa de quartzo padrão montada em trilho motorizado com deslizamento perpendicular ao feixe; (9) sensor de temperatura sobre a mesa óptica, termistor modelo para ar, com exatidão <50 mK; dentro da caixa, perto do padrão, modelo de alta resolução, com exatidão <5 mK; (10) íris; (11) autocolimador; (12) modulador de Faraday; (13) polarizador fixo, Glan-Thompson; (14) fotosensor de Si; (15) multímetro digital; (16) fonte e drivers para os estágio rotatório e trilho motorizados; (17) amplificador Lock-in; (18) amplificador para o modulador de Faraday. As placas de controle de quartzo usadas nos testes haviam sido previamente calibradas no PTB e num protótipo montado na Diopt em 2008 [5]. Na montagem atual, alguns problemas de alinhamento e termalização do protótipo antigo foram resolvidos com o uso de um autocolimador e um sistema de isolamento. O novo sistema de posicionamento angular também é uma evolução em relação ao antigo. O sistema de termalização definitivo está sendo construído nas oficinas do INMETRO e o controle do banho termalizador já está automatizado. Na tabela 1 podemos observar os valores das medições no PTB e no antigo protótipo (com método parabólico) enquanto os dois métodos são comparados na nova montagem. Tabela 1. Comparação entre o valor da rotação da polarização por dois padrões de quartzo: calibrados no PTB, medições realizadas no protótipo de 2008, medições realizadas na nova montagem. Padrão PTB IP880 (U k=2) IP886 -(29,749±0,001)º (29,817±0,001)º Protótipo Parábola -(29,750±0,003)º (29,814±0,008)º (2008) (U k=2) Protótipo Parábola -(29,752±0,001)º (2009) (U k=2) Reta (U k=2) __ __ (29,803±0,004)º foram os primeiros resultados de medição na nova montagem, que ainda continua em progresso. Um dos efeitos que foi estudado para garantia de melhoria dos resultados foi uma monitoração da temperatura durante a realização das medições. As temperaturas médias dos padrões durante as medições foram determinadas com incertezas menores que 0,0002 ºC e a diferença entre as temperaturas de início e final de uma seqüência de quatro medições consecutivas variaram tipicamente na ordem de 0,01 ºC. Estes valores estão dentro das recomendações da ICUMSA e da OIML para um serviço de calibração, que requer que a temperatura seja estável e conhecida com exatidão de 0,1 ºC. 3. CONCLUSÃO Apresentamos os primeiros resultados da nova montagem em curso no Inmetro/Diopt, do polarímetro de referência que fará a calibração dos padrões de quartzo, utilizados na calibração de sacarímetros e polarímetros. Utilizamos dois métodos de medição e análise, a fim de estabelecer condições de comparação dos resultados da nova montagem às do protótipo montado em 2008, e às calibrações feitas no PTB. Os primeiros resultados, com o método parabólico, mostram uma repetitividade com incertezas da ordem das obtidas no PTB. A reprodutibilidade está sendo melhorada, através de otimização das rotinas de aquisição dos dados de três encoders. A técnica de modulação do sinal ainda não está apresentando resultados dentro da faixa de incerteza desejável, e está ainda sendo melhor implementada. AGRADECIMENTOS A.D. Alvarenga e N.C.E. Pereira agradecem ao CNPq projeto 55178/2006-0, e à FAPERJ. REFERÊNCIAS Observa-se que no protótipo de 2008 a placa levógira apresentava uma incerteza expandida três vezes maior e uma diferença percentual de –0,003% em relação ao valor calibrado no PTB, enquanto a placa dextrógira apresentava uma incerteza expandida oito vezes maior e uma diferença de +0,01% em relação ao valor calibrado no PTB. Comparando a montagem de 2009 com o protótipo de 2008, observa-se que a incerteza expandida diminuiu três vezes para a placa levógira (ficando da mesma ordem da incerteza dada pelo PTB), e comparando o protótipo 2009 com a calibração no PTB, a diferença percentual aumentou para – 0,01% em relação ao valor calibrado. Para a placa dextrógira, comparando a montagem de 2009 com o protótipo de 2008, observa-se que a incerteza expandida permaneceu a mesma (ficando muito maior que a incerteza expandida dada pelo PTB, e comparando a montagem de 2009 com a calibração no PTB, a diferença percentual aumentou para –0,05% em relação ao valor calibrado. Esse comportamento demonstra que a repetitividade é boa, porém a reprodutibilidade ainda pode ser melhorada. Estes [1] ICUMSA Specification and Standard SPS-1(1998). [2] OIML - International Organization of Legal Metrology, R14 (1995): Polarimetric saccharimeters graduated in accordance with the ICUMSA International Sugar Scale. http://www.oiml.org/publications/R/R014-e95.pdf. [3] A.D. Alvarenga, M. Erin, R.S. França, F.R.T. Luna, H. Belaidi, and I.B. Couceiro; “A new polarimeter applied to sugar industry in Brazil”, proceedings of the “Metrology 2005” International Conference, Lyon, France. [4] Michael Schulz, Andreas Fricke, Klaus Stock, Ana D. Alvarenga, Hakima Belaidi; “ High accuracy polarimetric calibration of quartz control plates”, proceedings of the “IMEKO XVIII World Congress 2006”, september 17 to 22 Rio de Janeiro, Brazil. [5] A.D. Alvarenga, K. Souza, E.M. Borges, R.S. França, H. Belaidi; “Cálculo da incerteza de medição do ângulo de rotação do plano de polarização da luz por um padrão de quartzo”; Enqualab 2008-Congresso da Qualidade em Metrologia-REMESP, juin 9-12, São Paulo, Brazil. [6] “Manual do Consecana”; www.unica.com.br