A polêmica sobre os transgênicos Resenha Economia e Comércio / Desenvolvimento Alice Andrés Ribeiro 05 de novembro de 2003 1 A polêmica sobre os transgênicos Resenha Economia e Comércio / Desenvolvimento Alice Andrés Ribeiro 05 de novembro de 2003 Atualmente a discussão sobre os transgênicos ocupa um papel central no cenário político brasileiro, visto que o governo acabou de liberalizar o plantio e a comercialização de soja transgênica, que deverá ocorrer somente até o fim do ano que vem. T ransgênicos ou organismos geneticamente modificados são as designações conferidas aos animais ou plantas que tiveram sua composição genética alterada cientificamente. Tal alteração ocorre por meio da técnica do DNA recombinante ou da engenharia genética, pelas quais é possível inserir o gene de um organismo no DNA de outro, adicionando a esse a característica determinante de tal gene. No caso dos transgênicos, não é necessário que seja respeitado o critério de combinação genética entre organismos de uma mesma espécie, ou seja, é possível que genes animais sejam inseridos em plantas e assim por diante. Por isso o produto da engenharia genética diferencia-se das práticas tradicionais de melhoramento genético realizadas por agricultores e pela própria natureza, que têm que respeitar as barreiras naturais que distinguem as espécies. Os transgênicos são produzidos por poucas indústrias voltadas para a biotecnologia, sendo a Monsanto uma das que está em maior evidência atualmente. Essas empresas expandiram-se inicialmente com produtos químicos e farmacêuticos, tais como os herbicidas e pesticidas. Ao desenvolverem os transgênicos, que têm como característica a resistência a esses produtos, essas empresas beneficiam-se duplamente: recebem royalties pelo uso de suas sementes e promovem o uso e a venda de seus produtos químicos. A soja Roundup Ready, por exemplo, desenvolvida pela Monsanto, é resistente ao herbicida Roundup, produzido pela mesma empresa. A polêmica dos transgênicos no Brasil foi acirrada pelo contrabando de sementes de soja geneticamente modificadas provenientes da Argentina – onde seu plantio é liberado – para o sul do país, onde ele não era legalizado. Os agricultores, principalmente do Rio Grande do Sul, que já plantavam tais sementes, começaram então a pressionar o governo para que fosse legalizado o plantio e a comercialização da soja transgênica visto que, caso contrário, deparar-se-iam com um prejuízo vultuoso. Foi nesse contexto que o governo do Partido dos Trabalhadores decidiu liberalizar o plantio da safra 2003/2004 e a comercialização da soja transgênica já colhida, por meio da Medida Provisória 131. Essa postula que não poderão ser adquiridas mais sementes de soja transgênica, ou seja, somente deverão ser utilizadas as que os agricultores já possuem. Além disso, toda a soja transgênica deverá ser comercializada até o fim de dezembro do próximo ano devendo, após esse período, ser www.pucminas.br/conjuntura 2 incinerada. A medida provisória também responsabiliza os agricultores por quaisquer danos a terceiros e ao meio ambiente, incluindo-se aí a contaminação de plantações de soja orgânica. Para que possam plantar suas sementes legalmente, os agricultores deverão ainda assinar um Termo de Responsabilidade e Ajustamento de Conduta, sem o qual estarão sujeitos a uma multa superior a R$16.000. A medida provisória não vincula a liberalização do plantio a estudos de impacto, mas proíbe tal plantio em terras indígenas, em áreas de preservação ambiental ou próximas a mananciais. De acordo com o presidente Lula, a realidade do plantio da soja transgênica era desconhecida e a incineração dos nove milhões de sacas já estocadas não seria bem vista, em que pese os esforços governamentais para a redução da fome no país. “Ou mandávamos a Polícia Federal tocar fogo, e não seria uma boa imagem num país que luta contra a fome, ou entendíamos a situação e criávamos as condições para comerciar aquilo”, afirmou o presidente. O curioso é que o PT posicionou-se firmemente contra quando da discussão sobre a liberalização dos transgênicos no governo anterior, afirmando que essa atentava contra a segurança alimentar e os interesses do povo brasileiro. Para o partido, como afirmou antes da posse José Graziano – agora coordenador do Programa Fome Zero- antes da liberalização deveriam ser realizados estudos detalhados sobre os transgênicos, seus efeitos para o ser humano e seus impactos sobre o meio ambiente. Agora, ao entrarem no governo, liberalizaram o plantio e a comercialização da soja transgênica, passando por cima das opiniões dissonantes como a da ministra do meio ambiente, Marina Silva, e do Deputado Federal Fernando Gabeira, dentre outros. Para tanto, foi argumentado que tal liberalização conta com o respaldo da Comissão Técnica Nacional de Biosegurança (CTNBio) que, com base em estudos aprofundados, autorizou há cinco anos seu cultivo. Seria interessante então identificar o que mudou nesses últimos cinco anos para que um posicionamento firme se alterasse substancialmente. Os argumentos a favor e contra a liberalização dos transgênicos também deveriam ser confrontados e esclarecidos por técnicos especializados, para que a população brasileira possa tirar suas próprias conclusões acerca desse tema. É argumentado que o Brasil não deveria se furtar de gozar os benefícios trazidos pelas inovações biotecnológicas. No caso dos transgênicos, argumenta-se que a produtividade aumentaria consideravelmente e os custos, diminuiriam, podendo-se assim, sanar os problemas relacionados à fome no país. O valor nutricional dos alimentos também poderia ser enriquecido, como já acontece com o chamado “arroz dourado”, ao qual foi adicionada vitamina A. Também é ressaltada a importância da resistência das plantas, a possibilidade de se utilizá-las em solos pouco favoráveis às culturas tradicionais, e a diminuição da demanda por água. Como argumentos que vão de encontro à medida adotada pelo governo, destaca-se não só a questão da falta de informações precisas sobre os efeitos dos transgênicos, mas também a necessidade de rotulagem para que os consumidores possam decidir sobre aquilo que querem consumir. Estudos devem ser conduzidos ainda para identificar se a liberalização comprometerá ou não os mercados de soja orgânica já conquistados pelo Brasil, tais como a Europa e o Japão. Caso isso acontecesse, ou mesmo se esses países começassem a consumir a soja geneticamente modificada, o Brasil provavelmente não mais exportaria para eles, visto que os custos, principalmente de transporte, favoreceriam os produtores norte-americanos. Nesse sentido, é importante que se www.pucminas.br/conjuntura 3 promova discussões que contemplem todas as variáveis pertinentes à questão dos transgênicos. Os interesses dos diversos grupos também devem ser cuidadosamente considerados e analisados: ambientalistas, representantes das empresas de biotecnologia, consumidores nacionais e mercados internacionais, são apenas alguns dos grupos em questão. Faz-se ainda necessário que estudo aprofundados e dados reais sejam apresentados, visto que é argumentado que o Rio Grande do Sul não é o único estado produtor da soja transgênica e que o consumo de alimentos geneticamente modificados é maior do que o que tem sido divulgado. Dessa forma, poderá ser esclarecida a polêmica com relação aos transgênicos e o consumidor brasileira estará melhor informado. Referência www.gabeira.com.br www.greenpeace.org.br www.monsanto.com www.monsanto.com.br www.syntonia.com/ www.pucminas.br/conjuntura