Gestão Ambiental de Resíduos de Óleos Lubrificantes: o Processo de Rerrefino
Autoria: José Américo Martelli Tristão, Jadir Vilela de Sousa Junior, Virgínia Talaveira
Valentini Tristão
Resumo. A partir do referencial oferecido pela Teoria Econômica e utilizando o conceito de
externalidade como fundamento para a aplicação do princípio do poluidor-pagador, este
trabalho discute os instrumentos de política ambiental e examina a experiência brasileira na
gestão de resíduos de óleos lubrificantes com base no processo de reciclagem conhecido como
rerrefino. Essa técnica permite ao óleo usado recuperar suas características originais e retornar
à cadeia produtiva por ilimitadas vezes, evitando a degradação ambiental decorrente do
descarte indevido no meio ambiente ou da sua utilização como combustível. O argumento
central refere-se à necessidade da ação governamental para corrigir falhas de mercado e
garantir a existência de condições que incentivem a coleta e reciclagem do óleo residual, a
partir dos instrumentos econômicos e de comando e controle. O processo de rerrefino é
examinado em seus aspectos técnicos e jurídicos e os resultados são avaliados em função do
potencial de redução da poluição ambiental.
1. Introdução
O gerenciamento ambiental do resíduo de óleos lubrificantes usados tem sido
considerado uma questão de grande relevância em muitos países devido ao elevado potencial
de degradação ambiental quando descartado indevidamente ou utilizado como combustível
em estabelecimentos industriais. Em contrapartida, quando coletado e reciclado, o óleo
lubrificante usado recupera suas características originais e pode retornar à cadeia produtiva
por ilimitadas vezes, sofrendo apenas as perdas inerentes ao novo processamento do produto.
O processo de reciclagem de óleos lubrificantes, conhecido como rerrefino, representa
uma interessante alternativa e vem sendo adotado por muitos países, inclusive o Brasil, com
resultados positivos. Contudo, a experiência tem mostrado que os mecanismos de mercado
não são suficientes para garantir a existência, em termos sustentáveis, do processo de rerrefino
de óleos lubrificantes, ou seja, sua coleta, reciclagem e comercialização. É necessária a
atuação do poder público desenvolvendo políticas públicas ambientais que induzam o
comportamento empresarial em direção aos objetivos de preservação do meio ambiente
Dois tipos de instrumentos de política ambiental têm sido utilizados pelas autoridades
governamentais para induzir o comportamento dos agentes econômicos envolvidos na
produção e consumo do óleo lubrificante: os instrumentos de comando e controle, baseados
na regulamentação de emissões poluidoras e na regulação dos equipamentos, processos,
insumos e produtos; e os instrumentos econômicos, baseados na aplicação de tributos e
subsídios financeiros.
2. O conceito de externalidade econômica
A externalidade econômica está presente quando o bem-estar de um indivíduo
depende não somente dos bens e serviços que ele consome, mas também dos bens e serviços
que são consumidos por outros indivíduos. Deste modo, a característica que distingue a
externalidade é a existência de uma interdependência entre um indivíduo e outro e, mais
importante ainda, é uma interdependência que ocorre fora do mecanismo de preço,
caracterizando uma falha do mercado (Cullis e Jones, 1992).
Embora possamos definir externalidade em termos da interdependência entre o
consumo de um indivíduo e outro, não devemos supor que ela ocorra somente entre
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consumidores. Externalidades podem existir na relação entre um consumidor e outro, um
produtor e outro, um produtor e um empregado, e mesmo entre um produtor e um vizinho.
Definições explícitas de externalidade econômica têm sido uma fonte de controvérsia. Uma
forma de abordar o problema é a partir da definição genérica proposta por Meade (1973):
"Uma economia externa é um evento que confere um apreciável benefício ou inflige um
apreciável custo a uma ou mais pessoas, que não tomou ou tomaram parte no processo de
decisão que levou direta ou indiretamente ao evento em questão".
O consumo privado pode gerar tanto externalidades positivas quanto negativas. A
externalidade positiva se dá quando, por exemplo, um indivíduo é beneficiado por se vacinar
contra uma doença, mas, na medida em que se reduz o perigo de contágio, os demais
elementos da sociedade também se beneficiam. O mesmo ocorre com o processo educacional.
Quando um indivíduo é beneficiado por uma educação melhor, permitirá à sociedade como
um todo conviver com um nível educacional mais alto ou mesmo desfrutar dos conhecimentos
técnicos adquiridos pelo indivíduo diretamente beneficiado pelos gastos com a educação. Em
sentido oposto temos a externalidade negativa. Trata-se de custos que, embora não sejam
considerados pelo produtor, são bastante reais para a sociedade. São custos não internalizados,
ou seja, o produtor não precisa pagar por eles como paga por trabalho ou matérias-primas.
Como resultado, temos que os custos sociais - que incluem os custos internalizados (privados)
e os custos externalizados (sociais) - excedem os custos privados. Como o sistema de mercado
só leva em conta os custos privados, o preço é subestimado e, conseqüentemente, tende a
ocorrer um excesso de oferta desses bens. A poluição é, sem dúvida, o principal caso de
externalidade negativa. Musgrave e Musgrave (1980) observam que a poluição apresenta dois
problemas. O primeiro refere-se à falha do mercado, gerando ineficiência na alocação dos
recursos. O segundo refere-se ao aspecto distributivo ou de eqüidade. Em decorrência da
deterioração do meio ambiente, consumidores de determinados bens como água e ar acabam
por subsidiar os consumidores de produtos poluentes.
3. O princípio do poluidor-pagador
O princípio do poluidor-pagador propõe que o poluidor arque com o custo das
medidas antipoluição adotadas pelas autoridades públicas para assegurar que o meio ambiente
seja mantido num estado aceitável. Este princípio deve ser considerado como uma forma
específica de distribuir os custos da proteção ambiental entre os poluidores ou usuários dos
recursos e aqueles que se beneficiam desses melhoramentos. Para Oliveira (1995) este
princípio tem dois sentidos: o impositivo, que representa o dever do Estado de cobrar do
poluidor, ou seja, tributar, face à sua atividade poluidora fazendo-o arcar com o custo dos
serviços públicos referentes à preservação e recuperação do meio ambiente ou à fiscalização e
monitoramento ambiental, se adequando sob este aspecto à tributação fiscal; e o seletivo, que
indica prioritariamente ao Poder Público que a tributação deve ser graduada de forma que
estimule atividades, processos produtivos ou consumos environmentally friendly,
desestimulando a utilização de tecnologias ultrapassadas, assim como a produção e o
consumo de bens not environmentally friendly.
O princípio do poluidor-pagador foi adotado pela OCDE, em 1972, como orientação
para políticas ambientais adequadas e amplamente aceito como uma diretriz para a
formulação de políticas ambientais por parte de governos e agências de assistência, tendo sido
incluído na Declaração do Rio de Janeiro sobre o meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992.
No Brasil, esse princípio é previsto no inciso VII do art. 40 da Lei nº 6938 de 1981, que
impõe ao poluidor e ao predador a obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e,
ao usuário, a contribuição pela utilização de recursos ambientais.
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4. Fundamentação teórica para a aplicação do princípio do poluidor-pagador
A cobrança de tributos sobre a poluição é provavelmente o mais conhecido e utilizado
dentre os instrumentos econômicos que visam a proteção dos recursos naturais. Constitui-se
na aplicação do princípio do poluidor-pagador, cuja origem encontra-se na obra pioneira de
Pigou sobre externalidades, The Economics of Welfare, publicada pela primeira vez em 1920.
A proposição básica defendida pelo economista é de que quando o funcionamento do sistema
econômico apresenta falhas é necessário que haja alguma ação governamental para corrigilas. Assim, no caso da poluição, externalidade negativa decorrente da falha do mecanismo de
preços, a idéia defendida por Pigou (1946) é a utilização de um imposto como uma forma de
transpor o abismo entre o custo privado e o social que está na raiz do dano ambiental .
O tributo proposto por Pigou (1946), conhecido como Pigouvian Taxes, internalizaria
as externalidades ambientais com a finalidade de corrigir a distorção entre os custos sociais e
privados, com base no princípio do poluidor-pagador. Para ele há um nível "ótimo" de
poluição, devendo o tributo se igualar ao custo da externalidade negativa. Como observa
Marmon (1996) a dificuldade em se determinar a taxa "ótima" de poluição reside na
mensuração dos custos ambientais fazendo com que, na prática, o nível socialmente aceitável
de poluição seja definido com base em critérios outros que os econômicos.
Ressalta Almeida (1998) que as dificuldades em se elaborar o cálculo da taxa "ótima"
de poluição, seriam sanadas se fosse possível conhecermos a "função de dano" que
expressaria quanto o dano ambiental (medido em termos monetários) provocado pela poluição
varia com o nível de poluição emitido. Hoje, apesar de todas as técnicas desenvolvidas o
problema se mantém. Essas dificuldades indicam que na prática não é possível aplicar-se o
tributo ambiental tal qual prescrito pela teoria.
Musgrave e Musgrave (1980) analisam os resultados da aplicação de um imposto para
internalização dos custos da poluição a partir das condições tecnológicas. Com tecnologia
fixa, a solução eficiente é a aplicação de um imposto que adicionará o custo marginal da
poluição ao custo privado marginal, de modo que o custo marginal total seja igual ao preço.
Nestas circunstâncias a poluição não será eliminada, mas o seu nível será reduzido. Para o
caso em que a poluição possa ser reduzida por meio de alterações tecnológicas, o autor
observa que o combate à poluição deve se restringir a um nível em que o seu custo marginal
iguale o valor marginal da poluição evitada.
O direito de propriedade como definido por Pindyk e Rubenfeld (1994) " é o conjunto
de leis que descreve o que as pessoas e as empresas podem fazer com suas respectivas
propriedades". Colocam Eskeland e Jimenez (1991) que os recursos naturais estariam bem
resguardados se os direitos de propriedade fossem reavaliados, "se os consumidores tivessem
direito a ar puro e água limpa e pudessem vender licenças para poluir na quantidade que
quisessem, muitas ou poucas".
Todavia, alguns problemas se apresentam. Primeiro se não houver fiscalização, é
quase inexistente a possibilidade de que seja cumprido o exercício do direito a recursos como,
por exemplo, a água e o ar despoluídos. Segundo, na medida em que todos poderão usufruir a
qualidade do ar, cada indivíduo estará mais motivado a vender os direitos a quem causa a
poluição. Por esta razão os direitos de poluir não devem ser vendidos individualmente e sim
coletivamente. Em situações específicas, poluidores e vítimas podem "negociar os níveis
socialmente ótimos de poluição, sem intervenção do governo" (Eskeland e Jimenez, 1991).
Atribui-se ao economista Ronald Coase o argumento de que quando as partes podem
negociar sem custo, e com possibilidade de obter benefícios mútuos, o resultado das
transações deverá ser eficiente, independentemente de como estejam especificados os direitos
de propriedade (Pindyk e Rubenfeld, 1994). Coase (1990) ilustrou a solução de barganha
entre dois agentes imaginando uma situação na qual um agricultor que possuía um vizinho
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que criava gado. Nesta situação a poluição era representada pela invasão da plantação pelo
gado, e o seu controle pela construção de uma cerca separando as propriedades. Se as
propriedades pertencessem a um único dono, os custos das invasões das plantações pelo gado
estariam internalizados, e ao proprietário caberia decidir-se entre: cercar uma das
propriedades, se os danos fossem maiores do que os custos da cerca; não tomar nenhuma
providência caso os danos fossem menores do que os custos da cerca ou encontrar uma
solução intermediária com a construção parcial de cercas, de forma a obter uma redução dos
danos proporcionalmente vantajosa. Ou seja, o investimento máximo em cercas seria aquele
no qual o custo marginal de sua construção (controle) seja igual ao custo marginal da
produção agrícola perdida.
Como aponta Bellia (1996) este é o limite da discussão entre dois agentes, já que o
pecuarista dará preferência ao pagamento de uma indenização ao agricultor, desde que esta
não ultrapasse o custo marginal de construção e manutenção da cerca; "Qualquer que seja o
resultado de uma barganha deste tipo, considera-se que o ótimo social foi alcançado".
Eskeland e Jimenez (1991) apresentam o exemplo de uma situação nas Filipinas, na
qual a sedimentação do solo causado por um único trator ameaçava o turismo numa área
costeira. Nesse caso, como indicam os autores, caberia a negociação direta entre poluidores e
vítimas. Da mesma forma, argumentam os autores, questões de poluição nas quais estão
envolvidos mais de dois países soberanos, como por exemplo a chuva ácida, costumam ser
solucionadas sem a intervenção de entidades governamentais supranacionais. Todavia, esta
solução pode não ser eficiente quando há muitos indivíduos envolvidos e poucas informações
sobre o assunto. Na cidade do México, por exemplo, 30 mil empresas industriais e 2,6
milhões de veículos poluem o ar, afetando 20 milhões de pessoas. Fica impossibilitada assim
a realização de negociações diretas.
5. Instrumentos de política ambiental
No início dos anos 70, quando a intervenção governamental passou a se dar também
no campo da proteção ambiental, as autoridades da maior parte dos países industrializados se
voltaram para a utilização de instrumentos de comando e controle, criando novas leis e
regulamentações ou adaptando a legislação já existente. Em alguns casos representavam
apenas rótulos novos em soluções velhas para resolver problemas que começavam a surgir
(Barde e Opschoor, 1994).
Sem dúvida alguma, o instrumento de política ambiental que mais tem sido utilizado
ao longo do tempo é o de comando e controle. Entretanto, no final dos anos 80 e durante os
anos 90 o interesse das autoridades governamentais centrou-se muito mais em instrumentos
de política ambiental de base mercadológica – impostos ambientais, certificados ou licenças
para poluir – abrindo caminho para políticas ambientais mais eficientes tanto economicamente
como na sua adequação às políticas setoriais. .Essa mudança foi estimulada por diversos
fatores, como aponta o trabalho "Environmental Taxes. Implementation and Environmental
Effectiveness" (1996) tais como: uma nova orientação política no sentido do mercado,
reconhecimento das limitações das ações governamentais e da utilização dos instrumentos de
comando e controle, o desejo de implementar o princípio do poluidor-pagador, e a
necessidade de integrar as políticas ambientais com as demais áreas.
Até o início dos anos 80 a aplicação de instrumentos econômicos em políticas
ambientais era muito pequena e sua utilização experimental e limitada. Uma nítida mudança
ocorreu depois da primeira metade dos anos 80. Entre 1987 e o início de 1993, o número de
instrumentos econômicos aumentou cerca de 25 a 50% conforme o país analisado. O
crescimento mais importante foi o da utilização de impostos sobre produtos, energia, emissões
de dióxido de carbono e enxofre e sobre o petróleo com chumbo. Muito outros poluentes
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como pesticidas, fertilizantes, embalagens, resíduos de óleo entre outros, também têm sido
tributados. A utilização de sistemas de depósitos retornáveis também cresceu muito, atingindo
uma faixa de 35 a 100 % conforme o país, especialmente como resposta ao sério problema
causado pelo aumento do volume dos materiais para embalagem (cerca de 140 milhões de
toneladas/ano nos países membros da OCDE).
Um levantamento elaborado em 1989, pela OCDE, apontado por Barde e Opschoor
(1994), identificaram cerca de 150 tipos de instrumentos em 14 países, revelando a existência
de cinco categorias diferentes de instrumentos econômicos: impostos e taxas; subsídios;
sistemas de devolução de depósitos; criação de mercados; e incentivos financeiros. Nos anos
de 1994 e 1995 novos estudos da OCDE identificaram os tributos, nas suas diferentes formas,
como sendo as maiores categorias de instrumentos econômicos em termos de impacto e
freqüência de aplicação.
Hoje a utilização de tributos como instrumentos de política ambiental continua
crescendo, tendendo a haver uma integração dos tributos ambientais às reformas fiscais
verdes, nas quais os tributos que recaem sobre "coisas ruins" como a poluição vem substituir a
tributação de "coisas boas" como, por exemplo, o trabalho.
6. Tipologia dos instrumentos de política ambiental
Os analistas vêm apontando basicamente duas formas de alterar o comportamento dos
poluidores e daqueles que utilizam recursos ambientais: estabelecer padrões e regulamentos,
os denominados instrumentos de políticas de comando e controle, ou fixar um preço para a
poluição ou uso de recursos naturais (políticas de incentivos ou de mercado), os instrumentos
econômicos.
A taxonomia dos instrumentos de políticas ambientais elaborada por Eskeland e
Jimenez (1991), como mostra a figura 1, subdivide os instrumentos em diretos, cuja finalidade
é corrigir a poluição imposta por meio de instrumentos como cobrança de taxas, licenças para
poluir e o estabelecimento de padrões para emissões. E, em indiretos, aqueles que não são
diretamente ligados às emissões, mas que provocam efeitos ambientais sérios, embora nem
sempre intencionais.
Por sua vez, os autores Zeitler e Hermmans (1997) classificam os instrumentos de
política ambiental, em fiscais e não fiscais. Dentre os instrumentos que não possuem caráter
fiscal os autores apontam as proibições e os condicionamentos que refletem de forma mais
forte a influência do Estado. Também são apontados como instrumentos não fiscais as
mudanças que são operadas na legislação com o objetivo de privilegiar o meio ambiente.
Quanto aos instrumentos de caráter não fiscal e cuja obediência não é obrigatória, os autores
indicam as atividades destinadas a conscientizar a população a respeito dos problemas
ambientais ou de proteção ao consumidor.
No que se refere aos instrumentos classificados na categoria fiscal os autores propõem
uma subdivisão conforme se realizem por meio das receitas ou das despesas públicas.
Esclarecem que embora os instrumentos relacionados com a arrecadação sigam
fundamentalmente o princípio do poluidor-pagador, os instrumentos ambientais que operam
do lado dos gastos atuam de acordo com o princípio da repartição.
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Figura 1. Instrumentos de política ambiental
Instrumentos
Diretos
Indiretos
Econômicos
Encargos sobre efluentes,
Impostos e subsídios insumo/
licenças negociáveis, sistemas produção, subsídios a similares
de restituição de depósito.
nacionais e a insumos menos
poluentes.
Comando e controle
Regulamentação de emissões
(cotas não-transferíveis de
fontes específicas).
Regulação de equipamento,
processos, insumos e produtos
Fonte: Eskeland e Jimenez (1991)
7. Instrumentos econômicos
Os instrumentos econômicos são utilizados com o objetivo de induzir o
comportamento dos indivíduos e das empresas no que se refere ao meio ambiente por meio de
medidas que signifiquem benefícios ou custos adicionais para eles. Esses instrumentos têm
por base o conceito de internalização das externalidades. Os instrumentos econômicos são
medidas que tratam da criação de mercados para a proteção ambiental ou, ao menos, da
internalização dos custos ambientais nos preços de mercado. Permitem às fontes emissoras
fazer sua escolha individual sobre qual tecnologia utilizar para diminuir os níveis de poluição
que causa. De acordo com a literatura da área um dos elementos que melhor caracteriza a
diferença entre os instrumentos econômicos dos chamados instrumentos de comando e
controle é a flexibilidade que se apresenta ao poluidor, este é livre para responder aos
estímulos da maneira e no tempo que melhor lhe convier economicamente. (Almeida, 1998).
Na realidade, nem sempre é muito clara a separação entre os instrumentos econômicos
e as regulações diretas (Almeida, 1998). Um programa sob o qual o regulador especifica os
procedimentos exatos de tratamento a serem seguidos pelos poluidores obviamente se inclui
na categoria de comando e controle. Mas e quanto a uma política que estabeleça um limite
fixo de emissões para uma fonte particular (sem possibilidade de negociação), mas que
permita ao poluidor selecionar a forma para cumprir a meta? Tal flexibilidade certamente
possibilita a operação de incentivos econômicos em termos da busca do método de controle
de custo mínimo.
Quando a implementação das políticas baseadas em instrumentos econômicos é feita
com eficácia, em geral, acabam por alcançar metas ambientais com menor custo do que as
medidas de regulamentação. Com as chamadas políticas de mercado, o preço é igual para
todos os poluidores e usuários de recursos, e são eles que devem optar pelo grau de controle.
As políticas de incentivos econômicos que estabelecem preços para os danos ambientais são
sentidas por todos aqueles que poluem, enquanto que as regulamentações afetam somente os
que não as cumprem. Assim, as políticas de incentivos dão aos usuários de recursos
ambientais sinais válidos e de longo prazo. Aquele que polui e/ou usa os recursos ambientais
é incentivado a buscar e utilizar tecnologias mais eficazes em termos de custos para reduzir os
danos ambientais. O "Relatório Sobre o Desenvolvimento Mundial - 1992 - Desenvolvimento
e Meio Ambiente" (1992) indica que as regulamentações "que impõe padrões não dão
motivos para que os poluidores ultrapassem os padrões impostos". Na realidade, as
regulamentações que especificam as tecnologias de controle - políticas de tecnologias
obrigatórias - comuns nos EUA e na Europa Ocidental, limitam-se aos padrões vigentes e
acabam por não incentivar as empresas a desenvolver novos modelos de produção menos
poluentes ou controles mais eficazes.
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Para Benjamin e Weiss (1997) os instrumentos econômicos representam uma atraente
alternativa em relação aos instrumentos mais tradicionais de comando e controle. Observam
os autores que seu maior atrativo advém de sua flexibilidade, que permite que se alcance
objetivos ambientais ao menor custo possível. Observa o autor que os aspectos conceituais
associados aos instrumentos econômicos são bastante avançados. Entendendo, todavia, que é
preciso incrementar o desenvolvimento de exercícios empíricos que permitam quantificar a
magnitude dos efeitos da aplicação de determinados instrumentos de maneira que seja
possível uma avaliação ex-ante das conseqüências que a sua utilização acarretaria.
8. Instrumentos de comando e controle
Os instrumentos de comando e controle podem ser definidos como um conjunto de
regulamentos e normas impostos pelo governo com o objetivo de restringir as ações do
poluidor. Dentre os mais tradicionais instrumentos de comando e controle estão os
regulamentos que determinam padrões de emissão (que indicam os níveis aceitáveis de
poluição) e os padrões de desempenho (que se relacionam à forma de regular e operar
equipamentos visando a diminuição da emissão de determinados poluentes). Temos ainda
dentre estes instrumentos as legislações que dispõem quanto ao licenciamento de atividades
potencialmente poluidoras e a proibição da fabricação, comercialização e uso de produtos e
insumos específicos (Almeida 1998).
Os instrumentos de comando e controle demandam um sofisticado sistema de medição
de poluição, do cálculo de sua dispersão e da sinergia entre poluentes, bem como das técnicas
de depuração, que somados à necessidade de um eficiente esquema de fiscalização para sua
manutenção os tornam uma opção dispendiosa. Estudos empíricos citados com freqüência na
literatura procuram demonstrar que os custos de implementação de políticas baseadas em
incentivos econômicos são menores do que aqueles gerados pela utilização de instrumentos de
comando e controle.
Na avaliação para a escolha deste tipo de instrumento, é preciso considerar-se
especialmente, o grau de capacidade governamental para monitorar os danos ocasionados pela
poluição e fazer com que sejam cumpridas as regulamentações (Eskeland e Jimenez, 1991).
Para que estes instrumentos tenham eficácia, é necessário que quem os utilize possua
capacidade tecnológica e responsabilidade para suportar pressões das partes interessadas, pois
as políticas baseadas na monitoração ambiental têm implicações pecuniárias para quem
poluir.
De acordo com o Relatório Sobre o Desenvolvimento Mundial - 1992 Desenvolvimento e Meio Ambiente (1992), há quatro aspectos que determinam a dificuldade
de monitoramento ambiental:
- elevado o número de fontes causadoras de danos ambientais e elevado grau de dispersão
geográfica (exemplo: o caso do transporte);
- fazer o acompanhamento das atividades de agentes difíceis de localizar (exemplo:
pequenos garimpeiros da região amazônica);
- as soluções tecnológicas disponíveis para monitoramento de agentes poluidores (a
monitoração da eliminação gradual da gasolina com chumbo, nos EUA, tornou-se mais
fácil a partir da utilização de conversores catalíticos para controlar as emissões dos
automóveis, porque esses conversores podem ser checados durante as vistorias periódicas
dos veículos); e
- problemas ambientais que atravessam fronteiras nacionais (exemplo: a chuva ácida na
Europa).
Almeida (1998) nos coloca que os economistas são os principais adversários das
políticas de comando e controle, apontando desvantagens com relação aos custos de aplicação
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e à falta de incentivos à introdução de aprimoramentos técnicos, uma vez atingidos os padrões
determinados pela legislação. Por sua vez, Osborne e Gaebler (1992) em seu interessante livro
"Reinventando o Governo" comentam que nos EUA, desde que o Departamento de Proteção
Ambiental (Environmental Protection Agency - EPA foi criado, o governo federal tem-se
utilizado, essencialmente, para o controle ambiental, da estratégia de comando e controle.
A despeito das dificuldades e custos que apresentam, as políticas de comando e
controle têm sido muito utilizadas pelos países industrializados e em desenvolvimento. O
Banco Mundial, cuja abordagem se inclina mais para a utilização de incentivos econômicos,
enfatiza que há casos em que o instrumento mais adequado a regulação direta, ou seja,
políticas regulatórias usadas amplamente tanto em países industrializados quanto em
desenvolvimento, são mais apropriadas em situações que envolvem poucas empresas públicas
e empresas privadas não competitivas.
As políticas de comando e controle são também mais indicadas quando a preocupação
é evitar a concentração espacial de atividades poluentes, ou seja, quando o crucial é não
esgotar a capacidade de absorção do meio. Um exemplo é a política de zoneamento, que nas
áreas rurais procura evitar desgaste precoce de solos agriculturáveis ou preservar áreas
ecologicamente estratégicas, e nas áreas urbanas impede a ocorrência de locais densamente
poluídos, com baixa capacidade de renovação da qualidade do ar. São raros os instrumentos
econômicos que conseguem lidar diretamente com esse aspecto.
9. A escolha do instrumento de política ambiental
A escolha de instrumentos de controle ambiental se converteu em um tema muito
importante para os policymakers ambientais. A busca de instrumentos eficientes tem
motivado um renovado interesse pelo uso de instrumentos econômicos na proteção ambiental.
Um reflexo disto é o aumento da literatura na área nos últimos anos.
A literatura de Economia Ambiental no que se refere à escolha dos instrumentos de
política ambiental a serem utilizados tem proposto um enfoque de eficiência sem a
preocupação de alcançar um "ótimo econômico". De maneira geral não se tem procurado
atingir um "ótimo econômico" nem corrigir totalmente o problema da externalidade,
adotando-se em contrapartida um processo em duas etapas. Na primeira, há a determinação de
um objetivo ou uma meta ambiental a ser atingida que é estabelecida de acordo com critérios
como saúde da população, proteção de ecossistemas e outros. Na segunda, procura-se o
melhor instrumento para atingir os objetivos pré-definidos.
Observa o autor que a opção por uma solução que busca o segundo melhor e não o
primeiro melhor "ótimo econômico" é motivada por uma razão de ordem prática. Qualquer
instrumento que se queira utilizar para se atingir o "ótimo econômico" se defronta com a
dificuldade de se definir o valor dos bens ambientais, bem como das funções de danos
ambientais marginais da poluição (o que representa uma barreira por causa da complexidade
dos fenômenos e de suas inter-relações).
Quase sempre os objetivos ambientais são representados por padrões de qualidade
ambiental, tanto primários como secundários. É importante considerar-se que as
regulamentações que são estabelecidas espelham um acordo social no que se refere aos níveis
de poluição que a sociedade está disposta a aceitar. Devem, portanto, ser resultantes de
considerações econômicas, sociais, morais, de eqüidade e de justiça. As normas primárias,
que guardam relação com a saúde da população devem ser idênticas em todo o país. Isto
parece razoável, argumenta se levarmos em conta que as normas de qualidade determinam os
níveis máximos de concentração de poluentes. Se a intenção da autoridade for proteger a
saúde da população, então os níveis de concentração da poluição e, portanto, o risco a que as
pessoas estão expostas deve ser o mesmo em todo o território nacional em razão da adoção do
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critério de eqüidade na definição do objetivo ambiental. É idêntica a situação das normas
secundárias já que são específicas para a proteção de algum ecossistema em particular, que
provavelmente não existe em outro local. Por isso as normas secundárias precisam ser
específicas à região ou local no qual será aplicada.
10. O processo de rerrefino de óleos lubrificantes no cenário mundial
Em todo o mundo são consumidos anualmente cerca de 45 bilhões de litros de
lubrificantes, que dão origem a mais de 20 bilhões de litros de óleos usados. Se
considerarmos, de modo otimista, que 50% desse volume é coletado e utilizado
adequadamente, ainda restarão 10 bilhões de litros não coletados, sendo lançados nos rios,
mares, subsolo e atmosfera (se queimados inadequadamente), poluindo o meio ambiente. Para
enfrentar esse problema, a maior parte dos países desenvolvidos e, portanto, os maiores
consumidores do produto, vêm adotando políticas de gestão ambiental no sentido de
incentivar a reciclagem do produto.
Portugal consome anualmente cerca de 100 milhões de litros de lubrificantes, dos
quais cerca de 60%, após o uso, são recicláveis. Entretanto, apenas 30% são recolhidos por
empresas licenciadas, com destinação adequada. Os restantes 30% são coletados no mercado
paralelo e sua destinação pode ser a queima ilegal em fornos industriais ou padarias, embora
seja proibido, sem qualquer tipo de tratamento. A principal deficiência do sistema português
de reciclagem de óleos lubrificantes é a inexistência de uma rede de pontos de coleta em todo
o país. Em Portugal não existem rerrefinarias.
Os Estados Unidos geram cerca de 5 bilhões de litros de lubrificantes usados
anualmente . Desse total, aproximadamente 60% são coletados e 40% descartados de forma
imprópria, gerando forte poluição. No caso do óleo coletado, sua destinação prioritária é a
queima controlada, sendo que apenas 8% é rerrefinado O restante é reciclado através de
tratamentos simples de descontaminação e reutilizados. A Environmental Protection Agency USEPA recomenda a todos os órgãos do governo que dêem preferência à compra de óleos
lubrificantes que contenham um mínimo de 25% de óleos básicos rerrefinados, observadas as
condições de preço e qualidade. Por solicitação governamental, as montadoras Ford, General
Motors, Caterpillar, Chrysler e Detroit Diesel, aprovam e utilizam lubrificantes produzidos
com óleo básico rerrefinado, desde que atendam as especificações da American Petroleum
Institute -API. No estado da Pennsylvania foi criado um sistema voluntário de locais de
coleta, denominados Used Oil Collection Sites - UOC’s. A situação é especialmente grave na
região da Grande Los Angeles, Califórnia, onde mais de 80 milhões de litros de óleo de motor
usados são lançados anualmente no meio ambiente. Para coibir o descarte ilegal de óleo usado
impõe-se uma multa que pode chegar a US$ 250 mil.
A Alemanha pode ser apontada como o país mais avançado em termos de coleta e
rerrefino de óleo usado. Lá são consumidos anualmente cerca de 1,4 bilhão de litros de
lubrificantes, dos quais 60% são coletados após o uso, e desses, 65% são rerrefinados. Os
pontos de comercialização são obrigados a ter um ponto de coleta de óleo usado e embalagens
vazias. O país conta com uma das legislações mais rigorosas quanto ao controle ambiental e
apresenta a maior taxa de rerrefino de óleo usado.
Na Itália a coleta de óleo usado é administrada pelo Consortium, uma entidade
mantida conjuntamente por órgãos governamentais e empresas de petróleo e rerrefino. Os
produtores de lubrificantes pagam uma taxa aos responsáveis pela coleta, que encaminham os
óleos para a reciclagem, combustão, rerrefino ou incineração. O Consortium vende o óleo
usado para empresas de rerrefino.
A França aplica uma taxa especial sobre os básicos virgens produzidos ou importados,
com a finalidade de financiar a coleta dos óleos usados. Os detentores de óleo usado devem
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entregá-lo aos coletores sem qualquer encargo, ficando os custos de remoção a cargo da
Agência de Controle Ambiental que destina parte ao rerrefino, cerca de 45%, e o restante,
cerca de 55%, para a queima, principalmente em indústrias cimenteiras e usinas
termoelétricas.
11. O processo de rerrefino no Brasil
Entre 1978 e 1988, o Brasil chegou a coletar 190 milhões de litros anuais de óleo
lubrificante utilizado, volume superior ao que estava coletando no final da década de 90, 180
milhões de litros anuais. As várias mudanças na legislação fiscal introduzidas pelo governo
nesse período agiram como fator ora de estímulo ora de desestímulo às atividades de coleta e
rerrefino do óleo usado. Neste período estava em vigor o Imposto Único - IU para petróleo e
derivados, sendo dada isenção para o rerrefino. Desse modo, o rerrefinador pagava pelo óleo
usado um valor que inibia a sua utilização como combustível, estimulava a sua armazenagem
pelos pontos geradores e proporcionava margem suficiente para sua comercialização a preços
inferiores aos do óleo novo. Com a extinção do imposto único e, conseqüentemente, da
vantagem fiscal que gozava o óleo rerrefinado, a coleta de óleo usado declinou 30% nos
quatro anos subseqüentes, permanecendo na faixa dos 130 milhões de litros/ano.
Outro complicador para a indústria do rerrefino foi a integração da Petrobrás na
economia globalizada, com a internacionalização dos preços dos óleos básicos para o mercado
interno, que era, para o neutro pesado, produto mais consumido, cerca de US$ 1000/m3 em
1988 e caiu para cerca de US$ 480/m3 em 1992. Dessa forma, os rerrefinadores perderam a
capacidade de comprar o óleo usado que passou a concorrer com o óleo combustível BPF
(baixo ponto de fluidez) e os geradores passaram a dar outras destinações ao produto,
principalmente a queima descontrolada em fundições e outros fornos de pequenas indústrias.
Quando, em 1992, a Agência Nacional de Petróleo - ANP criou o Frete de
Uniformização de Preços - FUP, elevou artificialmente os preços dos óleos básicos virgens
em cerca de 50%. Com esse diferencial de preço, o setor de rerrefino conseguiu sobreviver até
setembro de 1997, quando o FUP foi extinto, em decorrência da desregulamentação do setor
petrolífero. Esse procedimento tornou-se inevitável devido às necessidades de se adequar às
regras do Mercosul, bem como, se tornar competitivo numa economia globalizada.
Em novembro de 1997, pela Portaria Interministerial nº 4, foi criado um grupo de
trabalho para analisar a situação do rerrefino e particularmente da coleta. Esse grupo sugeriu
uma fase de transição, que se prolongou até setembro de 1999, sendo que todos os fabricantes
de lubrificantes associados ao Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de
Combustíveis e Lubrificantes - Sindicom se comprometeram a comprar o óleo rerrefinado a
preços superiores aos do óleo novo, em volumes proporcionais preestabelecidos, até que se
encontrasse uma solução definitiva para o problema. A partir de outubro de 1999, por
determinação da Portaria n. 125 da ANP, foi estabelecido o princípio do poluidor pagador e os
produtores e importadores de lubrificantes assumiram a responsabilidade pelo custo da coleta.
No primeiro ano, até setembro de 2000, deveria ser coletado 20% do volume total de óleo
comercializado, a partir de outubro de 2000, esse percentual passou para 25% e, desde
outubro de 2001, foi fixado o limite mínimo de 30% do volume comercializado. A figura 2
mostra de forma esquemática o ciclo de rerrefino do óleo lubrificante, segundo o modelo
adotado no país.
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Figura 2. O ciclo de rerrefino do óleo lubrificante
Petróleo cru
Refino
Óleo básico
Óleo lubrificante
Aditivos
Consumo
Resíduo descartado
Rerrefino
12. Avaliação dos resultados da política de reciclagem do óleo lubrificante usado no
Brasil
Conforme dados do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis
e de Lubrificantes - Sindicom, o Brasil comercializa anualmente cerca de um bilhão de litros
de lubrificante. Deste volume, 60% se destina à aplicação automotiva, incluindo desde
motocicletas, automóveis e caminhões até equipamentos agrícolas e de construção, como
tratores. Nesse segmento se utiliza não apenas como óleo de motor, mas também para
transmissões mecânicas e automáticas, sistemas hidráulicos, freio úmido, etc. Os restantes
40% destinam-se à indústria. Do consumo total de um bilhão de litros, são gerados cerca de
450 milhões de litros de óleos usados.
Embora a legislação vigente determine que seja coletado um mínimo de 30% do óleo
produzido, apenas 25% ou cerca de 250 milhões de litros estão sendo coletados para rerrefino.
Os 200 milhões restantes têm destinação desconhecida, sendo o fim mais provável a queima
in natura ou o descarte direto no meio ambiente, como mostra a figura 3. O potencial poluidor
do óleo descartado foi salientado no relatório apresentado pelo grupo de trabalho do
Sindicom, em 1997 (ARAUJO, 1997). O relatório aponta os seguintes dados:
•
•
•
Os lubrificantes usados são considerados responsáveis por 10% da poluição observada
nos mares do mundo;
Pesquisas realizadas em universidades, concluem que 1 litro de óleo usado é capaz de
contaminar 1 milhão de litros de água potável;
Ambientalistas afirmam que o descarte de uma tonelada de óleo usado, despejada em
mares, rios e lagos causa dano equivalente aos esgotos domésticos de uma cidade com
40 mil habitantes;
11
•
•
•
Apenas 5 litros de óleo usado podem recobrir uma superfície de 5000 m2 de um lago,
matando seus organismos por asfixia;
A queima de óleo usado sem um pré-tratamento pode lançar na atmosfera compostos
clorados e sulfurados, monóxido de carbono, dioxinas, metais pesados (chumbo,
cromo, cádmio, zinco) e vários tipos de substâncias tóxicas e corrosivas, algumas com
ação cancerígenas; e
Apenas 10 kg de óleo usado, quando queimado de forma descontrolada e sem prétratamento, pode jogar no ar até 20 g de metais pesados, potencialmente cancerígenos.
Por outro lado, o óleo usado é um recurso que, se reciclado adequadamente, pode
retornar à cadeia produtiva por ilimitadas vezes, sofrendo apenas as perdas de cada
processamento, gerando consideráveis vantagens econômicas e poupando divisas, no caso de
países que, como o Brasil, são importadores de básicos para lubrificantes. Se coletado e
rerrefinado, o óleo usado pode gerar até 70% de óleo básico de alta qualidade, pronto para
reiniciar o ciclo que pode se repetir indefinidamente.
Mais da metade de todo o lubrificante consumido no Brasil ocorre na região sudeste,
liderada pelo Estado de São Paulo, que detém o maior parque industrial do país e mais da
metade da frota nacional de veículos em circulação. As regiões norte, nordeste e centro-oeste
juntas consomem 25% dos lubrificantes no Brasil, gerando mais de 100 milhões de litros de
óleo usado por ano. As longas distâncias até uma rerrefinaria e a pulverização dos pontos de
consumo dificultam a coleta e encaminhamento dos resíduos para o rerrefino. De acordo com
o “Diagnóstico Ambiental da Baia de Ilha Grande”, publicado em dezembro de 1997 pela
Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Rio de Janeiro, em parceria com o Ministério do
Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, cerca de 24.000 litros de óleo
usado são despejados anualmente nas águas costeiras da Baía de Ilha Grande, por cerca de
1.200 embarcações de pequeno porte mantidas em ancoradouros, cais e marinas. Quando o
óleo lubrificante é trocado, o óleo usado é despejado no mar ou, quando levado para terra, é
despejado no solo ou esgoto. Segundo esse diagnóstico, a situação é tão grave que em cerca
de 100 quilômetros da orla da Baía de Ilha Grande existem indícios de exposição crônica a
óleo flutuante, com manchas nas pedras e destruição quase total da fauna e da flora da zona
entre-marés.
Podemos observar também que o processo de rerrefino, em suas três etapas - coleta,
processamento e comercialização - vem enfrentando problemas. A indústria de rerrefino, que
já chegou a contar com mais de 30 empresas, hoje está reduzida a 10, com uma capacidade
nominal total de 300 milhões de litros por ano, sendo que apenas uma dessas empresas, a
Lwart situada em Lençóis Paulista no Estado de São Paulo, é responsável por cerca de 50% de
toda a coleta e rerrefino no país.
12
Figura 3. Destino do resíduo do óleo lubrificante no Brasil
1 bilhão de litros por ano de
óleos lubrificantes são
produzidos
600 milhões de litros são
destinados a aplicação
automotiva
400 milhões de litros são
destinados a outras
aplicações industriais
450 milhões de litros anuais de
resíduos são gerados pelos
consumo de óleos lubrificantes
250 milhões de litros de óleo
usado são coletados e enviados
para rerrefinadoras
200 milhões de litros de óleo
usado tem destinação
desconhecida
170 milhões de litros de óleo
rerrefinado é obtido e vendido
aos fabricantes de lubrificantes
Destino mais provável:
• queima "in natura"
• esgotos, rios, lagos, mar,
solo e sub-solo
13. Aspectos técnicos do rerrefino
Os óleos lubrificantes representam cerca de 2% do total de derivados de petróleo e são
os únicos que podem ser mantidos com as características originais, exercendo suas funções
durante períodos tão longos como 20 anos ou mais em unidades seladas. Os demais derivados
de petróleo são utilizados como combustíveis ou matéria prima em indústrias químicas, sendo
consumidos ou perdendo suas características originais na primeira utilização. Quando um óleo
lubrificante produzido com básicos virgens, isto é, de primeiro refino, contém moléculas
instáveis, principalmente aquelas contendo ligações duplas, que se oxidarão prioritariamente
nas primeiras situações adversas. Por outro lado, o óleo básico proveniente de rerrefino,
quando processado adequadamente, não contém essas moléculas, que já foram oxidadas na
primeira utilização e eliminadas no processo de rerrefino. Pode-se afirmar, portanto, que o
óleo básico rerrefinado pode ter qualidade superior à de um básico de primeiro refino, por ser
constituído de moléculas remanescentes com maior resistência à oxidação.
Os lubrificantes perdem a capacidade de exercer sua função devido à presença de
contaminantes internos ou externos, bem como pela depleção dos aditivos. Entretanto,
submetidos a tratamentos apropriados de regeneração, como o rerrefino, eles retornam à sua
13
condição inicial de óleo básico, podendo participar de um novo ciclo, e assim sucessivamente
por um número indeterminado de vezes. Para se produzir óleo básico a partir de óleo usado,
numa rerrefinaria, se consome apenas 33% da energia que se gastaria para produzir a mesma
quantidade de óleo básico a partir de petróleo cru, numa refinaria.
Aos cerca de 60% dos óleos usados que são coletados no mundo, são dadas diferentes
destinações, em cada país, dependendo de uma série de variáveis, como: volume total
coletado, concentração e distribuição dessa coleta, tecnologia de reciclagem disponível, etc.
Em alguns países, como os EUA, parte do óleo usado coletado recebe um tratamento para
desidratação e remoção de sólidos e é queimado, principalmente em fornos de cimento e
usinas termoelétricas. Essa destinação tem como desvantagem a reutilização do óleo, que é
um produto nobre, apenas uma vez, já que ele é queimado como combustível. Para atender
aos requisitos técnico-ambientais para queima, de modo a não poluir a atmosfera, o óleo
usado tem que estar com os contaminantes dentro dos limites estabelecidos pelas normas
internacionais de segurança para queima controlada de óleos usados.
Algumas empresas, principalmente indústrias grandes consumidoras de lubrificantes,
regeneram em suas próprias instalações o óleo usado, através de processos físico-químicos
que eliminam os contaminantes. Em seguida o óleo é readitivado e volta para seus
equipamentos originais ou é utilizado em outras aplicações. Esse processo tem a vantagem de
proporcionar perdas pequenas em cada processamento, mas não se aplica a óleo de motor,
pela sua elevada degradação. O óleo lubrificante utilizado em motores deve, necessariamente,
ser encaminhado para rerrefino.
14. Conclusões e recomendações
Em diversos países examinados, o processo de rerrefino vem se revelando uma
interessante opção na gestão de resíduos de óleos lubrificantes usados, tanto pelo aspecto
técnico como pelos aspectos econômico e ambiental. O Brasil tem feito esforços para
aprimorar e ampliar o rerrefino, todavia, fica claro que ainda há muito a se fazer,
principalmente no que diz respeito à coleta, que passa por uma questão cultural e sofre pela
falta de uma estrutura nacional para recolhimento do óleo usado.
O maior óbice ao desenvolvimento do rerrefino no país tem sido a dificuldade
encontrada na coleta do óleo usado. As legislações pertinentes, muitas vezes obsoletas,
inadequadas ou insuficientes, não garantem nem estimulam essa atividade, gerando, como
conseqüência, os problemas ambientais dos descartes incorretos.
Após uma breve experiência, a utilização de instrumentos econômicos de política
ambiental foi abandonada e a ação governamental se dá, na atualidade, exclusivamente por
meio de instrumentos de comando e controle. Seria recomendada a utilização de incentivos
econômicos para tornar atrativa a coleta do óleo residual.
Outras medidas recomendadas são: a intensificação da fiscalização pelos órgãos
competentes, a instalação de centrais de coleta, tratamento e reciclagem dos resíduos e a
realização de campanhas de sensibilização e conscientização da sociedade e setores
envolvidos, sobre a importância da participação e envolvimento no processo de preservação
ambiental.
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Papirus. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998.
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1 Gestão Ambiental de Resíduos de Óleos Lubrificantes: o