CONTRIBUTOS DO CONSELHO DE CLASSE PARA A FORMAÇÃO DOS
PROFESSORES NO ÂMBITO DA GESTÃO DEMOCRÁTICA
Márcia Maria Rodrigues Tabosa Brandão¹
Viviane Alves de Lima Silva²
Eixo Temático - Políticas educacionais: gestão escolar e formação docente
Categoria: Comunicação oral
Resumo: Este artigo apresenta uma experiência formativa no âmbito do
conselho de classe no contexto da educação básica desenvolvida no Colégio
de Aplicação da Universidade Federal de Pernambuco. Trata-se de um relato
de experiência que busca descrever a dinâmica dos conselhos de classe,
considerando as contribuições desta instância para a formação dos
professores. O estudo em tela se caracteriza como uma pesquisa de
abordagem qualitativa; os procedimentos de coleta de dados foram: pesquisa
bibliográfica, análise documental e observação participante. Conclui-se que o
conselho de classe é um espaço democrático de avaliação, análises e decisões
coletivas, por conseguinte, instrumento fundamental de efetivação de ensinoaprendizagem de qualidade, bem como se traduz num canal de ação educativa
de todos os profissionais da escola.
Palavras-chave: conselho de classe; formação de professores; participação;
Abstract: This paper presents a formative experience in the teacher-student
feedback meetings (conselhos de classe) in the context of basic education
developed at Colégio de Aplicação of the Federal University of Pernambuco.
This is an experience report that seeks to describe the dynamics of teacherstudent feedback meetings, considering the contributions of this instance to the
formation of teachers. The present study is characterized as a qualitative
research approach; procedures for data collection were: literature review,
document analysis, and participant observation. We conclude that teacherstudent feedback meetings are a democratic space for evaluation, analysis and
collective decisions. Therefore, it is not only an essential tool for effective and
high quality teaching and learning but also a way of enhancing educational
practices among all school staff.
Key-words: feedback meetings; formation of teachers; participation;
__________________
¹ Pedagoga no Colégio de Aplicação (CAp) da Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE), professora na rede pública municipal de Jaboatão dos Guararapes – PE,
mestranda em Educação (Centro de Educação-UFPE) na linha de pesquisa
“Formação de Professores e Prática Pedagógica”;
² Pedagoga no Colégio de Aplicação (CAp) da Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE), mestranda em Educação (Centro de Educação-UFPE) na linha de pesquisa
“Política Educacional, Planejamento e Gestão da Educação”.
INTRODUÇÃO
No contexto das mudanças nas formas da gestão e organização do
trabalho pedagógico, empreendidas desde os anos 1990, as formações
colegiadas vem sendo revalorizadas e ganhando um novo sentido. Para a
construção de uma escola democrática é imprescindível a inclusão de
instâncias colegiadas, pois a participação coletiva faz parte do perfil
democrático, favorecendo o compartilhamento das decisões.
O desenvolvimento democrático do trabalho pedagógico pressupõe uma
organização capaz de garantir a atuação de forma participativa de toda a
comunidade escolar, visando uma atuação coerente e corresponsável. No
domínio do trabalho pedagógico da escola, destacamos o conselho de classe
em virtude da sua relevância no que tange ao ideário de um projeto
democrático.
O conselho de classe é uma instância colegiada da escola que visa
contribuir para a reflexão e a ressignificação da prática pedagógica,
colaborando para o desenvolvimento do percurso escolar do aluno, o repensar
da prática docente, assim como o desempenho da própria escola de forma
coletiva.
O objetivo deste trabalho é apresentar um relato de experiência a
respeito da dinâmica dos conselhos de classe no Colégio de Aplicação da
UFPE, considerando para fins de compartilhamento, os aspectos que
colaboram na efetivação desta instância para a formação docente.
Com o intuito de esclarecer um pouco sobre nossa prática a respeito do
conselho de classe, mais especificamente no que tange a formação do
professor reflexivo, apresentaremos a seguir uma discussão teórica a respeito
de conselhos de classe e formação de professores; em seguida, delinearemos
o percurso metodológico adotado no ambiente escolar do CAp-UFPE, visando
a consecução da presente pesquisa; posteriormente, descreveremos a
dinâmica do conselho de classe do CAp-UFPE; mais adiante, exploraremos
dois momentos de conselhos de classe em que houve o compartilhamento de
questões ligadas ao processo de ensino e aprendizagem, com ênfase na
relação professor-aluno; e, por fim, faremos as considerações finais.
CONSELHO DE CLASSE: QUE ESPAÇO É ESTE?
Segundo Dalben (2004, p.31), o conselho de classe é um órgão
colegiado em que:
(...) vários professores das diversas disciplinas, juntamente
com os coordenadores pedagógicos, ou mesmo os
supervisores e orientadores educacionais, reúnem-se para
refletir e avaliar o desempenho pedagógico dos alunos das
diversas turmas, séries ou ciclos.
Para a autora, o conselho de classe tem como característica a
participação direta de todos os profissionais que atuam no processo
pedagógico, constituindo-se por uma organização interdisciplinar, tendo como
foco do trabalho a avaliação dos alunos, ao que acrescento: da prática docente
e da interação didático-relacional entre os implicados no processo de ensinoaprendizagem.
Em assim sendo, a avaliação precisa ser compreendida enquanto um
mecanismo utilizado para adquirirmos conhecimento, tornando-se desta forma,
um norte para a prática profissional. Vale destacar que a avaliação precisa
operar a serviço do conhecimento e da aprendizagem, portanto, é provável a
possibilidade de aprendizado com a avaliação e assim ela torna-se
imprescindível no momento da formação prática dos professores sobre a
qualidade das aprendizagens dos alunos. Para Freire (1980, p.25), “a
educação, como prática da liberdade, é um ato de conhecimento, uma
aproximação crítica da realidade” e, por conseguinte, a avaliação do outro é
fundamental na constituição do ser humano e na orientação de suas ações.
Garcia (1977) amplia esta ideia sobre conselho de classe, reconhecendo
esta instância como responsável por aprimorar e dinamizar a ação educativa
permitindo subsidiar o replanejamento curricular, bem como favorecendo a
criação de oportunidade de aperfeiçoamento profissional da equipe. Posto isto,
o conselho de classe configura-se como expressão de uma nova atitude em
oposição a modo tradicional de avaliar os alunos, que valorizava a aprovação
ou não dos mesmos, não havendo desta forma, a preocupação com a
elaboração de critérios que contribuíssem para a reflexão crítica do processo
educativo.
O conselho de classe é um momento basilar para esta avaliação, no
entanto nem sempre é dado ao aluno o direito de participar ativamente nesta
instância, limitando a possibilidade de revisão pelos participantes de sua
prática. Ao partilhar, nesta instância, o poder de decisão sobre o fazer
pedagógico, autoriza-se aos envolvidos um diálogo do ponto de vista individual
e coletivo voltado à formação humana e consequentemente a uma prática
democrática.
Na perspectiva de Vasconcellos (2005, p.56):
É justamente aqui que encontramos uma distorção: de modo
geral, não se percebe a discrepância entre a proposta de
educação e a prática efetiva. Em parte, isto ocorre em função
de uma prática de planejamento meramente formal, levando a
que os professores simplesmente ‘esqueçam’ quais foram os
objetivos propostos. Temos que superar esta contradição
através da reflexão crítica e coletiva sobre a prática.
A problematização localiza-se justamente na realização de conselhos de
classe que muitas vezes gera o distanciamento, em suas reflexões, a respeito
da avaliação escolar ancorada na concepção de homem e de sociedade
conforme
se
prima
no
projeto
político-pedagógico
da
escola.
Consequentemente, o debate sobre o conselho de classe precisa estabelecer
um nível mínimo de concordância para que possa transformar um evento em
uma ação significativa.
Dalberio (2008) nos destaca que o conselho de classe tem o papel de
representar um apoio, uma estratégia de ação, na qual todos devem se reunir
visando a melhoria dos resultados do processo de ensino. Nele, deve-se
discutir sobre como se desenvolve o trabalho pedagógico escolar e como fazer
para que se alcance maior êxito, bem como conduzir a avaliação da
aprendizagem do aluno, mas também do trabalho do professor e de toda a
equipe escolar.
E COMO SE FORMA O PROFESSOR?
Na perspectiva de Souza (2009), a formação de professores resulta da
prática pedagógica adotada pelas diferentes instituições de ensino pelos quais
o indivíduo tem acesso, legitimando assim, o exercício profissional. O referido
autor amplia a ideia de prática pedagógica considerando que ela se refere
também à prática docente, a discente, a gestora, a epistemológica, a cultural, a
social, entre outras. Vale ressaltar que, para os fins deste trabalho, vamos nos
deter aos aspectos da prática docente e discente que se estabelecem no
conselho de classe, visto que os demais aspectos escapam ao propósito deste
texto.
A ação coletiva destas práticas, bem como as interações entre os
diferentes sujeitos (docente, discente, equipes pedagógica e gestora) precisam
estar contempladas na construção e implantação do projeto políticopedagógico da escola, para tanto é preciso ter clareza quanto a função a que
se presta a educação, considerando o tipo de homem, de sociedade e de
mundo que se almeja formar. É no processo de diálogo, reflexão, proposição,
conscientização, que se estabelece no cotidiano educacional, que o professor
pode formar e ser formado, constituindo-se este momento, em uma ação
individual, mas também coletiva que contribui para a formação humana e
profissional docente.
A formação do professor, que vai além da abordagem acadêmica,
estrutura-se a partir de um processo de autoformação, envolvendo a dimensão
pessoal, profissional e organizacional da profissão. Neste processo, o sujeito
reelabora os saberes iniciais em confronto com sua prática ressignificando o
seu fazer docente. Assim, os saberes docentes se estabelecem a partir de uma
reflexão na e sobre a prática, sendo essa tendência reflexiva considerada como
o novo paradigma na formação de professores.
Nóvoa (1991) considera a escola como um lócus de formação
continuada do educador em que se confirmam os saberes e a experiência dos
professores. É nesse contexto que o professor faz descobertas, desconstrói
ideias, estrutura aprendizados, constrói novas posturas a partir de uma relação
dialética entre desempenho profissional e aprimoramento da sua formação.
No exercício de sua prática, no interior da escola, o professor lida com
uma diversidade de situações que demandam uma variedade de saberes a
respeito do ensinar e do aprender, sendo estes saberes heterogêneos,
contextualizados, envolvendo aprendizados de caráter variado, entre eles os
saberes da formação, os saberes pessoais e os saberes da experiência. Na
perspectiva de Tardif (2000, p. 11):
(...) os saberes profissionais são saberes trabalhados,
lapidados e incorporados no processo de trabalho docente que
só tem sentido em relação às situações de trabalho concretas,
em seus contextos singulares e que é nessas situações que
são construídos, modelados e utilizados de maneira
significativa pelos trabalhadores do ensino.
Para tanto, é essencial que o professor assuma o papel de mobilizar e
promover os diversos saberes docentes referentes à sua profissão.
Nomeadamente, este processo se reveste de extrema importância para o
professor, pois os envolvidos podem construir e reconstruir seus saberes
segundo as necessidades que surgem no cotidiano escolar, considerando
também, suas experiências profissionais, suas trajetórias formativas e suas
histórias de vida. Cabe então considerar as dimensões social, técnica e política
do processo formativo, sustentada por saberes humanos, apoiados na
experiência e na vivência.
A consolidação de um modelo construtivista de formação profissional do
educador suscita ambientes de aprendizagem que se consolidem num contexto
dinâmico do vir­a­ser, uma vez que ele articula-se às demandas sociais,
econômicas e culturais. Esta concepção considera que o processo formativo do
professor requer um novo modelo educacional, que tenha como prática
recorrente a ação-reflexão-ação, ou seja, visando à formação do educador
reflexivo.
A possibilidade de investigar a própria atividade permite constituir e
transformar os saberes-fazeres docentes, num processo contínuo de
construção da identidade do professor. De acordo com Pimenta (2000) a
identidade profissional se constrói, a partir da significação social da profissão,
da rede de relações com outros professores, nas escolas e em outros espaços,
da revisão das tradições, da reafirmação de práticas aprovadas culturalmente e
impregnada de sentido. Esse processo considera também as práticas que
combatem inovações, por buscar fundamentação em saberes que atendem às
necessidades do contexto, assim como, pelo significado que cada professor
atribui à atividade docente no seu cotidiano a partir de seus valores, de suas
crenças, de seu modo de situar-se no mundo, de suas representações, de sua
história de vida, de seus saberes, do sentido que se dá ao ser professor.
METODOLOGIA
A pesquisa em tela trata-se de um relato de experiência de abordagem
qualitativa, tendo em vista os seguintes aspectos: o ambiente natural como
fonte direta de coleta de dados e o pesquisador como seu principal
instrumento; o caráter descritivo e analítico; o interesse pelo processo mais do
que simplesmente pelos resultados; o significado que as pessoas dão à
temática como preocupação do investigador (BOGDAN & BIKLEN, 1994).
Além de pesquisa bibliográfica, as técnicas de coleta de dados utilizadas
foram: a) observação participante- conforme nos destaca Viana (2003), neste
tipo de observação “o observador é parte dos eventos que estão sendo
pesquisados” (p. 50); b) análise documental- permite complementar as
informações, podendo desvelar novos aspectos durante a pesquisa e validar as
informações obtidas por outras técnicas (LÜDKE & ANDRÉ, 2001).
O campo empírico foi o Colégio de Aplicação (CAp) da Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE), uma escola pública de referência que vem se
sobressaindo nas avaliações de larga escola e, diferentemente da maioria das
demais escolas públicas brasileiras em que se atua fundamentalmente com o
ensino, uma de suas funções compreende contribuir para a qualidade da
educação básica para além de sua esfera de atuação.
A DINÂMICA DOS CONSELHOS DE CLASSE DO CAp UFPE
Os conselhos de classe no CAp-UFPE são bimestrais e correspondem a
um momento ímpar em que professores e alunos podem realizar uma avalição
mútua. Constitui-se em um momento formal em que são discutidas a situação
atual dos alunos e as possibilidades de avanço que visam alcançar os objetivos
de aprendizagem pretendidos. Cada turma tem um conselho bimestral, sendo
realizados durante o ano letivo cinco conselhos de classe: um conselho de
classe prognóstico, três conselhos de classe para acompanhamento e um
conselho de classe para efeito promocional dos alunos.
As atribuições dos conselhos de classe do CAp são: analisar os
objetivos de cada série, das disciplinas e práticas e de suas etapas, bem como
os procedimentos a serem adotados para alcançá-los; avaliar a aprendizagem
dos alunos nos seus diferentes aspectos; deliberar quando à aprovação ou não
dos
alunos,
conforme
as
normas
regulamentares
e
as
normas
complementares; diagnosticar as causas de dificuldades de aprendizagem dos
alunos; solicitar, quando necessário, colaboração de especialistas do Colégio
ou externo, para orientar o seu trabalho de diagnóstico; sugerir linhas de ação
a serem tomadas pelos professores para com a classe; elaborar, para
apreciação pelos órgãos competentes, propostas de alteração dos objetivos e
conteúdo curricular da série (UFPE, 1993).
Participam dos conselhos de classe: o supervisor de turma; a totalidade
de professores de cada turma; alunos; estagiários de licenciaturas; integrantes
da equipe pedagógica. O conselho de classe é presidido pelo supervisor de
cada turma, e cada membro da equipe pedagógica e os professores são
considerados conselheiros. Nesse sentido, as decisões são tomadas
coletivamente. E quando há medidas em que não se chega a um consenso, se
seguem as argumentações, exposição de propostas, havendo por fim a
votação.
O primeiro conselho tem como uma de suas finalidades o planejamento
(INSTRUÇÃO Nº 01/99). Alunos não participam deste conselho. É o momento
em que os professores socializam seu planejamento anual e, através do
diálogo
com
seus
pares
eventualmente
surgem
possibilidades
de
planejamentos interdisciplinares. Também se discute sobre as situações de
dificuldades de aprendizagem vivenciadas no ano anterior pelos alunos,
informando, inclusive, os avanços desses alunos (quando for o caso) que já
puderam ser identificados pelos professores no início do ano letivo.
Os três conselhos subsequentes são de acompanhamento pedagógico e
possuem dinâmica de avaliação mútua e de tomada de decisão coletiva. No
primeiro momento, os alunos leem o relatório referente à avaliação que fazem
a respeito de cada professor em sua respectiva disciplina, bem como se
autoavaliam
enquanto
turma
em
cada
disciplina.
Posteriormente,
os
professores se posicionam em relação à avaliação realizada pelos alunos e,
em seguida, expõem sua visão crítica acerca da turma. Depois desse momento
de
avaliação
mútua,
identificados
os
problemas,
seguem-se
aos
encaminhamentos na tentativa de superação dos mesmos. No segundo
momento do conselho, os alunos se retiram e cada professor e equipe
pedagógica avaliam cada aluno individualmente, especialmente aqueles que
apresentam
dificuldades
de
aprendizagem,
de
comportamento,
de
comprometimento com as atividades, etc.; à medida que se discute sobre a
situação de cada aluno, decidem-se coletivamente os encaminhamentos. Os
encaminhamentos para os alunos com dificuldades de aprendizagem
geralmente são direcionados ao setor pedagógico denominado Serviço de
Orientação Pedagógico (SOE), responsável por acompanhar o processo de
aprendizagem dos alunos juntamente com os professores, e mediar à relação
da família com a escola.
O último conselho de classe denomina-se promocional, no qual são
analisadas as situações dos alunos que apresentaram algum tipo de
dificuldade recorrente ao longo do ano letivo. Cada situação é discutida e, se
houver indicação à retenção de algum aluno por parte de alguma disciplina,
expõem-se as argumentações contra e a favor da promoção ou não do aluno
em questão; posteriormente, segue-se à votação que decide pela promoção ou
retenção do aluno. Os alunos não participam deste conselho. Os resultados
são divulgados pelo SOE às famílias.
CONSELHO DE CLASSE COMO ESPAÇO DE FORMAÇÃO DE
PROFESSORES: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA
Os registros a respeito do conselho de classe se constituem em uma
memória de como se organiza e desenvolve efetivamente esta instância no
âmbito educacional, possibilitando entender para além do processo de
participação dos envolvidos no trabalho escolar.
Utilizamos em nossa
pesquisa, para efeitos de análise, os relatórios dos conselhos de classe de uma
turma de 1º ano do Ensino Médio referentes às reuniões de I e II unidades do
ano letivo 2013.
Tivemos como foco de análise os diálogos entre professor e alunos, que
contribuíram para a construção dos saberes da docência.
Vale pontuar que a
turma faz uma avaliação antecipadamente sobre cada um dos professores,
tendo a mediação de uma orientadora educacional do Serviço de Orientação
Educacional (SOE), e apresentam suas considerações no início do conselho de
classe considerando aspectos, tais como: o trato com o conteúdo de sua
formação, considerando a maneira como desenvolve seu trabalho em sala;
assim como, também é levado em conta o modo como se estabelecem as
interações entre o professor e o aluno.
Ao analisar os relatórios da referida turma percebemos um diálogo em
especial que nos chama a atenção. Este relato evidencia a inquietação da
turma a respeito de um professor em específico que passou a lecionar o grupo
pela primeira vez:
Turma: A maneira como o professor organiza suas aulas
(leitura do livro, desenvolvimento das atividades e, sendo o
caso, esclarecimento das dúvidas) não tem deixado a turma
satisfeita, visto que ele tem limitado a apresentação do
conteúdo ao uso do livro que nem sempre é tão claro. A
relação professor-aluno ainda está em construção, devido ao
curto período de convivência. A turma considera que tem se
esforçado para compreender o conteúdo, destacando como
sugestão que o professor poderia valorizar mais as dúvidas dos
alunos (mesmo fora da sala de aula), pois foram levantados
alguns casos em que o desempenho dos alunos em avaliações
escritas foi afetado pelo não esclarecimento de dúvidas por
parte do professor quando este foi procurado fora da sala de
aula.
Relatório do conselho de classe- (I unidade)
Pela dinâmica do conselho de classe o professor tem seu espaço de
fala, visando desta forma, estimular um diálogo entre professor e aluno. Neste
momento ele pode tecer considerações a respeito do material apresentado pelo
grupo, bem como trazer para o debate novos elementos não percebidos pela
turma:
Professor X: Ele considera que teve de início uma boa
impressão da turma, visto que é a primeira vez que dá aula
para este grupo. Durante o período percebeu que os alunos
precisam de maior atenção, disposição e tempo para o estudo.
Reconhece que não houve diversificação das estratégias de
ensino, assim como, percebe a partir destas falas, ser
necessário reservar um tempo da aula para retomar alguns
temas em específico. O professor sugeriu conversar com o
grupo em sala e se mostrou sensível ao pedido, ressaltando
que tentará rever as questões pontuadas.
Relatório do conselho de classe - (I unidade)
Na II unidade, a referida turma apresenta um novo relatório acerca do
vivido durante o período. Este relato evidencia o desenvolvimento de um novo
olhar do grupo sobre o professor, assim como, do próprio professor em relação
a si próprio, considerando o trato das questões específicas de sua área de
atuação, bem como a respeito da construção de uma relação positiva entre
ambos. Tal exemplo demonstra a utilização deste espaço como um local
primordial para o debate sobre os entraves vividos quanto às questões
pedagógicas de modo amplo, inclusive sobre as práticas docentes que
colaboram para a construção dos saberes da docência.
Turma: Diferentemente da etapa anterior, a turma está
satisfeita com o desenvolvimento das atividades propostas pelo
professor X. As aulas estão sendo desenvolvidas de maneira
mais dinâmica, o que contribui para o nosso aprendizado.
Ressaltamos como positiva a sua disponibilidade em tirar as
dúvidas apresentadas pelos alunos (problemática apresentada
no conselho passado) deixando a turma mais confiante quanto
ao processo de modo geral. A relação professor-aluno
melhorou bastante, e tem se fortalecido como decorrer do
tempo.
Conselho de Classe - (II unidade)
Mediante estes extratos de relatórios do conselho de classe é possível
realizar uma análise sobre a contribuição desta instância a respeito da
formação da identidade do professor. Neste sentido torna-se essencial
considerar que este espaço permite a investigação da prática docente a partir
do diálogo realizado entre professor e alunos, conforme destacam Engers e
Gomes (2007, p. 527, 528):
No momento em que outras vozes são escutadas, as relações
de poder dentro da instituição escolar são passíveis de
reestruturações. Não mais percebendo tal poder como
estanque e concentrado nas mãos dos professores,
coordenadores e diretores, sujeitos que são escutados,
também são parte da escola e, assim, dialogam sobre suas
percepções a respeito da educação que se tem e da educação
que se busca.
A interação levou o professor a revisitar suas práticas impregnadas de
sentido, colaborando para a significação social da profissão, bem como
transformando seus saberes-fazeres; ou seja, o constante olhar para a prática
repercutiu na contínua construção da identidade do professor.
A identidade profissional do docente se constrói, a partir de um processo
de reflexão marcado pelo julgo do professor a respeito de si próprio à luz do
julgamento dos outros, ou seja, o indivíduo faz este julgamento de si
considerando a maneira como os outros o julgam em comparação com eles
próprios. Este processo pode ser observado nos relatos acima citado, o que
nos leva a entender que a identidade é um fenômeno social, e por conta disto,
torna-se fundamental entender o papel do outro neste contexto, visto que a
identidade é legitimada pela representação do outro, assim ela tem a ver com o
olhar do outro.
Por entender que a identidade é fluída e sofre influência do meio é que
se faz necessário que o indivíduo busque se adaptar. Tal fato foi percebido
quando o professor mostrou-se aberto a conversar, revendo os pontos
destacados pelos alunos. Desta maneira, a identidade vai se formando a partir
de experiências, observações e reflexões; e é no processo de socialização que
o professor forma a sua identidade docente.
O acolhimento por parte do professor das questões abordadas pelos
alunos possibilitou a ressignificação da prática docente. Neste contexto, foi
possível perceber o movimento de reconstrução dos saberes docentes
segundo as necessidades apontadas pelo grupo. A consolidação deste modelo
construtivista de formação profissional do educador se deu num ambiente de
aprendizagem consolidado num contexto dinâmico do vir­a­ser, através da
prática recorrente de ação-reflexão-ação, promovendo deste modo a formação
do educador reflexivo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se que o conselho de classe é um espaço democrático de
avaliação, análises e decisões coletivas, por conseguinte, instrumento
fundamental de efetivação de um ensino e aprendizagem de qualidade, e se
traduz num canal de ação educativa de todos os profissionais da escola.
Os conselhos de classe constituem-se também como momentos
possibilitadores de formação e (re)construção da identidade docente, na
medida em que os professores “compartilham momentos de suas atuações em
sala de aula”, “defendem práticas de ensino e falam de si”, enquanto
profissionais que se identificam com determinadas identidades profissionais
(ENGERS E GOMES, 2007, p. 518).
A interação professor-aluno, objeto de nossa análise, levou o professor a
revisitar suas práticas, através da escuta democrática dos envolvidos no
processo ensino-aprendizagem, levando-o a transformar seus saberes-fazeres;
ou seja, o constante olhar sobre a prática repercutiu na contínua construção da
identidade e na formação do professor, assim como na qualidade do processo
pedagógico.
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