CORPOREIDADE INFANTIL: UMA EDUCAÇÃO POR INTEIRO
Laudeth Alves dos Reis1 - UFTM
Resumo
Experiências de vida precisam estar carregadas de significados para que a criança tenha um
desenvolvimento bem sucedido. Já os estudos sobre o tema Corporeidade são essenciais,
visando dotar as crianças de possibilidades de experimentar diferentes situações com seu
corpo como um todo. Assim, substitui-se a ideia de corpo dividido, de corpo-objeto por
corpo-sujeito, que na sua existencialidade movimenta-se intencionalmente buscando
superações. A Corporeidade tem sido objeto de estudo de vários teóricos nacionais como:
Gonçalves (1994); Silvino Santin (2003); Nóbrega (2005/2010); Moreira (2006); Assmann
(2012); Morais (2012), dentre outros. Esta pesquisa procura mapear produções científicas
sobre o tema, no âmbito da Educação Infantil, junto a Programas de Pós Graduação Stricto
Sensu em Educação e em Educação Física. Foi utilizada a metodologia de pesquisa Estado da
Arte e através das palavras-chave Educação Infantil, Corporeidade e Educação, identificar
produções nos últimos cinco anos que associassem Corporeidade e Educação Infantil.
Visitou-se as bibliotecas digitais da UFMG, UFPR, UNIMEP, UFRN, UCB, PUC/SP,
UNICAMP e UFU e nestas não foi encontrada a relação Corporeidade e Educação Infantil. Já
em duas outras fontes conseguiu-se identificar a relação, a saber: 1 – Portal da CAPES, com o
seguinte resultado: uma dissertação; duas teses; dois artigos. 2 – Repositório da UFRGS com
duas teses. Este estudo revelou que há uma carência de produções realizadas sobre
“Corporeidade” no âmbito da Educação Infantil. Há, portanto, a necessidade de ampliação dos
estudos pertinentes à temática e que o conhecimento adquirido sobre Corporeidade possibilite
mudanças na prática pedagógica do professor de Educação Infantil.
Palavras-chave: Corporeidade. Educação Infantil. Estado da Arte.
Introdução
Historicamente os estudos sobre corporeidade constituem um campo teórico ainda
recente e em pleno desenvolvimento, pois a infância não foi seu escopo de atenção e ainda a
educação não concebeu a problemática da corporeidade como centro de suas discussões.
1
Pedagoga pela Universidade de Uberaba. Área de Especialização: Psicopedagogia, Universidade de Iguaçu.
Mestranda em Educação/UFTM. Atua como Pedagoga do Centro Socioeducativo de Uberaba – CSEUR. Integra
o Grupo de Estudos NUCORPO (Núcleo de Estudos e Pesquisas em Corporeidade e Pedagogia do Movimento).
[email protected]
Frente a este cenário, o presente estudo busca estabelecer uma associação/diálogo entre os
dois campos de atuação: Educação Infantil e Educação Física.
A Educação Infantil é um espaço privilegiado para que a criança viva intensamente a
sua corporeidade, experimentado a liberdade de expressão dos movimentos. Foucault (2013)
em seus estudos retrata como era o poder disciplinar e controlador sobre o corpo nas escolas
dos séculos XVIII e XIX, o que percebemos que ainda impera nos dias atuais, onde as
crianças seguem rotinas rígidas e são conduzidas à realização de atividades que visam
prepará-las para a sistematização da futura jornada escolar. A essa obediência passiva,
Foucault denomina “corpos dóceis”, aqueles que recebem com naturalidade o que é
transmitido, sujeitando-se a uma educação fragmentária (MOREIRA, 1995).
Merleau-Ponty (1908-1961) em seu legado nos remete à compreensão da existência
humana como um processo inacabado aberto sempre a novas experiências, possibilitando uma
visão do corpo e do movimento integrados na totalidade humana, pois o homem é um ser-nomundo. Para ele, “o mundo é aquilo mesmo que nós nos representamos não como homens ou
como sujeitos empíricos, mas enquanto somos todos uma única luz e enquanto participamos
do Uno sem dividi-lo” (2001, p.7). Desta forma, o pensamento de Merleau-Ponty contribui
significativamente para os caminhos da reflexão epistemológica da corporeidade.
Nóbrega (2010, p.36) em seus estudos, destaca que:
Uma teoria da corporeidade deve estar atenta para a multiplicidade de sentidos dos
saberes do corpo, buscando não reduzir o fenômeno a categorias simplificadoras,
mas permitindo diferentes aproximações e abordagens, primando pelo diálogo, pela
comunicação entre os elementos que configuram esse universo multifacetado.
Um estudo mais aprofundando nos permite compreender a necessidade de uma visão
ampliada sobre o tema corporeidade, como um campo de experiência e reflexão de saberes do
corpo. Nesse sentido, temos uma nova compreensão do corpo humano, pois à medida que
vivemos a corporeidade ou nos sentimos corpo, nos tornamos significativos tanto a si próprios
quanto aos outros. Essa relação dialética do corpo juntamente com seus movimentos é que
oportunizará que os saberes e fazeres pedagógicos sejam permeados de múltiplas
possibilidades que favoreçam a criança a livre expressão de seus movimentos e gestos, e que
estes sejam revestidos de intencionalidades e significados.
A corporeidade surge da contraposição do pensamento cartesiano que defende a
dualidade corpo e mente pensamento adotado por Descartes, que assemelhava o corpo a uma
máquina dividida em partes, entendida em termos de organização e funcionamento de suas
peças. Caso contrário, consertam ou trocam-se as peças. Essas divisões tendem a padronizar
as ações dos corpos e são fortemente vivenciadas na Educação Infantil quando ainda
prevalecem atividades que fracionam a criança, limitando-a a um ser apenas pensante, que
necessita dominar a leitura e escrita, como requisitos básicos para o sucesso no ensino
fundamental.
Por meio do estudo da corporeidade abandona-se a ideia de um corpo dividido, ou
seja, somado por partes para então ser substituído por um corpo-sujeito, um corpo na sua
totalidade, um corpo que se movimenta intencionalmente. Não se trata de apenas uma mão
que escreve, mas sim, um corpo que escreve. A mão só funciona devido as interconexões de
diferentes músculos e órgãos, que juntos resultam na ação de escrever. Nesse momento não há
sobreposição de um ou outro músculo ou órgão, mas eles se complementam. Sendo assim,
propõe-se a unidade e indivisibilidade da corporeidade que, por sua vez, busca a
conscientização do indivíduo.
Cabem aqui algumas reflexões: qual a concepção de corpo que temos? Qual a
concepção de ser humano que temos? A criança que pensa é a mesma que escreve? A criança
tem um corpo ou ela é um corpo?
Essas perguntas são essenciais para que se compreenda o real sentido da corporeidade,
pois segundo Freire (1991, p.35) “o ser que pensa é o mesmo que sente. O ser que pensa, sem
o ser que sente, já não é o ser. Se um dos dois faltar, é o mesmo que faltar tudo.” Portanto, a
criança deve ser concebida na sua totalidade e é essa mesma totalidade que integra as partes.
Interessante destacar que o mesmo autor denuncia em seus postulados que as pessoas
são corpos (FREIRE, 1991). Sua formação é proveniente da área da Educação Física e
durante sua prática pedagógica possibilitou que seus alunos se percebessem como corpos.
Dessa maneira, as práticas educativas com relação aos saberes e fazeres na Educação Infantil
são necessárias para que as crianças se percebam enquanto um corpo em constante
movimento, dotado de sentidos. E ainda, acrescenta que o que diferencia o ser humano dos
animais é que este primeiro nasce incompleto, ou melhor, aprende-se cada vez mais.
Inclusive, o ser humano só cessa o seu desenvolvimento com a morte. O aprendizado é um
processo contínuo, em que o ser está sempre em busca de mais, ou seja, um ser mais, saber
mais.
Esta pesquisa tem como objetivo mapear as produções científicas relacionadas a
“corporeidade” no âmbito da Educação Infantil a partir do Banco de Periódicos da CAPES e
do Repositório Digital da UFRGS, no período de 2010 a 2015. A análise dos dados se deu a
partir dos termos: corporeidade e educação infantil. Por se tratar de um estudo que se originou
na área da Educação Física, que se ocupou de estudar o ser humano que se movimenta para a
auto-superação, ampliou-se a pesquisa para dar maior significância e fundamentação teórica.
Sendo assim, uma nova busca foi realizada, a partir dos mesmos objetos de busca, no entanto,
acrescentando o termo “Educação Física”.
A relevância do período realizado, que compreende o período de 2010 a 2015 (este
último ainda não finalizado), configura-se pela necessidade de a pesquisadora conhecer o que
se tem publicado de mais recente sobre o assunto em questão e que poderá contribuir
significativamente para o seu trabalho de dissertação em nível de mestrado, uma vez que os
conhecimentos científicos se inovam e renovam de maneira progressiva e rápida.
Nesse contexto, este artigo tem a intenção de contribuir para ampliar o conhecimento
sobre os estudos da corporeidade na Educação Infantil visando situar em que ponto se
encontram as pesquisas voltadas à compreensão da sua corporeidade e sua complexidade.
Para alcançarmos nosso objetivo, optamos por realizar um mapeamento da distribuição das
pesquisas em Educação Infantil e, posteriormente, em Educação Física e identificamos alguns
trabalhos que guiaram o presente estudo.
Metodologia
Como recurso metodológico para a realização desta pesquisa utilizamos os estudos do
Estado da Arte pelo desafio de ser um meio de realizar o levantamento e mapeamento das
publicações já construídas, conhecendo-as a fim de que seja dada especial atenção às lacunas
referentes aos conhecimentos que possuem relevância e precisam ser disseminados. Desta
forma o Estado da Arte constitui-se basicamente de pesquisas de levantamento e avaliação do
conhecimento sobre determinado tema e período.
As etapas desenvolvidas nesta pesquisa foram as seguintes: a) busca de títulos de
periódicos em Bibliotecas Digitais da: UFMG, UFPR, UNIMEP, UFRN, Universidade
Católica de Brasília, PUC/SP, UNICAMP e UFU, com as seguintes palavras-chave:
Corporeidade e Educação Infantil. Em todas essas buscas foram utilizados como filtro o país
da publicação (todos), tipo de material (artigos, teses e dissertações) e o idioma (todos).
Utilizou-se de outros critérios, tais como: a) publicações num período compreendido entre
2010 a 2015; b) ser publicação da área de Educação; c) estar ligado à instituição de ensino
superior. Não houve sucesso de busca nesse primeiro momento. Inclusive, houve a tentativa
em se buscar combinações com a palavra corporeidade. No entanto, a preocupação com a
perda do foco foi decisiva para retomar a pesquisa por outros caminhos.
Sendo assim, optamos pelo Portal de Periódicos da Capes, por se tratar de uma
biblioteca virtual que reúne e disponibiliza a instituições de ensino e pesquisa no Brasil
produções científicas: nacional e internacional. As etapas para esta nova pesquisa foram: a)
descritores “corporeidade and educação infantil”, b) pesquisa avançada; c) período
correspondente aos últimos 5 anos. Com a obtenção dos resultados, totalizaram-se 17
trabalhos, sendo: 13 artigos, 3 teses de doutorado e uma dissertação de mestrado. A partir
desse resultado buscou selecioná-los na sequência dos seguintes critérios: a) título que
contemplasse a temática abordada (corporeidade e educação infantil), b) leitura do resumo, c)
palavras-chave, d) Conclusão, d) posteriormente, leitura completa para verificação da
compreensão da concepção de corporeidade.
As etapas foram certamente muito complexas, pois selecionar pela sequência proposta
não garantia necessariamente que o conteúdo possuísse afinidade com a temática que se
pretendia analisar. Por isso, sentiu-se necessidade da leitura completa das publicações.
Nesse momento surgiu a curiosidade quanto à formação dos autores e orientadores das
pesquisas. Então, buscou-se esta informação na Plataforma Lattes em função do tema em
questão ser oriundo da área de Ciências da Saúde, especificamente, a Educação Física. Desta
forma, a ligação ao tema poderia ter sido desencadeada por motivos diversos, tais como:
formação na área de Educação Física (licenciatura, graduação e pós-graduação), participação
em grupos de estudo e/ou área de interesse. Nesse levantamento, chegou-se ao seguinte
resultado:
Tabela 1: listagem dos resultados apontados pela Base de dados da Capes
TÍTULO
TESE DE DOUTORADO
Corpo e movimento na Educação
Infantil: concepções e saberes docentes
que permeiam as práticas cotidianas
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
Concepção de Corporeidade de
Professores da Educação Infantil e sua
Ação Docente
TESE DE DOUTORADO
Formação corporal de professoras de
bebês: contribuições da pedagogia do
teatro
Fonte: Elaborada pela autora
ANO
PROGRAMA
AUTOR
2010
Faculdade de Educação do
Estado de São Paulo.
Nara Rejane Cruz de
Oliveira
2010
Educação da Universidade
Estadual de Londrina
Patrícia Alzira
Proscêncio
2011
Faculdade de Educação do
Estado de São Paulo
Lúcia Maria Salgado dos
Santos Lombardi
De acordo com Ferreira (2002, p.258), as pesquisas definidas como “estado da arte”
ou “estado do conhecimento” trazem em comum o desafio de mapear e discutir certa
produção acadêmica em diferentes campos do conhecimento, tentando dessa maneira
responder quais aspectos e dimensões vêm sendo destacados e privilegiados em diferentes
“épocas” e “lugares”, e sob que formas e condições têm sido produzidas tais publicações em
periódicos e/ou comunicações em anais de congressos e seminários. Partindo desse
pressuposto, é que em virtude da quantidade encontrada parecer insuficiente para o estudo ser
considerado efetivamente Estado da Arte, buscou-se ampliar a pesquisa a fim de se obter mais
dados e, consequentemente, suprir de alguma forma a necessidade de confirmar a lacuna
existente sobre esta temática, sendo considerado então, de grande relevância esse estudo.
Percorrendo vários caminhos, deparamos com uma biblioteca digital ainda não
pesquisada: o Lume, Repositório Digital da Universidade Federal do Rio Grande do SulUFRGS. É uma instituição centenária reconhecida nacional e internacionalmente com alcance
de altos níveis de avaliação, portanto suas produções acadêmicas são de grande relevância
científica.
A consulta foi realizada buscando seguir novamente as etapas: a) descritores
“corporeidade and educação infantil”, b) pesquisa avançada; c) período correspondente aos
últimos 5 anos. Esta busca obteve como resultado: 176 publicações.
Tabela 2: listagem dos resultados por ano
Repositório Digital da UFRGS
RESULTADO
21
32
26
49
40
08
176
Fonte: Elaborada pela autora
ANO
2010
2011
2012
2013
2014
2015
Uma vez selecionados os periódicos, iniciamos outro processo de filtro das
informações restringindo-se especificamente ao tema abordado: corporeidade e educação
infantil. Foram desconsideradas publicações que contemplavam áreas e o tema distintos do
teor desta pesquisa. Com isso, restaram apenas 2 teses de doutorado, ambas publicadas no ano
de 2014.
Tabela 3: listagem dos resultados apontados pelo Repositório Digital da UFRGS
TÍTULO
TESE DE DOUTORADO
As experiências do corpo em
movimento das crianças pequenas:
reflexões para a pedagogia da infância
TESE DE DOUTORADO
Bebês em suas experiências primeiras:
perspectivas para uma escola da
infância
Fonte: Elaborada pela autora
ANO
2014
PROGRAMA
Educação da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul
AUTOR
Irene Carrillo Romero
Beber
2014
Educação da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul
Gardia Maria Santos de
Vargas
Feita esta análise da produção do conhecimento de corporeidade infantil na educação,
e mesmo deparando com resultados considerados ainda tímidos no âmbito da Educação, não
se pode negar que a origem desse conhecimento advém de pesquisas que apontaram a
temática a partir dos anos 90, por estudiosos e pesquisadores da área da Educação Física.
Mesmo em se tratando de um estudo recente, optamos por ampliar os resultados, estendendo
então à área da Educação Física, que por destacar com um contingente grande de pesquisas e
produções sobre o estudo do corpo, fomentará a fundamentação dos conhecimentos realizados
sobre a corporeidade.
Para isso, foram utilizadas as mesmas bases de dados: Portal de Periódicos da Capes e
Repositório Digital da UFRGS. No entanto, acrescentamos as palavras-chave: corporeidade,
educação infantil e educação física.
No Portal de Periódicos da Capes foram encontrados 9 resultados, que após filtragem
permaneceram 2 artigos, sendo um do ano de 2011 e outro do ano de 2012.
No Repositório Digital da UFRGS, no filtro de produção científica, não foi encontrado
nenhum resultado. Seguiu-se então, para o filtro de busca em teses e dissertações:
Tabela 4: listagem dos resultados por ano
Repositório Digital da UFRGS
RESULTADO
21
30
25
47
37
08
168
Fonte: Elaborada pela autora
ANO
2010
2011
2012
2013
2014
2015
No entanto, após verificação das publicações, nenhuma atendeu aos critérios
esperados.
No Portal de Periódicos da Capes foram encontradas os seguintes trabalhos: uma tese
(2010) e uma dissertação (2010), outra tese (2011) e dois artigos (2011 e 2012) e no
Repositório da UFRGS, duas teses (2014).
De posse dos dados coletados, apresentamos a análise das publicações pesquisadas, o
que certamente nos permitiu identificar categorias de análise mais refinadas para
posteriormente traçar o perfil da produção realizada sobre o tema em questão.
Análise descritiva dos dados
A primeira pesquisa (P1), é uma Tese de doutorado intitulada “Corpo e movimento na
Educação Infantil: concepções e saberes docentes que permeiam as práticas cotidianas”,
defendida no ano de 2010, no Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da
Universidade de São Paulo, tendo como autora Nara Rejane Cruz de Oliveira. As palavraschave são: Corpo, Movimento e Educação Infantil. O objetivo da pesquisa foi investigar qual
a concepção de corpo e movimento que norteia as práticas pedagógicas dos professores de
Educação Infantil. A metodologia, de abordagem qualitativa, privilegiou o trabalho de campo
por meio de entrevistas semiestruturadas, realizadas com professores de Educação Infantil nas
cidades de São Paulo/SP e Jundiaí/SP. A pesquisa indicou que, no discurso dos professores
apontam a ideia da criança na sua totalidade, mas ainda assim, reivindicam o professor de
Educação Física, unicamente, para o trabalho com movimento. Dessa maneira, neste estudo
concluiu-se a necessidade de formação profissional que subsidie aos professores refletir e
construir práticas cotidianas com olhar crítico sobre a criança e sua corporeidade - totalidade.
De forma sintetizada, a autora concebe a corporeidade como a criança na sua totalidade.
A segunda pesquisa (P2), é uma dissertação de mestrado denominada “Concepção de
Corporeidade de Professores da Educação Infantil e sua Ação Docente”, defendida no ano de
2010, no Programa de Mestrado em Educação da Universidade Estadual de Londrina, tendo
como autora Patrícia Alzira Proscêncio. As palavras-chave são: Docência, Formação de
professores, Ação pedagógica, Corporeidade e Educação Infantil. O objetivo foi investigar a
compreensão de corporeidade de seis professoras da Educação Infantil que atuam com
crianças entre quatro e cinco anos de idade, verificando se havia relação entre concepção e
ação docente. Utilizou como metodologia de abordagem qualitativa, e para coleta de dados,
realizou-se uma entrevista semi-estruturada e quatro observações em sala com cada
professora. Com esta pesquisa verificou-se que apenas duas professoras expuseram os
conceitos com maior segurança e clareza. Atribuiu-se a isso o contato anterior, durante seu
processo formativo, com aspectos da corporeidade. Da mesma forma ficou evidenciado em
suas ações o predomínio de atitudes reflexivas e atividades que estimulavam as crianças a
serem mais participativas, a opinar e fazer escolhas. Com isso concluiu-se que os processos
formativos para professores da educação infantil devem contemplar temas peculiares como a
corporeidade. Para que o professor contribua para o desenvolvimento das qualidades humanas
em seus alunos, necessariamente precisa ter construído isso em si mesmo durante seu
processo formativo. Em outras palavras, é necessário que o professor tenha a tomada de
consciência de si, que é a partir da sua ação consciente que haverá evolução. A autora
apresenta a corporeidade como presença no mundo, ou melhor, a maneira como as relações e
interações são estabelecidas com o outro e com os objetos que rodeiam, influenciando e
orientando a atuação na sociedade.
A terceira pesquisa (P3), é uma tese de doutorado, intitulada “Formação corporal de
professoras de bebês: contribuições da pedagogia do teatro”, defendida no ano de 2011, no
Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, por
Lúcia Maria Salgado dos Santos Lombardi. As palavras-chave são: Formação de professores,
Bebê, Linguagem corporal e Pedagogia do Teatro. O objetivo da pesquisa foi verificar como
tem sido feita a formação de pedagogos na linguagem expressiva corporal voltada ao trabalho
pedagógico com os bebês, analisando as possibilidades, os desafios e as necessidades dessa
formação. Como procedimento metodológico foi criado um curso de extensão na Faculdade
de Educação da USP, do qual participaram sessenta e seis pedagogas que trabalham em
Centros de Educação Infantil localizados nos municípios de São Paulo, Barueri, Cotia, Embu
e Francisco Morato, e no qual foram utilizados os conhecimentos do campo da Pedagogia do
Teatro como mediadores de formação. Da análise dos dados provenientes da investigação de
campo e do diálogo destes com a pesquisa bibliográfica, derivam as categorias aprofundadas:
formação corporal do pedagogo; disciplinamento e repressão corporal; percepção sobre os
bebês; reflexões sobre formação e valores docentes. O presente estudo mencionou a
corporeidade como conceito baseado na integração corpo-mente-ambiente. A autora utilizou
em vários momentos do texto, o termo corporeidade, no entanto, não houve aprofundamento
em seu significado.
A quarta pesquisa (P4), é uma tese de doutorado, intitulada como “As experiências do
corpo em movimento das crianças pequenas: reflexões para a pedagogia da infância”,
defendida no ano de 2014, no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, por Irene Carrillo Romero Beber. As palavras-chave são:
Educação Infantil, Movimento, Corpo, Cuidado e Ação autônoma. O objetivo da pesquisa foi
desenvolver argumentos que evidenciaram a dimensão corpórea presente nos processos de
aprendizagem das crianças pequenas. Foi realizada com 25 crianças entre 2 e 3 anos, durante
o período de 9 meses, entre abril e novembro de 2012, num Centro de Educação Infantil no
município de Sinope/MT. A metodologia foi inspirada nos preceitos da pesquisa etnográfica.
Foi elaborado um instrumento metodológico denominado “Olhar 3D”, resultado da
composição da abordagem fenomenológica, escuta sensível e descrição densa. O estudo
evidenciou a importância do tempo livre pedagogicamente preparado, como um tempo
necessário para mover-se em liberdade, numa ação pedagógica pensada com e para as
crianças. O movimento assume um papel fundamental no processo de comunicabilidade.
Nota-se que a concepção de corporeidade apresentada no bojo do trabalho está associada à
forma do ser estar no mundo, um corpo-presença, ou seja, a criança como corpo-sujeito que se
movimenta com intencionalidade.
A quinta pesquisa (P5), uma tese de doutorado, titulada “Bebês em suas experiências
primeiras: perspectivas para uma escola da infância”, no ano de 2014, no Programa de PósGraduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, por Gardia Maria
Santos de Vargas. As palavras-chave são: Bebês, Educação, Experiência, Corporeidade e
Infância. O estudo interrogou quais aspectos envolvem uma educação para a formação
humana, que se preocupe com o viver coletivo dos seres humanos na contemporaneidade,
além de indagar sobre o que compõe a experiência educativa dos bebês na relação com o
outro e nas suas ações significantes na escola de Educação Infantil. Utilizou-se a metodologia
de abordagem fenomenológica, de cunho etnográfico/interventivo. Desta forma, a infância,
muito além de uma etapa da vida é, na realidade, condição da experiência humana. A
educação que se propõe receber e acolher os novos seres – as crianças - que chegam ao
mundo precisa de uma abertura, precisa ser vista com uma novidade, que desencadeará na
formação humana. Este estudo define a corporeidade como expressão dos sentidos
primordiais de existência da vida humana, também reconhecida em significação. E ainda,
destaca o sentido de totalidade do corpo.
A sexta pesquisa (P6), um artigo denominado “El Papel de la Escuela y la Educación
Física en la construcción de la Corporeidad Infantil. Un estúdio desde la perspectiva
narrativa”, publicado no ano de 2011, pela Revista Brasileira de Ciências do Esporte,
classificação Webqualis, B1, Florianópolis, sob a autoria de Dra. Mariel Alejandra Ruiz,
Doutora pela Universidade de Barcelona e Professora da Universidade Nacional de Lujan
(Buenos Aires - Argentina). As palavras-chave são: Escola, Educação Física, Corporeidade e
Processo de Agenciamento. O objetivo desse estudo foi conhecer a contribuição da educação
física escolar na construção da corporeidade infantil no contexto europeu. Utilizou-se a
metodologia “construccionista” (GUBA; LINCOLN, 1994) e o estudo etnográfico, que tinha
como finalidade narrar histórias que refletiram as principais características dos modos de
produção de corporeidades do centro educativo investigado. Os resultados indicaram que a
educação física escolar promove a exclusão de corporeidades que, por sua capacidade de
ação, se identificam com posições e modelos distintos impostos pela escola e que a prática
pedagógica corporal não reconhece os projetos alternativos que os sujeitos constroem à
margem dos discursos e práticas escolares dominantes. O estudo ilustra o termo corporeidade
referindo-se às concepções fenomenológicas que marcaram o fim do pensamento cartesiano e
a ruptura com a axiologia platônica e cristã, humanizando a noção de corpo como corponatureza, corpo para o outro e concebido com um corpo humano carregado de significados e
intencionalidades, que se constitui uma realidade subjetiva.
A sétima e última pesquisa (P7), denominada “Corporeidade: um olhar socioespacial
inclusivo na Vila dos Teimosos e das Teimosas de Campina Grande/PB”, publicada no ano de
2012, por Elyziane Rhaquel Araújo Morais e Dra. Ligia Pereira dos Santos, pela Revista
Ártemis, João Pessoa/PB, classificação webqualis B5. As palavras-chave são: Corporeidade,
Território e Inclusão. Trata-se de uma Pesquisa do Programa de Iniciação Científica da
Universidade Estadual da Paraíba – UEPB, realizado no ano de 2011/2012. O presente estudo
objetiva descrever e analisar ações inclusivas e excludentes sobre a corporeidade e
territorialidade das crianças usuárias das Escolas do Departamento de Educação Física – DEF
da UEPB, e suas mães, habitantes da Vila dos Teimosos (das Teimosas), considerando
atividades aplicadas nas Escolas com os/as alunos/as e nas oficinas da Corporeidade. O
caminho metodológico escolhido foi revisão de literatura, entrevista semiestruturada,
observação e oficinas da corporeidade. Por meio desta investigação, concluiu-se que a
corporeidade territorial estava presente em todo lugar, sempre se transforma e sendo
transformada pela história, uma vez que somos sujeitos sociais sempre em transformação e
transformando. De acordo com o respectivo estudo, a corporeidade implicaria na inserção de
um corpo consigo mesmo, com outros corpos e com o mundo.
Análise e discussão
A pesquisa realizada possibilitou o levantamento de algumas categorias de acordo com
a similaridade temática apresentada, como: definição de corporeidade focando criança ser
total, movimento com intencionalidade e relação com o outro; formação profissional,
participação em grupos de estudos; educação física e autores pesquisados.
Há um consenso quanto a compreensão da corporeidade que personifica a criança
como um ser integral, capaz de aprender com o seu corpo como um todo, sendo respeitada e
valorizada a expressão livre de seus movimentos. Tal aprendizado ocorrerá na relação com o
outro, que é resultado da convivência tanto familiar quanto com aqueles sujeitos inseridos em
seu meio, seja no contexto escolar ou outros convívios sociais (clubes, igreja, parques, etc).
Os movimentos são intencionais quando exatamente se permite que a criança realize por si
própria, com autonomia e liberdade, pois a cada conquista, tende a ampliar-se, graduando
aquele movimento. Por isso, dotado de sentido e intenção. Nesse sentido, Porto (1995, p. 102)
nos alerta que:
Quando a criança aprende jogando e brincando com todo o corpo, não só com o
pensamento mas também com as ações, além de sentir mais prazer, sua vontade de
aprender irá aumentar e seu desenvolvimento global desencadeará acentuadas
mudanças.
A seguinte categoria que diz respeito à formação profissional, aponta a fragilidade no
processo de formação de professores. Entende-se por formação um processo que acompanha o
profissional durante toda a sua trajetória escolar mesmo enquanto discente até o momento de
sua atuação profissional, pois é um movimento constante em que o aprendizado torna-se
contínuo. É o que alerta Tardif (2002, p. 36) ao afirmar que:
A relação dos docentes com os saberes não se reduz a uma função de transmissão
dos conhecimentos já constituídos. Sua prática integra diferentes saberes, com os
quais o corpo docente mantém diferentes relações. Pode-se definir o saber docente
como um saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes
oriundos da formação profissional e de saberes disciplinares, curriculares e
experienciais.
Com isso, as experiências ao longo da vida proporcionam diferentes aprendizados. Por
isso sugerem as P2 e P3, a inserção do estudo abordando o tema corporeidade como essencial
para e no processo de formação profissional do professor.
Outra categoria considerada pelos trabalhos pesquisados relaciona-se à legitimidade
por parte do professor quanto à totalidade da criança, no entanto, mesmo utilizando esse
discurso e defendendo esse posicionamento, a P1 destaca que os professores se eximem da
responsabilidade, transferindo-a ao professor de Educação Física, como se fosse o único
momento que o corpo, enquanto movimento, seria trabalhado de alguma forma.
No entanto, todas as pesquisas realizadas comungam a mesma ideia, de um trabalho
com o corpo, para o corpo, pensando-se na criança enquanto ser criança integral. Embora haja
certa distância entre o que o professor pensa e o que ele faz na sua prática pedagógica,
considera-se um avanço no sentido de abrir possibilidades para a descoberta e reconhecimento
de um conhecimento que se faz necessário na e para a experiência da Educação Infantil.
A P1 traz em seu escopo um estudo acerca do movimento e ainda considera a temática
da corporeidade. No entanto, verifica-se uma apropriação da palavra corporeidade como
sinônimo de outras expressões, tais como: corpo, qualidade do que é corpóreo. Uma
concepção, cujo discurso torna-se diferente quando a prática revela a presença viva da
imobilidade e negligência do corpo da criança no contexto educacional. Dessa maneira, torna-
se evidente o pensamento cartesiano, em que fraciona o corpo da criança em “mente e corpo”,
onde o cognitivo prevalece sobre os demais aspectos como social, afetivo e motor.
Outra categoria refere-se à relação estabelecida com a área da Educação Física. E, para
chegar a essa conclusão, as informações foram encontradas na Plataforma Lattes, quanto à
formação tanto dos autores quanto dos orientadores e, com isso, verificou-se que na P1, P4 e
P6 os autores possuem graduação nesta área; na P2 e P3 possuem licenciatura também na
referida área; na P5 a autora estuda sobre o corpo e na P7, o orientador apropria-se do estudo
também desta área: o que representa positivamente um diálogo entre diferentes áreas e
campus do saber. A participação em grupos de estudos também foi evidenciada nessa busca.
Observamos nas referências apresentadas, o predomínio de autores consagrados na
área da Educação Física, tais como: Wagner Wey Moreira, Terezinha Petrúcia Nóbrega, João
Batista Freire, Manuel Sérgio, Silvino Santin, Hugo Assmann e Ademir De Marco, dentre
outros. E como filósofos, temos como destaque: Maurice Merleau-Ponty e Michel Foucault.
Considerações finais
Quando a criança nasce, se insere numa determinada cultura e momento histórico.
Durante o seu desenvolvimento ela vai incorporando experiências por meio de símbolos e,
com isso, vai experimentando diferentes sentimentos e relação com as pessoas que a
influenciarão modificando por vezes seu modo de pensar e agir. Portanto, nessa relação com o
mundo vai tecendo sua personalidade, constituindo sua identidade pessoal, por meio da
vivência da corporeidade. Assim, as mudanças iniciam-se no meio familiar e se estendem ao
meio social. São essas experiências que, paulatinamente, vão se consolidando na relação
recíproca entre a criança e o mundo. Num processo cíclico, as novas experiências
transformam-se, reestruturando e ampliando as experiências anteriores. Logo, o ser criança
está no mundo em constante transformação, e o meio atua decisivamente nesse processo.
Nesse sentido, é que advogamos a importância desse estudo e complementando essa
ideia Moreira e Simões (2006, p.74), destacam o seguinte:
Corporeidade sou eu. Corporeidade é você. Corporeidade somos nós, seres humanos
carentes, por isso mesmo dotados de movimento para a superação de nossas
carências. Corporeidade somos nós na íntima relação com o mundo, pois um sem o
outro é inconcebível.
Por isso as experiências desde a infância precisam estar carregadas de significados
para que a criança tenha um desenvolvimento bem sucedido. É por esse motivo que o
entendimento da corporeidade é essencial para que à criança sejam oportunizadas vivências
que permitam explorar e experimentar diferentes situações com seu corpo e como um todo.
De acordo com os dados desta pesquisa, destacamos a relevância do uso da temática
em questão que, mesmo abordada ainda num contingente pequeno, já enceta de forma tímida,
mas promissora, um diálogo entre as áreas do conhecimento: Educação e Educação Física.
Contudo, após este trabalho verificamos que nas duas bases de pesquisa consultadas,
há uma carência de produções realizadas sobre a “Corporeidade” no âmbito da Educação
Infantil. No entanto, acreditamos que um dos principais motivos para esses resultados é a
necessidade em se ampliar os estudos de maneira que a temática abordada seja concebida
como princípio básico que venha pautar a prática pedagógica do professor de Educação
Infantil.
Com relação ao impacto das pesquisas sobre o estudo em questão pode-se afirmar que
esses trabalhos possuem um efeito inovador sobre a produção científica da área. Além do
mais, os resultados apresentados podem fornecer subsídios para o desenvolvimento de
estratégias na prática pedagógica da Educação infantil.
Esperamos, enfim, uma educação que promova efetivamente a humanização.
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