Efeitos da noradrenalina na perfusão, filtração e oxigenação renal no choque vasodilatado e lesão renal aguda Effects of norepinephrine on renal perfusion, filtration and oxygenation in vasodilatory shock and acute kidney injury Bengt Redfors, Gudrun Bragadottir, Johan Sellgren, Kristina Sward, Sven-Erik Ricksten (Suécia) Intensive Care Med 2011; 37:60–67 Programa de Residência Médica em Terapia Intensiva Pediátrica Apresentação: Alessandra Severiano – R3 Brasília, 16 de novembro de 2013 www.paulomargotto.com.br INTRODUÇÃO Choque vasodilatado pode ser a via final comum para choque grave de qualquer etiologia e deve-se à falha do músculo liso vascular para a constrição [1]. ◦ Isto é causado pela extrema geração de vasodilatadores endógenos (óxido nítrico e prostaglandinas) ou pela ativação dos canais de potássio sensíveis a ATP nas células do músculo liso vascular [1]. (é relativamente comum após complicação de cirurgia cardíaca [2], frequentemente com insuficiência cardíaca pós-operatória [3]) A norepinefrina (NE) é o agente mais comumente utilizado para o tratamento de hipotensão no choque vasodilatado ressuscitado volemicamente [3, 4]. Pacientes com choque vasodilatado após cirurgia cardíaca muitas vezes sofrem de lesão renal aguda (LRA). ◦ Acredita-se que principal causa seja a isquemia renal por hipoperfusão [5, 6]. Uso de vasopressores em pacientes com LRA poderia potencialmente levar à diminuição do fluxo sanguíneo renal (FSR) e da oferta renal de oxigênio, agravando a isquemia renal. De fato, a infusão intrarrenal da NE é usada para provocar LRA em animais [7], e demonstrou diminuir o FSR em voluntários saudáveis [8, 9]. Por outro lado, dose muito baixa de NE em pacientes com choque vasodilatado pode resultar em pressão arterial abaixo do limite da capacidade autorregulatória renal, nos quais o fluxo sanguíneo renal diminui quase de forma linear com a pressão arterial. No entanto, tem sido demonstrado em cachorros hipotensivos endotoxêmicos [10,11] que a NE aumentar o FSR. Recentemente foi recomendado que vasopressores devem ser usados para manter pressão arterial média (PAM) maior ou igual a 60-65 mmHg no choque vasodilatado para evitar lesão renal aguda [12]. Em pacientes sépticos, aumento do clearance de creatinina com NE tem sido observada em alguns [13-15], mas não em todos [16] os estudos. No entanto, uma melhora da taxa de filtração glomerular (TFG) dependente da NE poderia levar a um aumento do consumo renal de oxigênio (RVO2), prejudicando a relação oferta / demanda renal de oxigênio, pois a TFG é o principal determinante do RVO2 [1719]. Os efeitos da NE na perfusão, filtração e oxigenação renal não tinham sido previamente estudados em pacientes com LRA e choque vasodilatado no pós-operatório. Portanto, o objetivo do presente estudo é avaliar os efeitos renais da NE ao longo de uma faixa de PAM de 60-90 mmHg. Assim, FSR,TFG, consumo renal de oxigênio e a oxigenação renal, foram estudados usando a técnica de termodiluição retrógrada da veia renal. MATERIAIS E MÉTODOS O Comitê de Ética Humana da Universidade de Gotemburgo aprovou o protocolo do estudo, e consentimento informado escrito foi obtido de parentes próximos. 14 pacientes foram incluídos com os seguintes critérios de inclusão: (a) (b) (c) (d) (e) (f) cirurgia cardíaca com circulação extracorpórea, creatinina sérica normal no pré-operatório (<115 micromol / l), desenvolvimento de LRA, de acordo com os critérios da AKI (Acute Kidney Injuriy) network, definidos como aumento de 50-200% na linha de base da creatinina sérica no pós-operatório [20], choque vasodilatado, exigindo NE para obter PAM >=60 mmHg, apesar de précarga ótima, avaliada pelas pressões de enchimento cardíaco direita e esquerda e / ou ecocardiografia transesofágica, índice cardíaco (IC) >=2.1 l/min/m2 com ou sem drogas vasoativas e / ou balão intra-aórtico (BIA), idade >18 anos. Os critérios de exclusão foram: (a) transplante cardíaco, (b) cirurgia de aorta toracoabdominal, (c) dissecção da aorta, (d) utilização de agentes de radio-contraste, (e) arritmias ventriculares pós-operatórias que necessitaram de tratamento. Os pacientes foram sedados com propofol e morfina (n=11) ou fentanil (n=1), sem adição de drogas antinflamatórias não esteróides. O protocolo de tratamento clínico incluiu suporte inotrópico com milrinona e / ou noradrenalina para manter o índice cardíaco maior ou igual a 2.1 l/min/m2, a extração de oxigênio < 40% e PAM de 70-80 mmHg, com ou sem um BIA (balão intra-aórtico). Para promover a diurese, foi utilizada infusão contínua de furosemide. Uma vez que todos os pacientes foram sedados, o estado neurológico não foi incluído no score Sequential Organ Failure Assessment (SOFA)* [21]. * SOFA não é um escore de gravidade ou de predição de mortalidade e sim uma forma de avaliar diariamente, por pontuação, as disfunções orgânicas e o grau de comprometimento do funcionamento orgânico Medidas da hemodinâmica sistêmica Todos os pacientes foram monitorizados por termodiluição da artéria pulmonar e cateteres arteriais. As medidas de débito cardíaco por termodiluição foram realizados em triplicata e indexados a área de superfície corporal para obter o índice cardíaco (IC). O índice de resistência vascular sistêmica, o índice do volume sistólico do ventrículo esquerdo, o índice de oferta sistêmica de oxigênio (DO2I), o índice de consumo de oxigênio sistêmico (VO2I) e a extração sistêmica de oxigênio (O2Ex) foram calculados de acordo com as fórmulas padrão. Medidas das variáveis renais Um cateter 8Fr foi introduzido na veia renal esquerda, através da veia femoral direita sob orientação fluoroscópica. O cateter foi colocado na porção central da veia renal e sua posição foi verificada por venografia com ultra-baixas doses de iohexol [22]. Usando o cateter da veia renal, foi medido o fluxo sanguíneo renal por termodiluição retrógrada contínua [23, 24]. Uma dose inicial de cromo etilenodiamina tetraacético (51CrEDTA) intravenosa foi dada, seguida por infusão a uma taxa constante e individualizada para o peso corporal e creatinina sérica. As concentrações séricas da atividade de 51Cr-EDTA foram medidas por um contador. A urina foi coletada durante períodos de 30 min para medir o fluxo urinário e excreção de sódio. Procedimento experimental Os pacientes foram estudados 2-6 dias após a cirurgia cardíaca. Após um período de equilíbrio de pelo menos, 60 min, dois períodos 30 min de controle se seguiram com meta de PAM de 75 mmHg. Todos os pacientes foram então submetidos a períodos de 60 min com alvo de PAM de 60 e 90 mmHg, diminuindo ou aumentando a velocidade de infusão da noradrenalina (Fig. 1). Subsequentemente, um período pós-intervenção de 60 min com PAM de 75 mmHg foi obtido. Cada período de 60 min foi precedido por um período de titulação de aproximadamente 15 min, para se obter a nova pressão alvo. Em cada alvo de PAM, foi coletada urina durante os últimos 30 min. No final de cada período, o débito cardíaco e as medidas renais de termodiluição foram realizadas, e as amostras de sangue foram coletadas a partir da artéria radial, da artéria pulmonar e da veia renal para as medições das concentrações séricas de sódio, 51Cr-EDTA, hemoglobina, bem como o conteúdo de oxigênio. Os inotrópicos, diuréticos e a infusão de fluidos não foram alterados durante o procedimento experimental. Cálculo dos dados Fluxo sanguíneo renal foi mensurado por termodiluição retrógrada da veia renal esquerda: FSR = (fluxo sanguíneo da veia renal esquerda x 2) + (fluxo de urina). Fração de filtração (FF) foi medida como extração renal de 51Cr-EDTA: FF = [fluxo plasmático renal x (51Cr-EDTA arterial) - (fluxo plasmático renal - fluxo de urina) x (51Cr-EDTA na veia renal)] / [fluxo plasmático renal x (51Cr-EDTA arterial)] onde fluxo plasmático renal = fluxo sanguíneo renal x (1-hematócrito) [25]. Taxa de filtração glomerular = Fração de filtração x fluxo plasmático renal. Resistência vascular renal (RVR) = (PAM – PVC)/fluxo sanguíneo renal. Com CaO2 e CrvO2 como conteúdo arterial e venoso renal de oxigênio, oferta renal de oxigênio = CaO2 x fluxo sanguineo renal, enquanto o consumo renal de oxigênio RVO2 = fluxo sanguineo renal x (CaO2 - CrvO2) e extração renal de oxigênio = (CaO2 - CrvO2) / CaO2. A filtração glomerular de sódio foi o produto da TFG e a concentração de sódio sérica e a reabsorção tubular de sódio foi a diferença entre o sódio filtrado e o sódio excretado. Todos os dados renais foram normalizados para área de superfície corporal de 1,73 m2. Análise estatística Foi realizado Teste de Kolmogorov-Smirnov* para a qualidade de ajuste da distribuição normal e normalidade foi obtida para todas as medidas. Análise de variância (ANOVA) para medidas repetidas seguida pela mínima diferença signficante* (post-hoc test) foram utilizados para avaliar os efeitos induzidos pela NE na pressão de perfusão, na hemodinâmica sistêmica e nas variáveis renais. Valores pré-intervenção e pós-intervenção foram comparados utilizando Teste t-Student. O grau de probabilidade (valor de p) menor que 0,05 foi considerado como indicativo de significância estatística. Os dados são apresentados como média ± desvio padrão (DP). *Teste de Kolmogorov-Smirnov : avalia a normalidade de variáveis quantitativas, como peso, estatura, perímetro cefálico. Least Significant Difference Test: é um procedimento estatístico que determina se a diferença encontrada entre os dois tratamentos, deve-se ao tratamento, ou se a diferença é RESULTADOS Um paciente desenvolveu fibrilação ventricular antes do início do procedimento experimental, o qual foi revertido com sucesso; o paciente foi excluído. Outro paciente foi excluído devido insucesso na colocação do cateter da veia renal. Dados demográficos da linha de base dos pacientes (n = 12) são apresentados na Tabela 1. Os pacientes foram estudados 2-6 dias após a cirurgia com aumento de 62-184% da creatinina sérica. Todos os pacientes foram submetidos à ventilação mecânica, com SOFA score* de 7-12. Todos os pacientes foram tratados com NE, 8 pacientes (75%) com milrinona, 10 (83%) com furosemide e 3 pacientes (25%) necessitaram de um BIA (Tabela 2). *O SOFA escore analisa 6 sistemas orgânicos graduando entre 0 e 4 pontos de acordo com o grau de disfunção orgânica/falência. Variáveis sistêmicas A taxa de infusão de NE foi 38% maior no alvo de 75 comparado com o de 60 mmHg. Na PAM alvo de 75 mmHg, o índice cardíaco IC(11%), a pressão venosa central-PVC (11%), a pressão capilar pulmonar (PCP) (14%), o índice de resistência vascular sistêmica - RVSi (13%) e o índice de oferta sistêmica de oxigênio - DO2I (17%) foram superiores, enquanto a extração sistêmica de oxigênio O2Ex (-13%) foi mais baixa quando comparada com a meta de PAM de 60 mmHg. A taxa de infusão de NE foi 34% mais elevada com alvo de 90 comparado com 75 mmHg. No alvo de PAM de 90 mmHg, IC (8%), PVC (7%), PCP (11%), RVSi (18%) e DO2I (10%) foram superiores, enquanto a extração sistêmica de oxigênio não foi alterada em relação ao alvo de 75 mmHg. Frequência cardíaca, índice do volume sistólico do ventrículo esquerdo, índice de resistência vascular pulmonar, índice do consumo sistêmico de oxigênio, lactato sérico e pH não foram afetados pela variação da NE induzida para obtenção da PAM alvo. Os valores pré e pós-intervenção das diferentes variáveis sistêmicas não diferiram significativamente. A taxa de infusão de noradrenalina no alvo PAM de 75 mmHg em pacientes que receberam milrinona (n = 8) foi de 0,20 ± 0,11 mcg/kg/min, o que não foi significativamente diferente daqueles que não receberam milrinona (0,24 ± 0,08 mcg/kg/min, n = 4) (Tabela 3). Variáveis renais No alvo de PAM 75 mmHg, a oferta de oxigênio (13%), resistência vascular renal (16%), fração de filtração (19%), taxa de filtração glomerular (27%), filtração de sódio (31%), reabsorção de sódio (25%), excreção fracionada de sódio (114%) e fluxo de urina (115%) foram superiores, enquanto a extração renal de oxigênio (-7%) foi menor em comparação com alvo de 60 mmHg. No alvo de 90 mmHg, apenas a resistência vascular renal (25%) aumentou ainda mais em comparação com a meta de 75 mmHg. Nem o fluxo sanguíneo renal nem o consumo renal de oxigênio foram significativamente afetados pelas variações da NE. Valores pré e pós-intervenção das diversas variáveis renais não diferiram significativamente, independentemente dos alvos anteriores (90 ou 60 mmHg). Não foram encontradas diferenças no que diz respeito a alterações na taxa de filtração glomerular, oferta renal de oxigênio ou extração renal de oxigênio, quando a PAM alvo foi reduzida de 75 mmHg (pré-intervenção) a 60 mmHg (n = 6) em comparação quando a PAM foi aumentada de 60 mmHg para um nível de 75 mmHg na pós-intervenção (n = 6). Não houve correlação entre PAM pré-operatória e o aumento da taxa de filtração glomerular (p = 0,12, r2 = 0,27), mas uma correlação inversa (p = 0,04, r2 = 0,66) entre PAM pré-operatória e o aumento da oferta renal de oxigênio quando PAM foi aumentada de 60 para 75 mmHg (Tabela 4; Figs 1, 2.). DISCUSSÃO No presente estudo, os efeitos da variação da PAM induzidos pela NE no fluxo sanguíneo renal, na TFG, no consumo renal de oxigênio e na oxigenação renal foram avaliados em pacientes com choque vasodilatado dependente de NE com lesão renal aguda após cirurgia cardíaca. As principais conclusões são que a restauração da PAM de 60 para 75 mmHg aumentou a oferta renal de oxigênio, a TFG e a oxigenação renal. Em contraste, um aumento adicional na PAM, induzida pela NE, para 90 mmHg somente aumentou a resistência vascular renal sem nenhuma outra alteração na perfusão, filtração ou oxigenação. Elevaçãoda pressão de perfusão renal induzida pela NE aumenta a resistência vascular renal de duas maneiras: por vasoconstrição direta mediada por alfa1 e por autorregulação renal dependente de pressão [26]. ◦ Estudos experimentais anteriores diferenciaram o aumento na resistência vascular renal devido ao efeito vasoconstritor alfa1 e o aumento induzido por uma resposta autorregulatória induzida pelo aumento da pressão arterial[26]. Foi demostrado que a autorregulação foi responsável por mais de 90% do aumento na resistência vascular renal com NE, quando a pressão aórtica foi aumentada em 20-40 mmHg [26]. Fluxo sanguíneo renal e oferta renal de oxigênio não foram superiores em 90mmHg em comparação com 75 mmHg, provavelmente como consequência de um aumento autorregulatório de 25% na resistência vascular renal. Por outro lado, na PAM de 60 mmHg, a oferta renal de oxigênio foi inferior em comparação com 75 mmHg, apesar da diminuição autorregulatória de 16% na resistência vascular renal. Em outras palavras, nos baixos níveis de PAM, o limite inferior da capacidade de autorregulação renal pode ter sido alcançado e a oferta renal de oxigênio torna-se mais dependente de pressão. Ao expor o rim a aumentos agudos na PAM, tanto o fluxo sanguíneo renal e quanto a TFG permanecem relativamente constantes, devido a uma resposta rápida vasoconstritora das arteríolas aferentes, sobreposta a um mecanismo de feedback tubuloglomerular mais lento, que agem em conjunto para regular precisamente a TGF e a oferta tubular de sal [27, 28]. O limite inferior autoregulatório da TFG é aproximadamente 10mmHg superior ao limite do fluxo sanguíneo renal [29]. No presente estudo, a TFG não foi diferente comparando-se 90 com 75 mmHg, muito provavelmente devido ao efeito autorregulador das arteríolas aferentes. Em contraste, a TFG foi 22% menor com alvo de 60 comparado a 75 mmHg, apesar da queda autorreguladora da resistência vascular renal, sugerindo que a TFG é mais ou menos pressão dependente no alvo de 75mmHg ou abaixo. Esses dados estão em conformidade com um estudo retrospectivo recente de Dünser et al [30] em pacientes sépticos mostrando que a necessidade de terapia de substituição renal foi maior com pressão arterial inferior a 75 mmHg e que PAM >=60 mmHg pode ser necessária para manter a função renal. No presente estudo, 75% dos pacientes eram tratados para hipertensão crônica. A hipertensão arterial provoca um deslocamento para cima do limite inferior da autorregulação do fluxo sanguíneo renal e da TFG [31]. Seria previsível que os hipertensos se beneficiariam mais de restauração da PAM de 60 para 75 mmHg, uma vez que seria mais provável de estar fora de sua faixa autorregulatória em comparação com normotensos. Surpreendentemente, os autores descubriram que aqueles que tinham a menor PAM pré-operatória responderam melhor a um aumento no alvo da PAM. Dois pacientes com diabetes apresentaram uma resposta vasoconstritora renal pronunciada à noradrenalina em comparação com os não-diabéticos. Esta diferença pode ser explicada pela conhecida reatividade vascular anormal que ocorre no início do diabetes [32]. Assim, foi demonstrado que os pacientes com diabetes têm uma resposta exagerada a vasoconstritores, tais como a noradrenalina e angiotensina II [33, 34]. Este achado merece uma investigação mais aprofundada. TFG assim como a filtração e a reabsorção renal de sódio foram mais elevadas com 75 do que com 60 mmHg. Reabsorção renal de sódio é o principal determinante do consumo renal de oxigênio em pacientes com função renal normal, e a TFG e o consumo renal de oxigênio estão intimamente correlacionados em pacientes pós-cirurgia cardíaca sem instabilidade circulatória ou disfunção renal [17, 18]. No entanto, o consumo renal de oxigênio não foi superior, apesar da maior taxa de filtração glomerular e reabsorção renal de sódio. A explicação para esta diferença não é óbvia, mas demonstra que a NE provoca um aumento alfa1mediado no transporte tubular proximal de sódio sem nenhum efeito no consumo celular de oxigênio [35]. A extração renal de oxigênio foi superior no alvo de 60 em comparação a 75 mmHg, o que sugere que a oxigenação renal pode ser ainda mais prejudicada na LRA quando a pressão arterial é mantida abaixo do limite inferior da autorregulação renal. O aumento da pressão sanguínea de 75 para 90 mmHg não afetou a extração renal de oxigênio. Este resultado está em conformidade com um estudo recente em voluntários sadios no qual foi demonstrado que a NE não afeta a oxigenação renal, o que foi avaliado pelo método BOLD (blood oxygenation level-depend)* por imagem de ressonância magnética [38]. *Oxigenação sanguínea nível dependente (BOLD) por imagem de RM pode medir desoxihemoglobina e, portanto, indiretamente, estima o teor de oxigênio renal No presente estudo foi utilizada a técnica da termodiluição contínua da veia renal para medir o fluxo sanguíneo renal. A vantagem desta técnica é que as estimativas rápidas e repetidas do fluxo sanguíneo renal podem ser realizados à cabeceira do doente com intervalos curtos. Recentemente, os autores validaram o método da termodiluição contínua da veia renal contra a técnica padrãoouro de clearance urinário de para-aminohipurato (PAH) [24]. O coeficiente de variação para estimativas repetidas de fluxo sanguíneo renal foi semelhante (10%) para a termodiluição e a técnica do clearance urinário, sugerindo que a reprodutibilidade da técnica de termodiluição é comparável à da técnica padrão-ouro. A NE aumentou o índice cardíaco e a oferta sistêmica de oxigênio, devido ao efeito beta1-estimulatório da NE, uma descoberta que está em conformidade com estudos anteriores em pacientes com choque séptico [16, 39] e com choque vasodilatado pós cardiotomia [40]. O efeito relativamente baixo da NE no aumento do índice cardíaco em pacientes com choque vasodilatado póscardiotomia em comparação com pacientes com choque séptico, pode ser explicado pela reserva contrátil mais baixa do miocárdio em pacientes de cirurgia cardíaca e sensibilidade pós-carga mais alta, devido à natureza de sua doença de base [40]. Isto refletiu-se também pelo aumento na pressão capilar pulmonar com níveis crescentes de PAM, o que não é visto em choque séptico com vasodilatação quando a pressão arterial é restaurada com NE [16, 39]. Uma das principais limitações deste estudo é que não foi incluído um grupo controle. Pode-se, portanto, argumentar que as mudanças nas variáveis medidas não foram inteiramente causadas por variações da dose de NE em si, mas também, em certa medida, por flutuações espontâneas ou efeitos tempo-dependentes sobre estas variáveis. Por outro lado, nem as principais variáveis sistêmicas nem as variáveis renais foram significativamente alteradas quando comparadas a PAM de 75 mmHg antes e depois da intervenção. Além disso, as taxas de infusão de noradrenalina foram aleatoriamente aumentadas ou diminuídas para conseguir as metas da PAM de 60 e 90 mmHg. Assim, os autores acreditam que os efeitos das doses de NE nas variáveis medidas são causados pela própria NE e não pelas flutuações espontâneas ou tempodependentes dessas variáveis. Em conclusão, foi demonstrado que a restauração da PAM de 60 para 75 mmHg utilizando NE melhora a oferta renal de oxigênio, a TFG e a oxigenação renal nos pacientes com choque vasodilatado e lesão renal aguda no pósoperatório de cirurgia cardíaca. Aumento da PAM até 90 mmHg usando NE não afetou adicionalmente estas variáveis. A perfusão renal, filtração e oxigenação dependentes de pressão em níveis de PAM abaixo de 75 mmHg refletem uma reserva autorregulatória renal mais ou menos esgotada. RESUMO Objetivo: O uso de norepinefrina (NE) em pacientes com choque vasodilatado ressuscitado volemicamente e lesão renal aguda (LRA) continua a ser o assunto de muito debate e controvérsia. Os efeitos induzidos pela NE nas variações na pressão arterial médial (PAM), no fluxo sanguíneo renal (FSR), oferta renal de oxigênio (RDO2), taxa de filtração glomerular (TFG) e a relação entre a oferta/ demanda renal de oxigênio no Referências 1. Landry DW, Oliver JA (2001) The pathogenesis of vasodilatory shock. N Engl J Med 345:588–595 2. Kristof AS, Magder S (1999) Low systemic vascular resistance state in patients undergoing cardiopulmonary bypass. Crit Care Med 27:1121–1127 3. Holmes CL, Walley KR (2009) Vasoactive drugs for vasodilatory shock in ICU. Curr Opin Crit Care 15:398–402. doi: 10.1097/MCC.0b013e32832e96ef 4. 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Em 2008, Pierre Torneaux et al, França em dois estudos, embora estudos observacionais (evidência fraca), porém com metodologia rigorosa de análise da abordagem dos casos,avaliaram o papel da noradrenalina no Choque Séptico neonatal refratário a fluidos e a dopamina e dobutamina (22 RN; Idade gestacional média de 39±1.7sem) e seus Efeitos circulatórios naqueles com Hipertensão Pulmonar Persistente (18 recém-nascidos;Idade gestacional média de 37±3sem). Na maior parte das crianças incluídas, a Hipertensão Pulmonar Persistente do Recém-Nascido (HPPRN) foi associada ao choque séptico. A HPPRN é usualmente associada com baixa pressão sistêmica e baixo débito cardíaco devido a um aumento da pós-carga do ventrículo direito e disfunção miocárdica. Os autores relataram aumento do fluxo pulmonar com inversão do shunt + aumento do débito cardíaco e aumento da perfusão e oxigenação tissular. A noradrenalina aumentou tanto a pressão pulmonar como a sistêmica, no entanto houve diminuição da relação pressão arterial pulmonar/pressão arterial sistêmica (PAP/PAS) devido ao aumento do fluxo pulmonar e melhora do débito cardíaco, o que sugere que a noradrenalina pode ter efeito vasodilatador pulmonar, especialmente a partir de um tonus vascular pulmonar basal elevado, como demonstrado em vários estudos animais (induz vasodilatação pulmonar óxido nítrico-induzida através da ativação de α2-adrenoceptores). Consultem o resumo dos estudos Noradrenalina para o manuseio do choque séptico refratário a fluido e dopamina nos recém-nascidos a termo Autor(es): Pierre Tourneux, et.al. Apresentação: Antonio Carlos Tessari, Pedro Fragoso Ricardo Mariano de Deus, Paulo R. Margotto Na maior parte das crianças incluídas no presente estudo, a Hipertensão Pulmonar Persistente do Recém-Nascido (HPPRN) foi associada ao choque séptico. A HPPRN é usualmente associada com baixa pressão sistêmica e baixo débito cardíaco devido a um aumento da pós-carga do ventrículo direito e disfunção miocárdica. Outros dados sugerem que a noradrenalina (NA) pode melhorar o desempenho cardíaco na hipertensão pulmonar. No atual estudo, a necessidade de O2 diminuiu durante a infusão de NA, sugerindo que o aumento da pressão aórtica NA-induzida pode ser associado à melhora da disfunção cardíaca induzida pela HPPRN. Usado norepinefrina (diluida em SG 5% a 1ml=100 mcg), iniciando a 0.5mcg/kg/min, com aumento de 30/30 min até pressão desejada Efeitos circulatórios pulmonares da norepinefrina nos recémnascidos com hipertensão pulmonar persistente Pierre Tourneux et al.Apresentação: Marília Aires Oliveira, Carlos A. Zaconeta Aumento do fluxo sanguíneo cerebral, mesentérico e renal; Mudança na direção do shunt do PCA em metade dos casos; Aumento do fluxo pulmonar: inversão do shunt + aumento do débito cardíaco; Aumenta perfusão e oxigenação tissular Aumento do fluxo pulmonar: inversão do shunt + aumento do débito cardíaco; Aumenta perfusão e oxigenação tissular (Modelos animais mostra efeito vasodilatadora pulmonar da norepinefrina) Necessidade de menor FiO2 sem alteração dos parâmetros ventilatórios Aumento da pressão pulmonar e sistêmica, porém com diminuição da relação pressão arterial pulmonar/pressão arterial sistêmica (PAP/PAS) devido ao aumento do fluxo pulmonar e melhora do débito cardíaco.